Boletim trimestral do Ecomuseu Municipal do Seixal
Museu de território
Nº
Índice
28
. 2003
3.4.5.
9.10.11.12.13.14..
17.
Programa de Iniciativas do Serviço Educativo
Memórias e Quotidianos ... Pelas Freguesias
Notícias
6.
15.16.
Tema de Reflexão Museus,Turismo e Rotas Culturais
Património Cultural do Concelho Quinta de São João: Contributo para o Estudo de Uma Antiga Propriedade Agrícola
7.8.
Conhecer A Colecção Numismática do Ecomuseu Municipal do Seixal
18.19.
Agenda
. AGO. JUL.
Nesta edição trimestral do Ecomuseu Informação os conteúdos e temas tratados procuram, mais uma vez, complementar outras actividades de comunicação e de carácter educativo que o museu programou para os meses a que respeita a edição, enquanto dão sequência à divulgação, quer do acervo museológico e de recursos documentais e de informação geridos pelo museu quer do património cultural do Seixal. Convidamos os nossos leitores a complementarem as informações deste boletim - na versão impressa ou na versão on-line, através de www.cm-seixal.pt/ecomuseu - com uma visita ao nosso site ou uma exploração mais detalhada das suas secções. Os artigos que preenchem as habituais rubricas comprovarão que, confluindo com a museologia, a história e a arqueologia continuam ainda a ser as principais áreas disciplinares de base da investigação e dos projectos interdisciplinares do Ecomuseu, incontornáveis para a sua actividade e para a valorização do seu acervo. O diversificado espectro de campos temáticos e de patrimónios com que lida o Ecomuseu releva as potencialidades de uma reprogramação museológica capaz de aprofundar as linhas apontadas, desde 2000, para o período 2001-2006, no Programa de Qualificação e de Desenvolvimento do Ecomuseu.Tais linhas de orientação deverão brevemente ser analisadas e avaliadas pela Câmara Municipal do Seixal, tendo em conta os recursos mobilizados e numa perspectiva integradora de outras dinâmicas locais, regionais e nacionais. A reflexão iniciada por parte da equipa técnica aponta para que se deve dar particular atenção, enquanto museu de tutela municipal e na perspectiva de vigência de um esperado novo enquadramento legal, às responsabilidades
SET.
arqueológico e histórico, marítimo e industrial
I S S N : 0 8 7 3 - 6 1 9 7 • Depósito Legal: 106175/96 • Tiragem: 6000 exemplares
Ecomuseu Informação
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que devem ser cometidas, não só às autarquias, mas aos organismos centrais, a quem também se exigirão meios e competências descentralizadoras, com benefícios para a rentabilização dos recursos municipais e nacionais e para a democratização da cultura, em que os museus possam, socialmente, desempenhar o devido papel. Considerando que a aplicação da designação “ecomuseu” não particulariza, por si só, a sua missão e objectivos, é através do funcionamento e trabalho regular do museu, da sua acção atenta às preocupações e necessidades, tanto da comunidade local, como principal interlocutor no território, tanto dos utilizadores e visitantes, que evolui e se constrói, no tempo e no espaço, a nossa identidade museológica. Para tal torna-se [...] o museu municipal do cada vez mais necessária uma unidade Seixal tem o concelho por dotada de serviços centrais devidamente espaço de acção. instalados e equipados, de acordo com as Enquanto museu de características e exigências de um museu território - que para uns de território, as solicitações actualmente poderá emergir privileabrangidas pelo museu municipal do Seixal giadamente como arquee as responsabilidades de futuro, inerentes, ológico e histórico, quer ao importante acervo que gere e ao enquanto outros recotrabalho científico que desenvolve quer aos nhecerão particular razão públicos com que comunica ou a que de aprofundamento nos potencialmente se dirige. Para a concretização desse objectivo, assim como campos da temática para os projectos de valorização de fluvío-marítima, ao passo património cujo valor histórico e cultural que as expectativas e transcende o âmbito local, serão interesses de outros necessárias estratégias inovadoras e os realçarão a importância do meios correspondentes. seu acervo industrial - a Seguindo as linhas de orientação duma acção do Ecomuseu museologia “de desenvolvimento”, como a dirige-se, não só à popudesigna e apresenta Hugues de Varine lação concelhia mas a (nomeadamente na sua recente obra Les todos que o visitam e que racines du futur. Le patrimoine au service du interagem com os seus développemnt local, que os interessados serviços [...] poderão encontrar no nosso CDI), o museu municipal do Seixal tem o concelho por espaço de acção. Enquanto museu de território - que para uns poderá emergir privilegiadamente como arqueológico e histórico, enquanto outros reconhecerão particular razão de aprofundamento nos campos da temática fluvio-marítima, ao passo que as expectativas e interesses de outros realçarão a importância do seu acervo industrial - a acção do Ecomuseu dirige-se, não só à população concelhia mas a todos que o visitam e que interagem com os seus serviços, em relação aos quais o museu se adapta e com cujos interesses e preocupações procura convergir, na medida em que possa contribuir para o desenvolvimento local e, consoante as suas possibilidades, para o progresso da museologia na sociedade contemporânea.
