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1234 Informativo 1234 1234 1234 do Instituto 1234 1234 1234 Camiliano 1234 1234 1234 de Pastoral 1234 1234 1234 da Saúde 1234 1234 1234 e Bioética 1234 1234
1234 1234 1234 1234 1234 Abril de 2005 1234 1234 o ANO XXIII – n 229 1234 1234 1234 PROVÍNCIA CAMILIANA BRASILEIRA 1234
❒ PASTORAL
❒ BIOÉTICA
ATRÁS DE UMA BÊNÇÃO, MUITAS NECESSIDADES ANÍSIO BALDESSIN
As expressões que mais ouvimos desde criança, depois de mãe e pai, são: Deus te abençoe, se Deus quiser, vá com Deus, durma com Deus, que Deus guie e ilumine seus passos… Mas o que significa a palavra bênção? Segundo a definição do Dicionário Cristão, bênção, em sentido ascendente, “é oração em que se louva ou glorifica a Deus ou os santos. E, em sentido descendente, bênção significa favor ou proteção concedidos por Deus ou pelos Santos. É, também, oração com que a Igreja implora a proteção de Deus sobre as pessoas. Quando a Igreja bendiz coisas, lugares relacionados com a vida humana, o faz tendo sempre presentes os homens que utilizam aquelas coisas e atuam naqueles lugares”.
A IMPORTÂNCIA DA BÊNÇÃO Antigamente era muito comum ver os filhos, quando saíam de casa e também antes de dormir, pedirem a bênção aos pais. Prática que, atualmente, caiu um pouco no esquecimento. E a cada pedido de bênção os pais respondiam: “Deus te abençoe meu filho”, como costumavam fazer os patriarcas bíblicos ao abençoar seus filhos. Uma das mais bonitas palavras bíblicas para bênção é Chesed, que quer dizer o amor leal de Deus e a bondade para conosco. Devemos compartilhar o nosso Chesed com os outros. Essas palavras cheias de
amor podem ser encontradas em Rute. A bênção mais simples é dita por Boaz quando ele abençoa os seus funcionários com “O Senhor esteja convosco”. Ao que eles respondem “Que Deus lhe abençoe” (cf. Rute 2,4). Abençoar uns aos outros faz bem para as nossas almas. Naomi abençoa Rute e Boaz, Boaz abençoa Rute e os seus funcionários e Rute abençoa Boaz. A comunidade inteira abençoa Rute, Naomi e Boaz (cf. Rute 1,8-10;2,19-20;3,10). Javé falou a Moisés: “Diga a Aarão e a seus filhos: Vocês abençoarão os filhos de Israel assim: ‘Javé o abençoe e guarde! Javé lhe mostre seu rosto brilhante e tenha piedade de você! Javé lhe mostre
❒ HUMANIZAÇÃO
seu rosto e lhe conceda a paz!’ Assim o meu nome sobre os filhos de Israel, e eu os abençoarei” (cf. Num 6,23-27).
A BÊNÇÃO COMO FUGA Há algum tempo escrevi um artigo que intitulei: “O médico e o padre, a receita e a bênção”. Nele, refletia sobre o papel do médico e do padre no contato com as pessoas. Afirmei que a atitude mais simples para o médico é passar uma receita e, para o padre, ministrar uma bênção. No consultório médico, mais do que diagnóstico de doenças, muitas pessoas procuram alguém que lhes ofereça uma acolhida, que escute e converse. No entanto, como o profissional dispõe de muito pouco tempo para ouvir, e nem sempre tem paciência para essa “consulta”, passa uma receita ou pede exames. Afinal, é bem mais simples ter esta conduta do que ficar com as pessoas. No ambiente religioso acontece o mesmo fenômeno. O “temido” confessionário e principalmente a confissão deram lugar a uma boa conversa. No entanto, alguns padres ainda não perceberam, ou não querem perceber, que, muito mais do que contar pecados, as pessoas querem desabafar. Assim, por falta de tempo ou comodismo, continuam insistindo somente na bênção e na confissão nos moldes antigos. Será que Deus perdoa apenas os pecados que o padre ouve? A exemplo do profissional médico que se utiliza da receita e do exame como artifício para não se envolver com o doente, o padre pode usar a bênção como fuga. Ou seja, a bênção, que como vimos acima tem um significado tão bonito, passou a ser tratada de maneira muito banal e, sem dúvida, um mecanis-
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mo para atender aos inúmeros pedidos sem perder tempo.
