Informativo do Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde e Bioética agosto de 2007 Ano XXV – no 255 Província Camiliana Brasileira
❒ Pastoral
D
❒ bioética
❒ humanização
Para os agentes de pastoral da saúde que atuam ar de comer a quem tem fome, dar de beber a diretamente na dimensão solidária, ou seja, visi quem tem sede, vestir os nus, dar abrigo aos tando os enfermos em casa ou nos hospitais, sem peregrinos, visitar os doentes e os encarcerados, negar a importância das outras obras, visitar os libertar os escravizados, sepultar os mortos, dar doentes é a obra de misericórdia que mais chama a bom conselho, ensinar os que não sabem, corrigir atenção. Afinal, o mandato de cuidar dos doentes é os que erram, consolar os aflitos, perdoar as ofen repetido por Jesus várias vezes nos evangelhos. sas, suportar as fraquezas do próximo e orar pelos Seguindo esse mandato, são muitos os agentes vivos e pelos defuntos. Essas atividades eram reco que, sem medir esforços, nhecidas como obras de realizam essa pastoral misericórdia. da saúde encarnada, ou No antigo Catecismo seja, vão ao encontro da aprendíamos os manda pessoa doente e a encon mentos, as virtudes teo ANÍSIO BALDESSIN tram na situação em que logais (fé, esperança e está: triste, desanima caridade) e cardeais (pru da, revoltada, cheirando dência, fortaleza, tempe mal etc., e não na situação em rança e justiça), os vícios capitais que o padre, o visitador e/ou o (soberba, avareza, luxúria, ira, gu ministro da Eucaristia, gostaria la, inveja e preguiça), pecados que que ela estivesse. Ao desenvol bradam aos céus, e as obras de ver essa ação pastoral encarna misericórdia. Na catequese reno da, estão prontos a oferecer não vada, se falamos de obras de mise aquilo que é importante para si, ricórdia, alguém pode nos pergun afinal, a ajuda deve ser sempre tar: O que é isso? para o outro, mas sim atender Nunca se falou tanto das obras às necessidades do doente, que de misericórdia como hoje em nem sempre são espirituais. dia, só que com termos diferen Visitar, doutrinar ou sacra tes. Hoje falamos de cidadania, mentar? solidariedade, direitos humanos, Segundo a definição do Dicio marginalização, menores de rua, nário Aurélio, visita “é o ato de ir moradores de rua, sem terra etc. ver alguém por cortesia, dever ou As obras de misericórdia apa afeição; doutrina é um conjunto recem nos evangelhos (Mt 25,31de princípios que servem de base 46), mas pode-se dizer que nas a um sistema religioso, filosófico cem do direito natural de toda ou científico; doutrinar é instruir pessoa. Não é assistencialismo ou numa doutrina, pronunciar ou es coisa parecida. Trata-se da verda crever doutrinas e ensinamentos; sacramentar deira cidadania, pois ensinam o caminho da é administrar sacramentos, sobretudo da con solidariedade e ajudam a construir a pessoa e fissão e comunhão, dar unção dos enfermos, uma nova sociedade baseada na justiça e na fra sagrar e consagrar a hóstia, ou ainda imprimir ternidade. É uma forma alternativa de combater caráter sagrado a, tornar sagrado”. a violência, a exclusão e a marginalização. No Evangelho de Mateus, a expressão de As obras de misericórdia não são programas Jesus é bastante clara: “estive enfermo e me para quem quer ajudar os outros, mas apontam visitaste” (cf. Mt 25,36). Note bem que Ele caminhos que educam em todos os níveis, prin disse “me visitaste”. Mas os católicos tradi cipalmente no da sensibilização. Elas despertam cionais, bem como a maioria dos agentes da nossa sensibilidade para a percepção de que se pastoral da saúde, têm uma grande preocu remos felizes quando os outros também o forem.
VISITAR OU DOUTRINAR OS ENFERMOS?
