Ana Carolina da Rocha Mundim (organização)
Abordagens sobre improvisação em dança contemporânea Abordagens sobre improvisação em dança contemporânea Ana Carolina da Rocha Mundim (organização)
Ana Carolina Mundim Organização
Maria Lyra Tradutora
Abordagens sobre improvisação em dança contemporânea
Uberlândia 2017
Copyright 2017© Ana Carolina Mundim, 2017
Todos os direitos reservados. Vedada a produção, distribuição, comercialização ou cessão sem autorização do autor. Os direitos desta obra não foram cedidos.
ORGANIZAÇÃO Ana Carolina Mundim CONSELHO EDITORIAL Adriana C. Omena dos Santos Aparecido José Cirillo Cesária Alice Macedo Gazy Andraus Glayson Arcanjo Lídia Maria Meirelles Leda Maria de Barros Guimarães Luciana Arslan Mourão Mara Rúbia Marques Miguel Rodrigues de Sousa Netto Paula Arbex Raquel M. Salimento de Sá Renato Palumbo Dória REVISORAS Marcela Henrique de Freitas Mariana Ferreira Olivia Maria Santos de Lima DESIGNER DA CAPA Emilliano Alves de Freitas Nogueira Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Nelson Marcos Ferreira - CRB-6 / 3074 A154s Abordagens sobre improvisação em dança contemporânea = Approaches about improvisation in contemporary dance / Ana Carolina Mundim (organização) ; Maria Lyra (tradutora). -- Uberlândia : Composer, 2017. 276 p. : il.
ISBN 978-85-8324-058-7 Textos em português e inglês. Inclui bibliografia. Vários autores.
1. Dança-criação. 2. Dança contemporânea. 3. Composição em tempo real. 4. Improvisação na dança. I. Mundim, Ana Carolina, (org.) II. Lyra, Maria, (trad.). CDU 792.8 Av. Segismundo Pereira, 145 - B. Santa Mônica Uberlândia - MG - Fone: (34) 3236-8611 - Cel. 99173-6271 rita@composer.com.br
Abordagens sobre improvisação em dança contemporânea
SUMÁRIO
O DANÇAR/JOGAR/IMPROVISAR NAS DANÇAS BRASILEIRAS:
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POÉTICAS DE UMA ENCRUZILHADA Jarbas Siqueira Ramos INTERDISCIPLINARIDADES CRIATIVAS NA COMPOSIÇÃO EM
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DANÇA Mariane Araujo Vieira PROJETO CORPO E(M) MOVIMENTO - A CRIANÇA E A COMPOSIÇÃO EM TEMPO REAL
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Patrícia Chavarelli Vilela da Silva CORPO E ARQUITETURA: A POÉTICA DO ESPAÇO ARQUITETÔNICO NA DRAMATURGIA NA COMPOSIÇÃO EM
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TEMPO REAL Emilliano Alves de Freitas Nogueira IMPROVISAÇÃO EM DANÇA: CORPOESPAÇO EM EXPERIÊNCIA Ana Carolina Mundim
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Abordagens sobre improvisação em Dança Contemporânea Apresentação
O Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço nasceu em 2010, como primeira ação do Curso de Bacharelado em Dança da Universidade Federal de Uberlândia, implantado em 2011. O grupo, iniciado pela Profa. Dra. Ana Carolina Mundim, com o nome inicial de “Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpo-Espaço e Territorialidade”, tem como foco de estudos o Corpoespaço e suas possibilidades técnico-criativas na Dança Contemporânea, especialmente na improvisação e na composição em tempo real. Nesse contexto, foi premissa do grupo, desde seu início, a busca pelo diálogo com outras áreas de conhecimento, ampliando conceitos e práticas por meio da interdisciplinaridade. Composto por docentes, discentes e técnicos, o grupo reuniu, até o presente momento, além de integrantes do Curso de Dança, pesquisadores das áreas de Arquitetura, Música, Física Mecânica e Teatro. As contribuições teórico-práticas trazidas por esses indivíduos com perspectivas tão distintas redimensionaram as relações estabelecidas e criaram uma rede de possibilidades híbridas nos processos e resultados obtidos por nossos estudos. Entendemos a Dança como um ponto de encontro. Nossas ações são permeadas por discussões teóricas apoiadas pela leitura de textos (livros e/ou artigos), por apreciação estética por meio de vídeos e por experimentações baseadas em práticas corporais. As práticas percorrem o universo da Dança Contemporânea, tendo como base proposições de frases de movimentos e improvisações orientadas, jam sessions e jogos de percepção coletiva. A apreciação de vídeos ocorre para compartilhar referências que se aproximam do nosso campo de estudos, seja por meio de espetáculos, filmes, documentários ou entrevistas. As discussões teóricas têm sido baseadas na leitura de livros, previamente escolhidos pelo coletivo, que discorrem sobre a improvisação e a composição em tempo real, sobre aspectos do corpoespaço, procedimentos técnico-criativos e metodologias de trabalho em Dança. Durante o estudo dos livros, trazemos artigos e textos complementares sobre os assuntos, especialmente para nos aprofundarmos 7
nos estudos dos conceitos que orientam nossa pesquisa: dramaturgia; corpoespaço; improvisação e composição em tempo real em dança. Desses encontros, surgiu a necessidade de criação de um braço de extensão do grupo de pesquisa, chamado Conectivo Nozes, para ampliar as possibilidades de diálogo dos nossos estudos com a comunidade por meio da realização e circulação de produções artísticas, do desejo de proporcionar ações de compartilhamento (promover eventos, encontros, residências, oficinas, apresentações) e pela iniciativa de realizar práticas pedagógicas em escolas públicas. Além disso, o Conectivo também produz artigos acadêmicos, livros, documentários, entrevistas e a organização de materiais de pesquisa, que podem ser encontrados no blog: http://www.conectivonozes.blogspot.com. Nesse percurso de trabalho, o grupo já passou por diferentes formações e experimentou maneiras diversas de estruturação, o que lhe proporcionou constantes revisões e reflexões sobre seu próprio fazer coletivo e seus modos de atuação. O presente livro “Abordagens sobre improvisação em dança contemporânea” se organiza com base nas pesquisas individuais que se originaram ou se fortaleceram nesse encontro conjunto. Ele reúne os textos de cinco dos pesquisadores que integraram o grupo nos últimos anos. O artigo “O dançar/jogar/improvisar nas danças brasileiras: poéticas de uma encruzilhada”, do Prof. Dr. Jarbas Siqueira, faz uma articulação entre a improvisação na Dança Contemporânea e nas danças brasileiras, com base em sua experiência como brincante e a atuação no Conectivo Nozes. O texto está relacionado à sua pesquisa de doutorado, integrada ao DINTER/UNIRIO-UFU (PPGAC/UNIRIO), com orientação do Prof. Dr. Narciso Telles e apoio da CAPES. O artigo “Interdisciplinaridades criativas na composição em dança”, de Mariane Araújo Vieira, discute possibilidades de composição em Dança Contemporânea baseadas na improvisação, criando um diálogo com conteúdos da Física Quântica. O texto está relacionado à realização de seu trabalho de conclusão de curso, sob minha orientação, vinculada ao Curso de Graduação em Dança da Universidade Federal de Uberlândia. O artigo “Projeto corpo e(m) movimento – a criança e a composição em tempo real”, da Profa. Ms. Patrícia Chavarelli, compartilha experiências realizadas ao longo de três anos com crianças e jovens na Escola Estadual do 8
Parque São Jorge, por meio do projeto de extensão “Corpo e(m) movimento”. No texto, a pesquisadora aborda diferentes formas de atenção (sensível, relacional e criativa) que podem ser trabalhadas por meio do estudo de movimentos e da composição em tempo real em dança. O artigo “Corpo e arquitetura: a poética do espaço arquitetônico na dramaturgia na composição em tempo real”, do Prof. Ms. Emilliano Alves de Freitas Nogueira, trata de aspectos físicos e socioculturais dos espaços e os modos como eles interferem nas qualidades de movimentos e no processo de criação durante os processos de improvisação e composição em tempo real em dança. O artigo “Improvisação em dança: corpoespaço em experiência”, de minha autoria, desenvolve o conceito corpoespaço na improvisação e na composição em tempo real na Dança Contemporânea. Também discute as conexões com os processos de escrita e leitura que envolvem o espectador na improvisação em dança – cujo processo de escrita discursiva ocorre no próprio corpoespaço, no momento presente – e na composição em tempo real, onde, de modo mais abrangente, em cena, com público presente, ampliamse possibilidades de potência e falência. O texto está vinculado a um estágio pós-doutoral realizado no ano de 2015, na Universitat de Barcelona (UB), sob orientação do Prof. Dr. Jorge Larrosa Bondia, com financiamento da CAPES (Pesquisa Pós-doutoral no Exterior/Portaria 36/2013 – Estágio Pósdoutoral – Chamada I 2015). Desejamos que as pesquisas desenvolvidas pelo grupo e aqui compartilhadas sirvam como canal de diálogo com outros interessados em Dança, na perspectiva de fortalecer nossa área de conhecimento dentro e fora das universidades, na conexão entre teoria e prática. Este livro fecha um ciclo na caminhada do grupo, que se recria e se transforma a partir de agora em novas configurações. Convidamos os leitores a acompanharem também as mudanças que seguirão! Por ora, desejamos uma boa leitura e lhes convidamos a uma reflexão conjunta! Ana Carolina Mundim
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O DANÇAR/JOGAR/IMPROVISAR NAS DANÇAS BRASILEIRAS: POÉTICAS DE UMA ENCRUZILHADA Jarbas Siqueira Ramos1
INTRODUÇÃO A minha relação com o universo da dança se deu pela intermediação com as “danças brasileiras” ou “danças populares brasileiras”. Vivendo as práticas festivas e ritualísticas de várias manifestações/expressões culturais espalhadas por toda a região do Norte de Minas Gerais e Vale do Jequitinhonha é que pude apreender as relações intrínsecas que acontecem entre corpo, memória, tradição e contemporaneidade por meio da dança, sendo material basilar das propostas de pesquisa e docência que tenho realizado e desenvolvido ao longo da última década. Em outra perspectiva, o contato com a improvisação em dança, ocorrido a partir do encontro com o Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço, na Universidade Federal de Uberlândia2, foi fundamental para que eu pudesse compreender alguns modos de operação e organização dos corpos dos sujeitos nas manifestações/expressões culturais, especialmente nos processos festivos e ritualísticos. Trabalhando com esse grupo de pesquisa, pude observar na minha prática artística algumas nuances das experiências e vivências com as danças brasileiras na maneira de pensarfazer a improvisação em dança.
1 Professor Assistente do Curso de Dança da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Doutor em Artes Cênicas pelo PPGAC/Unirio. Mestre em Artes Cênicas pelo PPGAC/ UFBA. Mestre em Desenvolvimento Social pelo PPGDS/Unimontes. Graduado em Artes/Teatro pela Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes. Tesoureiro da Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-graduação em Artes Cênicas – Abrace (gestão 2015-2016). Membro do Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço e do Conectivo Nozes. Ator, dançarino, produtor cultural e pesquisador da cultura brasileira. E-mail: jarbasramos@ufu.br. 2 O Grupo de Estudos Dramaturgia do Corpoespaço, proposto pela professora, pesquisadora e artista Ana Carolina Mundim, é vinculado ao Curso de Dança da Universidade Federal de Uberlândia – UFU e tem como objetivo o estudo da improvisação em dança com base nas noções de dramaturgia do corpo, corpoespaço e composição em tempo real. Para maiores informações sobre o grupo, suas ações e produções, acesse o blog: conectivonozes.blogspot.com.br.
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No grupo, a improvisação é vista como um modo de produção de discurso sobre o mundo e como uma prática da Dança Contemporânea que tem formas, estruturas e linguagens específicas. A prática da improvisação em dança se dá, portanto, com base na organização de elementos estudados com e pelo corpo, que podem ser acessados nos processos de composição em tempo real realizados pelo grupo (a exemplo do espetáculo “Sobre Pontos, Retas e Planos”), como fragmentos que auxiliam na construção de uma dramaturgia da dança no aqui-agora3. Conforme suscita Mundim (2012, p. 114), acerca dos procedimentos de trabalho do grupo de pesquisa: Estudamos, em nossos corpos, conteúdos de ordem técnico-criativa: mecanismos e recursos que contribuem para o desenvolvimento artístico e profissional dos envolvidos na pesquisa e que nos dão suporte para elaboração de um trabalho cênico que permita a transformação de jogos criativos em jogos-espetáculos, com suas composições poéticas em tempo real. Estudamos para redimensionar nossos modos de ver o mundo, conviver com ele e interferir nele. [...] Buscamos as possibilidades afetivas em nossas micro relações e micro ações, capazes de reverberar em outras micro relações e outras micro ações.
Neste artigo, proponho uma aproximação desses dois universos: as danças brasileiras e a improvisação em dança. Busco refletir sobre as possibilidades de interseção entre esses dois campos com base na compreensão dos processos de improvisação nas manifestações/expressões culturais brasileiras. A intenção deste texto é, assim, refletir sobre o improviso nas danças brasileiras, buscando apresentar uma leitura sobre a prática da improvisação e o lugar do improvisador nessas danças; suscitar a dimensão do corpo nas práticas culturais brasileiras; e apontar relações possíveis entre os modos peculiares do improviso nas danças brasileiras e os processos de improvisação em danças contemporâneas. Para a realização dessa proposta, parto das vivências/experiências realizadas junto a manifestações culturais brasileiras (especialmente o 3 Para maiores informações sobre os procedimentos técnico-criativos, as práticas artísticas e os estudos teóricos realizados pelo Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço, leia: MUNDIM, Ana Carolina (org.). Dramaturgia do corpo-espaço e territorialidade: uma experiência de pesquisa em dança contemporânea. Uberlândia: Composer, 2012.
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congado, os reisados, os pastoris, as cirandas, o samba de roda, o jongo, a capoeira, o cavalo-marinho e o cacuriá), assim como as experiências e estudos realizados de modo teórico e prático no Grupo de Estudos Dramaturgia do Corpoespaço4, buscando não fixar uma ideia ou conceito sobre o tema, mas sim possibilitar um diálogo mais íntimo entre esses dois universos: a improvisação nas danças brasileiras e a improvisação nas danças contemporâneas. Partindo da minha experiência, sem contudo se restringir a ela, o que desejo é abrir um espaço de diálogo sobre as maneiras pelas quais as danças brasileiras vêm sendo recorrentemente tratadas e trabalhadas no universo da formação acadêmica em Dança, especialmente neste momento de expansão dos cursos superiores pelo Brasil afora. Assim, o leitor pode encontrar aqui rascunhos, rabiscos, traços e rastros de uma experiência que pode inspirar aqueles que desejam experimentar novos atravessamentos, novas encruzilhadas. DOS PROCEDIMENTOS DE OBSERVAÇÃO: EPISTEMOLÓGICA DAS DANÇAS BRASILEIRAS
PERSPECTIVA
As “danças brasileiras” ou “danças populares brasileiras” são um conjunto de várias expressões/manifestações culturais que se encontram espalhadas pelo território nacional e que se congregam, por meio do movimento e em uma íntima relação com as sonoridades e oralidades, todo um conjunto de saberes-fazeres culturais e simbólicos de cada tradição. Ainda que algumas dessas expressões sejam “constantes sociais” (caso, por exemplo, dos Reisados, que podem ser encontrados por todo o Brasil), elas resguardam características peculiares de cada lugar e de cada realidade sociocultural. Essas “danças brasileiras” foram o centro do projeto modernista do início do século XX, quando intelectuais como Mário de Andrade, Câmara Cascudo, Arthur Ramos, Sílvio Romero, entre outros, empenharam-se no registro tanto dos aspectos musicais como das “coreografias” de diversas 4 Desde o ano de 2014, participo ativamente do Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço e do Conectivo Nozes, grupo artístico que surgiu como extensão do grupo de pesquisa.
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danças pelo interior do Brasil. Entretanto, é nítido que os registros realizados por esses pesquisadores/folcloristas são muito mais detalhados e minuciosos em relação às músicas do que em relação às danças, aos corpos e aos seus brincantes. Chama atenção a maneira como essas danças foram descritas, analisadas e tratadas por esses pesquisadores, que as viam sempre pelo prisma eurocêntrico, categorizando-as como coreografias, enredos e/ ou passos, tendo sempre o intuito de decodificá-las. Durante um longo tempo, o entendimento das danças brasileiras passava por essa noção eurocêntrica de Dança, que as compreendia como um encadeamento sequencial de passos ordenados no tempo e no espaço, conforme a rítmica musical a ela associada. Entretanto, tenho entendido, assim como vários pesquisadores das danças brasileiras na atualidade, que essa noção não dá conta de toda a complexidade que envolve a organização, realização e execução dessas danças, tanto na sua dimensão corporal como na dimensão simbólica. Assim, a necessidade de adotar uma postura epistemológica que permita dar sentido e significação às danças que se colocam fora do eixo eurocêntrico, como as danças brasileiras, tem se tornado uma emergência para os pesquisadores que se debruçam sobre esses materiais e essas realidades. A adoção de outra postura epistemológica passa, inevitavelmente, pela reformulação e reorganização do pensamento e do discurso sobre o tema de estudo, nesse caso, as danças brasileiras. É também uma maneira de se colocarem uma posição mais aproximada e aprofundada no que se refere às dinâmicas e aos estados corporais das práticas em dança nas diversas manifestações/expressões culturais brasileiras. Para tanto, aponto três propostas de organização dessa observação. A primeira proposta que faço é a de um deslocamento da ideia preestabelecida sobre as danças brasileiras, na busca por um entendimento de que a abordagem deve considerar a diversidade de práticas culturais, rituais e festivas que congregam por meio da dança formas peculiares de organização dos saberes-fazeres dos mais diversos grupos culturais brasileiros. Soma-se a isso a noção relativista de que cada realidade e cada cultura são culturalmente específicas e que, por esse motivo, podem suscitar formas diversificadas de produção de sentido. 14
Como segunda proposta, sugiro que a reflexão sobre as danças brasileiras ocorra menos pela forma como se executa a dança e mais pela organização e produção de símbolos apresentados em cada uma de suas expressões. Nesse ponto, corroboro com o pensamento de Domenici (2009) sobre a complexidade existente nas cadeias de signos implicados em cada uma dessas danças e a emergente necessidade de compreendê-los em sua densidade. Entendo, assim como a autora, que o engajamento corporal dos dançantes/brincantes produz símbolos e significados à medida que os saberes-fazeres se tornam “significados corporificados”. A terceira proposta parte da necessidade de entender as corporalidades pelo lugar do dançante/brincante e, dessa forma, produzir um pensamento que priorize a descolonização do corpo. Para tanto, a intenção é que haja a construção de um olhar mais sinuoso e metafórico sobre as danças brasileiras, compreendendo que elas são formadas pelas diversas maneiras de significação e ressignificação da dança pelo próprio dançante/brincante. Segundo Domenici (2009), por essa perspectiva, é possível olhar as danças brasileiras com o mesmo interesse que se olha as danças estrangeiras, além de suscitar outras possibilidades de compreensão das danças brasileiras, por exemplo, pelos estados corporais, pelas metáforas ou pelas dramaturgias dos corpos em movimento. Ao assumir uma nova postura epistemológica, buscando entender e analisar de modo mais profundo, orgânico e dinâmico as dimensões corporais e simbólicas que envolvem as danças brasileiras, procuro compreender as inúmeras variantes existentes no interior dessas danças, considerando que elas podem admitir diferenças e contrastes, sejam eles de movimento, acentuação rítmica, tonicidade corporal, desenhos do corpo nos espaços, como assevera Domenici (2009), ou mesmo do modo de apreensão do universo simbólico e da cosmovisão do grupo e/ou da manifestação pelo corpo do seu dançante/ brincante. Nesse ínterim, o aprendizado das danças brasileiras acontece à medida que o dançante/brincante cria uma relação com a manifestação e com seu mestre, vivenciando-a e experienciando-a. Não se trata, entretanto, de um aprendizado do modelo, de uma cópia de movimentos ou de uma reprodução das ações do outro. Nas danças brasileiras, cada sujeito dança a seu modo, respeitando as restrições e hierarquias que cada manifestação 15
cultural cultiva. Não há uma exigência de execução de uma única forma de realização do movimento ou da ação, sendo as diferenças encaradas como o modo peculiar de cada um “brincar” ou “dançar”. Segundo Domenici (2009, p. 10), o aprendizado dessas danças acontece por meio da “[...] compreensão de princípios gerais, de traços principais, como dinâmicas, qualidades, padrões tônicos, entre outros”, que determinam as “dinâmicas corporais”5 de cada manifestação cultural e de cada sujeito implicado na manifestação. Com base nessa postura epistemológica, colocando a observação das danças brasileiras em um lugar de compreensão da totalidade interligada de suas dimensões corporais (movimento, dinâmicas, qualidades, tonicidades) e simbólicas (cosmovisão de mundo), outros aspectos importantes das danças brasileiras nos saltam aos olhos, como a relação intrínseca com o jogo, a brincadeira e o improviso. O DANÇAR/JOGAR/IMPROVISAR DAS DANÇAS BRASILEIRAS Ao abordar as culturas brasileiras em meus estudos (e, dessa maneira, abordar as práticas de danças brasileiras), dois pensamentos têm sido fundamentais para sustentação das reflexões empreendidas. O primeiro se refere à ideia de que as práticas culturais encontradas pelo Brasil devem ser entendidas como culturas de encruzilhada, pois são fruto de intensos processos de transformações/traduções/transcriações culturais baseados na relação (nem sempre amistosa) entre as culturas africanas, europeias e indígenas em solo brasileiro. O segundo pensamento tem a ver com a ideia proposta por Zeca Ligiéro (2011) acerca do “cantar-dançar-batucar” como uma forma de expressão que abarca uma totalidade de ação dos produtores das manifestações culturais brasileiras. Nesse contexto, entendo que as práticas rituais/votivas das culturas brasileiras se caracterizam por não separarem os elementos que as compõem (canto, dança, batuque, materiais visuais, enredo etc.), formando assim um todo indivisível e inseparável que constitui o universo semântico e simbólico de cada manifestação. 5 Eloísa Domenici (2009) aponta que adotar o termo “dinâmicas corporais” em detrimento do termo “passos” quando se propõe a tratar os elementos característicos da movimentação dos brincantes nas manifestações culturais brasileiras é uma maneira de tentar dar conta da diversidade e complexidade do movimento e das corporalidades nas danças populares brasileiras.
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Dessa maneira, “Cantar-dançar-batucar não é apenas uma forma, mas uma estratégia de cultuar uma memória, exercendo-a com o corpo em sua plenitude. Uma espécie de oração orgânica” (LIGIÉRO, 2011, p. 130). É pensando nessas duas dimensões (as culturas de encruzilhada e o cantar-dançar-batucar) e em todos os atravessamentos causados pelas relações estabelecidas nas práticas e processos rituais/festivos de cada manifestação cultural que busco entender a relação íntima e indivisível do dançar/jogar/improvisar nas danças brasileiras. Considero, nesses termos, que a noção de dança está associada à dimensão da brincadeira e que, em muitas manifestações, os termos dançar, brincar e jogar querem dizer a mesma coisa. Nas danças brasileiras, o jogo surge como elemento constituinte do modus operandi de cada manifestação. Se em algumas práticas ele é a base fundamental para a construção da expressão dançada, como no cavalomarinho, no bumba meu boi ou na capoeira, em outras práticas ele se encontra travestido em formas sutis de sua expressão, como nas oralidades dos congados ou nas umbigadas dos sambas de roda. Nesses termos, concordo com o pensamento de Johan Huizinga (2007), quando aponta ser possível considerar o jogo e sua capacidade lúdica como a principal forma de organização dos sujeitos em sociedade. Para o autor, o jogo foi o elemento básico capaz de assegurar a organização das sociedades e a construção de sua cosmovisão, pois “é um fator distinto e fundamental, presente em tudo o que acontece no mundo”. Segundo Huizinga (2007), a característica que define o jogo é o divertimento. Trata-se, no entanto, de um divertimento lúdico, que associa a capacidade racional e operacional do sujeito à sua dimensão criadora. Assim, o jogo é fundamental para o desenvolvimento da percepção estética do mundo. Outra característica do jogo é que ele é uma atividade humana baseada em sistemas de regras, arbitrárias ou imperativas, que orientam a forma de atuação dos sujeitos. Aqui, falo com base em uma perspectiva que entende a prática das danças brasileiras como um momento específico da ação humana, um recorte no tempo e no espaço cotidiano e a abertura de um tempo-espaço extracotidiano e específico para cada manifestação cultural. Esse espaço, entendido por Caillois (1990) como um tempo-espaço próprio do jogo, é estabelecido à medida que os “jogadores” sentem a vontade de 17
“jogar” e “jogam”, criando um ambiente de alegria e divertimento. Isso só é possível porque outra característica fundamental do jogo é a garantia da liberdade, sendo obrigação ou dever apenas quando está ligado ou constitui “uma função cultural reconhecida, como no culto e no ritual” (HUIZINGA, 2007, p. 11). O jogo é, portanto, elemento fundamental das danças brasileiras. Quando dança, o brincante/dançante joga. Joga com o espaço, com o tempo, com a sua memória e com a do outro. Joga com o outro. Dançando, o jogo acontece; e na medida em que o jogo se desenrola, a dança vai ganhando forma, estrutura e sendo corporificada. Huizinga (2007, p. 11) aponta que “todo jogo é capaz, a qualquer momento, de absorver inteiramente o jogador”; assim, posso afirmar que o mesmo vale para as danças brasileiras, pois a dança pode contagiar de tal forma que tanto o dançante quanto o observador podem ser capturados pelas imagens e memórias, sendo absorvidos pela dança e pela própria manifestação. Nessa dimensão, e considerando a capacidade de estabelecer o jogo como um atributo tanto coletivo como individual, o ato de improvisar se refere aos modos singulares de se colocar na relação com o outro. Entendo a improvisação nas danças brasileiras como um processo de comunicação em que o corpo que dança estabelece uma permanente troca de informações com os sujeitos que participam da manifestação cultural, sejam eles os próprios produtores da dança ou os espectadores. Assim, o ato de improvisar é uma ação polissêmica, que parte da experiência corporal de cada sujeito (mas que só se completa na interlocução com os demais sujeitos da manifestação) e que pode ser pensado quando o improvisador apresenta a sua capacidade e qualidade na execução dos mais complexos modos de produção da comunicação sobre a cosmovisão do grupo ou sociedade. Ao improvisar, os sujeitos revelam a forma como compreendem e interpretam os códigos da sua manifestação cultural, recriando e transcriando as memórias coletivas que formam a cosmovisão do grupo. Improvisando/ jogando, o sujeito refaz a sua dança, não como outra forma de organização das danças brasileiras, mas como uma possibilidade de construção de novos discursos e de novas propostas de jogo na relação com o outro. Improvisar é, portanto, uma estratégia utilizada para se colocar de modo diferenciado na relação com o mundo circundante. 18
Assim como o jogo, o improviso se dá em momentos muito específicos das danças brasileiras (e isso também é bastante distinto em cada manifestação cultural). Há momentos em que é permitido improvisar, assim como há momentos em que o improviso não é bem visto. Se no cavalomarinho o improviso é a base da construção da manifestação, na congada, por exemplo, há poucos momentos em que se pode improvisar. O improviso acontece na medida em que há uma relação de confiabilidade tanto do mestre para com o dançante/brincante quanto deste em relação à sua performance6 como improvisador. Quanto mais se tem domínio dos códigos que compõem a manifestação, maior a confiança na realização do seu improviso e maior a complexidade presente na execução de sua dança. O improvisador é, assim, o sujeito capaz de aglutinar os saberesfazeres da manifestação cultural utilizando-os de modos diversificados em sua performance dançada. É nesses termos que a dança acontece no contexto cultural brasileiro, pela relação do dançar/jogar/improvisar. Assim, há uma integração entre movimentos, musicalidades, visualidades e textualidades/oralidades que caracterizam a prática performativa do dançante/brincante de cada manifestação cultural, resguardando a maneira particular de expressão de cada uma dessas danças. Na capoeira, por exemplo, o movimento ocorre na mesma dinâmica em que a música se coloca na roda, criando uma correlação tanto no que se refere à rítmica empregada pelo toque dos instrumentos, às textualidades apresentadas em cada canção e às dinâmicas corporais apresentadas por cada sujeito. Dessa forma, movimento, musicalidade e textualidade são complementares e inseparáveis, pois a dança somente ocorre quando essas três dimensões acontecem no mesmo tempo-espaço. Retomando a argumentação inicial, em que aponto as dimensões da encruzilhada e do dançar-cantar-batucar como elementos constituintes do que apresento como sendo o dançar/jogar/improvisar das danças brasileiras, entendo que esse conjunto se processa na dimensão do repertório de cada 6 Ao utilizar o termo performance, refiro-me, nesse momento, à forma de execução da ação e não à linguagem da performance como arte. Assim como aponta Shechner (2003), o termo performance pode se referir desde a capacidade/qualidade de ação ou atuação de um carro, à atuação de um artista na criação e apresentação de uma obra artística. No caso da obra artística, o realizador da ação é chamado de performer.
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manifestação, de cada grupo, de cada sujeito. Compreendo repertório, assim como Diana Tylor (2013), como a prática de memórias incorporadas que se dão à medida que a vivência/experiência da própria manifestação cultural vai grafando no corpo dos sujeitos os saberes específicos de sua cosmovisão. Os repertórios são as marcas, os rastros deixados pelos saberes-fazeres que, constituídos de forma mais efêmera, podem se apagar, esquecer, silenciar, esvaziar na medida em que se constituem como laços fortes, pois deixam impregnados no corpo-memória apenas o imprescindível para a manutenção da tradição (seja coletiva ou individual)7. A improvisação ocorre à medida que o repertório é acessado pelos dançantes/brincantes no momento em que dançam. Nesse ínterim, as memórias coletivas e a memória individual criam uma dinâmica espiralada no corpo do dançante/brincante, recriando/transcriando movimentos no tempo-espaço, aglutinando tanto comportamentos restaurados quanto novos procedimentos conforme os cruzamentos de memórias vão ocorrendo no tempo da própria ação. Ao dançar/jogar/improvisar, o sujeito constrói novos significados para a sua forma de expressão dançada. Enfim, entendendo a indivisibilidade dos elementos constituintes de qualquer manifestação cultural brasileira, a improvisação pode acontecer tanto nas dinâmicas do movimento do corpo que dança como na musicalidade e/ou na oralidade do dançante/brincante. Na manifestação do Cavalo-Marinho da zona da mata pernambucana, as figuras surgem na medida em que são evocadas tanto pelo movimento do corpo quanto pela oralidade e musicalidade que as caracterizam. Na congada, a improvisação pode acontecer na entonação dos cantos, na musicalidade do instrumento ou nas estruturas de movimento do corpo do dançante/brincante. Na capoeira, nos reisados, nas cantigas e em todas as demais formas de expressão das danças brasileiras, a mesma relação ocorre, produzindo significados específicos conforme as próprias dinâmicas das manifestações e das realidades corporais dos sujeitos nelas implicados.
7 Diana Tylor (2013, p. 57) faz a seguinte reflexão sobre a ideia de repertório: “Parte do que a performance e os estudos da performance nos permitem fazer, então, é levar a sério o repertório de práticas incorporadas como um importante sistema de conhecer e de transmitir conhecimento. O repertório, num nível muito prático, expande o arquivo tradicional usado pelos departamentos acadêmicos nas humanidades”.
