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SÃO CAMILO PASTORAL DA SAÚDE INFORMATIVO DO INSTITUTO CAMILIANO DE PASTORAL DA SAÚDE ANO XXXI N.337 JANEIRO E FEVEREIRO 2015

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO PARA O XXIII DIA MUNDIAL DO DOENTE O tema deste ano convida-nos a meditar uma frase do livro de Jó: «Eu era os olhos do cego e servia de pés para o coxo» (29, 15). Gostaria de o fazer na perspectiva da sabedoria do coração. 1. Esta sabedoria é «pura, pacífica, indulgente, dócil, cheia de misericórdia e de bons frutos, imparcial, sem hipocrisia» (3, 17). Trata-se, por conseguinte, de uma disposição infundida pelo Espírito Santo na mente e no coração de quem sabe abrir-se ao sofrimento dos irmãos e neles reconhece a imagem de Deus. 2. Sabedoria do coração é servir o irmão. No discurso de Jó que contém as palavras «eu era os olhos do cego e servia de pés para o coxo», evidencia-se a dimensão de serviço aos necessitados por parte deste homem justo, que goza duma certa autoridade e ocupa um lugar de destaque entre os anciãos da cidade. Também hoje quantos cristãos dão testemunho – não com as palavras mas com a sua vida radicada numa fé genuína – de ser «os olhos do cego» e «os pés para o coxo»! Pessoas que permanecem junto dos doentes que precisam de assistência contínua, de ajuda para se lavar, vestir e alimentar. Este serviço, especialmente quando se prolonga no tempo, pode tornar-se cansativo e pesado. Em tais momentos, pode-se contar de modo particular com a proximidade do Senhor, sendo também de especial apoio à missão da Igreja. 3. Sabedoria do coração é estar com o irmão. O tempo gasto junto do doente é um tempo santo. É louvor a Deus, que nos configura à imagem do seu Filho, que «não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida para resgatar a multidão» (Mt 20, 28). Com fé viva, peçamos ao Espírito Santo que nos conceda a graça de compreender o valor do acompanhamento, muitas vezes silencioso, que nos leva a dedicar tempo a estas irmãs e a estes irmãos que, graças à nossa proximidade e ao nosso afeto, se sentem mais amados e confortados. 4. Sabedoria do coração é sair de si ao encontro do irmão. Às vezes, o nosso mundo esquece o valor especial que tem o tempo gasto à cabeceira do doente, porque, obcecados pela rapidez, pelo anseio do fazer e do produzir, esquece-se a dimensão da gratuidade, do prestar cuidados, do encarregar-se do outro. No fundo, por detrás desta atitude, há muitas vezes uma fé morna, que esqueceu a palavra do Senhor que diz: «a Mim mesmo o fizestes» (Mt 25, 40). Por isso, gostaria de recordar uma vez mais a «absoluta prioridade da “saída de si próprio para o irmão”, como um dos dois mandamentos principais que fundamentam toda

