Joaquim Lagoeiro - centenário do nascimento

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centenรกrio do nascimento

1918~2018


“Homem de Palavra e das Palavras”, Joaquim Lagoeiro foi um notável contador de histórias que embora tenha migrado para Lisboa muito novo, nunca cortou as ligações com a sua terra. Natural de Veiros, este escritor estarrejense, contribuiu muito para a cultura do Município. O Município de Estarreja assinala o Centenário do seu nascimento, em estreita colaboração com a sua filha, Dulce Pereira, e amigos mais próximos do autor, com o objetivo de reconhecer e celebrar o contributo do escritor para a cultura do município e do país. Diamantino Sabina

Nascido em terras marinhoas, cem anos faria agora, Joaquim Lagoeiro. Vivo, ainda, no “milagre da memória” e da sua obra. Uma obra escrita entre 25 de fevereiro de 1946, com 27 anos, e 25 de fevereiro de 2011, com 92 um ciclo. Sessenta e cinco anos a escrever... É obra. O menino que com pouco mais de três anos se pôs a caminho de Estarreja, arrastando uma saca de borlas vazia “para comprar os livros para a lição”, e ao colo da professora D. Margarida aprendeu sozinho a escrever JOAQUIM, esse menino nunca mais parou.“Foi o princípio de uma carreira, com livros e sem livros, sempre a estudar.” E a escrever. Os mais de trinta livros publicados são uma pequena parte de uma corrente de escrita onde, ainda inéditas, esperavam, e esperam, obras como Lisboaus, Aparições, Rua Suja, Guinhol, Nas Margens do Amor, História de Estarreja contada aos mais novos... Mesmo se prontas, “sempre in fieri.” Deixadas a amadurecer, não na gaveta. “Sou repentista no passar a ideia ao papel. Sai-me de supetão, com força, a exigir que não a trave. Depois, guardo o trabalho, deixo que amadureça”. ”Escrevo um livro em dois ou três meses, vem depois o período das emendas”, dizia. Com dois hiatos, fruto de mudanças na sua editora de sempre, nos anos 70, e de problemas de saúde, em meados de 90, a publicação dos seus livros sucedia-se, a intervalos regulares, ignorando a idade. Mais célere após o Mar Vivo (a sua ria), testemunho de uma das muitas ressurreições com que desde menino soube trocar as voltas à morte. Na busca dos seus escritos, cada estante, cada gaveta, cada bloco de notas, cada disquete, foi e é um manancial de surpresas: folhas e mais folhas, manuscritos, rascunhos, obras acabadas, mil vezes emendadas, algumas com cortes da censura, cartas, notas soltas, dúvidas, investigações em curso, recortes, muitos recortes de jornal. Porque, para além dos livros, desde os finais dos anos 40 e até à sua morte, nunca deixou de escrever para jornais e revistas, com colaboração regular no Sol, no Boletim da Sociedade de Língua Portuguesa, no Diário de Lisboa, n´ O Diário, e nos vários jornais da região da Ericeira, de Aveiro, da Murtosa e de Estarreja, entre muitos. Não só com contos, crónicas, artigos sobre a língua portuguesa, mas também com artigos de opinião, respostas polémicas, cartas aos directores, manifestações de indignação com os desacertos e injustiças do mundo e da vida política, alertando para erros e sugerindo caminhos. E um amor militante à Língua mãe. Assim no último livro, Português sem Mestre III, agora editado pela Câmara de Estarreja. Entregou-o nas minhas mãos. Corrigidas as últimas páginas, feita a última emenda precisamente na palavra corrigere, por um daqueles desígnios surpreendentes que sempre lhe marcaram a vida, confessou-se “mais leve que nunca para voar”. “Os meus livros são as minhas lembranças”

disse um dia. Os seus livros são as minhas também. Dulce Pereira


Madre antiga centenário do nascimento

1918~2018

Joaquim Lagoeiro nasceu no lugar de S. Geraldo, em Veiros, no dia 6 de Setembro de 1918, e para sempre ficou ligado à sua gente e à terra marinhoa onde voltava quando podia, para lavar a alma. Nela está sepultado, desde março de 2011. Ele, que, por curiosidade, gostaria de ter ficado mais um pouco... Um regresso a casa, 92 anos depois. E tão cedo teve de partir, contra vontade... Com pouco mais de nove anos foi para o Porto, para o Colégio dos Carvalhos, e daí para o Seminário de Vilar, onde cursou Teologia e de onde tomou a decisão de sair por volta dos dezoito anos, nas vésperas da primeira tonsura. “No meu tempo as pessoas só tinham a saída do seminário, não havia escolas e as condições eram muito más. Agora qualquer pessoa tira um curso. Antigamente só as pessoas muito ricas é que tinham hipóteses [...]. (Entrevista ao Jornal Periódico – Torreira, 17.02.99) “Foi logo na tarde do primeiro dia de férias. Lançado no gozo da Natureza, árvores, campos, flores, pássaros, calhava estremecer com o ruído surdo duma lebre; assim me compensava, com este silêncio, do seminário, também do cheiro a cera e a incenso e a flores murchas nos solitários dos altares, enfim enchia os sentidos, também a alma, na catedral do arvoredo.” Nas Margens do Amor (romance inédito) “Então… De olhos abertos no escuro da antemanhã. Saía ou não saía do seminário? Escutava a voz sensata do meu amigo, o padre Boaventura: abrisse-me a minha mãe. Tanto poderia desencadear-se uma borrasca de impropérios ou, e isso temia-o, deparar-se-me um muro de silêncio, assim me tentaria vergar, sem ouvidos para mim, ouvir-se-ia apenas a si própria, assim fora quando da ida para o seminário, eu reagira alegando que sem vocação, quase a rebentar em pranto. “Vocação? Sabes lá que é isso!” Não sabia, nem ela, ninguém sabe; a um padre no seminário ouviria mais tarde dizer: “Vocação? Não há!, faz-se um padre como de um pau de laranjeira se afeiçoa uma piorra ao torno, o torno é aqui”.” Nas Margens do Amor (romance inédito) MADRE ANTIGA “Bem mal que também é bem” me dizia a minha avó, a mãe de minha mãe, quando lhe perguntava como ia, pois que a saúde dela o nosso bem. Segura desta sã sabedoria, os males eram seus, de mais ninguém, mesmo os alheios eram seus também, e assim, serena, os próprios encobria. Mas não mentia. Rasando os noventa, o “bem mal” lhe servia de bordão, numa vida serena e sem intriga. Serena mesmo quando na tormenta, serena ainda exposta no caixão, - a minha avó, a minha madre antiga.

Rumou então a Lisboa, a “terra do seu exílio” (Português sem Mestre III), onde tantas vezes se sentiu como mosca na vidraça, “sepultado na cidade, longe dos caminhos da infância, das terras marinhoas” (Assim no Céu como na Terra). Para trabalhar e, trabalhando, estudar. Vítima como tantos da emigração que empurrou o pai, tal como o pai do seu pai e o próprio irmão, para o Brasil, e fez da mãe mais uma viúva de vivo. Também ele migrante na sua própria terra, essa “terra mãe” incapaz “de dar pão suficiente aos seus filhos”. A família, deixou-a em Veiros, uns vivos, outros só memória, mas sempre presentes até ao fim dos seus dias. A mãe, Rosa Lagoeiro, a tia-madrinha Albina, o tio José Luciano, o tio Américo, a tia Glória, a avó, “madre antiga” como dizia da própria terra mãe, o avô Joaquim Lagoeiro, de que herdou o amor às letras...

