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12345 Informativo 12345 12345 12345 do Instituto 12345 12345 12345 Camiliano 12345 12345 12345 de Pastoral 12345 12345 12345 da Saúde 12345 12345 12345 e Bioética 12345 12345

12345 12345 12345 12345 Setembro de 2005 12345 12345 12345 ANO XXIII – no 234 12345 12345 12345 PROVÍNCIA CAMILIANA BRASILEIRA 12345

❒ PASTORAL

❒ BIOÉTICA

❒ HUMANIZAÇÃO

25 ANOS DE CONGRESSO Congresso Brasileiro de Humanização e Pastoral da Saúde Tema: CELEBRANDO 25 ANOS DATA:

LOCAL: Anfiteatro do Centro Universitário São Camilo

10 e 11 de setembro de 2005

Avenida Nazaré, 1501 – Ipiranga – São Paulo, SP

DIA 10 Sábado

07h15 às 08h15 – Inscrições e entrega de material 08h15 às 09h – Oração e abertura 09h00 às 09h45 – História dos congressos – Pe. Anísio Baldessin 09h45 às 10h30 – As consquistas na área da saúde Pe. Christian de Paul de Barchifontaine 10h30 às 11h00 – Intervalo 11h00 às 11h45 – Descobertas científicas, desafios éticos e bioéticos – Pe. Leo Pessini 11h45 às 12h15 – Espaço para perguntas 12h15 às 13h30 – Almoço 13h30 às 14h00 – Tribuna livre 14h00 às 14h45 – Campanha da Fraternidade e Pastoral da Saúde Dom José Alberto Moura 14h45 às 15h15 – Novidades da Coordenação Nacional da Pastoral da Saúde da CNBB – Dr. André Luís de Oliveira 15h15 às 17h00 – A importância do cuidado de si mesmo Dra. Alexandrina Meleiro 17h15 às 17h – Encerramento

DIA 11 Domingo

07h15 às 17h – Chegada 08h00 às 08h40 – Aspectos médicos dos cuidados paliativos – Dr. Toshio Shiba 08h40 às 09h20 – Aspectos práticos no controle da dor Cibele Andrucioli de Mattos Pimenta 09h20 às 10h00 – Aspectos sociais dos cuidados paliativos – Letícia Andrade da Silva 10h00 às 10h15 – Espaço para perguntas 10h15 às 10h45 – Intervalo 10h45 às 11h20 – Aspectos teológicos e pastorais dos cuidados paliativos Pe. João Inácio Mildner 11h20 às 11h50 – Aspectos psicológicos dos cuidados paliativos Valmari Cristina Aranha 11h50 às 12h15 – Dia mundial dos cuidados paliativos – Dr. Císio Brandão 12h15 às 13h30 – Almoço 13h30 às 14h00 – Tribuna livre 14h00 às 14h30 – Prática saudável de vida – Marta Damasceno 14h30 às 15h15 – Hipertensão arterial: um mal invisível Dra. Fernanda Consolin Colombo 15h15 às 15h45 – Intervalo 15h45 às 16h30 – Obesidade: um mal evidente – Dr. Carlos Aurélio Schiavon 16h30 às 17h – Espaço para perguntas 17h15 às 17h – Missa e encerramento

INSCRIÇÕES • Fone (11) 3862-7286, ramal 3, com Cristiana – das 13h às 18h


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CONGRESSO PASTORAL 25 ANOS DE HISTÓRIA

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SAÚDE: DESAFIOS E EXPERIÊNCIAS foi o tema central do primeiro Congresso Brasileiro de Humanização e Pastoral da Saúde, realizado em 1981 e organizado pelo extinto centro de pastoral da saúde, denominado CAPS – Cultura Antropologia e Pastoral da Saúde, departamento responsável pela pastoral da saúde da Província Camiliana Brasileira, que perdurou até 1983 quando foi substituído pelo ICAPS – Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde. A temática do primeiro congresso, desafios e experiências, retrata muito bem a real necessidade de se promover o evento: partilhar experiências positivas e/ou negativas, e juntos procurar saídas para enfrentar os desafios pastorais no mundo da saúde presentes nos hospitais, dioceses e paróquias. Paralelamente, com a evolução da tecnologia no mundo da saúde, foi preciso ampliar as discussões, até então restritas às questões pastorais no hospital. Em 1986, a pastoral da saúde do Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde – ICAPS se uniu à pastoral da saúde da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB. A partir de então esta pastoral foi dividida em três dimensões: solidária, comunitária e político-institucional. Assim, na programação do congresso, passou a figurar temas de interesse dessas três dimensões. Além disso, a Aids, por muitos considerada o “mal do século”, mereceu e continua merecendo, hoje com menos intensidade, espaço para discussão. Outro tema que ocupou, e hoje mais do que nunca, enorme espaço nas discussões relacionadas ao mundo da saúde é a bioética. E esse congresso, de maneira quase pioneira no Brasil, começou a levantar e propagar a importância de se discutir os temas relacionados às três fases mais importantes da vida: o nascer, o viver e o morrer.

