Ecomuseu Informação N.º 52 – Julho | Agosto | Setembro 2009

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˙n.º 52˙JULHO.AGOSTO.SETEMBRO Boletim trimestral do Ecomuseu Municipal do Seixal

ecomuseu informação NÚCLEO DO MOINHO DE MARÉ DE CORROIOS reabre ao público Programa de Iniciativas: páginas 6 e 8

Núcleo do Moinho de Maré de Corroios – interior da sala de moagem © EMS/CDI, Graça Filipe, 1992

Em Setembro, comemore com o Ecomuseu Municipal do Seixal: dias 25, 26 e 27: JORNADAS EUROPEIAS DO PATRIMÓNIO

Aguarela Mares da Terra Nova, Jorge Brandeiro, 1956. Acervo do EMS

dia 25: DIA MUNDIAL DO MAR Apresentação do livro A Muleta, de Manuel Leitão, Ferdinando Oliveira Simões e António Marques da Silva (edição da Câmara Municipal do Seixal/Ecomuseu e do Museu de Marinha, 2009)

Exposição temporária Cortiça ao milímetro, no Núcleo da Mundet do EMS © EMS/CDI, António Silva, 2008

Consulte Programa de Iniciativas e Agenda. Visite-nos! Exposições e Programa de Iniciativas de Serviço Educativo informe-se em www.cm-seixal.pt/ecomuseu


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ÍNDICE 2

10˙11˙12

17˙18

EDITORIAL Insistir no valor do património cultural para a sociedade, a propósito das Jornadas Europeias do Património de 2009 . Graça Filipe

conhecer

EM FOCO

A olaria tradicional: a propósito de uma exposição de arqueologia . Jorge Raposo

3˙4

13˙14˙15˙16

Breve balanço e recomendações da Sessão Pública do 3.º Encontro de Embarcações Tradicionais na Baía do Seixal, sobre O património marítimo e a formação profissional – parcerias para o desenvolvimento de profissões ligadas ao mar

exposições 5˙6˙7 ˙8˙9

Programa de iniciativas de serviço educativo

carta do património do concelho do seixal O Moinho de Maré de Corroios, um recurso para o desenvolvimento local. Herança e memória de 600 anos de moagem . Cláudia Silveira

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Agenda 20

Núcleos e serviços do EMS

EDITORIAL Insistir no valor do património cultural para a sociedade, a propósito das Jornadas Europeias do Património de 2009 Na altura em que escrevemos este editorial ainda não conhece-

«O Património cultural constitui um conjunto de recursos herdados

mos o tema seleccionado pela coordenação nacional paras as

do passado que as pessoas identificam, independentemente do

comemorações deste ano, em Portugal, das Jornadas Europeias

regime de propriedade dos bens, como um reflexo e expressão dos

do Património, que habitualmente decorrem na última semana de

seus valores, crenças, saberes e tradições em permanente evolução.

Setembro. Recordemos que estas são, desde 1991, uma iniciativa

Inclui todos os aspectos do meio ambiente resultantes da interacção

do Conselho da Europa, tendo mais tarde passado a constituir uma

entre as pessoas e os lugares através do tempo».

acção conjunta daquele e da Comissão Europeia. Portugal tem ade-

rido anualmente a esta celebração do património cultural da Europa,

Parece-nos premente reconhecer o papel privilegiado dos museus,

que procura congregar os cidadãos de 49 países, sensibilizando-os

se dotados de meios adequados, para que integrem os objectivos

para a riqueza e a diversidade cultural no nosso continente e favore-

enunciados e o espírito da Convenção-Quadro do CE relativa ao valor

cer uma maior tolerância para lá das fronteiras nacionais.

do Património Cultural para a sociedade, em inúmeras vertentes da educação e da formação ao longo da vida, que fazem parte da sua

Portugal foi até agora um dos países signatários da Convenção-

programação e das actividades que desenvolvem.

-Quadro do Conselho da Europa relativa ao valor do Património Cultural para a sociedade, também conhecida como a Convenção

Centrando-nos na missão do Ecomuseu Municipal do Seixal –

de Faro, por resolução da Assembleia da República publicada no

contribuir para a construção e transmissão de memórias sociais e

Diário da República (n.º 177, Série I, 12 de Setembro de 2008). Dela

para o desenvolvimento local, através da investigação, conservação,

gostaríamos aqui de relevar algumas ideias que consideramos

documentação, interpretação, valorização e difusão de testemunhos

muito importantes, e já presentes, na gestão patrimonial que pers-

do homem e do meio reportados ao território e à população do

pectivamos e que a Câmara Municipal do Seixal promove através

Concelho do Seixal – continuaremos a planificar a nossa acção e

do Ecomuseu.

a empenharmo-nos em parcerias para contribuirmos para uma comunidade patrimonial ligada à herança cultural e ao desenvolvi-

Aquela Convenção do Conselho da Europa reconhece a neces-

mento sustentável deste município e da região.

sidade de «colocar a pessoa e os valores humanos no centro de

Contamos que, face à diversidade de patrimónios geridos, assim

um conceito alargado e interdisciplinar de Património cultural»,

como de iniciativas por que é interpretado e apresentado, envolvendo

salientando o valor e as potencialidades de um património cultural

diferentes tipos de participantes, se alargue também o acesso a

bem gerido, enquanto fonte ou recurso de desenvolvimento durável

variados públicos e assim aumente por parte destes o reconheci-

e de qualidade de vida numa sociedade em evolução constante.

mento do valor que o património cultural representa para a nossa

Enfatizando a «necessidade de comprometer cada um no processo

sociedade, tanto no plano memorial, como da criação contempo-

contínuo de definição e gestão do Património cultural», a Convenção

rânea.

de Faro define o importante conceito de comunidade patrimonial

Convidamos os nossos leitores, os amigos e doadores do Ecomuseu

– «composta por pessoas que valorizam determinados aspectos

e todos os potenciais públicos interessados na programação deste

do Património cultural que desejam, através da iniciativa pública,

trimestre a participarem no Programa de Iniciativas que vos apre-

manter e transmitir às gerações futuras». Finalmente, nestas

sentamos e/ou a visitarem as nossas exposições. Convidamo-

breves linhas, pretendemos destacar a interacção entre os cidadãos

-vos também a celebrarem o património cultural como

e os recursos do passado, assim como o direito de contribuir para

herança comum para o desenvolvimento, nas Jornadas

o seu enriquecimento, promover a diversidade cultural e a criação

Europeias do Património, em Setembro de 2009.

contemporânea enquanto ideias que dão força ao conceito de património cultural definido pela referida Convenção:

Graça Filipe


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EXPOSIÇÕES

ECOMUSEU INFORMAÇÃO

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Para mais informações sobre Exposições e Notícias, consulte o site www.cm-seixal.pt/ecomuseu

Núcleo da MUNDET do EMS Exposição temporária

Cortiça ao milímetro Edifício das Caldeiras Babcock & Wilcox

O papel de cortiça, hoje em dia principalmente associado a produtos decorativos e a acessórios utilitários, quando a sua produção mobilizava centenas de trabalhadores na fábrica Mundet do Seixal, onde era produzido para a indústria tabaqueira. A exposição Cortiça ao milímetro interpreta o funcionamento da oficina de fabrico de papel, com base nas suas máquinas e nas memórias dos antigos trabalhadores, e apresenta aos visitantes a grande diversidade dos produtos elaborados na Mundet a partir de finíssimas folhas de cortiça laminada.

