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COMUNICAÇÃO E SILÊNCIO MARIA AGNES QUAGLINI “O Homem sábio fica em silêncio até a hora oportuna, mas o falador e o insensato a deixam passar” (Eclo 20,7). Está ainda presente, na retina de nossos olhos, aquele acontecimento incomum de cerca de um ano atrás: a imagem de João Paulo II, que se aproxima da janela de seu apartamento, dias antes de sua morte, e fica ali em silêncio, porque a palavra não lhe brota nos lábios. Uma onda de emoção apodera-se de homens e mulheres de todas as idades, de todas as raças, de diversas denominações religiosas, unidos em uma mesma oração. É o poder e a força do silêncio. Sua extraordinária eloqüência produz uma comunicação muito eficaz e nova capacidade de ouvir. Em um mundo em que somos dominados por ruídos, sons e palavras expressas, documentadas, escritas ou ecoantes pelo ar, torna-se primordial refletir sobre o silêncio. O que é o silêncio? Cada pessoa conhece os valores e também os limites do silêncio. Há um silêncio que une e um que divide; um que angustia e outro que exprime amor; um que levanta suspeita e outro que fundamenta a amizade e a compreensão. Há o silêncio do vazio absoluto e aquele fecundo, que gera a reflexão. E a palavra proferida como que por encanto, volta a refugia-se nele, porque ele lhe confere o sentido do dever cumprido. A palavra é perfeitamente significativa porque evoca o silêncio que a origina e que lhe imprime sempre novas formas. É uma palavra, pensada no silêncio da reflexão e jamais e jamais expressa em toda sua plenitude, porque parte dela permanece sempre dentro de nós. O silêncio carrega consigo uma riqueza de conteúdo que, de outra forma, não se poderia expressar e tem a força da surpresa e da capacidade de maravilhar. Dimensão do comunicar-se O silêncio é uma dimensão importante do comunicar-se, é condição indispensável do saber ouvir; na verdade, quem não cala enquanto o outro fala não está em condições de dialogar. Palavra e silêncio não são termos mutuamente excludentes; são, antes, dois aspectos que formam a linguagem humana. Não existiria palavra se não houvesse o silêncio. Este é bem mais que a falta de sons e ruídos: é a essência de toda a linguagem humana, porque representa sua fonte originária e seu fim último. Ele, efetivamente, remete à presença de Deus. O homem e a mulher capazes de valorizar o silêncio sinalizam o Absoluto; de seu espírito irrompe Deus, de repente, ainda não seja involuntariamente. Porque o silêncio é o lugar do encontro com Deus, isto é, da comunicação plena traduzida em comunhão. A palavra é a mediação; o silêncio, a outra extremidade. Sem palavra não pode haver acesso ao silêncio, mas, sem este, aquela seria apenas uma manifestação que não remeteria a outro mundo. E só mesmo permanecendo no silêncio a palavra provoca resposta, como abertura do coração em busca da insondável profundidade de Deus. Nosso silêncio não pode estar ligado à mudez do nada dizer, mas ao silenciar eloqüente do celebrar, com a abertura, em adoração, ao mestre que fala ao nosso coração. Silêncio: lugar da revelação de Deus O silêncio pode ser vida ou morte, proximidade ou distância, ternura ou rejeição. É o lugar privilegiado da revelação divina, o cenário em que ressoa a palavra, o espaço da escuta profunda. Acolhe verdadeiramente a Palavra só quem se dispõe a ouvi-lo. Os espaços de silêncio possibilitam novo encontro consigo mesmo, com os outros, com Deus: “ pôr-se à


parte” (cf. Mc 6,30). Trata-se de característica da pessoa madura, que procura espaços de silêncio de onde possa sair, depois, para retomar a comunicação. Constitui, por assim dizer, a zona limítrofe para recuperar o sentido e a grandeza da linguagem humana, diante das multiplicações das linguagens técnicas e da informática que hoje invadem o universo. A aprendizagem da arte do silêncio permite-nos reencontrar o silêncio mais profundo das palavras e da comunicação, afim de que possamos ser, com toda nossa vida, uma palavra autêntica e viva que ecoa nas profundezas dos corações.