TEMAS DOS CONGRESSOS

EXPEDIENTE

ASTORAL DA

O Boletim ICAPS é uma publicação do Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde e Bioética - Província Camiliana Brasileira. Presidente José Maria dos Santos Conselheiros Antônio Mendes Freitas, Leocir Pessini, Olacir Geraldo Agnolin, Niversindo Antônio Cherubin Diretor Responsável Anísio Baldessin Secretária Cristiana Baldessin Maina

Os temas centrais dos vinte e cinco congressos realizados foram os seguintes: 1981 1982 1983 1984

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1985 – 1986 – 1987 – 1988 – 1989 – 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997

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1998 1999 2000 2001 2002

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2003 – 2004 – 2005 –

Pastoral da Saúde: desafios e experiências Humanizar o hospital hoje Direito à vida e à saúde Problemas éticos na humanização e pastoral da saúde Evangelização e catequese no mundo da saúde A função social do hospital A pastoral da saúde no contexto da pastoral orgânica A nova Constituição e a saúde no Brasil. Problemas de bioética Pastoral da promoção da saúde. Valores cristãos na área da saúde A mulher e o idoso Curas: medicina e religião Nova evangelização e saúde Pastoral da saúde e saúde pública Saúde mental A saúde e os excluídos Saúde e justiça Políticas públicas de saúde e terapias naturais em saúde O Espírito Santo: animador da pastoral da saúde Envelhecer com dignidade Saúde e dignidade humana Drogas: o desafio do milênio A pastoral da saúde nas dimensões solidária, comunitária e político-institucional Qualidade de vida na pastoral da saúde Os novos desafios da pastoral da saúde Celebrando 25 anos de humanização e pastoral da saúde

Revisora Joseli N. Brito Redação Av. Pompéia, 1214 Tel. (0xx11) 3675-0035 05022-001 - São Paulo - SP e-mail: icaps@camilianos.org.br Periodicidade Mensal Produção gráfica Edições Loyola Fone (0xx11) 6914-1922 Tiragem 4.000 exemplares

Assinatura O valor de R$10,00 garante o recebimento, pelo Correio, de 11 edições (janeiro a dezembro). O pagamento deve ser feito através de depósito bancário em nome de Província Camiliana Brasileira, no Banco Bradesco, agência 0422-7, conta corrente 89407-9. A reprodução dos artigos do Boletim ICAPS é livre, solicitando-se que seja citada a fonte. Pede-se o envio de publicações que façam a transcrição.


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25 ANOS DE HISTÓRIA É quase impossível, principalmente por não termos todos os temas discutidos nos primeiros congressos, fazer uma lista completa de tudo aquilo que mereceu destaque nestes 25 anos de história. Além disso, ocuparíamos algumas páginas deste boletim. Não menos difícil seria lembrar, sem cometer injustiça, os nomes de todos os que ministraram palestras em nossos congressos. Mas podemos destacar que por eles passaram inúmeras pessoas. Desde as mais letradas até as mais humildes, que mesmo não tendo grande capacidade intelectual, na sua simplicidade, contribuíram com testemunhos e experiências práticas do dia-a-dia em hospitais, dioceses, paróquias e comunidades. Portanto, bispos, padres, pastores, religiosos(as), seminaristas, médicos, psicólogos, nutricionistas, assistentes sociais, fisioterapeutas, enfermeiros(as), administradores, políticos, centenas de leigos e até bruxos e esotéricos que professam fé contrária à nossa já ministraram palestras nesses congressos. Destacamos ainda, sem mencionar nomes, os participantes que fizeram com que os congressos acontecessem. Ao apagarmos a velinha dos 25 anos de vida deste aniversariante que, no início, contava com um número restrito de convidados para seu aniversário, não apaguemos de nossa memória tudo aquilo que aprendemos no decorrer dos anos e muito menos todos os participantes que, direta ou indiretamente, contribuíram para que pudéssemos chegar a este número tão expressivo de vida. Em nome da Província Camiliana Brasileira e do Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde, quero agradecer a nossos parceiros que colaboraram financeiramente para este congresso: Província Camiliana Brasileira, a Sociedade Beneficente São Camilo, a União Social Camiliana. E a todos, colaboradores, parceiros, palestrantes e participantes, um muito obrigado. Juntos vamos continuar fazendo história.

