˙n.º 49˙OUTUBRO.NOVEMBRO.DEZEMBRO
2008
Boletim trimestral do Ecomuseu Municipal do Seixal
ecomuseu informação CONHEÇA, NO ECOMUSEU DO SEIXAL PATRIMÓNIO INDUSTRIAL: MUNDET E CIRCUITO DA PÓLVORA NEGRA PATRIMÓNIO FLÚVIO-MARÍTIMO: NÚCLEO NAVAL E EMBARCAÇÕES
Circuito da pólvora negra © EMS/CDI, Elisabete Curtinhal, 2008
Exposições e iniciativas: páginas 3 a 8
CONSULTE O PROGRAMA NO SITE DO ECOMUSEU
PATRIMÓNIO MARÍTIMO DO MEDITERRÂNEO XIV Fórum no Seixal: 24 e 25 de Outubro Palhabote Santa Eulália, do Museu Marítimo de Barcelona, visitável no estuário do Tejo: de 22 a 25 de Outubro Palhabote Santa Eulália © Museu Marítimo de Barcelona
Sobre programa e inscrições, consulte www.cm-seixal.pt/ecomuseu
˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙n.º 49˙OUT.NOV.DEZ
2008
ÍNDICE 2
9˙10
14˙15˙16˙17˙18
EDITORIAL
CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÃO
CARTA DO PATRIMÓNIO DO CONCELHO DO SEIXAL
Salvaguardar a nossa paisagem urbana histórica
. Fernanda Ferreira
. Graça Filipe
Bairros operários: memórias de uma industrialização . João Paulo Santos
11˙12˙13˙14 3˙4
exposições 5˙6˙7˙8
Programa de Iniciativas dE Serviço Educativo
Conhecer
19
As fotografias do Fundo Documental Mundet do Ecomuseu Municipal do Seixal: um meio para conhecer o universo da cortiça
Agenda 20
Núcleos e serviços do EMS
. Ana Machado e Fátima Afonso
EDITORIAL SALVAGUARDAR A NOSSA PAISAGEM URBANA HISTÓRICA Princípios teóricos e normas técnicas, consolidados e difun-
baseada no Inventário do Património Imóvel do Concelho do
didos através de importantes convenções internacionais,
Seixal (abarcando cento e nove monumentos, conjuntos e
nomeadamente sob responsabilidade da Organização
sítios, que se encontram georreferenciados e a curto prazo
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
disponíveis no nosso sítio na Internet), a par de sucessivos
(UNESCO), do Conselho da Europa ou do Conselho
programas anuais de iniciativas, dinamizados principalmente
Internacional dos Monumentos e Sítios (ICOMOS), conti-
através do Serviço Educativo do Ecomuseu, mas devendo-
nuam a inspirar alguns decisores políticos e equipas científi-
-se igualmente ao trabalho integrado de numerosos outros
cas e técnicas multidisciplinares, viabilizando planos e acções
técnicos da instituição e à interacção desses com o meio, por
que contrariam a uniformização e a despersonalização a que
vezes estabelecendo parcerias em que se destacam diversos
na maior parte dos casos o urbanismo contemporâneo tem
professores. É sem dúvida a estes, enquanto grupo profissio-
condenado vilas e cidades, também em Portugal e na nossa
nal, que compete um papel essencial para incutir nos mais
região.
jovens e na comunidade a compreensão e uma atitude de
A execução de tais planos, salvaguardando conjuntos históri-
respeito face ao património cultural, em geral, e ao património
cos muito variados, não só contribuíram para a qualidade de
urbano, em particular.
vida dos seus habitantes, quer em meio urbano, quer em meio
No novo ciclo de iniciativas que o EMS programou para
rural, como converteram o seu potencial, incluindo a perspec-
2008/2009, em consonância com o calendário lectivo, voltamos
tiva turística, em mais-valias sociais e económicas reversíveis
assim a destacar as necessidades específicas dos professores
num desenvolvimento sustentável dos respectivos territórios.
e dos grupos escolares, tratando-os como destinatários privi-
À luz de tais experiências, reflectindo sobre uma adequada
legiados do trabalho de educação patrimonial. Continuamos
aplicação dos referidos princípios e normas ao nosso terri-
porém a abarcar na nossa programação os interesses de
tório, urge conciliar esforços públicos e privados, envolvendo
outros públicos, nomeadamente aqueles visitantes a quem
não só os habitantes dos bairros ou núcleos históricos e suas
oferecemos exposições e actividades que lhes proporcionarão,
envolventes, mas procurando também sensibilizar progres-
individualmente ou em pequenos grupos familiares (ou de
sivamente todos os sectores da população. Estimulando-os
amigos), oportunidades de lazer e de conhecimento sobre
a conhecer o património urbano e paisagístico do Concelho,
temas variados, do ambiente à indústria, da história local e
mais provável se tornará a sua consciencialização sobre a
regional à cultura marítima.
necessidade de um plano de salvaguarda e até mesmo a sua
A planificação das iniciativas divulgadas para este trimestre
colaboração em medidas que o concretizem.
(a ter continuidade nos trimestres seguintes), para cujos
Neste contexto, torna-se essencial explorar as parcerias entre
resultados se dirige um esforço de reflexão e de avaliação
a CMS e a comunidade educativa, em que o Ecomuseu desen-
de todos os serviços do Ecomuseu, assenta no propósito de
volve continuadamente a sua acção, articulando projectos de
contribuirmos, com os nossos parceiros, para a reflexão sobre
investigação, estudo e documentação do património e da his-
o planeamento do território, em que se conciliem duas verten-
tória locais, com programas de interpretação e de divulgação.
tes indispensáveis: por um lado, a preservação do património
Nessa acção, de acordo com a missão e os objectivos do EMS,
urbano e da paisagem histórica; por outro lado, a criação de
tem sido dada uma especial relevância ao património cultural,
uma nova paisagem urbana de qualidade, que no futuro mere-
nomeadamente imóvel e imaterial, dada a sua particular
ça ser salvaguardada e com que os habitantes estabeleçam
vulnerabilidade à mudança.
uma relação identitária.