O QUE AS PESSOAS BUSCAM?
EXPEDIENTE
Andando pelo centro da cidade de São Paulo, mais especificamente na famosa Praça da República, pude perceber o grande número des religiosos, médiuns, mães e pais-desanto, cartomantes, quiromantes, jogadores de búzios e tarô, videntes, ciganas entre outros. E o mais incrível é que quase todos estavam rodeados de clientes. Ao ver aquilo tudo fiquei pensando: Enquanto os “confessionários” das Igrejas estão cada vez mais vazios, estes “religiosos” estão cada vez mais ocupados. Sem colocar em discussão o que é certo ou errado nesse tipo de conduta pergunto: “Qual o motivo dessas pessoas para buscar esses ensinamentos? Elas pedem e buscam soluções mágicas. A religião, para muitos, é algo que serve para resolver os mais diversos tipos de problema. Na rua, muitas vezes recebemos folhetos perguntando: “Qual é o seu problema? Nós temos a solução. Entre em contato conosco pelo telefone...”. Daí apresentam a solução para os mais diversos tipos de problema. Na capela do Hospital, em frente ao sacrário e principalmente aos pés dos santos os pedidos são os mais diversos. Diante disso fico pensando, qual é a real necessidade dessas pessoas? Será que estão pedindo coisas? Ou estariam pedindo acolhida, compreensão, alguém que saiba escutar. Posso imaginar o bem estar que proporcionaria um padre, numa atitude compreensiva e aconselhadora, que se dispusesse a ficar sentado naquela praça escutando o que as pessoas têm a dizer. O Boletim ICAPS é uma publicação do Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde e Bioética - Província Camiliana Brasileira. Presidente José Maria dos Santos Conselheiros Antônio Mendes Freitas, Leocir Pessini, Olacir Geraldo Agnolin, Niversindo Antônio Cherubin Diretor Responsável Anísio Baldessin Secretária Cristiana Baldessin Maina
O QUE OFERECEMOS? Na maioria das vezes, oferecemos sacramentos e sacramentais, mas não oferecemos a nós mesmos. Infelizmente, em vez de se oferecer uma acolhida e um atendimento individual e personalizado vemos, cada vez mais, ser oferecidos objetos de piedade que deixaram de ser símbolos e tornaram-se verdadeiros amuletos que as pessoas são incentivadas a usar para proteger de mau-olhado, falta de emprego e desunião na família. Temos santinhos, velas de sete dias, água benta jogada com balde, orações e rituais para “solucionar” muito mais as nossas inquietações do que os problemas das pessoas que vêm ao nosso encontro. Para tais atitudes, usamos a famosa desculpa: “O povo gosta disso, não podemos acabar com a religiosidade popular do povo!” Será que o povo gosta realmente dessas crendices? Também o povo que estava na festa das Bodas de Cana (cf. Jo 2,1-10) achava aquele vinho (as leis do Antigo Testamento) muito bom. No entanto, quando Jesus, o “vinho novo”, apresentou a nova lei, a lei do amor (vinho bom), todos ficaram admirados e imediatamente aprovaram. A mulher samaritana também imaginava que o único poço (ou seja a lei) que tinha água capaz de matar a sede era o de Jacó. No entanto, quando ela experimenta a verdadeira água viva (a nova lei) que Jesus oferece, não só se satisfaz como também vai à cidade apresentar esta nova água (nova lei). “Venham ver um homem que me disse tudo o que eu fiz. Será que ele não é o Messias?” (cf. Jo 4,28-29). Por isso, é claro que se não oferecermos coisas novas, as pessoas, infelizmente, vão ter de se contenRevisora Rita Lopes Redação Av. Pompéia, 1214 Tel. (0xx11) 3675-0035 05022-001 - São Paulo - SP e-mail: icaps@camilianos.org.br Periodicidade Mensal Produção gráfica Edições Loyola Fone (0xx11) 6914-1922 Tiragem 4.000 exemplares
tar com o “vinho velho”, ou com aquela água que, embora possa parecer muito boa, não mata a sede.