Ficha Técnica Ecomuseu Informação nº28
Foto capa - Ateliê Nós e o Rio - © EMS/CDI - Carla Costa, 2003
Edição
Direcção
Grafismo e Revisão
Tiragem
Câmara Municipal do Seixal
Graça Filipe
Sector de Apoio Gráfico e Edições
6000 exemplares
Créditos Fotográficos
0873-6197
EMS/CDI; Rosa Reis; João Martins; Carla Costa; Cézer Santos, Ana Luísa Duarte, AVS, Foto Messias
Depósito Legal
Textos/Investigação
Graça Filipe, João Paulo Santos, Ana Cláudia Silveira, Fátima Afonso, Pedro Estácio, Fernanda Ferreira www.cm-seixal.pt/ecomuseu
Informação/Agenda e Notícias
Carla Costa, Graça Filipe, Jorge Raposo, Luís Filipe Santos
Impressão
SIG - Sociedade Industrial Gráfica
ISSN
106175/96
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Tema de Reflexão
Museus, Turismo e Rotas Culturais A indústria turística, uma das actividades económicas que se perspectiva da maior importância em todo o nosso planeta, nem sempre se serve bem dos museus e, sendo o património cultural e natural um dos recursos, finitos, que o turismo utiliza de forma crescente, colocam-se-nos cada vez com maior pertinência as questões, indissociáveis, de qualidade e de sustentabilidade. Aos museus, em particular, assim como a todas as entidades de algum modo envolvidas e responsáveis pela protecção do ambiente e do património e por um desenvolvimento duradouro, compete discutir as formas e os meios de gestão dos bens culturais, tendo em vista uma gestão integrada da qualidade, em todas as vertentes turísticas orientadas para o património, conciliando economia e conservação, aumentando a qualidade de vida das comunidades e respeitando as culturas locais, desenvolvendo a consciência ambiental e a compreensão da história natural e cultural. Na era da globalização, o sucesso de um destino turístico depende, não só da qualidade de serviços, do profissionalismo e da segurança, como também da autenticidade e da especificidade do sítio. É sobretudo no chamado turismo cultural que emerge um número crescente ou potencialmente elevado de visitantes que, sendo suposto viajarem individualmente ou em pequenos grupos e disporem de menos tempo para um dado lugar - ao contrário, em princípio, do turismo dito de massas - se distinguem pela curiosidade e pelas suas competências de observação e de interpretação e, por isso, pela exigência, em termos de autenticidade e de respeito pelo meio, de cujos recursos esperam usufruir, também, através de contacto e de partilha com a população. Para que Portugal se possa projectar no desenvolvimento dos itinerários turísticos e culturais, como é desejável e já ocorre em numerosos países, particularmente europeus, os museus precisam de ver o seu papel valorizado e reforçado, integrando-os, com outros recursos patrimoniais e culturais, em diversas rotas - temáticas ou de território, ao nível de regiões ou intermunicipais, ao nível do país ou transnacionais em que seja aproveitada a sua vocação educativa e de interpretação, de acolhimento e de comunicação com variados públicos. Sem dúvida muitas acções haverá para colocar em prática, se por exemplo forem criativa e organizadamente exploradas as Leis nº 10 e nº 11/2003, de 13 de Maio, no que concerne às atribuições e competências das áreas metropolitanas e das comunidades intermunicipais de direito público, relativamente às redes de unidades museológicas e de desenvolvimento turístico. Para além das suas próprias actividades, particularmente exposições, os museus possibilitam múltiplas parcerias na concepção e na criação de centros de interpretação, indispensáveis à apresentação integrada e à valorização dos patrimónios, sítios, paisagens, actividades e modos de vida com que se relacionem.A interpretação, classicamente definida (F. Tilden, 1957) como uma actividade educativa que pretende revelar significados e inter-relações através do uso de Moinho de Maré de Corroios objectos originais, por um contacto © EMS/CDI - AVS, 1995 directo com o recurso ou por meio de ilustrações, não se limitando a dar uma mera informação dos factos exige conhecimento, seja qual for o âmbito temático ou geográfico, desde logo para fundamentar os critérios de selecção inerentes a qualquer projecto - itinerário, percurso, rota, sítio valorizado - assim como para os produtos de divulgação e de difusão complementares, ora os tradicionais ora os que incorporam as novas tecnologias de informação.Também neste campo, segundo as normas de acesso e respeitando os direitos ética e legalmente exigíveis, devem ser aproveitados os recursos e a produção de conteúdos que inúmeros museus colocam hoje à disposição da indústria turística, para uma ampla fruição dos públicos e um alargado reconhecimento social.
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A Colecção Numismática do Ecomuseu Municipal do Seixal Introdução A moeda surgiu como resposta à necessidade de desenvolvimento da actividade comercial, ultrapassando as limitações inerentes ao sistema de troca directa de bens. As primeiras moedas, que em terminologia numismática se designam por “moedas primitivas”, procuravam reproduzir a forma das mercadorias. Foi um longo período de transição, de durabilidade temporal muito variável, consoante as regiões do Mundo, em que foi procurada a conciliação entre a necessidade de encontrar espécies “monetárias” mais fáceis de transportar e quantificar, mas também de promover a sua aceitação nos circuitos comerciais ainda fortemente ligados à imagem da troca directa de mercadorias. A forma discóide que hoje é característica da quase totalidade das moedas em circulação no Mundo (as raras excepções podem ser encontradas nos sistemas monetários de alguns países da Ásia e da Oceânia) terá surgido pelo século VII a.C., em Lídia (Ásia Menor) ou em Égina (Grécia). As primeiras moedas de forma discóide apresentavam figuração de divindades ou distintivos das povoações ou territórios emissores. Excedendo a mera função comercial, a moeda ou, mais precisamente, o direito de cunhagem, tornou-se um símbolo de soberania. Seriam os Romanos, já desde o Período Republicano, a tornar a moeda num poderoso meio de propaganda política. Ainda na Época Romana surgiu um culto mortuário com reminiscências que perdurariam muito para além da desagregação do Império. O Óbulo a Caronte, ou seja, o pagamento ao barqueiro que transportava os espíritos dos falecidos até ao País dos Mortos (Hades), manifestava-se pela colocação de uma moeda na boca do defunto, para que este pudesse pagar a travessia, sob pena de ficar perdido para sempre. Em plena Idade Média, ainda podemos encontrar reminiscências deste culto, se bem que as moedas fossem colocadas na vala de enterramento, junto dos corpos e, num caso concreto, entre os dedos do cadáver. Na necrópole da Quinta de S. Pedro, na freguesia de Corroios, encontraram-se vestígios destas práticas.
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A colecção do Ecomuseu municipal é constituída por cerca de 230 numismas, cunhados ao longo dos últimos dezoito séculos. As moedas mais antigas remontam ao Império Romano, no período compreendido entre os séculos II e IV da Era Cristã. Existe ainda um interessante e numeroso conjunto monetário da Primeira Moeda romana, em bronze, cuDinastia portuguesa, do período nhada em honra de Flavius Iulos compreendido entre os anos de Crispus, César entre 317 e 326. Inv. EMS 1999.286 © EMS/CDI 1 2 23 e 1367 (reinados de Cézer Santos, 2002 D. Sancho II, D. Afonso III, D. Dinis, D. Afonso IV e D. Pedro I). A Segunda Dinastia, no período compreendido entre 1385 e 1578, está representada por algumas boas peças dos reinados de D. João I, D. Duarte, D.Afonso V, D. João II, D. Manuel I, D. João III e D. Sebastião. Os exemplares da Quarta Dinastia são poucos e comuns, tendo sido cunhados nos reinados de D. João V, D. José I, do Príncipe Regente D. João (futuro D. João VI) e D. Luís I. Completam a colecção alguns numismas da República Portuguesa, um deles proveniente do antigo território ultramarino de Moçambique e um pequeno número de moedas estrangeiras (de Espanha, França e dos antigos territórios britânicos na região da Malásia). Nesta considerável colecção, existem alguns exemplares dignos de destaque.