Flor do Sal, Sonetos de Amor e de Escárnio, 2004

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Madre antiga centenário do nascimento

1918~2018

O AVÔ LAGOEIRO I Nas mãos de Deus sozinho pelas vielas (a aldeia esse tempo era o céu), aninhos tinha, ao avô ia eu o diário das notícias comprar. Lê-las seu entretém de inválido, janelas para um mundo que já não era seu. Minha paga um sorriso e o orgulho meu de uma encomenda ser capaz daquelas. À sua sombra ficava a contemplá-lo: por onde é que andaria ali sentado sem que eu sequer imaginar pudesse? Pedia-me as muletas, ia ajudá-lo. Íamos depois ambos, lado a lado, ver como no quintal, e aprendesse, os renovos cresciam ou se não. [Casa paterna à entrada de Veiros, lugar das Olas]

Faltou-me um dia: abrira-se-lhe o chão.

Longe, mas perto, também a ria, a teia-de-aranha da ria, “de que nunca mais se livrou, e bem”, “a apresar o céu”, o mar da Torreira, e as serras, “aqueles montes violáceos, de longe violáceos, ou azuis, ou verdes”, “aquele trono do céu visto das marinhas”(Almas Danadas)... ENTRE AMBAS AS ÁGUAS. O mar, a lagoa, a terra. E o vento, sopro do céu, que pai de um e doutra, mar e terra, da lagoa também. O meu amigo Angelino, quando padre e depois de despadrado, com outra opinião, o céu é que filho da água, irmã da terra. Que antes de todo o antes só o caos e que jamais o espírito de Deus deixara de vogar sobre ele, e ainda agora nem de todo separados. Assim seja. Eu por tudo. Volto-me para mim, acredito no caos, mas não sinto o sopro de tal espírito. Em criança acreditava na minha mãe, temia as águas fundas como a do poço onde ia espreitar um menino que acenava ao meu aceno e um dia me ia puxando para junto de si. Quando já lhe estendia os braços, ao menino do poço, susteve-me pelo bibe minha mãe. Mar Vivo

Flor do Sal, Sonetos de Amor e de Escárnio, 2004

AVÔ LAGOEIRO II Loiro, de olhos azuis, assim surgiu por obra e graça da técnica moderna da foto cuja imagem se sumiu o meu avô Joaquim, que um ar prosterna e lhe desfaz quase da vida o fio, e que até ao desfecho lha inferna. Mestre-escola se fez e foi lanterna na noite da ignorância, e o dia abriu.

E as memórias de menino e de adolescente que sempre o guiaram na busca da compreensão dos mistérios e paradoxos do mundo e de si mesmo (v. O Poço) - um rio de peripécias que atravessou deslumbrado, até com o próprio deslumbramento. Porque ele via tudo, mesmo o que não via. O direito e o seu avesso (e não é “o direito do anzol ser torto”?), de olhos abertos ou fechados, um “caçador de sonhos”. Esse o princípio das estórias, deste mundo e do outro (v. Assim no Céu como na Terra). “... cegos de olhos abertos e que pena!, pois que, se ainda hoje os fecho, vejo o que não vi então, assim um caminhar em sonhos por sítios onde só neles se pode, nem que histórias da minha avó que Deus tem, só que verdadeiras como a verdade.” (Almas Danadas).

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Da minha ideia se esfumou a imagem. Agora tenho-a. Mas quem foi? Bem: lia! A Eneida, Santo Agostinho, as gazetas… Um camponês letrado, sempre em viagem dentro e fora de si e que sabia que é via torta a vida e com metas. A herdança dele a isto se resume: o ter sido e acaso o amor às letras - e a palmatória que botei ao lume. Flor do Sal, Sonetos de Amor e de Escárnio, 2004


Madre antiga centenário do nascimento

1918~2018

O RETRATO Era das vésperas da minha morte o retrato que o tempo esmaeceu: o menino e sua mãe; ele, sou eu. Seis mesinhos teria, tive sorte. Um sobressalto só. Quanto me reporte à infância, outra vez a luz me deu quando, aflita, p'lo bibe me prendeu, ao menino de mim que sem suporte se debruçava sobre o espelho de água, olá! dizendo ao outro que do poço com sincrónicos gestos lhe acenava. Milagre foi de um coração em frágua; igual amor me aqueceu quando moço. - Velho-bebé, p'ra o colo te saltava! Flor do Sal 9.5.04

FÁTIMA

LIVRA! Em pinhal sobranceiro ao Antuã num ramo alcandorada apareceu em noite de luar, vinda do Céu, uma Nossa-Senhora. Grande o afã do povo crente e bom da terra chã: ante o claro prodígio acorreu, p'rà santa ver sob inconsútil véu de estrelas e de luz. Esp'rança vã. Que privilégio era de inocentes, de mim só é que não. Ah, não, não via! Comigo ao colo, minha mãe, chorosa. Cai-lhe uma lágrima: cerrei os dentes - e vi! Mas era a lua que seguia, cheia, por entre as nuvens, gloriosa… Sobre o Antuã outra Fátima - excesso: cortou a Guarda ao sítio o acesso. (Do que em menino me livrei! Porquanto, quisesse ou não, eu era hoje santo.) Flor do Sal, 2004

Fátima… Um santuário como tantos outros, uma grande praça para manifestações de fé. Estivera na capela das Aparições, dizia-se que no sítio da azinheira onde numa ranca se empoleirara a Senhora. Em pequenino também eu tivera uma aparição. Num pinhal nas margens do Antuã, perto caía rumorosa a água de um açude, no silêncio da noite assustava-se quem não soubesse. Que anos teria? Fazendo contas, um ano após as aparições da Cova da Iria espreitava o mundo. Ora, no pinhal do Antuã eu pequeno ainda, nos braços erguia-me minha mãe como se me oferecendo ao céu no momento culminante da aparição, dava a lua no coruto dos pinheiros, mais sobre uns que sobre outros, em nenhum dia igual, e era quando, da boca dos inocentes saía quase uníssono o grito da revelação, “ali!, ali!, ali!” E eu calado: “Então não vês, meu menino?” Mais exclamação de desânimo que pergunta ansiosa. Não via. Como ainda hoje, meu pecado original esta cegueira. Não via. As mais crianças com a graça de ver, uns instantes só, viam, assim como aparecia desaparecia a doce imagem - e o povo caía de joelhos. Mais ninguém via senão os inocentes. Mas eu não. Cego de alma, essa a dor de minha mãe, debalde me erguia nos braços mais alto. Chegado o momento sagrado, ela apontava com o dedo “ali, ali”. E minha mãe doía-lhe por que o seu menino fosse desdenhado da Senhora. Réprobo já e tão pequenino! Ouvira do púlpito um frade asseverar que em êxtase uma santa vira no Inferno criancinhas eternamente a sofrer. Por que era eu menos que os outros, alguns tão feiinhos? E foi quando aconteceu: vi-a de lágrimas pela cara abaixo e então rilhei os dentes e fechei os olhos e vi e tornei a ver com olhos vistos, vi como queriam que visse, e gritei: “ali!, ali”. - “Ah, filhinho!” E um soluço arrancado, outros arrancos em volta, um trovão de clamores, milagre!, milagre!, Avé, avé, avé, Maria! Avé, avé… Essa noite para não me perder minha mãe deitou-se comigo, só dei por isso de manhã quando apertado do chichi. Tive sorte: aquela a derradeira aparição; a Guarda Republicana, de armas aperradas, no dia seguinte cortava os caminhos do pinhal a pedido do dono, estragavam-lhe a propriedade calcando-a e enchendo-a de cacos, copos, garrafas, latas, pirolitos, e quartolas de vinho ao lado de fogueiras a assar couratos e chouriços, uma poucavergonha, nem se fala do atropelo da lei, a mais sagrada de todas e fundamento da nossa civilização cristã o respeito da propriedade. Perante tamanho abuso que valia essa coisa extraordinária de a Senhora se haver escapado do Céu para se mostrar, e só por isso, aos filhos das pobres mulheres da beira-Antuã? Assim o fim do milagre. Nas Margens do Amor (inédito)

