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Janeiro/Fevereiro de 2010
aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa Lumen gentium, lemos que "tal como Cristo... foi enviado pelo Pai "para anunciar a boa nova aos pobres, para proclamar a libertação aos cativos" (Lc 4, 18), "para procurar e salvar o que estava perdido" (Lc 19, 10), de modo semelhante a Igreja ama todos os angustiados pelo sofrimento humano, reconhece mesmo a imagem do seu Fundador, pobre e sofredor, nos pobres e nos que sofrem, esforça-se por aliviar a sua indigência e neles deseja servir a Cristo" (n. 8). Esta ação humanitária e espiritual da Comunidade eclesial para com os doentes e os sofredores, ao longo dos séculos, manifestou-se de múltiplas formas e em numerosas estruturas médicas, também de caráter institucional. Gostaria de evocar aqui aquelas que são geridas diretamente pelas dioceses e as que nasceram da generosidade de vários Institutos religiosos. Trata-se de um "patrimônio" precioso, correspondente ao fato de que "o amor tem necessidade também de organização enquanto pressuposto para um serviço comunitário ordenado" (Encíclica Deus caritas est, 20).
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aros irmãos e irmãs,
No próximo dia 11 de Fevereiro, memória litúrgica da Bem-Aventurada Virgem Maria de Lourdes, celebrar-se-á na Basílica Vaticana o XVIII Dia Mundial do Doente. A feliz coincidência com o 25º aniversário da instituição do Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde constitui mais um motivo para dar graças a Deus do caminho até agora percorrido no setor da pastoral da saúde. Formulo votos de coração a fim de que esta celebração seja ocasião para um impulso apostólico mais generoso ao serviço dos enfermos e de quantos se ocupam deles. Efetivamente, com o anual Dia Mundial do Doente a Igreja tenciona sensibilizar profundamente a comunidade eclesial a respeito da importância do serviço pastoral no vasto mundo da saúde, serviço que faz parte integrante da sua missão, uma vez que se inscreve no sulco da mesma missão salvífica de Cristo. Ele, Médico divino, "passou de lugar em lugar, fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo Diabo" (Act 10, 38). O sofrimento humano tem sentido e é plenamente esclarecido no mistério da Sua paixão, morte e ressurreição. Na Carta Apostólica Salvifici doloris, o Servo de Deus João Paulo II usa palavras iluminadoras a este propósito. "O sofrimento humano escreveu ele atingiu o seu vértice na paixão de Cristo; e, ao mesmo tempo, revestiu-se de uma dimensão completamente nova e entrou numa ordem nova: ele foi associado ao amor... àquele amor que cria o bem, tirando-o mesmo do mal, tirando-o por meio do sofrimento, tal como o bem supremo da redenção do mundo foi tirado da Cruz de Cristo e nela encontra perenemente o seu princípio. A Cruz de Cristo tornou-se uma fonte, da qual brotam rios de água viva" (n. 18). Na Última Ceia, antes de voltar para o Pai, o Senhor Jesus inclinou-se para lavar os pés aos Apóstolos, antecipando o supremo ato de amor da Cruz. Com este gesto, convidou os seus discípulos a entrar na sua mesma lógica do amor que se entrega, especialmente aos mais pequeninos e aos necessitados (cf. Jo 13, 12-17). Seguindo o seu exemplo, cada cristão é chamado a reviver, em contextos diferentes e sempre novos, a parábola do bom Samaritano que, passando ao lado de um homem abandonado meio morto pelos salteadores na margem da estrada, "vendo-o, encheu-se de
aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaAaAAa piedade. Aproximou-se, atou-lhe as feridas, deitando nelas azeite e vinho, colocou-o sobre a sua própria montaria, levou-o para uma estalagem e cuidou dele. No dia seguinte, tirando duas moedas de prata, deu-os ao dono da pensão recomendando: "Trata bem dele, e o que gastares a mais, pagar-toei quando voltar"" (Lc 10, 33-35). Na conclusão da parábola, Jesus diz: "Vai, e também tu faz do mesmo modo" (Lc 10, 37). Ele dirige-se também a nós com estas palavras. Exorta-nos a inclinar-nos sobre as feridas do corpo e do espírito de muitos dos nossos irmãos e irmãs que encontramos pelas estradas do mundo; ajudanos a compreender que, com a graça de Deus acolhida e vivida na vida de cada dia, a experiência da enfermidade e do sofrimento pode tornar-se escola de esperança. Na verdade, como afirmei na Encíclica, salvos pela esperança (Spe salvi:) "não é o evitar o sofrimento, a fuga diante da dor, que cura o homem, mas a capacidade de aceitar a tribulação e nela amadurecer, de encontrar o seu sentido através da união com Cristo, que sofreu com amor infinito" (n. 37). Já o Concílio Vaticano II evocava a importante tarefa da Igreja, de cuidar do sofrimento humano. Na Constituição dogmática
A criação do Pontifício Conselho para a Pastoral no Campo da Saúde, há vinte e cinco anos, faz parte de tal solicitude eclesial pelo mundo da saúde. E apraz-me acrescentar que, no atual momento histórico-cultural, se sente ainda mais a exigência de uma presença eclesial atenta e escrupulosa ao lado dos doentes, como também de uma presença na sociedade capaz de transmitir os valores evangélicos de maneira eficaz, em vista da salvaguarda da vida humana em cada uma das fases, desde a sua concepção até ao seu fim natural. Gostaria de retomar aqui a mensagem, que os Padres conciliares dirigiram ao mundo, no encerramento do Concílio Ecuménico Vaticano II: "Ó vós todos, que sentis mais duramente o peso da cruz – disseram eles – ...vós que chorais... vós, desconhecidos da dor, tende coragem, vós sois os preferidos do reino de Deus, que é o reino da esperança, da felicidade e da vida; vós sois os irmãos de Cristo sofredor; e com Ele, se quiserdes, salvareis o mundo!" (Ench. Vat., I, n. 523* [pág. 313]). Agradeço de coração às pessoas que, todos os dias, "desempenham o serviço em prol dos doentes e dos sofredores", fazendo com que "o apostolado da misericórdia de Deus, ao qual se dedicam, corresponda cada vez melhor às novas exigências" (João Paulo II, Constituição Apostólica Pastor bônus, art. 152).