Conhecer
A colecção do Ecomuseu Municipal do Seixal
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Seguindo a ordem cronológica, começaremos por salientar Dinheiro de D. Dinis (1279-1325), em duas bonitas moedas de bolhão, Inv. EMS 2003.00001.00002 © EMS/CDI - Cézer Santos, 2002 bronze, cunhadas na época do Império Romano. A primeira foi cunhada em nome de Crispus, filho do imperador Constantinus I, entre os anos de 317 e 326 da Era Cristã. Realce para o excelente estado de conservação, mas também para a excelente cunhagem, particularmente da efígie, realizada na oficina monetária de Treveri (actual cidade de Trier, na Alemanha). Temos ainda uma moeda póstuma, cunhada em nome do citado imperador Constantinus I. Sendo um exemplar muito mais comum que o anterior, é no entanto de salientar o seu bom estado de conservação. O conjunto de numismas da Primeira Dinastia é notável, não apenas pelo número de exemplares, mas ainda pela raridade dos mesmos, havendo mesmo fortes probabilidades de existirem peças inéditas. Todas as peças deste período são “dinheiros”, moedas cunhadas em bolhão, liga pobre de cobre e prata. A raridade de alguns exemplares está relacionada com a legenda do reverso, seja pela morfologia de algumas letras, seja pelo ponto em que começa a própria legenda (PO RT UG II até ao reinado de D. Afonso III, AL GA RB II nos reinados seguintes). No entanto, e apesar de serem necessários estudos mais aprofundados após a complexa Ceitil de D. Afonso V (1438-1481), em limpeza da peça, existe a probacobre, Inv. EMS 2003.00001.00001 © EMS/CDI - Cézer Santos, 2002 bilidade de uma das moedas do reinado de D. Dinis apresentar uma marca monetária (de oficina ou de moedeiro) no anverso, o que, a confirmar-se, seria um caso inédito nos numismas da Primeira Dinastia. Ainda do reinado de D. Dinis, temos uma moeda interessante e pouco comum, com a cruz do anverso morfologicamente muito semelhante à Cruz da Ordem Militar do Templo. De entre os ceitis batidos no reinado de D. Afonso V, merece relevo um provável exemplar inédito, que apresenta uma morfologia do castelo e ondas do anverso não mencionada no exaustivo estudo de Francisco A. Costa Magro ( “Ceitis”, Ed. Instituto de Sintra, Sintra, 1986). Embora não inéditos, temos ainda outros ceitis muito raros deste reinado, quer pela morfologia da figura do anverso, por sinais nas legendas (e aqui, não podemos deixar de referir uma magnífica Cruz de Malta num numisma muito bem Meio Real ou meio vintém de conservado) ou mesmo marcas D. Manuel I (1495-1521), em prata, monetárias, da oficina ou do Inv. EMS R.1994.91 © EMS/CDI - Cézer Santos, 2002 próprio moedeiro. Salientamos também dois ceitis relacionados com as campanhas africanas promovidas por aquele rei. Por curiosidade, mencionaremos ainda uma moeda que evidencia ter sido batida duas vezes, provavelmente por as figuras terem ficado descentradas ou pouco nítidas após a primeira batida. As únicas moedas portuguesas de prata existentes na colecção foram cunhadas no reinado de D. Manuel I. Pouco comum é o ceitil de D. João III batido em Beja.
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... Pelas Freguesias Este é um trimestre em que o quotidiano municipal, em todas as freguesias do Concelho, é sucessivamente marcado por actividades e animações de rua, de cariz profano, mas ligadas ou realizadas a pretexto de eventos religiosos, como foi a procissão de S. Pedro, no Seixal, no feriado municipal, ou como os festejos em honra de Nossa Senhora de Monte Sião, em Amora. Para além da participação local, este período atrai certamente visitantes exteriores. Nem sempre são dadas a conhecer as origens históricas, nem se revelam as memórias das comunidades concelhias, de tão variadas proveniências e referências culturais. Esse poderá continuar a ser um dos desafios das chamadas festas populares do Concelho, perspectivando a mudança como processo enriquecedor dos quotidianos e das memórias. Entretanto, o Ecomuseu Informação leva até aos seus leitores breves notas de carácter cronológico, com o simples intuito de lhes dar a conhecer um pouco do nosso território comum e da história das freguesias do concelho do Seixal, que actualmente o configuram administrativaProcissão de S. Pedro © EMS/CDI - Rosa Reis, 2000 mente.
Em 1581, são lavrados os primeiros assentos na paróquia de Arrentela. Esta paróquia, que se localizava no termo de Almada, integrava também os lugares de Amora, Paio Pires e Seixal. Sendo esta uma povoação localizada junto ao rio, o seu desenvolvimento foi condicionado pelo mesmo. Paralelamente às actividades ligadas ao rio, como por exemplo a construção naval e a pesca ou até mesmo a moagem em moinhos de maré (por volta de 1733 existiam 7 moinhos de maré na freguesia), as marinhas de sal (de que há notícias de algumas pertencentes aos frades Jerónimos de Belém), predominava também a agricultura, principalmente a vinha. O território era constituído maioritariamente por quintas, muitas pertencentes à nobreza e ordens
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Em 1580, é lavrado o 1º assento de Baptismo na paróquia de Corroios cujo orago é N. Sra. da Graça. A paróquia de Corroios integrava para além da Igreja Matriz, destruída pelo Terramoto de 1755, a ermida de Stº António da Olaia na Quinta do Rouxinol (onde se encontram os vestígios arqueológicos de uma antiga olaria romana, datados dos séculos II-IV d.C., classificada, desde 1992, como Monumento Nacional).Após 1755, esta ermida acolheu as celebrações religiosas até à reabertura ao culto da Igreja Matriz. Refira-se igualmente a ermida de Stª Marta de Corroios cujas festas em honra da padroeira atraíam anualmente, entre 28 e 29 de Julho, muitos fiéis em romaria provenientes de localidades como Caparica, Amora, Arrentela e Almada. Com a implantação da República em 1910 e o encerramento da ermida, perdeu-se o culto de Stª Marta e a tradicional romaria.