Sublinhamos assim a elaboração de uma Carta do Património,
[Graça Filipe]
˙
2008
OUT.NOV.DEZ n.º 49
EXPOSIÇÕES
˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙
Para mais informações sobre Exposições e Notícias, consulte o site www.cm-seixal.pt/ecomuseu
Núcleo da MUNDET do EMS
O papel de cortiça – folhas de cortiça natural laminada, de espessura inferior a 1/10 de milímetro - foi uma das principais
especialidades da Mundet (Seixal) entre 1915 e 1988. Embora nos dias de hoje seja comercializado como uma nova aplicação da cortiça, em produtos decorativos, acessórios utilitários e vestuário, o papel de cortiça já se produzia, portanto, no início do século XX, nos principais centros corticeiros, designadamente sob a forma de bobines para revestimento de filtros de cigarros, assim como base para produtos decorativos. Entre estes últimos, na Mundet, destacou-se o Corkskin, de que são revestidas várias salas de trabalho do edifício que actualmente aloja os Serviços Centrais do Ecomuseu Municipal do Seixal. Na exposição temporária Cortiça ao milímetro pretendemos surpreender os visitantes com as particularidades das múltiplas operações necessárias ao seu fabrico, as principais máquinas e os equipamentos ligados à produção do chamado papel de cortiça.
Exposição de longa duração
– uma das principais operações de preparação
Quem diz cortiça diz Mundet, quem diz Mundet diz cortiça
da cortiça para a sua transformação industrial
Edifício das Caldeiras Babcock & Wilcox A produção de vapor para a fábrica
em diversas oficinas. Observando o sítio
Um aspecto da Cortiça ao milímetro © EMS/CDI, António Silva, 2008
Exposição temporária
Cortiça ao milímetro Edifício das Caldeiras Babcock & Wilcox
–
como
para
operações
subsequentes,
industrial, facilmente se identifica ainda o sistema de condutas de vapor que ligava o
Neste edifício, de princípio da segunda década
edifício das caldeiras Babcock & Wilcox às
do século XX, projectado por dois técnicos da
outras oficinas e até mesmo a espaços de
Mundet – Luís Almeida e Artur Silva –, duas
utilização quotidiana e social da fábrica, como
caldeiras Babcock & Wilcox produziam o
no caso dos Refeitórios, cujas estufas para as
vapor que servia toda a unidade industrial do
refeições dos trabalhadores eram aquecidas
Seixal. Essa fonte de energia térmica era não
através daquele sistema.
só fundamental para o cozimento da cortiça
Esta oficina, outrora conhecida como as Caldeiras dos Moços, onde se procedia ao cozimento de pranchas de cortiça, fez parte da importante secção de prancha da Mundet. No espaço, museografado através de uma intervenção minimalista, os equipamentos foram mantidos in situ, e para a sua interpretação recorreu-se quer ao fundo documental Exposição no Edifício das Caldeiras de Cozer (autoclaves) © EMS/CDI, António Silva, 2008
da
Mundet
incorporado
e
estudado pelo Ecomuseu Municipal do Seixal, quer aos testemunhos de antigos trabalhadores corticeiros.
Exposição de longa duração Edifício das Caldeiras de Cozer Cortiça
Na exposição são dados a conhecer os
Quem diz cortiça diz Mundet, quem diz Mundet diz cortiça
industrial da cortiça, enquanto matéria-
A cortiça na fábrica: A preparação
principais procedimentos de preparação -prima.
˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙n.º 49˙OUT.NOV.DEZ
2008
Núcleo NAVAL do EMS Exposições temporárias de curta duração Oficina do Núcelo Naval Até 26 de Outubro:
crenças através de viagens e de festas, com
ESTUÁRIO EM FESTA
que em mudança, identificam culturalmente
os barcos tradicionais e as suas tripulações, exibindo saberes e técnicas, os quais, ainda a região e as paisagens dos seus territórios.
Todos os anos, aproximadamente entre Abril e
Pode ver no Núcleo Naval do Ecomuseu os
início de Novembro, as comunidades ribeirinhas
interessantes registos de alguns desses acon-
do estuário do Tejo celebram acontecimentos e
tecimentos e viagens.
Oficina do Núcelo Naval A partir de 28 de Outubro:
parte dos quais contratados localmente, mas
A Ponta dos Corvos e a seca de bacalhau
Na Ponta dos Corvos (concelho do Seixal, fre-
a maioria provenientes da Beira Litoral. guesia de Amora) reuniam-se as condições ideais para a seca do pescado: uma boa ex-
Em Outubro, os lugres bacalhoeiros regressa-
posição solar, ventos dominantes de Noroeste
dos da Terra Nova eram descarregados, com
Este/Nordeste e abundância de água captada
os navios acostados ou ancorados ao largo da
das nascentes ou de poços artesianos. Conju-
baía do Seixal. Através de registos fotográfi-
gadas com a localização geográfica, atraíram
cos e dos testemunhos orais recolhidos pelo
a instalação e possibilitaram a actividade de
Ecomuseu Municipal do Seixal, a exposição
importantes unidades de preparação e seca-
recorda a actividade das secas de bacalhau
gem de bacalhau, a partir do início até à déca-
da Ponta dos Corvos e o trabalho sazonal que
da de 90 do século XX.
ocupava centenas de homens e mulheres,
Exposição de longa duração
tradicionais, de cabotagem e de pesca.
Barcos, memórias do Tejo
Os recursos audiovisuais e multimédia dão a conhecer o património cultural do estuário
Apresentando
uma
série
de
modelos
do Tejo e procuram sensibilizar para a sua
construídos ao longo de vários anos pelo
salvaguarda, convidando o visitante a percorrer
EMS – através dos seus artífices e da
outros lugares e a contactar directamente
incorporação de participações de marítimos
com eventos e testemunhos que fazem parte
que trabalharam no Estuário – ilustram-
da cultura fluvial e marítima desta região, em
se as principais tipologias de embarcações
particular das suas comunidades ribeirinhas.
em circulação pela europa Ocidente Europeu”, produzida pelo Ecomuseu Municipal do Seixal no âmbito de um projecto de parceria internacional apoiado pelo Programa Cultura 2000 da Comissão Europeia, continua o périplo pela Europa. Enquanto se aguarda pelo seu regresso a Portugal, previsto para 2009, poderá ser visitada, em 2008, entre os dias 1 e 31 de Outubro, na Moinho de Maré de Carew (País de Gales, Reino Unido) © Pembrokeshire Coast National Park, 2002
Abadia Real de Saint Jean d’Angély (França), de 2 a 31 de Outubro, no Moinho de Maré de Carew, gerido pelo Pembrokeshire Coast National Park (País de Gales, Reino Unido), e de 3 de Novembro
Exposição itinerante
a 15 de Dezembro, no Moulin du Got, em Saint
Moinhos de Maré do Ocidente Europeu
Léonard de Noblat (França). Mais informações sobre a exposição e o projecto que a enquadra encontram-se disponíveis no
A exposição itinerante “Moinhos de Maré do
site www.moinhosdemare-europa.org.