Ano XXVII - nº 282 - Janeiro/Fevereiro de 2010 - BOLETIM ICAPS
Neste Ano sacerdotal, o meu pensamento dirige-se particularmente a vós, queridos sacerdotes, "ministros dos enfermos", sinal e instrumento da compaixão de Cristo, que deve chegar a cada homem assinalado pelo sofrimento. Estimados presbíteros, convido-vos a não vos poupardes no gesto de lhes oferecer cuidado e conforto. O tempo transcorrido ao lado de quem se encontra na prova revela-se fecundo de graça para todas as demais dimensões da pastoral. Enfim, dirijo-me a vós prezados doentes, enquanto vos peço que rezeis e ofereçais os vossos sofrimentos pelos sacerdotes, a fim de que possam manter-se fiéis à sua vocação, e o seu ministério seja rico de frutos espirituais, em benefício da Igreja inteira. Com estes sentimentos, imploro sobre os enfermos, assim como sobre aqueles que os assistem, a salvaguarda materna de Maria, Salus Infirmorum, e a todos concedo de coração a Bênção Apostólica. Vaticano, 22 de Novembro de 2009 Papa Bento XVI
O Boletim ICAPS é uma publicação do Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde e Bioética - Província Camiliana Brasileira. Presidente: José Maria dos Santos Conselheiros: Niversindo Antônio Cherubin, Leocir Pessini, João Batista Gomes de Lima, André Luis Giombeli. Diretor-Responsável: Anísio Baldesin Secretária: Cláudia Santana Revisão: Fadwa Hallage Redação: Rua Barão do Bananal, 1.125 Tel. (11) 3862-7286, ramal 3 05024-000 São Paulo SP e-mail :icaps@camilianos.org.br Periodicidade: Mensal Prod. Gráfica: Edicões Loyola Tiragem: 2.500 exemplares Assinatura: O valor de R$15,00 garante o recebimento, pelo Correio, de 11 (onze) edições (janeiro a dezembro). O pagamento deve ser feito mediante depósito bancário em nome de Província Camiliana Brasileira, no Banco Bradesco, agência 0422-7, conta corrente 89407-9. A reprodução dos artigos do Boletim ICAPS é livre, solicitando-se que seja citada a fonte. Pede-se o envio de publicações que façam transcrição.
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SAÚDE PÚBLICA: PROGRESSOS E REGRESSOS VICENTE AMATO NETO e JACYR PASTERNAK
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melhora da expectativa de vida da maior parte da humanidade, dos 40 anos ou menos no início do século passado para 70 ou mais em grande parte dos países desenvolvidos e mesmo nos países em desenvolvimento, entre os quais o Brasil, não foi causada por progressos na medicina curativa, pois 90% ou mais desse resultado deve-se a providências de saúde pública. Vacinação com certeza foi uma das destacáveis conquistas. Saneamento básico -ou, no mínimo, o fornecimento de água potável segura- é citável a seguir, por evitar as maiores causas de mortalidade infantil: as diarreias infecciosas. Outras mudanças socioeconômicas também têm relevância, como o aprimoramento da situação habitacional e a troca do cavalo pelo automóvel: morriam mais pessoas em acidentes equinos do que nos nossos carros. A campanha contra o tabagismo destaca o potencial de levar a uma intensa diminuição das consequências da aterosclerose, além da significativa diminuição dos casos de câncer de pulmão, cabeça e pescoço ou de bexiga, com certeza: pode ser que também diminuam outros tumores, e a percepção de que o fumo passivo também oferece riscos é mais um dado que deve ser levado a sério para que o vício seja ainda mais limitado. Os grandes êxitos de ações de saúde pública, porém, foram acompanhados de um relativo desmonte dos órgãos encarregados das providências relacionadas à dita cuja. O que até tem sentido: quando as coisas vão bem, governos acham que isso está parcialmente resolvido e investem em empreendimentos que ainda não o estão. A jornalista Laurie Garrett escreveu um calhamaço (“The Betrayal of Public Health”) mostrando que houve grande relaxo nos programas de saúde pública nos EUA e em outros países desenvolvidos. Consequências seguiram-se: a expansão da tuberculose em todo o mundo envolve várias causas, como a epidemia de Aids e a resistência progressiva da bactéria causadora aos quimioterápicos, mas, indubitavelmente, o controle da doença piorou. Menos profissionais da saúde interessaram-se por esse assunto e até uma especialidade brasileira, a tisiologia, dedicada especificamente à tuberculose, desapareceu. A própria epidemia de Aids estaria mais satisfatoriamente controlada se órgãos de saúde pública estivessem mais bem equipados. Os laboratórios de saúde pública, essenciais no diagnóstico e na vigilância, só ficaram mais