O QUE DEVERÍAMOS OFERECER? É muito comum nas igrejas e principalmente no hospital, quando acaba a celebração da missa, alguns pacientes virem até o padre para pedir uma bênção. Diante disso, a pergunta que dirijo a mim mesmo é: Se o padre deu a bênção final para todos, por que alguém necessitaria de uma bênção especial? Diante disso, o que fazer? Não é conveniente, em hipótese alguma, e muito menos uma atitude pastoral, dizer à pessoa: “Eu já abençoei você e todos os que estavam na missa. Por isso, não precisa de nenhuma bênção especial”. Pois essa atitude revela que não fomos capazes de entender a real necessidade da pessoa. Na verdade, o que a pessoa está pedindo não é bem uma bênção. Ela está pedindo uma ajuda. Como a consulta é uma maneira de chegar até o médico, a bênção foi a estratégia, por ela encontrada, para chegar até o padre. Portanto, se quiser realmente ajudar alguém, pastoral e humanamente, você deverá antes de mais nada oferecer uma boa acolhida. Em seguida, perguntar como a pessoa está se sentindo. O que a estaria deixando angustiada? Seria o medo da cirurgia, os resultados dos exames, as preocupações familiares e profissionais? Enfim, tentar, junto com ela, perceber qual é sua real necessidade e não simplesmente se esconder atrás de uma bênção. Pois, atrás de uma bênção, se escondem muitas necessidades. ANÍSIO BALDESSIN, padre camiliano, é capelão do Hospital das Clínicas da FMUSP
Assinatura O valor de R$10,00 garante o recebimento, pelo Correio, de 11 edições (janeiro a dezembro). O pagamento deve ser feito através de depósito bancário em nome de Província Camiliana Brasileira, no Banco Bradesco, agência 0422-7, conta corrente 89407-9. A reprodução dos artigos do Boletim ICAPS é livre, solicitando-se que seja citada a fonte. Pede-se o envio de publicações que façam a transcrição.
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II CONFERÊNCIA NACIONAL DE AGENTES DA PASTORAL DA SAÚDE
LOCAL:
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DATA: 21, 22 e 23 de abril de 2005
21 de abril – quinta-feira 13h às 18h30 – 18h30 – 19h – 19h30 – 20h30 – 21h –
Cadastro no hotel e entrega de material Coffee Break Solenidade de abertura Palestra: O Sus nos dias de hoje Questionamentos ao palestrante Contato de convivências e avisos
22 de abril – sexta-feira 7h às 8h – 8h30 – 9h30 – 10h15 – 10h30 – 10h45 – 12h30 – 14h – 16h30 – 16h45 – 18h30 – 19h30 – 20h30 – 22h30 –
Café da manhã Apresentação dos participantes Palestra: O agente e a participação na comunidade Questionamentos ao palestrante Coffee break Divisão dos grupos, leitura dos eixos temáticos por grupo; identificar a atuação e três ações da PS em cada eixo. Almoço Trabalho em grupo – (continuação) identificar a atuação e três ações da PS em cada eixo Coffee break Apresentação dos resultados dos grupos Horário livre Jantar Continuação da apresentação dos resultados dos grupos e intercâmbio de experiências. Encerramento
23 de abril – sábado 6h30h às 8h – Café da manhã 8h00 – Palestra: A importância da gestão participativa para o conselheiro de saúde 8h45 – Escolha das prioridades para a Pastoral da Saúde por eixo (I Grupo) 10h – Coffee break 10h15 – Elaboração da carta de prioridades da PS para a 12a Conf. Nacional de Saúde. 11h15 – Celebração Eucarística 12h – Encerramento Inscrições e informações pelos telefones: (34) 3217-6434, de 2a a 6a das 7h30 às 12h30. Taxa de inscrição: 25 reais — DEPOSITAR: Banco Itaú – Ag. 1611 Cc; 17900-1 (Obs.: guardar o comprovante de depósito, será usado no ato da inscrição.)