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O QUE SE ENTENDE POR CUIDADOS PRIMÁRIOS DE SAÚDE? KÁTIA MACHADO

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S CUIDADOS PRIMÁRIOS DE SAÚDE,

segundo a Declaração de Alma Ata (parágrafo VI), são definidos como cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem fundamentados e socialmente aceitáveis, colocados ao alcance universal de indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação a um custo que a comunidade e o país possam manter em cada fase de seu desenvolvimento, no espírito da autoconfiança e automedicação. Fazem parte integrante tanto do sistema de saúde do país, do qual constituem a função central e o foco principal, quanto do desenvolvimento social e econômico global da comunidade. Representam o primeiro nível de contato dos indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional de saúde, pelo qual os cuidados de saúde são levados o mais proximamente possível aos lugares onde as pessoas vivem e trabalham, e constituem o primeiro elemento de um continuado processo de assistência à saúde. Eles refletem (como está expresso no parágrafo VII) as condições econômicas e as características socioculturais e políticas do país e de suas comunidades, e se baseiam na aplicação dos resultados relevantes da pesquisa social, biomédica e de serviços de saúde e da experiência em saúde pública. Vale lembrar que, como nos explica Jairnilson Paim, professor de Política de Saúde da Universidade Federal da Bahia (ISC/Ufba), em seu artigo “Gestão da Atenção Básica nas Cidades”, a Atenção Primária à Saúde (APS) tem sido reconhecida como espaço tático-operacional de reorientação de sistemas de serviços de saúde mediante a implantação de distritos sanitários e como oportunidade de experimentação de modelos assistenciais alternativos em consonância com as necessidades de saúde e com o perfil epidemiológico da população. No Brasil, a expressão Atenção Primária à Saúde dá lugar à Atenção Básica de Saúde (ABS), para evitar uma concepção de assistência simplificada e de baixo custo. No que tange à organização do SUS, a ABS tem sido entendida como o primeiro nível de atenção e como estratégia de reorientação do sistema de saúde. Isso significa, conforme explica Jairnilson, “que a gestão da atenção básica, ao mesmo tempo que administra esse primeiro nível do sistema de serviços de saúde, deve conduzir a estratégia de reorientação de todo o sistema, buscando uma atuação intersetorial”.


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UNÇÃO DOS ENFERMOS SACRAMENTO OU MAGIA? ANÍSIO BALDESSIN

Para a maioria das pessoas, mesmo aquelas que se dizem católicas praticantes, a não ser o batismo que muitos acreditam servir para livrar a criança de alguma coisa ruim ou azar, os sacramentos não têm tanta importância. Aliás, muitas vezes é visto como se fosse um “diploma”, por exemplo, o do batismo, que é importante para poder, no futuro, casar-se na Igreja. O sacramento da confissão caiu em desuso; a primeira eucaristia, para muitos, serve só para satisfazer a vontade dos pais; a crisma, como não é exigida para o casamento na Igreja, não precisa ser feita; por fim, o sacramento do matrimônio. Cada etapa da vida vai recebendo os sacramentos como se fossem “diplomas”. No entanto, quando a pessoa está quase morrendo, é impressionante como os familiares correm atrás do padre para ministrar o sacramento da Unção dos Enfermos, um “diploma” para estar de bem com Deus e, se não fizer bem, mal não fará. Será que isso é sacramento, sacramental ou magia? SACRAMENTO, SACRAMENTAL E MAGIA Segundo a definição do dicionário Aurélio, no sentido religioso, a palavra Sacramento significa “sinal sagrado instituído por Jesus Cristo para distribuição da salvação divina àqueles que, recebendo-o, fazem uma profissão de fé”. Seguindo esta definição, a Igreja confirma que os sacramentos “são sinais eficazes da graça, instituídos por Cristo e confiados à Igreja, por meio dos quais nos é dispensada a vida divina; produzem fruto naqueles que os recebem com as disposições exigidas”. Em seu livro Os sacramentos da vida e a vida dos sacramentos, o teólogo Leonardo Boff afirma: “o sacramento só é sacramento no horizonte da fé. A fé, que significa encontro vital e acolhida de Deus na vida, exprime seu encontro com Deus através de objetos, gestos, palavras e pessoas. As expressões são os sacramentos. Estes supõem a fé, exprimem a fé e alimentam a fé”.