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O IMPROVISADOR SE FAZ NA RODA: O SABER-FAZER DA IMPROVISAÇÃO NAS DANÇAS BRASILEIRAS O dançar/jogar/improvisar “se faz na roda”. A metáfora da roda é utilizada aqui para entendermos tanto sobre o locus operandi da relação tempo-espaço das danças brasileiras quanto sobre os aspectos rituais que envolvem a cosmovisão de cada grupo e de cada sujeito. A terminologia da roda ou os termos correlatos, por exemplo, “giro”, são constantemente utilizados nas manifestações brasileiras como elemento para delimitação do tempo-espaço onde ocorrerá o ritual, a festa. Isso pode ser percebido em algumas situações: enquanto na capoeira o jogo só se inicia quando “se faz a roda”, nas folias de reis a caminhada entre as casas para as visitas ao menino Deus nascido são nomeadas de “giro”. O estabelecimento desse tempoespaço sagrado/secular é que garante uma das características fundamentais das danças brasileiras: a performatividade. É na roda, no giro, que os sujeitos dançantes/brincantes se colocam para o olhar do outro. É pela circularidade que se estabelece a relação de eterno retorno ao ponto inicial. É nesse tempo-espaço que o mundo gira e volta sempre para o mesmo lugar: o ponto inicial da vida. É na roda, no giro, na gira, na circularidade da vida que ocorre o dançar/jogar/improvisar. Compreendendo, assim, que o dançar/jogar/improvisar é elemento preponderante para o desvelamento da capacidade de improvisação nas danças brasileiras, posso afirmar que o ato de improvisar acontece na medida em que o brincante/dançante mergulha no jogo/dança da sua manifestação cultural. Nesses termos, quanto maior o aprofundamento na vivência do ritual/festa, quanto maior a imersão na experiência do momento do aquiagora, maior a possibilidade de a improvisação acontecer. Ainda que haja liberdade para a realização do improviso, especialmente nos momentos de encontros para preparação da festa/ritual, é notória a existência de uma hierarquia para a realização da improvisação nas danças brasileiras, especialmente quando essa acontece para uma determinada audiência. Nesses casos, os grupos escolhem, nomeiam ou apontam aqueles que são reconhecidos como os melhores improvisadores para se apresentarem ao público. Nas danças brasileiras, o bom improvisador é aquele que consegue extrapolar os limites da dança e manter, na sua performance, as estruturas 21
simbólicas básicas e específicas que caracterizam a dança de sua manifestação cultural. Assim, quanto mais complexa e difícil a execução da dança, maior é a capacidade de improvisar do sujeito. Pensando com base nas noções antropológicas suscitadas por Marcel Mauss (1974), em seus estudos sobre as técnicas corporais, e por Richard Schechner (2003), no que se refere à construção da ideia de Performances Culturais, é possível considerar que o dançante/brincante improvisador agrega de modo mais eficaz e com maior virtuosidade e destreza todos os elementos constituintes da manifestação cultural, criando, desmantelando, recriando e transcriando todos os modos de comunicação e todos os signos de sua expressão cultural. Ao improvisar, a intenção do dançante/brincante é realizar a sua ação com o mais alto grau de qualidade física, sensitiva, emotiva, sígnica e comunicativa. O que define um sujeito como grande improvisador é o seu desempenho diante dos espectadores, seja aqueles de sua comunidade ou aqueles que se encontram à sua margem. Assim, um bom improvisador é um sujeito capaz de realizar a sua dança com um alto grau de complexidade. É pensando nas questões que envolvem o desempenho do improvisador nas danças brasileiras que considero pertinente estabelecermos uma reflexão sobre esses dois aspectos conceituais apresentados: o virtuosismo e a eficácia. Segundo Mauss (1974), o virtuosismo está relacionado à capacidade/ habilidade técnica do sujeito de realização e cumprimento de uma determinada ação, seja ela cotidiana ou extracotidiana. Ainda considerando o pensamento de Mauss (1974), o virtuosismo se torna evidente quando o corpo do sujeito apresenta uma técnica corporal8 capaz de diferenciar a sua organização e estrutura somática daquelas empreendidas pelo corpo cotidiano. Nas danças brasileiras, ele se dá, portanto, na medida em que é exigido do dançante o domínio de qualidades, capacidades e/ou habilidades 8 Ao abordar o termo “técnicas corporais”, o faço mediante a leitura e interpretação da noção desenvolvida por Marcel Mauss em seus estudos sobre o corpo nas práticas cotidianas e extracotidianas. Nesses termos, refiro-me a técnicas não como um tipo único e exclusivo de treinamento, mas como modos bem distintos de organização do corpo para se alcançar a qualidade do movimento que cada dança pede. Como exemplo, penso nas qualidades do corpo musical para se alcançar o movimento de pulsação na congada, na força exigida para realização do maracatu, na ginga e sinuosidade para se jogar a capoeira, no giro intermitente das coureiras no tambor de crioula, na flexibilidade articular dos passistas de frevo, e assim por diante.
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específicas de uma determinada manifestação cultural, como a resistência física, a destreza e desenvoltura corporais e vocais, a fluência, a rítmica (corporal ou musical), as oralidades, etc. O virtuosismo também está associado às formas como os sujeitos organizam suas memórias corporais e as colocam para o olhar do outro. De acordo com Armindo Bião (2007), em seus estudos sobre a Etnocenologia, isso se refere à capacidade de criar, instaurar e compartilhar estados alterados de corpo e consciência, colocando-se de modo mais ou menos espetacular para o olhar do outro em uma incessante busca de superação dos seus limites (físicos, emotivos, psicológicos) e de sua capacidade de desempenho durante a ação improvisada. Para Oliveira (2006), o virtuosismo está associado à capacidade que o dançante/brincante tem de colocar em evidência o seu movimento, a sua musicalidade, a sua vocalidade e a sua atuação, demonstrando o alto nível de qualidade corporal durante a realização do ritual/da festa, independentemente da dificuldade que possa existir para a sua execução. Nessa perspectiva, um dançante/brincante virtuose busca sempre a excelência na realização daquilo que se propõe. Em relação à eficácia, os pensamentos de Marcel Mausse e Richard Schechner são distintos e complementares em suas observações. Enquanto Mauss (1974) a compreende como uma capacidade de organização das técnicas corporais para que sejam empregadas exclusivamente quando necessárias, retardando, inibindo e conservando os movimentos em relação à emoção avassaladora do momento do acontecimento; para Schechner (2003), a eficácia se refere à capacidade de se alcançar o efeito desejado durante a ação performativa, cumprindo com o mais alto grau de satisfação e rendimento todos os padrões corporais, estéticos, éticos esperados para a execução da ação. Em ambas as perspectivas, o corpo eficaz é aquele que realiza as suas ações sem desperdícios e sem uso desnecessário de sua técnica. Um sujeito eficaz possui habilidades suficientes para saber dosar o uso de suas capacidades e qualidades corporais a fim de alcançar e ultrapassar as expectativas construídas sobre sua ação. Quanto maior a consciência do sujeito no uso de suas técnicas e no emprego de seu virtuosismo, maior a capacidade de tornar a sua ação eficaz e, com isso, distinguir-se dos demais sujeitos, tornando-se um bom executante. 23
A eficácia está assim relacionada ao rendimento do sujeito na sua ação, objetivando alcançar os resultados esperados e ultrapassar os limites com base na virtuosidade do dançante/brincante. Nas danças brasileiras, a eficácia está associada às condições técnicas que o corpo tem de alcançar as qualidades requeridas em cada manifestação cultural e em cada tipo de dança. Corroboro com Oliveira (2006) quando aponta, em seu estudo sobre o Cavalo-Marinho, a eficácia como o elemento preponderante para a construção e comunicação plena dos códigos estipulados pela expressão cultural. Assim, o papel da eficácia está em possibilitar que os símbolos e signos impressos pela manifestação cultural possam resultar em uma apreensão consciente (por aquele que observa) de seus saberes-fazeres. De acordo com Turner (1974), as mensagens simbólicas emitidas pelos sujeitos de uma dada manifestação estão fundamentadas nos elementos que constituem a própria consciência que eles têm dessa manifestação. Entendo que o virtuosismo e a eficácia não se opõem à espontaneidade dos dançantes/brincantes e, desse modo, são preponderantes para que aconteça a improvisação nas diversas danças brasileiras. A liberdade improvisacional, aliada à virtuosidade e à eficácia, conduz o improvisador ao seu limite e, assim, ele se torna capaz de recriar, transcriar e retroalimentar a própria manifestação e seus códigos. Ainda que algumas manifestações culturais possam apresentar estruturas mais codificadas que outras, não há inviabilidade para a existência e produção do improviso e a permanência mais ou menos efetiva do caráter de liberdade improvisacional nas danças brasileiras. Assim, é possível afirmar que o dançar/jogar/improvisar é um conjunto inseparável e indivisível das formas de organização das manifestações culturais brasileiras, sendo elemento constituinte das estruturas de produção das diversas danças e dos vários corpos em movimento pelo Brasil afora. DA IMPROVISAÇÃO NAS DANÇAS BRASILEIRAS À COMPOSIÇÃO EM TEMPO REAL NAS DANÇAS CONTEMPORÂNEAS:POÉTICAS DA ENCRUZILHADA Como já afirmei, dançar/jogar/improvisar nas danças brasileiras é uma forma de se “colocar na roda”. Nessa roda, a liberdade improvisacional deve ser vista como uma possibilidade de construção de significados 24
corporificados com base no repertório dos sujeitos que delas participam e de suas coletividades. É exatamente nesse contexto que a vivência/experiência se coloca como operadora para a construção de sentidos pelo corpo dos dançantes/brincantes; afinal, acredito que a experiência/sentido9, como proposta por Jorge Larrosa Bondia (2014), constrói-se nos atravessamentos e impregnações que se dão no corpo e pelo corpo. As experiências vivenciadas nas manifestações culturais brasileiras, especialmente o congado, as folias de reis e a capoeira, foram fundamentais para a organização da minha corporalidade. Parto do pressuposto de que o contato e o relacionamento com essas manifestações e as diversas dinâmicas corporais delas provenientes possibilitaram a constituição de um repertório corporal baseado em complexos processos de significação e ressignificação dessas experiências, deixando no corpo marcas que são constantemente atravessadas (indivisível e simultaneamente) pelas várias técnicas corporais apreendidas nas inúmeras práticas cotidianas e extracotidianas, tanto na arte como na vida ordinária. Nesse contexto, a relação que estabeleço com a improvisação é reflexo desse repertório de memórias corporificadas pela experiência com as danças brasileiras. Assim, é nítido que a maneira como me movo, as decisões que tomo, as direções que aponto, os discursos/enunciados que apresento e as estruturas que utilizo no momento em que danço estão diretamente ligados às experiências subjetivas, metafóricas e sensório-motoras corporificadas nesse universo. Desde a relação estabelecida com as danças brasileiras até o contato com outras linguagens da dança (especialmente as danças contemporâneas), a improvisação esteve como lugar de investigação, organização, produção e criação artística e pedagógica, seja nos processos de preparação de atores e dançarinos, seja nos processos de elaboração estética de personagens e/ou 9 O autor propõe pensar o par experiência/sentido como elemento fundamental para o processo educacional. O autor faz a seguinte afirmação em relação à sua ideia de experiência: “A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que se passa, não o que acontece, ou o que toca. A cada dia se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos acontece. Dir-se-ia que tudo o que passa está organizado para que nada nos aconteça. Walter Benjamin, em um texto célebre, já observava a pobreza de experiências que caracteriza o nosso mundo. Nunca se passaram tantas coisas, mas a experiência é cada vez mais rara” (LARROSA, 2014, p. 18).
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espetáculos. Contudo, somente no ano de 2011, após o ingresso como docente na Universidade Federal de Uberlândia, é que pude ter o contato, por meio do Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço, com a improvisação e com a composição em tempo real como elementos constituintes do espetáculo. Nessa direção, o encontro com o grupo de pesquisa e, consequentemente, o mergulho no universo da improvisação em Dança Contemporânea foram atravessamentos marcantes e fundamentais tanto para a compreensão dos processos formativos impregnados no meu corpo dançante como para o entendimento do meu repertório. Quando se entrecruzam as experiências da improvisação nas danças brasileiras, as memórias corporificadas e as práticas e processos criativos da improvisação na relação com o grupo de pesquisa, o meu lugar de improvisador e intérprete-criador emerge em uma forma muito peculiar de lidar com os processos de composição em tempo real10. Em se tratando dos processos criativos na composição em tempo real, concordo com o seguinte apontamento de Ana Carolina Mundim (2012, p. 105): Criar a cena em tempo real não significa partir de “lugar algum”. De seus laboratórios corporais, os intérpretes-criadores reúnem vocabulário, repertório, possibilidade de estados corporais e uso do espaço e tempo que servirão de referencial para a improvisação a ser realizada em cena. A composição em tempo real exige do intérprete-criador, além de um domínio de seu próprio corpo, uma potencialização das relações coletivas e das ferramentas de composição, uma atitude de realizar escolhas e a confiança nas decisões tomadas. Conectar-se com o entorno, dialogar com as propostas por ele oferecidas (sons, gestos, lugares, situações, etc.) e perceber o outro (artista ou espectador) com a inteireza de um corpo que sabe posicionar-se mediante as ocorrências da vida tornam o intérprete-criador uma escritura poética em movimento. 10 Segundo Mundim (2012, p. 105), “A composição em tempo real exige do intérpretecriador, além de um domínio de seu próprio corpo, uma potencialização das relações coletivas e de ferramentas de composição, uma atitude de realizar escolhas e a confiança nas decisões tomadas. Conectar-se com o entorno, dialogar com as propostas por ele oferecidas (sons, gestos, lugares, situações, etc.) e perceber o outro (artista ou espectador) com a inteireza de um corpo que sabe posicionar-se mediante as ocorrências da vida tornam o intérprete-criador uma escritura poética em movimento”.
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Nos procedimentos de trabalho do grupo de pesquisa há, baseada na relação com a improvisação, a construção de um lugar de convívio afetivo que se aproxima dos modos-de-fazer das festas populares brasileiras. Existe nesses dois universos, por exemplo, um intenso e respeitoso processo de negociação entre as individualidades e a coletividade, a fim de se construir uma prática coletiva capaz de dar conta da complexidade do discurso e de sua emissão, seja ele corporal ou oral. Outra semelhança se encontra nos modos de se relacionar, pois ambos priorizam as formas mais horizontalizadas de cooperação entre os sujeitos, garantindo que as hierarquias (sim, elas existem e dialogam todo o tempo com as várias vozes dos sujeitos implicados na experiência do convívio em grupo) funcionem de forma menos rígidas e formais, sendo assim mais maleáveis e dinâmicas. Sobre o modo de trabalho do grupo de pesquisa, Mundim (2012, p. 114) diz: O lugar de convívio afetivo é um exercício constante de potencialização das afinidades e de reconhecimento dos distanciamentos, de negociação dos distintos estados e de respeito aos diferentes humores. É o lugar de preservação das diferenças com respeito, cuidado e diálogo. É o lugar onde as vaidades e as verdades absolutas precisam ser diluídas em prol de um universo coletivo. Isso não significa deixar de se posicionar, de discutir, de argumentar. Significa compreender que cada um é sujeito que não se encerra em si. Portanto, é o lugar de onde o ‘eu’ só existe na percepção do ‘outro’.
A minha relação com a composição em tempo real proposta pelo grupo de pesquisa teve um início conturbado. A princípio, estava acostumado a lidar com o modo quase estruturado do momento em que ocorre o improviso nas danças brasileiras (apesar de cada improvisador e cada momento de improvisação serem e se colocarem distinta e sobrepostamente como uma nova e efêmera forma de lidar com os símbolos e significados da manifestação cultural), sendo essa a tônica de todo o processo criativo que vivenciava ou desenvolvia. No contato com a improvisação e composição em tempo real nas danças contemporâneas, tive que me colocar decididamente em uma relação aberta com o outro, em um processo de negociação em que há uma liberdade tão grande para se exercer a sua dança, mas ao mesmo tempo limitado pela proposição que o outro traz para o jogo e pela forma como ele ocupa o espaço em relação à cena, e isso se tornou um imenso nó a ser desatado. 27
Compreendi que esses nós eram causados pela instabilidade dos conceitos e ideias sobre improvisação que eu trazia de modo bastante enrijecido e fixado na minha corporalidade; e que desatá-los seria um exercício de revisão desses conceitos e uma incansável reorganização epistêmica e ontológica do modo como eu via a improvisação. Gradativamente, percebi que os pontos de contato entre as dinâmicas corporais das danças brasileiras e os exercícios técnico-criativos desenvolvidos pelo grupo se davam exclusivamente pela abertura e engajamento do corpo na relação com o movimento. Assim, acionando metáforas, sensações, lugares, percepções, imagens, sonoridades e oralidades, fui construindo um vocabulário entremeado pelas memórias corporificadas com base nas danças brasileiras e suas nuances de movimento, bem como pelo novo vocabulário corporal desenvolvido nos exercícios técnico-criativos em improvisação, em uma relação profunda de entrega aos laboratórios propostos pelo grupo. As qualidades corporais apreendidas dos elementos da improvisação nas danças brasileiras permanecem como base no corpo-memória. Dentre os elementos trabalhados, alguns foram fundamentais para a minha experiência, como a ludicidade, a virtuosidade, a eficácia e a integralidade/indissociação entre movimento, musicalidade e oralidade, pois até hoje perpassam os processos e práticas que vivencio ao dançar, independentemente do contexto em que eu esteja ou da linguagem estético-artística escolhida. O reconhecimento dessas qualidades e o estudo desses elementos como materiais criativos passaram a ser fundamentais para a construção, organização e representação de um corpo vivo no ato da própria composição em tempo real. Assim, entendo que os laboratórios de experimentação e criação do grupo de pesquisa foram importantes para a construção de um “saber encarnado” em relação aos procedimentos artísticos na interface entre as danças populares e as danças contemporâneas, seja na improvisação e composição em tempo real, seja nas demais formas de expressão que delas emergem. O que percebo é que a relação entre as danças brasileiras e a composição em tempo real apresenta características que vão além do processo de interlocução entre os conceitos, procedimentos ou modos de se fazer da improvisação. Para artistas que se lançam a experienciar essa prática, a relação se constitui como a base para a produção de uma poética 28
do corpo, que se estabelece na encruzilhada traçada pelo encontro dessas duas perspectivas (danças brasileiras e danças contemporâneas). Esse é um dos apontamentos que fundamentam a proposição de elaboração da metáfora corpo-encruzilhada11. Entendo a encruzilhada como o espaço tangencial, o lócus operacional do atravessamento de duas ou mais vias de acesso. A encruzilhada ocorre no ponto nodal, o ponto de encontro ou ponto de interseção entre essas vias. Quando me refiro ao corpo-encruzilhada, o faço com base na elaboração metafórica que propõe um deslocamento de atenção para o corpo-espaço como ponto nodal de encontro de vias distintas, como a memória, a performatividade, o repertório etc. Aqui, podemos pensar que o ponto nodal da improvisação nessas distintas vias de saberes-fazeres se dá no corpo-encruzilhada. Operacionalizar os elementos da composição em tempo real nessa encruzilhada é, sobretudo, ativar as qualidades, mecanismos, sensações e percepções do repertório desse corpo-memória, permitindo vivenciar o instante presente do dançar/jogar/improvisar e, nesse fluxo, criar situações, imagens, emoções e relações capazes de articular e materializar um discurso poético em uma dimensão coletiva. Penso a poética como elemento estético capaz de gerar reações emotivas, sensitivas, afetivas e críticas a um sistema de significação e expressão, recriando e transcriando novas maneiras de se colocar no mundo (JAKOBSON, 2003; CAMPOS, 1975). Nessa perspectiva, entendo que a poética do corpo é elemento capaz de criar deslocamentos, fricções, reversões e desestabilizações nos procedimentos de leitura estética do mundo, tanto mais quando se associa a este os processos de interlocução entre as dinâmicas corporais e repertórios incorporados do corpo-encruzilhada e, no contexto deste texto, as qualidades estéticas da relação entre danças brasileiras e composição em tempo real. 11 Esse termo/conceito foi elaborado na construção da minha tese de doutoramento em artes cênicas pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – Unirio. Para maiores informações sobre o assunto, consulte a seguinte referência: RAMOS, Jarbas Siqueira. Questões epistemológicas sobre o corpo-encruzilhada. Disponível em: <http://portalabrace.org/viiicongresso/resumos/ jornada/RAMOS%20Jarbas%20Siqueira.pdf>. Acesso em: 14 set. 2016.
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Refletindo sobre essa relação na prática artística, percebo que a composição em tempo real acontece com a presentificação desse corpomemória, desses repertórios, dessas encruzilhadas, acionados por um dançar/jogar/improvisar que traz à tona uma relação de vivacidade, ludicidade, afetividade e de prazer na conexão estabelecida entre os improvisadores (intérpretes-criadores) e entre estes e o público, construindo no aqui-agora uma poesia em movimento. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como disse no início do texto, a minha intenção não foi criar generalizações sobre a prática artística da improvisação e suas inúmeras possibilidades de atuação tanto nas danças brasileiras como nas danças contemporâneas. O objetivo foi o de refletir sobre o imbricamento, atravessamento, encruzilhada entre os dois campos da Dança acima especificados, tendo como ponto de partida a minha experiência nesses dois universos e como ponto central de análise a improvisação e a composição em tempo real. Nesse contexto, quatro questões surgiram como condições necessárias para a produção dessa reflexão: 1) a necessidade de se estabelecer um deslocamento epistemológico que produza novas formas de olhar/pensar/dizer as danças brasileiras no contexto do campo da Dança; 2) o entendimento de que nas danças brasileiras o processo de dançar/jogar/improvisar é um todo indivisível e inseparável e que se constitui à medida que os sujeitos se colocam na relação com o outro; 3) não há um único modo de se dançar/jogar/ improvisar, pois essa relação é estabelecida conforme a experiência de corpo-vida de cada sujeito; 4) os processos de imbricamentos, atravessamentos e encruzilhadas, que surgem na improvisação com base na relação entre as danças brasileiras e as danças contemporâneas, são reflexos dos modos como cada sujeito constrói sua poética ao dançar/jogar/improvisar. Pensar a relação do dançar/jogar/improvisar como uma dimensão poética, ética e estética, tanto coletiva como individual, é buscar uma compreensão da relação entre as danças brasileiras e as danças contemporâneas como uma possibilidade humana de expressão, criação, existência e resistência. Quando associada à improvisação e à composição em tempo real, a dimensão poética se coaduna com a dimensão política, 30
criando novas estruturas de produção de sentido e de organização do corpo em movimento no espaço. É nessa perspectiva que afirmo que a relação entre memória, repertório e presença é ponto fundamental para a construção de um discurso e de uma poética na improvisação, que só pode acontecer e ser acessada no momento do aqui-agora. Em se tratando da improvisação e da composição em tempo real, as experiências cênicas de criação e composição são, sempre, espaços de construção de discursos poéticos que permitem o deslocamento dos sentidos literais para os metafóricos por meio de traduções e transcriações que potencializam a relação entre o artista/improvisador/intérprete-criador e seu espectador. Ao entender essa dimensão da composição em tempo real, não é difícil compreender que a relação entre os discursos das danças brasileiras e das danças contemporâneas se faz, necessariamente, no corpo do sujeito que dança. O corpo é, assim, o ponto nodal dessa relação e dessa construção. Ele é o ponto nodal da encruzilhada. O corpo-encruzilhada. Ao me referir ao corpo-encruzilhada, termo/noção que tenho utilizado para elaborar uma reflexão sobre a dimensão do corpo no interstício entre as práticas rituais e a cena, busco acionar essa relação entre memória, repertório e presença na relação com o corpoespaço. Entendo, assim, que o corpoespaço-encruzilhada é o lócus tangencial em que convergem todos os elementos (o virtuosismo, a eficácia, a performatividade, as memórias incorporadas etc.) que compõem e definem o processo de dançar/jogar/ improvisar nas danças brasileiras e nas danças contemporâneas. Enfim, como todo e qualquer processo artístico, a construção desse lugar efêmero e instável da composição em tempo real nos convida a continuar refletindo, presentificando, sentindo, gerindo e construindo um percurso que não se encerra no fim da improvisação, pois o fim é sempre a possibilidade um novo começo. Concordo com Mundim (2012) quando diz que esses outros percursos traçados pelas ações dançadas na composição em tempo real são modos sutis de existir, insistir e coexistir. Assim, faço um convite para que possamos experienciar o dançar/ jogar/improvisar com base na interlocução entre as danças brasileiras e a composição em tempo real. Faço um convite para que nos permitamos olhar para as manifestações culturais brasileiras e compreendamos os atravessamentos e encruzilhadas que se dão no nosso corpo que dança. 31
Faço um convite para que nos coloquemos em uma prática artística afetiva e permitamos que a construção poética do nosso dançar seja uma forma de plantar e colher amor e poesia em forma de movimento. Quem topa? Vamos lá? REFERÊNCIAS BIÃO, Armindo Jorge de Carvalho (Org.). Artes do corpo e do espetáculo: questões de etnocenologia. Salvador: P&A, 2007. CAILLOIS, Roger. O jogo e os homens: a máscara e a vertigem. Trad. José Garcez Palha. Lisboa: Cotovia, 1990. CAMPOS, Haroldo de. A arte no horizonte do provável e outros ensaios. 3ª ed. São Paulo: Perspectiva, 1975. DOMENICI, Eloísa. A pesquisa das danças populares brasileiras: questões epistemológicas para as artes cênicas. In: Cadernos do GIPE-CIT. Universidade Federal da Bahia – UFBA, Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas. Nº 23. Salvador: UFBA/PPGAC, 2009. HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. Trad. João Paulo Monteiro. São Paulo: Perspectiva, 2007. JAKOBSON, Roman. Linguística e comunicação. 19ª ed. Trad. Isidro Blikstein e José Paulo Paes. São Paulo: Cultrix, 2003. LARROSA, Jorge. Tremores: escritos sobre experiência. Trad. Cristina Antunes, João Wanderley Geraldi. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2014. LIGIÉRO, Zeca. Corpo a corpo: estudo das performances brasileiras. Rio de Janeiro: Garamond, 2011. MAUSS, Marcel. Sociologia e Antropologia. Trad. Lamberto Pulcinelli. São Paulo: EPU, 1974. MUNDIM, Ana Carolina (org.). Dramaturgia do corpo-espaço e territorialidade: uma experiência de pesquisa em dança contemporânea. Uberlândia: Composer, 2012. OLIVEIRA, Érico José Souza de. A roda do mundo gira: um olhar sobre o Cavalo Marinho Estrela de Outro (Condado-PE). Recife: SESC, 2006. 32
SHECHNER, Richard. O que é performance? In: Revista O Percevejo. Ano 11, nº 12. Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – Unirio. 2003. TURNER, Victor W. O processo ritual: estrutura e anti-estrutura. Trad. Nancy Campi de Castro. Petrópolis/RJ: Vozes, 1974. TYLOR, Diana. O arquivo e o repertório: performance e memória cultural nas Américas. Trad. Eliana Lourenço de Lima Reis. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013.
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INTERDISCIPLINARIDADES CRIATIVAS NA COMPOSIÇÃO EM DANÇA Mariane Araujo Vieira1
Introdução Criar sentidos, desfazê-los e construir outros. Estar em relação no entre, no espaço, no vazio e, assim, organizando desorganizações no fazer dançante, movimentando-se no fluxo de forças, criando composições. As relações entre o todo e as partes se juntam, se misturam e transformam uma outra unicidade. O corpo é afetado pela matéria dinâmica do mundo e responde com outros afetos, com outros mundos. Assim, a dança revela o invisível mais concreto que vibra e se transforma em movimento. Um corpo que vaza, troca sensações e se propaga. Para criar reflexões sobre esse corpo que dança e interage diretamente na e com a matéria será traçado, neste artigo, um paralelo entre a física do mundo microscópico e a dança, isto é, entre o micro e o macro, entre o comprovado e a experiência singular, entre verdades e possibilidades criativas e, por último, entre matéria e subjetividade. Mais do que criar interdisciplinaridade, este texto busca trazer, para o campo da Dança, o que é comprovado na Física em relação à natureza, ao ser humano e ao movimento, a fim de problematizar como isso influencia a construção do pensar-fazer criativo. Além disso, este trabalho não se propõe apenas a levantar análises sobre o mundo quântico, mas criar reflexões e apropriações entre o que é visto e o que não é visto – que se influenciam e se interconectam a todo instante. Neste texto, é possível perceber que as relações entre a Física Quântica e a Dança podem ser cada vez mais próximas e que o estudo das partículas influencia a forma de entender o mundo, mostrando que as conexões da matéria são mais integradas do que costumamos ver ou pensar. 1 Bailarina, formada em Dança pela Universidade Federal de Uberlândia, integrante grupo profissional de Dança Contemporânea Grupo Strondum e membro do Grupo de Composição em Tempo Real Conectivo Nozes, vinculado ao Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço. Este trabalho foi desenvolvido como pesquisa de monografia, apresentada no ano de 2016.
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A Física Quântica estuda as leis da natureza no plano microscópico, que não se aplica ao macro no sentido dos cálculos matemáticos e das medições físicas. Contudo, este trabalho utilizará as descobertas científicas como conceitos operatórios para pensar a composição na criação artística em Dança Contemporânea. Nesse sentido, não há a intenção de explicar a dança por meio da Física, pois a Dança é entendida como uma área do conhecimento autônoma; em vez disso, busca-se trazer e explorar conceitos da materialidade com os da subjetividade. Assim, a ideia de criar cruzamentos entre arte e ciência surge da necessidade de ampliar o olhar para as organizações criadas entre sujeito e ambiente pesquisado de diferentes perspectivas. Com uma análise histórica, baseada nos estudos de Sommerman (2006), é possível entender como a interdisciplinaridade entre as áreas de conhecimento foi se transformando ao longo dos séculos. Segundo esse autor, a partir do século XX, os campos do saber foram se fragmentando e criando barreiras por especialização e construção de disciplinas. Contudo, na antiguidade, o conhecimento era elaborado por estudiosos que pesquisavam várias áreas do conhecimento de uma forma mais globalizada e menos distintiva. As visões cosmológica, antropológica e epistemológica estavam imbricadas no conhecimento. Com o advento das universidades, por volta do século XVIII, a religião, a tradição, a filosofia e a ciência foram se tornando independentes. A ruptura desses saberes criou barreiras e separações entre as diferentes áreas, culminando na “disciplinaridade” do conhecimento. Nesse sentido, as disciplinas estabeleceram, ao longo dos séculos, algumas fronteiras, mas não perderam a capacidade de diálogo para renovar e expandir o conhecimento. É com essa tentativa de ampliar, tornar-se pluri e explorar novas formas de saberes sobre o corpo e a criação artística que será proposta a interdisciplinaridade entre duas áreas que normalmente são vistas de modo separado. Um dos principais motivos para escolher a Física Quântica é o fato de essa área começar a estruturar uma maneira diferente de compreender a vida e suas organizações, defendendo que não é mais possível perceber o mundo apenas de forma lógica, racional e linear: a realidade não é apenas aquilo que é visto, então é preciso elaborar uma nova maneira de pensar e perceber o mundo. Além disso, as pesquisas em quântica comprovam que a 35
essência da matéria está nas interconexões, que tudo está relacionado. Outro ponto importante que a Física Moderna2 discute, é que não há certezas prontas e determinadas, apenas verdades relativas e probabilidades que influenciam a forma de entender a matéria e as leis da natureza. Assim, a Física Moderna não trabalha apenas na descrição de fenômenos, mas também cria percepções fora do imaginário comum e cotidiano do ser humano. Além disso, esse ramo da ciência extrapola conexões entre o sujeito, o objeto e o espaço-tempo. No campo da Dança, essas interações serão pensadas e analisadas na perspectiva do ato compositivo em dança realizado pelo bailarino3 em cena. Isso significa problematizar as formas de organização e criação de quem dança na interação com o meio em tempo real. Dessa forma, há o interesse de olhar para o bailarino como sujeito autônomo e produtor de subjetividades, que influencia e recria o meio em que se coloca, bem como é transformado por este. Na Dança Contemporânea, a composição em tempo real foi ganhando espaço por meio de bailarinos(as) e pesquisadores(as) que começaram a demonstrar, a partir da década de 1940, o interesse pela improvisação, pelo contato-improvisação, pelos estudos da educação somática e pela performance. O interesse de repensar a atuação do bailarino em cena e o questionamento dos processos de criação muito formatados e da disciplinarização e docilização do corpo com técnicas sistematizadas foram os principais aspectos que viabilizaram novas formas de pensar-fazer dança (SILVA, 2005, p.105). A liberdade que o bailarino tem na criação possibilita composições singulares intrincadas na subjetividade do indivíduo histórico-social. Isso significa que o bailarino precisa desenvolver habilidades de escuta do próprio corpo, do outro e dos objetos no instante da composição: 2 No início no século XX, surgiram diversas descobertas na Física, que passou então a ser chamada de Física Moderna, diferente da Física Clássica baseada nos princípios de Newton. Na Física Moderna, teorias importantes como as da física quântica, da relatividade geral, do caos, da geometria dos fractais, dos campos e diversas outras transformaram o que havia de mais concreto e determinado no mundo físico. 3 O termo bailarino/dançarino não é entendido somente como um repetidor de passos, mas também como um sujeito que tem autonomia sobre os processos de criação.
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Na dança, a improvisação é uma abordagem que desenvolve o corpo responsivo e inteligente, para resolver a questão da composição rapidamente. Contrariamente ao mito de que a improvisação é espontaneidade, esse corpo inteligente seleciona e resolve situações de improvisação eficazmente; portanto, é um processo altamente consciente e rigoroso de criação no momento (MUNIZ, 2004, p. 78 apud MARTINS et al., 2010, p.70).