Exposição de longa duração

Quem diz cortiça diz Mundet, quem diz Mundet diz cortiça Edifício das Caldeiras Babcock & Wilcox A produção de vapor para a fábrica Edifício das Caldeiras Cozer Cortiça A cortiça na fábrica: a preparação

Exposição Quem diz cortiça, diz Mundet…- A cortiça na fábrica: a preparação © EMS/CDI, António Silva, 2008.

As Caldeiras Babcock & WIlcox constituíam a oficina de produção de vapor, necessário à preparação e à transformação da matéria-prima. Nas Caldeiras dos Moços, procediase ao cozimento de pranchas de cortiça, uma das operações de preparação indispensável ao processamento da matéria-prima para as suas várias aplicações, desde a laminagem para papel ao fabrico de rolhas.

Núcleo NAVAL do EMS Exposição temporária

Oficina do Núcleo Naval Memórias da Faina do Alto Mar A partir de Abril, até Outubro de 2009

Mostra temática dedicada ao ciclo Bacalhoeiros – entre a Terra Nova e o Seixal, aborda, sobretudo através da reprodução de aguarelas de Jorge Brandeiro (colecção do Ecomuseu Municipal do Seixal), aspectos da história e das práticas da pesca de bacalhau.

Exposição de longa duração

Barcos, memórias do Tejo

Exposição baseada na colecção de modelos de embarcações tradicionais do estuário do Tejo – de pesca e de tráfego local. As diversas tipologias de embarcações, suas funções e contextos de trabalho são documentados e interpretados através de recursos museográficos diversos, incluindo um audiovisual que sintetiza as várias temáticas.

Exposição Barcos, memórias do Tejo © EMS/CDI, Luís Miguel Martins, 2008.


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Núcleo DO MOINHO DE MARÉ DE CORROIOS do EMS Exposição de longa duração

600 anos de MOAGEM NO Moinho de Maré de Corroios Entre os objectivos específicos deste núcleo do Ecomuseu incluem-se a preservação, a interpretação e a exposição do conjunto patrimonial formado pelo imóvel e equipamento na sua relação com a envolvente; a valorização do trabalho e do saber-fazer associados às funções de moleiro, contextualizando-os nos princípios técnicos e tecnológicos utilizados e procurando assegurar a transmissão activa de técnicas e saberes associados à conservação do sistema de moagem em funcionamento; a interpretação do imóvel, evidenciando a sua

Exposição temporária no Museu Nacional de Arqueologia, em Lisboa

Quinta do Rouxinol: uma olaria romana no estuário do Tejo [Corroios, Seixal] Exposição do Ecomuseu Municipal do Seixal em parceria com o Museu Nacional de Arqueologia. São interpretados e apresentados – com a necessária contextualização em relação ao sítio de proveniência – quer as produções da olaria da Quinta do Rouxinol (séculos II-V), quer materiais exógenos, que o projecto de investigação também valorizou. Abarcando a actividade do oleiro, a exposição integra ainda uma reconstituição, à escala natural, de um forno cerâmico da

evolução construtiva e contextualizando-o historicamente, tanto numa perspectiva nacional como internacional.

Núcleo do Moinho de Maré de Corroios – vista aérea © EMS/CDI, António Silva, 2005.

mesma tipologia de um dos fornos romanos de Corroios, a par da sua reconstituição virtual tridimensional. Edições complementares: desdobrável (incluído na visita) e guia (5 euros).

Exposição Quinta do Rouxinol: uma olaria romana no estuário do Tejo (Corroios/Seixal) © EMS/CDI, António Silva, 2005

em circulação pela europa Exposição itinerante

Moinhos de Maré do Ocidente Europeu A exposição itinerante Moinhos de Maré do Ocidente Europeu, resultante de uma parceria internacional coordenada pelo Ecomuseu Municipal do Seixal e apoiada pelo Programa Cultura 2000 da Comissão Europeia, continua em circulação pelo espaço atlântico europeu. No decurso deste trimestre, encontra-se agendada a sua apresentação no Ecoparque de Trasmiera, em Arnuero (Cantábria – Espanha) até ao próximo dia 15 de Julho; no Centro de Interpretação Ambiental de Leiria entre meados de Julho a 14 de Setembro; no Museu do Departamento de Engenharia Civil

e Arquitectura do Instituto Superior Técnico, em Lisboa, a partir de meados de Setembro; e em Saint-Malo (França) de 19 de Setembro a 11 de Outubro. Mais informações sobre a exposição e o projecto que a enquadra encontram-se disponíveis no site www. moinhosdemare-europa.org.

Moinho de Maré de Santa Olaja, em Arnuero (Cantábria, Espanha) © José Antonio Cano Quintana, 2004.


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EM FOCO

3.º Encontro de Embarcações Tradicionais na Baía do Seixal 22 a 26 de Maio de 2009 Breve balanço e recomendações sobre O património marítimo e a formação profissional – parcerias para o desenvolvimento de profissões ligadas ao mar O 3.º Encontro de Embarcações Tradicionais, organizado pelo Ecomuseu Municipal do Seixal, reuniu na Baía do Seixal 48 embarcações e 194 tripulantes: 32 embarcações tradicionais do estuário do Tejo (com 147 marinheiros), 4 barcos do Norte de Portugal (com 20 marinheiros) e 12 barcos da Galiza (com 27 marinheiros). Neste Encontro participaram também 10 embarcações de apoio, com 36 tripulantes, além de 14 elementos da organização. Embarcaram ainda e participaram nas várias actividades de navegação, a bordo das embarcações tradicionais das autarquias do estuário do Tejo – desfile, regata e passeios com navegação em frota – 377 pessoas. Nas actividades do 3.º Encontro de Embarcações Tradicionais na Baía do Seixal contaram-se assim 621 participações no rio. Complementarmente, realizaram-se, junto ao cais do Seixal, os ateliês Aprender a fazer… Nós de marinheiro e Pintura tradicional de barcos do Tejo, com 126 participantes, sendo estes maioritariamente crianças. Destaca-se por outro lado a realização da sessão pública sobre O património marítimo e a formação profissional – parcerias para o desenvolvimento de profissões ligadas ao mar, no dia 23 de Maio, entre as 16.30 e as 19.30h, na Associação Náutica do Seixal, com 100 participantes. Ao longo dos cinco dias de actividades, foi ressaltada a opinião de que o Encontro de Embarcações Tradicionais na Baía do Seixal já assumiu um importante lugar no calendário de iniciativas culturais no estuário do Tejo, contribuindo para a protecção e a valorização do património marítimo e fluvial, em particular das embarcações tradicionais, enquanto recursos de desenvolvimento, divulgando-os nos âmbitos nacional e internacional. Assim, foi reafirmado, pelos diversos parceiros e associações integrados na dinamização do Encontro, o propósito de contribuir para a sua continuidade e consolidação, quer quanto a embarcações e tripulantes no rio, quer quanto a participantes e diversidade de iniciativas em terra, particularmente de forma a envolver as comunidades locais.