Memórias e Quotidianos
As primeiras referências que conhecemos a localidades que integram actualmente o concelho do Seixal remontam à época da Reconquista. Fernão Lopes, em 1384, na Crónica de D. João I, faz referência aos lugares de Arrentela e Amora localizados junto ao esteiro do Tejo também referido como Rio Judeu. Um dos principais núcleos de povoamento do período medieval-moderno localiza-se nos terrenos da actual Quinta de S. Pedro (Corroios), testemunhado pela descoberta de uma necrópole na sequência dos trabalhos de sucessivas campanhas arqueológicas iniciadas em 1994.
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religiosas. Em 1399, o Convento da Trindade, que tinha propriedades no Seixal, troca a sua quinta em Arrentela por bens em Lisboa. Em 1404, Nuno Álvares Pereira doou alguns bens ao Convento do Carmo, e neles se incluiu os esteiros de Arrentela, Amora e Corroios - onde mandou edificar o moinho de maré da Quinta do Castelo, Corroios (actual núcleo do EMS) - que lhe haviam sido aforados no ano anterior . O Compromisso da Confraria da N. Sra. do Monte Sião, orago da paróquia de Amora, remonta a 1538, datando de 1608 os primeiros assentos lavrados na paróquia.A constituição da paróquia condicionou o povoamento da região onde se terão constituído vários núcleos populacionais com destaque para o lugar de Cheira Ventos, também designado por Amora Velha, onde se localizam algumas das principais quintas da nobreza, nomeadamente as quintas da Princesa e Cheira Ventos, que foram propriedade da Casa de Bragança. Nas quintas de Amora há referência à produção de vinhos de qualidade reconhecida. Em 1583, no primeiro livro de Baptizados da freguesia de Arrentela, o Seixal é denominado “vila” que Frei Agostinho de Stª Maria caracteriza, entre 1707-1723, como uma povoação em que “quasi todos aquelles moradores são marítimos e pescadores”, observando ainda que “he hoje o mayor, e mais populoso lugar daquella freguesia” [Arrentela]. Cerca de 1733 existe a referência a um hospital localizado no Seixal. No ano de 1734 foi criada a paróquia do Seixal.
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Memórias e Quotidianos
Ao longo de séculos, em terrenos situados na margem esquerda da ribeira de Coina, foram-se implantando várias quintas (entre as quais, a Quinta de Cucena, onde no início do séc. XVI existia uma estalagem destinada a apoiar os viajantes que se dirigiam para o Sul do País; a Quinta da Palmeira e a Quinta de Fernão Ferro, adquiridas nesse mesmo século pelos frades Jerónimos do Convento de Santa Maria de Belém, permanecendo na sua posse até à extinção das Ordens Religiosas), dando origem a núcleos de exploração agrícola de maiores ou menores dimensões e a pequenos povoados - entre os quais se destacava a Aldeia de Paio Pires disseminando-se numa paisagem eminentemente rural envolvida por vastas manchas de coberto florestal. No séc. XVIII, comprovando a realização de romarias de devoção a N. Sra. da Anunciada na Aldeia de Paio Pires, foram concedidas pelo Papa Pio VI indulgências perpétuas aos fiéis que visitassem a ermida nos dias da Anunciação de Nossa Senhora e do mártir São Sebastião (apesar de ter aí existido uma ermida, a construção da actual igreja teve início em 1770). Após um processo moroso, que teve início com uma exposição dos moradores apresentando queixa pelos incómodos resultantes dos maus caminhos a percorrer até à igreja de N. Sra. da Consolação de Arrentela, e provando a sua capacidade de isoladamente garantirem o sustento do seu próprio pároco, constando a côngrua paroquial na entrega anual de três potes de vinho em mosto por cada um dos sessenta e um fazendeiros que aí residiam, o que denota a importância da actividade agrícola na freguesia. Em 26 de Setembro de 1802, foi erigida a nova paróquia por decreto de D. José II, Cardeal Patriarca de Lisboa, e realizada uma missa na igreja de N. Sra. da Anunciada da Aldeia de Paio Pires, desanexando-a definitivamente da jurisdição eclesiástica da paróquia arrentelense. Com a reforma administrativa colocada em curso pela lei de 25 de Abril de 1835, regulamentada a 18 de Julho do mesmo ano, foram criadas as freguesias de Amora, Arrentela, Paio Pires e Seixal que mantiveram a estrutura territorial das paróquias já existentes. Com elas foi criado o concelho do Seixal, a 6 de Novembro de 1836. Em 1895 o concelho do Seixal foi extinto, ficando a freguesia de Amora anexada a Almada e as freguesias de Seixal,Arrentela e Paio Pires anexadas ao Barreiro, sendo restaurado três anos mais tarde. Só em 1976 foi criada a freguesia de Corroios que até então integrava a freguesia de Amora. Decorrente da actualização administrativa do território municipal ocorrida em 1993, comemora-se no corrente ano o 10º aniversário da elevação a cidades de Amora e do Seixal (esta constituída pelas freguesias de Seixal e de Arrentela), bem como da criação da vila de Corroios e da freguesia de Fernão Ferro.
