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JORNAL TRIMESTRAL COM NOTÍCIAS DO PASSADO

Santiago do Cacém em Marcha pela REPÚBLICA PUBLICAÇÃO DA CÂMARA MUNICIPAL DE SANTIAGO DO CACÉM - ARQUIVO, N.º 6 - 2010 JORNAL TRIMESTRAL COM NOTÍCIAS DO PASSADO

JORNAL TRIMESTRAL COM NOTÍCIAS DO PASSADO

PUBLICAÇÃO DA CÂMARA MUNICIPAL DE SANTIAGO DO CACÉM ARQUIVO, N.º 6 - 2010 Santiago do Cacém em Marcha pela EDITORIAL REPÚBLICA PUBLICAÇÃO DA CÂMARA MUNICIPAL DE SANTIAGO DO CACÉM – ARQUIVO, N.º 8 - 2010


5 de Outubro Tarde de Outono; linda! Espelha-se no mar A limpidez do céu; e as vagas a cantar Deitavam-se na areia. Um barco segue ao longe É o passado que foge… apenas se divisa Na superfície azul, tão vasta, onde desliza … As ondas d’uma a uma Vinham cair na praia a desfazer-se em espuma. Mas sente-se que além a artilharia troa Pelas ribas do mar já a metralha ecoa No chão de Portugal há sangue derramado Palpita o coração da pátria amotinado Susteve com vigor o pendão da revolta E ao ser içado enfim, esse pendão vermelho A cor verde da esp’rança a esvoaçar ao vento A alma da nação vibrou nesse momento Generosa e altiva. A voz da artilharia Dizia saudações: - A pátria ressurgia! Ao senti-lo então, o povo triunfante Confia no amanhã e passa delirante Se caídos na luta alguns não mais se ergueram A mesma pátria os chora O povo enxuga o pranto às dobras da bandeira E o futuro sorri que pelo país fora, Crianças vão cantando em coro a Sementeira. Quando a história escrever no grande livro d’ouro Essa data feliz, -Traçar-lhe-á no cimo O nome dos heróis, os raios de um sol nascente E esse grupo gentil, gracioso e sorridente Emoldurando o quadro! Será por certo aquela Da história portuguesa a página mais bela!

Alda Guerreiro


EDITORIAL O ARQUIFOLHA, retomando a sua periodicidade, vem neste número dar continuidade à Marcha pela República em Santiago do Cacém, debruçando-se sobre os acontecimentos ocorridos entre 5 de Outubro de 1910 e Junho de 1911. No dia 5 de Outubro de 1910, o administrador do concelho de Santiago do Cacém recebeu um telegrama do governador civil, Eusébio Leão (um dos membros do directório do Partido Republicano Português que proclamou a República, a partir da varanda da Câmara de Lisboa), ordenando-lhe que hasteasse a bandeira vermelha e verde. Os republicanos santiaguenses acompanharam de perto as políticas, as conspirações e as lutas pelo poder, não ficando indiferentes à cisão da família republicana. Assim, na Primavera de 1911, assistiu-se à divisão do Partido Republicano de Santiago do Cacém em dois grupos: os radicais, mais à esquerda, seguidores de Afonso Costa e os moderados, mais à direita, ligados inicialmente à tendência evolucionista de António José de Almeida. Entre os primeiros encontravam-se: Rafael da Costa Brotas e Jorge Pereira Chaves, e entre os segundos: Félix da Cruz e Luís Augusto da Gama. Uma das questões mais polémicas da República foi a Lei da Separação, de 21 de Abril de 1911, que retirava à Igreja Católica Romana o controlo sobre os ministros espirituais. Antecipando-se à referida Lei, o administrador do concelho, Félix da Cruz, explicou aos regedores através de uma circular datada de 19 de Outubro, a liberdade de culto defendida pelo regime, equiparando o catolicismo às outras religiões, e especificando que se devia “respeitar a religião de cada cidadão, como mero caso de consciência”. A profusão legislativa da República haveria, logo em 3 de Novembro de 1910, de decretar que as mulheres também poderiam pedir o divórcio, com base no adultério do cônjuge. No seguimento deste Decreto surgiu em 25 de Dezembro a Lei da Família, que para além de designar o casamento como um contrato civil e legislar sobre os filhos ilegítimos e as suas mães, previa a futura regulamentação do registo civil. A preocupação que os republicanos pareciam demonstrar pela condição feminina, revelar-se-ia aquém das expectações e seria preciso passar a Guerra Mundial, para haver uma redefinição do papel das mulheres na sociedade.


POLITICA

“Sirva-se arvorar bandeira republicana e aguarde ordens comunique à Câmara e mais repartições públicas para devido cumprimento.”

1910-10-05 - Telegrama do governador civil ao administrador do concelho de Santiago do Cacém no dia da implantação da República.