Para que o estudo da composição em tempo real em dança e a Física se aproximem de forma mais integrada e sejam melhor explorados, serão definidos os principais aspectos descobertos sobre as partículas elementares que influenciam a forma como entendemos a matéria, entre eles: a dualidade onda-partícula, o princípio da incerteza de Heisenberg, a teoria da complementaridade de Bohr e a teoria dos multiversos.
Sobre o mundo microscópico Figura 1 – Colisões de alta energia de partículas subatômicas
Fonte: RODRIGUES, 2013.
As inter-relações que o corpo produz na criação em dança têm como um dos princípios a compreensão de que o corpo se dá em relação com o ambiente, sendo este uma integração dinâmica entre matéria, linguagem, percepções, fluxo e outros. Ambos os campos (ser humano e meio) estão interconectados de forma a gerar modificações entre si, no contexto em que 37
essas interações são estabelecidas. A Física Quântica descreve, de forma analítica e teórica, como esse processo acontece, por meio da definição das partículas subatômicas e suas interações. Além disso, o estudo quântico questiona a realidade estável, linear e previsível e cria um novo olhar do estudo do caos, da probabilidade e das incertezas que influenciam a forma como percebemos o corpo em relação ao real. Os princípios da estruturação da Física Quântica e outras teorias contemporâneas da Física questionam a era do pensamento iniciada pelo filósofo René Descartes (1596-1650), que apresenta teorias e entendimentos de mundo que mecanizam o corpo e as leis que regem a natureza. Descartes predominou de forma ampla e duradoura a partir do século XVII, e, no campo da Física, essa influência culminou nas teorias de um dos mais reconhecidos físicos da história, Isaac Newton (1643-1727), que transformou a forma como é entendida a natureza atualmente. A predominância do pensamento de Descartes em muitas áreas do conhecimento privilegiou o entendimento da natureza como uma máquina perfeita e liderada por leis matemáticas exatas. Esse pensamento foi a estrutura conceitual para a ciência do século XVII, testada e “comprovada” em experimentos feitos por Newton. Dessa forma, o pensamento mecanicista transformou a forma como a natureza é entendida, priorizando a quantificação e a exatidão das leis que regem a sociedade ocidental. O universo, e assim também o corpo, seria uma máquina como um relógio, que é passível de leituras lógicas e que pode “estragar” ou “ser consertado”, longe de ser visto como uma estrutura viva e complexa. Segundo Capra (2005, p. 46), A divisão cartesiana entre matéria e mente teve um efeito profundo sobre o pensamento ocidental. Ela nos ensinou a conhecermos a nós mesmos como egos isolados existentes “dentro” dos nossos corpos; levounos a atribuir ao trabalho mental um valor superior ao do trabalho manual; habilitou indústrias gigantescas a venderem produtos — especialmente para as mulheres — que nos proporcionem o “corpo ideal”; impediu os médicos de considerarem seriamente a dimensão psicológica das doenças e os psicoterapeutas de lidarem com o corpo de seus pacientes.
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Por meio desse entendimento, com as teorias que surgiram após Max Planck (1858-1947), sobre a organização do átomo, e Albert Einstein (1879-1955), sobre a relatividade e o desenvolvimento da Física Quântica, no início do século XX, os físicos e cientistas começaram a duvidar dos princípios mecânicos e exatos, produzindo, assim, uma nova era do pensamento científico e filosófico. Os principais fundamentos questionados da física newtoniana, chamados de Principia, foram as ideias de espaço e tempo absolutos (entendidos de forma separada e independente, além de estáveis e imóveis), a noção do átomo como um elemento duro e sólido e também do movimento das partículas materiais, gerado pela gravidade e que explicava os fenômenos da natureza. Além disso, a Física Moderna questiona a previsibilidade de um experimento em sua totalidade, pois os fenômenos da natureza se davam de forma determinada no entendimento da Física Clássica. Como afirma Eisberg (1979, p. 97): “Na física clássica as leis básicas são determinísticas [...] no entanto, a interpretação probabilística é fundamental em mecânica quântica, e deve-se abandonar o determinismo”. As descobertas da Física Quântica ultrapassam quase um século de revelações, compilações e reestruturações, e hoje é possível perceber que a quântica é mais usada no desenvolvimento das tecnologias do que normalmente se pensa. Exemplos disso são o computador, o projetor e as tecnologias atuais, que foram produzidos por meio das descobertas da Física Moderna. O desenvolvimento dessa área provocou tanta mudança na concepção da forma como o ser humano entende o mundo que, muitas vezes, a Física Quântica é mal interpretada e entendida como algo extraordinário, sem explicações, totalmente subjetivo. Esse entendimento dificulta inclusive o ensino dos princípios da Física Moderna nas escolas, o que faz com que os conceitos clássicos sejam priorizados. As primeiras teorias a contestarem esse entendimento newtoniano tratavam das forças magnéticas e elétricas, denominadas campos de força. Essas teorias foram propostas por Michael Faraday e completadas por Clerk Maxwell (CAPRA, 2006, p. 65). Em outra área da ciência, foram apresentadas as teorias da evolução de Jean-Baptiste Lamarck e Darwin, que mostraram que os princípios mecânicos de Newton e de Descartes eram 39
muito primitivos para explicar a complexidade de relações micro e macro dos fenômenos da natureza4. A mudança da Física Clássica para a Física Moderna foi marcada pelos estudos desenvolvidos por Max Plank (1858–1947) com o espectro da luz, em um experimento chamado de radiação do corpo negro. Nele, esse cientista mostrou que a energia luminosa é irradiada em pacotes individuais de energia, chamados quanta. Esses grãos de energia são proporcionais à cor da luz (assim, a luz vermelha tem menos quantidade de quanta do que a luz azul ou ultravioleta), dessa maneira, a energia depende da frequência da luz. Einstein se apropriou desses estudos em 1905 e transformou toda a forma de pensar a física nos séculos XX e XXI. Além dos estudos desenvolvidos sobre as partículas subatômicas, Einstein criou a teoria da relatividade especial, que determina que o espaço não é tridimensional (relação entre altura, largura e profundidade), mas sim quadridimensional, sendo o tempo um aspecto determinante, assim como o espaço, que influencia a matéria. Na Física Quântica, Einstein denominou os pacotes de energias – antes chamados de quantum por Planck – fótons. Ele observou que os fótons se propagavam como ondas e que essa propriedade nos eventos fotoelétricos ocorria de forma análoga nos experimentos com estruturas atômicas de uma porção de matéria. Em 1923, Comptom comprovou a natureza corpuscular da radiação, importante descoberta que culminou na teoria de Maurice de Broglie, no ano seguinte: A necessidade da hipótese do fóton, ou partícula localizada, para interpretar processos que envolvem a interação da radiação com a matéria é clara, mas ao mesmo tempo é necessária uma teoria ondulatória da radiação para explicar os fenômenos de interferência e difração. A ideia de que a radiação não é um fenômeno puramente ondulatório nem meramente um feixe de partículas deve, portanto, ser levado [sic] a sério (EISBERG, 1979, p. 66).
4 Para entender melhor como essas teorias foram contestadas, consulte O ponto de mutação, de Fritjof Capra (2005).
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Broglie tinha uma hipótese de que, assim como a radiação tinha um comportamento dual, isto é onda-partícula5, a matéria também tinha essa propriedade. Dessa forma, a matéria apresentaria características de partícula (entidade confinada a um volume minúsculo) ao mesmo tempo em que apresenta características de onda (prolonga-se por uma região do espaço). Essa hipótese foi comprovada em 1927 por G. P. Thomson. A consequência dessa descoberta alterou o conceito da realidade da matéria, que Capra explica assim: No nível subatômico, não se pode dizer que a matéria exista com certeza em lugares definidos; diz-se, antes, que ela apresenta “tendências de existir”, e que os eventos atômicos não ocorrem com certeza em instantes definidos e numa direção definida, mas, sim, que apresentam tendências de ocorrer (CAPRA, 2005, p. 58).
Para que esses entendimentos paradoxais sobre a partícula de aspecto dual fiquem mais claros, é necessário entender a estrutura de um átomo. Antes, na Física Clássica, o átomo era uma estrutura estável, dura, indivisível. Rutherford (1871-1937), que estabeleceu a teoria da radioatividade, percebeu que os átomos eram enormes regiões do espaço em que os elétrons, minúsculas partículas, moviam-se em volta do núcleo (Figura 2). Figura 2 – Modelo atômico de Rutheford
Fonte: AGUILERA, 2006.
5 Uma especulação imagética desse fenômeno da matéria é feita por cálculos matemáticos e reproduzida em computador.
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Esse modelo descoberto foi denominado sistema planetário, em que os elétrons de carga negativa se moviam em órbitas circulares ao redor do núcleo carregado positivamente. O átomo, nesse sentido, é 10.000 vezes maior que seu núcleo; em proporções equivalentes. Se o envoltório do átomo, formado por elétrons, fosse do tamanho do Maracanã, o núcleo seria do tamanho de uma ervilha e os elétrons do tamanho de grãos de poeira girando em altíssima velocidade. Bohr (1885-1962) se apropriou do modelo de Rutherford para definir que os elétrons não circulam de forma aleatória em torno do núcleo, mas têm camadas de energia definidas, sendo a camada com menos energia mais próxima do núcleo e a com mais energia mais distante do núcleo. Figura 3 – Modelo atômico de Bohr
Fonte: A EVOLUÇÃO..., s/d.
Atualmente, o modelo de Bohr foi ultrapassado pelo modelo contemporâneo, que teve influência de Erwin Schrödinger (1887–1961), Louis de Broglie (1892-1987), Heisenberg (1901-1976) e Paul Dirac (19021984). Nesse modelo (Figura 4), o átomo é dual (ora partícula, ora onda), não tem órbitas definidas e segue o princípio da incerteza (explicado nos parágrafos seguintes). Assim, o átomo é constituído pelo núcleo e pela nuvem eletrônica (na qual é incerta a possibilidade de encontrar um elétron em um local determinado).
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Figura 4 – Modelo atômico atual
Fonte: DORTE, 2015.
Apesar de o modelo de Bohr ter sido ultrapassado, ele conseguiu desenvolver, em 1927, a teoria da complementaridade, que explica que a característica dual do átomo ocorre de forma complementar, assim, “se uma medida prova o caráter ondulatório da radiação ou da matéria, então é impossível provar o caráter corpuscular na mesma medida, e viceversa” (EISBERG, 1979, p. 95). Isso significa que ambas são identificáveis separadamente dependendo do que é mensurado, mas as duas são propriedades intrínsecas do elemento; o fato de observar ou medir é que define a propriedade da partícula. Assim, em um determinado experimento o átomo se apresenta de forma ondulatória, e, em um outro tipo de experimento, o átomo se mostra em forma de partícula. Na mesma década de Bohr, Werner Heisenberg e Erwin Schrödinger postularam o princípio da incerteza, que explica e comprova dois aspectos com leis matemáticas: a impossibilidade de localizar a posição da partícula e encontrar o momentum6 de forma exata em uma mesma medição – assim, ou se encontra a posição ou o momentum. Outro aspecto é o fato de que tentar medir a partícula modifica/perturba o que é observado. Segue um exemplo dessa última propriedade: Para ver um elétron precisamos iluminá-lo, pois é na verdade o fóton de luz espalhado pelo elétron que é visto pelo observador. Já aqui, mesmo antes de qualquer cálculo surge o princípio da incerteza. Só o ato de observarmos o elétron o perturba. No instante 6 Uma quantidade definida como a massa da partícula multiplicada por sua velocidade (CAPRA, 2005, p. 110).
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que iluminamos o elétron, ele recua [...] de uma forma que [...] não pode ser completamente determinada. Se não iluminarmos o elétron, entretanto, não seremos capazes de vê-lo (detectá-lo). Portanto o princípio da incerteza [...] expressa o fato de que sempre existe uma interação não determinável entre o observador e o que é observado (EISBERG, 1979, p. 100).
Se não é possível determinar a localização exata, mas probabilidades dessa localização, como a matéria é palpável? Muitas teorias estão sendo pensadas para resolver essa questão, mas ainda não há metáforas que deem explicações claras para esse fenômeno, apenas cálculos matemáticos. É possível, entretanto, analisar que “todas as coisas e todos os momentos tocam uns nos outros em todos os pontos, a unidade do sistema completo é suprema” (ZOAR, 1990, p.19). Dessa forma, as probabilidades do nível subatômico não são probabilidades de coisas, mas sim de interconexões que, segundo Capra (2005), formam redes de conexões em que não é possível entender elementos separados e independentes. Em sua estrutura atômica, os elementos são apreendidos por suas interconexões: “À medida que penetramos na matéria, a natureza não nos mostra quaisquer ‘blocos básicos de construção’ isolados. Ao contrário, surge perante nós como uma complicada teia de relações entre as diversas partes do todo” (CAPRA, 2005, p. 58).
Conexões entre partículas e a composição em Dança Contemporânea No campo da Dança Contemporânea, há diferentes caminhos artísticos de composição e experimentação que impossibilitam uma definição estática e única desse termo. Por meio de um levantamento teórico de pesquisas em Dança, é possível afirmar que para muitos dos autores a relação entre corpo, movimento e cena sempre está presente. Essas relações são traçadas de formas singulares, no sentido de estarem relacionadas com o sujeito e o contexto em que acontece a criação. Essas produções em Dança Contemporânea são diversas e envolvem diferentes técnicas, métodos e filosofias que começaram a se desenvolver a partir da década de 50, com o movimento pós-moderno. Nesse sentido, é possível elencar, na história ocidental da Dança, personalidades como Anna Halprin, Merce Cunningham, Yvonne Rainer, Steve Paxton, Pina Bausch e 44
outros (GIL, 2004, p. 146), que extrapolavam e/ou questionavam técnicas definidas, como o balé clássico e a Dança Moderna, e criavam uma outra forma de dançar e se movimentar em cena. Com essas transformações, as pesquisas em Dança começaram a olhar para o corpo e para a composição de uma forma mais crítica e singular. Por meio desse pensar-fazer na Dança Contemporânea, com o intuito de aprofundar os estudos da quântica em relação às pesquisas de composição, esse texto prioriza a ideia da composição que se dá em tempo real, ou seja, trabalhos artísticos que demandam do bailarino autonomia de escolha durante a apresentação do espetáculo. Essa perspectiva favorece a visualização de como a composição é pensada de forma instantânea com os acontecimentos, além de ser possível problematizar como ela é modificada no espaço-tempo, como a materialidade se forma, como os sentidos são criados, assim como outras discussões e reflexões que serão traçadas ao longo do texto relacionadas com os estudos da Física. O que já está dado na matéria se modifica de forma poética a cada intervenção e interação singular realizada pelo bailarino. O corpo não só cria, mas transforma e é transformado em composição. Como indica Susan Buirge no texto de Laurence Louppe (2012, p.224): “O todo não é a soma das partes: o todo de uma composição reside no que, a cada momento e em cada articulação, trabalha e perturba o conjunto.” As redes de sentidos criadas na composição são traçadas por esse sujeito que organiza e forma movimento em relação ao todo e cria novas redes de significados. É possível compreender, nesse sentido, que a composição é também uma forma de criar unidades, em que matéria e significados se dão conjuntamente na percepção do sujeito. Lidar com essas duas esferas formando uma única não significa homogeneizar, transformar em uma coisa só, mas sim criar relações de interdependência em que os sentidos não são criados sem a matéria e o inverso também não ocorre. Com base nisso, na composição em Dança Contemporânea que se dá no acontecimento da ação em cena sempre há elementos dinâmicos e instáveis, que se reorganizam a cada mudança provocada.
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Não há inscrição que não seja acompanhada de uma não-inscrição. Se devemos tomar aqui o exprimido como o que se inscreve nos movimentos do corpo [...] podemos dizer que todo o acontecimento de qualquer tipo (sensorial, existencial) que tende a inscrever-se no corpo [...] traz consigo outros acontecimentos que não chegam a inscrever-se, deixando um branco, uma sequência sinestésica não estimulada, nunca posta em movimento (GIL, 2004, p.95).
A composição em dança atravessa o visível para perceber o invisível, para além da forma, do sentido, da pulsão, das forças em fluxo de energia. Por isso, é difícil a tarefa de falar sobre o não explicável, sobre o não definível, e de perceber com o corpo que a dança não pode ser expressa de outra forma que não seja por si mesma. A dança é matéria em fluxo de movimento que produz enunciações no campo sensível da composição. Essa relação entre matéria e sentidos estéticos modifica a forma que se entende, no senso comum, a composição. Como já dito, não é uma junção de partes, mas sim interconexões do concreto, do abstrato, do visível, do simbólico, ou seja, da relação entre arte e vida. A composição, nesse sentido, dá poder ao bailarino de transformar a realidade vista e vivenciada. Segundo Capra (2006, p. 84), “nossas noções comuns de realidade estão limitadas à nossa experiência comum do mundo físico e que elas têm de ser abandonadas sempre que ampliamos essa experiência”. Novos sentidos são criados em interconexão e geram ao público a possibilidade de vivenciar e perceber que as coisas são mais interconectadas do que é visto no cotidiano. Assim, o bailarino dialoga com o que está dado e com a materialidade – e esse “poder” que o bailarino tem não é hierárquico, mas sim democrático. Com essa suposição, não há uma composição sem experiência: essa relação ocorre de forma conjunta e relacionada no tempo e no espaço. Do mesmo modo, não só o bailarino é responsável pelo o que cria, mas também o público é responsável pelo o que compõe. O risco se dá em duas vias, isto é, aos sujeitos que se abrem à experiência do outro e de si próprio.
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Composições O entendimento de que cada movimento, cada ação reverbera e dialoga com o todo, carrega responsabilidades com o que é feito em cena. Nesse sentido, é preciso perceber a composição como uma forma de se relacionar menos individualista com tudo o que acontece de forma simultânea. São várias totalidades apreendidas por diferentes sujeitos em relação. A realidade de um sujeito dialoga com a totalidade apreendida por outro indivíduo. As reverberações desse mundo macroscópico em relação ao micro são dispositivos de sensibilidade e criação de composições estéticas que, de alguma forma, traçam relações poéticas com o público. A percepção desse “todo” modifica uma simples ação de quem dança e influencia mais uma vez as relações micro e macro em constante fluxo. Nesse sentido, o movimento lida com forças, partículas, vazios, matéria e conexões sensíveis de forma interdependente. Na Física Clássica, a sucessão de estados determina uma trajetória e, assim, a realidade objetiva e a previsibilidade se tornaram bases do paradigma científico. A Física Quântica mostra que a matéria é composta de partículas subatômicas que não se dão de formas isoladas. Isso significa que, por mais que os cientistas encontrem partículas cada vez menores dentro de um átomo, essas partículas não existem de forma independente. Há, nesse sentido, um entendimento de uma unidade comum no universo que ocorre, principalmente, por interconexões de uma complexa teia de relações. Apesar de o pensamento clássico não se adequar à física dos átomos e ao que é do mundo micro, essa teoria foi importante para questionar se os fenômenos objetivos independiam de uma intervenção divina, pensamento predominante na Idade Média. Além disso, a Física Clássica tem grande importância para a explicação dos fenômenos na escala macroscópica, perceptíveis aos seres humanos. Assim, se alguém joga uma bola para cima, a certeza de que ela vai cair em determinado momento é de 100% (se não houver nenhum impedimento), mesmo se esse experimento for realizado inúmeras vezes. Esse conhecimento é importante, pois dá uma certeza em aspectos objetivos do que pode ou vai acontecer. 47
Ainda, a mecânica clássica consegue explicar de forma clara e coesa os movimentos do corpo humano em relação ao torque, às alavancas, às forças utilizadas em impulso dos saltos e em formas de manejar um objeto, o que dá ao bailarino condições de se conscientizar da movimentação do próprio corpo e assim ter um maior controle da cena. É nesse sentido que as técnicas de movimento são importantes, para que o bailarino tenha vocabulário corporal e possibilidades de escolhas no que deseja fazer e compor em cena. Contudo, assim como a Física Clássica não consegue explicar o que acontece na dimensão microscópica, a técnica do bailarino não é suficiente, sozinha, para compor no acontecimento de forma sensível e poética. Desse modo, a necessidade de observação, disposição e transformação do bailarino em cena aliada à técnica consciente de movimento se tornam essenciais na composição dos elementos dramatúrgicos em conexão. A participação do observador nesses experimentos é de grande relevância, uma vez que ele decide o que vai observar e determina algumas propriedades que serão analisadas. O observador não só “observa”, mas também define a realidade. Segundo Heisenberg, “o que observamos não é natureza propriamente dita, mas a natureza exposta ao nosso método de questionamento” (HEISENBERG apud CAPRA, 2005, p. 110). Assim, o observador que olha de forma distante e imparcial a si próprio e em relação com o ambiente, quebra o fluxo que lhe move. Segundo Zoar (1990, p. 7) “tal sentido de alienação vem da sensação de que nós [...] somos meros subprodutos acidentais de forças evolucionárias cegas, [...] sem nenhuma relação significativa com as inexoráveis forças que impulsionam o mundo maior da matéria bruta e insensível”. Por meio desse entendimento, é possível dizer que a composição está em oposição a esse lugar da indiferença. Na verdade, o bailarino que se disponibiliza à percepção e transformação do todo precisa filtrar as diversas possibilidades de criação e definir para onde quer ir, como e o que fazer. Dessa forma, o que fazemos é reverberação do que nos constitui, do que nos forma. Pensar assim é perceber que a dança é movimento de algo muito pequeno que se dá em grandes proporções. Além disso, parece-me uma possibilidade de atravessar as escalas de tempo, tamanho e quantidade. 48
A criação em dança, ou melhor, a composição em dança traz à tona todas essas possibilidades de lidar com o universo, com o acaso, com o vazio e com o risco de não estar só. Olhar para o outro como parte de si e criar relações de sentido na composição em dança é ter a arte como possibilidade de perceber o que a ciência não consegue explicar. É por meio desse entendimento que o bailarino participa e observa, a fim de compor, tornando-se também público da própria criação. Os filtros criados para se definir o que e como realizar a ação atravessam um crivo crítico entre o fazer e o não fazer, em que o bailarino assume a posição de dramaturgo e diretor da própria obra. Nesse sentido, o entendimento da Física Quântica cria uma nova forma de olhar para o meio em que vivemos e, assim, gera novas possibilidades de criação e relação que extrapolam as percepções do senso comum do mundo. Embora esse conhecimento no campo da Física ser muito controverso na nossa experiência cotidiana, não há teorias que consigam explicar com clareza (e que são aceitas pela comunidade científica como uma verdade) o porquê de o ser humano não conseguir acessar essas leis que regem a matéria. Essas “Partículas no nível atômico diferem de objetos em escala macroscópica” (GILMORE, 1998, p. 13). Isso significa que ainda não há um consenso sobre a explicação, por exemplo, de observarmos a matéria como algo sólido e palpável ou das leis atômicas não se aplicarem às leis da Física Clássica. Átomos no sol e em estrelas distantes emitem luz no mesmo espectro que o abajur na sua mesa-de-cabeceira. A passagem para o comportamento quântico não é algo que acontece apenas localmente; há alguma propriedade fundamental da Natureza envolvida. Nessa escala, energia e tempo, posição e momentum, apresentam-se borrados entre si (GILMORE, 1998, p. 57).
Há algumas teorias que tentam explicar esse fenômeno de diferentes formas, mas nenhuma delas é universalmente aceita. Uma delas, que me parece interessante explicitar e que enfatiza a importância das escolhas feitas pelos indivíduos, é a teoria do multiverso. Essa hipótese define que, a cada nova escolha que fazemos, criamos novas realidades que acontecem de forma simultânea. Por exemplo, um bailarino apresentando um espetáculo de composição em tempo real decide rolar no chão. Nesse simples movimento, 49
ele cria diferentes realidades: (a) um mundo em que ele rolou e continuou o movimento a partir do chão, (b) outro mundo no qual ele não rolou, (c) outro no qual ele rolou e ficou no chão, ou (d) outro em que ele rolou e se machucou, além de outras possibilidades infinitas. Em consequência dessa teoria, o espectador também faz parte dessas diversas realidades e cria outras por meio das escolhas sobre o que quer observar. Isso significa que o sujeito que observa escolhe observar o bailarino rolando no chão ou decide ir embora, por exemplo. Essas duas possibilidades acontecem de forma simultânea e desencadeiam novos universos, os quais não percebemos, pois segundo essa teoria, o encontro dessas realidades provocariam o colapso desses universos. Assim, uma pluralidade de realidades infinitas acontece ao mesmo tempo. O livro Alice no país do quantum apresenta esse fenômeno de forma sucinta: Não é assim que parece para nós, mas isso é porque os diferentes estados de um observador não sabem da existência uns dos outros. Quando um elétron atravessa uma barreira onde há duas fendas, ele pode passar tanto pela da direita quanto pela da esquerda. Aquilo que o observador consegue ver é puro acaso. Você poderia ver que o elétron foi pela esquerda, mas haverá um outro você que terá visto o elétron ir pela direita. Na hora em que você observa um elétron, você se divide em duas versões de si próprio, uma para ver cada resultado possível. Se essas duas versões nunca mais se reunirem, cada uma delas continuará ignorando a existência da outra. O mundo se divide em dois, com duas versões levemente diferentes de você. É claro que, quando essas duas versões suas começarem a falar com outras pessoas, será preciso ter diferentes versões dessas pessoas também. O que acontece então é a divisão de todo o universo. Neste caso, ele se dividiria em dois, mas para observações mais complexas ele se dividiria em um número maior de versões (GILMORE, 1998, p. 60).
Por mais que os cientistas ainda não consigam provar essa teoria, há a possibilidade de trazer de forma reflexiva e não exata as consequências das escolhas que realizamos no mundo. Isso explicita que criamos mundos paralelos que impactam não só o que uma pessoa faz, mas sim o fazer de todos.
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Além disso, por mais que a Física Quântica ainda não se aplique de forma clara à esfera macro, as propriedades que integram toda a matéria são compostas por átomos, que são constituídos por elétrons, prótons e nêutrons. Somos partículas, vazio, corpo, universo. Na verdade, somos mais vazio do que normalmente percebemos. Segundo o físico Paul Davis, o átomo é constituído por elétrons que ficam no campo gravitacional do núcleo. Os [...] elétrons não têm dimensão que possa ser medida. Movem-se em redemoinho num espaço vazio 1 trilhão de vezes maior que o volume do núcleo. Pode-se dizer, então, que só uma trilionésima parte do átomo está cheia de matéria, mas mesmo isso seria uma generosidade, pois o núcleo também não é um corpo sólido. A matéria nuclear tem uma densidade inimaginável: uma colher de café cheia dessa matéria pesaria 1 bilhão de toneladas! E apesar disso, sobra muito espaço vazio dentro do átomo. Nesse sentido temos mais vazios do que massa. Somo menos sólidos do que parecemos ou do que nossa intuição nos permite afirmar (DAVIS, 1993).
Não é uma metáfora dizer que somos espaço, energia e matéria. Somos, em nossa constituição, interconexões, ligações e relações entre tudo o que nos atravessa, há um borramento desses conceitos. Nesse sentido, na dança, o bailarino não lida com partes separadas, independentes, mas sim com vazios que se relacionam com forças interconectadas com átomos que têm velocidade e assim por diante. A dança é a possibilidade de criação com tudo isso presente no mundo. A organização da natureza é autoconsciente, inerente à nossa consciência, mas a dança não; ela depende do sujeito, que cria relações com o que é experienciado no mundo. Nesse sentido, somos autoconscientes na qualidade de natureza e conscientes como artistas que traçam, no movimento, as interconexões que vão do micro ao macro, do que percebemos, do que somos e, principalmente, do que se transforma em ação, em sentidos, em fluxo. É possível dizer que, pela dança, ampliamos a percepção sobre o que é visto e o que não é. Dançamos com os fluxos de energia, com as partículas que nos constituem e com o outro, que também é espaço-tempo. Há interconexões que são criadas e estão longe de serem explicadas pela Física ou pelas ciências exatas, que atravessam os sentidos humanos. Nesse sentido, percebemos de diferentes formas o mundo em que vivemos; que 51
depende da mudança de perspectiva na experiência dançada, vivida, disponível e criativa. A experiência é o caminho do fazer que lida com o vazio, com o que perturba, com o que acomete e transforma; é sempre matéria em relação. Sem explicações exatas, cria sentidos que atravessam o público e cria espaços-tempos e possibilidades. Atravessa também os sentidos poéticos, esbarra nas imprecisões de sensações e acomete o que está de passagem, quem fica e quem vai embora. Estar na experiência é vivenciar a matéria de uma outra forma, olhar por uma outra perspectiva, criar o que ainda não estava ali. Assim, por meio desse entendimento, não me parece necessário analisar os cálculos matemáticos ou se aprofundar na complexidade atômica, como fazem os físicos, para começar a compreender a magnitude no universo, que vai do micro ao macro. Mudar a perspectiva na relação entre o sujeito e o mundo me parece mais interessante como ser e, claro, como ser artista, para alterar uma concepção fragmentada das coisas mecânicas, distantes da realidade, da matéria. Dessa maneira, “A dança é por natureza um ambiente onde as relações inerentes às dimensões físicas do espaço podem ser coreograficamente enunciadas enquanto possibilidade” (HERCOLES in BANANA, 2012, p. 15).
Considerações finais Olhar para o todo é perceber as interconexões entre corpos, forças e objetos que criam composições no momento dançado. É criar no macro e alterar no mais micro, no não visível, tanto na matéria quanto nas conexões de sentido, no que atravessa o outro. Perceber que essas conexões estão na matéria de fato, que as partículas subatômicas não são vistas de formas separadas, mas em uma complexa rede de relação, é olhar a composição de maneira mais ampla e menos hierárquica. Ela é, sim, dialógica, receptiva e disponível ao movimento. Assim, a composição se combina com as forças presentes do universo, que são sempre dinâmicas, na busca de uma relação de instabilidade e estabilidade, isto é na busca de um equilíbrio infinito:
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Deixar-se “invadir”, “impregnar” pelo corpo significa principalmente entrar na zona das pequenas percepções. A consciência vígil, clara e distinta, a consciência intencional que visa o sentido e delimita um campo de luz, deixam de ser pregnantes em proveito das pequenas percepções e do seu movimento crepuscular (GIL, 2004, p. 130).
É possível perceber, por meio dessas relações, que a própria partícula que forma a matéria não é uma esfera dura, fechada, mas um elemento que tem um centro com uma nuvem ao seu redor, sem fronteiras, ligada a forças que estão além do que podemos entender. Criamos, assim como o átomo, nuvens de sentido que chegam no outro, na matéria, no subjetivo. Dessa maneira, o conhecimento de si, ou seja, a consciência de quem dança e a noção de mundo, cria nexos de sentidos, significados, valores e percepções singulares ao bailarino e ao público. As escolhas e organizações de cada sujeito dançante interferem e criam novos fluxos. Assim, a composição pode ser vista como consciente, o que não significa que ela é racional. É uma consciência do corpo que dança, percebe as linhas de força e dialoga com elas. Em resumo, a interdisciplinaridade entre áreas do conhecimento provoca aberturas em outros campos desconhecidos, que se tornam importantes no fazer do sujeito em sociedade. A composição, então, torna-se mais complexa e mais ampla, o que exige um aprofundamento maior no fazerdançar, nas pesquisas em dança. Torna-se cada vez mais emergente olhar para a composição como a relação de um todo, de uma unicidade que é múltipla. REFERÊNCIAS BANANA, Adriana. Trishapensamento: espaço metereológica. Belo Horizonte: Clube Ur=H0r, 2012.
como
previsão
CAPRA, Fritjof. O Tao da física: um paralelo entre a física moderna e o misticismo oriental. 23. ed. São Paulo: Cultrix, 2005. ______. O ponto de mutação. São Paulo: Cultrix, 2006. DAVIS, Paul. A matéria está cheia de vazio. Superinteressante, São Paulo, ed. 72, set. 1993. 53
EISBERG. Robert. Física quântica. Rio de Janeiro: Elsevier, 1979. GIL, José. Movimento Total. São Paulo: Iluminuras, 2004. GILMORE, Robert. Alice no país do quantum: uma alegoria da física quântica. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. HEISENBERG, Werner. Physics and philosophy. [S.l.]: [s.n.], 1959 apud CAPRA, Fritjof. O Tao da física: um paralelo entre a física moderna e o misticismo oriental. 23. ed. São Paulo: Cultrix, 2005. LOUPPE, Laurence. Poética da dança contemporânea. Lisboa: Orfeu Negro, 2012. MARTINS, Cleide. A improvisação em dança: um processo sistêmico e evolutivo. 1999. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Semiótica) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 1999. MUNDIM, Ana Carolina da Rocha. (Org.). Dramaturgia do corpo-espaço e territorialidade: uma experiência de pesquisa em dança contemporânea. Uberlândia: Composer, 2012. ______. Corpoespaço na dança. In: REUNIÃO CIENTÍFICA DA ABRACE, 7., 2013, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: UFMG, 2013. Disponível em: <http://www.portalabrace.org/viireuniao/pesquisadanca/MUNDIM_ Ana_Carolina.pdf> Acesso em: 23 jun. 2016. SANTAELLA, Lucia. A relevância da arte-ciência na contemporaneidade. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DE ARTE E TECNOLOGIA, 9., 2010, Brasília. Anais... 2010. p. 1-6. Disponível em: <http://www.medialab.ufg. br/art/anais/textos/LuciaSantaella.pdf>. Acesso em: 21 fev. 2015. SILVA, Eliana Rodrigues. Dança e pós-modernidade. Salvador: EDUFBA, 2005. SOMMERMAN, A. Inter ou transdisciplinaridade? Da fragmentação disciplinar ao novo diálogo entre os saberes. São Paulo: Paulus, 2006. ZOAR, Danah. O ser quântico: uma visão revolucionária da natureza humana e da consciência, baseada na nova física. Rio de Janeiro; São Paulo: Best Seller, 1990.