a norma moral e como o sinal mais claro para discernir sobre o caminho de crescimento espiritual em resposta à doação absolutamente gratuita de Deus» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 179). 5. Sabedoria do coração é ser solidário com o irmão, sem o julgar. A caridade precisa de tempo. Tempo para cuidar dos doentes e tempo para os visitar. Tempo para estar junto deles, como fizeram os amigos de Jó: «Ficaram sentados no chão, ao lado dele, sete dias e sete noites, sem lhe dizer palavra, pois viram que a sua dor era demasiado grande» (Jó 2, 13. Pois a verdadeira caridade é partilha que não julga, que não tem a pretensão de converter o outro. A experiência de Jó só encontra a sua resposta autêntica na Cruz de Jesus, ato supremo de solidariedade de Deus para connosco, totalmente gratuito, totalmente misericordioso. E esta resposta de amor ao drama do sofrimento humano, especialmente do sofrimento inocente, permanece para sempre gravada no corpo de Cristo ressuscitado, naquelas suas chagas gloriosas que são escândalo para a fé, mas também verificação da fé (cf. Homilia na canonização de João XXIII e João Paulo II, 27 de Abril de 2014). Mesmo quando a doença, a solidão e a incapacidade levam a melhor sobre a nossa vida de doação, a experiência do sofrimento pode tornar-se lugar privilegiado da transmissão da graça e fonte para adquirir e fortalecer a sabedoria do coração. Por isso se compreende como Jó, no fim da sua experiência, pôde afirmar dirigindo-se a Deus: «Os meus ouvidos tinham ouvido falar de Ti, mas agora veem-Te os meus próprios olhos» (42, 5). Também as pessoas imersas no mistério do sofrimento e da dor, se acolhido na fé, podem tornar-se testemunhas vivas duma fé que permite abraçar o próprio sofrimento, ainda que o homem não seja capaz, pela própria inteligência, de o compreender até ao fundo. 6. Confio este Dia Mundial do Doente à protecção materna de Maria, que acolheu no ventre e gerou a Sabedoria encarnada, Jesus Cristo, nosso Senhor. Ó Maria, Sede da Sabedoria, intercedei como nossa Mãe por todos os doentes e quantos cuidam deles. Fazei que possamos, no serviço ao próximo sofredor e através da própria experiência do sofrimento, acolher e fazer crescer em nós a verdadeira sabedoria do coração. Acompanho esta súplica por todos vós com a minha Bênção Apostólica.

“Eu era os olhos do cego e servia de pés para o coxo” (Jó 29, 15)

Vaticano 03 de Dezembro de 2014

VAI COMEÇAR DE NOVO Depois de celebrarmos com alegria o Natal do Senhor e o início de mais um ano, é tempo de recomeçar. Aproveitamos para reafirmar nossos desejos de um 2015 de paz e realização e convidar a todos os Agentes de Pastoral da Saúde, Ministros da Eucaristia e Assistentes Espirituais para mais um ano de solidariedade junto aos enfermos. Por isso, estamos colocando, mensalmente à disposição, Online, os boletins ICAPS. Você poderá encontrar também, no nosso Site, livros, DVDs e materiais religiosos que ajudarão na formação de nossos agentes e Ministros da Eucaristia. Além disso, a partir de fevereiro, estará à disposição a programação dos cursos de formação para Agentes de Pastoral da Saúde que acontecerão na Arquidiocese de São Paulo e também em outras cidades. Fique atento. Finalmente, pedimos para que você anote e reserve as datas dos dias 05 e 06 de setembro. Afinal, nesses dias será realizado em São Paulo o XXXV Congresso Brasileiro de Humanização e Pastoral da Saúde. Venha participar conosco. Equipe ICAPS.