PRECISAMOS UNS DOS OUTROS: DEFICIÊNCIA E CONDIÇÃO HUMANA CLAUDIANO AVELINO DOS SANTOS Quando tinha 16 anos, senti que minha visão não estava muito boa. De certa distância, não conseguia ler ou distinguir imagens. Não era coisa grave. Mesmo assim, procurei o oftalmologista. O resultado da consulta foi a receita de óculos de menos de um grau para corrigir miopia. Não gostei do resultado. Esperei que me fosse receitado um colírio ou algo assim, ou, no máximo, uns óculos de descanso. Mesmo um pouco chateado, procurei uma óptica, escolhi uma armação preta, que estava na moda naquele tempo, e pus meus óculos. Mirei o espelho e até gostei do que vi. Minha alegria, porém, não durou muito: dona Maria da Hora, minha vizinha, olhou para mim e disse com notável pesar: “Meu filho, você está deficiente das vistas!” O que pesou foi mesmo a palavra “deficiente”. Hoje percebo que ela usou o termo correto. Ela, uma mulher de pouca instrução livresca, mas cumulada daquela sabedoria que o tempo traz as pessoas de boa vontade. Eu estava deficiente dos olhos. Minha visão era deficiente. Eu estava deficiente da visão. Esse fato passado fez-me lembrar que deficiência é carência, falta de alguma coisa, incompletude. E depois me fez perguntar: quem é completo? Quem não é carente? Quem não precisa do outro, quem não precisa de alguém? Assim, de alguma forma, somos todos deficientes. Esse pensamento pode parecer exagerado ou mesmo simplista. No entanto, pensar assim faz que, diante de pessoas com alguma deficiência menos comum, não nos sintamos “superiores” ou “privilegiados”. É verdade, existem algumas deficiências que nos chamam mais a atenção, já que são pouco comuns. Porém, o fato de uma pessoa precisar de mais cuidados que outra não significa que ela seja uma “coitada”. É um ser humano em situação diferente da nossa que exige determinado tipo de cuidado, que exige respeito. O respeito pela pessoa que geralmente chamamos de deficiente – ou seja, aquelas que possuem algum órgão físico em condição diferente da maioria – é fruto de uma atitude de reverência pela vida em todas as sua formas. Mais do que máquinas, precisamos de humanidade Quando falo em respeito, logo vem à mente a pergunta: como devo referir-me a alguém que tem determinada deficiência? A resposta não é simples, pois, por exemplo, muitos consideram ser pejorativo chamar alguém com deficiência física de aleijado ou de cego quem tem deficiência visual. Uma atitude equilibrada é, de um lado, não tentar mascarar a realidade: a pessoa tem certas necessidades, precisa de certo tratamento que deve ser garantido pela família e pela sociedade em geral. Por outro lado, não deve ser desrespeitada por causa de sua situação. Cometemos injustiça quando avaliamos as pessoas apenas pelos critérios técnicos da eficiência. E, no sistema atual de coisas, somos tentados a rotular pessoas. Somos tentados a


rotular como “bons” aqueles que se enquadram nos padrões ditados pela moda ou pelas exigências do mercado. Possuir um corpo malhado ou falar português sem correção, ainda que sejam coisas importantes, não é garantia de sensibilidade humana, de respeito e de solidariedade, valores tão necessários, mas tão descuidados. Pensar nas pessoas com deficiência deve nos chamar a atenção para as coisas mais importantes da vida. A sabedoria popular há muito tempo ns diz que quem vê cara não vê coração. Precisamos educar nosso olhar, nossos gestos, nossas palavras, em busca de relacionamentos que procurem nas pessoas sinais de humanidade, de amor sincero, de solidariedade, de misericórdia. Todos somos deficientes de sensibilidade, de compaixão, de solidariedade, de sinceridade, de beleza profunda, e não buscamos apenas a aparência superficial. Claudiano Avelino dos Santos é Cooperador Paulino