Sacramental, algo semelhante a sacramento e não confere a graça em si, à maneira dos sacramentos, mas é caminho que conduz a ela, ajudando a santificar as diferentes circunstâncias da vida. Pode ser constituído por ações (bênçãos e rituais) ou objetos (santinhos, medalhas, água benta etc.). Magia, para esta palavra o dicionário dá a seguinte definição: “magia é a arte ou ciência oculta com que se pretende produzir, por meio de certos atos e palavras e por interferência de espíritos, gênios e demônios, efeitos e fenômenos extraordinários, contrários às leis naturais”. Os estudiosos do oculto costumam defini-la de diversas maneiras. No entanto, há um consenso quanto à sua “essência”, pois, em geral, eles a explicam como sendo uma “força” que combinaria a “energia psíquica” com a vontade do mago para provocar as “modificações” desejadas por este. Trocando em miúdos, o mágico conseguiria levantar uma ponta do véu que ainda encobre certos segre-

dos da natureza e, teoricamente, poderia usá-los em seu próprio favor, ou do próximo.

SACRAMENTALISMO E MAGIA Somos uma sociedade “oficialmente” cristã católica. Por essa razão, devemos receber o batismo logo após o nascimento, fazer a primeira comunhão, confessar, crismar. Para os que querem, embora nem sempre acreditem, existe o sacramento do matrimônio. E para os enfermos, diria bem enfermos, de preferência quando não mais conscientes, a Unção dos Enfermos. Alguém pode perguntar: mas isso não é bom? Em princípio, é positivo. Porém, é uma visão sacramentalista em que as pessoas acreditam que os sacramentos agem em virtude do próprio rito realizado. Basta realizar o rito (ungir o doente, por exemplo) que as coisas acontecem milagrosamente. Pode ser comparado a uma semente lançada


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na terra que nasce sozinha sem muitos cuidados. É só lançar, não importa em que tipo de terreno. O mesmo acontece em relação aos sacramentos. Não importa se quem vai recebê-los se dê conta ou não, já que a ação sacramental não depende dos meios humanos. O rito produziria a graça como a aspirina que acalma a dor. Nesse sentido, percebemos claramente que está presente a magia ou uma mentalidade mágica entendida como uma prática individual destinada a adquirir a graça de Deus. Pensamento que ainda é muito atual.

UNÇÃO DOS ENFERMOS A Unção dos Enfermos, simbolismo bíblico e antigo, é rica em significados: “o óleo é sinal de abundância e de alegria, ele purifica (unção antes e depois do banho) e amacia (unção dos atletas e dos lutadores); é sinal de cura, pois ameniza as contusões e as feridas, e faz irradiar beleza, saúde e força”. “Pela sagrada Unção dos Enfermos e pela oração dos presbíteros, a Igreja toda entrega os doentes aos cuidados do Senhor sofredor e glorificado, para que os alivie e salve. Exorta os mesmos a que livremente se associem à paixão e morte de Cristo e contribuam para o bem do povo de Deus” (Catecismo da Igreja Católica nos 1293 e 1499). O rito da Unção dos Enfermos e sua assistência pastoral no 1 diz: “As dores e enfermidades sempre foram consideradas como os maiores problemas que afligem a consciência dos homens. Porém, os que professam a fé cristã, mesmo padecendo e experimentando tais sofrimentos, são ajudados, pela luz da mesma fé, a compreender de modo mais profundo o mistério da dor e a suportá-lo com maior coragem”. O profeta Isaías diz: “O espírito do Senhor está sobre mim, porque o Senhor me ungiu”. Cristo, palavra que significa o Ungido, o escolhido por Deus para uma missão especial, retoma o texto de Isaías para dizer que foi escolhido pelo

Espírito Santo para uma missão. Não se trata de pensar que o óleo seja apenas algo mágico que “fecha o corpo” contra o mal. O óleo transmite a força divina. Portanto, é símbolo de força, resistência e missão. Sinal de vida e esperança, não de morte.