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PRESSÃO ARTERIAL SOB CONTROLE ELISANDRA ESCUDERO

O homem fica hipertenso, em média, depois dos 35 anos e a mulher após os 40 Considerada um dos mais graves problemas de saúde pública no Brasil e, igualmente, nocivo fator de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, a hipertensão arterial, também conhecida como pressão alta, é a principal responsável pelo aumento de ocorrências de acidente vascular encefálico (derrame) e infarto agudo do miocárdio (ataque cardíaco) – atualmente as duas maiores causas de mortes no País. “A hipertensão é um inimigo bem próximo, que mora dentro de cada indivíduo, e é uma doença silenciosa, porque raramente aparecem sintomas; mas, quando se manifesta, é tarde demais para os chamados órgãos-alvo, como coração, cérebro, rins, vasos arteriais e retina, que acabam sofrendo as consequências diretas do aumento duradouro da pressão”, avisa Cibele Rodrigues, professora titular de Nefrologia da PUC-SP, diretora do Departamento de Hipertensão da Sociedade Brasileira de Nefrologia e membro da Sociedade Brasileira de Hipertensão. Todos os dias, passam pelas artérias cerca de cinco litros de sangue. Dentro de vasos saudáveis, essa travessia é tranquila. Mas não para pessoas que sofrem de pressão alta. Nesse grupo, chamado de hipertensos, o sangue viaja apertado. A circunferência interna das artérias diminui e deixa menos espaço para o sangue, que, então, começa a pressionar as paredes, deformando-as. A pressão é considerada normal quando os valores são de 120/80 mmHg (12 por 8). Uma pessoa pode ser diagnosticada hipertensa quando os níveis da pressão estão acima de 140/90 mmHg (14 por 9). Estes números, na verdade, representam a força gerada pelo bombeamento do sangue, que é feito pelo coração, e passa pelas artérias. O número maior (12) indica a pressão provocada quando o coração se contrai (sístole) para distribuir o sangue, e o menor (8), quando ele relaxa (diástole). “Estima-se que aproximadamente um terço da população brasileira tenha hipertensão. E, quanto maior a idade, maior a prevalência da pressão alta. Cerca de 60% das pessoas com mais de 65 anos têm a doença”, diz Antônio Carlos Bacelar, cardiologista do Hospital Israelita Albert Einstein. A hipertensão pode ser dividida em dois grupos – primária e secundária. A pressão alta primária, mais comum entre a população, não tem uma causa específica, é considerada multifatorial e envolve, além da genética, raça e o estilo de vida. Já a hiperte0nsão secundária acontece quando existe alguma outra doença envolvida, que leva ao aparecimento da pressa o alta, como, por exemplo, apneia do sono, problema na tireoide, diabetes e problemas renais, entre outras, informa Bacelar. “Nem mesmo as crianças escapam da pressão alta, aproximadamente 5% delas têm o problema e deveriam ser diagnosticadas e tratadas”, alerta Rodrigues. Conforme explicam os es-

pecialistas, a genética tem alto peso sobre o aparecimento da hipertensão. Portanto, se os pais têm pressão alta, a chance de um filho desenvolver a doença é de 50%. Se apenas um deles tem a doença, a chance diminui para 30%. Negros, por exemplo, têm até duas vezes mais chance de desenvolver pressão alta do que brancos. Outros fatores responsáveis pelo surgimento e agravamento da hipertensão são: maus hábitos alimentares, como o consumo abusivo de sal e de alimentos industrializados; sedentarismo; estar com sobrepeso ou obesidade; ingestão de bebidas alcoólicas em excesso; uso frequente de descongestionantes nasais, anti-inflamatórios e anticoncepcionais. Para Bacelar, é preciso combater essa epidemia no País com programas de promoção à saúde e ações de prevenção. “Existe tratamento para a doença com medicamentos, mas o ideal é prevenir-se através de medidas simples, como, por exemplo, manter uma dieta rica em frutas e verduras, com baixo teor de gordura saturada e total. Também é importante a prática de exercícios físicos e o controle do estresse emocional por meio de ioga, meditação ou outro incentivo ao corpo e à mente”, diz o especialista. De acordo com o último levantamento realizado em 2012 pelo Ministério da Saúde, por meio da Vigitel (Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por Inquérito Telefônico), muitas pessoas foram identificadas com pressão alta, mas desconhecem este fato. Os dados apontam ainda que, entre a população que sabe e declara ter a doença, 26,9% são mulheres e 21,3% são homens. Cibele Rodrigues informa que o homem fica hipertenso, em média, depois dos 35 anos e a mulher após os 40 anos, já que os hormônios femininos ajudam a controlar a pressão. Por isso, todo adulto deve medir sua pressão arterial. Se descobrir que é hipertenso, precisa ter acompanhamento médico para o resto da vida. A doença é crônica, quase sempre não tem cura, mas tem controle e só complica em quem não se trata corretamente. Conforme avisam os especialistas, quem sofre deste mal precisa estar atento, mesmo que não sinta absolutamente nada, e mudar o estilo de vida é tão ou mais importante do que tomar medicamentos, que hoje estão disponíveis na rede pública gratuitamente. Não deixe a pressão alta enganá-lo. “Conhecer o seu corpo é o primeiro passo para combater este inimigo controlável. Esteja sempre alerta para alguns dos sintomas da hipertensão, como pressão muito forte na região da nuca, tontura e zumbido no ouvido. Visite um médico regularmente e faça os exames de rotina. Cuide-se, afinal não dá para perder o jogo para a pressão alta com armas tão simples e poderosas à nossa disposição”, conclui Rodrigues. Artigo extraído da revista Medicina Social, ano XXXI n° 225.