FICHA DE INSCRIÇÃO O depósito para o pagamento da inscrição deverá ser feito em nome de: Província Camiliana Brasileira – Banco Bradesco – Agência 0422-7 – Conta corrente 89407-9. Após o depósito, mandar esta ficha e o comprovante bancário do depósito para a secretaria do ICAPS no endereço acima. Você poderá mandar a ficha e/ou comprovante também pelo Fax. (11) 3865-2189. Nome Endereço
Nº
Cx. Postal Estado
Cidade Cep
Fone
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QUANDO A DOENÇA VEM DA EMOÇÃO SIMONE IWASSO
A somatização tem de ser tratada, pois pode enfraquecer as defesas do organismo. Basta passar por uma situação muito difícil, estressante ou problemática que o corpo fica diferente: a cabeça dói, o resfriado aparece, a digestão se complica, a respiração fica difícil ou a pele se enche de alergias. O fato não é uma simples coincidência, mas um processo chamado pela medicina de somatização, ou seja, a transferência para o corpo do que deveria ser vivido e suportado apenas na mente. Segundo os profissionais que trabalham com a medicina psicossomática, todas as pessoas acabam provocando mudanças no corpo ao enfrentar determinadas situações emocionais, principalmente as que produzem stress e ansiedade. O que muda é a intensidade e a freqüência com que isso acontece — de eventos ocasionais a transtornos repetitivos, que acabam se tornando crônicos. Desse modo, cada vez que uma pessoa não consegue suportar, no plano psíquico, uma situação, ela acaba produzindo ou agravando sintomas e doenças que se manifestam no corpo. Palpitações, gastrite e dores de cabeça estão entre os sintomas mais comuns, mas a somatização pode deixar o organismo com menos defesas para doenças sérias, como câncer, além de prejudicar a recuperação de uma cirurgia, por exemplo. “O stress e a ansiedade são os principais fatores que acabam por influenciar no aparecimento, na manutenção ou na repetição de uma doença física, porque eles alteram o funcionamento de vários sistemas do nosso organismo”, explica o psiquiatra Carlos Andrade, diretor-científico do Comitê de Medicina Psicossomática da Associação Paulista de Medicina. No entanto, é possível controlar e até mesmo evitar que isso aconteça. Mas a receita, que não é fácil e muito menos rápida, inclui o autoconhecimento, a descoberta de válvulas de escape e uma mudança na maneira de encarar os problemas e reagir a eles, de preferência com acompanhamento de um psicoterapeuta.
SINAIS CEREBRAIS Apesar de mudar de pessoa para pessoa, a somatização é explicada cientificamente. Raiva, paixão, tristeza, medo e uma série de emoções causam alterações no organismo, liberando ou
O QUE É SOMATIZAÇÃO? É a transferência para o corpo de situações e sentimentos que deveriam ser vividos no plano psíquico. Acontece quando fatores emocionais influenciam no aparecimento, na manutenção e na repetição de uma doença física, tornando-a um problema crônico na vida da pessoa. Sem causa: em alguns casos, a pessoa sente dores e apresenta sintomas de diversas doenças, mas não há, nesses casos, nenhuma explicação física para isso. São pacientes que freqüentam muito hospitais, que buscam descobrir a causa dos sintomas e geralmente se recusam a aceitar que eles têm uma origem emocional. Como acontece: em situações fortes de stress e ansiedade, por exemplo, ocorrem alterações no sistema nervoso, no sistema endócrino e no sistema imunológico. Com isso, podem ocorrer alterações hormonais e queda na resistência, entre outros. A pessoa fica com uma propensão maior a ter uma série de doenças, inclusive câncer. Principais sintomas: podem se manifestar de diversas maneiras, dependendo de pessoa para pessoa, desde doenças simples até casos mais graves. Mas os mais comuns são gastrite, herpes, dor de estômago, alterações no funcionamento do intestino, dores no corpo, palpitação e falta de ar, problemas de pele, dores de cabeça e problemas de tireóide.
O QUE FAZER? No consultório: é importante procurar um médico que, além de receitar remédios e pedir exames, leve em conta, na hora de examinar o paciente, os aspectos emocionais que podem interferir de alguma maneira na doença apresentada. Muitas vezes, a pessoa só percebe que os sintomas podem ter uma relação psicológica quando ouve isso do médico. Sem máscaras: não adianta tentar passar por cima de problemas e situações traumáticas simplesmente ignorando-os ou esquecendo-os. A pessoa precisa vivenciar e sentir as tensões para depois conseguir tirá-las da mente. Somente ao entrar em contato com esses entraves, é possível expulsá-los da mente e não somatizá-los, adoecendo o corpo. Atividades: é importante extravasar os sentimentos e não guardá-los ou reprimi-los. Conversar e desabafar com amigos pode ser uma boa alternativa para quem não pode ou não quer procurar um psicoterapeuta. Praticar esportes, ter aula de dança, tocar um instrumento também são atividades que ajudam a liberar os sentimentos que podem estar guardados e escondidos. Pausas: todo mundo precisa de uma pausa para se reciclar e recuperar as energias. É importante tentar colocar paradas e momentos de calma no cotidiano.