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PROJETO CORPO E(M) MOVIMENTO - A CRIANÇA E A COMPOSIÇÃO EM TEMPO REAL Patrícia Chavarelli Vilela da Silva1
Introdução Em meu processo particular de formação continuada, ao longo de anos de estudo em Dança, percebo a presença constante de estudos do movimento e de experiências de criação/composição. No tempo que atuava como uma jovem bailarina, a investigação do movimento se dava por meio de técnicas devidamente transmitidas por mestres experientes; a criação era vivenciada em experiências de composição coreográfica recebidas como tarefas em algumas aulas de dança. Ao iniciar na docência, ainda com pouca idade2 e experiência, investigar o movimento deixava de ser um desafio único da intérprete e passava também a compor um compromisso com os coletivos de crianças, depois jovens e adultos, que se aproximavam como seres dançantes (de balé, jazz, dança moderna, entre outros). O processo de criação e elaboração de uma composição coreográfica passava a ser um compromisso com essas pessoas, pois, naquele momento e lugar, a professora de dança coreografava os trabalhos artísticos de seus alunos. Ao longo do tempo, a busca por aprofundamento de conhecimento se tornou cada vez mais enriquecedora. Além das investigações técnicas de movimento e de processos criativos buscados desde o início da carreira, passei também a ter contato com pesquisas de improvisação e, posteriormente, de composição em tempo real. Nesse sentido, participar do Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço foi de fundamental importância para o aprofundamento dessas investigações. O estudo 1 Professora Assistente do Curso de Dança da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Bacharel e licenciada em Dança pela Universidade Federal de Viçosa – UFV. Mestre em Artes pela Universidad Internacional Tres Fronteras/ PY. Membro do Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço. 2 Comecei a dar aula de balé para crianças com 15 anos. Convidar jovens bailarinas, que se dedicavam bastante ao balé, para ministrar aulas foi uma prática comum entre proprietárias de academias de dança na minha geração.
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direcional e sistemático nesse coletivo possibilitou-me um refinamento e uma expansão de conhecimento nessa área, seja como docente e/ou como intérprete-criadora. No ano de 2012, o grupo de pesquisa vivenciou uma experiência significativa com jovens de escolas públicas municipais durante um período de compartilhamento de uma composição artística3. Nessa ocasião, a participação dos jovens suscitou ao grupo reflexões sobre o fazer artístico específico daquela obra, assim como a expansão da pesquisa a outros ambientes. Particularmente, surgiu o desejo de iniciar um trabalho com escolas de ensino fundamental, focado no estudo do movimento dançado e na composição em tempo real. Em diálogo com a profª Drª Ana Carolina Mundim, coordenadora do grupo de pesquisa, surgiu a ideia de criar uma ação de extensão, associada à pesquisa do grupo, em escolas públicas da cidade. Durante o ano seguinte, iniciei uma investigação para identificar que escola poderia acolher o trabalho e, em 2014, o projeto Corpo e(m) movimento4 começou suas ações com a Escola Estadual do Parque São Jorge, na cidade de Uberlândia. 3 Em 2012, o Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço teve o trabalho Sobre pontos, retas e planos aprovado em Edital Municipal de ocupação de galeria. A obra esteve em cartaz durante um mês na Galeria Lourdes Saraiva, na Oficina Cultural de Uberlândia. Nesse período, o cenário do trabalho ficou instalado na galeria e um vídeo da obra era projetado ininterruptamente. Em três dias da semana, o grupo de pesquisa realizava um compartilhamento do trabalho em horário pré-fixado divulgado à população. Fizemos contato com escolas públicas, de ensino fundamental e médio, convidando-as a levarem seus alunos. Recebemos a visita de duas escolas: Escola Estadual de Uberlândia (Museu) e Escola Municipal de Sobradinho (Zona Rural). 4 As ações do projeto Corpo e(m) movimento se iniciaram em março de 2014, realizadas no período da tarde, com duas turmas: uma do 4ª ano, do primeiro ciclo do ensino fundamental, período vespertino (turno); outra, com jovens do ensino médio, período matutino (contraturno). A primeira turma era composta por 30 alunos de uma mesma sala e a segunda por alunos de diversas turmas. O grupo de alunos do 4º ano participou do projeto durante dois anos consecutivos (2014 e 2015). Os alunos do ensino médio só participaram por um mês; acreditamos que o fato das aulas acontecerem no contraturno dificultou a participação, pois é bastante comum os jovens desse bairro começarem a trabalhar cedo. No ano de 2015, passamos a trabalhar também com uma turma de 1º ano, do primeiro ciclo do ensino fundamental; que permanece no projeto no ano seguinte (2016). A ideia inicial abarcava a participação de profissionais da Dança e da Psicologia. Durante o primeiro ano do projeto, coordenei e apliquei as atividades de dança juntamente com discentes da graduação em Dança e o psicólogo Alisson Borges coordenou e aplicou atividades relacionadas ao campo da Psicologia junto com duas discentes do curso de Psicologia da UFU, Manoela Musa e Giovanna Menezes. A partir do segundo ano, essa interação não foi possível e seguimos somente com as atividades da dança.
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Neste espaço de diálogo, compartilho reflexões sobre experiências vivenciadas ao longo de três anos do projeto, convidando o leitor a pensar sobre como estudos de movimento associados à improvisação em dança podem colaborar nos processos de formação de crianças e jovens do ensino fundamental. Acredito que, tanto na realização de estudo de movimentos como na composição em tempo real, a atenção do ser dançante deve ser sensível, relacional e criativa. Essas três particularidades serão norteadoras das discussões provocadas ao longo do texto, com particularidade especial às situações vivenciadas no contexto das ações do projeto Corpo e(m) movimento.
Atenção sensível – papel do educador e do educando Antes de falar sobre atenção sensível, faço um parêntese sobre a ‘atenção’. Ao iniciar o trabalho na escola com crianças de 9 e 10 anos, no ano de 2014, percebi que o maior desafio do trabalho seria relacionado à atenção. Os alunos chegavam para os encontros bastante agitados, falando muito, movimentando-se em direção ao outro na busca por um confronto5. Os movimentos eram realizados para atingir o colega, e não pelo movimento em si ou pela vivência lúdica que ele proporcionava. Por exemplo, um exercício simples, como andar pela sala em velocidades diferentes, tinha seu foco transformado em esbarrar ou bater no colega enquanto este corria ou andava. O foco da atenção das crianças estava, em sua maioria, na agressão ao outro ou na defesa de um empurrão. Perceber particularidades do próprio movimento era algo que não acontecia nos primeiros meses do projeto. Estar atento a si mesmo, ao próprio movimento, aos direcionamentos dados foi algo conquistado com muito tempo de trabalho e persistência. Poderia direcionar esse texto às causas desse tipo de atitude das crianças, tentando identificar que questões sociais, familiares, educacionais, psicológicas (entre outras) seriam definidoras destas atitudes. Entretanto, essa não é minha escolha neste momento. O que pretendo enfatizar neste instante é que o foco de atenção das crianças precisou ser trabalhado nas aulas no sentido de direcioná-lo para uma acuidade ao próprio movimento, 5 As crianças se batiam, se empurravam, se chocavam; seja “brincando”, seja com o desejo explícito de agredir o outro. Era como se tivessem que “marcar território” o tempo todo, para mostrar quem manda.
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identificando particularidades estruturais, sensíveis e relacionais nos estudos das movimentações. Nesse sentido, foi necessário um enfoque no desenvolvimento da atenção sensível dos propositores6 e dos alunos. Para os propositores, a ampliação da atenção colabora para identificar maneiras de conduzir as atividades a fim de promover a mudança da atitude relacional das crianças e auxilia também na formação de um vínculo com os alunos. Duarte Jr (2010), em sua obra O sentido dos sentidos - a educação (do) sensível, fala sobre um saber sensível, um conhecimento que é muito mais do que somente simbólico ou racional. Ele traz apontamentos de filósofos, físicos, neurocientistas, entre outros7, para dialogar sobre como o processo de educação do ser humano pode, e deve, dar-se por meio de diversas inter-relações com o mundo, seja por meio da percepção, da relação com as artes ou do acesso a conteúdos que permitam conhecer a vida do/no planeta. O texto desse autor me leva a uma relação direta com aquilo que acredito ser importante no processo educacional: educar a sensibilidade; educar com sensibilidade; sensibilidade como experiência educativa. Nesse sentido, acredito que a única maneira possível de encontrar algum procedimento que colaborasse na mudança do foco de atenção das crianças era educar minha sensibilidade, a fim de perceber quais ações propostas eram acolhidas com mais satisfação pelas crianças para, então, poder organizá-las de maneira que as realizassem com envolvimento e sem utilizar os hábitos usuais de movimento, tais como a agressão ao outro. Entendi que educar com sensibilidade é estar atento à maneira como a criança está a cada dia, seja relacionada à atenção, a organização corporal, ao seu humor ou ao seu estado de saúde. Vivenciar a sensibilidade como experiência educativa é aprender a desenvolver afeto e respeito por aquele ser humano totalmente permeado 6 Durante os dois anos e meio de realização do projeto, estive acompanhada por discentes do curso de Dança que atuaram como monitores. No primeiro ano, participaram as discentes: Gabriela Paes (março e julho) e Jessica Kamila (setembro e outubro). No primeiro semestre de 2015, um estudante de Pedagogia (que faz dança) foi monitor, Marcelo Borges. Em maio desse mesmo ano, Mariane Araújo, discente da Dança, que também é membro do grupo de pesquisa, passou a fazer parte do projeto e permanece até os dias atuais. 7 O autor traz citações de Rubem Alves, Fritjof Capra, Michel Maffesoli, Maurice MerleauPonty, Antonio Damásio, entre outros no referido capítulo.
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por inúmeras interferências (familiares, sociais, midiáticas etc.) e que se (re)organiza por meio delas. É entender que para estabelecer uma relação sensível com o outro é necessária certa convivência; a coexistência entre educador e educando coloca-os como duas faces de uma mesma moeda. A aula de dança, as investigações de movimentos, os processos de criação são de corresponsabilidade de todos os participantes; o momento da aula é o todo, educador e educando são as faces desse todo. O despertar da sensibilidade, da capacidade de observação do educador, permite-lhe perceber as necessidades de intervenção e interferência com as crianças, considerando-se as intervenções como procedimentos de interrupção de atitudes que interferem de maneira negativa no desenvolvimento das atividades propostas e interferência como proposição de atividades que provoquem o aluno a realizar atitudes que estejam em consonância com os objetivos de pesquisa traçados pelo projeto. As aulas precisavam ser organizadas em estudos de movimento em que o direcionamento da atenção estivesse no cuidado de si ou do outro8. Eram oferecidas ações brincantes que lhes permitissem explorar movimentações baseadas em poucos ou diversos apoios, cambalhotas e rolamentos que lhes exigiam atenção e cuidado, tanto para conseguir realizá-las como para que se tornassem “confortáveis”, sem que o corpo doesse no contato com o chão. Propusemos9 atividades em que um tivesse que cuidar do outro, por exemplo: traçamos no chão um grande labirinto com fita adesiva e, em duplas, enquanto uma criança tentava atravessar o labirinto de olhos fechados, ela era conduzida pelo colega com orientações orais. Em outro momento, a condução deveria ocorrer com estímulos táteis10, não poderia haver fala. Durante todo o primeiro ano de atividades, foi dada prioridade às 8 Dizer a eles: ‘façam isso ou aquilo”, “aprendam a se cuidar, a cuidar de seus colegas” não adiantava. Era necessário que isso fosse aprendido, vivenciado. Parece que isso nunca foi ensinado a grande maioria deles. 9 Esclareço ao leitor que nos momentos que utilizo o verbo em terceira pessoa do plural me refiro a ações adotadas por mim e pelos colaboradores do projeto. Quando o uso em primeira pessoa do singular expresso minha opinião. Essa mudança de tempo verbal é necessária para expressar essas diferenças. 10 As crianças poderiam tocar no colega de maneira a fazê-lo entender que deveria parar ou mudar de direção; poderiam dar pequenos toques para indicar que deveriam realizar ajustes sutis na sua posição.
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propostas de estudo de movimento e de ações inter-relacionais. Houve algumas experiências de criação, entretanto, percebi que nesses momentos aconteciam duas situações significativas: ou procuravam imitar algo que haviam visto em algum lugar (faziam movimentos da capoeira, da luta do super-herói, das moças que dançam na televisão etc.) ou aproveitavam a oportunidade para se chocar com algum colega. Ficava muito claro que as crianças não sentiam “conforto” quando a proposição era: “vamos criar”. O discurso oral e de movimento mostrava que haviam se defrontado com poucos estímulos nesse sentido. Atrevo-me a supor que, em todo o processo educacional daquelas crianças (familiar, escolar e social), elas recebem mais ordens de como fazer algo do que estímulos desafiadores que lhes permitem criar. Ante essa situação, procurei trazer, na maioria das aulas, atividades em que o estudo do movimento acontecia por meio de uma tarefa, por exemplo: eles deviam se deslocar pela sala sem permitir que as solas dos pés tocassem o chão. Com esse direcionador, as crianças experimentam maneiras diversas de se movimentar sem que o educador defina a movimentação realizada; ele direciona um tipo de experiência vivencial, mas dá à criança a oportunidade de fazer escolhas. Percebo que, em minha lógica organizacional, elaboro minhas aulas com dois momentos específicos de investigação: estudos de movimento e processos de criação e/ou improvisação11. Essa “escolha” de pensar o conhecimento a ser desenvolvido como dois blocos separados serve apenar para identificar qual é o foco que estou dando à experiência propositiva que está sendo trabalhada. Entendo, assim como vários profissionais da área, que não há como estudá-los em separado, mas há como direcionar a atenção para aquilo que chamamos de “estudo de movimento” ou para “processos de criação e/ou improvisação”. Penso que quando o foco está em um ou outro, a atenção sensível é um diferencial que deve ser trabalhado com os alunos. Ela possibilita a ampliação do repertório de movimento e instiga a criatividade, que surge das relações de troca com o ambiente, com o outro e com as situações. Durante o primeiro ano de aula na escola, os alunos não conseguiram 11 Essa lógica organizacional não foi “criada” por mim, mas acontece pela influência que sofri das práticas adotadas pelos inúmeros profissionais com que tive a oportunidade de estudar.
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estabelecer essas interações de maneira significativa, entretanto, construiuse uma relação de confiança e afeto entre a equipe do projeto e as crianças, a qual permitiu que modificações ocorressem com o passar do tempo. Elas também vivenciaram experiências de convívio interpessoal, de estudo de movimento e criação que lhes permitiram apreender um repertório de conhecimento para ser acessado nas aulas em proposições com nível de complexidade crescente.
Atenção relacional Acredito que desenvolver a atenção relacional na dança é procurar estabelecer relações mais sensíveis e refinadas com o próprio movimento e/ou com o outro e/ou com o entorno. Considero-a imprescindível nos estudos de movimento que demandem maior dificuldade de realização e em processos de composição em tempo real. Percebo que, no trabalho com as crianças, pudemos vivenciar experiências de improvisação, mas ainda não foi possível a composição com foco na criação de uma obra artística. Isso requer um aprofundamento nos estudos que até o momento não foi alcançado. A partir do segundo ano do projeto na escola, as mudanças foram significativas. Percebe-se que houve amadurecimento e refinamento das organizações sensório-motoras, pois ficou evidente a diferença de qualidade dos movimentos realizados. O movimento que buscava o choque, o confronto, não desapareceu, no entanto, modificou-se. Algumas rixas e implicâncias permaneceram, mas as crianças passaram a entender que durante a aula não é permitido dar vazão a isso, que o foco deve ser outro. As pesquisas de movimento e as experiências de criação devem ser mais importantes durante o encontro. É possível perceber que, com o passar do tempo, a relação estabelecida entre a(s) educadora(s) e os educandos e os diálogos sobre a responsabilidade de cada um na construção do conhecimento auxiliam no cumprimento dos acordos e na ampliação das experiências de investigação de movimento. O estabelecimento de determinada “qualidade” nas relações interpessoais gerou possibilidades de relações criativas. Quando digo qualidade, não me refiro a algo bom ou ruim, mas a uma conquista gradual da confiança, do respeito, da experimentação de movimentos diferentes 61
do cotidiano das crianças. Ao conseguirmos estabelecer relações criativas entre as propositoras e os alunos participantes do projeto, viabilizamos experiências de criação pautadas na relação com o outro e com o ambiente. Com a reorganização do foco de atenção das crianças, conseguimos introduzir nas aulas experimentos vivenciados no grupo de pesquisa12, tanto para estudo de movimento como para pesquisas de composição. Os estudos desenvolvidos no grupo de pesquisa sobre movimentos pontuados, retas e círculos foram, gradativamente, sendo compartilhados com os alunos. Investigações em que poderiam: pontuar o ambiente de sua kinesfera13 com partes diferentes do corpo, deslocar-se pela sala somente em cima de pontos marcados no chão com fita crepe ou tocar com o indicador um ponto do corpo do colega para que este movesse aquela parte se afastando do toque. Construir no/com corpoespaço linhas ou círculos, no lugar ou em deslocamento, seja em uma relação com a experiência do movimento ou em um processo de criação, estabelecendo relações com a arquitetura, com objetos, com os colegas. Introduzimos também alguns recursos de jogo utilizados pelo grupo de pesquisa – a coincidência e a equivalência14. Em cada um deles, 12 “O Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço organizou procedimentos de trabalho para experimentações práticas, denominados Movíveis. Os Movíveis se organizam a partir de três eixos: 1) estruturas de movimento (pontos, retas, círculos, espirais, alavancas); 2) recursos de jogo (coincidência, equivalência, bloqueio, pergunta no ouvido, ênfase); 3) comandos (para, repete, continua, rebobina, deleta). Os desdobramentos possíveis a partir de cada componente desses eixos provocam uma ampla gama de possibilidades técnico-criativas que, se minuciosamente estudados, estabelecem instrumentais que podem ser acionados em processos de improvisação ou em composições coreográficas pré-estabelecidas. Compreender como extrapolar estes estudos e redimensioná-los poeticamente só é possível se eles se tornam orgânicos pela produção de saber oriunda da pesquisa”. Texto redigido por Ana Carolina Mundim, disponível em: <http:// conectivonozes.blogspot.com.br/2012/08/nozes-o-conectivonozes-nasceu-em-2010. html>. Acesso em: 02 ago. 2016. 13 Kinesfera ou cinesfera é um conceito que pertence ao Método Laban de Análise do Movimento. É a esfera que delimita o limite natural do espaço pessoal, no entorno do corpo do ser movente, esteja ele em movimento ou não. Ressalto que o grupo de pesquisa, em suas discussões e redações, não trabalha mais com esse termo, pois considera uma expansão do conceito de kinesfera cunhado por Laban na primeira metade do século XX. Entretanto, mantenho o uso do termo labaniano, neste momento, como recurso para exemplificar a experiência proposta às crianças em determinada atividade, por questões didáticas. 14 Tanto a equivalência como a coincidência podem ser exploradas de inúmeras maneiras, não se restringem aos exemplos dados.
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trabalhamos primeiro em duplas e depois em grupo, da seguinte maneira: em dupla, uma pessoa realiza determinado movimento e a outra se move na busca de uma coincidência com a ação realizada pelo colega. A coincidência aqui não é entendida como cópia, espelho, imitação ou aquela brincadeira de “sombra”. As crianças podem estar perto ou longe uma da outra, podem ter suas faces voltadas em direções que não coincidem, podem estar posicionadas em níveis diferentes (alto, médio e baixo), mas buscarão estabelecer movimentos coincidentes com seu par. Durante algum tempo, uma pessoa é a propositora e, ao sinal do educador, inverte-se o papel com o colega. Na pesquisa em grupo, isso acontece de maneira um pouco mais complexa, as crianças se movem pela sala, de acordo com alguma situação proposta pelo educador, e se deixam contaminar pela movimentação daqueles que estão no seu entorno; isso pode acontecer por meio da relação estabelecida com apenas um colega ou com vários. O nível de complexidade das proposições varia de acordo com a maneira como os alunos se apropriam das experiências. No que diz respeito à equivalência, a atividade pode acontecer da seguinte maneira: em dupla, uma criança realiza determinado movimento com o braço e seu par procura se mover da maneira mais parecida possível, porém, não com o mesmo membro, mas com a perna ou outra parte do corpo. Quando o trabalho é em grupo, ela estabelece as relações com vários colegas, e não somente com um par. As coincidências e equivalências também podem ser estabelecidas com a arquitetura, com objetos; esses recursos de jogo dão margem a inúmeras variações. A partir do segundo ano do projeto, as crianças foram se apropriando desses experimentos e ampliando suas capacidades, tanto de refinamento de movimento como de improvisar e criar. Isso ocorreu por meio de uma sabedoria que se desenvolveu na experiência e não levou os alunos a um entendimento racional ou conceitual sobre esses processos, mas a uma compreensão que é de outra ordem. É da ordem do perceber, uma percepção sensível de si, de suas capacidades e limitações, conquistando e aperfeiçoando novas competências motoras e criativas. Acredito que quando o artista da dança desenvolve uma atenção por meio de um estreitamento de relações entre si e seu entorno (pessoas, objetos, sonoridades, arquitetura etc.), ele caminha para um amadurecimento da 63
capacidade de compor. Penso que, nesse contexto, criar/improvisar/compor está associado a estabelecer relação. Essa relação a que me refiro nesse momento é similar àquele tipo de percepção que um cantor desenvolve; ele precisa trabalhar com a afinação de sua voz, com a sintonia entre sua vocalização e a sonoridade dos instrumentos musicais e/ou com outras vozes. Quando cantamos em grupo, todos em mesmo tom, conseguimos uma harmonia, um equilíbrio do grupo. Conseguimos com o canto trazer a classe para a mesma frequência (sic), a mesma sintonia. Porém, quando cada um mantém um tom e a turma não consegue chegar numa afinação uníssona, este processo de harmonização fica inviável (PUPO, s/d, p.2).
Identifico que, assim como os alunos de canto precisam encontrar uma “sintonia” comum para executarem uma música juntos, para realizarmos improvisações e/ou composições coletivas na dança, precisamos entrar “em sintonia” com tudo que somos e que nos cerca. Nessa premissa, se não consigo compor com o outro e com o ambiente, estou apenas realizando movimentos ao mesmo tempo que alguém em um tempo-espaço idêntico; mas não “componho com”, estou “compondo ao mesmo tempo”. A experiência de compor no mesmo tempo-espaço é vivenciada nas aulas do projeto desde o início (mesmo com as dificuldades apresentadas anteriormente), entretanto, processos de “compor com” passaram a acontecer de maneira bem inicial somente a partir do segundo ano de estudos e apenas entre algumas crianças. Aqueles com dificuldade de estabelecer relações (na dimensão que tenho discutido neste artigo) conseguem criar somente “ao mesmo tempo que” seus colegas. Quando expresso que considero importante trabalhar com as crianças uma atenção voltada ao estabelecimento de relações com seu entorno, faço isso pautada no desejo de, futuramente, desenvolver com elas experiências de composição em tempo real. Nas investigações criativas realizadas no grupo de pesquisa, tenho constatado essa particularidade. Só consegui ter a sensação de estar compondo em tempo real conforme fui refinando a capacidade de estabelecer relações mais consistentes com o coletivo de artistas com o qual trabalho, com a(s) sonoridade(s) presente(s), com a cenografia, com o ambiente em que estivéssemos inseridos, com o público etc. 64
Atenção criativa No projeto Corpo e(m) movimento, estamos trabalhando com estudos de dança em que movimento e criação são pensados como questões indissociáveis; são considerados também como oportunidade e possibilidade de construção de conhecimento. Um conhecimento que surge do fazer, do experimentar, do observar, da relação. O processo criativo é um movimento de construção cênica que só acontece ao longo das vivências. Não está pronto a priori, depende do que ocorre em cada etapa. Pode-se pensar, assim, que a referência central desse processo é o corpo/soma. Conscientizar-se de que o corpo é um dos ingredientes da cena induz à pesquisa de como lidar com todos os outros ingredientes da cena espetacular. São escolhas, pois o tempo todo somos bombardeados por ideias que, para que se transformem em ações cênicas, dependem da existência de um processo seletivo que vai se delineando um percurso criativo (MILLER, 2012, p.148).
Acho bastante interessante pensar o estudo de movimento/criação em dança como um processo de escolha. Acredito que muitas pessoas escolhem sem saber o que estão fazendo, sem se preocupar com a dimensão da repercussão de suas escolhas. Mas, particularmente, penso que escolher “às cegas” pode ser perigoso. Nesse sentido, buscamos trabalhar com as crianças uma construção de conhecimento que possa ser acessada no momento de fazer escolhas, para que o processo de escolher esteja associado à criação de possibilidades, para que possam dar-se na dimensão do sensível, do racional, do intuitivo, mas acontecerão por meio de experiências vivenciadas. A atenção estará voltada ao conhecer-se, ao conhecer o outro e a conhecer o entorno para, com base nisso, poder compor com eles. No início do projeto, percebemos que a atenção das crianças não estava direcionada para si nem para seu entorno, somente para o que o colega fazia. Elas sabiam se o colega estava empurrando alguém, mas “apagavam da memória” o fato de realizarem o mesmo tipo de ação. Elas percebiam que alguém conseguia ou não realizar determinado movimento, mas não se atentavam à maneira que eles próprios o faziam, que era no “como eu faço” que estava o segredo da realização do movimento. 65
Somente com o tempo e a aplicação de propostas que direcionavam a atenção para o “como” eles foram identificando que o fato de não conseguirem realizar determinado movimento no instante presente não significava uma incapacidade, mas que se continuassem tentando “com atenção” conseguiriam realizá-lo em algum momento. Com base em um redirecionamento do foco, ou seja, uma atenção para aquilo que se pode fazer, tornou-se possível criar, compor. Durante os encontros do projeto, pudemos propor atividades que tivessem como prioridade a atenção criativa, sem perder a noção de que as ações de criação/composição se dariam na interação com o entorno. Como essa experiência era relativamente nova para a turma, procuramos realizar as proposições com direcionamentos específicos a cada encontro. Em um dia, deveriam criar com base na relação com algum colega, em outro, com determinado objeto, em outro, com o ambiente etc. No trabalho artístico Sobre pontos, retas e planos, do grupo de pesquisa, o cenário é composto por uma construção com barbantes e fita crepe. Na escola, procuramos levar, em alguns encontros, vários metros de barbante que foram fixados no ambiente da sala como se fosse uma grande teia de aranha. As crianças deveriam passar por essa teia sem tocá-la, isso poderia acontecer livremente, sem um “controle” de quem está passando pela teia e/ou de quem está nas bordas15 esperando para cruzar o espaço. Depois de algum tempo de experimentação, elas deveriam se colocar todas nas bordas e somente cinco crianças poderiam estar no ambiente da teia. Se um saísse, outro deveria ocupar seu lugar; se alguém entrasse, um deveria sair. Atividades como essa fazem com que o aluno tenha como foco uma situação, e não um comportamento particular de determinado colega, e também permite que se desenvolva uma responsabilidade pela tarefa do coletivo. Em alguns encontros, desenvolvemos atividades fora da sala de aula, em ambientes externos que permitiam aos alunos uma relação com um local diferente, em que a proposta era compor com as particularidades daquele(s) espaço(s). Nesses momentos, um banco, uma parede, uma grade eram convites à criação, ao movimento, à experimentação. Eles poderiam subverter as relações normalmente construídas com a arquitetura, tinham autorização 15 Estou nomeando de borda os lugares na sala onde a teia não está construída e onde as crianças se colocam para observar os colegas ou para esperar uma oportunidade para participar da atividade.
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de usar o banco para qualquer outro movimento que não necessariamente o de sentar; podiam pular, apoiar os pés ou até mesmo empurrar a parede ou realizar outra ação que achassem interessante. Obviamente, em vários momentos precisei intervir e orientar para que junto com a liberdade de pesquisa caminhasse a responsabilidade, pela integridade física pessoal, do outro e/ou pela manutenção do bem público. Percebi, ao longo de todo o processo de ensino-aprendizagem, que as crianças foram compreendendo que podem criar e que fazer isso pode ser muito agradável para elas. Com o tempo, as manifestações de satisfação pela experiência de compor foram se tornando sempre presentes. Entretanto, o processo de estudo sobre improvisação e composição ainda se encontra em um momento inicial de construção de conhecimento; não houve tempo hábil para um amadurecimento desse saber, mas aconteceu um despertar. Principiamos, com as crianças, o entendimento de que improvisar não é fazer qualquer coisa, que dançar não é apenas ter a capacidade de se mover ao som de uma música, que compor não é unicamente juntar as “peças” de algo que conheço, que escolho. O conhecimento e a capacidade de criar existem como potência no ser humano, entretanto, precisam de certa dedicação para acontecer; principalmente se estiverem relacionados a um tipo de saber específico, a uma área de conhecimento.