É POSSÍVEL DOAR ATÉ OS OSSOS A doação de órgãos como coração e córneas é bem conhecida pela população. O que muitos não sabem é que outra parte do corpo também pode ajudar milhares de pessoas: os ossos. Afinal, são tecidos vivos. De acordo com a Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos, no primeiro semestre de 2005, foram realizados 444 transplantes de ossos em todo país. Apesar de o número ter aumentado em relação ao mesmo período de 2004 (366 transplantes), poderia ter sido maior. Para se ter uma idéia, no Instituto Nacional de Tráumato-Ortopedia (INTO), ligado ao ministério da Saúde, existem, no Rio de Janeiro, cerca de 700 pessoas (inclusive de outros estados) aguardando por um transplante ósseo. No ano passado, o Instituto teve apenas três doadores. Se considerarmos que cada doação pode beneficiar, me média, 30 pacientes, pelo menos 610 deles ainda permaneceram na fila. O transplante ósseo é uma solução biológica para pacientes que precisam substituir ossos doentes por próteses (principalmente de quadril e joelho) ou que tiveram um tumor retirado e necessitam de reconstrução óssea, pessoas submetidas a cirurgias de coluna (como escoliose ou fratura), recém-nascidos e crianças que têm que realizar cirurgias de articulações e vítimas de armas de fogo de grande calibre com perda óssea. Dessa forma, são úteis tanto ossos completos quanto fragmentados. Os primeiros são importante para lesões tumorais mais estensas e os outros para preencher espaço quando existe uma cavidade. A grande barreira para o aumento das doações é a falta de informação entre médicos e também entre a família dos doadores. “Muitas aquipes de UTI ainda não estão treinadas para explicar o procedimento às famílias e, às vezes, nem solicitam a doação”, conta o Dr. Reynaldo Jesus Garcia Filho, coordenador do Banco de Tecidos do hospital São Paulo, da Unifesp-EPM, em São Paulo. Como esse tipo de doação só pode ser realizado por pessoas que já morreram, uma das maiores preocupações das famílias do doador é a aparência do corpo após a retirada dos ossos. A sua reconstituição, porém, é garantida por lei.


O transplante Os pacientes são transplantados por ordem de solicitação. O ortopedista, que deve ser cadastrado no Sistema Nacional de Transplantes (SNT), é quem entra em contato com os bancos de tecidos e faz a solicitação ao sistema. O hospital onde será realizada a cirurgia também deve ser cadastrado no SNT. Após a confirmação da morte, o doador passa por uma bateria de exames, como coleta de sangue para exclusão de possíveis doenças transmissíveis, e a família responde a um questionário sobre os antigos hábitos, com perguntas íntimas, para garantir total segurança ao receptor. Por causa dos riscos, muitas vezes são aceitos apenas ossos de pacientes que autorizaram o transplante múltiplo de órgãos, já que os exames realizados nesses casos são mais seguros. A retirada deve ser feita até seis horas após a parada cardíaca e dura, aproximadamente, uma hora. Caso não existe problema de incompatibilidade, o paciente que recebe o transplante faz a preparação normal para uma cirurgia ortopédica e, praticamente, não há rejeição. Se no corpo do doador não há nenhuma diferença, no do receptor significa a chance de uma vida melhor. “Em crianças, após um ano de cirurgia, quase não se distingue o osso transplantado”, relata o Dr. Reynaldo. “Há algum tempo, o objetivo de uma cirurgia para a retirada de tumor era simplesmente salvar a vida do paciente e deixá-lo livre de metástases, independente do resultado final. Com o passar do tempo e o avanço das técnicas e dos materiais cirúrgicos, a questão passou a ser preservar o membro e evitar que ele seja amputado”, conta o ortopedista do INTO. Fim das muletas A estudante de psicologia Vanessa Vianna de Oliveira precisou colocar uma prótese no fêmur, em 1999, devido a um osteossarcoma, tipo de câncer nos ossos que ocorre principalmente em adolescentes e adultos jovens. Ela teve complicações com a prótese e quebrou o fêmur. Sua alternativa foi o transplante, que demorou quase três anos. “A espera foi longa e ruim. Além da dor na perna, eu sentia muita dor nos pulsos, por causa das muletas, e minhas mãos ficavam cheias de feridas. Tudo era difícil: pegar um livro na biblioteca, fazer estágio...Eu ficava sempre sentada”, conta Vanessa. Após a cirurgia, realizada em novembro de 2005, passou uma semana no hospital, sem coloca o pé no chão. Para se recuperar melhor, fez fisioterapia. Conseguiu dobrar o joelho em dois meses e, hoje, já anda sem as muletas e faz hidroterapia. “O transplante mudou minha vida até nas pequenas coisas. Agora fica mais fácil ir para a faculdade, carregar livros e subir escada”

