ARQUIFOLHA notícias Proibição de Realização de Conferência Envio de Forças da GNR para a Fronteira Presos Políticos Recrutamento de Legionários artigos Entretanto em Cabo Verde
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JORNAL TRIMESTRAL COM NOTÍCIAS DO PASSADO
em destaque
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
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1976 - 2016
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nº.
CÂMARA MUNICIPAL DE SANTIAGO DO CACÉM | ARQUIVO MUNICIPAL | 2016
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Quando a Liberdade Passar por aqui: Memórias de Um Tempo Amordaçado CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
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o ano do quadragésimo aniversário da Constituição da
República Portuguesa (1976), o ARQUIFOLHA celebra o texto que consagra os direitos, liberdades e garantias do Povo Português, restituídos com a Revolução de Abril. Neste número, optamos por recuar à segunda metade dos anos 30 do século XX, os anos de afirmação política, económica e institucional do Estado Novo, em particular ao ano de 1936, um ano repleto de acontecimentos que contribuíram indubitavelmente para a supressão das liberdades. Entre esses acontecimentos, encontram-se a conhecida reforma Carneiro Pacheco, reforma do sistema educativo que visava moldar os jovens nos valores do nacionalismo; a criação da Mocidade Portuguesa e da Legião Portuguesa; a atribuição da pasta da Guerra a Salazar, e a consequente subordinação das Forças Armadas ao regime; o início da Guerra Civil de Espanha e o apoio de Portugal aos Franquistas; e a inauguração do Campo do Tarrafal.
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ditorial …continuação
Viviam-se tempos difíceis como desabafava numa carta um amigo de Carlos Vilhena “O ambiente aqui está de perfeito terrorismo. Muitas prisões, assim como no/ Porto. Do Alentejo veem camions cheios. Polícia é aos cardumes. É um perigo ir/ a cafés ou formar
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um grupo na rua. Está tudo apavorado com o caminho/ que isto está
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Já por duas veses se deram demonstrações de força. À noite, deante/ da
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Brasileira por um magote destes cavalheiros e meninos da Mocidade
tomando. A formação dessa Legião Cívica está dando os seus/ frutos –
Portu-/ guêsa, protegidos pela polícia, com vivório e morrório.” Em Santiago do Cacém, o poder era ocupado, sem surpresas, pelas forças mais alinhadas com a ditadura, por isso, não é de estranhar a proibição da realização de uma conferência, o desvio de forças da GNR para a fronteira, e o recrutamento de legionários.
1 Recortes de imprensa local e nacional, com indicação de terem sido visados pela Censura (Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo – Estado Novo).
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Além das notícias, este ARQUIFOLHA apresenta um artigo sobre o Coronel Carlos Vilhena, opositor ao regime, que, em 1936, estava deportado em São Nicolau, Cabo Verde.
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Quando a Liberdade Passar por aqui: Memórias de Um Tempo Amordaçado
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“(…) Esta política de espírito, como então, a coberto da PIDE e da Censura a proclamaram com ademanes de untuosa insinuação cultural, deu de si, como primeira e última amostra, uma multidão de subalternos, içada a lugares de mando e de decisão, que executavam afanosamente todos os atropelos ordenados de cima quando os não excediam por conta própria. Raça de governadores-gerais, herdeiros dos vazios e hirtos corregedores, que os últimos governos, inimigos da Revolução, já devem ter reposto nas funções que lhe são inseparáveis: rebaixar ao nível das suas mentalidades as áreas onde dominam.”
2 Manuel da Fonseca (fotografo desconhecido, [1940?]).
Manuel da Fonseca Seara de Vento, Posfácio. Caminho: 2011. p. 195.
Reprodução cedida por Artur Lopes da Fonseca.
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Proibição de Realização de Conferência
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o dia 20 de janeiro de 1936, o Administrador do
Concelho resolveu proibir a realização de uma conferência sobre Cultura Popular, já anunciada para essa mesma noite, que iria ter
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lugar no Cinema Jardim de Santiago do Cacém. A proibição foi comunicada ao conferencista e ao proprietário da casa de espetáculos através de respetivas notificações, e nestas, sem nunca aduzir uma razão determinante para o seu ato, a autoridade tecia várias considerações acerca do proposto orador, terminando por proclamar que “As conferencias po-/ pulares devem ser orientadas/ e fiscalizadas pelo Estado por in-/ termedio dos seus organismos e/ não ao arbitrio de cada um.”
3 3 Jardim Municipal de Santiago do Cacém (fotografia de Policarpo Godinho, 1957). PT/AMSC/FOT/PG/CE/002.
O conferencista foi sujeito a interrogatório até abril, pois as autoridades insistiam em saber das suas habilitações e autoridade para falar sobre o tema.