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A AUTÓPSIA DA FÉ

EDUARDO ROSA PEDREIRA Desde a década de 60 a Igreja Evangélica Brasileira viu nascer dentro de si um movimento que tem sido chamado de novo pentecostalismo. Como qualquer outro fenômeno humano, este também é um feixe complexo no qual se entrecruzam, além da dimensão religiosa, as sociais, políticas, psíquicas e econômicas. Apesar desta complexidade é necessário que tentemos descrevê-lo, ainda que parcialmente. Alguns líderes são em muitos aspectos uma síntese deste movimento. Ressalte-se enfaticamente que nem todas as igrejas e pastores neo-pentecostais podem ser medidos da mesma maneira. Todavia, não se pode negar que esses líderes trazem em sua trajetória a marca que tem caracterizado boa parte do mundo neo-pentecostal: líderes com um enorme carisma, dissociado de caráter e alimentado por uma teologia do consumo e da prosperidade. O carisma de atrair multidões e saber lidar com elas, faz do líder de qualquer organização uma pessoa muito poderosa e na igreja não é diferente! Isto porque, um líder com forte carisma é capaz de seduzir seguidores a ultrapassar até mesmo os limites do razoável, pois o senso crítico de um grupo de pessoas diminui na proporção exata da incidência do carisma do líder sobre ele. O caráter por sua vez, é a fronteira do carisma. É através dele que se resiste às armadilhas do carisma. Então, quando um se desliga do outro, o líder perde o seu crítico interior, destrói seu super-ego ficando ao sabor do ego inflado pelos resultados advindos de sua liderança carismática. Esta equação daninha de carisma sem caráter somente se sustenta no contexto da fé porque ganha contornos divinos. É a chamada teologia da prosperidade, que justifica diante dos fiéis os abusos financeiros de um estilo de vida socialmente nababesco vivido por muitos deles. Prega-se dentro desta visão teológica, que Deus deseja que os seus filhos prosperem, por isso, eles devem ofertar ao máximo, pois fazendo assim, serão recompensa-

dos. Ou no limite de suas angústias ou puramente interessadas numa barganha sobrenatural na qual a benção de Deus é comprada mediante o dízimo, pessoas vão embarcando nesta que é a curto, médio e longo prazo, uma canoa teologicamente furada. Obviamente que não para os líderes carismáticos pregadores de tal teologia que, diga-se de passagem, são os únicos realmente a prosperarem numa medida de milhões de reais. A rigor, o quadro até aqui descrito não é novo, sendo já conhecido e tratado pela grande mídia. A novidade do presente momento, fica por conta das denúncias do Ministério Público que qualificam uma igreja como organização criminosa e responsabilizam seus líderes por ações ilícitas. Estas denúncias em si mesmas, independente do seu desfecho, devem constituir-se em uma séria advertência a todos, de que falta de caráter no âmbito da fé poderá trazer sérias implicações judiciais para aqueles que ultrapassem os limites legais. Sendo assim, a cadeia não pode ser encarada nem como punição divina e nem uma armação do diabo, mas sim uma consequência natural que deve se abater sobre todos os infratores da lei. Em tudo isso, é curioso notar que outro Apóstolo Tiago escreve na Bíblia que a fé sem obras é morta. O que ele não disse, mas implícito está, é que uma fé morre não apenas pela ausência de obras, mas pela qualidade delas e dos meios usados para produzi-las. Portanto, uma fé sem ética está morta apesar dos muitos resultados. E uma vez morta, só nos resta fazer sua autopsia e torcer pelo seu breve sepultamento, para então renascer líderes que com integridade cumpram sua missão amando a Deus e a este povo tão sofrido! Eduardo Rosa Pedreira é pastor da Comunidade Presbiteriana da Barra da Tijuca e professor de Ética Corporativa da Fundação Getúlio Vargas.