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A Igreja Paroquial de Arrentela foi classificada de Imóvel de Interesse Público em 1977. Salienta-se a importância artística do tecto, do altar-mor e do órgão do século XVIII. O mesmo foi construído por Joaquim Xavier Machado e Cerveira, considerado pelo jornal local Tribuna do Povo “um dos maiores, senão o maior construtor de órgãos que já houve em Portugal”. Foi terminado em 23 de Outubro de 1794 de acordo com uma inscrição existente no interior da caixa. A igreja, cujo orago é N. Sra. da Consolação, foi reedificada em 1757 após a sua destruição pelo Terramoto de 1755. Foi a partir desta data que se iniciou o culto à N. Sra. da Soledade, quando no “dia do terramoto que depois de caída a Igreja toda, que sendo de abóbada fazia dentro dela semelhança de Serra, se achou lugar desembaraçado para se tirar da sua tribuna, e posta em um andor se continuou uma procissão de penitência para a borda da Praia, e vindo o mar em bramidos, e empoladas ondas em uma excessiva altura fora do seu natural curso, à vista da Imagem sossegou, e não excedeu do natural coisa alguma em toda esta Ria; por cujo prodígio se celebra nestes anos uma acção de graças à mesma Senhora levando-a em procissão pela mesma praia.” (in Dicionário Geográfico de Portugal, vol.V, de Padre Luís Cardoso). Esta acção de graças transformou-se na principal festividade de Arrentela, celebrada, anualmente, a 1 de Novembro. A paróquia do Seixal já antes da sua criação tinha um templo. Em 1500 foi referenciada a construção de uma ermida em honra de N. Sra. da Conceição e, mais tarde, em 1726, o primeiro patriarca de Lisboa, D. Tomás de Almeida, concedeu licença para a edificação da que viria a ser a Igreja Matriz da paróquia do Seixal, a qual viria a ter a mesma padroeira da ermida. Ambos os edifícios ficaram destruídos durante o Terramoto de 1755. Em 1756 já existem referências de celebrações realizadas na ermida, reconstruída entretanto. A reconstrução da igreja demorou mais tempo, estando apenas pronta no ano de 1762. Em 1904, a igreja foi sujeita a obras de restauro, durante as quais o pintor Pereira Cão executou uma pintura no tecto, representando a padroeira, N. Sra. da Conceição. As imagens de S. Pedro e S. Paulo que também se encontram pintadas no tecto são mais antigas, da autoria do pintor seixalense José Coelho. A principal festividade local está precisamente relacionada com S. Pedro. No dia 29 de Junho, celebra-se no Seixal a Festa de S. Pedro, padroeiro dos pescadores. Tradicionalmente organizam-se celebrações religiosas, a Marcha das Canas e ainda arraiais populares. Entre as várias actividades de cariz cultural realizadas no Seixal, referencia-se também a “Festa das Árvores” celebrada em 1907, sendo a primeira do género em Portugal. Em meados do séc. XIX, após se procederem a obras de melhoria e ampliação do templo de N. Sra. da Anunciada da Aldeia de Paio Pires, teve início a celebração anual das festas em honra da padroeira no primeiro Domingo de Agosto, realizando-se as comemorações religiosas e os arraiais populares no adro da igreja abrilhantados, a partir de 1883, pela sociedade filarmónica da terra. Com o passar do tempo, foram-se associando as celebrações religiosas aos festejos profanos. A mais recente freguesia do Concelho, Fernão Ferro, celebra no final do mês de Julho as festas em honra da N. Sra. da Boa Hora. Em 1834, com a extinção das Ordens Religiosas, os pinhais, terras de cultivo e casas da Palmeira e do Casal de Fernão Ferro foram vendidos em hasta pública sendo, mais tarde, adquiridos pelo cidadão inglês Abraham Wheelhouse, que se tornou assim proprietário de vastos terrenos na zona do actual concelho do Seixal. Por volta de 1848, a sua filha, Georgina Wheelhouse, contraiu matrimónio com José Joaquim de Almeida Lima, recebendo no dote da esposa as quintas da Palmeira e de Fernão Ferro. Estas propriedades permaneceram na posse da família Almeida Lima até ao início do séc. XX, altura em que foi realizado o emparcelamento de terras em Fernão Ferro também designado por Pinhal do Lima - entregues à exploração por rendeiros através de contratos de enfiteuse, transferindo o domínio útil das parcelas de terra para as famílias que aí se instalaram, cuja população activa era essencialmente constituída por lenhadores e agricultores, que se dedicaram ao desbravamento de matos e cultivo das terras, implementando sobretudo a viticultura, ficando obrigados ao pagamento anual de uma certa pensão determinada pelo proprietário das terras. Este tipo de explo-
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ração da terra através de enfiteuse só terminou em 1957, após cerca de dez anos de queixas por parte dos rendeiros devido às várias tentativas de despejo que lhes foram movidas pelos senhorios das terras, quando o Governo decidiu intervir e decretar a expropriação por utilidade pública dos terrenos da Quinta de Fernão Ferro [DecretoLei n.º 33.917, de 20.11.1957].
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Memórias e Quotidianos
Em 1948, tem início a “questão de Fernão Ferro” relativa à disputa de tutela administrativa e territorial entre o concelho do Seixal (até então, Fernão Ferro encontrava-se integrado na Freguesia de Arrentela) e o concelho de Sesimbra, este último baseando a sua pretensão em fundamentos históricos. Esta questão irá arrastar-se durante cerca de uma década. Em 1981, a Associação Dinamizadora para a Urbanização Fontanário de Fernão Ferro © EMS/CDI - Maria João Cunha, 2002 de Fernão Ferro foi criada com o objectivo de acompanhar e colaborar no plano de reconversão urbanística, contribuindo para a resolução de problemas vários, nomeadamente a nível da inexistência de infra-estruturas básicas numa população crescente que, em 1985, contava já com cerca de 4000 habitantes. Finalmente, a mais recente freguesia do Concelho, a Freguesia de Fernão Ferro, foi criada em 27 de Maio de 1993 por aprovação da Assembleia da República e, enquadrada pela Lei nº 91/95, nas áreas urbanas de génese ilegal existentes no País, tendo como objectivo a reconversão dos loteamentos ilegais. A instalação da Siderurgia Nacional na Aldeia de Paio Pires - decisão que exigiu a expropriação urgente por utilidade pública dos terrenos, nos quais se situava, entre outras, a Quinta da Palmeira, propriedade da família Almeida Lima - e o crescimento urbano de génese ilegal em Fernão Ferro, foram factores determinantes para a significativa metamorfose da fisionomia destas freguesias, até então caracterizadas por uma paisagem ruralizada. A indústria desenvolve-se principalmente a partir do século XIX, predominando, entre outras, as indústrias têxtil, vidreira, corticeira, polvoreira e siderúrgica. Em 1855, sob a direcção de Julio Caldas Aulette, fundou-se a Companhia de Lanifícios de Arrentela que se manteve em funcionamento até à década de 80 do século XX. Em 1888 instalou-se nos terrenos das quintas das Lobatas (antiga propriedade da família de Pedro Eanes de Lobato) e Maria Pires, junto à zona ribeirinha de Amora (actual Avenida Silva Gomes), a Companhia das Fábricas de Garrafas de Amora, da qual subsiste o antigo bairro, que serviu inicialmente de residência aos operários e mestres garrafeiros. Outrora designados por “correnteza dos ferros”, os edifícios