Ilações finais Nesse projeto, foi imprescindível encontrar o tempo da espera, a espera pelo tempo do outro. Por um tempo que não é do cotidiano, da contemporaneidade, do professor, da escola, da internet, da sociedade, enfim... mas esperar pelo tempo de maturação e acolhimento de cada criança. Não me refiro à maturação fisiológica, anatômica, mas a uma maturação que vem do amadurecimento do indivíduo como ser único e completo no universo. Como educadora, precisei trabalhar como facilitadora do desenvolvimento da capacidade de aprender o que existe como potência em cada ser humano; dando à criança tempo para suas descobertas, oferecendo situações e estímulos variados no intuito de proporcionar experiências que contribuíssem com conquistas que foram desejadas por mim desde o momento da idealização do projeto e que se estenderam por todos os dias de contato com elas. 67
Acredito que os estudos desenvolvidos podem colaborar na construção da autonomia das crianças. Espero que possamos trazer referenciais de relação, mobilidade, arte, percepção, e sensibilidade diferentes daqueles proporcionados pela cultura de massa, pela família e pela escola. Esses lhes são oferecidos em outros contextos, sem a nossa interferência. Entretanto, penso, e aí reside um dos grandes desafios de um educador, em trazer algo que é novo (e que pode ser acolhido com estranhamento simplesmente por ser algo desconhecido) sem desrespeitar ações e saberes instituídos em um grupo social, convidando alguns de seus membros a pensar que há algo além daquilo que já conhecem e mais ainda: que há muito mais do que aquilo que estamos trazendo para que conheçam. Minha intenção como artista-educadora é despertar nas crianças um desejo imenso de aprender, de prestar atenção às questões e particularidades do mundo (particular, coletivo, natural). O movimento faz parte da lei da natureza, nela tudo se move, se transforma, se organiza e se reorganiza. Construir conhecimento é se mover e, por meio do movimento podemos elaborar conhecimento. Acredito que por meio do desenvolvimento dos “tipos” de atenção que proponho nesse texto, os alunos podem despertar uma maneira muito particular de estar e conhecer, não só a dança e a arte, mas também a vida. Feldenkrais (1977, p.67) diz que “fazer não significa conhecer”, que aprendemos a nos mover desde muito cedo, mas que é necessário desenvolver uma consciência pelo movimento e que para se alcançar esse objetivo devemos correlacionar a ação com a intenção, e eu acrescento, com a atenção. Percebo que o período da infância é, normalmente, um momento de bastante fazer, mas que as particularidades do conhecer são negligenciadas em muitas famílias e grupos sociais. Parece-me que para alcançarmos um equilíbrio entre a quantidade de informações e recursos tecnológicos que temos a nosso dispor precisamos desenvolver algo que muitos chamam de sabedoria. Na dança, podemos considerar que parte da sabedoria de um intérprete-criador é saber administrar conhecimentos múltiplos (mecânicofisiológicos, expressivos, estéticos) agenciando-os no seu fazer. Para um bailarino, ter equilíbrio é, inclusive, saber se desequilibrar. Nesse sentido, José Gil (2004) diz que há “duas espécies de equilíbrio corporal”, um 68
puramente mecânico e outro “que o movimento e a consciência introduzem no corpo”. Nessa premissa, para o artista da dança alcançar um “corpo em equilíbrio”, é necessário muito mais do que a capacidade de colocar “massas em movimento”, é preciso um conjunto de agenciamento de saberes que se constrói no fazer, algo que se acessa por meio de determinado nível de apropriação da sua arte, “quando a consciência do movimento se torna movimento da consciência” (GIL, 2004, p.17). Gil fala sobre como a “capacidade de concentração” do bailarino traz um diferencial a sua dança. Nesse artigo, eu exponho, em consonância com o autor, a necessidade de direcionamento da atenção das crianças para que conquistem um tipo de conhecimento que se dá no/com o movimento, para que, assim, alcancem determinada apropriação em sua capacidade de se mover e que possam imprimir as qualidades que desejem em seus movimentos. Nessa busca por uma apropriação de movimento, desenvolvem-se saberes que podem ser agenciados em situações outras de escolha, de vida. Uma questão muito importante a ser ressaltada no trabalho desenvolvido no projeto Corpo e(m) movimento é a maneira como a direção e a supervisão da escola acolheram a proposta. É comum, quando se desenvolve um trabalho de dança em uma escola, o anseio e a solicitação de criação de “dancinhas” ao longo do ano letivo: dança para o dia das mães, no dia do índio, no dia dos pais, nas festas juninas etc. Em nenhum momento a direção da escola solicitou que fosse realizado esse tipo de ação, permitindo-se o desenvolvimento atividades com os direcionamentos que acredito serem importantes. O diálogo com as gestoras e o professor de turma é constante, no sentido de haver um acompanhamento do processo de desenvolvimento e amadurecimento das crianças. Não tenho como aferir o quanto compreendem o trabalho realizado, entretanto, há respeito e parceria naquilo que é necessário para fazer com que as ações aconteçam. José Gil (2004, p.78) diz que a dança constrói o movimento em um plano em que o indivíduo é um ser completo e repleto de significado, “porque o movimento do sentido desposa o próprio sentido do movimento: dançar é (sic), não ‘significar’, ‘simbolizar’ ou ‘indicar’ significações ou coisas, mas traçar o movimento graças ao qual todos estes sentidos nascem. No movimento dançado o sentido torna-se ação”. 69
Em consonância com as afirmações desse autor, podemos estimar que quando o indivíduo se dedica a desenvolver uma atenção naquilo que realiza, a ter uma percepção diferenciada sobre suas ações, ele se torna mais consciente do que faz. E o artista-criador, como ser social, nessa perspectiva, cria nexos de sentidos que se configuram em obra, em poética. Convidar crianças a encontrar uma completude que se elabora na experiência e no tempo é extremamente desafiador. Proporcionarlhes oportunidades relacionais que colaborem para o despertar de suas capacidades de ser humano criativo e criador, não é uma tarefa fácil; por isso, há uma necessidade constante de atenção ao que se faz e como se faz. O educador não deve esquecer que aquilo que deseja desenvolver nos alunos é algo que deve trabalhar em si mesmo.
Referência bibliográfica ALVES, Fátima. Psicomotricidade: corpo, ação e emoção. 4ªed. Rio de Janeiro: WAK Editora, 2008. DUARTE JR, João Francisco. O Sentido dos Sentidos - a educação (do) sensível. 5ª ed. Campinas: CRIAR Edições, 2010. FELDENKRAIS, Moshe. Consciência pelo movimento. 4ª ed. São Paulo: Summus, 1977. _________________. O poder da auto-transformação: a dinâmica do corpo e da mente. Tradução de Denise Maria Bolanho. São Paulo: Summus Editorial, 1994. GIL, José. Movimento Total – o corpo e a dança. São Paulo: Iluminuras, 2004. MARQUES, Isabel. Linguagem da dança: arte e ensino. São Paulo: Digitexto, 2010. MILLER, Jussara. Qual é o corpo que dança? – dança e educação somática para adultos e crianças. São Paulo: Summus, 2012. MUNDIM, Ana Carolina. Dramaturgia do Corpo-espaço e territorialidade – uma experiência de pesquisa em dança contemporânea. Uberlândia: Composer, 2012. 70
___________________. A pesquisa em dança e as possibilidades de interdisciplinaridade. Anais do CID – Colóquio Internacional do Grupo de Pesquisa O corpo e a imagem no discurso. Vol.1, 2º semestre 2012, p. 307-315. ___________________. Corpoespaço na dança. VII Reunião Cientifica da ABRACE – 27 a 29 de outubro de 2013. Belo Horizonte/MG. PUPO, Letícia Zamberlan. A Importância da afinação do professor como referência para a criança dos 0 aos 9 anos. Disponível em: <http://www. antroposofy.com.br/forum/download/artigos/A%20Importancia%20 da%20afinacao%20do%20professor.pdf> Acesso em: 13/08/2016.
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Corpo e arquitetura: a poética do espaço arquitetônico na dramaturgia na composição em tempo real Emilliano Alves de Freitas Nogueira1 Dançar é tornar o espaço visível (Dominique Dupuy).2
Introdução Na composição em tempo real em Dança Contemporânea, as proposições de movimento são feitas na própria cena apresentada, fazendo com que as escolhas realizadas pelos intérpretes conduzam os caminhos da dramaturgia da cena. Nesse caso, a dança nasce da possibilidade dos movimentos do corpo do intérprete, levando em conta o seu repertório técnico pessoal. Assim, a dramaturgia não se limita a campos específicos de modalidades de dança, mas “o movimento da dança que um corpo faz seria o fiador da dramaturgia” (KATZ, 2010, p. 163), abrindo-se às possibilidades do universo do movimento, ação, pantomima, palavras e imagens. As escolhas feitas pelo intérprete no espaço fazem com que ele tenha total autonomia e responsabilidade na sua criação. Sobre as escolhas realizadas na composição em tempo real, Guerreiro fala que: Pode-se assumir que composição em dança, de modo geral, é uma organização entre arranjos espaço1 Emilliano Alves de Freitas Nogueira faz parte do Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpoespaço desde 2010, atuando como cenógrafo e intérprete no Conectivo Nozes. É natural de Tupaciguara (MG), graduado em Arquitetura e Urbanismo (UFU), especialista em Artes Visuais: Cultura e Criação pelo SENAC/MG e mestre em Artes, subárea Artes Cênicas (PPGA/UFU) pela Universidade Federal de Uberlândia. Nas artes visuais, realiza trabalhos relacionando arquitetura e corpo, produzindo desenhos, pinturas, instalações e performances. Nas artes cênicas, trabalha como ator, palhaço, intérprete do movimento, cenógrafo e figurinista. Atuou como cenógrafo no Curso de Teatro da Universidade Federal de Uberlândia de 2010 a 2016. Atualmente, é professor no Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Goiás - Regional Goiás, na área de expressão e representação. 2 DUPUY, Dominique. La danse, naissance d’un movement de pensée. Paris: Armand Collin, 1989. In: LOUPPE, Laurence, Poética na Dança Contemporânea. Lisboa: Orfeu Negro, 2012, p. 190.
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temporais, que operam nas relações entre corpo e ambiente. A composição final, ou seja, a ‘obra’, envolve as informações inscritas nos corpos (advindas de experiências vividas no cotidiano e na dança), que carregam opções estéticas (relacionadas a noções de dança, ou artes, já instituídas, como por exemplo: balé clássico, dança moderna, jazz, etc., e outras formas artísticas), junto às condições presentes no contexto dado para a composição (GUERRERO, 2008, p. 15).
O espaço cênico faz parte do contexto em que o trabalho é criado e apresentado, assim, muitas das propostas de composição em tempo real se apropriam das possibilidades de criação que esse oferece, proporcionando um diálogo direto da dramaturgia criada com o espaço e os seus vínculos poéticos. Este artigo busca discutir de que forma o espaço arquitetônico influencia as escolhas dos intérpretes na construção da dramaturgia, levando em conta trabalhos abertos a esse tipo de diálogo.
O espaço da experiência Digamos que eu chame de espaço todos os mecanismos da vida. O espaço não é apenas o lugar onde as pessoas estão, mas algo ativo e envolvente. O espaço, como imagino, exclui a possibilidade da existência de um observador isento, que domina o mundo com o seu olhar. Ele implica a participação (MEIRELES, 2009, p. 26).
Seria leviano afirmar que um trabalho de composição em tempo real consegue ser isento das interferências do lugar em que é realizado. Isso porque “todo lugar impregna (formalmente, arquitetonicamente, sociologicamente, politicamente) radicalmente seu sentido no objeto (obra/ trabalho) que é exposto” (BUREN, 2001, p. 91). Os corpos que dançam em uma composição em tempo real se distinguem dos corpos cotidianos, visto que estão em estado de jogo, exigindo uma atenção para a criação cênica durante a cena, somandose à escuta do contexto (público, lugar, companheiros de cena). Mesmo se forem lugares tradicionalmente destinados a apresentações artísticas (como teatros em seus mais diferentes formatos), eles têm características muito particulares, que muitas vezes ficam mascaradas na busca pela ilusão de suspensão da realidade nas artes cênicas. Esses corpos 73
performáticos acabam dilatando as experiências no espaço arquitetônico, constantemente adormecidas durante o dia-a-dia. A experiência é definida por Bondia (2002) como “o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que passa, não o que acontece, ou o que toca. [...] Nunca se passaram tantas coisas, mas a experiência é cada vez mais rara” (BONDIA, 2002, p. 21). Bondia afirma que a experiência é cada vez mais rara em razão dos excessos de informação, opinião e trabalho, bem como da falta de tempo. Estar em experiência durante a composição em tempo real, proporciona uma oportunidade se relacionar e se conectar com o contexto instaurado. É necessário se colocar em experiência para ampliar as possibilidades de cena na composição em tempo real. O excesso de informação dá lugar à edição da criação em cena, procurando enfatizar as escolhas realizadas. O excesso de opinião tende a ser substituído no jogo cênico com a suspensão do julgamento, mostrando diferentes possibilidades em vez de estar preso ao certo e errado. O excesso de trabalho, sinônimo de uma longa busca por produtividade, é alterado pelo prazer de estar em cena e, como na improvisação a criação é feita no momento da apresentação, o compromisso com o acerto tende a ser substituído por vivenciar. A falta de tempo é combatida por uma suspensão do tempo cotidiano durante a cena. Essas estratégias procuram fazer com que quem está em dançando comungue com o que se passa, acontece e toca. Assim, o intérprete, ao se mover em determinado espaço arquitetônico, passa a revelar os sentidos, apresentando novas possibilidades de experiência. O experenciado é dilatado em cena, acordando aquilo que está adormecido no cotidiano, em uma relação íntima com o lugar. Tschumi (1996) diz que a experiência no espaço arquitetônico promove o encontro entre as partes, tornando-se indissociáveis no tempoespaço. Entrar num edifício pode ser um ato delicado, mas ele viola o equilíbrio de uma geometria precisamente ordenada. Os corpos esculpem todos os tipos de espaços novos e inesperados através de movimentos fluidos ou errantes. A arquitetura, então, é apenas um organismo engajado em constante troca com os usuários cujos cor74
pos avançam contra regras cuidadosamente estabelecidas pelo pensamento arquitetural. [...] Cada porta implica um movimento de atravessar a sua estrutura. Cada espaço arquitetural implica e deseja a presença intrusiva que o habitará (TSCHUMI, 1996, p. 123).
Para analisar as reverberações do espaço arquitetônico em quem dança, o primeiro será analisado de dois pontos de vista: o físico e o social. As escolhas feitas para as condições formais de uma arquitetura dizem muito a respeito de suas condições sociais, fazendo com que a experiência reverbere artisticamente e revele muito sobre o local. Uma experiência marcante da arquitetura sensibiliza toda nossa receptividade física e mental. É difícil apreender a estrutura do sentimento, por causa de sua imensidão e diversidade. Na experiência, descobrimos uma combinação do biológico e do cultural, do coletivo e do individual, do consciente e do inconsciente, do analítico e do emocional, do mental e do físico (PALLASMAA, 2013. p. 486).
É importante lembrar que, na experiência, as qualidades da arquitetura se intercruzam e se tornam, muitas vezes, indissociáveis. A utilização de determinada técnica construtiva, material de acabamento, a definição da escala do edifício ou do tipo de iluminação existente se dá pelo seu valor social. Porém, serão analisados neste artigo separadamente, compreendendo que os conteúdos físicos e sociais, apesar de interdependentes, acabam interferindo de formas distintas na qualidade do movimento durante a improvisação. Ao tomar o espaço arquitetônico como parte do processo de composição em tempo real, os dançarinos são tomados involuntariamente pelas circunstâncias e passam também a criar com base na perspectiva espacial. O espaço age sobre nós e pode dominar o nosso espírito; uma grande parte do prazer que recebemos da arquitetura – prazer que parece não podermos perceber ou que não nos damos ao trabalho de notar – surge, na realidade, do espaço (SCOTT, in ZEVI, 2009, p. 186).
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O conteúdo físico Chamarei de conteúdo físico do espaço aquilo que é “medível e medido, examinável e geométrico” (LOUPPE, 2012, p. 191). O espaço, com suas características formais, é condicionante para a concepção dramatúrgica na composição em tempo real em Dança Contemporânea. Se considerarmos que as escolhas dramatúrgicas feitas durante as apresentações refletem as relações entre o corpo que dança e o lugar onde se dança, “o espaço se dá no espetáculo, passando do espaço do espetáculo para o espetáculo do espaço” (FÉRAL, 2004, p. 198, tradução nossa). Na história da dança, observamos que espaço ocupado na cena entre os bailarinos e o público começou a se estreitar a partir da década de 1960, quando os artistas começaram a ocupar lugares diferentes dos tradicionais teatros com palcos italianos, em que a separação entre palco e plateia é distinta. Os artistas buscam realizar trabalhos que dialoguem diretamente com a fisicalidade de novos lugares (galerias, ruas, praças, igrejas, estacionamentos etc.), quebrando os paradigmas do sistema da arte em relação ao mercado e à circulação. Ao “considera[r] os elementos constitutivos do lugar: as suas dimensões e condições físicas”, (CARTAXO, 2009) esses trabalhos passam a ter características site-specific, conceito surgido na década de 1960 nas artes visuais entre os artistas minimalistas. Colocar o corpo em conversa com a fisicalidade do lugar promove uma “ruptura com o caráter ideal do espaço modernista e com a ideia de obra autônoma e auto-referencial, dando lugar à priorização da experiência fenomenológica da experiência corporal vivenciada” (BRUZZI, RENA, 2015, p. 169). É notório também, que mesmo as apresentações de composição em tempo real realizadas em teatros italianos ou espaços cênicos em que a delimitação entre palco e plateia é bem definida, na maior parte das vezes, não há o desejo de criar ilusão e distanciamento e, apesar da separação espacial, o diálogo entre as partes é frequente. A arquitetura nos trabalhos, então, torna-se “suporte, agente principal, cama de tortura ou leito de desejo, alcova, refúgio ou prisão, segundo o modo 76
como o corpo o utiliza enquanto apoio, trampolim ou obstáculo”3 (LOUPPE, 2012, p. 310). Os corpos em experiência no espaço arquitetônico são afetados pelo conteúdo físico do lugar, sua escala, forma, materialidade, cor e textura. Os planos de base, cobertura e verticais, e outros elementos definidores dos espaços, perante sua escala, materialidade e formato serão responsáveis por determinar a qualidade de movimento dos corpos. O plano de base na Dança Contemporânea age como “suporte, parceiro amoroso ou renúncia” (LOUPPE, 2012, p. 106), sendo recorrente “a construção de alinhamentos e apoios corpóreos (incluindo o uso da respiração tridimensional), a partir da utilização do chão como partner (parceiro) e consequentemente transferências destes estudos para os níveis médio e alto” (MUNDIM, 2013, p. 42). As dimensões da área cênica para a apresentação definem as perspectivas de atuação do intérprete. Por exemplo, se em uma praça com grandes dimensões o bailarino pode realizar livremente seus movimentos sem se preocupar com os limites do lugar, ao escolher dançar apenas dentro de uma fonte na praça com pequenas dimensões, seus movimentos serão limitados. O formato do piso – plano, com elevações ou rebaixamentos (como escadarias e planos em desníveis) – permitirá diferentes possibilidades de fluxos, podendo colocar o intérprete em destaque ou esconder parte dele. O próprio desenho do piso, com diferentes tons de cores, formatos de material, distâncias de rejuntes e juntas, podem virar jogo, por exemplo, se os intérpretes decidirem que só dançarão sobre as linhas de rejunte, ou quando há duas cores de piso, definirem que só poderão dançar nos pisos mais claros. A materialidade do piso – madeira, revestido com linóleo, pedra, cerâmica, natural (grama, terra, areia etc.) etc. – provocará diferentes impactos no contato do corpo com o solo e, consequentemente, a movimentação se adaptará a esse piso, trazendo reverberações diversas, como solavancos, quedas, desequilíbrios, choques, escorregamentos, sons, dentre outros. 3 Apesar de a autora tratar nesse parágrafo sobre o uso do objeto na Dança Contemporânea, essa ideia aqui apresentada se aproxima muito do espaço arquitetônico, visto o caráter de interação física.
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Os planos de cobertura ajudam a definir os limites do espaço arquitetônico. A dimensão do pé direito do lugar estabelece limites para a movimentação dos intérpretes. As estruturas que apoiam os planos de cobertura podem ser utilizadas como apoios para pendurar e saltar. Lugares sem cobertura, como praças, acabam menos delimitados, fazendo com que as intempéries naturais, como chuva, sol e vento atinjam o bailarino e provoque em seu corpo estados de atenção definidores de qualidades de movimento. Os planos verticais geralmente delimitam onde começam e terminam os espaços fechados. Paredes e pilares são pontos de apoio muito utilizados pelos performers durante jogos de improvisação, porque, sendo fixos e rígidos, acabam se tornando parceiros na dança. Outros elementos definidores de espaços, como aberturas e mobiliários fixos, são facilitadores dramatúrgicos, visto que podem marcar entradas e saídas, serem pontos de apoio, suporte e parceiros de cena que alteram dinâmicas e visadas. A composição em tempo real busca somar à cena tudo o que acontece ao seu redor. Desse modo, mesmo com uma trilha sonora predefinida ou realizada também em tempo real, os sons que o próprio espaço produz também entram em jogo. Os barulhos feitos no contato com o piso, entre os corpos, produzidos pela plateia (tosse, soluços e conversas etc.) e pelo próprio ambiente (carros passando pela rua, barulhos de animais ao redor, sirenes etc.) compõem essa trilha sonora feita em tempo real durante o jogo. A improvisação em dança e a música do espaço se unem em uma “reconciliação tornada historicamente impensável, as aspirações ao limite do possível, (...) e as cumplicidades secretas ou fora das normas (...) garantem as fontes poéticas dessa instabilidade” (LOUPPE, 2012, p. 318).
O conteúdo sociocultural No espaço coincide vida e cultura, interesses espirituais e responsabilidades sociais. Porque o espaço não é só cavidade vazia, “negação de solidez”: é vivo e positivo. Não é apenas um fato visual: é, em todos os sentidos, e, sobretudo num sentido humano e integrado, uma realidade vivida (ZEVI, 2009. p. 217). 78
Ao considerarmos que a experiência no espaço arquitetônico vai além da fisicalidade, o intérprete buscará também em seus movimentos refletir sobre as condições socioculturais que aquele lugar carrega. “A qualidade da arquitetura não reside na sensação de realidade que expressa, mas, ao contrário, em sua capacidade de despertar nossa imaginação” (PALLASMAA, 2013. p. 488). Se na composição em tempo real em Dança Contemporânea os movimentos se articulam com as relações de tempo e espaço, assim, acaba tomando para si, além da fisicalidade, os aspectos sociais intrínsecos do lugar, tornando-se uma obra site-oriented. “A singularidade da arte site-oriented [se] constitui pelas relações da obra com o lugar temporal (atualização) e social (esfera institucional) – configurando-se como um campo de conhecimento intelectual e cultural” (CARTAXO, 2011, p. 2). As camadas socioculturais promovem a criação de narrativas enviesadas entre o intérprete, o lugar e o público. Essas narrativas darão corpo à dramaturgia que “se compõe a partir de tempos fragmentados, sobreposições, repetições, deslocamentos” (CANTON, 2009, p. 15). A organização das leituras socioculturais do lugar com a força que isso traz à movimentação faz com que o artista, no momento da criação e apresentação, tenha um grande número de estratégias de composição para utilização dentro do jogo cênico. A escuta e a seleção das informações na cena serão fundamentais para a edição dos presentes dados pelas condições socioculturais oferecidas pelo espaço arquitetônico à dramaturgia da composição. “Compor é o contrário de justapor, onde não existe a força de um discurso, mas apenas uma série de palavras isoladas, sem significado” (ZEVI, 2009, p. 166). A memória de cada lugar está recheada com seus significados socioculturais, podendo ser definida como “um elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual quanto coletiva” (POLLAK, 1992, p. 204). O espaço arquitetônico guarda, em si, camadas de memórias, justapostas em fatos históricos, usos dos lugares e as bagagens que esses espaços representam para cada pessoa. Esses fatos, associados tanto em movimento dos intérpretes quanto nos corpos de quem assiste, produzem narrativas dramatúrgicas diversas, nutrindo dramaturgicamente as performances. 79
Todo o conteúdo sociocultural está impregnado na memória que aquele espaço arquitetônico traz em si. Na sua efemeridade, a improvisação que trabalha com o aqui e agora lidará o tempo inteiro com essas interferências. Os fatos que estão acontecendo no momento, seja em relação à vida particular de cada intérprete ou a situações coletivas, como datas comemorativas ou fatos políticos, econômicos e culturais, expressamse de forma particular dependendo do lugar onde se está, reverberando no movimento produzido durante uma performance. A forma como a eleição presidencial, o dia das mães, o aniversário, a briga com o amigo ou qualquer outro fato se manifestará em movimento, estará de acordo com o repertório pessoal e com o lugar onde se está dançando. Dançar no dia 7 de setembro em uma praça gera provocações diferentes de dançar no mesmo dia dentro de um teatro. Assim, o lugar onde está acontecendo a apresentação responderá de forma distinta a cada fato ocorrido. Muitas vezes, o espaço arquitetônico, que a priori pode ser desconhecido do intérprete, desencadeia outras relações de afetividade, fazendo com que “as percepções atuais do espaço possam ser duplicadas por percepções anteriores sem que se possa falar de recalque ou de conflito entre representações pré-estabelecidas” (GUATARRI, 2016, p. 155). Por exemplo, se a composição em tempo real é realizada em uma escola, o ambiente educacional provoca o intérprete a se relacionar com as demandas de memória que o lugar oferece. Mesmo nunca tendo estado nessa escola, todo o seu entendimento de ambiente escolar reflete em seus movimentos. Caso o dançarino tenha estudado ali, os fatos ocorridos no passado estão impregnados em seu corpo e podem surgir em cena como dramaturgia. Essas dramaturgias produzidas por cada intérprete-criador se intercruzarão com as dramaturgias produzidas pelos espaços arquitetônicos, pelos companheiros de cena e também pelo espectador que é parte da cena na Dança Contemporânea. Busca-se assim: a instalação de um estado de provocação a ser vivenciado mutuamente entre intérprete-criador e plateia, e construímos um pensamento onde o fruidor contempla a cena, a partir de sua singularidade, das aproximações e distanciamentos que estabelece com o intérprete-criador por meio da estrutura coreográfica e das conexões que propõe, intervindo no espetáculo (MUNDIM, 2013, p. 267). 80
Considerações finais A improvisação é uma dialética entre os recursos profundos do bailarino, o acontecimento suscitado pela experiência e o olhar que reflete e nos dá novas perspectivas, ou que, pelo contrário, desloca e recua as fronteiras do possível com uma força renovada (LOUPPE, 2012, p. 236).
A dança é a “atualização de uma experiência de corpo única, a materialização do tempo e do espaço em relação a uma percepção-testemunha, e a relação corpo a corpo estabelecida numa duração partilhada” (LOUPPE, 2012, p. 361). Assim, improvisar em dança é entender o espaço arquitetônico como um parceiro na dança. Dança-se com e no espaço arquitetônico. Guatarri (2006) diz que os espaços na contemporaneidade interpelam os fruidores das mais variadas maneiras: histórica, funcional, afetiva, simbólica, estilística. “Não seria demais enfatizar que a consistência de um edifício não é unicamente de ordem material, ela envolve dimensões maquínicas e universos incorporais” (GUATARRI, 2006, pp. 160-161). Portanto, quando se improvisa em dança, apreende-se de um clima para estabelecer relações espaciais afetivas e estéticas. Não se pode ignorar que o intérprete também interfere diretamente no espaço arquitetônico. A partir do momento em que se dança no espaço arquitetônico, este também dança no bailarino, fazendo com que as trocas entre um e outro interfiram o tempo todo nas qualidades espaciais. Deixar de pensar o espaço arquitetônico como fator condicionante na dramaturgia na composição em tempo real é perder a oportunidade de fazer da dança uma forma de perceber poeticamente os enfrentamentos comuns do dia a dia.
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Improvisação em dança: corpoespaço em experiência Ana Carolina Mundim1
Introdução Este texto é parte integrante da pesquisa de estágio pós-doutoral “Improvisação em Dança: corpoespaço e experiência”, realizada no ano de 2015, na Universidade de Barcelona, sob orientação do Prof. Dr. Jorge Larrosa Bondia, com suporte de bolsa CAPES, dentro do Programa de Estágio Pós-doutoral – Chamada I 2015, Pesquisa Pós-doutoral no Exterior. Este estágio correspondeu a uma etapa importante de um processo de estudos que vem se desenvolvendo desde o ano 2000, pois buscou refinar o conceito de corpoespaço na improvisação em dança com base na minha própria experiência prática, realizando workshops de Mark Tompkins, Simone Forti e um acompanhamento próximo do trabalho de Julyen Hamilton, ao longo do ano de 2015. Além disso, foi realizada uma residência artística no Institut del Teatre, da cidade de Vic, na Catalunha, Espanha, que culminou na criação e apresentação de um espetáculo solo de composição em tempo real, de autoria própria, chamado Dreams2. As entrevistas com Mark Tompkins, Julyen Hamilton, Claire Filmón, Roberto de Oliveira e Anton Lachky, além das já realizadas no ano de 2014 com Lisa Nelson, Kate Duck, Tica Lemos e Dudude Hermann, também foram preciosas para amadurecer os argumentos que destacamos neste texto. 1 Ana Carolina Mundim é intérprete-criadora nas áreas de Dança Contemporânea e Improvisação, atriz e fotógrafa. Bacharel e licenciada (Unicamp), com mestrado em Artes (Unicamp), doutorado em Artes (Unicamp e UAB - Espanha) e estágio pós-doutoral na UB (Espanha). Atualmente, é professora da Universidade Federal do Ceará. Coordena o Grupo Artístico e de Pesquisa Conectivo Nozes e Dramaturgia do Corpoespaço, respectivamente, dedicados à improvisação e à composição em tempo real. Participou de muitas residências artísticas em Celrá (Espanha), Ipatinga (Brasil) Fortaleza (Brasil), Fontcoberta (Espanha), Xangai (China), Uberlândia (Brasil), Belo Horizonte (Brasil), Faro (Portugal), Barcelona (Espanha) e Vic (Espanha). Estuda corpoespaço na improvisação em dança desde 2000. Participou de workshops com importantes artistas como Dudude Hermann, Tica Lemos, Beth Bastos, Kate Duck, Lisa Nelson, Mark Tompkins, Simone Forti e Julyen Hamilton. Idealizadora do evento de improvisação Temporal – encontros de dança contemporânea e composição em tempo real. 2 https://www.dropbox.com/home/Dreams?preview=Dreams+final+com+entradaHD+1080p.mov
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Todos esses materiais foram referências de estudos e produção artística e não necessariamente aparecem aqui de maneira explícita, mas é importante registrar que eles deram subsídios para a organização de pensamento que compartilho, pois me moveram / me movem como artista, docente, pesquisadora e cidadã do mundo. Toda a reflexão teórica que se organiza aqui, portanto, ocorre com base nos treinamentos de improvisação vivenciados e no fazer artístico desenvolvido. Seu recorte, no entanto, não está no compartilhamento descritivo dos processos, senão na materialização e na provocação escrita das questões levantadas em ação prática, incluindo a permissão poética de construção sensível e sensorial da palavra/corpoespaço em movimento textual. Ainda que a interdisciplinaridade com artistas e autores de outras áreas de conhecimento seja uma constante nos caminhos de articulação desta pesquisa, que também envolve um trabalho prático/reflexivo contínuo com o Grupo Dramaturgia do Corpoespaço, cada vez mais há uma busca de produção de um pensamento que surja da própria dança. Os argumentos aqui apresentados, portanto, originaram-se em um percurso orgânico e vivencial.
Corpoespaço em movimento “Espaço não existe. É um conceito criado pelos humanos. Nós criamos espaço”. Com essa frase, Julyen Hamilton3 iniciou seu curso The Space Issue, em Carthago Delenda Est, em Bruxelas, Bélgica, que ocorreu entre 16 e 20 de março de 2015. Pensar a constituição de conceitos considerando a própria existência e por meio da sua materialização corpórea parece ser um caminho sensato para a compreensão de que os constructos, embora apresentem uma objetividade inerente, também são permeados pelas experiências subjetivas. Discorrer sobre um conceito é uma tentativa de materializar em palavras um dado fenômeno. Mas os fenômenos, apesar de concretos, porque ocorrem fisicamente de modo temporário ou permanente, são percebidos, analisados e estudados por corpos humanos e, portanto, são recheados de subjetividade. 3 Julyen Hamilton é um bailarino e improvisador inglês, residente em Banyoles, Espanha. Seu trabalho em dança, tanto em companhias como solos, é voltado para a composição instantânea e se organiza com base em princípios que compreendem estudo do espaço, tempo e ritmo, composição de personagem, uso da voz e produção de texto. Mais detalhes sobre seu trabalho podem ser encontrados em: http://www.julyenhamilton.com.
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Logo, a frase de Julyen traz à tona como nossos modos de perceber o espaço estão vinculados àquilo que construímos como seres humanos, ou seja, como está inerente ao corpo. Corpoespaço e suas múltiplas formas de conceituação. Espaço é um termo abstrato para um conjunto complexo de ideias. Pessoas de diferentes culturas diferem na forma de dividir seu mundo, de atribuir valores às suas partes e medi-las. [...] [...] Contudo, existem certas semelhanças culturais comuns, e elas repousam basicamente no fato de que o homem é a medida de todas as coisas. Em outras palavras, os princípios fundamentais da organização espacial encontram-se em dois tipos de fato: a postura e a estrutura do corpo humano e as relações (quer próximas ou distantes) entre as pessoas. O homem, como resultado de sua experiência íntima com seu corpo e com outras pessoas, organiza o espaço a fim de conformá-lo a suas necessidades biológicas e relações sociais. A palavra “corpo” sugere de imediato antes um objeto que um ser vivo e espiritual. O corpo é uma “coisa” e está no espaço ou ocupa o espaço. Ao contrário, quando usamos os termos “homem” e “mundo”, não pensamos apenas no homem como um objeto no mundo, ocupando uma pequena parte do seu espaço, mas também no homem habitando o mundo, dirigindo-o e criando-o. De fato, o simples termo inglês world (mundo) contém e conjuga o homem e seu ambiente, porque o seu radical etimológico Wer significa homem. Homem e mundo indicam ideias mais simples abstraídas do homem e do mundo, principalmente corpo e espaço, lembrando, no entanto, que aquele não apenas ocupa esse, porém dirige e ordena segundo sua vontade. O corpo é “corpo vivo” e o espaço é um espaço constructo do ser humano (TUAN, 2013, p. 49).