˙
2008
CDI
OUT.NOV.DEZ n.º 49
˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙
Centro de Documentação e Informação
Para este número 49 do boletim Ecomuseu Informação, divul-
senvolveu o interesse pelo património industrial em Portugal,
gamos junto dos nossos utilizadores recursos documentais
a partir de meados dos anos 70 do século XX, o texto constitui
relacionados com os conteúdos de investigação apresentados
uma contribuição para a reflexão sobre os métodos de es-
nas rubricas Conhecer e Carta do Património do Concelho do
tudo, documentação e inventário de património industrial e
Seixal.
sua importância enquanto funções inerentes à programação
A área de investigação do Património Industrial, particular-
científica e museológica e à valorização daquele património.
mente aquela reportada ao património industrial concelhio, tem sido uma temática a que a Câmara Municipal do Seixal
¬ ASOCIACION VASCA DE PATRIMONIO INDUSTRIAL Y
através do Ecomuseu Municipal tem atribuído, de forma
OBRA PUBLICA - Viejas fábricas, nuevos usos = Fabrika
continuada, apoio e meios para o desenvolvimento de um di-
zaharrak , erabilera berriak. [S.l.] : Asociacion Vasca de
versificado conjunto de projectos e iniciativas. Em particular,
Patrimonio Industrial y Obra Publica, 2001. 103 p.
destacam-se os projectos de investigação relacionados com a
Catálogo da exposição Viejas Fábricas. Nuevos Usos que teve
fábrica de pólvora, em Vale de Milhaços, actualmente exten-
como objectivo apresentar o estado actual do património in-
são museológica do EMS, e com a fábrica de cortiça da Mun-
dustrial no País Basco, na óptica da gestão e reutilização des-
det, no Seixal, actualmente núcleo museológico do EMS.
tes testemunhos, através da divulgação de alguns projectos
A estes projectos de investigação e inventário do património
mais significativos. A edição integra ainda 2 textos intitulados
industrial, o EMS associa outras vertentes de trabalho mu-
La reutilización del patrimonio industrial en Europa: crité-
seal, como a conservação, a interpretação e a comunicação,
rios, problemas y ejemplos, da autoria de Louis Bergeron,
através da exposição e da edição, centrados nos referidos tes-
e El legado industrial como un compromiso: permanecias,
temunhos da industrialização local. Assim, tornam-se essen-
ruinas y desapariciones, da autoria de Marta Zabala.
ciais a incorporação, a produção e a gestão de recursos documentais para apoiar a realização destes projectos e iniciativas
¬ CARTIER, Claudine - L´héritage industriel, un patri-
e para a actualização e o aprofundamento de conhecimentos
moine. Besançon : CRDP de Franche-Comté, D.L.
da equipa técnica e das entidades parceiras com que aqueles
2003. 195 p. ISBN 2-84093-131-1.
se desenvolvem.
Publicação que aborda questões relativas à evolução da protecção do património e da arquitectura industrial em Fran-
Edições em destaque
ça. A autora apresenta uma síntese sobre procedimentos e linhas metodológicas a adoptar no estudo deste património
¬ AFONSO, Maria de Fátima de Carvalho - Museus e
complementando com o comentário e exemplo de testemu-
métodos de investigação e de documentação de patrimó-
nhos industriais significativos e algumas práticas de educa-
nio industrial em Portugal (1974-2004) [Texto policopia-
ção patrimonial, em França.
do]. [S.l.] : [s.n.], 2005. 137, CLXIII p. Tese de mestrado apresentada para obtenção do grau de
¬ COSSONS, Neil, ed. – Perspectives on industrial ar-
Mestre em Museologia, na Universidade de Évora.
chaeology. London : Science Museum, 2000. 176 p.
Partindo do contexto histórico e patrimonial no qual se de-
ISBN 1-900747-31-6
10 ˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙n.º 49˙OUT.NOV.DEZ
A obra reúne as contribuições de diversos especialistas no
2008
¬ INCUNA. Associación de Arqueología Industrial
âmbito da conceptualização de diversas questões e abor-
- Arqueología industrial, patrimonio y turismo cultural.
dagens relacionadas com a disciplina Arqueologia Indus-
[Gijón] : Incuna, Asociación de Arqueología Industrial,
trial e a sua evolução e desenvolvimento desde a década
2001. 275 [1] p. (Los ojos de la memoria ; 1). ISBN 84-
de 1950, no Reino Unido, altura em que, fruto de alterações
607-2646-0.
económicas e sociais, os sítios industriais começaram a
Comunicações apresentadas nas I e II Jornadas sobre Pa-
adquirir um novo significado e deixaram de ser vistos ape-
trimónio Industrial realizadas em Gijón nos meses de Abril
nas como símbolos da destruição da paisagem.
e Maio de 1999 e 2000, respectivamente. Promovidas pela Incuna, estas Jornadas tiveram como objectivo suscitar o interesse e preocupação pelo estudo, preservação e reabilitação do património industrial. As comunicações encontram-se agrupadas nas seguintes temáticas: Patrimonio Industrial: Memoria Colectiva, Asturias: Turismo a través del Patrimonio Industrial, Cultural y Natural e Experiencias de Reutilizacion de Património Industrial. ¬ MANIGAND-CHAPLAIN, Catherine - Les sources du
patrimoine industriel. Paris : CILAC, 1999. 96 p. (Documents & méthodes ; 4). ISBN 2-9513157-0-8. A obra apresenta-se como um guia que pretende fornecer linhas orientadoras para a pesquisa e consulta das diferentes fontes documentais sobre sítios industriais. Segundo a autora, a consulta de documentação histórica é indispensável para o inventário do património industrial e tem como objectivos identificar e localizar sítios industriais, documentar as diferentes sequências cronológicas na actividade de fabricação, conhecer as infra-estruturas próprias de cada unidade fabril, os aspectos económicos e sociais e a evolução das empresas, contextualizando cada ¬ FARIA, Fernando ; CRUZ, Luís ; BARBOSA, Pires - A
empresa no âmbito local e regional onde se insere.
Central Tejo : a fábrica que electrificou Lisboa. Lisboa : Museu de Electricidade ; Bizâncio, 2007. 259 p. ISBN
¬ SOTO GÁLVEZ, Manuel ; GUISADO LÓPEZ, Luis Ga-
978-972-53-0364-1.
briel - Los molinos hidráulicos y batanes en La Serena
A edição encontra-se estruturada em duas partes. A pri-
: arqueología industrial y patrimonio cultural : el molino
meira parte aborda a história e a evolução do edifício e dos
del Capellán. [S.l.] : Asociación para la Conservación,
seus equipamentos não esquecendo outros aspectos liga-
Desarrollo y Promoción de La Serena, D.L. 2007. 198
dos a este centro de vida colectiva que foi a Central Tejo.
p. ISBN 846119414-4.