destacam-se na paisagem urbana pela simetria da sua arquitectura e pela escala integrada na orla ribeirinha. Alvo de recentes alterações em função da reutilização para fins comerciais, receia-se pela preservação do bairro e dos testemunhos da vida social de outros tempos. Dez anos mais tarde, em 1898, estabeleceu-se em Vale de Milhaços, na actual freguesia de Corroios, a Companhia Africana de Pólvora. Em 1916 foi fundada a Fábrica de Pólvora Lusitana, na quinta da Barroca, em Amora, que se transformou, em 1928, na Sociedade Portuguesa de Explosivos. Após a grave explosão, ocorrida em 1948, que destruiu grande parte das instalações, decidiu-se a sua transferência e instalação em Pinheiro da Cruz - Santa Marta de Corroios. No início do século XX desenvolve-se a indústria corticeira com o estabelecimento da L. Mundet & Sons, em 1905 e, mais tarde, da C. G.Wicander, ambas na antiga vila do Seixal. As duas fábricas marcaram a paisagem do seu núcleo urbano, determinando o aparecimento de uma comunidade local corticeira em detrimento da tradicional comunidade piscatória. A importância da indústria corticeira no Concelho é atestada pelo número considerável de outras unidades de produção que foram surgindo no decorrer do século XX nomeadamente na Amora, das quais se destacam a sucursal da Mundet, instalada em 1917 nos ter-
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renos da antiga moagem a vapor, na zona ribeirinha, e a empresa de Produtos Corticeiros Portugueses, fundada em 1935, à qual sucedeu a Queimado e Pampolim, Lda., em 1953 (instalada numa parte do perímetro da histórica Fábrica de Vidros e de Garrafas da Amora. Em 1961 teve início a laboração da Siderurgia Nacional, SA, instalada nos terrenos de antigas quintas, das quais se destaca a Quinta da Palmeira, na freguesia de Aldeia de Paio Pires. O desenvolvimento industrial verificado a partir do século XIX e o consequente crescimento e consolidação do operariado no Concelho contribuem de forma inequívoca para a constituição das várias sociedades filarmónicas e recreativas que então surgiram. Em 1848 foi criada a Sociedade Filarmónica Timbre Seixalense, cuja banda filarmónica era constituída por operários da construção naval. Na sequência de dissidências internas, influenciadas também pela conjuntura política da altura, alguns membros desta sociedade formaram em 1871 uma nova sociedade, a Sociedade Filarmónica União Seixalense, ficando esta conhecida como a “Música Nova” e a anterior por “Música Velha”. O coreto da Sociedade Filarmónica União Seixalense foi inaugurado em 1879, no Largo Luís de Camões e, em 1905, foi construído o coreto da Sociedade Filarmónica Democrática Timbre Seixalense, no Largo da Igreja, demolido em 1966. Na Arrentela foi fundada, em 1872, a Sociedade Filarmónica Fabril Arrentelense, por um grupo de operários da Companhia de Lanifícios de Arrentela. Poucos anos mais tarde fundou-se a Sociedade Filarmónica Honra e Glória Arrentelense. Em 1914, ocorre a fusão das duas sociedades, dando origem à Sociedade Filarmónica União Arrentelense (SFUA) que continuou a ter como principal actividade a música, tendo a Banda Real Filarmónica Fabril Arrentelense recebido o diploma de 1º prémio nos Jogos Florais da Cidade de Lisboa, em 1908, concedido pelo Real Instituto de Lisboa. Actualmente, um dos principais acontecimentos é o Festival de Bandas Filarmónicas, evento anual, que se realiza desde 1989. Em 1905 foi cedido à Real Sociedade Filarmónica Fabril Arrentelense o terreno onde construiu o coreto (actualmente inexistente), junto à actual Avenida da República, tendo sido remodelado no final da década de 30 do século XX.
Banda da SFUA © EMS/CDI
Em 1881, na freguesia de Aldeia de Paio Pires foi fundada uma sociedade filarmónica com sede na Rua Direita junto à escola pública que, mais tarde e após aquisição dos necessários instrumentos musicais, será a génese da Sociedade Filarmónica União Capricho Aldeiense. No entanto, com o advento do regime republicano, a sociedade filarmónica passa a chamar-se Sociedade Musical 5 de Outubro. Em 1928 foram aprovados os estatutos da sociedade e, em 1930, foi construído por subscrição pública o seu coreto, sito no actual Largo D. Paio Peres Correia.
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A Sociedade Filarmónica Operária Amorense, fundada em 28 de Junho de 1898, tem a sua génese intimamente associada à instalação e vivência da Companhia de Vidros de Amora, tendo sido fortemente impulsionada e influenciada pelo seu operariado. Entre 1946 e 1947, a Sociedade passa a funcionar na Verbena (actual Rua S. F. O. A.), num edifício entretanto desaparecido, localizado frente ao actual edifício, inaugurado em 1958, em terreno cedido por D. Branca Saraiva de Carvalho, e resultado do empenho e trabalho voluntário de um grande número de associados. Em 19 de Junho de 1907 foi inaugurado o coreto de Amora, localizado em pleno Núcleo Urbano Antigo da Amora de Baixo, no actual Largo 5 de Outubro. Os meios necessários à Antiga srde da SFOA (Foto Messias) sua construção foram obtidos graças a uma subscrição pública levada a cabo por uma comissão de amorenses, tendo posteriormente a população decidido oferecê-lo à Sociedade Filarmónica Operária Amorense. Este coreto foi considerado, tal como o de Aldeia de Paio Pires, como património cultural de valor concelhio pela Assembleia Municipal do Seixal em 1995. Facilmente identificáveis por um palanque de planta octogonal e cobertura sustentada por oito colunas de ferro rebordada em ferro fundido, rematado exteriormente por uma lira, destacam-se ainda os balaústres de ferro fundido do guarda-corpo, cujos motivos decorativos evocam os bons vinhos e o ambiente campestre das redondezas, sendo o coreto de Paio Pires revestido a azulejos. O movimento desportivo ganhou alento no Concelho com a fundação de vários clubes. Em 1913, foi criado o Sport Lisboa e Seixal e, em 1921, o Amora Futebol Clube. 1925 foi o ano da criação de vários clubes - o Seixal Futebol Clube, o Independente Futebol Clube Torrense, o Portugal Futebol Clube Aldeiense (mudando mais tarde a designação para Paio Pires Futebol Clube) e o Arrentela Foot-Ball Club (que passou a desigCoreto de Amora (fotografia cedida por Amélio Cunha) nar-se por Atlético Clube de Arrentela a partir de 1943). Data dos anos 30 do século XX a construção das primeiras estruturas de apoio à prática desportiva edificadas no perímetro fabril da Mundet do Seixal. Por estas se revelarem exíguas, foram inaugurados em 1951 a sede e campo de jogos do Grupo Desportivo Mundet, possibilitando a recreação e a prática de diversos desportos, como a patinagem artísticas, hóquei patinado, basquetebol, voleibol, entre outras. Em 1946, na freguesia de Corroios, foi criado o Ginásio Clube de Corroios, sendo a sua sede construída no início da década de 50 do século XX. No final da década de 70 do século XX foi fundado o Clube Desportivo e Recreativo de Fernão Ferro e, em 1982, foi inaugurado o Sport Juventude de Fernão Ferro. Após o 25 de Abril, o movimento associativo consolida-se e desenvolve-se no Concelho, fenómeno atestado pela fundação de inúmeros clubes desportivos, recreativos e culturais, que dão continuidade às tradições do nosso Concelho no domínio da música e da arte dramática, entre diversas actividades.