Desse modo, é possível pensar no corpoespaço tomando-se por base a relação homem/mundo, como organismo vivo que se organiza como experiência em movimento. Todo corpo é um espaço e todo espaço é um corpo, não sendo esse corpo necessariamente humano. Um elemento da natureza, por exemplo, é um corpo. Também é sabido que o espaço existe sem o homem, tendo em vista a existência de outros planetas em que não há vida humana. No entanto, o homem não existe sem o espaço e todo conhecimento produzido sobre o espaço e a partir dele é produzido pelo homem por meio de sua experiência. Toda experiência é concreta e subjetiva, 86
objetiva e emocional, individual e social (mas é a leitura individual de uma prática social). “Meu corpo é o verdadeiro umbigo de meu mundo, não no sentido do ponto de observação de uma perspectiva central, mas como o único local de referência, memória, imaginação e integração” (PALLASMA, 2013, p. 104). De modo mais amplo, o corpoespaço está além do que é visível e da humanidade. Porém, como não se faz possível abarcar a totalidade do mundo, o recorte que se faz aqui é de uma leitura de corpoespaço com base na perspectiva humana e do que se materializa como existência.4 O espaço é em si, ou melhor, é o em si por excelência, sua definição é ser em si. Cada ponto do espaço existe e é pensado ali onde ele está, um aqui, outro ali, o espaço é a evidência do onde. Orientação, polaridade, envolvimento são nele fenômenos derivados, ligados à minha presença (MERLEAU-PONTY, 2004, pp. 33-34).
Se o espaço é em si e a presença humana articula seus fenômenos, podemos pensar que o movimento é o próprio processo de materialização. Em um nível de análise o tempo-geográfico lida com o tempo-espaço ‘coreográfico’ da existência dos indivíduos... a existência de um indivíduo pode ser esquematicamente descrita como uma trajetória, um ‘diário’ – ou ‘caminho de vida’ do movimento – ou uma tecelagem da dança por meio do espaço-tempo5 (A. PRED apud MERRIMAN, 2010, p.427).
Os desenhos coreográficos corpóreos delineados como espaço estabelecem, a partir de uma rede de movimentos, estruturas que funcionam como dispositivos materiais geradores de imagens, sempre postas em relação e sempre contextualizadas. Dentro dessa perspectiva, eu sou mundo (e não o mundo). “Então nós somos como um microcosmo de todo universo. Porque nós somos parte do universo, nós somos parte da natureza. Tudo é
4 O que chamo de materialização inclui questões visíveis e invisíveis (mas perceptíveis). No entanto, não entraremos em questões sobre espiritualidade e energia neste texto, embora citemos, por exemplo, o trabalho de Anna Halprin, que estava bastante vinculado a esses temas. 5 Tradução sob minha responsabilidade do original: “At one level of analysis timegeography deals with the time-space ‘choreography’ of the individual’s existence... an individual’s existence can be diagrammatically described as a trajectory, a ‘daily’ – or ‘lifepath’ of movement – or weaving dance through time-space”.
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uma coisa só” (ANNA HALPRIN, 2:43 min)6. Sou corpoespaço, atuando de forma constante em ação ou em silêncio e a tomada de consciência de cada perspectiva lançada pelo movimento é transfigurada em posicionamento. A consciência humana é uma consciência corpórea; o mundo se estrutura em torno de um centro corpóreo e sensorial. “Eu sou meu corpo”, afirma Gabriel Marcel; “Eu sou o que está ao meu redor”, diz Wallace Stevens; “Eu sou o espaço onde estou”, determina Noël Arnaud; e, por fim, “Eu sou meu mundo”, conclui Ludwig Wittgenstein (PALLASMAA, 2013a, p. 14).
Sou mundo. Sou corpoespaço. No entanto, compreender corpoespaço a partir de si (do “eu” como mundo) não é cair na armadilha da prepotência humana, que se vê como eixo central do universo a partir de onde tudo ocorre, desconsiderando outrem, mas o contrário: perceber-se, de modo humilde, em sua pequenez. Falar a partir de si é uma decisão gerada exatamente das próprias limitações e vulnerabilidades. “E tudo que nós percebemos sobre o mundo vive através de nosso corpo. Não pode viver em nenhum outro lugar, exceto conosco” (ANNA HALPRIN, 2:17)7. Por outro lado, falar a partir de si também é considerar o outro, pois a existência só se dá nas conexões coletivas e na percepção de que um indivíduo é social. “Dança não é sobre você. É sobre nós” (ANNA HALPRIN, 0:13 s)8. Claramente, não há como compreender o mundo segundo a perspectiva alheia, mas apenas com base na própria perspectiva originada da experiência. “Contemplamos, tocamos e medimos o mundo com toda nossa constituição e existência físicas, e o mundo das experiências é organizado e articulado em torno do centro do corpo” (Pallasmaa, 2013b, p. 6 ANNA HALPRIN, dancing life/danser la vie. Produção: Contredanse – Baptiste Andrien & Florence Corin. Bruxelas: Éditions Contredanse, 2014. 1 DVD-ROM (375 min), color. Tradução sob minha responsabilidade do original: “So we are like a microcosme of the whole universe. Because we are part of the universe, we are part of nature. It is all one”. 7 ANNA HALPRIN, dancing life/danser la vie. Produção: Contredanse – Baptiste Andrien & Florence Corin. Bruxelas: Éditions Contredanse, 2014. 1 DVD-ROM (375 min), color. Tradução sob minha responsabilidade do original: “And everything that we realize about the world lives through our body. It can´t live anywhere else, except with us”. 8 ANNA HALPRIN, dancing life/danser la vie. Produção: Contredanse – Baptiste Andrien & Florence Corin. Bruxelas: Éditions Contredanse, 2014. 1 DVD-ROM (375 min), color. Dentro do DVD-ROM citado há vários pequenos vídeos. O trecho citado encontra-se no vídeo chamado “Collective Energy”, dentro da palavra “espaço”, do index. Tradução sob minha responsabilidade do original: “Dance is not about you. It is about us”.
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125). Uma experiência, portanto, nunca será neutra e, logo, uma proposta conceitual que dela surja tampouco será. É possível se aproximar da prática e do pensamento de outrem ou de algo se baseando na imaginação e/ou na empatia, mas não de fato vivenciá-los. Assim, pensar corpoespaço a partir de si é perceber-se de um lugar possível e até onde é possível. “Existe uma frase de Kierkegaard que diz: ‘É necessário encontrar um lugar desde onde olhar’. Ou seja, primeiro temos que encontrar um lugar, somente depois podemos olhar. Se olhamos sem nos apoiarmos em um lugar, não veremos nada” (FERNÁNDEZ-SAVATER, 2011, p. 1)9. E é desse lugar corpoespaço, que se percebe em movimento, que a criação floresce e de onde se desabrocham os conceitos. De um lugar que parte de si, mas consciente e aberto para o outro, dentro de sua natureza coletiva. Tudo que se cria é crença. Feita de dente de leão.
Adoção. Doação. Digestão. Transformação.
Mastigo o que trago e assopro em conta gotas até oceanar e cobrir em véu a terra vermelha. Aquela mesma que entranha por meus pés constituindo-me de pó e poros. Danço o ar que me desenha. Recrio. Transcrio. Dobro as certezas como origamis e as desdobro em incertezas amassadas para desvendar o desconhecido. Espero o movimento mover-se, em seu silêncio, arriscando-me borboleta, edifício e chão. 9 Tradução sob minha responsabilidade do original: “Hay una frase de Kierkegaard que dice: ‘Hay que encontrar el lugar desde el que mirar’. Es decir, primero tenemos que encontrar un lugar, sólo luego podremos mirar. Si miramos sin apoyarnos en un lugar, no veremos nada”.
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Tudo que se cria é crença. Aposta. Tesão. Faço amor arranha-céu, em cada esquina, a cada gesto. Faço amor relva a cada textura, a cada protesto. Faço amor cimento semente que brota verde. Tudo que se cria é crença. Invenção. Imaginação. “Imaginar, em termos humanos é existir” (MANGUEL in TAVARES, 2012, p.11)10. A imaginação é órgão sensorial. Existimos alicerçados nos conceitos que criamos, mas antes, para criá-los, existimos de acordo com a maneira pela qual vivenciamos mundo. Um conceito não vivenciado é um conceito vazio. É preciso sentir o cheiro do jasmim para sabê-lo olfato. É preciso queimar a carne para sabê-la queimadura. Beijar para paladar o beijo. Respirar para sentir-se ar. É preciso destroçar-se para sentir-se cascalho. Mover-se para saber deslocar. Disfrutar o oceano para sabê-lo sal, horizonte e água. Caso contrário, o que teremos é apenas uma ideia do que seja o cheiro do jasmim, a queimadura, o beijo, o ar... Conceitos podem incluir ideias, mas não se consolidam nelas, consolidam-se no fazer. A coreografia das palavras escritas nesse papel só se compõe pelo corpoespaço vivente e vivenciado e só se mantém viva se praticada por outros corposespaços que a transformam. Corpoespaço em ação se constitui pelos sentidos em experiência e pela memória que se cria na arquitetura do corpo em carne, ossos, articulações, órgãos, sensores. Desse movimento em compasso consciente surge a dança que improvisa saberes teórico-práticos baseados em seu arquivo-memória.
10 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “Imaginar en términos humanos, es existir”.
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Estamos conectados com o mundo por meio de nossos sentidos. Os sentidos não são meros receptores passivos de estímulos, e o corpo não é apenas um ponto de observação do mundo em uma perspectiva centralizada. Nem é a cabeça o único lugar do pensamento cognitivo, uma vez que nossos sentidos e toda nossa existência corpórea estruturam, produzem e armazenam diretamente conhecimentos existenciais silenciosos. O corpo humano é uma entidade sábia. Todo o nosso ser neste mundo é um modo sensorial e corporificado de ser, e é exatamente este senso de ser que constitui a base de conhecimento existencial. “[A] compreensão não é um estado que chega à realidade humana vinda do exterior; ela é uma maneira característica de existir”, como afirma Jean-Paul Sartre (PALLASMA, 2013a, p. 14).
Constituímos, portanto, conhecimento existencial e, considerando o modo como nos sentimos e nos percebemos mundo, delineamos o que chamamos de realidade. E realidade também é perspectiva corpórea. A realidade se constitui corpoespaço. E não existe um único corpoespaço, mas múltiplos, que se namoram, se repelem, se consubstanciam, se entrelaçam, se destroem, se questionam, se distanciam, se aproximam, copulam, se desfazem, se sobrepõem, se apoiam, compõem mutuamente. Assim, a realidade também se despetala em múltiplas possibilidades, razões e leituras distintas. Ao se mover, “cada ângulo gera uma mudança acerca da leitura do movimento” (HAMILTON, 2015)11. O corpoespaço que observa também lê o movimento de onde está e dependendo de seu ângulo de observação também terá uma leitura específica da mudança de cada ângulo do corpoespaço movente. E por isso, como matéria dança, é preciso ter critério dentro da subjetividade: entender corpoespaço a partir de si é compreender-se em relação e não em isolamento. No mesmo workshop já citado neste texto, Julyen Hamilton disse três frases que, embora tenham sido compartilhadas em momentos distintos, aqui são agrupadas: “Espaço permite relação”, “Espaço é uma questão e portanto algo que diz respeito a uma pessoa ou mais”, “O espaço convida” (HAMILTON, 2015). Mais além, corpoespaço só existe em relação, especialmente no movimento dançante. 11 Frase dita no workshop anteriormente citado neste texto, ministrado por Hamilton em Bruxelas.
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Sendo assim, não cabe tudo nessa dança. Mas que dança? Em primeira instância é preciso saber que dança, quem/onde dança, em relação a que/ quem dança? Buscando clareza por meio dessas e de outras questões, cabe o que se dá em relação, em negociação, em escuta, em acordo. Cabe o que o diálogo permite, em função de uma composição, em função da obra artística. Era apenas uma. Em contemplação. A lua gorda amarela, pescada pela estrela, saltou da água e pendurou-se para secar. De lá do alto mergulhou-se luz branca como farol no mar. Invadida me vi brilho boiando, degustando voo ligeiro e leve. Perdi o peso e ouvi um sussurro: se queres contemplar, entrega-te a nadar. As conexões se estruturam nas experenciações. É no mergulho que percebemos peso e ausência de peso, encontramos direções ou perdemos orientação, aplainamos, nos afogamos, resistimos ou caímos e levantamos. “O homem, pela simples presença, impõe um esquema no espaço. Na maioria das vezes, ele não está consciente disso” (TUAN, 2013, p. 51). Fazerse consciente é dialogar, interagir, posicionar-se. Como na poesia, é perceberse lua e mar. Anna Halprin, em vídeo que comenta a obra de Leonardo da Vinci, o Homem vitruviano (1490), diz: Então ele tinha a sombra da figura com as pernas se juntando e os braços subindo. E ele estava tentando comunicar a percepção de que o corpo está indo verticalmente para cima. Agora, se você faz uma posição para o alto, é possível fazê-la daquela forma, mas se você tem o céu lá no alto e se relaciona com ele, todo o corpo muda e vai para o alto. Então, isso tem uma dinâmica diferente e você se sente não na posição de encarar o céu, mas de tornar-se céu (ANNA HALPRIN, 1:39 min).12 12 ANNA HALPRIN, dancing life/danser la vie. Produção: Contredanse – Baptiste Andrien & Florence Corin. Bruxelas: Éditions Contredanse, 2014. 1 DVD-ROM (375 min), color. Dentro do DVD-ROM citado há vários pequenos vídeos. O trecho citado encontra-se no vídeo chamado “Leonardo da Vinci”, dentro da palavra “espaço”, do index. Tradução sob minha responsabilidade do original: “Then you have the shadow of the figure with the legs coming together and the arms going up. And so he is trying to communicate the sense
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Perceber-se céu, lua, mar, rua, prédio. Em Returning home (2003)13, vídeo de Anna Halprin, essas relações são visíveis. É possível fruir seu corpomar, corpoárvore, corpovento e as trajetórias coreográficas corpóreoespaciais que transformam continuamente os movimentos integrados da arte como celebração da natureza e da natureza como manifestação artística. Mover-se e ser movido. “O espaço [...] é dado pela capacidade de mover-se” (TUAN, 2013, p. 22). E o movimento só ocorre como espaço. Espaçocorpo, corpoespaço. Toco a pedra, que me toca pedra que sou. Descasco areia e recolho os grãos para tragá-los junto à enchente que me dilui. Devoro ar para flutuar e chão para ser gravidade. Danço o que me move e movo o que me dança. Revigorar os sentidos do corpoespaço, rasgar seus automatismos desprovidos de consciência, deslocá-lo dos campos familiares de atuação ou mesmo fazê-lo notar esses campos desde outras percepções ampliadas expande as perspectivas de criação e potencializa as tomadas de decisão na dança. Essa compreensão traz uma mudança de paradigmas sobre como nos colocamos no mundo ou sobre como compomos artisticamente. Rudolf Von Laban (1879 - 1958), já no início do século XX, propunha um pensamento prático e uma experimentação corpóreas que lidavam a todo momento com a questão espacial e a relação homem/natureza. Para Laban, a experiência da natureza significava dança. Assim, qualquer pessoa que fosse capaz de experienciar a natureza poderia dançar. A natureza expunha protótipos espaciais e dinâmicos, os quais ele também that the body is going vertically up. Now if you do an up position, you might do it like that. But if you got the sky up there and you relate to the sky, the whole body shifts and the whole body goes up. So it has a difficult dynamic and you feel yourself not in a position facing the sky but you feel yourself becoming sky”. 13 Um pequeno trecho do vídeo pode ser consultado em: https://www.youtube.com/ watch?v=EvyI2MXzy4c
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encontrou no corpo e no movimento. Ele afirmava que as estruturas do corpo, movimento e natureza são harmonicamente conectadas: harmonia era o resultado das inter-relações ativas entre a ação do corpo (movimentos) e seus modelos orgânicos encontrados na natureza (protótipos espaciais e dinâmicos, como as formas cristalinas) (GRAU; JORDAN, 2000, p. 58)14.
Ele já considerava que o espaço era concebido com base no corpo do bailarino, na dança. Criou uma estruturação de estudos do corpo e do espaço que consistia em distintas camadas organizativas que podiam entrelaçar no processo técnico-criativo. A Corêutica ou Harmonia Espacial, considerada teoria do espaço, tem como pré-requisitos a consciência e a maestria da orientação direcional e a apreciação da extensão e da forma do movimento. A noção de extensão e tamanho do movimento está associada à estrutura do corpo humano, como a extensão vertical e bilateral, e com a noção da esfera do movimento que pode crescer e encolher pelo alongamento e flexão das articulações. Laban distinguia o espaço em geral pelo espaço alcançado imediatamente ao redor do corpo e o chamava de cinesfera (MALETIC, 1987, p.74).15
As relações espaciais na Corêutica eram definidas por princípios harmônicos, que eram pensados em uma ordem lógica subjacente à evolução de formas no espaço. Essas formas eram percebidas por escalas de direções espaciais de modo central, periférico e transversal. Para exercícios de espaço, Laban utilizava as formas cristalinas, particularmente o octaedro, o cubo e o icosaedro. “Os cinco poliedros ou sólidos platônicos (o cubo, octaedro, tetraedro, icosaedro, e dodecaedro), servem não apenas como esquematizações 14 Tradução sob minha responsabilidade do original: “For Laban, the experience of nature meant dance. Thus, everyone who was able to experience nature could dance. Nature exposed spatial and dynamic prototypes, which he also found in the body and the movement. He held that the structures of the body, movement and nature are harmoniously connected: harmony was the result of the active interrelations between body action (movements) and its organic models found in nature (spatial and dynamic prototypes, such as crystalline forms)”. 15 Tradução sob minha responsabilidade do original: “The notion of extension and size of movement is associated with the structure of the human body, such as the vertical and bilateral extension, and with the notion of the sphere of movement which can grow and shrink by means of the stretching and bending joints. Laban distinguished space in general from the reach space immediately around the body and named it kinesphere”.
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ou visualizações das direções espaciais de ambientais, mas também como metáforas para a forma dinâmica das formas expressivas de movimento” (MALETIC, 1987, p.67)16. E foi no icosaedro que Laban encontrou a forma cristalina que mais correspondia aos potenciais do movimento humano. Se por um lado a Corêutica lida com aspectos estruturais do movimento dentro do ritmo das formas, a Eukinética abarca as ocorrências temporais e dinâmicas. A Eukinética era considerada por Laban “[...] uma parte do estudo da corêutica na qual a estrutura dinâmica pode ser melhor determinada” (MALETIC, 1987, p.97)17. É o estudo qualitativo do movimento, configurado com base em quatro fatores: peso, espaço, tempo e fluência. A combinação dos fatores de movimento gerou a organização de oito ações básicas de esforço: deslizar, flutuar, pontuar, sacudir, pressionar, torcer, socar, chicotear. Na primeira edição de The Mastery of Moviment on the Stage, Laban refere-se a Esforço como o impulso interno do qual o movimento se origina. […] Mais significativa é a correlação de Laban das atitudes em relação aos fatores de movimento e os vários níveis de consciência. Atitudes em relação ao espaço estão associadas à atenção e ao poder do homem de pensar, atitudes em relação ao peso com intenção e com sentir. Atitudes em relação ao tempo com decisão e intuição, e atitudes com relação ao fluxo com progressão e sentimento (MALETIC, 1987, p. 100) 18.
Apoiado nesses princípios, Laban defendia que uma arte temporal só conseguiria atingir seu completo desenvolvimento com uma notação que pudesse capturar, preservar e examinar suas criações efêmeras (MALETIC, 1987, p. 113). Desse modo, ele criou uma notação de movimentos, em 16 Tradução sob minha responsabilidade do original: “The five polyhedra or Platonic solids (the cube, octaedron, tetrahedron, icosahedron, and dodecahedron), serve not only as visualizations or schematizations of the environmental space directions, but also as metaphors for the dynamic shaping of expressive movement forms”. 17 Tradução sob minha responsabilidade do original: “[...] as a part of the study of choreutics in which the dynamics structure of movement can be determined”. 18 Tradução sob minha responsabilidade do original: “In the first edition of The Mastery of Moviment on the Stage, Laban refers to Effort as the inner impulse from which movement originates. […] Most significant is Laban´s correlation of the attitudes towards motion factors and the various levels of consciousness. Attitudes towards space are associated with attention and man´s power to thinking, attitudes towards weight with intention and with sensing, attitudes towards time with decision and intuiting, and attitudes toward flow with progression and feeling”.
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princípio chamada de Choreographie, em seguida de Kinetographie (1928), que em sua etimologia grega significa “escrita do movimento” e, finalmente, estabelecida conforme passou a ser conhecida mundialmente, como Labanotation, sendo este último termo sugerido pelo Dance Notation Bureau de Nova York e aceito por Laban. Por meio de sua investigação teóricoprática, Laban organizou, de modo potente, uma estruturação de pesquisa do corpo em movimento em relação ao espaço, que criava/cria possibilidades de improvisação para a criação e por isso seus estudos ainda se mantêm como grande referência na área de Dança. Isadora Duncan (1877 – 1927), contemporânea de Laban, também desenvolvia trabalhos baseados na relação com a natureza, conectada com os movimentos das plantas, do vento, do mar, das nuvens, entre outros estímulos. Seu universo profissional, que se pautava na improvisação, desconstruiu paradigmas acerca da técnica-criação em Dança, que até então era fortemente embasada nas práticas de balé clássico, ensinado dentro de uma estrutura estética formal e rígida. Considerada uma das precursoras da Dança Moderna, era conhecida por suas ações de espírito revolucionário. Dançava descalça, de cabelos soltos e túnicas vaporosas e buscava inspiração na cultura grega, rompendo os padrões de dança estabelecidos na época. Isadora foi uma figura que criou rupturas como bailarina e professora de dança e, por meio de suas práticas, deixou resíduos históricos que reverberam até a atualidade. Uma de suas estudantes que ficou mundialmente reconhecida foi Anna Halprin, que embora tenha seguido um percurso artístico muito distinto do de Isadora, demonstra que manteve o interesse pela conexão que pode ser estabelecida entre dança e natureza, entre movimento do corpo e movimento do espaço. Anna Halprin (1920), que estudou não apenas com Isadora Duncan, mas também com Ruth St. Denis, ao longo de sua carreira passou ainda por outras influências, como seu marido, o arquiteto Lawrence Halprin, que conheceu na Universidade de Wisconsin, e Margaret H’Doubler, sua professora nessa mesma instituição (1938). Essas duas últimas referências lhe trouxeram o interesse por pesquisar mais profundamente aspectos da anatomia, da improvisação e da relação arquitetônica do corpo. Lawrence havia estudado na Universidade de Harvard com arquitetos vinculados à Bauhaus, tais como Marcel Breuer, Walter Gropius e Laszlo Moholy-Nagy. 96
[...] as ideias de Moholy-Nagy e outros pensadores da Bauhaus, junto às conversas com Lawrence, provocaram Anna a pensar sobre a natureza do ‘espaço coreográfico’, e ela mais tarde se tornaria uma das pioneiras da dança (pós-moderna) e da performance fora do teatro e dentro de uma gama de espaços públicos (MERRIMAN, 2010, p. 433).19
Anna reconfigurou a ideia de que o espaço performático deveria ocorrer no teatro. Avançando nos experimentos realizados fora do teatro, que como já vimos, foram iniciados por Laban e Duncan, Anna propõe a dança como ato performático em lugares como a praia, as ruas, o alto da montanha, pontos de ônibus etc. Por meio de seus estudos, percebeu que os padrões de movimentos atuais de um corpo eram refletidos por uma relação holística total com tudo que ocorria em sua vida (ANNA HALPRIN, 00:37). As relações entre corpo e espaço ficavam cada vez mais íntimas e configuravam-se cada vez mais como unidade perceptível. Em 1952, quando Anna e Lawrence se mudaram para Kentfield, Lawrence projetou com Arch Laureter um deck de dança a céu aberto, feito de madeira, suspenso em uma colina íngreme e permeado por árvores. Ele foi projetado para a experiência do movimento e como não possuía realmente um centro como em uma sala usual, provocou em Anna uma mudança de perspectiva acerca do uso do espaço. Dentre seus estudos, a dedicação do casal à compreensão do movimento em sua conexão espacial se apresentava de modo significativo. Lawrence afirmava: A essência de meu interesse pelo movimento e pela coreografia é que eu gosto de projetar sempre para pessoas e pessoas nunca estão estáticas. Elas estão sempre se movendo. O único modo que eles podem perceber sua relação com o ambiente é movendose através dele ou sendo afetados por ele de alguma forma. Como eu não projeto apenas para apreciação visual, mas também muito fortemente para o impacto social do projeto e como as pessoas reagirão e serão influenciadas por ele, eu tive que estudar com minha 19 Tradução sob minha responsabilidade do original: “[...] the ideas of Moholy-Nagy and other Bauhaus thinkers, coupled with conversations with Lawrence, prompted Anna to think about the nature of ‘choreography space’, and she would later go on to become one of the pioneers of (post-modern) dance and performance out of the theatre and into a range of public spaces”.
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esposa como o movimento das pessoas afeta o ambiente interativamente e como o ambiente as afeta. Então, eu passei muito tempo pensando sobre o movimento através do espaço interagindo com ambientes e como ele afeta o projeto do ambiente onde as pessoas irão se mover (ANNA HALPRIN, 0:16).20
Essa compreensão de um corpoespaço movente, que percebe a dança como arquitetura e a arquitetura como dança, a natureza como dança e a dança como natureza, a arquitetura como natureza e a natureza como arquitetura, reconfigura os modos de ação e compreensão dos conceitos que os sustentam. Anna (MERRIMAN, 2010, p. 433) aborda como a forma não retangular do deck forçava uma reorientação do bailarino, uma vez que os pontos referenciais de um cubo deixavam de existir (frente, trás, lados e alto): “[...] o espaço explode e se torna móvel. Movimento dentro de um espaço movente, eu descobri, é diferente de movimento dentro de um cubo estático” (HALPRIN, 1956 apud MERRIMAN, 2010, p. 433)21. Alguns dos bailarinos que estudaram com Anna deram continuidade a esse movimento de vanguarda que vinha se estruturando e disseminando. Trisha Brown, Simone Forti, Yvonne Rainer, Meredith Monk e Robert Morris são exemplos. Juntos, eles foram parte da Judson Dance Theater, um coletivo de bailarinos, músicos e artistas visuais, que performavam na Judson Memorial Church, em Manhattan, em Nova York, entre os anos de 62 e 64. A eles se somavam Steve Paxton, Deborah Hay, David Gordon, Lucinda Childs, entre outros, que em seguida seguiram caminhos muito 20 Dentro do DVD-ROM citado há vários pequenos vídeos. O trecho citado encontra-se no vídeo chamado Lawrence Halprin: changing places (1986), dentro da palavra “espaço”, do index. Tradução sob minha responsabilidade do original: “The essence of my interest in movement and in choreography is that I like to design always for people and people are never static. They are always moving. The only way that they can realize their relation to environment is by moving through it or being affected by it someway. Since I don´t just design for visual appreciation of design but also very strongly for the social impact of the design and how people are going to react to it and how they are influenced by it, I have had to study with my wife how people’s movement affects the environment interactively and how the environment affects them. So I´ve spent a lot of time thinking about movement through space interacting with environments and how it affects the design of the environment where the people are going to move in”. 21 Tradução sob minha responsabilidade do original: “[...] the space explodes and becomes mobile. Movement within a moving space, I have found, is different than movement within a static cube”.
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próprios, mantendo, até a atualidade, produções artísticas e processos de formação que influenciam a cena contemporânea. Os bailarinos incorporavam a forma dos movimentos e davam vida a espaços e, nas performances de vanguarda dos anos 1960, cada vez mais trabalhavam fora de espaços tradicionais de performance e treinamento, como estúdios e teatros, levando a dança para as ruas, rompendo as divisões convencionais entre performer e público, desafiando ‘as fronteiras entre dança e movimentos cotidianos e reivindicando todo e qualquer movimento humano como dança potencial. Os coreógrafos e bailarinos de vanguarda começaram a repensar e explorar a relação entre práticas de performance incorporadas e espaços de performance, habitando espaços e ambientes arquitetônicos de modos criativos e inventivos. Poderíamos rotular esses bailarinos e coreógrafos como geógrafos leigos, escrevendo e performando em espaços por meio de seus movimentos incorporados e animações da paisagem (MERRIMAN, 2010, p. 430).22
Traços que movem, dobram-se, desdobram-se, curvam-se e se retorcem, compondo novas rotas por meio da descomposição da estrutura, desestruturando para reestruturar, mapeando e remapeando coreograficamente movimentos por intermédio de movimentos de ruptura que reverberam historicamente e revelam genealogias. A dança vivida e percebida a partir de outros lugares. A Judson Dance Theater nasceu de um curso orientado por Robert Dunn nos anos 60. John Cage, parceiro de trabalho de Merce Cunningham (que também estudava com Anna Halprin), convidou Dunn – que era músico, e não bailarino – a oferecer esse curso voltado para composição no próprio estúdio de Cunningham, localizado no prédio do Living Theater. O nome Judson Dance 22 Tradução sob minha responsabilidade do original: “Dancers’ embodied movements shape and enliven spaces, and in the 1960s avant-garde performances increasingly worked outside conventional training and performance spaces such as the studio and theatre, taking dance into the streets, breaking down conventional divides between performer and audience, and challenging ‘the boundaries between dance and day-to-day movement and claim[ing] any and all human movement as potential dance. Avant-garde choreographers and dancers started to rethink and explore the relationship between embodied performance practices and performance spaces, inhabiting architectural spaces and environments in inventive and creative ways. We could label these dancers and choreographers as lay geographers, writing and performing spaces through their embodied movements and animations of landscape”.
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Theater surgiu de uma ação proveniente do grupo de novos coreógrafos que frequentava o curso quando, no verão de 1962, o grupo procurava um local para apresentar seu trabalho profissional experimental em formato de concerto e foi acolhido pela Judson Memorial Church, uma congregação protestante liberal situada na Washington Square, em Greenwich Village (BANNES, 1993, p. xi). Dentro dos processos de aula, Dunn utilizava em seu trabalho referências do método do acaso (como ficou conhecido no Brasil)23, trabalho que Cunningham desenvolveu a partir de 1951. Este processo do acaso, após o bailarino e coreógrafo ter lido O Livro das Mutações (I Ching) e tornar-se adepto do zen-budismo, por influência de Cage, é um dos pontos de maior relevância do pensamento de sua obra: “frases coreográficas previamente compostas seriam submetidas a sorteios, através do I Ching, de moedas e de outros meios, para decidir em qual ordem elas se sucederiam, qual seu padrão rítmico e sua duração, para quantos e quais bailarinos seriam atribuídas essas frases e como distribuir tudo no espaço” (AMORIM; QUEIROZ, 2002, 88-89). Nesta visão simultânea dos corpos em movimento, não há foco central, exceto onde o espectador, se não estiver absorvido pelo efeito total, se concentra em cada momento. [...] [...] O termo event, cunhado por Cunningham, designa seções de danças coreografadas previamente que, por meio de sorteio, tem suas partes recortadas, reordenadas e ‘coladas’ de modo que em cada apresentação uma entidade autosuficiente do repertório é formada de modo único. Devido às possibilidades dos procedimentos de acaso e aleatoriedade, um event nunca é igual a outro (WOSNIAK, 2010).
Jogar com as possibilidades de composição dos corposespaços em disposições e tempos variados, com relações cambiáveis, desconfigurava as certezas e implicava um outro estado desses corpoespaços envolvidos no ato performático (intérpretes-criadores, técnicos e plateia). O curso de Dunn, portanto, já iniciou influenciado por esses deslocamentos de pensamento23 Em inglês o método ficou conhecido como chance operation (WOSNIAK, 2010).
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ação que vinham sendo experimentados. Os primeiros cinco estudantes foram Paulus Berenson, Marni Mahaffay, Simone (Forti) Morris, Steve Paxton e Yvonne Rainer (BANNES, 1993, p. 7). Steve Paxton, oriundo do Arizona, estudou com Cunningham, Marta Graham, Doris Humphrey e José Limón. Sobre o período em que estava no curso de Dunn, Steve considera: O trabalho que fiz lá foi antes de tudo expulsar todos os meus “porque-nãos”, para atravessar meus círculos de “porque-não” tanto quanto podia até me entediar com a questão. “Por que não?” foi uma palavra de ordem naquele momento. Era uma época muito permissiva (PAXTON, 1975 apud BANNES, 1993, p. 9).24
Este modo de pensamento-ação desvela uma atitude criativa em relação às práticas de dança, que partiam de processos totalmente experimentais. Por que não experimentar, por que não fazer, por que não arriscar? Apesar das sólidas referências, a experiência e a possibilidade de se desapegar de regras e formatos específicos de qualquer ordem (técnica, criativa, formativa) traziam a Paxton uma liberdade de ação do corpoespaço que podia ampliar os espectros de criação e gerar produção de conhecimento com base no próprio fazer artístico. Risco. (Ar) risco. Risco o ar, o outro, entre um e outro. Peso em gravidade. Horizontalizo. Desagravo o espaço e resisto-me corpo ligeiro em vertical. Em suspenso, crio outro tempo, conecto-me, e em um momento sou eu e outro de distintos cantos. Canto corpo que canta dança, que canta espaço, que canta canto, a cada canto. 24 Tradução sob minha responsabilidade do original: “The work that I did there was first of all to flush out all my ‘why-nots’, to go through my ‘why not’ circles as far as I could until getting bored with the question. ‘Why not?’ was a catch-word at that time. It was a very permissive time”.