A VISÃO MÁGICA DA UNÇÃO No hospital, embora não seja muito comum, as pessoas pedem o sacramento da Unção dos Enfermos para seu doente. Como sabemos, antigamente, o sacramento era ministrado apenas uma vez. Hoje, caso o doente continue no processo de sofrimento e doença, pode ser repetido. Mas não precisa ser todos os dias como acreditam alguns. Lembro-me de um paciente que, numa sexta-feira quando ainda estava consciente, queria confessar, receber a comunhão e também a unção. No domingo, eu estava fora do hospital e recebi uma solicitação, por parte da enfermagem, para atender o referido paciente. Ao saber de quem se tratava, e por estar ocupado, respondi que passaria num outro momento. No final da tarde, quando fui vê-lo, o paciente estava inconsciente e respirando por aparelhos. Para minha surpresa, fui informado de que outro sacerdote, pela insistência da família, havia passado para ministrar a unção dos enfermos. E a família reclamou por eu, capelão do hospital, não ter ido antes. Uma filha, cuja mãe tinha doença crônica (longa duração), muito grave, e foi parar na unidade de terapia intensiva (UTI), todos os dias deixava na agenda de recados um pedido ao padre para ministrar a unção dos enfermos. No entanto, a paciente também já havia recebido os sacramentos ainda consciente. Diante desses dois casos e tantos outros, fica bastante evidente que, para muitos, quanto mais o doente receber a unção maiores são as possibilidades de ele se recuperar. Infelizmente, ainda reina a

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antiga mentalidade: “se não fizer bem, mal não fará”. A unção adquire um efeito semelhante a um remédio placebo, aquele remédio sem efeitos medicinais que é ministrado muito mais para agradar ao paciente e, às vezes, à família. No entanto, é importante lembrar que sacramento não é magia.

NÃO ÀS CRENDICES Na visita pastoral aos doentes, tanto em casa como no hospital, os agentes vão encontrar muitas pessoas que ainda têm uma visão meio mágica dos sacramentos. Por esta razão, às vezes até contra a vontade do doente, forçam-no a comungar, confessar e principalmente receber a unção dos enfermos. Rituais que as pessoas, livremente, nunca acreditaram e também não quiseram experienciar. Alguns, sem ter uma noção exata dos sacramentos, pedem ao padre a unção com um óleo que não seja “extrema unção”. Outros esperam o doente entrar em estado de inconsciência (quase morto) para pedir a unção. Acrescente-se a isso que alguns agentes da Pastoral da Saúde não sabem separar muito bem uma coisa da outra. Atualmente está havendo uma mistura. É um tal de óleo para isso, óleo para aquilo e tantos rituais, que até as próprias pessoas que praticam uma religião não sabem por onde caminhar. Na verdade, o que existe é uma verdadeira “salada religiosa”, acredita-se em um pouco de tudo. Essas crendices presentes no dia-a-dia dos doentes, e diria até dos agentes de pastoral e visitadores de doentes, acabam tirando o verdadeiro sentido do sacramento. Está na hora de darmos um basta a tantas crenças e crendices. Nunca é demais repetir que não são os sacramentos que nos salvam, e sim a fé e a graça de Deus. Pois os sacramentos, que como vimos acima são sinais, sem a fé daqueles que os recebem nada mais são que um ritual mágico. ANÍSIO BALDESSIN, padre camiliano, é capelão do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.


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A IMPORTÂNCIA DOS PRIMEIROS SOCORROS

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envolvendo a vida humana pode ocorrer em qualquer lugar e a qualquer hora. Segundo o Dr. Renato Poggetti, diretor do Pronto Socorro de Cirurgia do Hospital das Clínicas de São Paulo (SP), o Brasil perde, anualmente, 130 mil pessoas vítimas de traumas, sendo 40 mil em acidentes de trânsito. Outras 300 mil morrem devido a distúrbios cardiovasculares, como infartos ou derrames. Já o número de queimados chega a 200 mil. Aproximadamente 20 mil pessoas são picadas por serpentes, outras 8 mil por escorpiões e 5 mil por aranhas. Como ninguém está livre de algum mal, técnicas de primeiros socorros devem ser conhecidas por todos. “Um leigo em medicina, que sabe o que fazer em uma emergência, pode salvar vidas” – afirma o Dr. Fernando Leitão, instrutor do Curso de Suporte Básico de Vida do Hospital das Clínicas de São Paulo. MA EMERGÊNCIA

Confira, a seguir, alguns exemplos de primeiros socorros:

Antes de tudo 쮿 Fique calmo e chame o socorro. Tenha na carteira ou na memória o telefone desse serviço em sua cidade. Em São Paulo (SP), por exemplo, acione o 193 (Bombeiros) ou 192 (Serviço de Pronto-Socorro e Ambulância). 쮿 Ande constantemente com um cartão identificando seu tipo sangüíneo. Caso você seja vítima de algum acidente, essa informação poderá ser fundamental.