LUTO EM VIDA

SUZANA HERCULANO-HOUZEL Como já escrevi aqui antes, o luto é o processo de convencimento do cérebro de que todas as expectativas que envolvem uma pessoa querida não se realizarão mais. Em geral, o luto é póstumo. Mas às vezes, tristemente, é um processo que acontece ainda em vida. Luto em vida é o que faz a família de quem sofre de Alzheimer e outras demências semelhantes. Como as primeiras regiões do cérebro a serem mais afetadas, perdendo sinapses e neurônios, incluem o hipocampo, região necessária para a formação de novas associações, primeiro se vai a memória recente: o registro do que se comeu no café da manhã, do que se fez ontem, do jogo que acabou de passar na televisão. Depois, conforme a degeneração se agrava e se espalha para outras regiões do córtex cerebral, vão –se memórias cada vez mais distantes: do endereço de casa, dos amigos recentes e, por fim, dos próprios filhos. Aqui começa o luto em vida: quando a família precisa se convencer de que aquela pessoa não mais habita seu corpo ainda vivo. O aspecto misericordioso da doença é que, passados os estágios iniciais, o próprio doente não tem mais ciência do seu estado: ele vivo num fluxo constante de confabulações, conforme seu cérebro conjura histórias com os elementos mais acessíveis.

Contestar declarações absurdas como “eu tive um cachorro como o que parece na televisão” ou “você não é minha filha, onde está minha filha?” torna o convívio ainda mais sofrido – e para os dois lados. Inesperadamente, um casal de atores nos EUA descobriu um jeito de amenizar esse sofrimento dos dois lados, ao lidar com sua própria idosa doente, usando uma técnica de...teatro de improviso. A base do improviso é jamais dizer “não”. Um lado nunca contesta o outro. A regra é entrar no jogo, mesmo que a proposta seja impossível. “Então a cadela Lassie era da senhora? Que máximo, como ela era?” um exemplo fácil. É mais difícil entrar no jogo quando é preciso negar que a filha real saiu e mandou você e dizer que a filha real saiu e mandou você em seu lugar. Mas talvez ainda ganhe da alternativa. No mínimo, tem uma vantagem. Além de não irritar e confundir ainda mais a pessoa demenciada, ajuda quem fica a criar uma nova relação com a pessoa desmemoriada que agora habita aquele corpo e fazer o luto em vida da mente que se foi. Suzana Herculano-Houzel, neurologista, professora da UFRJ, autora do livro “Pílula de Neurociência para uma vida melhor” (Ed. Sextante)

Padres e Irmãos Camilianos a Serviço da Vida JUNTE-SE A NÓS, SEJA UM CAMILIANO TAMBÉM! “Estive enfermo e me visitastes” (Mt 25,36)

Serviço de Animação Vocacional Av. São Camilo, 1200 - Cotia - São Paulo - SP - CEP: 06709-150 Fone: (11) 3564-1634 vocacional@camilianos.org.br / www.camilianos.org.br


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QUANTA BESTEIRA!!! ANÍSIO BALDESSIN