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inibindo a produção de substâncias, como adrenalina, cortisol e serotonina. Quando a pessoa fica durante muito tempo submetida a uma situação diferente, ela desencadeia mudanças no sistema nervoso autônomo, responsável pelos batimentos cardíacos, pela temperatura corporal, pela digestão, pela respiração e pela sexualidade. Além disso, provoca mudanças no sistema endocrinológico, que produz uma série de hormônios, e no sistema imunológico, responsável pela defesa do organismo. Desse modo, a bagunça no corpo começa e os sintomas aparece — o local escolhido depende da herança genética e racial de cada pessoa. “O indivíduo tende a somatizar nas áreas do corpo que já estão mais fragilizadas ou já tiveram um problema no passado. Depende das reações e da composição física de cada pessoa”, diz Andrade. Mesmo assim, os médicos afirmam que existe um perfil geral do somatizador: pessoas extremamente ligadas ao mundo real, que dão pouco espaço para elaborações psíquicas e em cuja vida não há muito espaço para fantasias e imaginação. Assim, acabam tendo pouco contato e tempo para suas questões psicológicas. “Como não conseguem eliminar as tensões de uma forma natural, aparecem essas válvulas artificiais e as pessoas desenvolvem doenças físicas que têm certamente origem emocional. A gastrite, por exemplo, pode ser uma patologia do aparelho digestivo que se desenvolve à medida que aumentam o stress e o desgaste do paciente”, diz o psiquiatra Leonard Verea, especialista em psicossomática. Em algumas pessoas, o problema se acentua e aparece de uma outra maneira. A pessoa sente sintomas de várias doenças, é examinada pelos médicos, faz exames, mas não encontra nada no corpo que explique o que sente. Nesse
caso, não há doença física com o problema emocional. É o transtorno de somatização, estudado pela psiquiatria. “O paciente sente sintomas no corpo sem que haja uma causa física que explique aquilo. E ele sofre porque não encontra uma causa. Geralmente, são pessoas que recusam fazer um acompanhamento psicológico”, explica o psiquiatra José Atílio Bombana, do Programa de Atendimento e Estudos de Somatização da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
TRATAMENTO Há cerca de dois anos, ao passar por problemas familiares, a estudante de administração hoteleira Júlia Moraes Ramos, de 22 anos, começou a sentir dores do estômago e a vomitar constantemente. Foi ao médico e teve o diagnóstico: gastrite. “Ele me receitou remédios e um calmante natural, para eu tomar quando ficasse muito nervosa. Era muito rápido. Eu ficava nervosa, preocupada e uma hora depois começava a doer meu estômago, apareciam aftas na minha boca, eu chorava”, conta.
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Logo depois, e seguindo a recomendação do médico, Júlia procurou uma terapeuta. “Ela me disse que quando tenho um problema que não consigo digerir acabo atacando o meu estômago. Depois da terapia melhorei bastante, aprendi a não me fazer mal, tento me entender e me controlar”, diz. A estudante seguiu o caminho mais recomendado pelos médicos. Segundo eles, apenas tomar remédios para aliviar os sintomas ou curar a doença não é suficiente. Sem mexer na origem do problema, a somatização continuará. “A pessoa precisa ter a humildade de se olhar no espelho e dizer: eu preciso mudar. E ter a coragem para mudar. Senão ficará se repetindo para sempre”, observa o psiquiatra Verea. “A mudança acontece quando consigo conhecer minhas capacidade, incapacidade, bondade e maldade. Aí a pessoa pode discernir o que sente, o que é dela e o que está absorvendo do ambiente em que está”, diz a psicóloga Maria Rosa Spinelli, da Associação Brasileira de Medicina Psicossomática. Artigo extraído do jornal O Estado de S. Paulo de 14 de janeiro 2005.