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Madre antiga centenário do nascimento

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Assim chegou a Lisboa. O jovem “ingénuo e inexperiente”, “de espírito e alma tão receptíveis como uma película fotográfica à luz, só por isso capaz de [...] retratar a gente marinhoa”, como de si próprio disse (na introdução à 4.ª edição de Viúvas de Vivos, 1999), continuou o “diálogo em voz alta, a escrita, com as personagens humildes que se [lhe] depararam na vida e que muito [lhe] ensinaram”: “Elas aparecem em quase toda a minha obra. Aí estão em Viúvas de Vivos, Os Fraldas, Corda Bamba, Santos Pecadores, também nos outros. Aprendi mais observando-os que lendo onde lêem os sábios da escritura” (apresentação de Assim no Céu como na Terra). “Saibamos aprender com os ignorantes - e seremos como eles sábios” (Ramilhete Espiritual de Estórias Profanas). Na bagagem, a leitura dos clássicos, o espírito crítico, rebelde e inconformado, a prática da argumentação, do estudo da gramática, da lógica, da retórica, o domínio da língua latina (que, sendo morta, falava como viva, a ponto de lhe ter servido de recurso para comunicar com um padre alemão, contava), um grande amor à língua materna e a vontade compulsiva de escrever e de aprender (“aprender até à morrer”) que lhe vinha do tempo de menino. [na Ericeira com a mulher]

[na praia junto à linha do Estoril]

E a mesma atenção “às pulsações da vida” (Ramilhete Espiritual de Estórias Profanas) que faria que outras gentes e outros mundos, agora abertos, lhe viessem igualmente a ”calhar no bico da pena”.

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“Admiremos os inescrutáveis desígnios de Quem, num dia que ainda não era dia, deu um pontapé na bola do mundo e a deixou, infinitamente rolando. Desígnios que permitiram que um lapuz bisonho e uma donzela abusada, meras poeiras cósmicas, calhassem no bico da pena de um escrevinhador atento às pulsações da vida. Amém.” Ramilhete Espiritual de Estórias Profanas


Lisboa, terra do meu exílio centenário do nascimento

1918~2018

Em Lisboa, onde chegou nos finais dos anos 40, ao mesmo tempo que escrevia o seu primeiro livro, Viúvas de Vivos (1947), colaborava intensamente em jornais como o Sol, a Vida Mundial e o Diário de Lisboa, publicando contos e artigos de opinião. Para viver, dava também explicações de Latim e cedo entrou na banca (Caixa Geral de Depósitos), onde trabalhou até à sua reforma, já como Director. Nessa mesma altura, na Rua da Esperança, conheceu a Maria Dulce, sua mulher e companheira de uma vida: 63 anos, quase tantos quantos os da sua obra que ela acompanhou sempre como interlocutora atenta, e na própria edição.

[em junho de 1947]

[com a filha de 15 dias e a mulher]

Diria o tempo que esse instante atara duas vidas com nó-cego: um assombro ... Vogam no ar destinos que se encontram, da sinfonia sons que à vida montam. .... Queremo-nos sonhando-nos. Ah, deixa!, que é assim o amor: nenhum sem queixa; esta é da nossa vida a flor do sal. Flor do Sal

[dia do casamento]

Com ela conheceu também Mafra e a Ericeira, acompanhando-a aos finsde-semana e nas férias, nos seus primeiros anos como professora, colocada na Picanceira. Aí escreveu Corda Bamba, um dos seus livros preferidos, em 1952. A Ericeira fazia-lhe lembrar o mar da Torreira, e a ela foi sempre voltando, inspirando-se para novos livros, como Caiu um Santo do Altar. De novo em Lisboa, mudou-se para Campo de Ourique, bairro arejado, ainda com horizontes que faziam esquecer ser cidade. Moro hoje num bairro que já foi bom, alto mas não de nome, Campo de Ourique; era bom mas acabou-se, pois que sitiado agora de trânsito e dele retalhado, ainda assim um oásis no caos da cidade. De minha casa, donde dantes alcançava o mar, ainda chego ao rio e a um Cristo-Rei de cimento armado, parece querer abraçar-nos, em vão, será dos nossos pecados. Refresca-nos a serra de Monsanto, agora coberta de vegetação e arvoredo, associando-se à brisa do mar sopra para as ruas e areja-as, sacudindo o gás dos escapes. Como nas demais, na minha rua continua anónima e cada vez mais a vizinhança, vemo-nos e não nos falamos, com o decorrer dos anos há quem se cumprimente sem saber quem são, sinais evidentes de progresso. Ramilhete Espiritual de Estórias Profanas

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Lisboa, terra do meu exílio centenário do nascimento

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Em 1953 tiveram a primeira filha, Dulce. Um dia, ela contou-lhe um segredo: “sabes, vou ter um maninho mas não digas nada à mamã” (Segredo, conto inédito). E nasceu o João. Foi em 1958. Depois vieram os netos: outro João, a Inês e o Huguinho. A todos envolveu no mesmo abraço apertado de palavras. Por cada um que nascia era outra vez o mundo por contar e por descobrir pelos olhos deles, inventando perguntas, se não havia porquês. E havia. Até o porquê do porquê, queria saber a filha. E falava, falava, falava... “Vamos conversar...”, dizia. Forma natural e simples - a sua - de educar: “Ninguém dá por que as plantas crescem e na Primavera rebentam em folhas e flores. Não se vêem crescer. Também as crianças crescem, desenvolvem-se, sem que demos por tal, é maravilha. Um dia vimos que a cabecinha dela [a Dulcinha] chegava à altura da mesa da sala-de-jantar. Comprámos-lhe uma cadeira em que pudesse acompanhar-nos à mesa. Mais do que para comer para falar connosco. Da altura da sua cadeira fazia as suas escolhas, dava opinião, queria saber.” Os Porquês (conto inédito) O constante diálogo com os filhos e os netos era também ele fonte de deslumbramento e de estórias dentro de estórias que se sucediam num ciclo infindável, sem esconder as personagens.

E de repente foi um deslumbramento, todas as cores do arco-íris bordavam o manto de ouro que a Natureza estendia ao astro-rei. - Mas ainda não apareceu, avô - disse o Hugo. - Está a chegar, o Mundo vai recebê-lo com todas as honras… - O Mundo ou a Natureza? - observou o João. - É quase a mesma coisa. - A mim parece-me que estar à espera dele é mais lindo do que lhe assistir à chegada tornou o Hugo. Não ia fora disso o avô, já que temos de fechar os olhos para o ver, enquanto por ora os temos bem abertos. - Baixar os olhos, que é o que faziam aos reis, não é assim, avô? - disse o João. - Cá por mim fecho os olhos e pronto - tornou a Inês. - E não vês nada - respondeu-lhe o Huguinho. - Não vejo? Vejo tanto como tu que, se não fechares os olhos, ficas cego! Ora aí estava uma coisa engraçada: termos de fechar os olhos para ver - comentou o avô. Estórias Pequeninas

[com o neto João, em 1980]

[com os três netos na Ericeira, 1990]

Falar e conversar, tal como escrever, era uma forma de dar - até impor -, não só aos filhos e aos netos, mas a todos os que o rodeavam, novos ou velhos, as suas descobertas, reflexões e sabedoria. Também de colher inspiração e de reforçar, à boa maneira das culturas de tradição oral, a sua memória prodigiosa de factos, acontecimentos, peripécias e conhecimentos enciclopédicos de toda a espécie. Uma arte herdada do pai, alfaiate, contador de histórias maravilhosas, sobre as suas vivências na Amazónia e em Belém do Pará, que aos netos deixavam suspensos, nas noites alumiadas a candeia, na casa de Veiros. E também da avó materna: contava-as à lareira,” enquanto no tacho de cobre aloirava a rijoada ” (v. As mulas do gás, in O Baile).