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Envio de Forças da GNR para a Fronteira
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o dia 29 de agosto de 1936, o Administrador do
Concelho solicitou ao Governo Civil o reforço do posto de Santiago do Cacém para policiamento da Feira do Monte, que teria lugar a 8 e 9 de setembro. Temia o Administrador que as forças de
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segurança da vila, reduzidas a um cabo e dois praças, devido à vigilância da fronteira, fossem insuficientes para conter algum tipo de manifestação contra o regime. Justificava-se dizendo que “Atendendo aos acontecimentos de Espanha,/ é na vila onde mais esses acontecimentos/ se discutem e se aproveita para a propagan-/ da nociva, podendo dar logar (sic) a qualquer/ manifestação, que deva ser imediata/ e energicamente reprimida.”
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4 Carimbo da Guarda Nacional Republicana de Santiago do Cacém, 1934. PT/AMSC/AL/CMSC/BC/002-001).
5 Feira do Monte, [inicio do séc. XX], fotografia de Hidalgo de Vilhena.
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Presos Políticos
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o dia 3 de setembro de 1936, o Administrador do
Concelho enviou, para Setúbal, debaixo de prisão, cinco trabalhadores do caminho de ferro, acusados de “(…) terem tomado
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parte em manifestações/ de caracter comunista (…)”. Estes trabalhadores
eram
naturais
do
Algarve,
com
idades
compreendidas entre os 20 e os 26 anos e solteiros à exceção de um.
6 Indivíduos presos como tendo tomado parte na revolta, Marinha Grande, 18 de janeiro de 1934, In O Século Ilustrado, n.º1933, (25 jan.1975) p.27.
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7 Fachada e cela da antiga Cadeia de Santiago do Cacém, onde pernoitaram alguns presos políticos, s.d., CMSC.
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Recrutamento de Legionários
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m dezembro de 1936, o Comandante Distrital da
Legião Portuguesa pressionou as autoridades locais no sentido de estas se envolverem diretamente no recrutamento de legionários. O Administrador do Concelho, no dia 19 desse mês, respondeu ao
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referido Comandante Distrital “(…) que seria melhor dirigir-se ao Presidente da União/ Nacional deste concelho, pois foi a essa entida-/ de
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que foi solicitada a organização dos alis-/ tamentos na legião.” Esta
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resposta não demoveu o Comandante, que convidou pessoalmente o referido Administrador para esse serviço, garantindo-lhe que o próprio Comandante Geral da Legião via com agrado essa solução.
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8 Carimbo da Legião Portuguesa – Comando Distrital de Setúbal e Timbre da Legião Portuguesa de Santiago do Cacém, 1937. PT/AMSC/AL/G-A/003.
9 Timbre da Mocidade Portuguesa, [1938?] PT/AMSC/ENS/DESC.
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Estas manobras, no entanto, foram debalde, pois o Administrador, em ofício datado de 7 de janeiro do ano seguinte, insistia no facto de o recrutamento de legionários ser da responsabilidade da União Nacional, a quem havia sido superiormente atribuída essa tarefa; e encerrava o assunto declarando que “(…) de bom grado pro-/ cederia a esse alistamento. Porem, como/ V. Ex.ª vê, há uma duplicidade de funções,/ que me não permite agir, sem que/ possa provocar atritos (…) ”.
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Recrutamento de Legionários
10 Comissão Central da União Nacional, reunida pela 1ª vez, em 04.11.1935, in Separata de O Século Ilustrado, nº1943 (5 abr. 1975) p. 32. PT/AMSC
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11 Salazar, Carneiro Pacheco e Nobre Guedes, em saudação fascista, [1936?], in Separata de O Século Ilustrado, nº1943 (5 abr. 1975) p. 35. PT/AMSC
12 Manifestação fascista na Avenida da Liberdade, Lisboa, [1936?], in Separata de O Século Ilustrado, nº1943 (5 abr. 1975) p. 34. PT/AMSC
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Entretanto em Cabo Verde
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arlos de Jesus Vilhena, nosso conterrâneo
nascido na Abela, capitão do exército louvado e condecorado, encontrava-se deportado na vila da Ribeira Brava, ilha de São Nicolau, devido às suas ideias políticas.
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1976 2016 13 Privado do convívio da sua família e amigos, Carlos Vilhena tirava algum conforto da leitura de longas cartas nas quais, além de preciosas informações sobre o seu processo político 13 Coronel Carlos Vilhena, in Carlos Vilhena: Homenagem 1980, Aristides Teixeira, p. 30. Imagem cedida por António Gonçalves Pereira à Junta de Freguesia de Abela.
e os receios de vir a inaugurar o recém-criado Campo de Concentração do Tarrafal, se comentavam os acontecimentos políticos de Portugal, como a Revolta dos Marinheiros da Armada (setembro de 1936), e a evolução da Guerra Civil de Espanha.