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pação: a de que os doentes recebam os sacramen tos. Essa atitude é justa. Porém, o fato de Jesus dizer “estive enfermo e me visitaste” nos faz refletir. Será que Jesus dava mais importância à visita do que à doutrina ou aos sacramentos? As palavras de Paulo na primeira carta aos Corín tios (1,14-17) nos alertam: “Agradeço a Deus o fato de eu não ter batizado nenhum de vocês, a não ser Crispo e Caio. Portanto, ninguém pode dizer que foi batizado em meu nome. Ah! Sim. Batizei também a família de Estéfanas. Além deles, não me lembro de ter batizado nenhum outro de vocês. De fato, Cristo não me enviou para batizar, mas para anunciar o Evangelho, sem recorrer à sabedoria da linguagem, a fim de que não se torne inútil a cruz de Cristo”. Muita gente confunde visitação com doutrinação e evangelização com conversão. Para isso, recorre aos versículos bíblicos de forma fundamentalista, ignorando muitas vezes a própria situação do doen te. Não é raro, por exemplo, a família se apressar em pedir os sacramentos para quem está doente. “Ah! padre, será que é possível levar a comunhão para meu esposo, esposa, pai, mãe, irmão... todos os dias”? Nessas circunstâncias fico me perguntan do: Em sua comunidade, essa pessoa recebia o sa cramento com tanta frequência? Qual a razão de comungar tantas vezes quando se encontra hospita lizada? Será que tudo isso é fé?
Segundo Leonard Martin “existem certas confu sões entre o significado que damos à palavra evan gelização, que, não raras vezes, confundimos com doutrinação. Evangelizar é levar Cristo à pessoa a ser evangelizada. Essa evangelização pode ser feita pela presença amorosa, pelos serviços prestados, pela pa lavra, pela oração e obviamente pela celebração dos sacramentos. Doutrinação, por sua vez, é transmitir determinadas verdades, de que já temos posse, prin cipalmente ao paciente que está debilitado e fatiga do pelo seu sofrimento físico e emocional”. Por isso, o agente de pastoral poderá desempe nhar um papel muito importante ao visitar o doente, se souber ser sensível à complexidade da situação e tratá-lo não simplesmente como objeto de sua soli citude, mas como pessoa capaz de ser sujeito da sua doença, do seu tratamento, do seu viver e do seu morrer. Caso contrário, daremos tanta importância à doutrina que esqueceremos a pessoa. Porém não podemos esquecer que Jesus disse: “estive enfermo e me visitaste” (cf. Mt 25,36) e não “estive enfermo e me doutrinaste”.
Anísio Baldessin, padre camiliano,
é capelão do Hospital das Clínicas
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
COMO ORGANIZAR A PASTORAL DA SAÚDE
Este é o título do “novo” livro do Pe. Anísio Baldessin. A obra, revisada e remodelada, tem como objetivo contribuir para a reflexão e a animação das equipes da Pastoral da Saúde e de seus milhares de agentes, capelães, assistentes religiosos hospitalares e domiciliares, visitadores de doentes, ministros da Eucaristia, bem como os que procuram educar para a saúde fazendo com que as pessoas não fiquem doentes. O autor apresenta dicas e práticas importantes que auxiliarão, numa perspectiva camiliana (São Camilo), a organização da pastoral da saúde nas dimensões solidária, comunitária e político-institucional, em dioceses paróquias e hospitais, ou seja, oferece elementos teórico-práticos para uma boa atuação. Afinal, como disse Kurt Lewin: “Nada pode ser tão prático como uma boa teoria”.