Como ser doador Não é preciso deixar registro formal em vida, apenas expressar a vontade para a família. No total, existem seis bancos de ossos no Brasil, cada um com lista de espera própria:  Instituto Nacional de Tráumato-Ortopedia (Rio de Janeiro)  Hospital das Clínicas (Curitiba – PR)  Hospital das Clínicas (São Paulo)  Hospital Universitário de Marília (Marília – SP)  Associação Hospitalar São Vicente de Paulo (Passo Fundo – RS)  Santa Casa de Misericórdia (São Paulo – SP)


Mais informações sobre médicos e www.saude.gov.br/transplantes. Tel. 0800-61-1997

hospitais

cadastrados,

no

site:

LINDSEY CRITTENDEN Há cerca de cinco anos, comecei a rezar. Não sei em que acreditava, nem sequer se acreditava. Mas, numa manhã de domingo, num momento de ansiedade e confusão, fui à paróquia de meu bairro, em Berkeley, na Califórnia. Fui atraída tanto pelo canteiro de flores quanto pelo fato de que fora batizado ainda bebê na Igreja Episcopal. A igreja, pensei, não podia me fazer mal. E, como dizia minha mãe, lá eu poderia conhecer gente boa. Sentei-me no fundo e acompanhei a leitora do livro das orações, meu ceticismo sensível a todos os motivos para pensar: isso não é para mim. Mas então algo no sermão – algo sobre ser aberto, sobre intimidade – ultrapassou minha mente crítica e me chegou ao coração. Chorei. Na semana seguinte, e na outra, voltei lá. E, quando uma religiosa chamada Pamela me convidou para uma conversa, aceitei, mesmo que perguntando sobre o que poderíamos falar. Sobre muitos assuntos, afinal. Ambas éramos escritoras, e ambas tínhamos perdido um irmão. Ela me fez sentir que era natural ter dúvidas. “Deus nos encontra quando estamos no fim das forças”, disse-me. Depois me perguntou se eu já tentara rezar. Fiquei constrangida. Só conhecia o pai-nosso e a oração que eu recitava ajoelhada ao lado da cama, de pijama, as mãos postas: “Agora me deito para dormir...” Pamela sugeriu que eu já estava rezando – ao pedir ajuda, ao ser sincera. Meus olhos se encheram de lágrimas, de novo. Via que ela sabia do que falava, e eu queria mais. Pamela me ensinou duas orações singelas: “Ó Deus, estás aqui. Ó Deus estou aqui” e a “Oração a Jesus”. Passei a pronunciá-las de manhã, na cama, e a sussurá-las na ginástica, no carro ou no mercado, quando minha ansiedade aumentava. E comecei a perceber que as palavras não eram tão importantes quanto o ato de dizê-las, como se desse vazão ao que tinha sido guardado por tempo demais dentro de mim, supurando e me afligindo. Ajude-me. Estou sofrendo. Por favor. Às vezes me sentia constrangida, como se estivesse pedindo o prêmio de uma loteria emocional. No entanto, pouco depois de rezar, tinha uma sensação de expansividade, um afrouxar de nós apertados. Nos momentos em que costumava me preocupar com o compromisso do dia seguinte ou rever a discussão da véspera, comecei a permanecer no presente. Comecei a me sentir menos só. Uma mulher na igreja me mostrou o rosário anglicano, e fiz um de contas azul-cobalto com uma cruz simples de prata. Passei a levá-lo no bolso quando queria um talismã, uma pedra de toque. À medida que se tornou um hábito, a oração se desmitificou – e tornou a se mitificar . Comecei a notar a beleza reconfortante de um botão de flor ou do sorriso de um estranho. Comecei a confiar numa presença maior do que eu, uma presença que me encontrara nas profundezas do meu ser e me conduzira para o mundo. Eu sabia que o divino era essa presença e que a oração a reconhecia e celebrava. Obrigada, acrescentei ao meu repertório. Há dois anos, minha mãe recebeu um diagnóstico de câncer no pulmão. A metástase atingiu o fígado, os gânglios linfáticos, os ossos e – conforme me disse o oncologista pelo