Recorda-se que um dos principais objectivos definidos para este 3.º Encontro consistiu na promoção de parcerias para o desenvolvimento de profissões ligadas ao mar, reconhecendo a importância da formação profissional para assegurar os saberes-fazer associados à navegação e à manutenção das embarcações tradicionais. Preocupações sobre esta problemática foram anteriormente expressas e discutidas nas sessões públicas do 1.º e do 2.º Encontros promovidos pelo Ecomuseu Municipal do Seixal, em 2007 e 2008, respectivamente sobre Protecção e valorização do património marítimo do estuário do Tejo - Museus e comunidades e sobre Associações náuticas e museus como agentes de desenvolvimento, através das culturas e dos patrimónios flúvio-marítimos. Interpretando e resumindo o conjunto de contributos apresentados pelos representados das diversas organizações convidadas e pelos intervenientes no participado debate, realizado por ocasião da sessão pública de 23 de Maio de 2009, sobre a temática O património marítimo e a formação profissional – parcerias para o desenvolvimento de profissões ligadas ao mar, ressaltam-se os pontos e recomendações gerais seguintes. 1. Para a formação de tripulantes que activem a navegação tradicional e a preservação de embarcações de interesse patrimonial, recomendou-se: 1.1. A implementação de oferta formativa que inclua, além da navegação propriamente dita, algumas componentes sobre cultura marítima e o contexto social e ambiental das embarcações tradicionais e de interesse patrimonial. 1.2. O estabelecimento de parcerias entre entidades gestoras das embarcações tradicionais e de interesse patrimonial e instituições educativas e de formação credenciada, para assegurar uma estratégia e programas de continuidade, implementados de forma descentralizada e bem divulgados, particularmente junto de níveis etários mais jovens.


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Breve balanço e recomendações da sessão pública do 3.º Encontro de Embarcações Tradicionais na Baía do Seixal

encontro de embarcações tradicionais na baía do seixal 22 a 26 maio 2009

ORGANIZAÇÃO

APOIOS

1.3. O reconhecimento das profissões de marinheiro, tanto ligadas ao tráfego local como à náutica de recreio, integrando os tripulantes de embarcações de interesse patrimonial, para os quais devem ser identificadas e reconhecidas especificidades em consonância com a protecção e a valorização das embarcações com que operam. 1.4. A implementação e/ou o desenvolvimento de competências, nalguns casos já demonstradas por algumas entidades gestoras de património marítimo navegante (em que se enquadram por exemplo algumas autarquias ribeirinhas do estuário do Tejo e o Ecomuseu Municipal do Seixal), na transmissão de técnicas tradicionais de navegação à vela, promovendo projectos e parcerias no sistema educativo e de habilitação profissional. 1.5. A iniciativa de âmbito legal que concilie as normas de segurança e as práticas de navegação em embarcações tradicionais e de valor patrimonial, de forma adequada à sua preservação e à salvaguarda de técnicas e saberes-fazer que constituem herança cultural das comunidades que as utilizam e transmitem. MARCODIESEL

WWW.CM-SEIXAL.PT

2. Para a transmissão de técnicas tradicionais de construção naval e a prossecução de uma estratégia e de estruturas formativas que promovam a construção naval em madeira, recomendou-se: 2.1. O incentivo a estudos sobre o sector da construção naval em madeira no litoral português, ajudando ao delinear de medidas para a sobrevivência das técnicas tradicionais de construção em madeira, implementando-as em conexão com a renovação tecnológica do sector. 2.2. Um investimento público responsável para a preservação de embarcações históricas, de interesse patrimonial e tradicionais, em articulação com uma estratégia de formação e de criação de

estruturas formativas através de parcerias com entidades privadas e associativas. 2.3. O desenvolvimento de projectos integrados de salvaguarda e de protecção de património marítimo navegante – quer através da reconstrução e da conservação de embarcações de interesse patrimonial em estaleiro, quer por via do apoio a iniciativas individuais ou associativas de construção e reparação de barcos através de técnicas tradicionais – e de oferta formativa relativa à engenharia e à construção naval, contribuindo assim para a sustentabilidade da indústria da construção naval em madeira. 2.4. A promoção de cursos profissionais regulamentados e destinados ao desenvolvimento do sector, que capitalizem boas práticas pedagógicas e estruturados para a empregabilidade dos formandos, mediante um modelo organizacional em articulação com a realidade empresarial e adaptado às suas especificidades. Desde logo considera-se importante avaliar experiências recentes e aproveitar todo o trabalho realizado no que concerne os cursos profissionais anteriormente criados e regulamentados – como por exemplo o Curso Profissional de Técnico de Desenho de Construção Naval/Embarcações de Recreio (Portaria n.º 912/2005 de 26 de Setembro). 2.5. O conhecimento e estudo comparativo dos problemas estruturais da construção naval em madeira que afectam diferentes regiões marítimas e do litoral europeu, tendo em conta a situação geral de descontinuidade e de perigo de ruptura das cadeias de transmissão de saberes-fazer e de técnicas tradicionais. Tal conhecimento permite caracterizar experiências e contextos, como procurou fazer Dionísio Pereira, sobre o caso da Galiza (Espanha), apontando que a formação empírica, transmitida de pais para filhos nas carpintarias navais, deu e está a dar produtos de alta qualidade e fiabilidade no mar, mas é insuficiente para a renovação tecnológica com base nas técnicas tradicionais de construção, face às exigências ambientais e de controlo de qualidade. Dado o interesse manifestado pelos intervenientes em desenvolver vários aspectos do debate proporcionado, em particular em torno do tema da mesa-redonda – A transmissão de técnicas de construção naval e a formação profissional – foi assumido por parte dos organizadores o propósito de retomar este tema em próxima ocasião, se possível contando com a participação das mesmas entidades ali representadas.