Desmaio 쮿 Seja qual for a razão (infarto, derrame cerebral etc.), adote o procedimento chamado de ver, ouvir e sentir. 쮿 Deite a pessoa de barriga para cima, em posição reta. Se sua língua estiver enrolada, ponha o polegar debaixo de seu queixo. Encoste o ouvido junto à boca e nariz da pessoa, olhando para seus pés. Veja se o tórax se movimenta, ouça o ruído de sua respiração e sinta o ar respirado por ela. Se estiver respirando, fique ao seu lado esperando socorro. Caso contrário... 쮿 Encha seu peito de ar, abra a boca da pessoa e coloque seu lábio em volta do lábio dela. Tape as narinas da vítima e solte, durante dois segundos, o ar de sua boca. Repita a ventilação duas vezes e veja se o tórax da pessoa se expandiu. 쮿 Se não der resultado, inicie a massagem torácica. Ajoelhe-se ao lado da vítima, abra a parte de cima de sua roupa (se for mulher, levante o sutiã) e coloque as mãos (uma sobre a outra) na parte inferior do osso esterno (parte anterior do tórax). Comprima

esse local 15 vezes, pare e faça a ventilação boca a boca duas vezes. Repita a manobra “15 por 2” durante quatro vezes. Se a pessoa não recobrar a respiração, repita a manobra até a chegada do socorro. Se recobrar, pare, mas fique atento para recomeçar caso ela perca novamente a respiração.

Convulsão 쮿 Afaste móveis e objetos pontiagudos de perto da vítima. 쮿 Afrouxe sua gravata e cintos e tire seus óculos. 쮿 Para evitar que a pessoa morda a língua, ponha um lenço limpo entre seus dentes. 쮿 Se possível, deite-a de lado, no chão (se vomitar, ela não se afogará). 쮿 Para evitar que ela enrole a língua, pressione o polegar na parte de baixo do queixo, enquanto durar a crise.

Trauma, acidente ou queda 쮿 Deite a vítima no chão, de costas, em posição neutra (ereta). 쮿 Não mexa em sua coluna e preserve seu pescoço e cabeça na mesma linha do tronco (só mexa nela se, por exemplo, algo estiver pegando fogo por perto). 쮿 Se precisar desobstruir boca e nariz da vítima, congestionados por sangue e vômito, faça-o com a mão envolvida com saco plástico e pano limpo. 쮿 Para verificar se a vítima está respirando, faça a manobra do ver, ouvir e sentir.

Sangramento 쮿 Comprima o membro com uma das mãos envolvida com plástico e pano. 쮿 Só faça torniquete se houver amputação do membro. O coto deverá ser amarrado para evitar hemorragia.

Fratura aparente 쮿 Com a vítima deitada em posição neutra, alinhe o membro em sua posição normal e imobilize o local envolvendo-o em um jornal, revista ou pedaço de madeira, amarrando com um pano.

Queimadura 쮿 Queimadura localizada deve ser exposta à água fria e corrente. Em caso de grande queimadura, em crianças ou adultos, ir logo a um hospital. 쮿 Se a roupa da vítima estiver em chamas, ela não deve correr, mas rolar no chão sobre si mesma e ser coberta por um casaco ou cobertor.

Afogamento 쮿 Deite-a de bruços, com a cabeça virada para o lado, os braços dobrados, para que as mãos fiquem uma sobre a outra, sob o rosto.


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쮿 Para verificar se a vítima está respirando, faça a manobra do ver, ouvir e sentir.

Choque elétrico 쮿 Não se encoste na vítima. 쮿 Se ela permanecer em contato com a fonte de energia, procure desligar a rede elétrica. 쮿 Para verificar se a vítima está respirando, faça a manobra do ver, ouvir e sentir.

