XXX Domingo do Tempo Comum – Ano B 25 de outubro de 2015
Caríssimos Irmãos e Irmãs: A primeira leitura, um trecho retirado do profeta Jeremias e o salmo responsorial (Sl 125) se referem ao evento histórico do retorno dos hebreus exilados na Babilônia. A iniciativa fora unicamente de Deus. “O Senhor salvou o seu
povo, o resto de Israel” (Jr 31,7). O resto de Israel, conforme o profeta, se compunha daqueles que o próprio Deus havia escolhido; os exilados que tinham perseverado no pacto da Aliança dos Patriarcas e de Moisés. Eram os justos que o Senhor salvaria nos últimos tempos e os constituiria qual um novo povo. Esse resto, conforme Jeremias, eram os cegos, coxos, parturientes e todos aqueles sem condições para en1
frentar a viagem. Gerar um novo povo com tais “debilitados” evidenciaria uma realidade: a obra era divina e não humana. Esse fato histórico – à volta de um resto do povo para Jerusalém – na releitura litúrgica tornara-se profecia da grande e definitiva restauração messiânica. Haveria um dia em que o homem, libertado por Deus de seus pecados e de suas sequelas, realizaria plenamente o destino pelo qual fora criado: livre de todo tipo de escravidão, sobretudo a do pecado, poderia glorificá-Lo. O “novo resto” acontecera, na plenitude dos tempos, com o sacrifício do Cristo sacerdote na ara da cruz e prolongado em sacramento pela Igreja. A cura do cego Bartimeu surge, então, como um símbolo de homens e mulheres pertencentes a um “novo retorno” operado não por iniciativa humana mas pela virtude do Cristo-Deus. 2
Nesse novo retorno, o Redentor aniquila as
conse-
quências do pecado, em particular a cegueira espiritual (2Cor 3,14-18). É Ele quem abre os olhos dos homens para a luz deífica, refletida em seu rosto . O apóstolo São Paulo nos diz:“6Porquanto Deus, que disse: Do meio das
trevas brilhe a luz!, foi ele mesmo quem reluziu em nossos corações, para fazer brilhar o conhecimento da glória de Deus, que resplandece na face de Cristo”. (2Cor 4,6). Bartimeu curado de suas trevas é, pois, figura de todos nós cristãos que fazemos nosso Grande Retorno, que o resto de Israel voltando do exílio, prefigurava. Convém considerar que o cego Bartimeu era mais do que pobre, pois estava privado de uma das mais necessárias riquezas do ser humano: a luz dos olhos. Entretanto, soube valorizar uma outra grande riqueza, não obstante cego: crer e rezar. Não se intimidou e enfrentou a multidão 3
que o fazia calar. Persistiu em gritar suplicando piedade e proclamando sua fé em Jesus como Filho de Davi, isto é, como Messias. (Mt 9,27) Operada a cura, Bartimeu tinha a liberdade de “aproveitar a vida”, pois o Cristo nada lhe impusera. Mas sua cura foi além do físico, por isso fez-se seguidor do Senhor que subia a Jerusalém. Com efeito, uma vez curado, poderia permanecer em Jericó; cidade bela, atraente, fascinante, febril; poderia “tirar o atraso”, como dizemos em nossa linguagem popular. Não! Bartimeu optou por subir a Jerusalém com Cristo. Quis fazer parte desse pequeno resto que se dirigia à cidade de Davi que condenava e matava seus profetas. Com Cristo, uma minoria se põe em marcha à Cidade Santa deixando Jericó e suas delícias.
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Violentando-se a si mesmos e não a outros, essa grande multidão que O acompanhava, porém minoria em proporção a todo o restante do povo eleito, não se deixara arrastar pelas “vitrines” de Jericó, semelhantes às que temos hoje, pois apenas os violentos conquistam o Reino, conforme Jesus. A violência dos que seguiam Jesus era não permanecer em Jericó nem levá-la no coração e nem se guiar por suas propostas e doutrinas. Pelo Sacramento do Batismo temos, como Bartimeu, os olhos iluminados para enxergar a realidade da vida presente na Jericó de nossos tempos e optar por fazer parte dessa minoria que é a Igreja, e o é de fato, dada as estatísticas pelo mundo afora. Só permaneceremos nesse grupo de seguidores do Cristo nessa subida à Jerusalém se persistirmos na fé da ressurreição e na esperança da vida bem-aventurada na 5
gloriosa Jerusalém. Caso contrário, faremos de nossa hodierna Jericó o lugar e a ilusão da infinitude, onde poderemos desfrutar o máximo do tempo presente e nem sempre de forma sadia para o corpo e alma. Diz São Paulo: “Se
os mortos não ressuscitam, comamos e bebamos, pois amanhã morreremos” (1Cor 15,32). Portanto, quem não crê na ressurreição dos mortos não renuncia a Jericó que a mídia propõe, qual fascinante cenário de um show de efeitos especiais em nosso “aqui e agora”. Celebrando a nossa fé – o que fazemos neste momento como Igreja reunida – podemos num ato contínuo deitar fora nosso manto de seguranças e ilusões; gritar destemidamente e sempre que necessário ao único mediador entre Deus e os homens para vir em nosso socorro e curar, sobretudo nossa cegueira espiritual, e, somente assim, perseverar no seguimento de Cristo rumo ao festim da Je6
rusalém do alto, que nossa celebração eucarística, de maneira sacramental, já antecipa. Deus nos ajude a todos! Assim seja!
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