expediente
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O Boletim ICAPS é uma publicação do Instituto Camiliano de Pastoral da Saúdee Bioética – Província Camiliana Brasileira. Presidente: José Maria dos Santos
Conselheiros: Antônio Mendes Freitas, Leocir Pessini, Olacir Geraldo Agnolin, Niversindo Antônio Cherubin Diretor-Responsável: Anísio Baldessin Secretária: Cláudia Santana
Revisão:
Joseli N. Brito e Rita Lopes
Redação: Rua Barão do Bananal, 1.125 Tel. (11) 3862-7286 ramal 3 05024-000 São Paulo, SP e-mail: icaps@camilianos.org.br Periodicidade: Mensal Prod. gráfica: Edições Loyola Tel. (11) 6914-1922 Tiragem: 3.500 exemplares
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RELIGIÃO DEMAIS JOSÉ FERNANDES DE OLIVEIRA
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ra religião demais, por isso falsa. Por causa dela, em 1978, morreram 914 pessoas em Jonestown, nas Guianas. Acre ditavam demais em Jim Jones e, por conseguinte, na morte; de menos nos evangelhos, por tanto, na vida. Se tivessem lido com atenção os evangelhos, não teriam dado ouvidos ao nada re verendo Jim Jones. Ele ensinava religião demais. Por causa disso, também mor reram os fiéis do falso Jesus Cris to do Texas e os 48 seguidores da seita Ordem do Templo, liderada por outro fanático, o médico bel ga Luc Jouret. Fiéis demais. Um fanático brinca de porta-voz de Deus ou de Jesus, às vezes con sidera-se o próprio Cristo reen carnado, e há sempre alguém que acredita. Crer com fanatismo é o mesmo que não crer direito, porque toda histeria religiosa esconde a morte em vez da ressurreição. Essa gen
te dá mais importância à morte do que à vida. É negação demais e oração de menos. Religião em dose certa é um santo remédio; em dose demasia da, aliena, enlouquece e envene na. Tudo o que é exagero faz mal: frio, calor, bebida, sal, açúcar, ginástica, trabalho, barulho, críti ca, conselhos, palavras. Tudo isso fere. Religião também. Demais ou de menos, ela está mais perto do inferno do que do céu. Não são poucas as pessoas que se perdem na religião, quando pen sam que se encontraram. Foi re médio demais para elas. Desequi librou. Agem como leões ou como cordeirinhos. Querem mudar tudo e todos e não se importam com mais nada, porque tudo vira milagre ou vontade de Deus. Na maioria das vezes, não passa da vontadede um pregador fanático. Cuidado com pregadores que absolutizam tudo aos berros. Cui dado com quem grita que “está
na Bíblia”. Pode até estar, mas não desse jeito. Na Bíblia, tam bém está escrito: “Se teu olho direito te escandaliza, arranca-o” (Mt 5,29). O escravo da Bíblia ao pé da letra conclui que, se pecar com o olho esquerdo, não precisa arrancá-lo, porque Jesus só falou no direito; ou vai e fura seu olho pecador em nome de Jesus. O último a querer que sejamos fanáticos é Jesus. Ele não veio trazer a morte ao pecador, mas a conversão e a vida. Pegue uma frase da Bíblia fora de seu con texto e você virará um fanático doentio, desses que pensam que só eles entendem as coisas. Pe gue a Bíblia como um todo e você terá uma religião serena, cheia de ternura. Cuidado com religião demais. É perigoso! Já vimos este filme. É muito perigoso! Padre Zezinho, SCJ,
é escritor, compositor e intérprete de músicas religiosas
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INFLUÊNCIA DA MÚSICA NA SAÚDE ELISETH RIBEIRO LEÃO
que, além da música, a forma como ela é levada para as ins tituições de saúde, ou seja, no relacionamento interpessoal, é um fator relevante nos resulta dos observados.
A música sempre acompanhou o homem ao lon go de sua história. Em um dado momento, passou a ser inserida sistematicamente na área da saú de, na qual surgiu a musicotera pia, abordada na arteterapia ora como disciplina independente, ora como recurso complementar utilizado por diversos profissio nais. Aqui será aprofundada pela Dra. Eliseth Ribeiro Leão. Revista Nursing – Comente sobre os trabalhos que a senhora vem de senvolvendo referentes à influência da música na saúde. Como surgiu o interesse por essa área?
Eliseth Ribeiro Leão – Sempre gostei de música, mas meu in teresse por ela na enfermagem teve início em 1996, quando atuava ao lado de pacientes com dores crônicas. Muitas dessas dores eram refratárias aos tra tamentos propostos, e eu bus cava uma intervenção de enfer magem que pudesse contribuir para o alívio da dor, como me dida adjuvante ao tratamento farmacológico, ou pelo menos que possibilitasse melhor quali dade de vida aos pacientes.