contemplados nos Estados Unidos depois que a epidemia de Aids estava plenamente em curso. E nós, no Brasil? Contamos com algumas glórias, sim: nosso programa de vacinação é muito bom, mesmo diante de padrões internacionais. Poderíamos e deveríamos expandilo logo com novas vacinas, como as contra varicela, doença pneumocócica, doença meningocócica e hepatite A, não restringindo o acesso a imunobiológicos. O fato de serem dispendiosos não é desculpa, porque as doenças saem mais caro. O povo brasileiro aceita muito bem vacinas, ao contrário de grupos nos EUA e na Europa que inventam asneiras, como “a tríplice possa causar autismo”: isso não tem nenhuma base em evidências. A vigilância epidemiológica melhorou muito, ao menos no Estado de São Paulo. Há articulação que não havia entre Estado e município, razoavelmente ágeis na informação adequada sobre problemas de saúde pública. Mas continuamos com problemas, principalmente na área diagnóstica. Nossos laboratórios de saúde pública continuam com poucos recursos e com pessoal insuficiente. A carreira de pesquisador em laboratório de saúde pública não é valorizada: um pesquisador nesse setor ganha menos que 1% de um deputado em Brasília. Nem vamos citar quanto vale um para a sociedade comparado com o outro. Nossos órgãos diretivos de saúde pública contam com sanitaristas sem prática e noção do dia a dia na linha de frente: muitos só viram um doente na época do curso de medicina. O órgão regulatório quanto aos exames laboratoriais -Anvisa- é excessivamente burocratizado e atrasa a capacidade de fazer testes no Brasil. O SUS ignora solenemente exames, bem como remédios, que são usados e conhecidos há pelo menos dez anos no exterior, impedindo que brasileiros tenham acesso a eles. Em que ficamos? Que a saúde pública está melhor, pelo menos em São Paulo, do que em outras épocas, como na fase da ditadura. Mas dá para melhorar muito.
a Serviço da Vida
Ano XXVII - nº 282 - Janeiro/Fevereiro de 2010 - BOLETIM ICAPS
A OBESIDADE NA PASTORAL DA SAÚDE “Como igual a um padre”. Essa é uma expressão que quase todo mundo já repetiu ou pelos ouviu. Frase que certamente tem um fundo muito verdadeiro. Porém, nos dias atuais ela poderia ser incluída nas mais diversas classes profissionais e sociais. Afinal, ter um corpo bastante avantajado não privilégio de poucos. Ultimamente tenho observado que o número de agentes de pastoral da saúde, ou pessoas que prestam assistência religiosa visitando os doentes também aumentou seu diâmetro. E a maioria estão sempre com as mesmas desculpas.
Conceitos fundamentais A
Importante lembrar quais são as principais contribuições de Viktor Frankl: o aumento da consciência da dimensão espiritual da experiência humana e a importância central do sentido como força motriz ou instinto da Psicologia. Na qualidade de psiquiatra que sobreviveu ao campo de concentração de Aushwitz (Polônia), durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), Frankl viu suas idéias passarem a ter grande aceitação. Abaixo, cito alguns conceitos fundamentais da logoterapia. A
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Sentido da vida – A vida tem sentido, e este nunca cessa, mesmo em seus momentos finais. O significado pode mudar nesse contexto, mas nunca deixa de existir;
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O SENTIDO DO SOFRIMENTO CRISTÃO
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LEOCIR PESSINI
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ós nascemos, crescemos, ficamos adultos, envelhecemos e morremos. Neste ciclo vital, estamos imersos numa vida marcada por alegria e tristezas, lágrimas, tragédias, triunfos, sofrimentos e busca de realização. Os acontecimentos em nossas vidas podem ter um significado e serem qualificados como “bons” ou “injustos”. Também podem ser interpretados como fatos do acaso, sem nenhum valor. “Sofremos” da mesma condição humana da qual nenhum ser humano pode escapar. Os acontecimentos da existência humana são frequentemente moldados por nossas por nossas crenças religiosas (ou pela falta delas) e experiências. Hoje, sem dúvida, estamos diante de um grande desafio: o de encontrarmos um sentido maior para viver nossa vida mortal, que é inevitavelmente finita. Precisamos aprender como equilibrar esperança e desespero, como viver com a inevitabilidade do aparente “absurdo” da existência do sofrimento e da morte. No Memorial Sloan – Kettering Cancer Center, em Nova Iorque (Estados Unidos), trabalha um grupo de profissionais da saúde liderados pelo psiquiatra William Breitbart. Este médico é responsável pela unidade de cuidados paliativos daquela instituição, que atende pacientes com câncer em sua fase final de vida. Há alguns anos, os médicos desse centro médico utilizam com grande sucesso em sua filosofia de cuidados os conceitos do psiquiatra austríaco Viktor Emil Frankl (19051997): a logoterapia, uma psicoterapia baseada no sentido da vida. A importância do bem-estar espiritual e o papel do “significado” da depressão moderada, da desesperança e do desejo de morrer em pacientes em fase terminal levaram estes profissionais a buscar em Viktor Frankl tratamentos que não fossem exclusivamente farmacológicos, novas intervenções através das quais pudessem abordar as questões existenciais relacionadas ao bem-estar espiritual e à perda do significado de vida.