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Lisboa, terra do meu exílio centenário do nascimento

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Conversas que se prolongavam para lá da conversa, na ânsia de saber mais de si, mesmo aos 90 anos. “E foi aquele dia o último em que nos falámos vivos. Com ele morto ainda converso. Para saber mais de mim, como ao escrever esta.” (A benzedeira do mar, in O Baile) Ou de enganar a ausência... Quando o filho João partiu subitamente, na sua grande dor, assim continuou a falar-lhe, escrevendo, escrevendo, escrevendo - “para não morrer”. Ainda de mãos dadas. Conversas para além da própria morte, como os livros inéditos que deixou, sabendo que um dia, das gavetas enfim abertas, as suas palavras voariam para o peito de quem as fizesse voar. Se no silêncio ouvires estalar os móveis, ou o bicho-carpinteiro na madeira, não cuides que sou eu:

Com a Maria Dulce, mesmo no silêncio, sempre.

minha ausência estarás a escutar, ao pé de ti presente, vivo e inteiro como da vez primeira em que fui teu. Erotica & Satirica

AINDA DE MÃOS DADAS Na vida sempre, sempre, de mãos dadas, confiantes em que o tempo era nosso. Não era, sei agora, que não posso já dar-lhe a mão em novas caminhadas.

[com os filhos, 1994]

Porque vou só, hesito, dou topadas, eu que ao pé dele me julgava moço. À sombra do que fui, de mim destroço, desamparado caio em ciladas. Eu que tropeço e logo a sua mão procuro no vazio, procuro em vão, e no entanto eu sinto-lhe a presença. Nítida no silêncio ouço-lhe a voz, e logo de mãos dadas vamos nós - eu, a arrastar a vida meio suspensa. 17.04.06, João

[perto dos 90 anos]

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Cravos vermelhos centenário do nascimento

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Saído do Seminário, onde “até aí navegara num mar de enganos e mentiras”, “num como jazigo sepultado, alheio ao palpitar da vida ao derredor”, foi em Lisboa que, entrando como colaborador no semanário Sol, “se lhe abriram de todo os olhos” (Nas Margens do Amor, inédito). Ganhou então consciência da consciência que afinal já tinha, quando procurava na observação das “gentes humildes” e na “sabedoria dos ignorantes”, “pobres de pobres”, deserdados da sorte e de Deus, a resposta para os desconcertos do mundo e para “a velha disputa entre os que têm por serem quem são e os que nada possuem para que os primeiros existam”.

CRAVOS VERMELHOS Os cravos não se riem para todos, há-de mister um coração sem lodos, sem invejas mesquinhas nem agravos. Flor do Sal Quando eu morrer alguém se há-de encarregar disso. Um ramo de cravos vermelhos. Português sem Mestre III

Proibidos jornais, excepto o “Novidades” e semanários como “A Voz do Pastor” e “A Ordem”, proibidos aparelhos de rádio, nem na Secretaria telefone, em plena Idade-Média vivíamos, perdidos no tempo e sem darmos por isso, de tudo que ocorria no exterior só algum eco muito diluído. As próprias aulas de Filosofia com as disputas e sabatinas como nos tempos medievais, vivíamos mortos, nem já falava das de Teologia em que se fazia acto jurando previamente a defesa do dogma da Imaculada Conceição. Valiam-me as férias, estas porém na aldeia, onde nem telefone, nem electricidade, e os aparelhos de rádio não mais que objecto decorativo na sala de algum emigrante ou de um doutor, rouquejavam e estalavam como se para explodir, e apreciados mais pelas cantigas de revista, as pessoas trauteavam-nas. A maior parte das férias passava-as numa a bem dizer ilha, a praia da Torreira, estendido na areia lia se calhava “O Primeiro de Janeiro”, onde no cabeçalho sem que o estranhasse o aviso “Visado pela Comissão de Censura”… E assim verdadeiramente os anos da aprendizagem um tempo morto numa terra morta, num como jazigo sepultado, alheio ao palpitar da vida ao derredor e à luta sem tréguas entre o Bem e o Mal, Hitler ameaçando o mundo, a mim diziam-me que ele S. Miguel Arcanjo, comandante das milícias celestes, à sua vitória seguir-se-iam mil anos de paz. Nas Margens do Amor (inédito)

“Confesso-me repeso de aos oitenta e oito tão mal haver empregado os dias a semear dúvidas entre quem vive feliz nas suas certezas, no paraíso sem dar por isso”, diria com ironia, sessenta anos depois (Apresentação de Assim no Céu como na Terra). Ele, o alma do diabo! (“Poderia eu querer melhor elogio?”), assim lhe chamou um conterrâneo, em sinal de admiração por Viúvas de Vivos - “uma bíblia popular para a boa gente das terras marinhoas”, em especial na emigração -, foi capaz, aos 29 anos, de inquietar a própria polícia política a ponto de ver a sua obra apreendida (como conta, em pormenor, na introdução à 4.ª edição). Era uma época em que livros e imprensa tinham de passar pelo crivo da Censura. Mas o homem rebelde, questionador, atento ao mundo e às suas injustiças, não se ficava, munido com a arma da inteligência e a ingenuidade da alma (que não do espírito) contra a mesquinhez muitas vezes acéfala e incongruente dos censores:

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Cravos vermelhos centenário do nascimento