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Olaria de Hernâni Fortunato (Sobreiro, Mafra) © EMS/CDI, Cézer Santos, 2008

CONHECER

A olaria tradicional: a propósito de uma exposição de arqueologia São várias as vias pelas quais o Ecomuseu Municipal do Seixal procura cumprir uma missão que, entre outras, lhe comete as funções de investigar, documentar, interpretar e difundir os bens patrimoniais móveis e imóveis identificados no Concelho, com a consequente responsabilização social pela partilha alargada do conhecimento e da informação daí decorrentes. Por isso, os serviços mais ligados à investigação, documentação e inventário funcionam em estreita ligação com um Centro de Documentação e Informação que reúne, trata e disponibiliza ao público materiais em múltiplos suportes e com diferentes temáticas, resultantes do desenvolvimento dos mais variados projectos (ver em www.cm.seixal. pt/ecomuseu). Recentemente, foi este o caso de um conjunto de vídeos com imagens do Arquivo RTP sobre olaria tradicional portuguesa (Ref.ª CDI: DVD 35), adquiridos a propósito de projecto promovido no contexto da actividade do Serviço de Arqueologia e da sempre desejável interligação com outras instituições museológicas e recursos externos. De facto, em 2007, o Ecomuseu Municipal do Seixal formalizou uma parceria com o Museu Nacional de Arqueologia (MNA), ao abrigo da qual viu aprovada candidatura ao programa ProMuseus, do Instituto dos Museus e da Conservação/ / Rede Portuguesa de Museus, para planificação de exposição sobre a olaria romana da Quinta do Rouxinol. Trata-se de sítio arqueológico localizado na freguesia de Corroios, Concelho do

Seixal, classificado como Monumento Nacional desde 1992, que desta forma pôde ser divulgado junto de públicos mais alargados através da utilização do espaço para exposições temporárias do MNA, no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa. Inaugurada em 19 de Março último, a referida exposição pode ser aí visitada até finais de Novembro e dispõe de diversa informação complementar na Internet (ver www.mnarqueologia-ipmuseus.pt). Sendo um dos raros vestígios de actividade oleira em época romana no estuário do Tejo (apenas se conhecem dois outros, nos actuais concelhos de Alcochete e Benavente), na olaria da Quinta do Rouxinol foram identificados e alvo de escavação e posterior estudo arqueológico fornos onde se cozeram peças de loiça doméstica variada, lucernas (candeias para iluminação) e, principalmente, ânforas para transporte de conservas e outros preparados de peixe, sendo também provável que uma das formas servisse para envasar vinho. Muita cerâmica partida e amontoada em fossas e outros estratos de utilização e abandono atestam a diversidade e intensidade de uma produção que terá tido o seu auge entre o início dos séculos III e V d.C., satisfazendo as necessidades das populações locais e beneficiando da proximidade de Olisipo (Lisboa) e dos centros conserveiros que exportavam produtos lusitanos para vários pontos do Império. Naturalmente, passados cerca de 1600 anos desde que terão deixado de funcionar, estes for-


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A Olaria Tradicional: a propósito de uma exposição de Arqueologia

nos chegaram até nós parcialmente arruinados, em diferente estado de conservação, colocando diversos problemas de interpretação da sua arquitectura e modo de funcionamento – não é fácil perceber como seriam quando completos e operacionais, nem recuperar a gestualidade associada ao trabalho do oleiro. Para o conseguir, recorre-se à comparação, tão exaustiva quanto possível, com informação recolhida em sítios arqueológicos de cronologia e tipologia similares, quer em território português, quer a nível internacional. No entanto, apesar de esta ser uma arte milenar, manteve características predominantemente artesanais até há poucas décadas e ainda hoje subsistem exemplos de cadeias operatórias, tecnologias e saberes muito semelhantes aos praticados na Época Romana e na Alta Idade Média. Por isso, é fundamental procurar também paralelos de natureza etnográfica e antropológica, preservados em registos arquivísticos e documentais, no espaço físico de pequenas olarias de vários pontos do País e na memória de muitos dos seus antigos e actuais oleiros. Para esse efeito, o banco de imagens de arquivo da televisão pública constitui precioso recurso e nele se desenvolveram as primeiras pesquisas, com selecção e visionamento de vários programas e documentários. Daí resultou a identificação e posterior aquisição de cerca de hora e meia de imagens, que reportam ao funcionamento de olarias das zonas de Montemor-o-Velho, Mafra, Lisboa e Viana do Alentejo, entre 1960 e 1986. Para além de documentação de apoio à prepa-

Reprodução de imagens de filmes do Arquivo RTP (2008), ilustrando a olaria tradicional em diversas localidades – Casal do Redinho (moringue); Sobreiro (oleiro, mulheres e enfornamento); Lisboa (aprendiz) e Viana (forno a lenha)

ração da exposição, estas imagens permitiram produzir e integrar na mesma dois audiovisuais: um com cerca de oito minutos, intitulado “Olaria artesanal: da extracção do barro à cozedura em forno a lenha”, dirigido a públicos generalistas; outro com menos de três minutos, dramatizado com a inclusão de uma personagem, a Rita, para públicos infantis e juvenis. Datado de 2 de Novembro de 1960, o mais antigo destes registos é precisamente o de olaria lisboeta indeterminada, correspondente a documentário de título Cerâmica, dirigido por Fialho Gouveia, com montagem de Isabel Sá e imagem de Silva Campos. Foram seleccionados cerca de onze dos pouco mais de 12 minutos originais que, infelizmente sem som, testemunham a maioria das fases caracterizadoras desta actividade: a extracção do barro em local próximo da olaria e o seu transporte para a mesma, onde é depurado, tratado e laboriosamente amassado pelos pés de jovem aprendiz; o hábil trabalho de mãos que dá forma às peças sobre a cabeça da roda de oleiro, apenas com a ajuda de um pequeno pedaço de cana e de um fio de corte; a pintura e o vidrado de loiça utilitária e decorativa e de azulejos; a execução de peças figuradas com molde de gesso ou pela cuidada modelagem manual de um aprendiz, reproduzindo estatueta zoomórfica que nos remete de imediato para peça muito semelhante encontrada na Quinta do Rouxinol e presentemente exibida no MNA (Tema 08. A Actividade do Oleiro); as técnicas de enfornamento e desenfornamento, etc. Do programa Presença do Passado que tem por título “Olaria de Viana do Alentejo”, gravado aproximadamente 13 anos depois em olaria localizada no interior do arruinado Convento de Jesus, nessa vila alentejana, extraíram-se cerca de seis minutos dos pouco mais de 16 originais, onde as imagens são enriquecidas pela narração e diálogo entre o arqueólogo e investigador Fernando Russel Cortez e um dos oleiros – voz que exprime a consciência da herança de uma tradição que remontará a 1272, a crer em documento “escrito em letra de pena” preservado pela autarquia, mas verbaliza também o lamento pela perspectiva de um futuro onde “os modernos não querem aprender” o ofício “porque é uma arte pobre”. As imagens mostram-nos o quotidiano da olaria e a relação que nesse espaço se estabelecia com os velhos, as crianças e os animais, mas atestam principalmente um caso muito interessante de forno a lenha com câmara de cozedura de acesso lateral e aberta no topo, onde cada fornada é coberta apenas pelos cacos de peças partidas em ocasiões anteriores. Este foi um dos exemplos que contribuiu para a pro-


