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Ás vezes, nos perguntamos por que Jesus faz milagres? Para atrair a multidão? Para mostrar seu próprio poder? Para traduzir em gestos concretos o sentido da sua missão? Dez leprosos aproximaram-se de Jesus e imploraram a cura. Jesus atende seus desejos. Desta vez, porém, não o faz com a intenção de suscitar a fé deles. Aqui a fé não foi o fruto do milagre, ela já estava presente. Estes dez homens já acreditavam em Jesus e no seu poder. A um deles que volta para agradecê-lo, Jesus lhe diz claramente: “A tua fé te salvou”. Porém, Jesus diz estas palavras surpreendentes apenas a um dos dez que foram curados: a um samaritano estrangeiro que volta para agradecê-lo. Por quê? Porque somente ele deixou Jesus satisfeito com o seu agir. Os outros nove, ao contrário, lhe causaram um sentimento de desilusão; e Jesus, se é que podemos dizer isso, desabafou essa desilusão com amargura, dizendo: “Os dez não ficaram purificados da lepra? Onde estão os outros nove? Não houve, acaso, quem voltasse para dar glória a Deus senão este estrangeiro”. Mal-agradecidos! Ao fazer o milagre Jesus não age sozinho. Jesus fez o milagre que aqueles homens


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imploraram porque ele estava pronto para atender qualquer coisa que eles lhe pedissem. O milagre pressupõe uma conexão entre Jesus e o miraculado. E se esta conexão não existia antes, o milagre a suscita e a cria. Para Jesus este milagre de conexão é muito mais importante que o próprio milagre. Jesus cura, certo, mas o faz para que eles retornem a ele com uma palavra de gratidão. E se ele cura á distância, talvez o faça para motivar-lhes a retornar, e quanto a Jesus, Jesus cura á distância para deixar que se desenvolva nele próprio a alegria da espera, até ao momento da extasiante alegria do encontro com o miraculado. Só quando chega a este ponto, haverá verdadeiramente espaço para o milagre e, então, o milagre será plenamente realizado. Terá dado os seus frutos: a ação de graças e a fé. A este ponto a salvação é dada em plenitude, para o coração e para o corpo. Somente ao samaritano que voltou para agradecê-lo, Jesus pode dizer com toda verdade: “Levanta-te e vai; a tua fé te salvou! ” Os outros nove são somente homens “miraculados pela metade”. Não há dúvida que foram curados, mas a cura deles foi estéril. Não deu frutos, porque o coração deles não se abriu para a gratidão e ação de graças.


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Eis, irmãos e irmãs, em que consiste antes de tudo o milagre: na fé e no louvor do miraculado. Jesus fica maravilhado se isso acontece ao realizar um milagre. Ao contrário, nunca ficou boquiaberto diante de uma perna que reconquistou a sua força ou diante de um braço que se revitalizou, nem mesmo em relação ao morto por ele ressuscitado, mas se maravilhou extremamente diante da fé e da ação de graças que tornaram possível o milagre e que remetem o homem á sua verdadeira conexão com Deus, que consiste em deixar ser tocado pelo seu amor e colocar-se á disposição de sua onipotente providência. Toda oração é tecida de fé e de ação de graças, mediante as quais a oração herda a onipotência de Deus: “Tudo quanto suplicardes e pedirdes, crede que recebestes, e assim será para vós” (Mc 11,24). Sem dúvida alguma. Quem mergulha de cabeça na ação de graças, unindo junto, por assim dizer, a etapa do ser atendido, não indispõe Deus com um comportamento atrevido, que se poderia considerar temerário, mas ao contrário, sem se dar conta, ouso dizer, motiva Deus a fazer o milagre. Pelo menos aparentemente. Digo aparentemente, porque na verdade nada força o coração de Deus, nem a mais forte ação de graças nem a mais


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inexpugnável fé, porém estas duas realidades reconduz o homem ao centro do desejo de Deus e fazem o desejo do homem coincidir com o desejo de Deus. Santa Teresinha, pirralha atrevida, dizia: “Não temo pedir nada a Deus; tudo o que o peço ele me dá, porque meu desejo é o desejo de Deus”. A comunhão entre Jesus e o Pai era da mesma natureza e infinitamente mais perfeita. Desta comunhão de desejos vieram á tona os milagres que perduraram durante a vida de Jesus na terra: “Pai, dou-te graças porque me ouviste. Eu sabia que sempre me ouves”. É deste modo, rendendo graças antecipadas, que Jesus ressuscita Lázaro. Nesta rendição de graças reconhece o Pai e aprende a viver infalivelmente segundo a sua vontade, no milagre. Esta mesma ação de graças é o elemento dominante de toda oração do crente: ação de graças forte e audaciosa que estimula a onipotência de Deus. Ação de graças não somente pelos milagres do passado, mas também pelos sinais e prodígios do futuro que podemos esperar. Os milagres que Jesus prepara para aqueles que creem nele e que não cessam nunca de render-lhe graças serão ainda maiores, como ele mesmo prometeu. AMÉM.


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