1918~2018

Escrevi um conto para o “Sol” que depois de aceite pela Censura não pôde sair naquele número. Como era de obrigação, teve de voltar à Censura e da segunda vez foi cortado. Procurei o Coronel autor do corte e curiosamente era apreciador da minha obra. Explicou-me. Eu tinha colocado na narrativa um sacerdote [a tocar guitarra entre beatas] com o cachecol do disfarce daí o corte. Vinguei-me. Escrevi um conto intitulado “Bolas de Sabão” em que punha em causa os princípios da religião católica sem o referir. Deixaram-no passar; não deram por isso.” (Entrevista ao Diário de Notícias do Funchal, 22.04.1984). Afinal, a própria PVDE (futura PIDE) e a Censura lhe foram devolvendo a imagem do que por natureza era. “E o polícia sacrista: - Mas é ou não comunista? - Comunista? Não, por ora não, e talvez nunca, pouco me dizia o nome, ainda não chegara lá nos estudos. A altura para lhes responder lá para o final do próximo ano, quando estudasse essas teorias políticas. Mas… desconfiavam então de que eu era comunista?” Nas Margens do Amor (inédito) NA ANTÓNIO MARIA CARDOSO Rua António Maria Cardoso, na sede da Polícia. Detive-me a tomar o fôlego como se para mergulhar numa onda. Mostrei o papel, esperei. Ouvia entretanto gritos. [...] Bem! Então respondesse: era ou não comunista? E isso necessário? Por que queriam saber? Eu um estudante de Filosofia, como pobre não podia perder tempo em encrencas, precisava de ganhar a vida. Porra! Porra! Respondesse sim ou não. Como queriam que respondesse, se eu próprio não sabia? Não sabia?! Não, não sabia, porque a tal respeito néscio. Quando entrasse na vida prática é que, se necessário… E se fosse, para que banda cairia? Imaginava lá! De ciência certa, porque estudara história, que a palavra havia pouco é que na boca da gente, então porque não fazia falta nenhuma. Se a não tivesse ouvido ali continuaria alheio como quando chegara à catequese. Logo o cara de buldogue: - Oiça lá [...]: está a fazer pouco de nós ou quê? [...] E o polícia sacrista: - Mas é ou não comunista? - Comunista? Não, por ora não, e talvez nunca, pouco me dizia o nome, ainda não chegara lá nos estudos. A altura para lhes responder lá para o final do próximo ano, quando estudasse essas teorias políticas. Mas… desconfiavam então de que eu era comunista? Silêncio. [...] E eis que oiço, em resposta a esta imprecação muda: - Senhor Henrique: à Polícia não se exige que saiba que é isso de comunista mas prendê-los, e daí termos de o confessar. [...] - Compreende? Ou é preciso que o façamos compreender? [...] - Pois, cautela - tornou o outro. Afaste-se das más companhias, a Universidade um cóio de comunistas, não se deixe cair em tentação. Depois de tantos anos: da boca de um esbirro aprendia um cristão o alcance e significado daquele final de padre-nosso: “não nos deixeis cair em tentação!” Para os Céus erguia o pensamento, volta o polícia bruto: - Vossemecê tem cara de padre despadrado… Sabe-a toda! Fui honesto: - Sim, senhor, com muita honra. E quase, quase, a cantar missa, não subi foi ao altar. - Introibo ad altare Dei - saltou de riso aberto o meu salvador. E eu, automaticamente: - Ad Deum qui laetificat juventutem meam. Rebenta o buldogue numa gargalhada, levando as mãos à barriga. Parou, dirigiu-se a ambos nós: - Ai, os almas-do-diabo! Ai, os almas-do-diabo, que até a ladrar aprenderam! - Torcia-se, sufocava, quase explodia. Quando lhe salta, retinindo na tijoleira, a metade superior da prótese dentária. - Ai a minha dentadura! E agora? Agora? Quem me paga o prejuízo? Silêncio. Miserável, o homem exibia-a na palma da mão, à dentadura partida em duas. Saí-me, um desenrascanço: - Isso cola-se… Mandaram-me embora. Nas Margens do Amor (inédito)

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Homem de causas, aproveitou a abertura política do semanário Sol, a coberto do prestígio do seu diretor, Lelo Portela, para publicar muitos outros contos e textos de opinião, também na Vida Mundial, verdadeiras crónicas sobre tudo o que o impressionava ou tinha impressionado e que guardava na memória como um arquivo imenso, em rede, pronto a saltar cá para fora à mínima oportunidade, apoiado pela arte da palavra e por uma lógica de argumentação e um espírito de humor certeiro imbatíveis, contra a ignorância enfatuada e a hipocrisia, e em defesa da justiça das coisas, sobretudo dos mais fracos. E não queria ele ser advogado? A sua grande arte, entrar no campo do inimigo, derrotando-o com as suas próprias armas. “A mordedura de cão, trata-se com o pêlo do mesmo cão”, dizia sempre, lembrando palavras da avó materna (Manual de Casos de Consciência). A escassez de habitação e a carestia e má distribuição das casas, a dignificação do professor, a obrigatoriedade do ensino e a importância do seu financiamento, o conteúdo dos programas, as discussões entre Portugal e o Brasil sobre o acordo ortográfico, os maus tratos à língua portuguesa, os “doutores ignorantes” feitos à pressa, os críticos, “esses exemplares biliosos”, a construção artificial de figuras públicas, estátuas com “pés de barro”, “modeladas pela opinião subserviente dos borcas-abertas que nem para apanhar moscas apertam os beiços”, a exploração do trabalho de algumas classes sociais, como as “sopeiras”, a mendicidade, as condições de pobreza da chamada “classe média” e as suas implicações “na crise do livro” e dos bens culturais, a “exploração do sentimentalismo” na imprensa, as fragilidades das modas, a condição e os direitos da mulher (v. a polémica na rubrica Tribuna Livre, do Sol: Escrava ou Senhora?), são uma ínfima parte dos temas que tratou já nessa época de 1947 e 48 e que ainda hoje – quase todos – pela sua actualidade, ganhariam em que estivesse vivo para nos fazer pensar - e agir. Tudo analisado à luz dos conhecimentos históricos, sociais e filosóficos, expondo as razões profundas e estruturais por trás das aparências, propondo soluções e não embarcando na denúncia superficial, a puxar à indignação fácil, que negava. E não é isto um político?

“E o Lagoeiro de cinquenta anos, se ainda não tiver deixado de ser pó levantado, há-de chamar nomes feios ao de agora. Deus me faça a vontade – a de ler esta crónica – e me conserve o modo de pensar”, escreveu. (“Sinais de Velhice”, Vida Mundial, 21.02.48). E conservou. A sua grande tribuna, pela vida fora e muito depois dos cinquenta que almejava, continuou a ser, para além dos livros, os jornais, pela imediatez da intervenção social e política: a tempo, esperava, de alertar as pessoas, ou quem de direito, e de alterar o rumo das coisas. Ou pelo menos de fazer pensar, nem que fosse pelo riso: “água mole em pedra dura”... Disso foi testemunha O Jornal de Estarreja que tantas crónicas suas publicou sobre a história e a vida do Concelho, e tantas delas com recados certeiros ao coração do poder. E não só: são incontáveis as crónicas e os artigos de opinião publicados noutros jornais da região, como o Jornal da Ria, a Voz

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- Vá com Deus! [...] E o mísero respondeu-lhe: - Mande-me com o diabo, mas dê-me alguma coisa.[...] Dar esmola poderá consolar ou deprimir, conforme a alma e a filosofia de quem dá. Mas não há filosofia que salve quem pede para si, para viver. Vida Mundial, 6.12.47

Os próprios nomes que lhe dão dizem-nos algo da sua sorte: moça, criada, sopeira. O verdadeiro é o de serva. [...] Sim, é preciso olhar bem de frente para o problema. As criadas constituem uma classe tão digna e útil como outra qualquer. Como qualquer outra que tenha sindicato, caixa de previdência, que seja protegida por leis, por contratos de trabalho e sanções aplicadas por pretórios competentes. Vida Mundial, 28.02.48


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Regionalista, a Voz de Estarreja, O Concelho da Murtosa, O Correio da Murtosa, O Concelho de Estarreja... Alguns houve, como o Público, que lhe começaram a recusar as “Cartas ao Director”. Por serem demasiadas (a vida não pára e as críticas urgiam) ou pelo seu teor? Nada que não se resolvesse escrevendo também a coberto do nome da mulher Maria Dulce, umas vezes Maria Costa, outras Maria Marques, tudo verdade. Ou não tivesse ele a tarimba de lidar com a Censura... Assim, agarrado à sua alma, foi atravessando, resistente, o calvário desse Cafarnaum dos tempos do fascismo, a que só o 25 de Abril de 1974 havia de pôr cobro e que lhe abriu a esperança do que há tanto esperava. [pela CDU com Glória Marreiros]

CRAVOS DE ABRIL Há trinta anos já! Vinda da rua trouxe minha mulher p'ra casa flores. Cravos em sangue vivo, do que estua em quem se mata em paixão de amores. Dois ramos deles hoje. No ar flutua cheiro a festa de quem, aos temores de a um cafarnaum escapo, perpetua a fé do nunca-mais a tais horrores. Trinta anos depois, cravos - é obra. Cravos que riem, clamam e alertam. Ouvem? É o grito da cor, um clarim. Grito de alarme de quem não se dobra ante os que do poleiro não desertam e a este dia tramam pôr-lhe fim.