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Não por acaso, a partir de 1972, provando vida em movimento, o bailarino e coreógrafo Steve Paxton começou a desenvolver um sistema de movimento chamado Contact Improvisation. A forma improvisada da dança é baseada na comunicação entre dois corpos em movimento que estão em contato físico e sua relação combinada às leis da física que governam seu movimento – gravidade, momentum, inércia. O corpo, para se abrir a essas sensações, aprende a liberar o excesso de tensão muscular e abandonar uma certa qualidade de obstinação para experienciar o fluxo natural do movimento. A prática inclui rolar, cair, ficar de cabeça para baixo, seguir um ponto físico de contato, suportar e dar peso ao parceiro. Improvisações de contato são diálogos físicos espontâneos que abarcam trocas desde a pausa até altos níveis energéticos. O estado de alerta é desenvolvido para trabalhar um estado energético de desorientação física, confiando nos instintos de sobrevivência de cada um. É um jogo livre com equilíbrio, em que se autocorrige os movimentos incorretos e se reforçam os corretos, trazendo adiante uma verdade físico/ emocional sobre um momento compartilhado que deixa os participantes informados, centrados e estimulados. Primeira definição de Steve Paxton e outros, 1970, de CQ, Vol 5:1, Fall 1979 http://www.contactquarterly. com/contact-improvisation/about/)25
É perceptível, com base na definição que Paxton delineia sobre o sistema de movimento que produz, que conceitos de física mecânica sobre corpoespaço são estudados como prática. Tomar consciência de como o corpo se autoorganiza para sobreviver é um dos pontos de ação explorativa. A “pequena 25 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “The improvised dance form is based on the communication between two moving bodies that are in physical contact and their combined relationship to the physical laws that govern their motion—gravity, momentum, inertia. The body, in order to open to these sensations, learns to release excess muscular tension and abandon a certain quality of willfulness to experience the natural flow of movement. Practice includes rolling, falling, being upside down, following a physical point of contact, supporting and giving weight to a partner. Contact improvisations are spontaneous physical dialogues that range from stillness to highly energetic exchanges. Alertness is developed in order to work in an energetic state of physical disorientation, trusting in one’s basic survival instincts. It is a free play with balance, self-correcting the wrong moves and reinforcing the right ones, bringing forth a physical/emotional truth about a shared moment of movement that leaves the participants informed, centered, and enlivened”.
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dança” (stand ou small dance) potencializa a percepção de micromovimentos que realizamos para manter-nos em pé, em um exercício proprioceptivo. Ela consiste em encontrar uma posição cômoda de pé e ficar em pausa, apenas identificando os movimentos gerados pelo corpoespaço para manter-se nessa posição e como as alterações são constantes ainda que em aparente pausa. Dentro de um campo explorativo cinestésico também são estudados caminhos entre a horizontalidade e a verticalidade e seus deslocamentos possíveis, enfocando em quedas e rolamentos. A compreensão de como o corpo desliza ou rola após uma queda, para buscar uma maior absorção de impacto se faz, nesse caso, baseada nas influências que Paxton tem das artes marciais, em especial o Aikidô, cuja principal ação é a busca pela neutralização de ataques externos por meio de um caráter defensivo. O rolamento e o deslizamento também são utilizados no diálogo com o parceiro, de um ponto de contato. Por meio desse ponto, também, buscase suporte mútuo (suporto o outro ao mesmo tempo em que sou suportado e em que ambos somos suportados pelo solo). Esse ponto de contato não parte apenas das mãos. As mãos servem como ponto de apoio, mas não são elementos centrais nas relações estabelecidas. Pelo intercâmbio de pesos e pela compreensão de princípios envolvidos na realização de carregadas, em percepção corpóreoespacial, cria-se a possibilidade de identificação de dois organismos em um. Encontrar bases em posições de alinhamentos e movimentos em espirais, redobrar a atenção para o corpoespaço como um todo, ampliar as capacidades de ajustes corpóreo-espaciais percebidos na “pequena dança” e compreender as possibilidades adaptativas individuais e desses indivíduos em relação expande o poder tridimensional criado pelo movimento. A escuta e a disponibilidade corpóreo-espaciais são fundamentais para que haja ativação do movimento e entrelaçamento com o outro. A dança Ouiji colabora para aguçar esse processo de escuta e proporcionar mudanças imediatas na relação em movimento com base em trocas sutis de pressão.26 É perceptível como corpoespaço começa a se articular de um outro ponto de vista. As relações frontais e verticais fortemente destacadas no balé se dissolvem. As estéticas modernas demarcadas principalmente nas danças 26 Essas referências sobre questões técnicas do contato improvisação podem ser encontradas no site: http://www.bodyresearch.org/contact-improvisation/fundamentals-of-contact-improvisation/.
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de Isadora Duncan (movimentos iniciados pelo plexo solar com fluxo contínuo), de Marta Graham (com enfoque em contração e relaxamento), de Doris Humphrey e de seu sucessor José Limón (com enfoque em quedas e recuperações) são questionadas e revistas. O movimento cria maiores probabilidades de trajetória, pode surgir e terminar em qualquer ponto do corpoespaço, articula-se e se desarticula. Contato Improvisação, como várias outras artes de vanguarda que emergiram durante os anos 1960 e 1970, desafiaram premissas existentes sobre espacialidades tanto de performances como espaços-performance. Enquanto os coreógrafos de balé tradicionalmente focaram muito de sua atenção na aparência visual e no ‘design espacial’ dos movimentos dos bailarinos, subjugando a função do toque, som e cinestesia para as linhas e formas vistas por um público e emolduradas por um arco proscênio, performers contemporâneos de vanguarda e experimentais focaram muito mais em sensibilidades cinestésicas, experiências e espacialidades de práticas performáticas incorporadas, em que o fazer e o processo da performance podem ser considerados mais importantes que ver a performance. O foco é na dança como uma prática de movimento incorporada e processual que traz ‘transformações no espaço movimento’, engajando ‘a totalidade dos sentidos em dobrar tempo e espaço em novas formas cinestésicas’ (MERRIMAN, 2010, p.430).27
Desse modo, percebemos que o domínio das formas começa a dar lugar ao domínio dos sentidos, que geram formas em que o corpoespaço é percebido para além de suas estruturas físicas visíveis. Simone Forti, por 27 Tradução sob minha responsabilidade do original: “Contact Improvisation, like many other avant-garde performance arts which emerged during the 1960s and 1970s, challenged existing assumptions about the spatialities of both the performance and performance-spaces. Whereas ballet choreographers have traditionally focused much of their attention on the visual appearance and ‘spatial design’ of dancers’ movements, subjugating the role of touch, sound and kinaesthesia to the lines and shapes viewed by an audience and framed by a proscenium arch, contemporary avant-garde and experimental performers have focused much more on the kinaesthetic sensibilities, experiences and spatialities of embodied performance practices, where the doing and the process of performing may be deemed more important than viewing a performance. The focus is on dance as a processual, embodied movement practice which brings about ‘transformations in movement space’, engaging ‘the whole of the senses in bending time and space into new kinaesthetic shapes’”.
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exemplo, desenvolve aspectos sensoriais e cinestésicos em seu trabalho. Em seu percurso, teve como referentes Merce Cunningham, Anna Halprin e Marta Graham. A bailarina passa por períodos distintos de seu fazer artístico, que se inicia por construções minimalistas, seguido de estudos sobre os movimentos dos animais. Nas últimas duas décadas, ela começou a estruturar um trabalho que desenvolve até a atualidade, denominado Logomotion, uma forma de dança narrativa improvisacional, cujo cerne é encontrar a conexão entre a consciência do movimento e a consciência da linguagem. Sua criação transita sempre por aspectos cotidianos (observação de movimentos e assuntos do dia a dia) e pela relação com a natureza e, nesse sentido, o corpoespaço é sempre compreendido como unidade teórico/prática. Na entrevista cedida a Patrick Steffen, publicada na revista Contact Quaterly (https://community.contactquarterly.com/journal/ view/onallfours), Simone Forti diz: Quando eu me mudei para Vermont, onde vivi por 10 anos e praticava bastante a jardinagem, muitos dos meus movimentos e conversas tinham a ver com o jardim e com a política do jardim. Por exemplo, o orégano. É muito agressivo; ele vai tomar o poder e matar tudo que estiver ao redor e crescer. Menta e camomila também fazem isso. Existem várias plantas que querem tomar o poder. Então se você colocar uma ao lado da outra haverá combate. Isso era muito interessante! Quando você está trabalhando no jardim, você tem tempo para sonhar acordado, então eu tinha muitos pensamentos sobre política, sobre o que está ocorrendo no mundo; isso ocorria quando eu estava desenterrando as batatas! Então eu podia mesclar esses pensamentos juntos na performance e há algo realístico sobre como os pensamentos vieram. Hoje digo “corpo-mente-mundo”. [...] Então eu trabalho em uma linguagem que reflete as suspeitas, as intuições, os medos racionais e cinestésicos...28
Claramente, o discurso e o trabalho de Simone Forti iluminam uma discussão sobre corpoespaço, desdobrando a complexidade existente acerca desse tema. A relação com a natureza (plantas e animais, por exemplo) e sua 28 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “When I first moved to Vermont, where I lived for 10 years and did a lot of gardening, a lot of my moving and talking had to do with the garden and with the politics of the garden. For instance, oregano. It’s very
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percepção política, de meu ponto de vista, não aparece em seu trabalho como metáfora senão como a própria fisicalização do que é percebido como corpoespaço. Nesse sentido, há toda uma alteração de paradigmas que, como vimos, já vinha se construindo desde Laban, Duncan e Anna Halprin, na qual este corpoespaço que se movimenta e dança passa a assumir responsabilidades que ampliam seus aspectos de atuação perante a sociedade. Não existe um corpo apartado do espaço. O indivíduo não assiste as mudanças ocorrerem. Cada um é parte das mudanças, agindo e sofrendo as ações, nas cenas coletivas que se organizam como corpoespaço. O envolvimento é direto. Dance Constructions, de 1961, por exemplo, apresenta uma série de coreografias que reorientam o corpoespaço de diversas maneiras: o uso do próprio corpoespaço para escalar (Huddle), de cordas penduradas no teto (Accompaniment for La Monte´s 2 Sounds, La Monte´s 2 Sounds e Hangers), de tábua de madeira inclinada com cordas para sustentar o corpoespaço inclinado (Slant Board), de caixas (Platforms), de panelas com pregos (Sensor)29, gangorra (See-Saw) e caixas de madeiras que funcionam como carrinhos puxados por cordas (Rellers). De onde vejo, como vejo, o que vejo. Vejo? Perspectiva. Desliza. Corpo inclinado, corpo em (des)equilíbrio, corpo desarmado, corpo atravessado. Corpo suspeeeeeeeeeeeenso. Penso. aggressive; it will take over and it will kill everything around it and become bigger. Mint and chamomile do it too. There are many plants that want to take over. So if you plant them next to each other there are battles. That was very interesting! When you are working in the garden, you have time to daydream, so I had a lot of thoughts about politics, about what was happening in the world; it would come to me while I was digging out the potatoes! And so I would mix those thoughts together in the performance and there is something realistic about how thoughts come. Today I like to say “body-mind-world.” […] So I try to work in a language that reflects both the rational and the kinesthetic suspicions, intuitions, fears, …” 29 Alguns desses trabalhos podem ser vistos em: http://www.claragraziolino.com/es/ installaciones/1961-simone-forti-dance-constructions-2/ e a estrutura pensada para eles pode ser encontrada no livro Simone Forti: Thinking body.
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Contemporânea de Forti, Yvonne Rainer, que também estudou com Graham e Cunningham, é marcadamente influenciada pelo contato com o trabalho de John Cage, a partir da Judson Dance Theater, e, em função disso, também passou a trabalhar com base no minimalismo e em tarefas que buscam integrar movimentos cotidianos com vocabulários de dança. The mind is a muscle (A mente é um músculo, em tradução livre) é um de seus trabalhos mais conhecidos. A Mente é um Músculo combinava alguns novos trabalhos com peças que já tinham sido testadas em performance, incluindo diversas variações construídas com base na sequência de dança mais conhecida de Rainer, Trio A. Trio A serviu como uma espécie de coluna vertebral para a prática de dança de Rainer desde que foi performado pela primeira vez como A Mente é um Músculo, Parte 1, na Judson Church, em 1966. A peça de aproximadamente quatro minutos e meio (seu tempo exato depende de quem a está performando) compreende uma sequência de movimentos que não têm segmentação frasal, então, parece estar em movimento contínuo, sem momentos estáticos de registro. A coreografia persiste de um modo perpetuamente imprevisível, deliberadamente recusando padrões de dança conhecidos que se apoiam em arcos de desenvolvimento e clímax30 (WOOD, 2007, p.4).
Trio A era uma dança curta com uma longa frase de movimento e as tarefas que a orientavam eram a distribuição de energia, a ênfase na aproximação entre execução do movimento e percepção neural e a ausência de interação com o público. As tarefas faziam com que todo movimento evitasse o contato visual com os observadores por meio do movimento dos olhos ou da cabeça. Mais uma vez, o corpoespaço é reconfigurado em 30 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “The Mind is a Muscle combined some new work with pieces that had been tested in performance already, including a number of variations built from Rainer´s most well- known dance sequence, Trio A. Trio A has served as a kind of backbone to Rainer´s dance practice since it was first performed as The Mind is a Muscle, Part 1 at the Judson Church in 1966. The approximately four-and-ahalf minute piece (its exact timing depends on who is performing it) comprises a sequence of movements that are without phrasal segmentation and so appear to be continuous in motion, without still moments of registration. The choreography persists in a perpetually unpredictable manner, deliberately refusing familiar dance patterns that rest upon arcs of development and climax”. O vídeo de Trio A pode ser assistido em: https://www.youtube.com/watch?v=TDHy_ nh2Cno
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outros padrões e baseado em novos procedimentos, criando outros níveis de relação e contato por meio do movimento. Um ano antes, em 1965, Rainer já anunciava um deslocamento do modo de fazer/pensar a dança, quando escreveu seu famoso manifesto do não, que colaborou para a ruptura que se instalava na época. Seu manifesto dizia (http://www.1000manifestos.com/yvonne-rainer-no-manifesto/): Não ao espetáculo. Não ao virtuosismo. Não à transformação, à mágica e ao faz de conta. Não ao glamour e à transcendência da imagem da estrela. Não ao heroico. Não ao anti-heroico. Não às imagens do lixo. Não ao envolvimento do performer ou do espectador. Não ao estilo. Não ao exagero. Não à sedução do espectador pelas artimanhas do performer. Não à excentricidade. Não à movimentação ou ao “ser movido”.31
Com esse manifesto, Rainer esgarçou as fronteiras da dança e abriu espaço para outros modos de pensamento e ação, que incluíam a possibilidade de pensar o não movimento como movimento, como dança. E, como vimos, nos anos 70 perceberíamos a quantidade de movimentos existentes na pausa, conforme pode ser observado na já comentada “small dance”, proposta por Steve Paxton. 31 Tradução sob minha responsabilidade do original: No to spectacle. No to virtuosity. No to transformations and magic and make-believe. No to the glamour and transcendency of the star image. No to the heroic. No to the anti-heroic. No to trash imagery. No to involvement of performer or spectator. No to style. No to camp. No to seduction of spectator by the wiles of the performer. No to eccentricity. No to moving or being moved.
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Com uma atuação provocativa e questionadora das normas sociais vigentes, Rainer fez de seu próprio corpoespaço uma discussão política quando nos anos oitenta se tornou celibatária e ativista feminista, para anos depois assumir-se homossexual. Na década anterior, da companhia de dança Yvonne Rainer e de sua peça Continuous Project - Altered Daily nasceu o The Grand Union, um grupo de improvisação em dança que durou de 1970 a 1976 e contou com a participação de Barbara Dilley, Douglas Dunn, David Gordon, Nancy Lewis, Steve Paxton (nesse contexto, ele criou o Contato Improvisação) e Trisha Brown. Muitas das propostas que revolucionaram o pensamento sobre corpoespaço e movimento, as quais reverberam até hoje nas teorias e práticas da dança, ocorreram nesse período. Trisha Brown, que nessa época ficou fortemente conhecida pelo uso de espaços diversos em suas produções criativas, realizou importantes experimentações enfocadas primordialmente no estudo da gravidade e do peso do corpo. Em seu trabalho mais reconhecido, denominado Early Works (1963-75)32, a bailarina e coreógrafa utilizou prédios, galerias, espaços urbanos e naturais, ampliando as discussões acerca do corpoespaço. Em Man Walking Down the Side of a Building33, de 1970, uma pessoa desce caminhando na parede lateral de um prédio, do alto até o chão, em posição perpendicular ao solo. Corpo vertigem. Perceber o corpoespaço de ponta-cabeça, caminhando na horizontal de um prédio (ou melhor dizendo, caminhando horizontalmente como prédio), altera por completo seu posicionamento e sua perspectiva relacional. Em residência realizada com Julyen Hamilton, no ano de 2010, em diferentes espaços de Banyoles, na Espanha, ele dizia: “Para aprender a rolar, é preciso ser generoso para entender que você não estará por cima o tempo todo. Haverá o momento em que outro estará por cima e você estará por baixo”. As palavras de Julyen inspiram um pensamento político sobre as condições que o corpoespaço delineia em movimento, na dança, e sobre como as perspectivas alteram a própria percepção. 32 É possível ver imagens da remontagem de alguns trabalhos no seguinte endereço: https://www.youtube.com/watch?v=TCQhi_7xa9s 33 É possível ver imagens da remontagem deste trabalho em 2013 no seguinte endereço: https://www.youtube.com/watch?v=1wUI7CL5jaY
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Mais uma vez, entendemos que, para além da criação de metáforas, o que vemos aqui é a fisicalização, por meio de estruturas poéticas, das relações políticas reais em discussão. Queda e recuperação; os dispositivos de toque baseados no contato improvisação, a partir de uma afinidade mútua; a imobilidade na mobilidade e a mobilidade na imobilidade; as perspectivas de deslocamento; a compreensão de centro e periferia, de ausência de centro, de multiplicidade das funções, de foco e desfoco, de aparição e desaparição, de acionamento e cessão. Questões em movimento. Corpoespaço em ação contínua. Nesse contexto, pensar corpoespaço como elementos separados não faz sentido. Como aponta Mark Tompkins, em entrevista que foi cedida a esta pesquisa em julho de 2015, (TOMPKINS, 3m55s, arq 1): Corpo separado de espaço? Você está brincando? (risos) Isso não faz absolutamente sentido algum. SEM ESPAÇO, SEM CORPO. SEM CORPO, SEM ESPAÇO! São sempre corpos no espaço que criam composição. Quando você performa, a primeira coisa é ver onde você está, ler o espaço e seus potenciais e manter o escaneamento e a ação até o final. Um corpo nunca existirá sem o espaço. Isso é inconcebível.34
Desse corpoespaço em movimento na dança, talvez seja possível abraçar o conceito de Ebeling de espaço como extensão inorgânica da pele humana. No lugar de estar envolvido pelo espaço, o sujeito vivente se transforma em espaço. É como se a figura de Vitruvio não estivesse inscrita senão que coincidira com o círculo macrocósmico. Em essência, não há diferença entre microcosmos e macrocosmos; a figura é cosmos. Enquanto a pele demarca normativamente os intercâmbios entre o interior e o exterior, a membrana de Ebeling não conhece tais distinções; é um limite permeável. Tudo passa a formar parte de um contínuo animado maior que se libera para criar novos invólucros 34 Tradução sob minha responsabilidade do original: “Body separate from space? Are you kidding? (laughs) It makes absolutely no sense. NO SPACE, NO BODY! NO BODY, NO SPACE! It’s always bodies in space that make a composition. When you perform, the first thing is to see where you are, to read the space and the potentials and to keep scanning and acting until the end. There is never a body without a space. It’s unconceivable”.
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além do corpo e dos edifícios (PAPAPETROS apud AVILÉS, 2015, p. 17)35.
Apesar de ter sido aluno de Laban, os pensamentos de Ebelin instigam a pensar na explosão da cinesfera, para que corpoespaço avance na proposição de novas ordens e de novos sentidos. É essa a proposta conceitual defendida neste texto e com base na qual se desenvolvem os recortes aqui apresentados sobre os modos de pensar/fazer improvisação e composição em tempo real em Dança Contemporânea.
Composição em tempo real em dança: a experiência do ato A dança é um acontecimento presencial. Ainda que registrada em vídeo ou em fotografia, ela necessita do ato presencial para existir. Especialmente no século XXI, quando a tecnologia, primordialmente por meio das redes sociais, altera por completo os modos de relação e interatuação entre as pessoas, virtualizando os contatos, insistir na produção e na fruição de um ato presencial parece ser uma ação artesanal de resistência. Em maio de 2015, durante o workshop “Working with objects within the dance-space on stage”36, ocorrido em Berlim (Radialsystem), Julyen Hamilton apontou as relações entre ausência e presença nas práticas relacionais atuais: hoje, quando uma pessoa está presencialmente com alguém, fica permanentemente checando nos e-mails, mensagens de WhatsApp e no Facebook, aqueles que não estão com ela. É uma checagem constante da ausência. As relações, portanto, estão frágeis e instáveis e os sentidos de presença se alteram. É uma constante presença-ausência e ausência-presença. O corpoespaço está em dois ou mais lugares ao mesmo tempo (presencial e virtual), o que pode levá-lo, também, a não estar em 35 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “En el lugar de estar envuelto en el espacio, el sujeto viviente se transforma en espacio. Es como si la figura de Vitruvio no estuviera inscrita sino que coincidiera con el círculo macrocósmico. En esencia, no hay diferencia entre microcosmos y macrocosmos; la figura es cosmos. Mientras que la piel demarca normativamente los intercambios entre el interior y el exterior, la membrana de Ebeling no conoce tales distinciones; es un umbral impermeable. Todo pasa a formar parte de un continuo animado mayor que se libera para crear nuevas envolventes más allá del cuerpo y los edificios”. 36 Tradução sob minha responsabilidade: “Trabalhando com objetos dentro da dançaespaço em cena”.
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lugar algum metaforicamente. Ainda que aja em múltiplos lugares, não se permite experienciar nenhum desses lugares e patina sobre eles, de modo superficial. Como corpoespaço, por um lado, esse novo modo de se relacionar (já não tão novo assim) gera uma liberdade maior de deslocamento, pois a estabilidade tende à estática. Por outro lado, a fragilidade traz a todo momento um estado de tensão, pela grande quantidade de informações que promove, geradora de novas ações momentâneas em cadeia, que apresentam fatores surpresa. Colocar algo em tensão é fazê-lo passível de dissolução. Aliás, é o que já exprime a etimologia do verbo latino tendere. Aqui, tensão (de tendere) é, originalmente, “ter com duração (de tempo), alongar, estender”. Aquilo que se alonga, que se es-tende, portanto, não se sustenta definitivamente, é “tênue” (DE OLIVEIRA, 2004, p. 10).
Contextualizando a etimologia da palavra tensão na atualidade, percebemos que os tempos de alongamento são cada vez mais curtos. Nada se estende por muito tempo na sociedade, portanto, as dissoluções se dão de modo mais rápido. Como produzir conhecimento baseado nisso, se continuamente uma informação dilui a outra? Como realizar pesquisa, que pressupõe aprofundamento e longa extensão de estudo, no momento das práticas de dissolução? Como lidar com uma prática presencial de dança em um universo de presenças-ausentes? Algumas dessas questões povoam este texto, que não pretende respondê-las, mas problematizá-las a fim de colaborar com possíveis reflexões. A improvisação em Dança Contemporânea pode lidar com esse campo de tensão e conflito. Por isso, os improvisadores precisam insistir nas práticas experienciais constantes, a fim de que estejam capazes de lidar com a tensão criada pelo desconhecido no momento da produção artística, que é uma prática considerada efêmera. Na etimologia da palavra grega Ephemeros, encontramos os significados de Epi, que significa “sobre”, e de Hemerai, que correspondente à “dia”. Sobre o dia. Aquilo que só existe um dia. Concomitantemente, a improvisação pressupõe estudo, atenção. Uma qualidade de atenção íntegra, experienciada, presencial. 112
A palavra atenção vem do latim attentio, -onis, que significa aplicação, esforço, cuidado. A palavra cuidado é oriunda do latim cōgitātu-, e está vinculada à reflexão, ao pensamento. Algo que exige reflexão e pensamento também exige investigação e aprofundamento, o que pressupõe constância e extensão do tempo. Aqui se instala um paradoxo. Aliás, o próprio ato de escrever sobre improvisação, de modo não improvisado, já se configura como um paradoxo em si. A improvisação, portanto, é algo que ocorre no tempo presente (aqui e agora), o qual se encontra cada vez mais veloz e instável, mas com base em um campo de conhecimento que vem sendo construído ao longo do tempo, ou seja, alicerçado em questões que, de certo modo, estabilizam-se como suporte no corpoespaço experienciado, resistem ao tempo. A palavra latina durar significa exatamente “resistência ao tempo”. Há como algo ser efêmero e duradouro ao mesmo tempo? A intuição de Roupnel afirma: 1.
O caráter absolutamente descontínuo do tempo.
2.
O caráter absolutamente puntiforme do instante.
Portanto, a tese de Roupnel realiza a aritmetização mais completa e mais franca do tempo. A duração não é nada mais do que um número cuja unidade é o instante. (BACHELARD, 1999, p. 35)37
A partir do momento em que o movimento se instaura em sua efemeridade no corpoespaço, ele produz uma mudança. Essa mudança é permanente, no sentido de que foi realizada e não pode ser alterada. É possível propor uma nova ação, mas não se pode modificar a anterior. Uma escolha foi feita e, dentre inúmeras possibilidades, uma foi escolhida. Como sugere Roupnel, a duração se apoia no instante. Há uma responsabilidade no ato de decisão.
37 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “La intuición temporal de Roupnel afirma: 1.El carácter absolutamente discontinuo del tiempo. 2. El carácter absolutamente puntiforme del instante. Por tanto, la tesis de Roupnel realiza la aritmetización más completa y más franca del tiempo. La duración no es sino un número cuya unidad es el instante”.
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Para um seguidor de Roupnel, um ato é antes de tudo uma decisão instantânea e essa decisão é a que leva toda a carga de originalidade […] […] para sentir o instante, é preciso voltarmos aos atos claros da consciência. […] veremos que a vida não pode ser compreendida em uma contemplação passiva; compreendê-la é mais que vivê-la, é verdadeiramente propulsá-la (BACHELARD, 1999, p. 20).38
A palavra “decisão” vem de “corte”, “cisão” (de+cisão). Assim, uma vez tomada uma decisão há uma cisão, uma definição. Cicatriz que corta a carne que cessa a curva que encolhe o canto que cria um cisto que cai. Uma escolha, então, elimina uma série de outras possibilidades e modifica o corpoespaço de modo permanente. Julyen Hamilton, durante o mesmo workshop já citado em Berlim, disse: “Você escolhe o movimento que produz. Você produz um movimento e não outro e, portanto, não há liberdade nisso”. Cada escolha, cada cisão determina um caminho e traz refinamento no seu próprio desenrolar (esmiuçar, desmontar, remontar, reinventar etc.). O lugar de cisão, no entanto, é bem diferente do local de dissolução. Ou seja, ao mesmo tempo em que a improvisação lida com a tensão e a dissolução constantes, porque é influenciada pela velocidade das informações recebidas pelo corpoespaço, ela também lida com a decisão que é a provocação de uma mudança permanente, é um corte no tempo com base no corpoespaço. Cada escolha é profunda e assume responsabilidades, pois estabelece um outro campo relacional. Logo, uma nova decisão pode ser tomada, causando novas mudanças, mas essa cisão se dá baseada na consciência do ato ou, ainda, na consciência da consciência do ato.
38 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “Para un seguidor de Roupnel, un acto es ante todo una decisión instantánea y esa decisión es la que lleva toda la carga de la originalidad. […] […] para sentir el instante, nos es preciso volver a los actos claros de la conciencia. […] veremos que la vida no se puede compreender en una contemplación pasiva; compreenderla es más que vivirla, es verdaderamente propulsarla”.
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Manter-se apenas na tensão e na diluição pode levar à falta de clareza e à supressão da tomada de decisões. A improvisação, portanto, parece perseguir mais a atenção na clareza das decisões do que as tensões e diluições por ela provocadas. As tensões e as diluições parecem estar vinculadas diretamente à produção veloz de informações, sem que haja tempo para uma digestão ou reflexão sobre o que se produz. As decisões parecem estar mais atreladas à produção de ações, fundadas em um corte oriundo de um processo consciente, ainda que imediato. Parece que aqui é necessário fazer uma distinção entre produção de ações e produção de informações. Do latim informatio, onis a palavra “informação” significa conceber uma ideia, cuja raiz etimológica, –eidos, quer dizer imagem. Já, a palavra “ação” deriva do Latim actio-onis e tem como significado atuação; ato; efeito; obra. A improvisação, embora gere imagens, se dá, a priori, no ato. Como sabemos, improvisar é distinto de compor em tempo real. A improvisação não necessariamente pressupõe um espectador. A composição em tempo real, sim. Nesse sentido, a composição em tempo real é a obra em si. Não está tanto vinculada a um campo de ideias, que não se transforma em ação, senão à própria ação como campo de conhecimento e atuação. Em psicoterapia e mesmo em educação uma coisa é clara: o que move a pessoa não são idéias (sic) abstratas, mas a experiência vivenciada. As idéias (sic) podem abrir caminhos, mas dar passos por esses caminhos é uma questão de experiência. As idéias(sic) podem também instituir descaminhos, sabemos disso. Há, sem dúvida, um trabalho grande e às vezes árduo a se fazer no mundo das idéias (sic). Mas ele não substitui a experiência, a vivência direta; integra-se com ela, isso sim (AMATUZZI, 2007, p. 8).
A improvisação também não ocorre com base na produção de ideias, mas da ação concreta do corpoespaço que, refletindo sobre si mesmo em tempo real, escreve movimentos provocadores de sentidos imagéticos. […] a experiência é em primeiro lugar vivência, e não ideias ou palavras. Por isso, para poder dizer algo da experiência, o pensamento tem que inventar. Tem que inventar para dizer em outro plano (o das ideias e palavras) o que só acontece vivendo (CONTRERAS; DE LARA, 2013, p. 115
37)39. O corpoespaço age por meio do movimento, provoca uma cisão, e com essa cisão podem ocorrer ideias e tensões, mas para que a cena se sustente como proposição poética, ela não se apoia em ideias e tensões que se diluem constantemente, embora dialogue com elas. A palavra “movimento” vem do latim movere e significa mover, fazer deslocar-se, colocar em marcha. Na primeira metade do século XIX, também começou a ser utilizada para definir um grupo que visa mudanças sociais ou políticas. A ação da escrita do movimento, portanto, ocorre no próprio fazer. O próprio movimento causa mudanças, ele é a ação em si. Em seu curso “Envolving technique and making dances”40, no New Dance Studios, em Amsterdã (de 05 a 16 de janeiro de 2015), Julyen Hamilton apontou: O movimento é esse, agora. Você não vai trabalhar para melhorá-lo depois. Na improvisação é preciso ser ágil para celebrar o movimento. Cada movimento é exatamente o que é. Não há movimento que prepare o outro. Caso contrário você está pondo em descrédito o que está fazendo. Cada movimento é emocional, pois cada movimento vem do espaço que eu estou permitindo transitar. Se giro sutilmente a cabeça para a direita tudo se transforma.
De acordo com esse pensamento, a improvisação se pauta no fato de que alguém a aprende no próprio ato de mover. Não antes e não depois. Isso não significa que a improvisação não demande estudo. Ao contrário, o que Julyen propõe é que haja um refinamento tão grande do estudo minucioso da ação, que cada movimento deve ser realizado com seriedade e profundidade em tempo real, a fim de provocar uma reverberação. Cada movimento tem a sua importância e a sua responsabilidade. No caso da composição em tempo real, uma modificação sutil da posição do corpoespaço em cena provoca uma grande alteração na leitura. Não há tempo de reflexão anterior ou posterior à ação. A observação, a reflexão e a leitura se dão na própria ação, ou seja, são ações imediatas que ocorrem dentro de uma outra ação, que é o movimento. É preciso analisar instantaneamente o que está sendo realizado e assumir a responsabilidade dessa ação. 39 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “[...] la experiencia es en primer lugar vivencia, y no ideas o palabras. Por eso, para poder decir algo de la experiencia, el pensamiento tiene que inventar. Tiene que inventar para decir en otro plano (el de las ideas y las palabras) lo que sólo acontece viviendo”. 40 Tradução sob minha responsabilidade: “Evoluindo técnica e compondo danças”.