Desejo de encontrar sentido – Descobrir o sentido na existência humana é um instinto primário e uma motivação básica do comportamento humano; Livre-arbítrio – Temos liberdade para encontrar significado na existência e escolher a atitude diante do sofrimento;
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Fontes de sentido – As três principais fontes de sentido são: a) Criatividade - o trabalho, as boas ações, a dedicação às pessoas; b) Experiência – a arte, a natureza, o humor, o amor, os relacionamentos ou papéis que desempenhamos na vida; c) Atitude – postura que se tem diante do sofrimento e dos problemas existenciais.
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Com a autoridade moral que conquistou ao sobreviver a Auschwitz, Viktor Frankl nos oferece inúmeras lições a respeito de nossa existência. Muitos desses pensamentos se encontram relatados em seu diário, que, transformado no livro O homem em busca de sentido, se tornou best-seller mundial. Numa das páginas desta obra, o pisiquiatra austríaco nos lembra que “o ser humano não é destruído pelo sofrimento, mas pelo sofrimento sem sentido.
Leocir Pessini, padre camiliano, é professor de bioética e Superintendente da União Social Camiliana.
Já estão marcadas as datas para o XXX Congresso Brasileiro de Humanização e Pastoral da Saúde. Será nos dias 04 e 05 de janeiro de 2010 no Centro Universitário São Camilo situado à Avenida Nazaré 1501 – São Paulo.
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ORTOTANÁSIA: UM RESPEITO À PESSOA E A UM MORRER DIGNO HÉLIO LIBARDI
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om esse nome entendemos a realização e o respeito a dois valores éticos do morrer: respeito à vida humana e o direito de morrer dignamente. A morte é o último acontecimento importante da vida humana, não podemos privar o ser humano de assumir esse momento de uma maneira digna e respeitosa. Isso significa que devemos usar os recursos ordinários na medicina sem, contudo, nos esquecermos que é importante dar atenção aos aspectos humanos de uma assistência, criando um clima de confiança, de calor humano ao redor do doente. Ele não pode experimentar a angústia da solidão nessa hora. Faz parte dessa assistência a presença religiosa. A fé constitui uma ajuda muito grande para se poder vencer o medo da morte e as várias tensões que se criam dentro de cada um. Nenhum remédio pode tirar a possibilidade de o doente assumir a própria morte. Além disso deve-se respeitar o direito do doente de escolher se enfrenta essa hora com dor ou sem dor. Morrer é a última ação do ser humano, como é que se pode tirar dele o direito de decisão? A sociedade hoje procura esconder a morte e suas conseqüências. Tudo é feito para minimizar esse acontecimento. Nós entramos nessa onda e tentamos também disfarçar as situações críticas para que o doente não perceba. O importante é não iludir o doente, é não ser desumano dando esperança a quem já não a tem. Todos devíamos nos preparar para ajudar a pessoa a aceitar com serenidade a morte como um passo para a vida nova com Deus. Aceitar não porque Deus quer, mas porque a natureza já dá sinais visíveis de que não consegue reter a vida. Como se trata de um momento difícil, vejo aqui a importância dos ministros dos enfermos, das visitas aos doentes levando a eles a confiança, a esperança e a conformidade. Como nos sentimos mal diante do que fazem alguns familiares, que se atiram no desespero e se desmancham em crises histéricas, piorando ainda mais a situação já custosa. Culpam a Deus, aos médicos, à medicina. Aquilo que devia ser uma aposta pela vida, uma que a existência terrena não é definitiva, acaba em cenas de desespero absurdo. Hoje é difícil morrer, porque tudo nos impede de chegar a uma reflexão sadia, séria e condizente com essa hora. A sociedade oculta a morte, mas ela existe ao nosso redor. Jesus se comove diante da morte e dá sua vida para que outros possam viver plenamente. Ele aceita sua morte, apesar da angústia e do medo. No alto da cruz nos dá a última lição: “Pai em vossa mãos entrego meu espírito”. Hoje pode serenamente dizer: Jesus nos ensina a viver e nos ensina a morrer. Oxalá rezássemos todos os dias: “Senhor, dai a cada um sua própria morte”.