Picada de animal 쮿 Não faça torniquete, não corte o local da picada nem chupe. 쮿 Não coloque nenhuma substância no local atingido. 쮿 Em caso de picada de serpente, mantenha a vítima deitada com a parte atingida em posição elevada. 쮿 Em acidente com lagartas, lacraias, abelhas e vespas, use compressas frias sobre o local e transporte a vítima para o hospital mais próximo. 쮿 Em acidente envolvendo escorpiões e aranhas, utilize compressas mornas e também transporte a vítima para atendimento médico. 쮿 Retire anéis, pulseiras ou outros objetos que impeçam a circulação do sangue. 쮿 Se o animal for capturado (vivo ou morto), leve-o para o hospital para que seja utilizado o soro específico.

Ingestão de produtos tóxicos 쮿 Não faça a vítima beber nada. 쮿 No caso de produto químico, não provoque vômito. 쮿 Verifique as orientações do rótulo do produto ingerido e leve-o ao hospital, junto com a vítima, para os médicos terem mais informações.

Engasgamento 쮿 Crianças pequenas (até 1 ano) devem ser colocadas de bruços, estendidas sobre o braço do socorrista, com a cabeça voltada para as mãos. 쮿 Aplicar cinco golpes leves sobre a coluna vertebral, pouco abaixo do pescoço, e virar a criança de cabeça para cima. 쮿 Aplicar outras cinco compressões, em golpes rápidos, sobre o osso esterno. 쮿 Se o corpo estranho não for expelido, encaminhar a criança ao hospital. 쮿 No caso de crianças maiores e adultos, mande-os tossir. 쮿 Apóie uma das mãos entre a parte inferior do osso esterno e o umbigo. Abrace a vítima por trás, com as mãos bem firmes, e faça cinco movimentos rápidos de fora para dentro e de baixo para cima. 쮿 Repita o movimento cinco vezes para o corpo estranho ser expelido. Se a vítima continuar engasgada ou perder a consciência, leve-a rapidamente ao hospital.

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AMAMENTAÇÃO GARANTE MELHOR DESENVOLVIMENTO DOS BEBÊS

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EGUNDO OS PEDIATRAS,

o aleitamento materno exclusivo dos bebês nos primeiros seis meses de vida, sem acréscimo de água, chás ou qualquer outro líquido ou alimento, é essencial para fortalecer as defesas do organismo e garantir um adequado crescimento e desenvolvimento. Nesse período, o leite materno atende todas as necessidades nutricionais da criança. Diante dos benefícios já comprovados, desde a década de 1980, instituições ligadas à área da saúde começaram a incentivar a amamentação no país. As campanhas deram resultado e continuam até hoje – de 12 a 18 de setembro de 2004 realizou-se a Semana Mundial da Amamentação e 1o de outubro é o Dia Nacional de Incentivo à Doação de Leite Humano. O Brasil é modelo para outros países em relação ao aleitamento materno. De acordo com pesquisa realizada em 1986, apenas 3,6% das crianças brasileiras com menos de 4 meses mamavam exclusivamente no peito. Com as ações de incentivo, houve um crescimento de 40% nos índices de aleitamento materno exclusivo no período de 1986 a 1999. O país foi um dos únicos a alcançar esse avanço. “Muitas mães acabam introduzindo água e chá na dieta dos bebês por achar que seu filho está sentindo sede. Fazem isso por não saberem que mais ou menos 80% do leite humano é constituído por água”, explica a pediatra Sônia Salviano, coordenadora da Política Nacional de Aleitamento Materno do Ministério da Saúde. “Se o bebê que mama só no peito sentir sede, ele vai mamar e, com isso, além de matar a sede, vai se beneficiar com todos os nutrientes e as defesas específicas do leite humano, fato que jamais acontecerá se receber apenas água”, acrescenta. Os especialistas recomendam a introdução de outro tipo de comida só quando o bebê já tiver completado seis meses. Ao mesmo tempo que lhe oferecem outros alimentos, o leite materno pode continuar fazendo parte da dieta da criança até os dois anos. As vantagens do aleitamento materno são inúmeras. Nas crianças, evita a ocorrência de diarréia, pneumonia, infecções urinárias, doenças do ouvido, má oclusão dos dentes e muitas outras situações, além de proporcionar elevação no quociente de inteligência. Os benefícios vão até a idade adulta. “O bebê que é amamentado conforme o recomendado terá menos chance de desenvolver doenças comuns da idade adulta, como diabetes, hipertensão, males cardiovasculares e, em mulheres, ajuda no combate à osteoporose”, reforça Sônia Salviano. Já quanto às mães, a amamentação proporciona redução do sangramento após o parto e diminuição da incidência de anemia, câncer de mama e ovário, entre outras vantagens. Além disso, o leite materno é prático e econômico.