Durante três anos fui responsá vel pelo projeto “Que tal uma música na sua vida”, dos Programas Educativos em Dor Crô nica, no Instituto de Or topedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da FMUSP, conduzido por diver sos profissionais de saúde es pecializados nessa área. Com a música, os pacientes podiam deslocar sua percepção da dor crônica e viver uma experiência mais prazerosa e com possibili dades de resgatar o saudável em sua vida.
Nursing – A senhora também deu início ao projeto “Uma canção no cuidar”. Como foi essa experiência?
Eliseth – Depois do mestrado e doutorado na Escola de Enfer magem da USP, nos quais foi ve rificada a efetividade da medida no controle da dor, em 2003 iniciei o projeto “Uma canção no cuidar”, no Hospital Samari tano, com mais três enfermeiras musicistas e um músico. Esse grupo passou a levar música se manalmente aos pacientes adul tos internados, o que possibili tou a continuidade da pesquisa voltada, então, à influência da música sobre os estados de âni mo dos pacientes, acompanhan tes e funcionários do hospital. Iniciei também a investigação no ambiente domiciliar pós-alta, mediante a utilização de um CD patrocinado pelo hospital para distribuição gratuita aos pacien tes. Havia uma solicitação mui to grande por parte deles nesse sentido. Com isso ficou claro
Nursing – Como é realizado esse tra balho de saúde entre os músicos?
Eliseth – Em 2005, surgiu a opor tunidade do pós-doutorado na Universidade Marc Bloch. Pude investigar a comunicação nãoverbal mediada pela música entre os músicos que recebem formação específica de um ano naquela instituição e os idosos institucionalizados na França e em Portugal. Esse trabalho re sultou na produção de um vídeo didático em francês (com uma versão de áudio em português) para ser utilizado no curso de formação de músicos na França, bem como para suscitar a refle xão dos profissionais de saúde sobre essa temática em nosso meio. Em 2007, ampliamos o projeto para cuidar de quem cui da no Hospital Samaritano por meio de Oficinas Musicais. Vou coordenar um grupo de enfer meiras que vão atuar na pedia tria. Participei do projeto musi cal do Instituto Zero a Seis, que tem como missão produzir e dis seminar conhecimento científico relacionado à primeira infância – do período gestacional aos seis anos – como instrumento de pro moção da Cultura de Paz. Como podemos ver, demanda e traba lho é o que não faltam!
Nursing – Quais as dificuldades e facilidades para o enfermeiro atuar nessa nova área?
Eliseth – Quando há o desejo não há dificuldades, mas sim desa fios. O primeiro deles é o apro fundamento nos estudos sobre o tema. Há a necessidade do co nhecimento, pois se trata de uma intervenção de enfermagem vol tada à saúde e não um entreteni mento musical. Como é uma ati vidade realizada em paralelo ao
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exercício profissional e em cará ter voluntário, requer disponibili dade de tempo e energia. Como facilitador, podemos citar a aber tura das instituições de saúde a essa abordagem, sob a égide da humanização, o que favorece a implantação de projetos. Nursing – A música pode ser utili zada como recurso complementar no tratamento de dores crônicas? De que maneira? Eliseth – Sim, pois ela atua na percepção do fenômeno doloro so, pode produzir relaxamento, liberação de endorfinas (nossos analgésicos naturais), além de proporcionar uma experiência estética e simbólica, rica em imagens mentais. Nursing _ Como a música pode ser implantada nos hospitais? Quem seria o responsável por dis seminá-la nesse meio? Eliseth – A música pode ser im plantada nos hospitais median te a estruturação de projetos com objetivos bem definidos, que podem ser conduzidos por profissionais da saúde como en fermeiros, médicos, psicólogos, musicoterapeutas, fisioterapeu tas ou músicos, desde que te nham conhecimento de como a música atua na saúde humana: seus benefícios, suas possibilida des, suas limitações. Isso no que tange à musica. Por outro lado, se entendermos a saúde como um bem socialmente comparti lhado, todos os cidadãos podem colaborar com o universo sono ro, por exemplo, com a redução dos ruídos (tão prejudiciais) nas instituições ou fora delas. Nursing – Há hospitais no Brasil que já inseriram a música no pro cesso do cuidar dos pacientes?