Ano XXVII - nº 282 - Janeiro/Fevereiro de 2010 - BOLETIM ICAPS
O CARINHO É A QUIMIOTERAPIA DA ALMA JULIÁN DEL OLMO
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argarida está perdida no labirinto de seus sonhos. Seu patrimônio vital é: uma esquizofrenia, que não a abandona nem de dia nem de noite há trinta anos; um irmão que vive inquieto ao vê-la caminhando pelos morros de Úbeda, e uma pensão por incapacidade que desaparece assim que é depositada em sua conta corrente. Margarida tem perturbações que lhe inquietam os pensamentos e sentimentos. Os psiquiatras lhe medicam com haloperidol para que, ao menos, ela melhore nos dias ímpares, que são aqueles em que o doente se sente mais só do que nunca. No calendário da doença mental, a maioria dos dias do ano é ímpar. Se não fosse por seu irmão, anjo da guarda para casos de emergência, Margarida estaria vagando pela rua ou morta por overdose de solidão. Seu irmão lhe afasta os pesadelos noturnos e diurnos que a transtornam e lhe injeta carinho diretamente na veia para ativar-lhe a vontade de viver. Há milhares de pessoas como Margarida perdidas em seu próprio labirinto e outras tantas, como seu irmão, que ficam de guarda 24 horas por dia para cuidar de seus doentes. A
AIDS A
Mery é uma idosa malawiana (leste da África) que tem vivido à beira do impossível. Para que seus filhos possam comer tem sido obrigada a repetir infinitas vezes o milagre da multiplicação do arroz e feijão. Mery viu morrer de AIDS seus quatro filhos, um após o outro. Ela tem sido a enfermeira e sacerdotisa que lhes tem acompanhado na grande e penosa viagem para o outro mundo. E agora, Mery tem sob sua responsabilidade seus sete netos, órfãos de pai e mãe, sem saber como poderá seguir adiante, porque já não lhe restam forças para fazer milagres. A irmã Brígida, uma missionária que tem passado quase toda sua vida em Malawi, tem o hospital e o coração inundados por doentes de AIDS. E como eles não cabem mais nos hospitais, ela vai pelos povoados visitando os doentes levando-lhes consolo e arroz, que é só o que ela pode dar-lhes. A AIDS tem deixado órfãos 11 milhões de crianças africanas, sem que os governos e as organizações internacionais façam nada para minimizar a pandemia. Mery e a irmã Brígida fazem o que está ao seu alcance ainda que pareça pouco, porém visto de perto, é muito. A
CÂNCER A
Angel, que é médico e teólogo, sabe que Deus sempre tem a última palavra sobre a vida, por isso está tranqüilo apesar do prognóstico dos médicos que prescreveram uma série de sessões de quimioterapia. Mas ele sabe que não só a quimioterapia cura o câncer, mas que também a fé, que move montanhas, tem efeitos curativos, além do carinho da família e dos amigos, que o empurram a seguir vivendo contra o vento e as
marés. Angel, que operou centenas de doentes de câncer, sabe que bom tratamento tem que ter um amplo espectro, levando-se em conta não só o corpo como também a alma e o entorno familiar. O carinho é a quimioterapia da alma, órgão vital por excelência, que é o primeiro que deve ser tratado. A família de Angel, que conhece muito bem o valor terapêutico do carinho, está lhe ministrando essa medicina que, pelo visto, está dando excelentes resultados. Deus e os oncologistas também seguem fazendo seu trabalho.
ASSISTÊNCIA RELIGIOSA NO HOSPITAL DAS CLÍNICAS: UM MODELO PASTORAL. As atividades de assistência religiosa na capela do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, teve início no dia 15 de maio de 1945, tendo como seu primeiro capelão o Cônego Roque Viggiano, auxiliado pelo Pe. Miguel Sanjurjo, que exerceu o ministério no HCFMUSP até 29 de abril de 1960. De acordo com os livros dos registros de crônicas da Capelania, esses padres capelães pertenciam aos frades franciscanos da Terceira Ordem Regular (TOR) da Paróquia Nossa Senhora de Fátima, à qual se jurisdiciona eclesiasticamente o Hospital das Clínicas. No início o trabalho de capelania hospitalar compreendia apenas a participação dos sacerdotes católicos e seus colaboradores leigos. Tal idéia, naturalmente, vem da cultura predominante de que o país é predominantemente católico, e que, portanto, dispensava outra participação de religiosidade cristã. Mas, em 1952, tendo em vista a necessidade de atender as características espirituais e religiosas específicas dos pacientes e seus familiares, além dos funcionários, de confissão cristã reformada (evangélicos) foi solicitada a organização, junto às igrejas protestantes tradicionais, do Serviço Religioso Evangélico do HC. Após muitas consultas foi indicado o pastor presbiteriano, da Igreja Presbiteriana Independente, Revº Walter Ermel, como primeiro capelão evangélico do HC. E hoje, juntamente com os capelães católicos, todo esforço é para integrar o HC nesse nível de inserção científica de capelania, fazendo jus à importância que o HC tem no cenário de pesquisa, educação e assistência no mundo da saúde.