Eu imagino que seja essa a expressão que muitos doentes terminais gostariam de expressar para os familiares, amigos, profissionais da saúde, religiosos e visitadores (agentes de pastoral da saúde) que vão aos hospitais ou às casas para fazer uma visita ou mesmo prestar assistência espiritual. Isto porque, por incrível que pareça, ainda hoje, esses visitadores continuam repetindo frases feitas, chavões, ou falando coisas inconvenientes para aqueles que estão morrendo. Eu confesso que me senti muito desconfortável quando fui visitar uma amiga que se encontrava nessa situação. Como ela mal tinha força para respirar, depois de trocar duas ou três palavras, imaginei que a atitude menos inconveniente seria apenas segurar sua mão. Foi o que fiz durante todo o período de tempo que estive ao seu lado. O que mais me deixou desconfortável não foi a sensação de impotência diante daquela situação de sofrimento. Mas sim, os mais desproporcionais e inconvenientes comentários de algumas pessoas que lá estavam. Verdadeiras bobagens como: “você vai ficar boa, não é querida? Melhora essa fisionomia e dê um sorriso para nós! Você quer um sorvete, um cafezinho? Se você não comer não vai sarar!” Quanta besteira! Eu até entendo que as pessoas não fazem isso por mal ou com o intuito de causar danos àqueles que sofrem. Porém, essas expressões servem somente para quem as expressa. Ou seja, fazemos um bonito “ramalhete” de palavras e as entregamos a quem muitas vezes necessita apenas de uma presença, um abraço ou de uma mão que afague. No livro Entre a Vida e a Morte, Medicina e Religião, de minha autoria, transcrevi um depoimento que mostra de maneira simples e direta, o que as pessoas que estão morrendo querem e esperam daqueles que as visitam ou prestam

assistência espiritual. Eis o relato: “O que eu desejo é que as pessoas me ajudem a morrer. Morrer é difícil. Não só por causa da morte mesmo, mas porque todos, na melhor das intenções, a cercam de mentiras. Sei que no dia a dia e também nas escolas de saúde somos sempre “treinados” para ajudar as pessoas a viver. Mas haverá professores que ensinem a arte de ajudar as pessoas a morrer? Ou isso não faz parte dos saberes dos profissionais da saúde? Meus parentes mais queridos se sentem perdidos. Quando quero falar sobre a morte eles logo dizem: “Tira essa ideia de morte da cabeça. Você estará boa logo...” Mentem. Então eu me calo. Quando saem do quarto, longe de mim, choram. As visitas vêm, assentam-se, sorriem, comentam as coisas do cotidiano. Fazem de conta que estão fazendo uma visita normal. Eu me esforço para ser delicada. Sorrio. Acho estranho que uma pessoa que está morrendo tenha a obrigação social de ser delicada com as visitas. A conversa não me interessa. Dá-me, ao contrário, um grande cansaço”. Aí estão descritos inúmeros ensinamentos que servem não somente para aqueles que prestam assistência espiritual aos doentes terminais, mas também para todos os que nessas situações, são chamados a ajudar. Portanto, é importante ficar atento às necessidades daquele que está morrendo por duas razões: primeiro, para não aumentar ainda mais o sofrimento de quem está totalmente desconfortável. Segundo, para que algum dia você não tenha que ouvir do próprio paciente, a indesejada frase: “quanta besteira”! Anísio Baldessin é padre da Ordem de São Camilo e capelão do Hospital das Clínicas e do Instituto do Câncer de São Paulo.

O boletim “São Camilo Pastoral da Saúde” é uma publicação do Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde - Província Camiliana Brasileira. Provincial: Pe. Antonio Mendes Freitas / Conselheiros: Pe. Mário Luís Kozik, Pe. Mateus Locatelli, Pe. Ariseu Ferreira de Medeiros e Pe. João Batista Gomes de Lima/ Diretor Responsável: Anísio Baldessin /Secretária: Fernanda Moro / Diagramação: Fernanda Moro / Revisão: José Lourenço / Redação: Av Pompeia, 888 Cep: 05022000 São Paulo-SP - Tel. (11) 3862-7286 / E-mail: icaps@camilianos.org.br / Site: www.icaps.org.br / Periodicidade: Mensal / Tiragem: 1.000 exemplares / Assinatura: O valor de R$20,00 garante o recebimento, pelo correio, de 11 edições. O pagamento deve ser feito mediante depósito bancário em nome de Província Camiliana Brasileira, no Banco Bradesco, Agencia 0422-7, Conta Corrente: 89407-9.

São Camilo PASTORAL DA SAÚDE

ICAPS - Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde Tel: (11) 3862-7286 Site: www.icaps.org.br E-mail: icaps@camilianos.org.br Avenida Pompeia, 888 Cep: 05022-000 São Paulo - SP


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