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Entretanto em Cabo Verde
…continuação Carlos Vilhena integrava um pequeno grupo de deportados políticos que considerava, à semelhança da maioria dos democratas, “(…) que o que se passa em Espanha vae/ muito além de
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uma guerra civil e entra no domínio dum conflito internacio-/ nal. A Espanha é, nêste momento, o campo de batalha das forças fascistas e/ anti-fascistas de tôdo o mundo que aí conjugam tôdos os seus esforços.”
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14 Seminário-liceu de São Nicolau, (fundado em 1866, encerrado “às pressas” em 1931, para albergar os deportados da metrópole, em consequência da Revolução da Madeira, iniciada em Abril de 1931). Gravura de 1897.
15 Ilha de S. Nicolau – Vila da Ribeira Brava (excerto). in Gravuras
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Portuguesas, 1974, p. 31.
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Este pequeno grupo, ciente de que se encontrava sob vigilância e desconfiado de que entre eles estava um espião, reunia-se regularmente para ouvir as notícias da dita guerra emitidas pelas estações de rádios espanholas a partir de zonas controladas pelos republicanos. Foi neste contexto que, numa noite de reunião, se levantou uma acalorada discussão acerca dos avanços e recuos dos dois lados do conflito, tendo um tenente presente demonstrado as suas simpatias pelos nacionalistas. O capitão Vilhena respondeu dizendo que as opiniões do outro eram “peregrinas”. Ofendido, talvez por perceber que se tornara suspeito aos olhos dos companheiros, o tenente desafiou o capitão para um duelo. Este não teve dúvidas em considerar ridícula a
16 Excerto de carta dirigida a Carlos Vilhena com a celebre expressão anti fascista, No Pasaran, 1936. PT/AMSC/PFAM/CV/AB/001.
ideia tendo em conta o motivo. Não obstante e por considerar que “(…) a transigência com/ a tolice, não sendo um acto inteli-/ gente, é, pelo menos, um acto generoso”, nomeou dois amigos e aceitou o duelo.
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BIBLIOGRAFIA MONOGRAFIAS AUTORES VÁRIOS – A Guerra Civil de Espanha – 50 Anos Depois. Dir. Ramon Tamames. Sacavém: Salamandra, 1986. AUTORES VÁRIOS – História do Século XX: volume 4 – Depressão e Ditadura (1929-1939). Dir. António Reis. Mem Martins: Alfa, 1995. BEEVOR, Antony – A Guerra Civil de Espanha. Lisboa: Livros do Brasil, 1989. GOMES, Varela – Guerra de Espanha – Achegas ao Redor da Participação Portuguesa: 70 anos Depois. [s.l.]: Fim de Século, 2006. JACKSON, Gabriel – A República Espanhola e a Guerra Civil 1931-1939: Vol. 1. [s.l.]: EuropaAmérica, [s.d]. MADEIRA, João – Carlos Vilhena. Dicionário de História do Estado Novo. Dir. Fernando Rosas e J. M. Brandão de Brito. Venda Nova: Bertrand. Vol. II (1996) pp. 1010-1011. OLIVEIRA, César – Guerra Civil de Espanha. Dicionário de História do Estado Novo. Dir. Fernando Rosas e J. M. Brandão de Brito. Venda Nova: Bertrand. Vol. I (1996) pp. 410-413. ROSAS, Fernando – História de Portugal: 7.º volume – O Estado Novo (1926-1974). Dir. José Mattoso. [s.l.]: Estampa, 1994. VILAR, Pierre – História de Espanha. Lisboa: Livros Horizonte, 1992.
FONTES DOCUMENTAIS MANUSCRITAS Copiador de ofícios expedidos para diferentes autoridades [Manuscrito]. 1936-1937. Acessível no Arquivo Municipal de Santiago do Cacém. PT/AMSC/ACD/ACSC/B-A/002 Copiador de ofícios expedidos para diferentes repartições do Governo Civil [Manuscrito]. 1936-1937. Acessível no Arquivo Municipal de Santiago do Cacém. PT/AMSC/ACD/ACSC/B-A/003 Correspondência recebida [Manuscrito]. 1936. Acessível no Arquivo Municipal de Santiago do Cacém. PT/AMSC/PES/CV/A-B/001 Documentos relativos ao período de deportação em Cabo Verde [Manuscrito]. 1936. Acessível no Arquivo Municipal de Santiago do Cacém. - 1936 PT/AMSC/PES /CV/A-B/007
DOCUMENTOS ELETRÓNICOS http://www.lantuna.blogspot.pt/2006/03/seminrio-liceu-de-s-nicolau.html
FICHA TÉCNICA Propriedade: Câmara Municipal de Santiago do Cacém Coordenação: Divisão de Cultura e Desporto | Arquivo Municipal
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