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A importância que a actividade agrícola assumiu ao longo dos séculos no território que hoje se integra no concelho do Seixal encontra-se atestada pela existência de inúmeros vestígios de quintas, muitas das quais hoje desaparecidas, onde frequentemente se associavam funções económicas inerentes à produção agrária e actividades de lazer que ocupavam os respectivos proprietários. A Quinta de São João foi uma das propriedades que se constituiu junto à Arrentela. Ainda que a ocupação humana do local remonte à Arrentela época romana, comprovada por achados arqueológi• Quinta de São João cos dos anos 50 do século XX e, mais recentemente, por investigação do serviço de arqueologia do Ecomuseu, data de 1758 a primeira referência de que temos conhecimento e que expressamente menciona a ermida de São João: a resposta do pároco de Arrentela ao inquérito enviado aos párocos de todo o País na sequência do Terramoto de 1755 alude à ermida de São João, que estaria “anexa à Quinta chamada de Castello Picão, que era de um Tabelião chamado Manoel de Quinta de São João, Arrentela © EMS/CDI - Ana L. Duarte, 2001 Oliveira, e agora de seus herdeiros”. Cruzando esta referência com outras de que dispomos, chegamos à conclusão que o topónimo “Castelo Picão” era já utilizado no século XV: na acta da visitação redigida na sequência da deslocação efectuada em 1488 pelos comendadores da Ordem de Santiago às igrejas de Almada, mencionam-se as propriedades pertencentes à colegiada das igrejas almadenses, entre as quais constava uma casa na Arrentela situada “onde chamom castel picom”. Encontramos igualmente referências a esta propriedade nos Livros de Décimas existentes no Arquivo Histórico Municipal de Almada.Aí se registava a contribuição paga, desde Setembro de 1641, por todos os proprietários, excluindo os eclesiásticos, e que inicialmente se destinava a suportar as despesas inerentes à manutenção de um exército que assegurasse a defesa dos ataques castelhanos, na sequência da Revolução de 1640. Assim, em 1704 e em 1705, entre os proprietários da “Torre de Arrentela”, faz-se referência a Manuel de Oliveira, o que confirma as indicações fornecidas posteriormente pelo pároco de Arrentela, às quais já aludimos. Em 1795, a Quinta pertencia ao Conde da Cunha, D. José Vasques da Cunha, Comendador da Ordem de Cristo, membro do Conselho Real, Trinchante Mor da Casa Real, enquanto administrador do Morgado instituído por Fernão Álvares da Cunha. Era explorada por Antónia Maria Caetana, viúva de Caetano Rodrigues Franco, em virtude de um contrato de aforamento celebrado com o Conde da Cunha, pelo qual se comprometia a pagar o foro de seis mil réis anualmente, acrescidos de duas galinhas e de um cesto de uvas. Compunha-se então a propriedade de casas térreas, ermida, fornos de cozer pão, adega, existindo um pátio fechado em torno do qual se dispunham outras acomodações.Além de árvores de fruto de várias qualidades, pertenciam à quinta uma vinha e uma terra chamada “o Morgadinho”, onde existiam alguns pés de oliveiras. A Quinta de São João confrontava com a estrada pública, com a Quinta da Alagoa Seca e com uma vinha dos herdeiros do Sargento Mor, Carlos José Vieira da Silva. Por escritura celebrada a 29 de Abril de 1840, sabemos que o contrato de aforamento
Património Cultural do Concelho
Quinta de São João: Contributo para o Estudo de Uma Antiga Propriedade Agrícola
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que regulava a exploração da propriedade, situada no sítio de Castelo Picão, pertencia então a Gregório José da Silva e a sua mulher Dona Cândida Benedita da Silva Nobre, neta de Caetano Rodrigues Franco e de Antónia Maria Caetana, por herança familiar e pela renúncia de sua prima Mónica Justina Norberta Severa, casada com João Coelho de Abreu. Nessa data, acorda-se a transmissão do contrato para este último casal. Compunha-se agora a propriedade de casas nobres, de dois pisos, com serventia para um pátio onde se localizavam a cavalariça, o celeiro, o lagar, a lagariça, uma ermida e a casa do forno. No pátio, localizava-se ainda o portão principal, que fazia a ligação com o caminho público que se dirigia de Arrentela para a Aldeia de Paio Pires. Já no século XX, a Quinta de São João foi adquirida por Manuel de Almeida, conhecido como o Cavadas, permanecendo até há pouco tempo na posse da família. De todos os imóveis que constituem o núcleo primitivo da Quinta de S. João, apenas é possível datar, com bastante certeza, a ermida. Gravada sobre a verga da moldura da porta, encontra-se a inscrição “1744”, provavelmente assinalando o ano de conclusão da obra. Com uma margem de erro aceitável, poder-se-á situar a época de construção do conjunto pela década de 40 do século XVIII. No entanto, sabendo-se que a zona de Arrentela sofreu um forte abalo, por ocasião do terramoto de 1 de Novembro de 1755, não é de excluir a possibilidade de estragos e subsequentes obras de recuperação nas casas da Quinta de S. João, que poderiam motivar eventuais alterações à traça original. No caso concreto da habitação principal, a traça do imóvel indicia que o mesmo seja bem mais recente do que os restantes edifícios do conjunto. Morfologicamente, os edifícios apresentam linhas muito simples, características da maioria das construções de carácter rural. Contudo, existe uma sugestão de alguns eixos de simetria nos alçados, a que não será alheia a influência das tendências arquitectónicas e urbanísticas do período barroco. A decoração é bastante sóbria, se exceptuarmos as aplicações azulejares e as cantarias mais trabalhadas da capela. No que respeita à azulejaria, existem dois núcleos interessantes: a capela e o jardim. A primeira foi transformada em habitação na primeira metade do séc. XX, tendo sido removido o altar e o santo patrono. Posteriormente, beneficiou de obras, aliás nunca concluídas, visando a recuperação da função primitiva, tendo então o espaço correspondente ao altar sido preenchido com silhar de azulejos