ASPECTOS JURÍDICOS DA ASSISTÊNCIA RELIGIOSA
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Regulamento Geral do Hospital das Clínicas, no seu artigo 632, define que os Assistentes Religiosos subordinam-se diretamente ao Superintendente. Para melhor definir as funções, ampliar a normatização e especificar as atividades da capelania, durante o ano de 1994 os capelães – convocados pela Superintendência, e em conjunto com os setores competentes dela, elaboraram uma Ordem de Serviço em que se estabeleceu detalhes de sua
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composição jurídica e a criação do Serviço Religioso Católico e do Serviço Religioso Evangélico, para atuarem ecumenicamente. A partir de então, os serviços de assistência religiosa passaram a ser supervisionados pela Coordenadoria criada, e composta eqüitativamente por dois representantes de cada credo. Em 2004, a Superintendência da Autarquia, com o objetivo de se adequar ao desenvolvimento da realidade mundial de assistência religiosa hospitalar, às novas leis governamentais que tratam da assistência religiosa em instituições de saúde e das características internas do hospital, convocou novamente os capelães, para que, em consonância com o Núcleo de Direito do Hospital das Clínicas, formalizassem documento substitutivo à Ordem de Serviço de janeiro de 1995. Após diversas reuniões, um novo documento tomou forma e finalmente se concretizou na Ordem de Serviço nº 25/2004, de 08 de junho de 2004, após aprovação oficial do Conselho Deliberativo do HCFMUSP – órgão máximo da Autarquia – em sua 2726ª Sessão. A nova Ordem de Serviço trouxe algumas novidades. Uma delas foi a nova denominação da capelania, que passou a ser Comitê de Assistência Religiosa – CARE – composto pelo mesmo Serviço Religioso Católico e Serviço Religioso Evangélico. Junto a estes, prevê-se a possibilidade – definida como necessária pelos membros do CARE – da criação de um outro Serviço Religioso. Outra é que, além dos dois representantes titulares e um suplente de cada serviço, o Comitê conta com um representante da Superintendência. Ademais, os leigos, que, já voluntariamente, desenvolviam trabalhos no complexo HC e que eram denominados, Agentes de Pastoral ou colaboradores passaram a ser chamados, individualmente, de voluntário religioso. Assim sendo, o comitê está organizado da seguinte maneira: A Coordenadoria Administrativa do CARE, segundo a Ordem de serviço 25/2004, será composta de no máximo 07 (sete) membros, sendo 02 (dois) representantes da igreja católica, 02 (dois) representantes das igrejas evangélicas; se necessário, de 02 (dois) representantes de outros credos e 01 representante da Administração Superior do HCFMUSP. Acrescenta-se a essa coordenadoria a equipe dos voluntários religiosos. O CARE tem objetivo prestar assistência religiosa no Complexo HCFMUSP constituindo-se para o exercício do conjunto das ações voltadas à boa prática dos credos e cultos, em prol dos pacientes, familiares e servidores, assegurando a autonomia de cada um. Para ingressar no comitê, seguindo as atribuições do Regimento Interno do CARE 21/Mar/2005, para que o interessado possa fazer parte do CARE é necessário preencher estes requisitos: apresentar carta do seu líder religioso; apresentar certificado de curso promovido pelo CARE; submeter-se a entrevista com representantes religiosos que integram Coordenadoria Administrativa. Para obter maiores e acessar a Ordem de Serviço do Comitê de Assistência Religiosa do Hospital das Clínicas você pode clicar: www.hcnet.usp.br .
Ano XXVII - nº 282 - Janeiro/Fevereiro de 2010 - BOLETIM ICAPS
Colaboram com essas informações, os integrante do Comitê de Assistência Religiosa do Hospital das Clínicas.
TESTEMUNHAS DE JEOVÁ E DOAÇÃO DE SANGUE
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posição religiosa das Testemunhas de Jeová em relação ao uso de sangue na medicina e na alimentação é uma das mais controversas e criticadas ao longo dos anos. Baseando-se na sua singular interpretação da Bíblia, entendem que o uso de transfusões de sangue total ou dos seus componentes primários, conhecida como hemoterapia, é proibido pela lei divina. As Testemunhas de Jeová dizem qua a recusa na utilização e consumo de sangue, humano ou animal está na Bíblia. Entendem que esta proibição foi dada à humanidade em geral visto que foi transmitida por Deus a um homem que a Bíblia apresenta como ancestral de todos os homens, Noé. Além disso, reforçando esta aplicação geral, a ordem teria sido dada na ocasião em que Noé, tal como o primeiro homem Adão, iria dar um novo início à sociedade humana. Esta mais antiga referência bíblica ao uso de sangue diz o seguinte: "Tudo o que se move e vive vos servirá de alimento; eu vos dou tudo isto, como vos dei a erva verde. Somente não comereis carne com a sua alma, com seu sangue. Eu pedirei conta de vosso sangue, por causa de vossas almas, a todo animal; e ao homem que matar o seu irmão, pedirei conta da alma do homem." (Gn 9:3-5) Segundo eles, esta ordem não era