Tomando como marco inicial o início da electricidade em
A publicação apresenta os resultados do levantamento
Lisboa, é apresentada a evolução da distribuição de elec-
de moinhos levado a cabo em La Serena (Extremadura).
tricidade pela cidade de Lisboa. Numa segunda parte, a
A metodologia de inventário e catalogação baseada no
história e a evolução do edifício são apresentadas através
trabalho de campo e investigação documental permitiu a
da memória fotográfica que contribui para o aprofunda-
sistematização da recolha de dados e a definição de um
mento do estudo do edifício enquanto sítio de património
modelo que possibilitou o estabelecimento de diferenças e
industrial e para o rigor da sua musealização.
semelhanças entre os diversos moinhos da região.
¬ FIGUEIREDO, Dulce - A real fábrica da pólvora de Bar-
¬ TERCER COLOQUIO LATINOAMERICANO SOBRE
carena, 1725-1820 : elementos para uma caracterização
RESCATE Y PRESERVACIÓN DEL PATRIMONIO IN-
sócio-económica. Oeiras : Câmara Municipal de Oeiras,
DUSTRIAL, 3, Santiago do Chile, 2001 - Tercer colo-
Museu da Pólvora Negra, 2007. 201 p. ISBN 978-989-
quio latinoamericano sobre rescate y preservación del
608-058-7.
patrimonio industrial: ponencias. Santiago de Chile :
Este estudo foi estruturado em duas partes. Na primei-
CONPAL, 2001. 534 [2] p.
ra, são abordados os principais marcos da história, da
A obra integra todas as comunicações apresentadas pelos
evolução, da produção e da administração da fábrica. Na
diversos especialistas neste encontro, organizado pelo Co-
segunda, elabora-se um estudo de caso centrado nos tra-
mité Nacional Chileno para la Conservación del Patrimo-
balhadores: a sua identificação, os ofícios que exerciam, o
nio Industrial, que teve como objectivo conhecer e difundir
ambiente laboral e, acima de tudo, os seus comportamen-
as iniciativas nacionais e internacionais que se desenvol-
tos demográficos, dando especial relevo às consequências
vem no âmbito do património industrial.
das explosões que, em 1805, vitimaram dezenas de funcionários, com repercussões na comunidade fabril e na freguesia onde se insere.
[Fernanda Ferreira]
˙
2008
OUT.NOV.DEZ n.º 49
˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙ 11
Após a municipalização do sítio industrial Mundet (Seixal), em 1996, a par do estudo e da preservação do seu património imóvel e integrado, tem vindo a ser incorporado no Ecomuseu Municipal do Seixal (EMS) um vasto património móvel, nomeadamente documental, principalmente reportado à actividade da antiga unidade fabril corticeira (1905-1988) e às entidades empresariais que sucessivamente a enquadraram. Esse importante património passou a constituir o designado Fundo Documental Mundet do EMS. Entre as séries ou conjuntos documentais que o integram, destacamos as fotografias, que nos dão a conhecer os espaços fabris - a ambiência das oficinas, as máquinas e os equipamentos industriais destinados à preparação e à transformação da cortiça e os gestos do trabalho - e diversos aspectos sociais e culturais ligados ao funcionamento da empresa.
As fotografias do Fundo Documental Mundet do Ecomuseu Municipal do Seixal: um meio para conhecer o universo da cortiça Apesar de uma parte das espécies fotográficas nos ter chegado devidamente ordenada, de acordo com um sistema de arquivo adoptado pela empresa, o espólio fotográfico da empresa que integra actualmente o Fundo Documental Mundet/EMS foi achado disperso pelos muitos edifícios que constituíam a antiga fábrica corticeira. No final da década de 1930, coincidindo com uma fase de crescimento da área fabril e de reestruturação das oficinas de transforma-
dos fotógrafos (entre os quais destacamos Mário Novais), a empresa procurou registar e difundir uma imagem de qualidade. Foram assim documentadas a participação dos produtos corticeiros da Mundet na Exposição do Mundo Português (1940), as comemorações associadas à inauguração da Casa de Infância na Mundet (Seixal), as creches que a firma então mantinha no Seixal e na Amora, as unidades industriais da Mundet (nos concelhos do Seixal, Ponte de Sôr, Mora e Vendas
ção da Mundet (Seixal), as valências técnicas da empresa consolidaram-se com a organização dos Serviços Técnicos da Mundet – também designados por Secção Técnica – de apoio à produção industrial corticeira. Datam do início do decénio seguinte os primeiros registos fotográficos promovidos pela Mundet & C.ª, Lda. Recorrendo a conceitua-
Novas), a grandiosidade da saída dos operários da fábrica Mundet (Seixal) e as tiradas de cortiça em montados e sobreirais. Na década de 1950, realizou-se o registo fotográfico dos estabelecimentos fabris da Mundet (incluindo a panorâmica aérea das fábricas), alargando-se o seu âmbito temático. A documentação que incorporámos inclui, en-
1954. Fundo Documental Mundet/EMS. © EMS/CDI
Secção de máquinas automáticas de brocar e rebaixar rolhas da Mundet (Amora),
CONHECER
12 ˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙n.º 49˙OUT.NOV.DEZ
2008
CONHECER
Joseph Mundet Jr. exibe a máquina fotográfica, c.1950. Fundo Documental Mundet/EMS. © EMS/CDI
tre outros, apontamentos fotográficos de algumas das mais representativas oficinas das fábricas Mundet em Amora, Seixal e Montijo, o edifício-sede do Grupo Desportivo Mundet, o posto médico e sede da Caixa de Previdência do Pessoal da Firma Mundet & C.ª, Lda., os Bombeiros Voluntários Privativos da Mundet, os refeitórios, os escritórios da empresa em Lisboa, a filial Mundet Cork Products (Inglaterra), para além de expositores da firma em certames nacionais e internacionais, produtos Mundet e as suas aplicações, nomeadamente em obras da construção civil. Pontualmente, a fotografia assumiu um carácter complementar em relação aos relatórios técnicos elaborados, registando o desenvolvimento das fábricas Mundet instaladas em Portugal e no estrangeiro, o estado de obras em execução nos edifícios, ou assinalando – através de apontamentos manuscritos sobre as imagens – a localização das diferentes oficinas e do seu equipamento técnico e industrial. O arquivo de matrizes de todos esses registos foi cuidadosamente organizado e gerido pela Secção Técnica da firma, quer através da criação de ficheiros de negativos em supor-