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POR QUE TANTAS FARMÁCIAS? JESUAN XAVIER
O brasileiro tem a sensação de que esbarra com uma farmácia em cada esquina. Pelo menos nesse quesito, o país exibe números de fazer inveja ao Primeiro Mundo: são 54 mil estabelecimentos que vendem remédios – um para cada grupo de 3.200 habitantes. Para entender o motivo dessa explosão de drogarias, principalmente nos grandes centros, a Radis ouviu profissionais de diversos segmentos. A meta era tentar responder à pergunta: Por que há tantas farmácias no Brasil? Cultura da automedicação, legislação flexível, propagação de medicamentos mais acessíveis (genéricos e similares), autorização para venda de outros produtos, ausência de uma lei de zoneamento, fachada para lavagem de dinheiro, aumento do roubo de carga de remédios? As respostas foram muitas. A primeira causa é óbvia: ao contrário do que acontece em outros países, a legislação brasileira não faz muita distinção entre farmácia e outro estabelecimento comercial qualquer. “Abrir uma farmácia no Brasil é relativamente fácil”, afirma o presidente da Rede de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), Sérgio Mena Barreto. O farmacêutico Alfredo da Costa Matos Neto, dono de uma farmácia em Duque de Caxias (RJ), concorda: “Infelizmente, o empresário entende o medicamento como uma mercadoria qualquer”. E disso ele discorda: “Saúde e educação não poderiam ser atividades com fins lucrativos”. Mas são: de acordo com os dados da Abrafarma, o setor de drogarias movimenta anualmente 16 bilhões de reais. Embora o mercado seja composto essencialmente por micro e pequenas empresas (85%), as grandes redes
abocanham um terço do total do faturamento (5,6 bilhões de reais). “Os pequenos se sustentam por causa do regime diferenciado de impostos, apesar de o lucro ser baixo”, esclarece Mena Barreto. Como exemplo, ele cita São Paulo: “As pequenas farmácias recolhem 3,5% de ICMS, enquanto as grandes pagam 18%”.
MERCADO PARALELO Há tempos o remédio vem sendo encarado como um produto de alto valor agregado. Segundo levantamento do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de São Paulo, o roubo de medicamentos já ocupa o terceiro lugar entre as mercadorias mais visadas no estado – perde apenas para produtos químicos/defensivos agrícolas e eletroeletrônicos, respectivamente. Entre janeiro e setembro de 2004 foram desviados 13,4 milhões de reais em remédios. Em 2003, o valor total do roubo de medicamento chegou a 16 milhões de reais. Para quem estranhou a afirmação sobre a lavagem de dinheiro, a explicação: um dos bandidos mais conhecidos do Rio de Janeiro, Darcy da Silva Filho, o Cy de Acari, era dono de uma grande rede de farmácias – com cerca de 200 lojas em todo o estado. Traficante, acabou morto por enforcamento no presídio de segurança máxima Bangu 1, em 1999: ele utilizava as farmácias para lavagem de dinheiro do tráfico. Afinal, é fácil abrir uma farmácia. A Confederação Nacional do Transporte (CNT) admite o crescimento no roubo de cargas como um todo, mas ainda não tem levantamento por segmento de mercadorias. De acordo com a assessoria da entidade, a CNT já faz um trabalho conjunto com a Polícia Rodovi-
ária Federal para, em breve, ter um mapa da situação no país. Há quatro anos, quando a CPI dos medicamentos investigou a falsificação e o roubo de remédios no Brasil, o deputado Robson Tuma, sub-relator da comissão, fez uma afirmação chocante: “Noventa por cento das farmácias não têm noção da origem dos produtos que vendem”. No relatório final da CPI, as conclusões não deixaram dúvidas sobre a existência de uma estrutura mafiosa para o roubo e a distribuição de remédios. “Uma carga de medicamentos pode chegar a milhões”, disse Tuma, na época, à revista IstoÉ. O relatório apontava ainda para um complicador: empresas e fabricantes de remédios tinham participação no desvio de cargas. De acordo com a investigação, essa era uma das formas de desafogar medicamentos com data de validade a vencer. Alfredo confirma que o mercado trabalha com remédios sem nota fiscal. “Não sei se chega a 90%, mas não tenho dúvida de que grande parte dos remédios consumidos no país é fruto de roubo”, diz. “Trabalhar com medicamento industrializado, devidamente legalizado, dá uma margem muito pequena de lucro.” Para tentar conter o crescente desvio de carga de remédios, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determinou, pela Resolução n. 320, de novembro de 2002, que as empresas atacadistas e as distribuidoras de remédios passassem a informar nas notas fiscais o número do lote dos medicamentos. A agência até oferece um site, atualizado com freqüência, com alertas sobre carga roubada: www.anvisa.gov.br/medicamentos/ roubados/alerta_2004.htm — com o nome do laboratório, a quantidade e o lote desviado.