telefone – o cérebro. Depois de desligar, gritei: “Não ouse fazer isso com ela!” Eu estava sozinha na cozinha, mas sabia com quem falava. Antigamente, eu teria considerado essa reação imprópria para uma oração. Entretanto, a oração e eu já ultrapassamos a polidez cuidadosa de um primeiro encontro. Não preciso mais ter um comportamento exemplar. Posso ser vista descabelada, de mau humor, com raiva e medo, e saber que não vou afugentar ninguém. A oração não impediu que minha mãe morresse, mas me deu forças para ficar com ela durante a quimioterapia e as internações, quando a visitava todas as noites para conversar e lhe massagear os pés. Às vezes falhava, como no dia em que murmurei “O Senhor é meu pastor”, o salmo 23, e ela abriu um pouco os olhos. “Por que está dizendo isso?”, perguntou, franzindo a testa, como que para me lembrar de que ainda estava viva. E às vezes me ajudava muito, como quando, no fim, fiquei de mãos dadas com ela e senti seu amor e sua força passarem para mim. A oração não tem satisfeito todos os meus desejos. Continuo a pedir soluções rápidas (um trabalho ideal, um namorado gentil e espirituoso, um vaga no estacionamento), mas não finjo que é por isso que rezo. Hoje, ao rezar, ouço vozes e tenho visões que alguns poderiam considerar divinas. E, seja qual for a imagem – a recordação do sorriso de minha mãe ou uma cena da Paixão de Cristo -, sei que é um presente, irredutível em sua mensagem. Quando eu era criança, meu gato costumava ficar enroscado em meu pescoço, como uma estola, enquanto eu lia ou coloria – uma presença palpável de que eu às vezes me esquecia, até que ele fosse embora. Quer eu reze durante meia hora quer durante uma fração de segundo, uma constância como a daquele gato permanece comigo o dia todo. Traz-me consolo e calor. Está sempre a postos. Essa presença nunca me deixa.

A BÍBLIA E O BISTURI JOSÉ FERNANDES DE OLIVEIRA Creio na bíblia e creio no bisturi. Há milagres nas igrejas, mas também os há nos hospitais. Sou padre católico, mas afirmo que há mais curas e ressurreições numa UTI do que em um templo repleto de milagres. É que o milagre dos médicos é bem menos divulgado. Aposto na oração dos santos da terra, mas aposto também na mãos dos médicos que estudaram mais tempo do que a maioria dos pregadores. Com eles os enfermeiros. Deus está naquelas salas de cirurgia, tanto quanto está nos templos, onde fiéis afirmam ter voltado a enxergar ou largado as muletas. Quanto a cirurgias que não deu certo, são quase tantas quanto os milagres que também não deram certo. Não se fala do milagre que não se verificou. O certo é que medicina sem humildade é caminho para o desastre. Médicos precisam ouvi rum ao outro. Nenhum doutor pode parar de ser aluno. Diga-se o mesmo dos pregadores de religião. Endeusá-los é um desvio. Pregadores são humanos, tão frágeis e quebradiços quanto as almas que ajudam a salvar. Era disso que Paulo falava aos Hebreus quando lembrava as fraquezas dos sacerdotes (Hb 2,17-19). Era a isso que Jesus se referia ao dizer aos apóstolos que deveriam orar para não resvalar na tentação. (Mt 26,41). Nesses tempos de púlpito que “vai lá” e de intensa invasão de pregadores que, poderosamente, por sobre os telhados visitam os fiéis dos outros e os chamam para o milagre nos seus templos, nunca é demais lembrar aos fiéis que pregador de televisão ou de rádio vai mais longe, mas nem por isso Deus cura mais por eles do que pelas mãos dos médicos. A


quem os pregadores procuram quando ficam enfermos? Apostam nos milagres dos seus templos ou aceitam os dos hospitais? Que o milagre existe não há como negar. Igreja que o negasse estaria negando o poder de Deus. Mas agir como se Deus só os operasse nos templos é negar a prodigalidade do Senhor. O mesmo Deus que age pela boca de um pregador, ou de um povo em prece, também age pelas mãos de bons médicos e bons enfermeiros. Divulguemos um pouco mais as curas acontecidas nos hospitais e talvez as pessoas acreditem um pouco mais nas curas operadas nos templos. Cobra-se muito dos médicos e bem pouco dos pegadores. Fala-se em erro médico quando a operação não dá certo. Se o milagre não surte efeito, raramente erro. Não é justo! José Fernandes de Oliveira (padre Zezinho), membro da Ordem dos padres do Sagrado Coração de Jesus é compositor, cantor e escritor.


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