sociais da firma ou remetendo para as múltiplas aplicações dos seus produtos e obras, efectuadas pela empresa em vários edifícios particulares e públicos, tanto no país, como no estrangeiro – ou em álbuns que abrangiam diversos assuntos. Presumimos que estes álbuns eram apresentados por ocasião da realização de feiras industriais e pelos serviços comerciais da firma a possíveis
tes de vidro, de celulose ou de poliéster, quer com a utilização de um caderno de registo do Arquivo de clichés fotográficos da Mundet & C.ª, Lda., atribuindo um número identificativo a cada imagem capturada. As reproduções em papel foram organizadas em álbuns fotográficos temáticos – reportados às obras
obras da Mundet e das suas instalações industriais, a empresa produziu outros materiais de difusão, tais como painéis utilizados para fins publicitários ou para integrarem expositores da firma em exposições e feiras industriais de âmbito regional, nacional ou mesmo internacional, quer na divulgação co-
Instalações da creche da Mundet (Amora), c. 1940. Fot. Mário Novais. Fundo Documental Mundet/EMS. © EMS/CDI
clientes, para promoção da empresa e dos seus produtos. Recorrendo a fotomontagens de imagens de
2008
˙
OUT.NOV.DEZ n.º 49
˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙ 13
As fotografias do Fundo Documental Mundet do Ecomuseu Municipal do Seixal: um meio para conhecer o universo da cortiça
Instalações da Mundet África, S.A., assinalando as oficinas de reparação de máquinas, os trituradores e a casa do motor, 1924. Fundo Documental Mundet/EMS. © EMS/CDI
mercial dos seus produtos e aplicações, quer na promoção social da sua própria imagem. Na fábrica Mundet (Seixal), retratos e fotografias de montado e das instalações industriais da Mundet emoldurados juntavam-se a mostruários de produtos, a planisférios – alguns dos quais resultando de um paciente trabalho de entalhe e colagem em cortiça – e a vistosos e aprazíveis revestimentos em cortiça, fabricados pela Mundet e ostentados em pavimentos e lambrins, na decoração de salas e corredores de acesso público (creche, casa de infância e escritórios), contribuindo, também por este meio, para a difusão da imagem de qualidade e de prestígio da empresa. Num conjunto mais restrito, encontramos as fotografias mais antigas deste acervo, remontando algumas aos anos 20 do séc. XX. Dado que, na sua maioria, têm no verso uma legenda manuscrita em inglês, remetendo algumas para o grau de parentesco da pessoa fotografada, pressupomos tratar-se de alguns registos fotográficos de autoria de Joseph Mundet Jr. (1913-1962), de nacionalidade norte-americana e sócio-gerente da Mundet.
Jr. enquanto jovem, em contexto familiar, em actividades de desporto e de lazer (entre outras, automobilismo e pesca), além de registos de paisagens. Entre estas, destacamos um conjunto de sítios industriais relacionados com a actividade económica e industrial da família Mundet, que nos leva a presumir que Joseph Mundet Jr., por volta de 1932, terá realizado uma viagem de reconhecimento dos bens patrimoniais da família e de “formação” no âmbito do trabalho e da indústria corticeira antes de assumir, em 1935, o conselho de gerência da Mundet Cork Corporation (E.U.A.) e, em 1938, a gerência da Mundet & C.ª, Lda. (Portugal). Apoiado pelo Programa Operacional da Cultura (POC), cofinanciado por fundos comunitários, o EMS realizou um projecto de inventário e de digitalização de colecções fotográficas e divulgação do acervo (móvel e imóvel), no qual foi contemplado um importante conjunto de negativos de vidro a preto e branco do referido Fundo Documental Mundet, abarcando imagens produzidas aproximadamente na primeira metade do século XX, sobretudo nas décadas de 40 e 50, embora muitas delas não possuam informação
A temática deste conjunto torna-o particularmente diferente do restante acervo fotográfico. Trata-se, não só de imagens de acontecimentos formais, de vários encontros, jantares de negócios e audiências com os mais altos representantes do Estado, mas também de apontamentos de Joseph Mundet
referente a data, nem autor. Actualmente, esta colecção de imagens já se encontra inventariada e disponível nas bases de dados de gestão de inventário de fotografia e de acervo museológico – Photo e Micromusée – com sistema de informação integrada, as quais podem ser consultadas no Centro de
14 ˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙n.º 49˙OUT.NOV.DEZ
2008
CONHECER
Descarga de cortiça do mato no átrio das instalações da Mundet (Mora), 1932. Fundo Documental Mundet/EMS. © EMS/CDI
Documentação e Informação do EMS. Os temas representados são bastante diversificados, incluindo as unidades fabris e oficinas de produção (de Amora, Seixal e Montijo); os equipamentos e processos de fabrico; as
actividades sociais e culturais e os seus serviços; a actividade comercial (nomeadamente de produtos fabricados pela empresa e a aplicação dos mesmos); abrangendo ainda imagens de edifícios (cinemas, hotéis, hospitais, escolas, embarcações de recreio) com revestimentos de aglomerado de cortiça; assim como fotografias de plantas, maquetas e desenhos de interiores com a indicação de produtos de isolamento, principalmente da marca Jointite, fabricados e comercializados pela Mundet. Proximamente, prevê-se aumentar as potencialidades de acesso deste espólio documental, com a instalação de um software OpacWeb, de ligação em linha, através do site do EMS, e a divulgação de um multimédia que apresentará algumas das imagens digitalizadas e inventariadas no projecto já mencionado. O restante acervo fotográfico irá ser objecto de inventário desenvolvido, em suporte digital, devendo futuramente integrar a base geral de inventário do EMS, a fim de garantir a sua disponibilidade aos públicos interessados nas temáticas da indústria e, em especial, da indústria corticeira.