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CONHECER

Olaria do oleiro-poeta António Batalha (Sobreiro, Mafra) © EMS/CDI, Cézer Santos, 2008

Olaria Araújo e Duarte (Sobreiro, Mafra) © EMS/CDI, Cézer Santos, 2008

posta de reconstituição de um dos fornos romanos da Quinta do Rouxinol, explorada na exposição a que vimos aludindo (Tema 05. Um Forno na Quinta do Rouxinol). Contudo, os documentários mais extensos e expressivos datam de 1981 e 1986, tendo sido recolhidos nas olarias do Sr. Delfim e de Manuel Araújo, no Casal do Redinho (Montemor-o-Velho) e no Sobreiro (Mafra), respectivamente. O primeiro, intitulado “Trabalho do Corpo, Trabalho das Formas”, integrou a série de programas Memória de Um Povo e tem assinatura de Teresa Olga (realização), António Hipólito (imagem), Júlio Pereira (música) e Maria Armanda Passos (texto e locução). Durante quase 29 minutos, a narração contextualiza a actividade oleira e o Sr. Delfim transmite paciente e respeitosamente a experiência acumulada desde os 15 anos de idade, resultado de meio século no exercício de uma

profissão aprendida com o pai e o avô, enquanto uma mão que “já tem os tamanhos da loiça” dá forma a várias peças, entre elas a “que custa mais a fazer”, a intrigante bilha conhecida por “moringue”. Silenciosa mas sempre presente, a mulher acompanha-o nos acabamentos e em graciosas e expeditas decorações geométricas ou naturalistas. Por fim, o documentário gravado no Sobreiro, com o título “II. Oleiro” e destinado ao programa As Profissões, tem pouco mais de 24 minutos e meio de duração, realização e argumento de José Asseiceiro, direcção de fotografia de Germano Vaz e locução de Armando Carvalheda. É talvez o vídeo com maiores preocupações de contextualização histórica da produção de cerâmicas, ao mesmo tempo que retrata a excelente e didáctica interacção com Manuel Araújo, “há 24 anos na casa” mas ainda convicto de que “um oleiro anda sempre a aprender”. Desvendam-se os segredos do barro, da “baliza” e do “pauzinho” que ajudam a regular a dimensão e a forma das peças, e da atitude que permite enfrentar novos desafios – “antes de fazer a peça tem de se passar pela cabeça como é que a gente há-de começar”. Nos documentos visuais em apreço, é dos que melhor ilustra o meticuloso enchimento do forno com peças de forma e dimensão variada, bem como o processo de fecho do acesso ao interior da câmara de combustão, por empilhamento de pedaços de peças já cozidas e preenchimento dos intervalos com barro. A presença das mulheres é marcante, não só nos acabamentos e decoração das cerâmicas, mas também enquanto suporte da unidade familiar, mesmo quando isso implica brincar e cuidar de crianças pequenas no espaço da olaria. É todo um processo de sociabilização e de aprendizagem que parece contrariar o lamento repetido – “hoje já ninguém quer aprender”. E o certo é que, 23 anos depois, a olaria de Araújo e Duarte ainda funciona, agora nas mãos dos seus filhos, José e Henrique, como pudemos constatar no trabalho de campo realizado no Sobreiro, também no âmbito da preparação da exposição sobre a olaria romana da Quinta do Rouxinol. Para que hoje possamos ainda encontrar a loiça e as peças cerâmicas que, diz-nos no mesmo vídeo Francelina, experiente vendedora da Nazaré, tanto encantavam “senhoritas como saloias”! Jorge Raposo


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Inauguração do caminho-de-ferro Barreiro - Seixal. Data: 1923/07/30 Fundo: O Século Fonte: Arquivo Nacional Torre do Tombo / DGARQ /MC. Código de referência: PT/TT/EPJS/SF/FT/04-23/04093

CARTA DO PATRIMÓNIO Do seixal

Em Portugal, à semelhança do que sucedeu noutros países europeus, foram edificados moinhos de maré em diversos pontos do litoral, atingindo-se uma maior concentração destes engenhos no Algarve e no estuário do Tejo, zona onde se encontram inventariadas mais de quatro dezenas de edifícios. A escolha deste espaço geográfico para a edificação de estruturas moageiras maremotrizes, que se encontra documentada desde a primeira metade do século XIII, foi condicionada por factores como a navegabilidade do rio, que facilitava o transporte do cereal e da farinha, a proximidade relativamente a Lisboa, o crescimento demográfico da região desde finais da Idade Média, o seu dinamismo portuário e a necessidade de abastecer as Armadas Reais em biscoito de embarque a partir do início da Expansão Portuguesa, no século XV.

O MOINHO DE MARÉ DE CORROIOS, UM RECURSO PARA O DESENVOLVIMENTO LOCAL HERANÇA E MEMÓRIA DE 600 ANOS DE MOAGEM O Moinho de Maré de Corroios foi o primeiro a ser edificado

Almada e do Seixal, tendo fundado os Moinhos Reunidos,

no actual território concelhio, em 1403, por iniciativa de D.

empresa que se encontra na origem da Moagem do Cara-

Nuno Álvares Pereira, recentemente canonizado como S.

mujo, instalada na Cova da Piedade no final do século XIX.

Nuno de Santa Maria, a quem D. João I havia doado os es-

No início do século XX, a exploração da actividade moa-

teiros de Corroios, Amora e Arrentela. Dotado inicialmente

geira no Moinho de Maré de Corroios foi assumida pelo

com três moendas, foi depois doado pelo Condestável ao

industrial Manuel Joaquim de Oliveira, que à moagem de

Convento de Santa Maria do Carmo de Lisboa, que o pró-

cereais aliou o descasque de arroz, adaptando um dos ca-

prio fundara, instituição que assumiu a responsabilidade

sais de mós a essa função e efectuando, entre 1907 e 1930,

pela sua administração através da celebração de suces-

algumas obras de ampliação no edifício.

sivos contratos de aforamento, garantindo desse modo a

O advento das moagens industriais conduziu ao declínio

sua exploração e conservação e assegurando a obtenção

dos sistemas tradicionais de moagem e ao consequente

de rendimentos para a vida monástica. Tendo sido suces-

abandono e degradação de alguns deles, o que não se veio

sivamente ampliado, em 1807 já possuía os oito engenhos

a verificar no Moinho de Maré de Corroios, uma vez que o

de moagem com que chegou aos nossos dias. Porém, em

imóvel foi adquirido em funcionamento pela Câmara Mu-

1834, foi incorporado na Fazenda Nacional, em virtude da

nicipal do Seixal, vindo a abrir ao público em 1986, como

extinção das Ordens Religiosas masculinas, tendo sido

núcleo museológico integrado na estrutura do Ecomuseu

vendido em hasta pública. Volvidos dois anos, foi adquiri-

Municipal do Seixal.