contemporâneos da intervenção (padrão estampilhado com motivo “bicho da praça”, azul e branco). Na área restante de parede, mantém-se a azulejaria original, constituída por silhar ornamental (albarradas), correspondente à data de 1744 assinalada na porta principal - o revestimento azulejar apresenta algumas lacunas e problemas de montagem, mas conserva a coerência e valor de conjunto, quer por se encontrar no local original quer porque não é conhecida situação similar no Concelho. Em termos gerais, a decoração do jardim aponta para meados do século XX e é composta por banco e fonte revestidos de azulejos, composição ornamental parietal de embrechados e nicho com registo de azulejos com o nome da Quinta e a representação do santo patrono, já desaparecido. Existem ainda pilares de suporte de latada revestidos de azulejos que copiam, por vezes em miniatura, motivos ornamentais da azulejaria tradicional. Os vãos dos alçados que não estão voltados para o pátio apresentam-se (nos imóveis mais antigos) pequenos e a cota elevada, como era habitual em zonas rurais mais ou menos isoladas, por questões de protecção. Menos usual é a distribuição espacial das construções. De facto, o pátio apresenta uma forma trapezoidal, quase triangular, em vez da tradicional forma quadrangular regular. A confirmar-se a relação entre a ermida de S. João e o topónimo “Castelo Picão”, e se considerarmos alguns aspectos que se afastam das habituais tipologias deste tipo de edificações, tais como o curioso ângulo formado pela habitação principal e pela habitação do pessoal, que permite uma perfeita visibilidade sobre o portão existente entre as duas construções, hoje entaipado; ou a incaracterística orientação da capela (Norte-Sul, em vez da tradicional Nascente-Poente); ou ainda a já citada configuração do pátio, que permitiria reduzir o perímetro defensivo, teremos algumas bases para ponderar a hipótese de o conjunto ter constituído uma posição fortificada. No entanto, só o aprofundamento dos estudos sobre a Quinta e a envolvente próxima permitirão desvendar o passado de tão interessantes sítio e conjunto edificado.
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Retomada a Intervenção Arqueológica na Quinta de S. João O Serviço de Arqueologia do Ecomuseu Municipal do Seixal retomou no passado dia 5 de Maio a intervenção que havia interrompido na Quinta de S. João (Arrentela), dando continuidade aos trabalhos suspensos em meados de Novembro último, face à intempérie que então se abateu sobre o território continental. Na ocasião eram já visíveis várias estruturas de cronologia romana, tendo-se recolhido grande quantidade de espólio dessa época, em contextos que corroboram indícios da presença de uma villa ou outra exploração de carácter agrícola cuja primeira evidência remonta a 1950, quando se identificaram algumas sepulturas e material disperso. A continuação do trabalho de campo vem clarificando a organização espacial da zona intervencionada e os contornos de uma ocupação humana que se terá centrado nos séculos III e IV, de acordo com os dados disponíveis de momento. Oficina de Formação de Professores Entre Fevereiro e Junho, o Ecomuseu Municipal do Seixal realizou a oficina de formação Produção de Materiais Didácticos no Âmbito da Educação Patrimonial, promovida em parceria com os Centros de Formação de Associação de Escolas do Concelho (Centro de Formação Gil Vicente e Centro de Formação Rui Grácio). Participaram 35 professores, distribuídos por duas turmas, de todos os níveis e ciclos de ensino e de escolas de diversas freguesias do Concelho. O programa desta oficina contemplou sessões presenciais e não presenciais, onde os professores participantes realizaram um conjunto de materiais didácticos concebidos para a concretização da educação patrimonial no concelho do Seixal. Exposição sobre Amora Antiga De 13 a 17 de Agosto de 2003 estará aberta ao público na Escola Básica do 1º Ciclo nº 1 de Amora., no âmbito das Festas Populares daquela freguesia, a exposição temporária intitulada Amora Antiga, organizada pelo Ecomuseu Municipal do Seixal e pela Junta de Freguesia de Amora, a pedido desta. A exposição, baseada em fotografias ilustrativas da paisagem, da arquitectura urbana e das actividades económicas e culturais de Amora do século XX, recorre também ao património imaterial constituído pela memória oral de habitantes locais, cujos testemunhos, não só podem ajudar o visitante a interpretar as imagens mas também a sentir-se mais próximos de quem viveu nos espaços e tempos representados. Pontuando a sequência de fotografias, seleccionaram-se e transcreveram-se informações-memórias obtidas através do levantamento oral efectuado pelo museu, com o propósito de melhor compreender o território, registar e transmitir memórias que as fontes escritas e iconográficas não contêm.
No Museu Marítimo de Ílhavo, entre 2 de Agosto e 30 de Setembro de 2003, os visitantes da exposição “Iconografia sobre a Pesca do Bacalhau” poderão apreciar algumas obras de Jorge Brandeiro, também cedidas pelo Ecomuseu Municipal do Seixal, de cujo acervo fazem parte, tendo-lhe sido oferecidas pelo falecido pintor.
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Através de cedência ao Museu da Escola Prática de Artilharia de Vendas Novas, a maqueta representando a máquina a vapor da Fábrica de Pólvora de Vale de Milhaços, executada por Domingos Araújo, foi integrada na exposição “Explosivos e Cargas Propulsoras”, em exibição entre 8 de Junho e 6 de Julho de 2003. Na mesma exposição promovida por aquele museu, cuja visita recomendamos, apresentaram-se diversas maquetas do espólio da SPEL, executadas por Carlos Maria, a cuja persistência não só se deveu a criação do respectivo museu de empresa, como se vem devendo a preservação de grande parte do seu espólio, apesar da lamentável desmontagem da exposição de Santa Marta de Corroios (Pinheiro da Cruz) e armazenamento em Alcochete.
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Acervo em Exposições Temporárias de Outros Museus