Fábrica de Cortiça da Mundet (Ponte de Sôr), 1932. Fundo Documental Mundet/EMS. © EMS/CDI
[Ana Machado e Fátima Afonso]
˙
2008
OUT.NOV.DEZ n.º 49
˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙ 15
Vista parcial do antigo bairro dos operários alemães da Fábrica de Garrafas de Vidro de Amora © EMS/CDI, Fernando Falcão
CARTA DO PATRIMÓNIO Do seixal
Bairros operários: memórias de uma industrialização O conceito de operariado é indissociável da denominada Revolução Industrial. Com efeito, é o desenvolvimento exponencial da indústria, após a adopção da máquina a vapor, inventada e desenvolvida por James Watt, que expande as necessidades de mão-de-obra, essencialmente barata, muito para além da oferta disponível nos aglomerados urbanos. Em plena expansão colonial das nações europeias, industrialização de países do continente americano e, mais tarde, com a introdução de máquinas accionadas a vapor na actividade agrícola, as populações das zonas rurais são atraídas pela perspectiva de um trabalho mais bem remunerado, e que imaginam menos duro e ingrato, na indústria florescente. Centenas ou mesmo milhares de famílias migram para as zonas periféricas das cidades; fixam-se nas áreas pobres, onde os seus parcos rendimentos permitem pagar as rendas. Amontoam-se em pequenas casas, barracas ou mesmo velhos casarões e palácios devolutos. As insuficiências alimentares, a insalubridade das habitações e ruas, onde as redes de saneamento básico não passam de ilusões e as diferentes noções de higiene das famílias provenientes das zonas rurais, onde as condições ambientais e o espaço mais desafogado compensavam em boa parte algumas deficiências ao nível higiénico, rapidamente vieram
a ter consequências altamente nefastas sobre a saúde pública. As zonas de habitação do operariado tornaram-se um caldo de cultura para surtos epidémicos de doenças como a tuberculose, a cólera, a varíola e outras pragas que acometiam com alarmante frequência os moradores. As condições sub-humanas e os dramas familiares e pessoais da classe operária acabaram por despertar a consciência de diversos intelectuais, das mais variadas áreas do conhecimento: filósofos (Owen, Saint-Simon, Engels, Fourier, Godin, Marx, Cabet, Lamennais, Proudhon), escritores (Charles Dickens, Jorge Amado, Ferreira de Castro), médicos (Louis Pasteur), arquitectos e urbanistas (Ebenezer Howard, Hermann Muthesius), religiosos (Padre Cruz), entre outros, consagraram boa parte da sua actividade a chamar a atenção para a situação miserável do operariado, a procurar soluções para os problemas mais prementes e até mesmo a promover a auto-estima daquela importante e numerosa faixa da população, incentivando a sua valorização e ascensão no tecido social. Os proprietários dos estabelecimentos industriais acabaram por ser mais ou menos sensibilizados para os problemas dos seus empregados. No entanto, se existem evidências que alguns desenvolveram medidas animados pelo espírito humanitário, a maioria terá sido
16 ˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙n.º 49˙OUT.NOV.DEZ
2008
CARTA DO PATRIMÓNIO Bairros operários: memórias de uma industrialização
verdadeiramente incentivada por razões de carácter mais prático e economicista. De facto, se a mão-de-obra operária não qualificada era barata e fácil de obter, já a formação de um bom operário qualificado e a adequação às Edifício do Clube dos alemães – antigo bairro operário, em Amora de Baixo © EMS/CDI, Fernando Falcão, 1980.
funções mais específicas era morosa e implicava custos bastante superiores. O falecimento ou invalidez de operários, ou simplesmente as baixas, causavam prejuízos consideráveis numa actividade ferozmente competitiva e em franca expansão. Por outro lado, o sucessivo aparecimento de novas indústrias alargava as oportunidades de emprego para os operários especializados mais competentes. E a oferta de melhores condições de habitação podia funcionar como chamariz para os melhores profissionais, potencialmente geradores de superior produtividade. Pese a diversidade de motivações, o facto é que começaram a concretizar-se medidas resultantes da preocupação de melhorar as condições de vida, nomeadamente a salubridade das habitações do operariado. Alguns industriais estabelecidos no Concelho do Seixal também aderiram à nova tendência de proporcionar melhores condições de habitação ao pessoal das suas fábricas. Pelo que nos foi possível apurar, os pioneiros nesta iniciativa terão sido os proprietários da Fábrica de Garrafas de Vidro de Amora, que promoveram a edificação do Bairro dos Operários Alemães da Fábrica de Vidros que, a despeito da crescente adulteração da traça arquitectónica, ainda vai conseguindo sub-
sistir, e a Companhia Africana de Pólvora [posteriormente Sociedade A.P.], em Vale de Milhaços. No segundo caso, o Bairro Operário já não é mais do que uma recordação, tendo soçobrado à implacável pressão urbanística que assola os municípios da Região da Grande Lisboa. Muito mais recente, mas com uma dimensão considerável em número de fogos é o Bairro dito “dos Corticeiros”, em Amora de Baixo, um dos que se mantém mais fiel à sua traça original. Também a Companhia de Lanifícios de Arrentela adoptou a nova política social, erguendo um pequeno Bairro Operário, que cremos se encontrará já totalmente devoluto e, indubitavelmente, em acelerado estado de degradação, e ainda uma Associação de Socorros Mútuos e uma Cooperativa de Abastecimento para os seus trabalhadores. A Companhia de Agricultura de Portugal teve igualmente a preocupação de melhorar as condições de habitação do seu pessoal, promovendo a construção de um bairro ainda hoje existente (sito nas imediações do Instituto Hidrográfico da Azinheira, do Forno de Cal, e ainda do Centro de Estágios do Sport Lisboa e Benfica). Facto digno de nota foi a preocupação em melhorar as condições de salubridade deste bairro, com a construção, na década Carranca zoomórfica (face de leão) em bronze: ornamento da fachada principal do Clube dos alemães – antigo bairro operário, em Amora de Baixo © EMS/CDI, Fernando Falcão, S/d
de 40 do séc. XX, de uma casa de banho para cada habitação, adossada à respectiva fachada tardoz. Dignos de referência, embora com uma escala um pouco menor, temos mais três exemplos:
˙
2008
OUT.NOV.DEZ n.º 49
˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙ 17
CARTA DO PATRIMÓNIO DO CONCELHO DO SEIXAL Bairros operários: memórias de uma industrialização
Vista parcial de uma banda do bairro operário da Sociedade Africana de Pólvora, em Vale de Milhaços © EMS/CDI, Rosa Reis, 1998.
o Bairro da Fábrica Monte-Sião (que produzia bolos e estava implantada na quinta do mesmo nome, sita entre a Torre da Marinha e o Casal do Marco), a Villa Maria Carlos, pequena banda de habitações térreas localizadas defronte do Núcleo Naval do Ecomuseu Municipal, em Arrentela, associada à empresa A. Silva & Silva, e a Vila Mimosa, também constituída por construções térreas, no Fogueteiro. A organização espacial de bairro operário assenta, geralmente, num módulo habitacional, Vista aérea de Amora de Baixo, com um trecho do antigo bairro dos operários alemães em 1.º plano © EMS/CDI, António Silva, 2005
possibilitar a partilha, e consequente redução, do número de chaminés e prumadas de redes técnicas (águas, esgotos e ventilação). Nos projectos mais antigos, era frequente existirem apenas quartos separados para o casal e respectiva prole. Mais tarde, o número de quartos atenderá também ao número e género sexual dos filhos. Habitualmente, os bairros operários incluíam apenas habitações. No caso específico do Bairro dos Operários Alemães da Fábrica de Vidros de Amora, o conjunto integrava alguns equipamentos, como sejam o clube, uma escola para os filhos dos trabalhadores e existem mesmo testemunhos orais de um espaço para culto religioso (com toda a probabilidade, rito cristão protestante). Esta rara inclusão de equipamentos específicos pode ser explicada pela especificidade cultural e mesmo linguística da população residente. Os projectos, materiais e técnicas construtivas reflectem as tendências de época. Nos modelos mais antigos, predominam as construções de um só piso, com paredes autoportantes, em alvenaria. Mais tarde, o sistema construtivo adoptado reflectirá a generalização da estrutura independente e, devido à especulação fundiária, será privilegiada a construção em altura, como aconteceu nos Bairros dos Corticeiros e da Fábrica Monte-Sião. A despeito da traça e acabamentos simples, a construção era geralmente de qualidade bastante boa, dentro dos respectivos contextos de época.