Eliseth – Sim. Na enfermagem, o Hospital Samaritano é o pioneiro. As enfermeiras das unidades pres crevem, na SAE (Sistematização da Assistência de Enfermagem),a música como cuidado. Os traba lhos de pós-graduação realizados por enfermeiros da instituição têm fornecido suporte teórico para es sa prática, e os enfermeiros mu sicistas são chamados pelos cole gas para avaliações específicas e
orientações quando necessário. Cada vez mais cursos de gradu ação e eventos científicos da en fermagem têm solicitado pales tras sobre essa experiência. Em diversas regiões do país, outras instituições contam com profis sionais médicos que têm utilizado a música calma durante a realiza ção de partos. Muitos musicotera peutas têm atuado na assistência às crianças autistas e em diversas outras situações clínicas.
Nursing – Como está o mercado de trabalho para o profissional de enfermagem que quer se especiali zar na área da música na saúde?
Eliseth – Não se trata, propria mente, de mercado de trabalho. A música na enfermagem é so mente mais um tipo de inter venção prevista na NIC (Nursing Intervention Classification) e é utilizada desde Florence Nightin gale. É um recurso a mais entre tantos outros que compõem nos so arsenal de intervenções. Por ter ação integrativa, facilita o cuidado bio-psico-socio-espiritual proposto pela enfermagem, as sim como a interação profissio nal-paciente. Quanto à especiali zação, não existe ainda formação específica na nossa área. Existem cursos de pós-graduação lato sensu em Musicoterapia que os enfermeiros podem fazer. Acre dito que, como o interesse dos enfermeiros tem sido crescente sobre o tema, futuramente deve remos ter, ao menos, alguma dis ciplina na pós-graduação stricto sensu, para favorecer a troca de idéias e discussão no âmbito da nossa profissão.
Nursing – Fale um pouco sobre a experiência mais marcante que a senhora obteve nesta área.
Eliseth – Cada experiência é sempre única. Mas gosto muito de me lembrar de uma intervenção que fizemos no quarto de um senhor acompanhado de sua es posa, dois idosos. Ele acamado, respiração bastante ofegante, com nebulização contínua e tudo o mais. Cantamos “Carinhoso”, e então ele nos perguntou se sabía mos cantar “Fascinação”. Quando começamos a cantar, sua esposa
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começou a chorar copiosamente. Trocamos olhares e continuamos com a canção. Ao término, ela nos contou que há muito tempo ele tinha escrito a letra dessa mú sica e ofertado a ela. Então, em um momento sublime, ele olhou para ela, que lhe segurava a mão, e disse: “Vamos relembrar? Dême um beijo...”. A enfermeira da unidade retirou a máscara, visivelmente emocionada. E eles trocaram um lindo beijo na boca, tendo todos nós como testemu nhas daquele amor que resistiu ao tempo. Coisa de dois, três dias depois ele faleceu. E como a morte é uma boa conselheira da reflexão, conseguimos com preender um pouco mais a abran gência deste trabalho. Pergunta mo-nos se tudo aquilo a que assistimos teria acontecido sem a presença da música (pelo me nos daquela forma) e ficamos muito gratos por ter participado de um momento tão especial no final da vida daquele ser. São experiências fortes e lindas, que muito nos têm ensinado.
Nursing – Como enfermeira e estu diosa das influências que a música tem na saúde, qual mensagem a senhora deixaria para aqueles que querem atuar nesta área?