uma mera restrição alimentar ou dietética visto que se associa o sangue não só com o alimento mas também com o assassínio. Mais tarde, após a formação da nação de Israel, a própria constituição ou Lei nacional incluía as seguintes ordens: "E não deveis comer nenhum sangue em qualquer dos lugares em que morardes, quer seja de ave quer de animal. Toda alma que comer qualquer sangue, esta alma terá de ser decepada do seu povo." (Lv 7:26, 27) "Se alguém da casa de Israel, ou dos estrangeiros que residirem entre eles, tomar qualquer sangue, eu porei a Minha face contra a pessoa que toma o sangue, e a cortarei de entre seus parentes. Pois a vida da carne está no sangue." Lv 17:10, 11. A Lei mencionava o que um caçador devia fazer com um animal morto: "Ele deve derramar o seu sangue e cobri-lo de terra. Não deveis tomar o sangue de carne alguma, pois a vida de toda carne é o seu sangue. Qualquer pessoa que tomar dele será cortada." Lv. 17:13, 14. As Testemunhas mencionam ainda que esta lei de Deus sobre o sangue não deveria ser desconsiderada nem mesmo numa emergência. Lembram que alguns soldados israelitas, em certa crise em tempo de guerra, mataram animais e
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‘foram comê-los junto com o sangue'. Apesar de parecer uma questão de emergência, ainda assim considerou-se esse ato como pecado contra Deus. 1 Sm. 14:31-35 Após a morte de Jesus, os apóstolos reuniram-se para decidir que aspectos da antiga Lei de Israel deveriam ser adaptados pelos cristãos. A sua decisão foi a seguinte: "O Espírito Santo e nós próprios resolvemos não vos impor outras obrigações além destas, que são indispensáveis: abster-vos de carnes imoladas a ídolos, do sangue, de carnes sufocadas e da imoralidade. Procederei bem, abstendo-vos destas coisas." At 15:28, 29. Segundo o entendimento das Testemunhas, os apóstolos não estavam a apresentar um mero ritual ou um regulamento dietético. O decreto estabelecia normas éticas fundamentais, que os cristãos primitivos deveriam acatar. Cerca de uma década depois, eles reforçaram: "Quanto aos crentes dentre as nações, já avisamos, dando a nossa decisão, de que se guardem do que é sacrificado a ídolos, bem como do sangue e do estrangulado, e da fornicação." At. 21:25 Segundo o entendimento das Testemunhas, qualquer pessoa que se afirme cristã deverá obedecer à ordem bíblica de abster-se de sangue.
OUTROS ARGUMENTOS O sangue era considerado precioso, símbolo da própria vida. A Bíblia contêm vários argumentos referentes ao sangue e ao seu simbolismo, o que as Testemunhas de Jeová consideram muito significativo para a sua fundamentação. Mas segundo eles três são fundamentais: 1.
O sangue de um cordeiro foi pintado em cada ombreira das casas israelitas no Egipto, o que os poupou dos efeitos mortíferos da décima praga no tempo de Moisés;
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O sangue de animais era derramado em sacrifício no altar do templo em Jerusalém, representando a própria vida dos ofertantes;
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O sangue que Jesus derramou, como sacrifício perfeito, em favor de toda a humanidade e que é representado no cálice de vinho puro usado anualmente na comemoração da sua morte.
Na sequência do conteúdo bíblico apresentado acima, as Testemunhas consideram o sangue como símbolo da vida e dizem acatar a injunção bíblica de se absterem de sangue, reconhecendo que apenas o sangue de Cristo pode salvar as suas vidas, tal como o sangue do cordeiro salvou os israelitas na primeira Páscoa. Para elas, respeitar a santidade do sangue é um dos aspectos centrais da própria fé Cristã. Por estes motivos, rejeitam usar sangue em qualquer alimento e também, de qualquer outra forma, sustentar a sua vida com o sangue de humanos ou de animais. A
Essas informações foram oferecidas por representante dessa seita.
POR QUE TEMOS SOLUÇO? O soluço é um espasmo involuntário do diafragma. Ele acontece quando há algum tipo de irritação do centro nervoso relacionado ao músculo do diafragma. O difícil é saber sua origem, pois pode haver mais de cem razões para um simples soluço. Desde a ingestão de bebidas muito quentes ou muito frias, ou então comer algo muito rápido, ou ainda engolir muito ar. O soluço é quase sempre benigno. Não há o menor risco de machucar e usualmente dura pouco tempo. É exatamente o tempo de duração do soluço que pode indicar algum problema. Se ele durar o dia inteiro, sem cessar, pode ser sinal de alguma doença. É também extensa a lista de que podem causar soluços freqüentes: obstruções intestinais, abscessos ou pulmonares que irritam o diafragma neurológicas.
doenças refluxo, doenças ou até
Essas condições têm de ser tratadas, por isso é recomendável procurar um médico quando o soluço é insistente demais. Mas tudo isso é raro. Insistente demais quer dizer soluçar por horas a fio, sem parar. Curar o soluço que é só chato tem jeito, e não é simpatia: prender a respiração por um tempo, comprimindo o abdome, costuma funcionar quando o soluço é benigno.