[João Paulo Santos]
composto por cozinha, sala e quartos, repetido tantas vezes quanto necessário ou pretendido. Por razões económicas, os módulos habitacionais são geralmente agrupados em pares simétricos (ou seja, geminados), de modo a
18 ˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙n.º 49˙OUT.NOV.DEZ
2008
CARTA DO PATRIMÓNIO Bairros operários: memórias de uma industrialização
INVENTÁRIOdeDO PATRIMÓNIO CULTURAL IMÓVEL a ocorrência vítimas em situações similares. Um bom exemplo é a torre da Igreja Paroquial REFERÊNCIA DE SÍTIO: CPS.00039 de Nossa Senhora da Conceição do Seixal, que Bairro da Fábrica de DESIGNAÇÃO: está encostada ao corpooperário do templo, em lugar Garrafas de Vidro de Amora de emergir do mesmo. Esta imposição técnica Localização administrativa: Amora permite reduzir o risco de derrocada da torre sobre a nave, em caso de abalo sísmico. Toponímia: Quinta das Lobatas Mas as tendências artísticas haviam também Localização geográfica: Folha CMP de Nº. admirar 442 conhecido alterações. Não é pois Carta DGSU/CMS Nº. 442-4 / 1-2 que os–elementos decorativos aplicados durante SIG ortofotomapa n.º 442-412 a reconstrução reflectissem o gosto do período Coordenadas: X = -85177.500; Y = -115141.300 m. barroco. Atento o diferencial de meios financeiros, tambémdenão causa estranheza que a traça Categoria sítio: Arquitectura industrial. e decoração das igrejas do concelho do Seixal Tipo de sítio: Bairro operário se enquadre no que José Fernandes Pereira Cronologia: Idade Contemporânea; séc.designa XIX. (Arquitectura Barroca em Portugal) como Barroco Provincial, ou -seja, apresentanMedidas de protecção: 1991 Encontra-se intenocaracterísticos conjunto protegido do NUA de Amora dogrado traços daquele período ar– Regulamento de Protecção aos Núcleos Urbanos Antigos do Concelho do Seixal publicado no Edital da Câmara Municipal do Seixal, N.º 91, de 3 de Julho. Estado de conservação: Os edifícios, na sua maioria, apresentam-se em mau estado de conservação tendo sofrido ao longo do tempo significativas alterações quer do seu interior, quer modificações de vãos de portas e janelas. As construções integradas na banda de edifícios do Bairro Operário, que entre 1935 e 1994 estiveram afectas a uma fábrica de produtos corticeiros, foram demolidas em 2006. Descrição sumária: Em 22 de Dezembro de 1888, foi constituída uma sociedade com vista à fundação e exploração de uma fábrica de garrafas que se instalou na Quinta das Lobatas, em Amora. Na última década do século XIX, para além de vários edifícios disseminados no interior do espaço fabril para habitação de pessoal, terá sido construído o bairro operário, edifícios escolares e clube, destinado a garantir uma zona residencial para os operários alemães. O bairro situa-se em terrenos da própria fábrica e organiza-se ao longo de um eixo viário (actual Av. Silva Gomes). O conjunto habitacional é constituído por duas correntezas, orientadas no sentido Nordeste-Sudoeste, construídas em dois momentos. A correnteza mais antiga e a única existente em 1897 apresenta um conjunto habitacional de casas térreas, do qual se distinguem dois edifícios, devido à sua volumetria e cércia (casas de loja e primeiro andar), e um outro edifício, de piso único, que dada a sua localização e apresentando no alçado principal um pequeno frontão, atribui simetria e equilíbrio ao conjunto. Próximos dois outros edifícios distinguindose pelo seu volume, destinavam-se a cumprir a função de escritórios da fábrica, ladeando um dos portões do estabelecimento fabril. O conjunto de habitações operárias que constitui a segunda correnteza, localizada a Sudoeste, teve uma implantação no terreno que resulta da subordinação das edificações à configuração da linha de costa e da via de comunicação com a qual confina. De configuração uniforme, o conjunto habitacional é composto por módulos repetitivos, em que o ritmo de fenestrações e das portas se repete, sem elementos ou ornamentos que o distinga ou valorize. Atravessando a Av. Silva Gomes, a Este da correnteza, encontram-se dois imóveis destinados
ao ensinomas primário dosda filhos dos operários vitístico, distante exuberância de Lisboa dreiros (existentes em 1897). O edifício a Oeste ou (do Convento) de Mafra, por exemplo. é constituído por dois pisos, tendo servido de No elenco que integram a Carta do escola para de os imóveis filhos dos mestres e operários de nacionalidade alemã, servindo ainda de consrePatrimónio do Concelho do Seixal (CPS), sidência ao professor, tendo o segundo edifício, tam seis edifícios religiosos –com Igreja Paroquial de piso térreo, sido construído funções de escola paraSenhora instrução destinada aos de Nossa da primária Consolação de Arrentela filhos dos operários portugueses. (CPS.00015), Igreja Paroquial de Nossa SenhoNas traseiras e confinantes com o bairro, enra da Conceição do Seixal (CPS.00034), Igreja contra-se a área fabril da antiga fábrica de produtos corticeiros, agora desactivada. O conjunParoquial de Nossa Senhora do Monte Sião de to integra um cais em alvenaria de pedra. Amora (CPS.00048), Igreja Paroquial de Nossa Síntese deda intervenções: Senhora Anunciação de Aldeia de Paio Pires 1982-1983 – Inquérito sociológico retrospecti(CPS.00104), Igreja Paroquial de Nossa Senhovo, levantamento toponímico e intervenção arra da Graça de Corroios queológica promovida pela(CPS.00103) Associação e deCapela Arqueologia de Lisboa, o de NossaIndustrial Senhorada daRegião Piedade, sita nacom Quinta apoio do Ecomuseu Municipal do Seixal. da