“EMPURROTERAPIA” O coordenador-executivo da Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentos (Sobravime), José Ruben de Alcântara Bonfim, defende um critério de zoneamento urbano para a abertura de novas farmáci-
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as. Para ele, é relativo centrar o debate apenas num número absoluto de estabelecimentos: “Acho que a questão maior é a falta de um critério de zoneamento sanitário. Hoje percebemos localidades com concentração muito grande de estabelecimentos e outras sem nenhum”. Ele dá como exemplo a cidade de São Paulo: “Na Avenida Paulista, onde circula o dinheiro e há dezenas de consultórios, há uma farmácia a cada 100 metros; na periferia, esse número diminui muito, há regiões em que não há nenhuma”. Ruben cita outro problema, relativo à segurança (ou insegurança): é comum, numa região mais pobre, haver farmácias que não atendem completamente o público: “Remédios caros, essenciais para um doente de câncer, por exemplo, não são encontrados na periferia, pois o dono tem medo de ser assaltado”. Alfredo, dono da farmácia de Caxias, também se mostra favorável a uma lei que regularize a distância entre os estabelecimentos: “Antigamente existia uma lei de zoneamento básico que não permitia uma farmácia a menos de 500 metros da outra; hoje, vemos um colada na outra”. A percepção dele é a mesma de qualquer cidadão carioca. O número de farmácias no Rio de Janeiro saltou de 1.756, em 2001, para 2.051 no primeiro semestre de 2004, segundo o Núcleo de Estudos Econômicos e Microdesenvolvimento (Neem) da Coordenação de Licenciamento e Fiscalização da Prefeitura. “A cultura da automedicação e a famosa empurroterapia, em que o balconista sugere ao cliente um remédio do qual ele não precisa, alavanca o setor”, diz Alfredo. Ele afirma que o mercado está acostumado a trabalhar com o que chama de Linha Guelta: “Ou seja, a dúzia de 36: é quando compramos do fabricante ou fornecedor um remédio e ganhamos três. Geralmente são similares a um custo muito mais baixo do que o normal”. Por sua vez, o presidente da Abrafarma, Sérgio Mena Barreto, rejeita a explicação de que o Brasil
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é o país dos hipocondríacos: “É mais uma das falácias que pairam sobre o mercado”. E apresenta dados de uma pesquisa para provar que o consumo médio de remédios no Brasil vem caindo desde 1997 e está abaixo do de países da América Latina, como México, Argentina, Venezuela e Chile: “No ano de 2003, as vendas caíram 7,2% em relação a 2002”. Sérgio Mena Barreto ainda desmente que a Organização Mundial de Saúde (OMS) tenha qualquer recomendação sobre o número ideal de farmácias por habitante: “Freqüentemente vemos, na grande im-
S CA DI
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prensa, que a OMS recomenda uma farmácia para cada 10 mil pessoas. Isso é mentira”. Segundo ele, a Abrafarma solicitou, por escrito, esclarecimento da própria OMS: “Eles nos responderam que nunca houve nenhuma sugestão sobre isso”. De acordo com estudo da Abrafarma realizado em abril de 2004, pelo menos dois países da Europa têm mais farmácias (proporcionalmente) do que o Brasil: “Na França há uma para cada 2.648 habitantes, e na Espanha, uma para cada 2.001. Já na Inglaterra são 12.224: uma para cada 3.875, proporção muito parecida com a nossa”.