Eliseth – Que responsabilidade, não? Bom, eu diria que a música é essencial à nossa vida e constitui um caminho possível no cuidado da saúde. É um recurso comple mentar que merece ser explorado pela enfermagem. É um recur so que nos auxilia, em primeira instância, a ouvir o outro, assim como a respeitar o silêncio (tão ne cessário), e isso faz toda diferença na forma como cuidamos. E, para tanto, conhecimento e amor são imprescindíveis, bons parceiros, já que conhecimento sem amor é arrogância e amor sem conhe cimento é sentimentalismo. Sim plesmente, não desistam! Dra. Eliseth Ribeiro Leão é doutora em enfermagem pela FEUSP, com
pós-doutorado pela Universidade March Bloch (França). Artigo
extraído da Revista Nursing – edição brasileira – jan./2007
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DA DIÁLISE A UM NOVO RIM. ENFERMIDADE E VIDA EM PLENITUDE MARÍA PILAR MARTÍNEZ BARCA
Desde recém-nascidos até pes soas adultas, em qualquer um pode surgir uma insuficiência, que se origina de malformação congê nita, de complicação em uma ci rurgia, de hipertensão arterial, de problemas da diabete, de cálculos e tumores... A diálise se torna imprescindí vel quando nossos rins já não fil tram as impurezas por meio da uri na. Pode ser na forma peritoneal, mediante um cateter ou tubo flexí vel no peritônio — membrana que reveste o abdômen —, ou de he modiálise, sem dúvida mais habi tual, por meio do sangue. Trata-se de limpar o organismo de substân cias nocivas e eliminar os líquidos que sobram. Conectar-se três vezes por se mana ao rim artificial, de duas a quatro horas por sessão, acarreta uma série de transtornos físicos, psicológicos e sociais. O apoio de uma associação é indispensável nesta doença: atenção à pessoa e à família, informação sobre trata mento e alimentação, grupos de auto-ajuda, atividades de lazer... ALCER Ebro e ALCER Madri (ALCER, Associação para a luta contra as enfermidades do rim),
bem como a Fundación Jiménez Díaz, serviram de ponte para os testemunhos seguintes. Calvário cotidiano
“É importante que os médicos sejam humanos, próximos. Porque a pessoa vai a um hospital três ve zes por semana e, além disso, vão lhe causar danos”, são palavras de Irene, que, por 18 anos, com partilhou a longa doença de seu filho Javier. Felizmente com um rim trans plantado em 1977, Pilar recorda sua difícil experiência: “O trans plante foi feito na França. Numa visita médica e após alguns exames descobriram que meus rins não ha viam se desenvolvido corretamen te. Foi como um raio que caiu em minha cabeça, pois ia me casar, ti nha 23 anos. Após 3 meses comecei a fazer diálise e passava muito mal, não suportava o tratamento, ema greci muito— 42 quilos para 1,60 m de altura. Fiquei dezesseis meses à espera de um rim”. “Nunca se chega a acostumarse” — afirma Seve. “Além disso, as agulhas roçam a parede da veia e provocam dor. E você tem de di zer à enfermeira que as posicione
melhor.” Seve realizou a diálise, antes do transplante, em sua casa, com mais tranqüilidade, mesmo que com certos riscos — chegou a acabar a água ou a luz no meio de algumas sessões. Antonio, que padece de uma afecção hereditária — assim como seu pai e seu irmão —, estava tra balhando numa empresa metalúr gica pouco antes de começar a diá lise. Hoje cobra uma pensão por incapacidade, que pode diminuir ou ser cancelada se se submeter ao transplante. Procuremos levar uma dieta po bre em sal, potássio e fósforo, ele mentos que podem produzir, ao não ser eliminados dos rins, algumas mudanças físicas: cansaço, irritabi lidade, inapetência sexual, náuseas, vômitos, cãibras na perna etc. Para Lolita, em quem detecta ram a poliquistosis renal, “a entra da em diálise foi um choque muito forte devido ao desconhecimento, e desde então minha vida mudou radicalmente. Foram anos difíceis, porque perdi parte de minha liber dade para depender de uma má quina. Além disso, tinha três filhos pequenos e um marido, não podia ficar parada”. Lista de esperança