do por João Luís Lourenço, figura destacada do concelho

Decorridos 20 anos após a primeira intervenção no Moinho

de Almada, mantendo-se na sua família até 1958. Até essa

de Maré de Corroios e coincidindo com a passagem dos 600

data, foi explorado por diversos indivíduos, salientando-se

anos relativamente à construção do edifício original, tendo

a família Gomes, que assumiu um forte protagonismo no

em conta as patologias que o afectavam do ponto de vista

desenvolvimento da moagem industrial nos concelhos de

estrutural e arquitectónico, bem como a necessidade de


16 ˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙n.º 52˙JUL.AGO.SET

2009

CARTA DO PATRIMÓNIO Do seixal aprovada em 23 de Setembro de 1992 a sua aplicação ao Concelho do Seixal através do respectivo Plano Director Municipal. Paralelamente, o recurso a uma fonte de energia renovável, a energia das marés, de elevadas potencialidades no nosso País, como se exemplifica pela existência de um amplo conjunto de moinhos de maré que se encontrou em laboração de norte a sul durante séculos, constitui um importante contributo para a sustentabilidade e a conservaVista aérea do Moinho de Maré de Corroios © EMS/CDI, António Silva, 2005

ção do ecossistema em que o moinho se encontra implantado e continua a apresentar potencialidades que poderão ser desenvolvidas e aplicadas no mundo actual. Os moinhos de maré edificados na Europa entre os séculos VII e XIX, de que o Moinho de Maré de Corroios constitui um exemplo assinalável, representam actualmente um importante testemunho sobre a vivência das sociedades que nos antecederam e sobre a sua capacidade de tirar proveito das forças naturais, respeitando o ecossistema em que se integravam. A presença destas estruturas nas paisagens do litoral atlântico europeu e o seu progressivo desaparecimento ou abandono reflectem a própria evolução económica das sociedades.

Sala de moagem do Moinho de Maré de Corroios © EMS/CDI, Luís Azevedo, 1995

Numa época em que os problemas energéticos se encontram na ordem do dia, torna-se imperativo salvaguardar e preservar este exemplo de utilização de um tipo de energia renovável, assim como as técnicas de trabalho e o saber-

qualificação museográfica deste espaço, entendeu a Câ-

-fazer que lhe estão associados. Desta forma, o aprovei-

mara Municipal do Seixal, a quem pertence a sua proprie-

tamento destes recursos patrimoniais e a recuperação

dade, assumindo as responsabilidades que lhe competem,

biológica e paisagística da sua envolvente natural poderão

proceder a um programa de intervenção, actualmente em

desempenhar um papel fundamental na formação e acti-

fase de conclusão, que previa a realização de trabalhos de

vação da cidadania e na formulação de estratégias propi-

conservação do imóvel, de requalificação museológica e

ciadoras do desenvolvimento local.

museográfica, de interpretação do edifício e da envolvente

Assim, o projecto desenvolvido pelo Ecomuseu Municipal

e respectiva preservação e divulgação.

do Seixal para o núcleo museológico do Moinho de Maré

A importância do imóvel, aliás reconhecida pelo Decreto

de Corroios assenta numa visão conceptual que visa esta-

do Governo n.º 29/84 de 25 de Junho, que classificou os

belecer a ligação entre a herança cultural representativa

moinhos de maré do Concelho como Imóveis de Interesse

da evolução histórica que marcou o território concelhio

Público, e da respectiva envolvente nas suas várias verten-

e os desafios do mundo contemporâneo, entre os quais

tes – histórica, patrimonial, técnica, ambiental, etnográfi-

emergem as questões ambientais e do desenvolvimento

ca, pedagógica – justifica que se promova a conservação

sustentável.

deste edifício in situ e em funcionamento e se potencie a divulgação do universo que representa, consubstancian-

Cláudia Silveira

do não só a própria história do Concelho, mas também os mais prementes desafios com que o mundo contemporâneo se debate na senda da sustentabilidade. De facto, além de se tratar de um dos mais antigos edifícios do território concelhio, o moinho emergente no sapal de Corroios encontra-se implantado na maior mancha de sapal existente no Município do Seixal, o que confere a este espaço uma grande importância do ponto de vista ecológico, justificando a sua inclusão na Reserva Ecológica Nacional, instrumento de gestão e de ordenamento do território fundamental para a protecção de espaços naturais, a qual foi criada com base no Decreto-Lei n.º 93/90, de 19 de Março, com o objectivo de proteger os ecossistemas e a estrutura biofísica do território e de salvaguardar a sua importância económica, social e cultural, tendo sido

Alçado do Moinho de Maré de Corroios © EMS/CDI, Rosa Reis, 2005


2009

ECOMUSEU INFORMAÇÃO

˙n.º 52˙JUL.AGO.SET˙ 17

CARTA DO PATRIMÓNIO DO CONCELHO DO SEIXAL O Moinho de Maré de Corroios, um recurso para o desenvolvimento local.

REFERÊNCIA DE SÍTIO: CPS.00004

colaboração do antigo moleiro, e aberto ao público. A Câmara Municipal do Seixal edita o estudo da

DESIGNAÇÃO: Moinho de Maré de Corroios

autoria de António Nabais História do Concelho do Seixal. Património Industrial – Moinhos de Maré, 1.ª

Localização administrativa: Corroios

ed., Seixal, Câmara Municipal do Seixal, 1986, o qual resulta do projecto de investigação desenvolvido

Localização geográfica: SIG Ortofotomapa N.º

pelo investigador em colaboração com a Associação

442.1/4.5.

Portuguesa dos Amigos dos Moinhos e que fundamentou o processo de classificação patrimonial dos

Coordenadas: UTM (PC 1973) - x = -88061; y =

moinhos de maré do Seixal.

-113279.

Da Reserva Ecológica Nacional aprovada no Concelho do Seixal pelo Plano Director Municipal, em 23

Categoria de sítio: Proto-industrial e industrial.

de Setembro de 1992, faz parte o sapal e a área envolvente do Moinho de Maré de Corroios.

Tipo de sítio: Moinho de maré.

Desde 2001 é desenvolvido no âmbito do Ecomuseu Municipal um projecto de investigação relativo aos

Cronologia: Séculos XV-XX

moinhos de maré do Seixal.

Moagem de cereais entre os séculos XV (em funcio-

Síntese de intervenções:

namento desde 1403) e XX.