A REVOLUÇÃO EM S. DOMINGOS

A agitação revolucionária em S.

à República, à cidade de Lisboa,

Domingos conduziu a medidas

ao exército, à marinha e ao Povo

de segurança excepcionais e a

Português.

episódios insólitos. Logo no dia

Novembro um residente invadiu

8 de Outubro o administrador do

a

concelho recomendou ao regedor

celebração da missa e ordenando

daquela paróquia que controlasse

ao pároco que mandasse calar os

e

sinos.

evitasse

a

ocorrência

de

E,

igreja,

Acto

reprovado

autoridades

monárquicos e, em especial, ao

município

pároco.

recomendações

dia

seguinte,

a

tomada de posse da nova junta de paróquia ocorreu entre vivas

provisório.

início

interrompendo

tumultos ou agressões a antigos No

no

ir do

a

pelas

republicanas por

de

contra

do as

governo


CISÃO DA FAMÍLIA REPUBLICANA DE SANTIAGO DO CACÉM

Na noite de 29 de Março de

Frazão, pedia ao Governo Civil

1911, no edifício da Escola

a nomeação, com a máxima

Liberal,

urgência,

realizou-se

uma

reunião da ala mais radical do partido

republicano

de

uma

nova

comissão municipal.

de

Santiago do Cacém. A reunião, convocada por Rafael da Costa Brotas e Jorge Pereira Chaves, pretendia apresentar e discutir as queixas contra a comissão municipal que geria a câmara desde 10 de Outubro de 1910, principalmente contra o seu presidente,

Félix

da

Cruz,

conotado

com

a

linha

moderada

do

regime.

Foi

decidido por unanimidade a destituição

imediata

do

referido presidente e a sua substituição

pelo

“cidadão

Carlos Augusto Jacques, antigo revolucionário

e

dedicado

republicano”. Em consequência demitiram-se vários membros da comissão municipal presidente

republicana da

Junta

e

o de

Paróquia, Luís Augusto da Gama. Logo a 4 de Abril, o administrador

do

concelho, Politica Local. Jornal Pedro Nunes. (C., 1911).

António

César

de

Amaral


AS INOVAÇÕES DA REPÚBLICA NOVO FORMULÁRIO OFICIAL Na

sequência

do

decreto

da

Presidência de 8 de Outubro de 1910, que estabelecia o novo formulário oficial, o administrador do concelho enviou, no dia 15 do mês seguinte, uma circular aos regedores e às juntas de paróquia, informando que todos os ofícios deveriam ser expedidos sob a fórmula “Serviço da República” e terminar com as palavras “Saúde e Circular da Inspecção do Círculo Escolar de Grândola (Francisco [?], 1921).

Fraternidade”.

CONSEQUÊNCIAS DA LEI DA SEPARAÇÃO DA IGREJA DO ESTADO No dia 3 de Junho de 1911, o

Central de Execução da Lei da

administrador do concelho, Amaral

Separação, que o pároco de Santiago

Frazão, informou o governador

de Cacém se recusava a designar uma

civil de uma reunião ilegal de

associação cultual para gerir o culto.

párocos, convocada pelo prior de

Enquanto

Santiago do Cacém, António de

pretendia que o culto ficasse entregue

Loureiro.

às

A

reunião teve

por

o

de

confrarias

do

Santíssimo

Sacramento

pensões

contradição com a lei que previa

Estado,

bastante

associação

em

apenas

hierarquia da Igreja Católica e que

extinção das demais. Por sua vez, o

segundo

Loureiro

pároco de Santa Cruz, encontrava-se

levaria à destituição imediata das

impossibilitado de apresentar uma

funções espirituais.

associação por falta de devotos,

Em Junho do mesmo ano, o referido

cabendo neste caso às autoridades a

administrador queixou-se à Comissão

designação do responsável pelo culto.

de

única

Almas,

contestada por alguns membros da António

uma

das

André,

objectivo debater a aceitação das do

e

Santo

e


LAICIZAÇÃO DA IGREJA DA SENHORA DO MONTE

No dia 21 de Janeiro de 1911,

popular, e que o espaço “não

o administrador do concelho

serve de coisa alguma (…)

de Santiago do Cacém em

porque na vila existem duas

ofício

civil

outras igrejas que são suficientes

reforçava o pedido feito pela

para o culto dos fiéis que (…)

Junta de Paróquia da vila, de

felizmente não são muitos”.

ao

governador

laicizar a Igreja de Nossa Senhora do Monte, para nela passar a funcionar a Escola Liberal. Acrescentava que o dito estabelecimento de ensino tinha

prestado

relevantes

serviços em prol da educação

Igreja de Nossa Senhora do Monte (pormenor de fotografia: Hidalgo Vilhena, s.d., CMSC/GRUP).