“A média é um ano e meio. Po dem chamar a qualquer momen to com a grande notícia: há um rim para você”, dizia Ana, que se submeteu ao transplante há dois anos. Seus últimos anos de carrei ra — filosofia e letras — teve de conciliá-los com a diálise. “Cha maram-me uma noite, fizeram os exames necessários e em seguida fui operada. Acordei numa grande sala de máquinas. É surpreenden te voltar a urinar. Esse fato mudou minha vida.” E Lolita relata: “Quando com pletou um ano de diálise me sub meti ao transplante. Foi imensa a alegria e grande a esperança, como é para milhares de doentes. Recuperei parte de minha autono
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mia, mesmo ainda doente, com outras complicações provocadas pelo próprio transplante. Mas este foi meu caso, meu irmão de rim continua muito bem”. Continua esperando um segundo rim há dez anos, nem sempre em lista de espera: “Um transplante ofere ce uma segunda oportunidade”. Antonio corrobora: “O transplante não é a cura definitiva, é preciso cuidar desse novo rim para que dure o máximo possível. Mas por outros companheiros transplanta dos e por minha própria irmã, sei que proporciona uma importante melhora na qualidade de vida”. Pilar tem uma experiência de quase trinta anos: “Senti-me fe liz, livre e com muita vontade de viver. Faz quase vinte e oito anos que me submeti ao transplante, e dou graças à pessoa que me doou seu rim. Porque de imediato esta é uma outra vida”. Irene doou um dos rins a seu fi lho Javier. Tinha 17 anos quando descobriu sua insuficiência, embo ra o problema viesse desde o nas cimento. “Tivemos de pensar mui to, sobretudo na responsabilidade familiar: tinha um marido e outros cinco filhos, não poderia acontecer nada comigo”. Mas se decidiu, pois diziam que o transplante entre vi vos era mais seguro e legalmente só possível de pai para filho — em outros casos se declarado perante um juiz que era algo completamen te altruísta. “E doar a seu próprio
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filho é como dá-lo à luz pela segun da vez, também há dor. O amor por um filho é como uma árvore, a raiz de tudo. Foram seis meses preciosos.” Vida em plenitude
Chus deixa a reunião, caminha para seu trabalho. Há seis meses operada, tem vida quase normal. Eduardo se manifesta eufórico: “Por não ter me cuidado, sofri in tervenção no fígado e rim. A dia bete me deixou quase cego. Agora tudo é diferente, mudei meu com portamento e até sou mais aberto com as garotas”. Os imunossupressores ou medi camentos contra rejeição baixam consideravelmente as defesas. Por isso, tem de se cuidar e viver ple namente cada etapa, dentro do possível. Antonio encontra-se na primei ra fase. Casado, com um filho, 47 anos, está à espera de um trans plante. Em dezembro de 2003, iriam dar-lhe dispensa do traba lho, pouco antes de começar a diálise. “Entre uma sessão e ou tra procuro levar uma vida nor mal com as limitações decorren tes da doença: não fazer esforço, fazer dieta e ingerir o mínimo de líquidos, mesmo que nem sempre se consiga”, lembra. Conciliar o tratamento com as tarefas domésticas não é fácil: “Limpo minha casa, vou às com pras, mesmo que, às vezes, custe
um grande esforço, dependendo de como estão minhas forças”. Lo lita e os seus planejam com muita antecedência as férias, para esco lher com tempo um lugar onde se possa fazer diálise. Irene comentou como não cos tumam sair. Javier se submeteu ao transplante duas vezes: na primei ra, recebeu um rim de sua própria mãe e, na segunda, de um jovem de 21 anos, de identidade desco nhecida, que falecera de acidente. “A generosidade foi muito maior no caso da mãe desse garoto”, diz emocionado. Pilar considera-se realizada, em bora comece a ter dores nos ossos e outros problemas, devido à me dicação através dos anos: “Mas enquanto meu rim transplantado está bem, tudo o mais não tem im portância. Sou feliz”. Palavras de Lolita: “Sou crente. Mesmo continuando a esperar, te nho a sorte de ter uma família que tem me acompanhado e apoiado sempre. Além disso, tive a opor tunidade de fazer amigos nas diá lises, e acabei sentindo-me muito unida a pessoas que compartilham uma parte importante de sua vida, que compreendem seus sentimen tos e problemas e lutam dia a dia como você”.