Agora já podia ser o que antes era (e não lho tinham perguntado antes de o saber?). E assim integra a Célula dos Escritores de Lisboa do Partido Comunista Português, com José Gomes Ferreira, Saramago, Urbano Tavares Rodrigues, Orlando da Costa, Modesto Navarro, Domingos Lobo, entre muitos outros, como a sua camarada e grande amiga, Glória Marreiros. Afinal, livre de pensar e de lutar pelas mesmas causas de sempre, só que dando, mais do que nunca, o nome às coisas, numa junção explosiva entre o homem da palavra e da escrita e o observador crítico sem papas na língua que nunca poupou os pernósticos, de qualquer quadrante, por isso incómodo, e sempre soube denunciar quando o rei ia nu. Com ideias muito próprias, assentes na observação, no questionamento em diálogo com os outros contra o magister dixit (ele próprio não se queria mestre, v. Português sem mestre) e nos conhecimentos profundos e vastíssimos de uma vida sem tréguas. E que não dava tréguas... Sobretudo a alguns políticos, alvo constante do seu sarcasmo verrinoso, que culpava do estado da Nação e a quem nem os erros de linguagem perdoava.

25.4.04, Flor do Sal Fazer é traiçoeiro. Não nos espanta que da boca de pessoas com obrigação de dobrar bem a língua saia intempestivamente fazerei e fazeria; pior do que isso, aquele escandaloso não faço nem façarei de um político de topo. Português sem Mestre III

DEZ DE JUNHO Em Junho dez, dia do peito inchado, reúne-se após combinações secretas o escol da grei p'ra ser condecorado, sobram medalhas p'ra servis marretas. Neste jardim à beira-mar plantado, se uma topada der saltam poetas, barões do capital, gente do fado, e “pessoas”, nobéis, génios de tretas. Milagre pois que enxuto alguém passe. Para não ser barão foge o meu cão, não quem na vida há mister coleira. Mas o Zé, inda que se não calasse, um manguito lhes fez e ao medalhão: não é asno que vá a esta feira. Junho, 2005, Erotica & Satirica

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A CORJA Não, não é essa em que pensa, vontade não me falta, estas crónicas são linguísticas, não de política. É pena, que outro sabor teriam com alguma pimenta. Português sem Mestre II


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No final do seu primeiro romance, Viúvas de Vivos, publicado em 47, escrevia Joaquim Lagoeiro: “Este livro foi escrito neste mundo”. Na verdade, toda a sua obra “resulta da experiência vivida, do que observa e sente” (Entrevista ao Diário de Notícias de 22 de Abril de 84), apoiada pelo “milagre da memória.” Peregrino deslumbrado no rio da própria vida, de “águas inquietas e esbravejando sempre” (Mar Vivo), para escrever, foi “caçador de sonhos”, como de si disse: “...eu creio que sonhar acordado pode servir (e serve!) a realização da mais realista das obras de arte” (Entrevista ao Boletim da CGD, Abril/Maio de 1982). É que a realidade não se dá, é preciso conquistá-la. Trágica e cómica. Mais surreal às vezes que a mais surreal ficção, basta que os olhos, abertos ou fechados, lhe saibam ver o avesso, nas dobras do direito. “A última estória não a fantasiei, porque de si improvável, fantástica por isso, e no entanto tão real que impossível inventá-la”. (Apresentação de Assim no Céu como na Terra) A vida é como “um balão de papel que se nos escapa e nós com ele numa viagem pelos longes do mundo.” (Assim no Céu como na Terra) Por isso, é preciso às vezes “inventar” o percurso, para melhor contar a viagem. Esse o direito de um “contador de estórias”. Joaquim Lagoeiro é um realista porque é um poeta que sempre transformou a realidade em metáfora de si mesma. NEO-REALISTA? Disseram-no neo-realista por “ter lançado as raízes no chão, na terra” e ter eleito como personagem principal de grande parte da sua obra não as elites, mas “os humildes” e as suas condições de vida, “a gente comum, às vezes a sub-gente, aquela em que as reacções perante a realidade mais evidenciam a fragilidade e a pequenez humanas” e também a sabedoria. Alguns “viviam como bichos mas comportavam-se como homens” (Projecto de Trabalho de Ramilhete Espiritual de Estórias Profanas). Cedo, porém, questionou o apodo. Como disse em 2010, numa palestra no Museu do Neo-Realismo, a que doou parte dos seus manuscritos: “Eu nem sabia que era neo-realista. Eu apenas escrevia sobre a gente da minha terra. Quando o Urbano Tavares Rodrigues me chamou pioneiro do Neo-Realismo fiquei surpreendido.” E explicava: “Ora aconteceu que aos filhos do povo foi possível, numa determinada altura, escrever e publicar: não seria então de esperar que surgissem lucubrações umbilicais – deram-nos pelo contrário conta do que viam e do que sentiam na própria pele”. (Entrevista no Boletim da CGD, Abril/Maio de 1982)

[na Sociedade de Língua Portuguesa]

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Quem tem o bicho da escrita tenta-a mal lhe crescem as asas. (Em entrevista , 1982)


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... este prefixo neo ligado com um hífen ao velho realismo [...] a que o próprio Camilo ergueu aras e sacrificou, ou eu me engano muito ou neste caso está a mais, formando uma palavra inútil. Com efeito, que espécie de realismo seria o que não fosse novo em relação ao seu tempo?... Julgo por isso que tal designativo não tem razão de ser, a não ser como bordão de críticos. (Entrevista ao Diário de Lisboa de 3/12/59) Um bom exemplo das razões da aversão a ser catalogado, deixa-o ele num Projecto de Trabalho para a escrita de Ramilhete Espiritual de Estórias Profanas: “O romance não será histórico, nem neo-realista, nem surrealista, mas o que aflorar à pena em cada momento, pelo que poderá ser tudo isso.” “Lagoeiro é daqueles (já hoje raros) escritores portugueses cuja obra comporta uma linha de unidade jamais quebrada. Autor singular, disse e repito: porque a obra de Joaquim Lagoeiro é absolutamente inclassificável [...]” “...apesar do evidente protesto social contido nos seus romances, neles sobrepuja a estatura estética, a compleição estilística, e, nunca, o sopro do panfleto”.

“O que o autor acima de tudo pretende é fazer literatura”. E manteve-se fiel, imune a todas as modas só por serem modas - ao provincianismo literário - e aos ventos de mudança que, no início dos anos 60, sopraram de França, com o nouveau roman, que não apreciava. Manejando os diálogos na trama da narrativa como se teatro fosse, deixando o leitor em suspense, até ao destrinçar de um crime, levando-o ao riso em momentos picarescos (v. os extraordinários contos As Mulas do Gás e De Noite, o amor, em O Baile) ou parando em assomos líricos e ramilhetes espirituais de rara beleza. Realista poeta.

Baptista-Bastos, Boletim da Sociedade de Língua Portuguesa de Nov. 1996.