LEI DO REGISTO CIVIL OBRIGATÓRIO vasto

e

cortado

por

várias

ribeiras que, por ocasião das cheias,

isolavam

as

várias

freguesias. Por fim, a 27 do mesmo mês, Instalações do Registo Civil de Santiago do Cacém. Extracto da planta do edifício da Câmara Municipal.

enviava uma circular a todos os

A 15 de Fevereiro, três dias

párocos do concelho, informando-

antes da aprovação do Código do

os oficialmente que no dia da

Registo Civil, o administrador

entrada em vigor da lei (1 de Abril

do

ao

de 1911), deveriam encerrar os

governador civil um mapa com

livros de registo paroquial “no

uma proposta de divisão do

estado em que se encontram, não

concelho,

podendo neles escrever-se mais coisa

concelho,

para

remetia

uma

maior

eficácia da aplicação da Lei. Proposta reforçada em oficio de 19 de Março, pois o concelho era

alguma”.


NOTAS SOLTAS

IRREGULARIDADES GRAVES EM OBRA NA RUA DAS PORTELAS No dia 16 de Fevereiro de 1911,

regime republicano, se desprezem

o administrador do concelho

as leis, quando nós, na oposição,

informava a Câmara Municipal

tanto reclamamos contra esse mau

que Domingos António Limão

procedimento

reconstruía um edifício na rua

monarquia”.

da

nefasta

das Portelas, sem ter “cercado a frente da obra com tabuado ou ripado”, conforme determinava o Código Municipal. Parecia-lhe ainda que o dito munícipe não possuía a devida licença de construção, pelo

gratuita,

referido

exigida

código.

O

administrador Amaral Frazão pedia “o cumprimento da lei concelhia, pois não é racional que

Antiga Rua das Portelas (fotografia: José Matias, s.d., CMSC/ GRUP).

vivendo nós no há tempo desejado

MULHER PRESA POR SE VESTIR DE HOMEM Na noite de 30 de Novembro de 1910, apareceu na vila de Santiago do Cacém Felizarda Maria Moutinha usando trajes masculinos e armada com uma navalha de ponta e mola. Este facto causou escândalo público e, aparentemente, foi o motivo da prisão da dita senhora, presente ao juiz no dia seguinte.


GLOSSÁRIO

Amotinado – Revoltoso, rebelde.

Cisão – Separação, rotura, divisão.

Laicizar – Substituir o pessoal religioso por laico; tirar o carácter religioso.

Riba – Arriba.

Troa – Estrondo.


FONTES Copiador de ofícios expedidos para diferentes autoridades [Manuscrito]. 1910-1911. Acessível no Arquivo Municipal de Santiago do Cacém. PT/AMSC/ACD/ACSC/B-A/002

Copiador de ofícios expedidos para diferentes repartições do Governo Civil [Manuscrito]. 1910-1911. Acessível no Arquivo Municipal de Santiago do Cacém. PT/AMSC/ACD/ACSC/B-A/003

PUBLICAÇÕES EM SÉRIE Politica Local. Jornal Pedro Nunes. N.º 245. (9 Abril 1911). Acessível no Arquivo Municipal de Santiago do Cacém. PT/AMSC/FAM/AGMESG/BIB Noticias de S. Thiago do Cacém – Proclamação da República. Jornal Pedro Nunes. N.º 220. (16 Outubro 1910). BNP Acontecimentos políticos – Destituição do Dr. Félix. Anexos do Jornal O Alvanéo. N.ºs 3 e 4 (11 e 21 Maio 1911). BNP

LEGISLAÇÃO

Colecção oficial de legislação Portuguesa do ano de 1901. Lisboa: Imprensa Nacional, 1902. Colecção oficial de legislação Portuguesa do ano de 1910. Lisboa: Imprensa Nacional, 1911. vol. II. Colecção oficial de legislação Portuguesa do ano de 1911. Lisboa: Imprensa Nacional, 1912.


FICHA TÉCNICA

Coordenação,

textos,

pesquisa

histórica, grafismo,

digitalização

e

tratamento de imagem – Equipa do Arquivo Municipal de Santiago do Cacém: Luísa Gomes, Gentil Cesário, Vânia Nobre, Fátima Braz e Maria Chainho.

AGRADECIMENTOS O Arquivo Municipal de Santiago do Cacém agradece a colaboração do Grupo de Reabilitação Urbana – GRUP.

NOTA: As imagens utilizadas na folha de rosto e na banda foram extraídas das publicações periódicas Pontos e Virgulas. A. Manuel de Sequeira e outro (proprietários). Porto, 1895. Nº10. E, Paródia. Rafael Bordalo Pinheiro (fundador). Lisboa, 1905. Nº 123, respectivamente.


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