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BENEFÍCIOS PARA O BEBÊ 쐍 Melhor desenvolvimento 쐍 Menor incidência de infecções gastrintestinais e respiratórias 쐍 O leite de cada mãe possui anticorpos que protegem o bebê de doenças às quais ela tenha sido exposta 쐍 Proteção contra alergias 쐍 Melhor resposta a vacinas 쐍 Capacidade de combater doenças mais rapidamente 쐍 Menor incidência de morte súbita 쐍 Menos problemas ortodônticos e dentais 쐍 Melhor desenvolvimento psicomotor, emocional e social, associado a um quociente de inteligência mais elevado

BENEFÍCIOS PARA A MÃE 쐍 쐍 쐍 쐍

Redução da hemorragia pós-parto Menor risco de anemia e de câncer mamário e ovariano Menor incidência de depressão pós-parto Recuperação física pós-parto mais rápida

A ingestão de cafeína deve ser controlada para não provocar desconforto na lactante. O fumo diminui a produção de leite e as substâncias tóxicas são passadas para o bebê. A ingestão de álcool deve ser evitada, pois muda o odor do leite materno, levando a sua recusa pelo bebê e a um menor poder de sucção, diminuindo os reflexos fisiológicos da lactação. Para produzir um litro de leite gasta-se 500 calorias.

Amamentação ajuda a evitar nova gravidez Segundo o Ministério da Saúde, o aleitamento materno exclusivo até os seis meses, praticado dia e noite, com intervalos que não ultrapassem quatro horas, protege a mulher de uma nova gravidez nos seis primeiros meses após o parto. A amamentação pode ser usada como contraceptivo com segurança total nos primeiros dois meses e com eficácia de aproximadamente 98% dos dois aos seis meses. Mesmo assim, recomenda-se que as mulheres, logo após o parto, procurem aconselhamento médico ou nos programas de planejamento familiar para adotar o método contraceptivo mais adequado.

Mito do leite fraco não é verdadeiro

Sol ajuda na cicatrização das mamas Não é preciso nenhum preparo especial para amamentar, mas determinados cuidados podem ajudar. Alguns especialistas recomendam, no período pré-natal, fazer uma massagem nos seios com bucha vegetal, para engrossar a pele da região e deixá-la mais resistente. Não se deve lavar as mamas antes da amamentação para não remover os óleos naturais e alterar o odor que o bebê identifica como sendo de sua mãe. Se os mamilos ficarem doloridos e com rachaduras, aplicar uma pequena porção do próprio leite materno sobre eles, após a mamada, deixando as mamas tomarem um pouco de ar e sol, para estimular o processo de cicatrização. Também é mais apropriado usar um sutiã confortável de algodão, não apertado demais, evitando bloquear os ductos lactíferos.

Alimentação variada e líquidos abundantes Durante a amamentação, recomenda-se dieta o mais completa e variada possível. Os líquidos devem ser abundantes. Não há alimentos proibidos, exceto em casos específicos.

Tanto o bebê quanto a mãe precisam estar com roupas confortáveis e em posição adequada para o ato de amamentar. O ambiente também deve ser tranqüilo. É preciso que a criança esteja bem apoiada e com o corpo virado para o da mãe, com a barriga encostada nela. A face do bebê também deve estar próxima da mama, de modo que o queixo possa tocar nela. A criança deve colocar grande parte da aréola na boca para retirar o leite eficientemente e evitar fissuras. A cabeça deve estar alinhada com a coluna, o pescoço não pode ficar virado para um dos lados. Se esses cuidados não forem garantidos, o bebê pode sugar pouco leite sem que isso signifique baixa produção. Os bicos artificiais podem confundir a sucção do bebê. “Os mitos do pouco leite e do leite fraco são comuns, porém, não verdadeiros. O que acontece nesses casos, quando a mãe é saudável, deseja amamentar e não sofreu alterações anatômicas importantes na mama, é amamentação errada”, afirma a pediatra Sônia Salviano. Artigo extraído do jornal Correio Riograndense de 22/09/2004

Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde Fone (11) 3675-0035 e-mail: icaps@camilianos.org.br Av. Pompéia, 1214 A 05022-001 São Paulo, SP

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