É difícil nominar a prosa deste notável romancista. O estilo é de poeta. A recriação das personagens pertence ao mistério que do barro faz irromper a chama da vida. Natércia Freire, Diário de Notícias, 21.01.71

[com Tomaz de Figueiredo e Manuel Poppe, dez.69]

Dele diz, magistralmente, o grande amigo e confidente das letras, Tomaz de Figueiredo, quando da publicação de Corda Bamba: “Longe de regionalista no sentido comum, o figurado rústico talha-o Joaquim Lagoeiro sem maneirismos de folclore, a enxó, goiva e grosa de santista inspirado. As almas e corpos brutos dos seus romances diferençamse dos de qualquer romancista: são vistos directamente pelos olhos. Nunca de convenção pitoresca, são de ursos, de lobos, de ouriçados javalis humanos, toscos de carne e bravos de paixões, se não de ingenuidade de cordeiros de Deus, surpreendidos, meditados e recriados com realismo poético. O Poeta de Corda Bamba sabe que escrever é uma arte inspirada, mas como arte sujeita a cânones e disciplina compatível com a originalidade. Porque a Poesia ”é o sal que tempera prosa e verso e que, dando-lhe sabor, faz deles literatura. A literatura é isto”- diz (Português sem Mestre III). [dedicatória de Tomaz de Figueiredo] 13


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ESCREVER É CORTAR Uma vez pensado e repensado o tema, Joaquim Lagoeiro era um escritor repentino, que acreditava no “automatismo da pena”. Depois, deixava amadurecer os seus escritos e a eles voltava vezes sem conta, emendando, emendando, emendando... Mesmo depois de publicados: com vista a novas edições ou porque, cultor do estilo, não resistia à busca incessante da perfeição. Como dizia, ensinando os filhos, “escrever é cortar”: depurar, poupar em adjectivos ou verbos inúteis, escolher a palavra certa que dá contenção ao texto, sem lhe deixar perder o ritmo, escutando a música da língua.

A música da língua, acreditava ele, vinha de dentro, ou não fosse língua mãe. Têm-na os analfabetos, a gente do povo, que às vezes falam como que em verso, com a sua “gramática natural”, alheios às “construções arrebicadas atentatórias do bom gosto e da gramática” dos “enfatuados e dos pseudocultos que, por terem um curso, pensam que têm de se distinguir da arraia miúda”(Português sem Mestre III). Disso e de tudo o mais que faz o sal da língua - a lógica e a correção gramaticais, a precisão das palavras na sua enorme riqueza (ele que tinha um acervo lexical imenso, que usava com naturalidade no quotidiano), a sua relação com as origens, as expressões proverbiais (v. Manual de Casos de Consciência e A Congosta), a oratória e a retórica - tratou com especial cuidado no fim da vida, nas crónicas linguísticas que, na maior parte, foi publicando n' O Jornal de Estarreja e também n' O Concelho de Estarreja e depois reuniu em três volumes - Português sem Mestre I, II e III. Mas antes, muito antes, já o jovem recém chegado a Lisboa, que “bebera” os clássicos e a eles de quando em quando voltava para tomar “um banho lustral” de escrita, e que falava Latim como se língua viva fosse, tinha mostrado o seu amor à Língua e o desejo de convocar democraticamente todos, independentemente da sua origem social ou do seu grau de instrução, para a luta “A Bem da Língua Portuguesa”. Uma verdadeira militância que o fez fundador e colaborador assíduo da Sociedade de Língua Portuguesa (criada em 14 de novembro de 1949, tinha ele 31 anos), de cuja direção fez parte e onde privou com os mestres que muito admirava, Raúl Machado e Hernâni Cidade, entre outros : 14

Um bichinho me morde desde que os bons professores que tive de Português me abriram o espírito para a sua beleza. Aqui fica o nome do primeiro deles, meu professor primário: José Maria da Silva Freire; depois, no Colégio Internato dos Carvalhos, o abade de Perosinho, Senhor Padre Manuel de Almeida e Silva, austero, exigente, cuja amizade, assente no seu gosto de ensinar e no meu de com ele aprender, e por nos descobrirmos ambos marinhões, perdurou toda a vida. A estes, sobretudo a estes, porque tive mais, devo este vezo de mexer e remexer nos problemas da Língua, poço sem fundo de mistérios e problemas. Prefácio a Português sem Mestre II


Escritos neste mundo centenário do nascimento

Aquilino e o Diabo Calhou-me bem principiar Aquilino, passe a expressão, por “O Homem que matou o Diabo”, pois que na altura puxava já pela cauda do meu, e foi uma ajuda. Mas sobretudo uma revelação: ao fim do primeiro período, uma pausa, torna atrás, o que ali se me oferecia havia que o saborear por tão diferente do que então se escrevia. Um estilo. De prosa insípida e inovadora, longe de literária mas com tal rótulo, andava farto, desenjoava-me com Frei Tomé de Jesus, Vieira, D. Francisco, Manuel Bernardes, pois que já empanturrado de Camilo e Eça de Queirós, depois de me haver deliciado com Herculano, mas sobretudo Garrett. Quando se me depara, e verdadeiramente inesperado, um rasgar de leivas pelo mais fundo do idioma que ao de cima fazia saltar insuspeitadas maravilhas. Um mago, o Aquilino. E nisso tão grande e brilhante que neste quase dobrar do vigésimo século da graça ainda há quem não tenha olhos para ele, sem dúvida tornado toupeira de tanto foçar no chão literário dos outros, ossos do ofício. O Diário, 21.04.1985

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“[...] temos sócios em todo o Mundo. E sócios que pertencem a todos os escalões sociais. Desde as mais altas magistraturas da Nação aos simples operários. [...] “...nela há lugar para todos - para os que têm obrigação de ensinar e para os que precisam de aprender. Na Sociedade de Língua Portuguesa não se pergunta quem é a quem nela ingressar, porque todos os seus componentes se encontram num plano superior de convívio e colaboração, num plano de interesse superior - 'a bem da Língua Portuguesa!'” (Entrevista ao República de 4.05.1953)

A mesma militância em prol da língua e da literatura que o fez, mais tarde, ser membro da Sociedade Portuguesa de Escritores e da Direcção da Associação Portuguesa de Escritores (APE). Sempre activo no meio literário, artístico e jornalístico da sua época. Não tanto ligado a tendências ou a grupos (ele que não aceitava “trelas” de espécie alguma), mas fiel aos amigos e aos que admirava e de quem esperava conversa viva, ideias e críticas que lhe servissem de alimento para pensar, como Tomaz de Figueiredo, Armindo Rodrigues, Aquilino Ribeiro, Abel Manta, Carlos Botelho, Vitorino Nemésio, Orlando da Costa, Manuel Ferreira, Jacinto do Prado Coelho, Luiz Pacheco, Baptista-Bastos, José de Lemos, Luiza Neto Jorge, Ondina Braga, Natércia Freire, Natália Nunes, Miguel Urbano Rodrigues, Urbano Tavares Rodrigues, Isabel da Nóbrega, Wanda Ramos, Hélia Correia, Jaime Gralheiro, Alexandre Babo, Glória Marreiros, Modesto Navarro, Sérgio Paulo, Carlota Guerra, Glicínia Quartim, entre tantos... Muitos deles companheiros de tertúlia, n' A Brasileira do Chiado. Um meio onde muitos reconheciam explicitamente o seu valor, sendo frequentemente solicitado para entrevistas e tomadas de posição na imprensa. Cada livro novo era aguardado, antecipado e objeto de notícia e de crítica literária em variadíssimos jornais, não só no continente, mas também nas ilhas, nas ex-colónias e na emigração, onde os seus livros sobre as gentes marinhoas tiveram grande repercussão (Viúvas de Vivos esgotou a 1.ª edição de dois mil exemplares em dois meses). 15


Escritos neste mundo centenário do nascimento

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N'A Brasileira do Chiado Um dia, Joaquim Lagoeiro entrou, como era seu hábito, n' A Brasileira do Chiado, vindo do Calhariz, ao final de um dia de trabalho na CGD. De uma das mesas da frente, do lado direito, ainda antes de se sentar, surpreendeo a voz de Abel Manta, pintor, recitando de cor um longo texto que o impressionou. - De quem é? - questionou. - Ó homem, então não sabe que é seu? [com Abel Manta pintor, Julho 65]