Entre 1982 e 1986, realizam-se obras de recuperação

Entre 1908 e 1922, encontra-se documentada a uti-

e adaptação que possibilitam a manutenção em fun-

lização deste moinho para efectuar o descasque de

cionamento do Moinho de Maré de Corroios e a sua

arroz.

abertura como núcleo museológico, que incluem a reparação de coberturas, a picagem de paredes;

Descrição sumária do edifício:

a aplicação de novo reboco e pintura; a reparação

Edifício com sólida estrutura arquitectónica, com 8

de madeiras das portas e janelas; a demolição de

arcadas voltadas para o rio, sob as quais giravam as

construções que haviam sido anexadas ao moinho;

rodas hidráulicas horizontais. O edifício é constituí-

a reconstrução de parte do sistema de moagem; a

do por um embasamento em lajedo assente sobre

construção de instalações sanitárias e a instalação

arcaria de pedra, no qual existem 8 canais por onde

de electricidade. O primeiro andar é transformado

passa a água represada na caldeira. Sobre o emba-

num espaço polivalente.

samento de pedra aparelhada, ergue-se o edifício

Entre 1990 e1995, realizam-se obras de beneficiação

de planta rectangular, onde se distribuem diferentes

no Moinho de Maré de Corroios promovidas pela Câ-

espaços: no piso térreo, a sala de moagem com pa-

mara Municipal do Seixal: os cabos eléctricos foram

vimento em lajedo, onde estão instalados 8 casais

substituídos por cabos subterrâneos; foram inter-

de mós; no 2.º piso, situava-se o celeiro e a habita-

vencionadas as fundações do edifício; é construída a

ção do moleiro. A partir da sala de moagem acede-

muralha e rampa de acesso à arcaria e rodízios, do

se ao exterior, onde se localiza a comporta. Ao lado

lado do rio; são colocados cabeços de amarração na

do moinho, localiza-se a caldeira, outrora com uma

muralha; remodelam-se os sanitários; consolida-se

área de 49 318 m2, delimitada por um muro desti-

parte da muralha da caldeira; procede-se à conso-

nado a reter as águas. Possui um cais com escada

lidação de abóboda e comporta; promove-se o ar-

em alvenaria.

ranjo dos acessos e do espaço exterior; efectua-se a reparação de beirados e coberturas.

Medidas de protecção:

Em 2002 são promovidas obras pela Câmara Mu-

A partir de 1980 a Câmara Municipal do Seixal toma

nicipal do Seixal consistindo na Conservação/ Re-

a iniciativa de aquisição de dois moinhos de maré,

cuperação do Moinho de Maré de Corroios, Cala

um dos quais o Moinho de Maré de Corroios, para a

e Caldeira, com concepção e execução de Oikos,

sua salvaguarda e protecção.

Construções, Lda. e Soraya Genin, Arquitectura e

Em 1982 a Proposta de Criação e o Programa do

Restauro, Lda.

Museu Municipal do Seixal incluem o Moinho de

No edifício, executaram-se os seguintes traba-

Maré de Corroios, como núcleo museológico.

lhos: levantamento arquitectónico e de patologias;

O Moinho de Maré de Corroios é classificado Imóvel

tratamento da estrutura de madeira da cobertura,

de Interesse Público – Decreto do Governo n.º 29/84,

substituição do telhado (troca de telha marselha por

de 25 de Junho.

telha de canudo), introdução de isolamento (sub-

Em 1986 passa a constituir núcleo do Ecomuseu Mu-

telha Onduline e poliestireno extrudido roofmate),

nicipal, preservado em funcionamento, através da

mantendo o forro existente; remoção de cimentos


18 ˙ECOMUSEU INFORMAÇÃO˙n.º 52˙JUL.AGO.SET

2009

CARTA DO PATRIMÓNIO do concelho do seixal O Moinho de Maré de Corroios, um recurso para o desenvolvimento local.

de alvenarias e cantarias no interior; consolidação

sob o ponto de vista do património industrial / Jorge

de embasamento, incluindo a zona da comporta, a

Custódio. In - 1.º Encontro nacional sobre o patrimó-

soleira, os poços dos rodízios e as setias. Na envol-

nio industrial : actas e comunicações. [S.l.] : Coim-

vente, realizou-se a dragagem da cala e da caldeira.

bra Editora, 1989 – 1990, Vol. 1, p. 343-389.

Em 2006 realiza-se o estudo Reforço Estrutural da

FLORES, Alexandre, António José Gomes. O Homem

Cobertura Alta, por BETAR, Estudos e Projectos de

e o Industrial (1847-1909), Junta de Freguesia da

Estabilidade, Lda.

Cova da Piedade, 1992.

Com o apoio do Programa Operacional da Cultura

NABAIS, António J. - Moinhos de maré : patrimó-

–PROJECTO Ecomuseu Municipal do Seixal – Moi-

nio industrial. Seixal : Câmara Municipal do Seixal,

nho de Maré, co-financiado pela União Europeia –

1986.

Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, em

OLIVEIRA, Ernesto Veiga de ; GALHANO, Fernando ;

2007 a Câmara Municipal do Seixal promove a Qua-

PEREIRA, Benjamim - Sistemas de moagem: tecno-

lificação do Moinho de Maré de Corroios, com pro-

logia tradicional portuguesa. Lisboa : Instituto Na-

jecto de Soraya Genin, Arquitectura e Restauro Lda.

cional de Investigação Científica, Centro de Estudos

e obra a cargo de ASN, António da Silva & Nunes,

de Etnologia, cop. 1983.

Lda. No edifício, a intervenção incide sobre infra- es-

RAPOSO, Jorge, “O Motor Hidráulico «Seixal»” in Al-

truturas de água, saneamento, electricidade, teleco-

Madan, n.º 4/5, Nov. 1984/Nov. 1985, pp. 39-43.

municações e climatização. São construídas novas

“Os moinhos de maré e a indústria de descasque de

instalações sanitárias. Por fim, são qualificadas as

arroz”. in Ecomuseu Informação. ISSN 0873 6197.

áreas de recepção/atendimento, de trabalho inter-

Nº. [14] (Jan./Fev./Mar. 2000), p. 10.

no e de apoio a actividades com públicos diversos,

REBELO, Manuel de Oliveira - Retalhos da minha

promovendo-se as condições de acesso de públicos

terra: monografia do concelho do Seixal. 2 ed. Seixal :

com necessidades especiais de mobilidade. Na en-

Câmara Municipal do Seixal, 1992.

volvente, procede-se ao arranjo de espaços exterio-

SANTA ANNA, Frei Joseph Pereira de, Chronica dos

res, contemplando o controlo de acesso e de esta-

Carmelitas da Antiga e Regular Observancia nestes

cionamento, a iluminação e a criação de uma área

reynos de Portugal, Algarves e seus Dominios, 2

verde e de lazer.

vols., Lisboa, Oficina dos Herdeiros de Antonio Pe-

Em 2008 e 2009 são executados trabalhos de con-

drozo Galram, 1745.

servação de madeiras de construção e equipamento

SILVEIRA, Ana Cláudia - “New contributions to the

de moagem, assim como trabalhos de carpintaria,

study of tide mills of the Tagus estuary: the case of

nomeadamente a execução e reparação da compor-

Seixal“. In SYMPOSIUM OF THE INTERNATIONAL

ta (porta de maré) e de portas e janelas do edifício. É

MOLINOLOGICAL SOCIETY, 11, Amadora, Boticas,

realizada a pintura exterior do edifício e trabalhos de

2004 - Transactions of the 11th International Sym-

conservação da cobertura.

posium of TIMS. Belas : Etnoideia, cop. 2007, pp.