Medideira, Amoraintegradas (CPS.00033). Constam 2006 – As construções na banda de edifícios Bairro Operário, entre 1935 ainda osdo subsolos da Ermidaque de Santa Martae de 1994 estiveram afectas a uma fábrica de proCorroios (CPS.00052) Capela de dutos corticeiros, forame da demolidas noNossa âmbitoSeda construção de uma superfície conhora da Boa Hora, emgrande Arrentela (CPS.00076), mercial. Tipo de uso: residencial e comércio. Bibliografia principal: BAROSA, José Pedro (1996) – “Uma empresa e uma fábrica: 1888-1904”. In As fábricas de garrafas da Amora: 1888-1926. [Marinha Grande]: Museu Santos Barosa da Fabricação do Vidro. pt 1. CAMPO arqueológico da Amora (1982). Seixal: Câmara Municipal. CUSTÓDIO, Jorge (1983) – “Campo arqueológico da Amora : fase preparatória”. Arqueologia. Porto: Sociedade Portuguesa de Antropologia e Etnologia. 6: 170-173. “FÁBRICA de cortiça na Quinta das Lobatas, em Amora”(2001). Ecomuseu Informação. Seixal: Câmara Municipal, Ecomuseu Municipal. 20:8. FERREIRA, Maria José (1989) – Inventário do património do Seixal. [S.l.:s.n.]. Acessível no Centro de Documentação e Informação do Ecomuseu Municipal do Seixal. RODRIGUES, Henrique Eugénio de Castro (1910) – Planta do terreno e disposição das installações da Companhia das Fábricas de Garrafas na Amora. Concelho do Seixal – Distrito de Lisboa [material cartográfico]. Escala 1:500. 1 planta. Acessível no Centro de Documentação e Informação do Ecomuseu Municipal do Seixal. SANTANA; Francisco (1999-2000) – “Amora revisitada”. Arqueologia & Indústria. Lisboa: APAI ; Colibri. 2/3: 261-266. “SEIXAL e Amora” (1897). Século. Lisboa : [s.n.]. Ano 17, 5690:1. VIDROS (Dos) de Coina à Fábrica de Garrafas de Vidro da Amora: cinco séculos da indústria do vidro em Portugal (1982). Seixal: Câmara Municipal. Observações: Propriedade privada. As coordenadas de localização geográfica correspondem ao ponto central do edifício térreo com frontão. Inventariante: Maria de Fátima Afonso Data de inventariação: Dezembro de 2003 Data de actualização: Agosto de 2008
museu da rede portuguesa de museus NÚCLEOS E SERVIÇOS
Núcleo da Mundet Largo 1.º de Maio, 1 2840-485 Seixal SERVIÇOS CENTRAIS – Edifício dos Escritórios Telefone: 210976112 – Fax: 210976113 E-mail: ecomuseu@cm-seixal.pt Horário de atendimento geral: De 2.ª a 6.ª feira, das 9h às 12.30h e das 14h às 17.30h
Embarcações Tradicionais do Tejo Cais principal de apoio: Seixal Varino Amoroso e bote-de-fragata Baía do Seixal Realização de passeios no Tejo, entre Abril e Outubro Informações sobre programação de actividades: Serviço Educativo Bote-de-fragata Gaivotas em estaleiro
CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÃO Horário de consulta de Inverno (Outubro-Maio): 3.as, 4.as e 5.as feiras, 10.00h às 17.00h Horário de consulta de Verão (Junho-Setembro): 3.as, 4.as e 5.as feiras, das 9h às 12.30h e das 14h às 17h E-mail: ecomuseu.cdi@cm-seixal.pt
NÚCLEO DA QUINTA DA TRINDADE Azinheira, Seixal Imóvel Classificado de Interesse Público Acesso condicionado
SERVIÇO EDUCATIVO Horários de atendimento telefónico: 2.as feiras, das 9h às 12.30h e das 14h às 17h E-mail: ecomuseu.se@cm-seixal.pt ¬ EXPOSIÇÕES – Edifícios das Caldeiras Babcock & Wilcox e das Caldeiras de Cozer Horários de Inverno (Outubro - Maio): De 3.ª a 6.ª feira, das 9h às 12h e das 14h às 17h Sábados e domingos, das 14h às 17h Horário de Verão (Junho - Setembro): De 3.ª a 6.ª feira, das 9h às 12h e das 14h às 17h Sábados e domingos, das 14.30h às 18.30h Encerramento: 2.as feiras e feriados nacionais
NÚCLEO NAVAL Av. da República - Arrentela
Núcleo dA Olaria Romana da Quinta do Rouxinol Quinta do Rouxinol, Corroios Sítio Classificado Monumento Nacional Fornos de Cerâmica Romanos (sécs. II-IV) Acesso condicionado
Núcleo do Moinho de Maré de Corroios Devido a obras de conservação e de requalificação do imóvel e da envolvente, este núcleo encontra-se encerrado ao público
Extensão do Ecomuseu na Fábrica de Pólvora de Vale de Milhaços Vale de Milhaços, Corroios
¬ EXPOSIÇÕES ¬ Oficina de construção artesanal de modelos de barcos do Tejo Horário de Inverno (Outubro - Maio): De 3.ª a 6.ª feira, das 9h às 12h e das 14 às 17h Sábados e domingos, das 14h às 17h Horário de Verão (Junho - Setembro): De 3.ª a 6.ª feira, das 9h às 12h e das 14 às 17h Sábados e domingos, das 14h às 18.30h Encerramento: 2.as feiras e feriados nacionais
Sítio Classificado Imóvel de Interesse Público Acesso condicionado Informação sobre visitas: Serviço Educativo
Extensão do Ecomuseu na Quinta de S. Pedro Quinta de S. Pedro, Corroios Campo arqueológico necrópole medieval-moderna (séculos XIII-XVII) Acesso condicionado
Ficha Técnica _ Ecomuseu Informação n.º 49 _ www.cm-seixal.pt/ecomuseu Edição Câmara Municipal do Seixal/Ecomuseu Municipal do Seixal
Distribuição gratuita Assinaturas a pedido junto do EMS
Direcção E EDITORIAL
Créditos fotográficos
Graça Filipe
Indicados nas legendas respectivas
Participaram nesta edição
Grafismo e Revisão
Exposições: Graça Filipe Itinerância «Moinhos de Maré do Ocidente Europeu»: Cláudia Silveira Programa de Iniciativas de Serviço Educativo e Agenda: Carla Costa e Graça Filipe Centro de Documentação e Informação: Fernanda Ferreira Conhecer: Ana Machado e Fátima Afonso Carta do Património do Concelho do Seixal: João Paulo Santos e Fátima Afonso
Sector de Apoio Gráfico e de Edições da CMS Impressão
Corlito, Centro Técnico de Artes Gráficas, Lda. Tiragem
6000 exemplares ISSN
0873-6197 Apoio nos recursos fotográficos e ilustrações
Fernanda Machado
DEPÓSITO LEGAL
106175/96