O 25 de Abril, que enterrou o cafarnaum escuro do fascismo e da censura, e que gostaria que fosse para sempre, viveu-o com uma alegria imensa. Trouxe-lhe, no entanto, alguns custos, tendo perdido a sua editora, que mudou de rumo, o que o fez estar uns anos sem publicar, embora escrevendo sempre. “Nunca como agora apareceram tantas obras literárias de qualidade”, disse em entrevista ao Diário de Notícias – Funchal, em 1984, quando, tendo-se reformado, já podia ser, finalmente, “escritor a tempo inteiro”. “Agora temos uma produção literária ímpar [...] dos autores consagrados e dos novos”, fruto da liberdade de expressão. Sem a desculpa da Censura, “descobriu-se o manto diáfano de muitas mentiras.” “Para alguns, o confirmar de uma vida de embuste, fazendo crer aquilo que não eram, para outros o desabrochar de novos horizontes e a afirmação da sua capacidade criativa.”

“Joaquim Lagoeiro é um ficcionista hábil, de estilo enxuto e escrita discreta mas sobriamente trabalhada, e que aborda uma problemática atinente às questões maiores da sociedade portuguesa das últimas décadas...” “...outros escritores da mesma dimensão se afirmam de modo visível, devido a critérios editoriais, de política de vendas e de difusão jornalística.” Maria Alzira Seixo, Joaquim Lagoeiro – O “centro” e as “margens”, Jornal de Letras, 30.12.1998

O “rebentar do balão” trouxe naturalmente alguns excessos. Foi preciso reaprender a nadar nas novas águas (antes escrevia-se a “pensar nos censores”...), adaptar-se, ganhando algum distanciamento, para evitar cair em “obras que não [passassem] de panfletos, como tantas que surgiram. “Mesmo assim, o saldo é positivo”, disse. “O que é preciso é escrever.” Escrever, escrever, escrever.... Foi, pois, com alento novo que retomou a publicação de contos no jornal O Diário, para além de artigos sobre questões literárias, lembrando os tempos de jovem, nos anos 40 e 50, em que o Sol e o Diário de Lisboa (com ilustrações de Carlos Botelho) acolhiam regularmente contos seus. Vieram mais romances, novelas, sonetos, contos infantis, crónicas linguísticas, intervenções em jornais... Do alto da sua idade, cada vez mais livre de peias, longe de “agitar a campainha de feirante para se impor” (como disse em entrevista ao Diário do Norte em 1965), esperando apenas que “se pergunte à obra o que é que vale” e não “de quem é ou por quem é”, com o mesmo rigor, fruto de muito trabalho, o mesmo amor à língua, às gentes e à terra onde nasceu, os mesmos assomos de sarcasmo (v. Erotica & Satirica), a mesma capacidade de dizer que o rei vai nu, ele que “olhava para trás e já não via ninguém dos velhos companheiros de letras e de artes” (é tão triste ser-se velho), soube ainda fazer dançar vivências e memórias num último Baile (2010). Na forja, outras crónicas linguísticas: Português sem Mestre III. Agora já posso voar, disse um dia. Foi a forma de anunciar o último ponto final do seu último livro. 16

Nunca se diz adeus a um Homem Honrado! assim escreveu, na sua morte, José Luís Moreira dos Santos (O Jornal de Estarreja, 25.03.2011)


Obras do autor centenário do nascimento

*Viúvas de Vivos (romance) – Lisboa, 25 de Fev. de 1946.

1918~2018

Ed. 1947, 1967 e 1973 (três 1.ªs edições esgotadas) Ed. 1999 (4.ª edição, com alterações e Introdução)

Os Fraldas (romance) – Lisboa, 6 de Julho de 1947

Ed. 1951 (esgotado)

As Castigadas (romance) – Lisboa, 14 de Fevereiro de 1948

Ed. 1953 (esgotado)

Corda Bamba (romance) – Mafra, 26 de Julho de 1952

Ed. 1955 (2 edições, esgotadas)

Mosca na Vidraça ( romance) – Lisboa, 8 de Agosto de 1954

Ed. 1959 (esgotado)

O Manto Diáfano (romance) - Lisboa, 8 de Março de 1960

Ed. 1961 (esgotado)

Santos Pecadores (romance) – Lisboa, Out. a Dez. de 1962

Ed. 1965 (1.ª edição esgotada)

*Madre Antiga (romance) – 26 de Dezembro de 1965

Ed. 1968

Almas Danadas (romance) – Lisboa, 19 de Janeiro de 1968

Ed. 1970

*Milagre em S. Bartolomeu (romance) – Lisboa, Julho de 1970

Ed. 1972

O Poço (romance) - Lisboa

Ed. 1984

Cafarnaum (romance) – Lisboa, 24 de Janeiro de 1981

Ed. 1984

Mar Vivo (romance) – Lisboa e Ericeira, Junho de 1998

Ed. 1998

Caiu um Santo do Altar (Romance) - Lisboa e Ericeira, Fev. e Mar. 1999

Ed. 1999

*A Congosta (Viúvas de Vivos II) (romance)

Ed. 2000

Ramilhete Espiritual de Estórias Profanas (contos) Lisboa e Ericeira, 1999 Ed. 2001 Manual de Casos de Consciência (contos) – Lisboa, 8 de Fev de 2002

Ed. 2002

Uma Lágrima do Céu (contos infantis)

Ed. 2002

Desconstrução – Novelas do Desconsolo - Ericeira, Junho de 2003

Ed. 2003

Flor do Sal – Sonetos de Amor e de Escárnio (poesia)

Ed. 2004

João – In Memoriam

Ed. 2006 (fora do mercado)

Assim no Céu como na Terra (contos)

Ed. 2006

Português sem Mestre - Crónicas Linguísticas

Ed. 2007

Estórias Pequeninas (contos infantis)

Ed. 2008

Dois Contos

Ed. 2008

Erotica & Satirica – Sonetos de Amor e de Escárnio

Ed. 2009

Português sem Mestre II - Crónicas Linguísticas

Ed. 2009

O Baile (novelas)

Ed. 2010

Português sem Mestre III - Crónicas Linguísticas – Lisboa, 25 .02.2011

Ed. 2018

(* Viúvas de Vivos, Madre Antiga e Milagre em S. Bartolomeu formam o “Tríptico da Terra”. Com A Congosta, completa-se a “Tetralogia da Terra”.)

VARIA Palavras Ditas

Ed. 2002

Tomaz de Figueiredo

Ed. 2003

INÉDITOS Lisboaus (romance) 23 de Junho de 1951 Beco sem Saída (romance) (existe cópia na Torre do Tombo, autorizada, com cortes, pela censura, em 10 de Set. de 1956) Itinerário de Mestre Afonso (adaptação do Itinerario de Mestre Afonso, solurgiao mor que foi da India, em tempo do conde visorei e do governador João Demendonça, da Viagem que fez da Imdia por terra a estes reinos de Portugal, por mandado do mesmo governador.) Sem data (data provável, início dos anos 70) Aparições (romance)- Lisboa, Fev. de 1981 Rua Suja (romance) Lisboa, Dez. de 1983 a Jan. 1984 Guinhol (contos) – Lisboa, 31 de Janeiro de 1984 Nas Margens do Amor (romance) - não datado (anunciado em 2002) História de Estarreja contada aos mais novos - Lisboa, Nov. 2008 Os Porquês (estórias infantis) - Lisboa, Nov. 2008



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