Em 2008 iniciou-se e prevê-se que esteja concluído

153-162.

em 2009, através do Instituto Hidrográfico, o Estudo

SILVEIRA, Ana Cláudia - “Moinhos de maré do Seixal : 20

para a Reposição em Funcionamento do Moinho de

anos de classificação“ in Ecomuseu Informação. ISSN

Maré de Corroios, incluindo o levantamento topográ-

0873-6197. Nº. 31 (Abr./Mai./Jun. 2004), p. 13-15.

fico, o estudo da amplitude de maré e do débito dos

SILVEIRA, Ana Cláudia, “Novos contributos para o

canais e o cálculo do volume de inertes a remover.

estudo dos moinhos de maré no estuário do Tejo:

Em 2009 inicia-se o estudo de Monitorização de Es-

empreendimentos e protagonistas (séculos XIII a

tabilidade do Edifício.

XVI)” in Olhares sobre a História. Estudos oferecidos a Iria Gonçalves, Lisboa, Caleidoscópio, 2009,

Bibliografia principal:

pp. 591-609.

Arquitectura Popular em Portugal, Lisboa, Associa-

Tide mills of western Europe [Documento electró-

ção dos Arquitectos Portugueses, 1980 (1961), pp.

nico]. Dados. Seixal : Câmara Municipal do Seixal,

418-419.

Ecomuseu Municipal, 2005.

CASTELO BRANCO, Fernando, “A Plea for the study of tife mills in Portugal” in Transactions of the Ist International Symposium of Molinology, The International Molinological Society, 1965, pp. 80-84. CHARLIER, Roger; MÉNANTEAU, Loïc, “The saga

Inventariante: Ana Cláudia Silveira

of tide mills” in Renewable and Sustainable Energy

Data de inventariação: Abril de 2004

Reviews, vol. I, n.º 3, 1997, pp. 171-202.

Síntese de intervenções: Ana Luísa Duarte e Graça

CUSTÓDIO, Jorge - Moinhos de maré em Portugal:

Filipe

algumas questões do seu estudo e salvaguarda

Data de actualização: Junho de 2009


museu da rede portuguesa de museus NÚCLEOS E SERVIÇOS

Núcleo da Mundet Praça 1.º de Maio, 1 2840-485 Seixal SERVIÇOS CENTRAIS – Edifício dos Escritórios Telefone: 210976112 – Fax: 210976113 E-mail: ecomuseu@cm-seixal.pt Horário de atendimento geral: De 2.ª a 6.ª feira, das 9h às 12.30h e das 14h às 17.30h CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÃO Horário de consulta de Inverno (Outubro-Maio): 3.as, 4.as e 5.as feiras, das10h às 17h Horário de consulta de Verão (Junho-Setembro): 3.as, 4.as e 5.as feiras, das 10h às 12.30h e das 14h às 17h E-mail: ecomuseu.cdi@cm-seixal.pt

Embarcações Tradicionais do Tejo Cais principal de apoio: Seixal bote-de-fragata Baía do Seixal Realização de passeios no Tejo, entre Abril e Outubro Informações sobre programação de actividades: Serviço Educativo do Ecomuseu VARINO AMOROSO E Bote-de-fragata Gaivotas em estaleiro

NÚCLEO DA QUINTA DA TRINDADE AV. MUD Juvenil, Seixal Imóvel Classificado de Interesse Público Acesso condicionado

SERVIÇO EDUCATIVO Horários de atendimento telefónico: 2.as feiras, das 9h às 12.30h e das 14h às 17h E-mail: ecomuseu.se@cm-seixal.pt ¬ EXPOSIÇÕES – Edifícios das Caldeiras Babcock & Wilcox e das Caldeiras de Cozer Horários de Inverno (Outubro - Maio): De 3.ª a 6.ª feira, das 9h às 12h e das 14h às 17h Sábados e domingos, das 14h às 17h Horário de Verão (Junho - Setembro): De 3.ª a 6.ª feira, das 9h às 12h e das 14h às 17h Sábados e domingos, das 14.30h às 18.30h Encerramento: 2.as feiras e feriados nacionais

Núcleo dA Olaria Romana da Quinta do Rouxinol Quinta do Rouxinol, Corroios Sítio Classificado Monumento Nacional Fornos de Cerâmica Romanos (séc. II-IV) Acesso condicionado

Núcleo do Moinho de Maré de Corroios Após obras de conservação e de requalificação do imóvel e da envolvente, este núcleo será reaberto ao público em Setembro

NÚCLEO NAVAL Av. da República - Arrentela

Extensão do Ecomuseu na ANTIGA Fábrica de Pólvora de Vale de Milhaços Vale de Milhaços, Corroios

¬ EXPOSIÇÕES ¬ Oficina de construção de modelos de barcos do Tejo Horário de Inverno (Outubro - Maio): De 3.ª a 6.ª feira, das 9h às 12h e das 14 às 17h Sábados e domingos, das 14h às 17h Horário de Verão (Junho - Setembro): De 3.ª a 6.ª feira, das 9h às 12h e das 14 às 17h Sábados e domingos, das 14h às 18.30h Encerramento: 2.as feiras e feriados nacionais

Sítio Classificado Imóvel de Interesse Público Acesso condicionado Informação sobre visitas, além da programação divulgada: Serviço Educativo do EMS

Extensão do Ecomuseu na Quinta de S. Pedro Quinta de S. Pedro, Corroios Campo arqueológico necrópole medieval-moderna (séculos XIII-XVII) Acesso condicionado

Ficha Técnica _ Ecomuseu Informação n.º 52 _ www.cm-seixal.pt/ecomuseu Edição Câmara Municipal do Seixal/Ecomuseu Municipal do Seixal

Distribuição gratuita Assinaturas a pedido junto do EMS

Direcção E EDITORIAL

Graça Filipe

Participaram nesta edição: Exposições Graça Filipe Itinerância «Moinhos de Maré do Ocidente Europeu» Cláudia Silveira

Apoio nos recursos fotográficos e ilustrações

Fernanda Ferreira e Fernanda Machado/CDI Créditos fotográficos

Indicados nas legendas respectivas Grafismo e Revisão

Sector de Apoio Gráfico e de Edições da CMS

Programa de Iniciativas de Serviço Educativo Carla Costa e Graça Filipe

Impressão

Conhecer Jorge Raposo

Tiragem

Carta do Património do Concelho do Seixal Cláudia Silveira, Ana Luísa Duarte e Graça Filipe

ISSN

Agenda Carla Costa e Graça Filipe.

DEPÓSITO LEGAL

Selenova - Artes Gráficas, Lda. 6000 exemplares 0873-6197 106175/96


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