OS SETE EIXOS SACRAMENTAIS DA VIDA
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a nossa vida convivemos com muitos símbolos. Todas as realidades podem, dependendo da maneira como as olharmos, tornarem-se simbólicas. Assim sendo, tudo pode remeter-nos a Deus, tornar-se um caminho para nosso encontro com Ele. Tudo pode ser sacramental. Na história da Igreja, houve momentos em que a lista dos sacramentos era muito extensa. No início, a Igreja não se preocupava em estabelecer um lista exaustiva dos sacramentos. Simplesmente se vivia a realidade sacramental, ou seja, a presença concreta de Deus através de sinais visíveis na comunidade de fé. Foi só a partir do ano mil que começou a preocupação de definir quais seriam exatamente os sacramentos. São Bernardo (1090-1153), por exemplo, afirmava que o “lavapés” é um sacramento. Hugo de São Vítor (m. 1141) dizia que eram seis os sacramentos, sendo o Batismo e a Eucaristia indispensáveis a Salvação. Pedro Lombardo (1095-1160), apoiado e secundado por Tomás de Aquino (m.1274) designou o sétimo sacramento como o da Ordem. O Concílio de Ferrara (1439) oficializou aquilo que já se tomara tradição dentro da Igreja: que os sacramentos são sete. O Concílio de Trento (1547) definiu “que os sacramentos da nova lei são sete, nem mais nem menos, a saber: o Batismo, a Confirmação, a Eucaristia, a Penitência, a
Ano XXVII - nº 282 - Janeiro/Fevereiro de 2010 - BOLETIM ICAPS
Extrema-unção, a Ordem e o Matrimônio” (Sessão VII, cânon 1). Nesse percurso de discernimento, a Igreja foi se fixando sobre aqueles momentos centrais da existência humana onde a presença de Deus é sentida de maneira especial. Podemos assim estabelecer uma relação dos sacramentos com momentos importantes da vida: • nascimento: Batismo; • a entrada na vida adulta: aaaaaaaaaaaa a Confirmação; • alimento: a Eucaristia; • a união do homem e da mulher: aaaaaaa o Matrimônio; • a doença e a morte: a Unção dos Enfermos; • a experiência da culpa: o Perdão dos Pecados; • serviço à comunidade: o Sacramento da Ordem. O importante é não esquecer, por um lado, que todos os momentos da vida humana, pessoal, comunitária e social, são próprios para a presença de Deus. Com a Encarnação, nada do que é humano é alheio a Deus. Se escolhermos alguns momentos da vida, não é para excluir os outros, mas para que nos lembremos com intensidade que Deus está presente em todos os momentos. Por outro lado, não podemos esquecer que a fonte de todos os Sacramentos é uma só: a graça salvadora de Deus. Se acolhemos a salvação de Deus na forma de um dos sacramentos não podemos nos recusar a acolhê-la sob as outras formas sacramentais e também nas não sacramentais. a
Artigo extraído do Jornal Caxias do Sul
O QUE É ESPERANÇA? MARIA DO SOCORRO D. FERREIRA um dom de Seus, uma das virtudes teologais: fé, esperança e caridade. Significa que a sua fonte é Deus e que se realiza na humanidade, nas atividades do dia-a-dia. Com isso ela suscita em nós um compromisso com aquilo que esperamos. Compromisso este que nos liga a Deus e aos irmãos.
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Esperar no quê? Como sabemos, a esperança não é um pacote fechado que se compra no mercado, mas é dom de Deus. Não pode ser construída somente a partir das forças humanas, apesar de ser o humano o seu campo de manifestação e de realização. O cristão é convidado a esperar em Jesus. Esperar para quê? Para participar plenamente na ressurreição de Cristo e viver em plenitude a vida da graça. A esperança é algo típico do ser humano que peregrina naturalmente, em vista da realização plena em Deus; enraizada na páscoa, ela se torna para cada um de nós um eterno presente no meio de nós, simplesmente pelo fato de esperarmos. Para São Paulo, a esperança cristã é a realização das promessas de Deus a Israel. Esperança essa firmada e fundamentada na história de Israel e no caráter de Deus revelado como alguém que é fiel para cumprir suas promessas. A esperança cristã dirige-se ao mesmo Deus que cumpriu sua promessa a Abraão. A
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esperança de Abraão aumentou porque ele acreditou no Deus da esperança, embora toda esperança humana tivesse se acabado. E não é qualquer esperança, mas como fala Keerkegaard: “é uma esperança contra toda esperança”, e esperar contra aquilo que está diante dos olhos (Rm 8,24); uma esperança em que, segundo a experiência e o possível lógico, “nada há a esperar” (Rm 4,18); uma esperança das coisas que não se vêem (Hb 11,1), porque contra a morte ela espera o impossível, a saber, a ressurreição e a vida a partir de Deus. Embora seja difícil adotar a esperança em meio à realidade do sofrimento, os cristãos se alegram mesmo no sofrimento, pois toda experiência cristã está iluminada pela realidade da experiência da glória. Se os cristãos se apegarem a esta esperança em meio ao sofrimento, sua esperança crescerá e eles não passarão vergonha. Por isso, a esperança é a fonte da força presente para os fiéis porque se baseia no que Deus fez em Cristo, é experimentada no poder do Espírito e se move em direção à glória que será revelada. Tanto é que citarei um personagem do nosso tempo, o cardeal vietnamita Nguyen Van Thuan, que nos deixou um testamento muito precioso no livro Testemunhas da Esperança. Van Thuan “ficou treze anos na prisão, numa situação de desespero aparentemente total; a escuta de Deus, o poder de falar-lhe, tornou-se para ele uma força crescente de esperança que, após sua libertação, lhe permitiu ser para os homens em todo o mundo uma testemunha de esperança, da grande esperança que não declina, mesmo nas noites de solidão”. Por isso, a “esperança renova e vivifica a fé sempre de novo e cuida para que sempre de novo se levante mais forte; para perseverar até o fim”. a
aaaaaaaaaaaaaaaMaria do Socorro D. Ferreira é missionária da Imaculada-Padre Kolbe.
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