GASTRITE É SINAL DE MAUS HÁBITOS ALIMENTARES
Tudo o que acontece no estômago tem relação com o que se come e com o que se sente. Segundo os especialistas, o órgão é um dos termômetros mais precisos do organismo. Assim, aquela sensação de queimação no estômago, acompanhada de dor, não deve ser ignorada, pois trata-se de um dos principais sintomas da gastrite, que, se não for tratada, pode evoluir para úlceras e até câncer. O estômago tem uma camada de proteção chamada mucosa, cuja função é evitar que a acidez do suco gástrico atinja as paredes do órgão. O sugo gástrico é produzido para ajudar a digerir os alimentos. Mecanismos como a mastigação, a sensação de fome, o nervosismo e a tensão constantes estimulam a produção e liberação desse ácido no estômago. Sem alimento para digerir, o suco gástrico pode provocar corrosão das paredes do estômago, que causa dor. Isso é a gastrite, em outras palavras, uma inflamação da mucosa gástrica. A gastrite também pode ser causada pelo consumo exagerado de álcool, cigarro e alimentos muito condimentados e gordurosos ou ainda pela contaminação provocada por bactéria. O mais importante é ter consciência de que, se o organismo desenvolveu uma gastrite, está sinalizando que os hábitos adotados não são saudáveis. Nesse caso, a pessoa deve avaliar sua dieta e também a tensão emocional a que está submetida, já que ambos interferem na saúde do estômago. Alguns cuidados com a alimentação são capazes de evitar as crises. Mesmo assim não se pode dispensar o acompanhamento médico, já que os problemas emocionais também devem ser tratados. Para controlar os problemas com o estômago, os especialistas recomendam não ficar sem se alimentar por mais de quatro horas. O ideal é fazer seis refeições moderadas por dia (café, lanche, almoço, lanche, janta e ceia). Comer devagar, em ambiente tranqüilo, mastigando bem os alimentos, também é importante. Evitar comer no meio da noite e, antes de dormir, não ingerir alimentos pesados. Restringir o consumo de pratos gordurosos e frituras em geral. Algumas pessoas também são sensíveis a alimentos muito condimentados, que nesse caso devem ser evitados. Dietas ricas em fibras, como frutas, hortaliças e cereais integrais, ajudam a normalizar o funcionamento do intestino, previnem o câncer e são benéficas no tratamento de gastrite. Os refrigerantes são ácidos e gasosos, além de irritarem o estômago, causam desconforto em função da expansão dos gases. Bebidas alcoólicas também são irritantes da mucosa do estômago, portanto, devem ser consumidas com moderação e nunca com o estômago vazio. Enfim, é fundamental fazer as refeições com tempo e local apropriado. Comer em pé, apressadamente, só prejudica a digestão.
Ano XXIII – no 229 – Abril de 2005 – BOLETIM ICAPS
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SOBRE O ESCUTAR JOSÉ TARCÍSIO AMORIM Em nossos tempos difíceis, em que nossa intimidade se isola num oceano de informações constantes, escutar é mais do que uma arte: transformou-se numa ascese de santificação. O que é escutar? É fazer-se disponível para o outro, numa forma básica de compaixão e caridade. É superar a tentação do “eu também”! e centrar-se na fala do outro, oferecendo sua mão, sob a forma de silêncio, a uma angústia que nos chega sob a forma de sons, da vibração profunda do ser, que se exprime como palavra. Existe um fato real, já de domínio público, que tomo a liberdade de compartilhar. Trata-se de algo cômico, com algumas pitadas de trágico, que retrata de maneira exemplar a primazia de nosso ego sobre as necessidades do nosso próximo. Consta que T. R., um presidente americano, era entusiasmado com caçadas, e isso já seria preocupante. De uma feita, soube que um eminente caçador inglês visitava seu país. Valendo-se de seus privilégi-
os, convidou o fleumático britânico para alguns momentos na Casa Branca. Seu desejo era saber o que seu convidado já caçara com que armas, seguindo quais estratégias e assim por diante. O mais importante seria comparar emoções. Enfim, o pressuroso presidente tinha muito o que ouvir e desejava sinceramente exercer a misericordiosa arte da escuta. O convidado chegou e as portas da biblioteca da Casa Branca fecha-
ram aquela intimidade para os urgentes problemas do mundo. Duas horas depois, as portas se abriram e o esperado visitante retirou-se visivelmente transtornado, com sinais de fadiga e nervosismo, tão pouco esperados na personalidade de um experiente caçador. Pessoas, do lado de fora, aguardavam o desfecho da entrevista e do meio delas ergueu-se uma voz, que perguntava: “O que o senhor falou com o presidente?”. “Só consegui falar o meu nome!”, respondeu o desconcertado súdito de Sua Majestade Britânica. JOSÉ TARCÍSIO AMORIM é professor de Psicologia Profunda na PUC-MG e no Seminário da Arquidiocese de BH.
TOME NOTA O XXV Congresso Brasileiro de Humanização e Pastoral da Saúde será realizado nos dias 10 e 11 de setembro, em São Paulo. Reserve essas datas e venha comemorar conosco os 25 anos de congresso, ou bodas de prata.
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