Extraído da Revista Humanizar, tra-
duzido por José Lourenço Garcia
Estão abertas as inscrições para o Congresso de Pastoral da Saúde nos dias 7 e 8 de setembro de 2007 Local: Anfiteatro do Centro Universitário São Camilo Avenida Nazaré, 1501 – Ipiranga – São Paulo O depósito para o pagamento da inscrição deverá ser feito no: Banco Bradesco | Agência 0422-7 | Conta corrente 89407-9 | em nome de: Província Camiliana Brasileira Nome: Endereço: Cx. Postal:
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Telefone: Taxa R$ 20,00, até 30 de agosto, e R$ 30,00, após esta data. A organização do congresso não se responsabilizará pela hospedagem e alimentação dos participantes. Preencha a ficha e mande, juntamente com o comprovante do depósito, para a secretaria do ICAPS por fax: (11) 3862-7286, ramal 6, ou pelo correio: Rua Barão do Bananal, 1125 • 05024-000 — São Paulo – SP. Para maiores informações: tel.: (11) 3862-7286, ramal 3, com Cláudia, das 8h às 17h30, ou e-mail icaps@camilianos.org.br.
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Artrose ou osteoartrite, uma doença articular degenerativa, é o resultado de eventos mecânicos (trabalho, trauma, peso etc.) e biológicos (metabolismo, doenças, etc.) que alteram o equilíbrio entre a formação e a destruição da cartilagem, e pode acometer uma ou várias juntas. Tal problema tem como causa fatores genéticos (hereditários), ambientais, metabólicos, traumáticos. Atinge cerca de 15% da população em geral e ocorre em qualquer idade, porém é mais freqüente ao envelhecer. A artrose provoca a destruição das articulações, principalmente as que suportam peso. É considerada a doença mais comum do aparelho locomotor e a maior causa de incapacidade tanto em países desenvolvidos quanto em desenvolvimento. Pode causar séria incapacidade, mesmo para atividades do dia-a-dia, tornando-se uma doença crônica bastante prejudicial, tanto do ponto de vista humano quanto financeiro. Com o envelhecimento da população, os casos de artrose e suas conse-
qüências trazem grande impacto socioeconômico. Aproximadamente, 40% dos adultos com mais de 70 anos apresentam artrose de joelho, e 80% destes têm algum tipo de limitação de movimento. Programas de atendimento que visam, principalmente, à prevenção, bem como ao diagnóstico e ao tratamento em fases iniciais da doença, podem ajudar a minimizar os prejuízos ao indivíduo e à sociedade. Os fatores que causam esse problema são:
genéticos (hereditários), ambientais, metabólicos, traumáticos.
A artrose pode acometer uma ou várias juntas. Epidemiologia A artrose atinge cerca de 15% da população geral e pode ocorrer em qualquer idade, porém é mais freqüente ao envelhecer.
CHEGOU O QUE VOCÊ ESPERAVA! Você que já conhece o livro, Como visitar um doente, de Padre Anísio Baldessin, não pode perder a oportunidade de levar para casa, ou para seu grupo, o DVD com a palestra “Como visitar um doente”. Nessa palestra, Padre Anísio dá importantes dicas de como se comportar numa visita ao doente, tanto em casa como no hospital. É um DVD de fácil compreensão e preço acessível. Por apenas R$ 10,00, incluída a taxa do correio, você terá em mãos um excelente subsídio pastoral. Para adquiri-lo, entre em contato com Cláudia, na secretaria do ICAPS, pelo tel. (11) 3862-7286, ramal 3, das 8 horas às 17h30. Você poderá também efetuar seu pedido pela Internet no e-mail: icaps@camilianos.org.br.
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