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Nesse sentido, Julyen Hamilton afirma que a improvisação não está vinculada à liberdade, uma vez que a cada escolha realizada, é preciso mergulhar em cada uma delas, aprofundando-se e assumindo sua decisão. E para que se escolha algo, uma série de outras opções é eliminada. Ter consciência da decisão e do corpoespaço em movimento dentro do contexto em que se insere é perigoso, pois é o local onde tudo se torna relevante. E quando nos referimos à palavra tudo, não consideramos tudo no plural, mas no singular, ou seja, cada coisa, cada movimento. Quando alguém não tem consciência de seu corpoespaço, torna-se ingênuo. Por exemplo, quando alguém está em uma cidade que não conhece, tudo é estranho, pois não se sabe os riscos que se corre, os locais que são perigosos ou não e se desconhece a vivência das regras sociais. Quando alguém se torna consciente, perde a ingenuidade e ganha responsabilidades. A tomada de consciência gera uma outra implicação corpóreo-espacial, com noção de risco, responsabilidade e atuação ativa. Isso determina o tipo de relação experiencial que será estabelecida. A improvisação não é ingênua. É preciso saber o contexto, arriscar-se e tomar decisões conscientes. “Os que correm riscos são os que abrem novos mundos, descobrem novas formas de se ser humano, novas formas de comportar-se e descobre coisas novas sobre o mundo” (MARK WRATHALL, 1:33).41 É preciso ser consciente de ser consciente e ir além da experiência para não ficar paralisado apenas na primeira sensação que ela traz. A experiência também requer responsabilidade e aprofundamento. É fundamental notar como a ausência da consciência pode gerar confusão. Em seu curso “The space issue”42, em Carthago Delenda, Bruxelas (16 a 20 de março de 2015), Julyen Hamilton abordou essa questão fazendo uma relação com o processo de aprendizado de um idioma: No aprendizado de um idioma, por exemplo, há um momento de desorientação quando ele ainda é desconhecido. O idioma torna-se vários sons reunidos e misturados em uma musicalidade. Quando o aprendizado de cada som ocorre, se consegue separar o básico e se encerra a confusão. Cada elemento tem seu lugar e pode se vincular a outro. 41 BEING IN THE WORLD. Direção: Tao Ruspoli. NY: Magusta Productions, 2010. 1 DVD (80 min), color. 42 Tradução sob minha responsabilidade: “A questão espaço”.
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A pronúncia de uma palavra é concreta, pois nela existem letras e sons. Isso é realidade. Mas a realidade produzida por cada pessoa terá uma leitura por meio de sua própria perspectiva, experiência e subjetividade. Apesar de concretas, palavras são só palavras. São parte de um discurso codificado por um idioma para uma organização coletiva. Se você não tem o código, elas não terão significado para você. Os significados das palavras são invenções que foram adotadas e repetidas ao longo dos tempos por uma determinada cultura e, enquanto os desconhecemos, podemos inclusive imaginar outros possíveis significados que poderiam ser atribuídos a cada palavra. O belga René Magritte (1898-1967) foi um artista que provocou a reflexão sobre o uso das palavras e sua possível alternância de significados. Mesmo reconhecendo os significados das palavras em seu próprio idioma, os deslocou em sua proposição criativa, estimulando questionamentos acerca das conexões entre imagem e palavra. A questão da aparência incongruente que apresentava o artista era saber se as palavras, em uso corrente, representam verdadeiramente o que alguém não crê. Assim, em A chave dos sonhos (1972)43, quadro dividido em quatro compartimentos, uma bolsa leva por subtítulo <<O céu>>; uma navalha, <<O pássaro>>; uma folha de árvore é legendada como <<A mesa>>. Mas a quarta imagem, que representa uma esponja, leva a legenda de <<A esponja>>. No O espelho vivente, há bolhas ou nuvens no estilo das tiras cômicas, com palavras ou frases: <<Personagem explodindo de riso>>; <<horizonte>>, <<armário>>, <<gritos de pássaros>>. De um quadro a outro se manifestam dois tipos de aproximações aos fenômenos que o pintor queria ilustrar, assim como duas percepções que exigia dos espectadores de suas obras. Em A chave dos sonhos, os objetos totalmente reconhecíveis se enfrentam em uma definição que não lhes concerne a priori: na linguagem corrente, a navalha não se chama <<pássaro>>. Somente um dos objetos representados leva o nome habitual: a esponja. Aí se apresenta bem a vontade de desorientar com imagens, se estão em referência ao sentido habitual. [...] Mais que de pintura, se trata aqui de linguagem. 43 Uma imagem da obra pode ser encontrada em: http://obrarenemagritte.blogspot. com.br/2011/01/la-clave-de-los-suenos-1930.html
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Uma palavra por outra, uma palavra por outra imagem distinta a que se espera, uma ou várias palavras para sugerir uma imagem que não está representada. [...] [...] Demolição das ideias correntes: esse é exatamente o propósito do quadro A chave dos sonhos, que mostra objetos definidos por palavras que não se correspondem com eles. Estabelecer definições muito seguras: a poesia trazida por imagens deve substituir a leitura literal destas. O que importa não é o que o quadro mostra, mas o que sugere. Reconstruir uma linguagem: a proximidade de objetos inesperados, imbricados ou não por palavras escritas, cria paradoxalmente outros significados aplicados em coisas que a primeira vista pareciam evidentes (MEURIS, 2007, p. 127).44
Isso altera a realidade e constrói uma nova. Faz com que as realidades sejam multiplicadas e que elas se alterem a partir da conscientização, que ocorre de modo individual. No caso do idioma, a consciência se dá pela aprendizagem de um vocabulário, um sistema gramatical e as capacidades interpretativas e de produção de significados. Assim se organiza a composição. No caso da escrita das palavras, a leitura e a reflexão se dão após a produção da ação de escrever. 44 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “La cuestión en apariencia incongruente que planteaba el artista era saber si las palabras, en su uso corriente, representan verdaderamente lo que uno no cree. Así en La clave de los sueños (1972), cuadro dividido en cuatro compartimientos, una cartera lleva por subtítulo <<El cielo>>; una navaja, <<El pájaro>>; una hoja de árbol va subtitulada como <<La mesa>>. Pero la cuarta imagen, que representa una esponja, lleva el subtítulo: <<La esponja>>. En El espejo viviente, hay burbujas o <<nubes>> al estilo de las tiras cómicas, con palabras o frases: <<Personaje reventando de la risa>>; <<horizonte>>, <<armario>>, <<gritos de pájaros>>. De un cuadro al otro se manifiestan dos tipos de aproximaciones a los fenómenos que el pintor quería ilustrar, así como dos percepciones que exigía de los espectadores de sus obras. En La clave de los sueños, los objetos totalmente reconocibles se enfrentan a una definición que nos les concierne a priori: en el lenguaje corriente, la navaja no se llama <<pájaro>>. Solamente uno de los objetos representados lleva el nombre habitual: la esponja. Ahí se aprecia bien la voluntad de desorientar con imágenes en referencia al sentido habitual. […] Más que de pintura, se trata aquí de lenguaje. Una palabra por otra, una palabra por otra imagen distinta a la que se espera, una o varias palabras para sugerir una imagen que no está representada. […] […] Demolición de las ideas corrientes: ése es exactamente el propósito del cuadro La clave de los sueños, que muestra objetos definidos por palabras que no se corresponden con ellos. Establecer definiciones muy seguras: la poesía aportada por las imágenes debe sustituir a una lectura literal de éstas. Lo que importa no es lo que el cuadro muestra, sino lo que sugiere. Reconstruir un lenguaje: la proximidad de objetos inesperados, imbricados o no por palabras escritas, crea paradójicamente otros significados aplicados en cosas que a primera vista parecían evidentes”.
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Palavras são sedutoras, pois voam e vão para outros lugares, espalhamse, são usadas, reutilizadas, interpretadas, inventadas, reinventadas, desvirtuadas. Trazem um conforto e uma sensação de continuidade, de eternidade pela sua capacidade de perpetuação, especialmente na linguagem escrita. Toda ação, antes de ser coletiva, é individual. No entanto, a escrita é mais comumente acionada de modo apenas individual. Como gesto, corre o risco de ser egocêntrico se realizado para a autoperpetuação. Mas ainda que seja com base nesse risco, é algo do corpo materializado em um objeto (livro, artigo, poema etc.). No ato de escrever, há uma tomada de decisão, em que se cria um universo concreto, no qual haverá concordâncias e discordâncias, incorporações ou distanciamentos. A partir da tomada de decisão e do registro, uma pessoa cria espaço para a outra tomar sua própria decisão. No entanto, as palavras também podem ser utilizadas para falsas composições discursivas, pautadas em uma retórica que visa à manipulação da leitura por parte de outrem. Tais palavras muitas vezes são organizadas para manutenção de poderes e estruturas hierarquizadas e frequentemente se desconectam do fazer prático. Pautadas na repetição e sufocando-se no próprio condicionamento definido como vocabulário, as palavras podem criar uma imutabilidade nos posicionamentos socioculturais, embora possam produzir discursos totalmente contrários para o convencimento de uma prática inexistente. Segundo Jorge Larrosa: Como disse José Luis Pardo, “para acessar a linguagem temos que falar uma língua, e falá-la desde dentro, com nossa própria voz e com nossa própria língua. E isso faz com que as palavras nos deixem um resíduo na ponta da língua, um sabor de boca (doce ou amargo, bom ou ruim), o que elas nos fazem saber (nos dão a saborear)”. Por isso, ainda que a linguagem nos tenha apodrecido, a maioria das pessoas não se dá conta, não sente náuseas e não se sente doente: porque perdeu a língua, porque não tem ou nunca teve uma voz própria, uma língua própria, porque somente assim, sem língua, pode falar, sem asco uma língua podre. [...] [...] A Lord Chandos primeiro se fazem impossíveis as grandes palavras, essas que são tão abstratas, tão gerais, tão solenes, tão mentirosas, tão grandiloquentes e tão vazias. Talvez se dê conta de que já não querem dizer nada, de tão vaidosas e de tão inchadas. Segundo, fazem120
se impossíveis os juízos sobre temas gerais, sobre os assuntos da corte e do parlamento, sobre tudo aquilo que, segundo essa artificiosa construção chamada “atualidade”, deveria ser importante. Talvez perceba o que esses juízos e essas opiniões têm de precipitados, artificiais, de convencionais. Talvez sinta aí a língua sem língua dos periodistas, dos experts, dos políticos e dos funcionários, dos que fabricam o presente, dos “atuais”, dos donos da “atualidade”. Terceiro, fazemse impossíveis também os juízos banais, esses que se dão automaticamente e sem pensar nas conversas de todos os dias” (LARROSA In CONTRERAS; DE LARA, 2013, p. 96).45
Fica claro, portanto, como as palavras podem ser organizadas para a produção de um discurso eloquente que se esvazia em si mesmo ou para a emissão de juízos de valores inconsistentes. Ambos não partem de uma prática experiencial, senão de um conjunto de ideias lançadas ao ar que objetiva, na verdade, camuflar a ausência dessa prática, criando uma ilusão sobre ela. Além disso, podem produzir a ilusão de uma prática. O filme Exit through the gift shop46, produzido por Banksy, parece-nos um exemplo interessante de como a manipulação das palavras pode criar uma realidade baseada em uma ficção. O filme conta a história de Mr. Brainwash, um 45 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “Como disse José Luis Pardo, ‘para acceder al lenguaje tenemos que hablar una lengua, y hablarla desde dentro, con nuestra propia voz y con nuestra propia lengua. Y ello hace que las palabras nos dejen un residuo en la punta de la lengua, un sabor de boca (dulce o amargo, bueno o malo), lo que ellas nos hacen saber (nos dan a saborear)’. Por eso, aunque el lenguaje se nos haya podrido, la mayoría de la gente no se da cuenta, no siente nauseas y no se siente enferma: porque ha perdido la lengua, porque no tiene, o nunca ha tenido, una voz propia, una lengua propia, porque solo así, sin lengua, puede hablar, sin asco una lengua podrida […]. […] A Lord Chandos primero se le hacen imposibles las grandes palabras, esas que son tan abstractas, tan generales, tan solemnes, tan mentirosas, tan grandilocuentes y tan vacías. Tal vez se da cuenta de que ya no quieren decir nada, de tan vanidosas y de tan hinchadas. Segundo, se le hacen imposibles los juicios sobre temas generales, sobre los asuntos de la corte y del parlamento, sobre todo aquello que, según esa artificiosa construcción llamada “actualidad”, debería ser importante. Tal vez percibe lo que esos juicios y esas opiniones tienen de apresurados, de artificiales, de convencionales. Tal vez siente ahí la lengua sin lengua de los periodistas, de los expertos, de los políticos y de los funcionarios, de los que fabrican el presente, de los “actuales”, de los dueños de la “actualidad”. Tercero, se le hacen imposibles también los juicios banales, esos que se dan automáticamente y sin pensar en las conversaciones de todos los días”. 46 EXIT THROUGH THE GIFT SHOP. Direção: Banksy. Madrid: Avalon, 2009. 1 DVD (88 min), color.
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grafiteiro que monta sua carreira e fama antes de propriamente produzir qualquer tipo de trabalho artístico. As mentiras contadas pelo protagonista do filme o convertem em uma celebridade. A complexidade das camadas manipulatórias contidas no discurso se expande, criando uma hiperrealidade, que chega a situação limítrofe de no dia da vernissage de sua primeira exposição individual – de proporções megalomaníacas – haver uma fila estrondosa de pessoas esperando os portões da galeria se abrirem, enquanto, dentro do local, ainda não havia exposição alguma. E, ao expor seu trabalho em público, as camadas de discursos se sobrepõem, ao serem criados novos discursos de fruição do público com base na suposta obra que não foi pensada como obra. Uma arquitetura do discurso é construída com fundamento em uma coleção de vazios sobrepostos, que preenchem um lugar. A obra é criada com base em uma mentira (ou da produção e manipulação de uma suposta verdade: a semelhança), que não expõe a falha, mas a maquia. Mr. Brainwash, apesar de não ser prolixo, tem o domínio do uso da palavra e a manipula para construir uma realidade, apoiada no que seu próprio pseudônimo sugere: uma lavagem cerebral. A retórica pode dar uma aparência de profundidade à superficialidade. Desse modo, é possível manter os territórios de poder, os esquemas simplificados e a ausência de reflexão, pois são discursos que não consideram o outro em diálogo, que não criam espaço, embora possam fazer parecer o contrário. É fundamental perceber como esses discursos orientam os saberes sobre o que se propõe como realidade e atualidade, determinando algumas verdades absolutas, quase sempre incontestáveis. Tecia as palavras como uma colcha de retalhos. Montava a teia e esperava desmoronar. Em relação à dança, especificamente na composição em tempo real, como se dá o processo de escrita do movimento? O discurso da palavra não é o corpo. É parte dele. O corpo é discursivo, no entanto, não são apenas as palavras que compõem esse discurso. Não são apenas as palavras que determinam o texto do movimento. Segundo Ferlosio:
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[…] a dança tem caráter de texto […]; e esse caráter me parece tão importante em uma instituição como a dança, tão ligado a seu modo de proceder e a seu sentido, que onde falta o texto, nego que haja dança. Deve ser uma das coisas mais essencialmente textuais que há, provavelmente, inclusive, o primeiro texto que há existido, muito antes, talvez, que os próprios textos linguísticos de depósito mnemônico, e, obviamente, do que os <<Carmen Arval>> escritos; inclusive, talvez tenha sido a mãe dos primeiros – já por haver suscitado a ideia de conservação literal, já por outra participação mais direta, como haver associado uma composição verbal a seu próprio depósito – e consequentemente do que o texto é. Uma prova da tenacidade textual da dança seria o fato de que o texto latino mais antigo que se conhece seja precisamente a pauta verbal de uma dança Marte, o famoso <<Carmen Arval>>, datado pelos especialistas por volta do século VII a.C., apesar de conhecido somente por uma transcrição do século II d.C. [...] (FERLOSIO, 1981, p. 210).47
E continua: Mas não quero, de modo algum, unificar o texto verbal concomitante a uma dança com o texto da própria dança, que são movimentos que a constituem; antes, pelo contrário, me interessa contemplar os distintos modos de relação que pode haver entre um e outro texto (FERLOSIO, 1981, p. 210).48 47 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “[…] la danza tiene carácter de texto […] y ese carácter me parece tan importante en una institución como la danza, tan ligado a su modo de proceder y a su sentido, que donde falte el texto me niego a que haya danza. Debe de ser de las cosas más esencialmente textuales que hay; probablemente, incluso, el primer texto que ha existido, mucho antes, quizá, que los propios textos lingüísticos de depósito mnémico y, por supuesto, que los Carmen Arval>>, escritos; tal vez ha sido incluso la madre de los primeros – ya por haber suscitado la idea de la conservación literal, ya por otra participación más directa, como el haber asociado una composición verbal a su proprio depósito – y consiguientemente de lo que el texto es. Una prueba de la tenacidad textual de la danza sería el hecho de que el texto latino más antiguo que se conoce sea precisamente la pauta verbal de una danza de Marte, el famoso << Carmen Arval>>, fechado por los expertos hacia el siglo VII a.C., aunque conocido solamente por una transcripción del siglo II d.C. […]” 48 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “Pero no quiero, en modo alguno, unificar el texto verbal concomitante a una danza con el texto de la danza misma, que son los movimientos que la constituyen; antes, por el contrario, me interesa contemplar los distintos modos de relación que puede haber entre uno y otro texto”.
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Referir-se ao texto e ao discurso, no contexto da Dança Contemporânea e da composição em tempo real, está muito além de pensar somente na utilização da palavra como movimento, na descrição que busca uma espécie de registro da dança ou na descrição “literal”49 do que se produz com o corpo. Na improvisação em dança, o processo de escrita discursiva ocorre no próprio corpoespaço, no momento presente, e na composição em tempo real isso se dá em cena, com o público presente. A solução do movimento e a ação do movimento estão no próprio corpo, no aqui e agora. A solução e a ação do movimento podem envolver ou não a palavra verbal, mas em ambos os casos, há escrita de texto e discurso produzido pela fricção entre decisão e imagem. Além disso, o ato de improvisar pode ser coletivo, em inúmeras situações. No entanto, as decisões coletivas se dão com base nas decisões individuais dentro desse conjunto. A decisão é individual, mas o ato é coletivo, então as decisões individuais devem ser tomadas em relação ao contexto, ao todo, ao outro ou a algo, em tempo real. Não há tempo de preparar um discurso ou de manipulá-lo. Isso coloca o improvisador que trabalha na coletividade em um outro local de discurso e escrita do movimento. A clareza e a decisão devem ser imediatas para oferecer ao outro a possibilidade de decisão. E a leitura do que ocorre também deve ser imediata, durante a própria ação, para que seja desenvolvida a capacidade de leitura do todo e de como a sua decisão poderá influenciar a decisão coletiva. Uma decisão pode, inclusive, incluir a pausa e o silêncio, mas isso deve ser preciso. Quando tratamos da composição em tempo real, adicionamos outra camada de leitura: além da leitura imediata que os intérpretes-criadores devem ter de si, do outro e do contexto criado, afinando a consciência para as imagens e situações que estão produzindo, também existe a leitura de cada espectador sobre o que vê e como ele se relaciona com a fruição do espetáculo. O corpoespaço, ainda que vivencie códigos socioculturais específicos, traz consigo uma capacidade de discurso independente do território em que esteja. E, embora existam gestos cotidianos que se instauram como códigos 49 Deixo a palavra literal entre parênteses pois entendo que a partir do momento em que a descrição é subjetiva, a literalidade também é relativa.
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de linguagem reconhecíveis coletivamente, a gama de possibilidades de movimentos transcende esses aspectos e, quando isso ocorre, na dança, por exemplo, deparamo-nos, na cultura ocidental, com uma dificuldade de apreciação e leitura do movimento. Em outras palavras, apesar do movimento ser algo, em princípio, inerente ao corpo humano, na cultura ocidental, não estamos, em linhas gerais, imersos em hábitos de leitura do movimento, que podem se dar por sistemas lógicos, lineares e/ou por percepções cinestésicas, não necessariamente lineares. A dança coloca o intérprete-criador e o espectador diante dessa questão. Na composição em tempo real em dança, o discurso se organiza em tempo real, de modo direto e com base em sua clareza abre espaço para o outro, para a confirmação ou a contestação, para o diálogo. O refinamento do que se diz e como se diz baseado no movimento é imprescindível para que não se incorra na produção de movimentos aleatórios, que também podem se constituir como discursos vazios e superficiais. Nesse sentido, a busca pela sinceridade do movimento, apoiada na escuta sensível do corpoespaço e seu diálogo honesto com as situações propostas, é um modo de se orientar na ação improvisativa, em estado de composição. Desse ponto de vista, o processo de composição em tempo real passa por um aprofundamento da experiência no corpoespaço e dos conteúdos que se constroem relacionandose entre si, com base nessa experiência. [...] o termo experiência, pela sua origem, significa o que foi retirado (ex) de uma prova ou provação (-perientia); um conhecimento adquirido no mundo da empiria, isto é, em contato sensorial com a realidade. Experiência relaciona-se com o que se vê, com o que se toca ou sente, mais do que com o pensamento. O que se deduz a partir do que se vê não é propriamente “experiencial”, mas pensado. Conhecimento experiencial é o diretamente produzido pelo contato com o real (AMATUZZI, 2007, p. 9).
Nesse contato com o real, é fundamental ter consciência de que a proposição artística só ocorre por meio da reverberação provocada por essa experiência. Não há manipulação de discurso ou dessa realidade e isso abre espaço para que cada atuante perceba esse real de seu ponto de vista, e não de uma indução exterior prévia (que ele passa a assumir inconscientemente como sua, após o processo de convencimento). 125
Quando compreendemos a noção de corpoespaço e percebemos o poder que há na possibilidade de movimento, no que se refere às transformações que esse pode gerar, corre-se o risco da produção de uma autossedução egocêntrica, na qual o intérprete-criador se fecha em si mesmo e se encanta com sua própria produção de tal modo que desconsidera o outro. Confiar no material produzido é necessário, mas é importante não se deixar afogar em si mesmo, caso contrário, não há configuração de uma produção artística. A cena é o momento em que essa experiência individual alarga seu campo para a produção de uma ação conjunta (entre intérpretescriadores e entre eles e a plateia). A atenção conjunta [...] instaura efeitos de um feitiço presencial, que trata nossa afetividade por meio da entre-fecundação de atenções cruzadas comunicantes em uma relação de presença imediata de corpo a corpo. Esse feitiço presencial é de uma natureza diferente dos feitiços mediáticos que canalizam nossa atenção coletiva, porque ele se constitui em uma escala necessariamente limitada pelo número de participantes. Se ele perde em extensão, ganha, contudo, em intensidade. Eis porque sem dúvida ainda vamos ao espetáculo (CITTON, 2014, p. 154).50
É provável que este feitiço presencial seja o que o poeta e dramaturgo espanhol Frederico García Lorca (1898-1936) chamava de duende, em sua conferência Teoria e jogo do duende: [...] o duende é um poder, e não um agir; é um lutar, e não um pensar. Eu escutei dizer a um velho mestre guitarrista: “O duende não está na garganta; o duende sobe por dentro desde a planta dos pés”. Quer dizer, não é uma questão de faculdade, senão um verdadeiro estilo vivo; quer dizer, de sangue; quer dizer, de velhíssima cultura, de criação em ato (LORCA, 2003, p. 2).51 50 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “L’attention conjointe [...] instaure des effets d’ENVOÛTEMENT PRÉSENTIEL qui tratement notre affectivité à travers l’entrefécondation d’attentions croisées communicant dans une relation de presence immédiate de corps à corps. Cet envoûtement présentiel est d’une nature différente des envoûtements médiatiques qui canalisent notre attention collective, parce qui’il se constitue à une echelle nécessairement limitée par le nombre de participants. Ce qu’il perd en extension, il le gagne toutefois en intensité. Voilà sans doute pourquoi nous allons encore au spetacle”. 51 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “[...] el duende es un poder y no
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E mais adiante, completa: Todas as artes são capazes de duende, mas onde encontra mais campo, como é natural, é na música, na dança e na poesia falada, já que essas necessitam um corpo vivo que as interpretem, porque são formas que nascem e morrem de modo perpétuo e alçam seus contornos sobre um presente exato (LORCA, 2003, p. 6).52
O ofício do artista, portanto, está em controlar a aparição e a desaparição desse duende na relação conectiva que instaura com o público e na intensidade de sua aparição fecundar a cumplicidade necessária com o espectador para que a obra se construa. Nesse sentido, estar atento ao outro, à percepção imediata e à escuta são condições primordiais para que uma improvisação se configure como proposta cênica. E isso só ocorre na abertura para a experiência. Mas em qual conceito de experiência e em qual conceito de escuta nos embasamos? Essas duas palavras se transformaram em modismo no Brasil entre psicólogos, artistas e educadores dos séculos XX e XXI, já seguindo tendências de um pensamento global, especialmente baseado em pesquisas produzidas na Europa. São palavras amplamente repetidas e sobre as quais inúmeros pesquisadores já se debruçaram e formularam conceitos. Sobre a origem da palavra “experiência”, Amatuzzi discorre: Quem poderia imaginar que “perigo” e “pirata” fossem palavras relacionadas com “experiência”? Pois assim é. Segundo nos informa o grande Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (Houaiss & Villar, 2001), do antigo verbo latino depoente periri, restou o particípio passado peritus, que passou diretamente para o português com perito, habilidoso, experimentado. Daí também com a preposição “ex” surge no latim experientia, que significa prova, ensaio, tentativa, experiência, e un obrar, es un luchar y no un pensar. Yo he oído decir a un viejo maestro guitarrista: “El duende no está en la garganta; el duende sube por dentro desde la planta de los pies.” Es decir, no es cuestión de facultad, sino de verdadero estilo vivo; es decir, de sangre; es decir, de viejísima cultura, de creación en acto”. 52 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “Todas las artes son capaces de duende, pero donde encuentra más campo, como es natural, es en la música, en la danza y en la poesía hablada, ya que estas necesitan un cuerpo vivo que interprete, porque son formas que nacen y mueren de modo perpetuo y alzan sus contornos sobre un presente exacto”.
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no latim imperial, experiência adquirida. Assim, o termo experiência pode significar tanto uma tentativa, uma prova, num sentido mais objetivo de algo que se faz, como o que resta de aprendido a partir de várias provas no decorrer da própria vida, num sentido agora mais subjetivo. Derivaram daí: experimentum (prova pelos fatos, comprovação) e o adjetivo expertus (experimentado, que deu provas de conhecimento – donde no inglês expert, especialista, e no português experto no sentido de versado, conhecedor; mas não confundir com esperto que tem outra origem). De periri (tentar, provar, empreender, experimentar), de onde saiu experientia (o que decorre da tentativa, do empreendimento), derivaram também periculum (tentativa, prova, risco, exame), o adjetivo periculosum (arriscado, perigoso), o verbo periclitor (fazer uma tentativa, arriscar, pôr em perigo), peritus (que sabe por experiência, perito, instruído), imperitia (imperícia, ignorância). Daí derivaram em português: experiência, perigo, perigoso, periclitante, perito, perícia. Ainda segundo Houaiss e Villar (2001) todas essas palavras se relacionam com o grego peíra (prova, tentativa), o verbo peiráo (tentar, empreender), peiratés (aquele que tenta um golpe, bandido, pirata), empeiría (experiência, e, como importação direta feita pela filosofia, “empiria”, conjunto de dados conhecidos não pelo raciocínio lógico, mas pela experiência sensorial) e empeirikós (que se dirige segundo a experiência) (ver também o clássico Ernout & Meillet, 1967) (AMATUZZI, 2007, p. 08).
Vemos como a origem da palavra “experiência” está vinculada ao risco, à sensorialidade, à experimentação. Com base nisso, depreendemos que inerente à palavra “experiência” há uma apreensão e uma apropriação corporal de um determinado fato ou situação, que decorre da abertura a vivenciar o desconhecido. Para vivenciar o desconhecido, é necessária a escuta. A palavra “escuta” vem do latim auscultare, que significa ouvir com atenção. Neste texto, trata-se escuta como a capacidade de considerar o outro e suas ações/ pensamentos, inclusive abrindo-se para uma possibilidade de mudança de suas próprias ações/pensamentos com base no diálogo. Assim, trata-se a escuta não apenas da perspectiva do sentido, mas como campo simbólico. E,
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como experiência, entende-se a qualidade, a intensidade e a profundidade com que se vivencia uma situação dada. Não é apenas o que se vivencia, mas como se vivencia. Neste contexto, trata-se da experiência fundada em uma presencialidade corpóreo-espacial, que convive com a virtualidade atual, mas que não se instala nela. Dizia Hannah Arendt que não é possível pensar sem experiência pessoal. É a experiência que põe em marcha o processo de pensamento. Pensamos porque algo nos ocorre; pensamos como produto das coisas que nos passam, com base no que vivemos, como consequência do mundo que nos rodeia, que experimentamos como próprio, afetados pelo que nos passa. É a experiência que nos imprime a necessidade de repensar, de retornar às ideias que tínhamos das coisas, porque justamente o que nos mostra a experiência é a insuficiência ou a insatisfação de nosso pensar anterior; necessitamos voltar a pensar porque já nos vale o anterior a vista do que vivemos ou do que vemos que passa, que nos passa. Justo, o que faz que a experiência seja tal é isto: que há que voltar a pensar (CONTRERAS; DE LARA, 2013, p. 21). 53
Portanto, a experiência passa pelo fato encarnado e a capacidade de revê-lo. Parece estar muito vinculada aos processos de reflexão, baseada na presença e na escuta, e não apenas no passado, mas no próprio presente que se configura como passado, tão logo ocorre. Ela nasce da capacidade de abrir-se para o novo, de revisar o antigo ou de criar o novo revisando o antigo, passa pela recepção e pela produção de novas propostas e, assim, conecta a passividade à atividade. A grande questão é: em que momento as palavras “experiência” e “escuta” deixam de ser apenas palavras-conceitos e se transformam em 53 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “Decía Hannah Arendt que nos es posible pensar sin experiencia personal. Es la experiencia que pone en marcha el proceso de pensamiento. Pensamos porque algo nos ocurre; pensamos como producto de las cosas que nos pasan, a partir de lo que vivimos, como consecuencia del mundo que nos rodea, que experimentamos como proprio, afectados por lo que nos pasa. Es la experiencia la que nos imprime la necesidad de repensar, de volver sobre las ideas que teníamos de las cosas, porque justamente lo que nos muestra la experiencia es la insuficiencia, o la insatisfacción de nuestro anterior pensar; necesitamos volver a pensar porque ya nos vale lo anterior a la vista de lo que vivimos, o de lo que vemos que pasa, que nos pasa. Justo, lo que hace que la experiencia sea tal, es esto: que hay que volver a pensar”.
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ação? Em 2015, em seu workshop “Working with objects within the dancespace on stage”, ocorrido em Berlim (Radialsystem), Julyen Hamilton disse: O nome dado às palavras pode torná-las estáticas. Por exemplo: se algo é uma caneta, não é uma galinha. Se você conhece a caneta e de que ela é feita, isso cria uma dinâmica. Você percebe que nem todas as canetas são iguais, que têm formas, pesos, materiais, cores diferentes.
É apenas vivenciando cada caneta, tendo a experiência do corpoespaço em relação à caneta, que você poderá ter uma dimensão do que cada caneta pode significar. E é uma dimensão, pois o contato de cada indivíduo com cada caneta trará novos sentidos àquela relação, ao indivíduo e ao objeto. Sendo assim, falar sobre experiência não é viver a experiência, assim como falar sobre a escuta não é escutar. O conceito não é a realidade em si. Meuris, em seu livro Magritte, discute como a imagem foi utilizada em obras desse artista, distinguindo a semelhança da realidade: [...] se a imagem utiliza elementos da realidade, não o faz, porém, tangíveis a tais elementos. Não se pode tocá-los, já que são pintados. Sendo intangível, a imagem propõe figuras que se assemelham a objetos de outra maneira tangíveis. Convém, por isso, que o artista coloque à prova sua imaginação. Suponhamos que, como explica Magritte, representa-se um pote de marmelada, produto comestível. Sua imagem não se pode comer. Se a combinação de pensamento e inspiração movem o pintor a colocar no pote uma inscrição como <<Isto não é um pote de marmelada.>>, não somente diria a verdade, já que a marmelada pintada não pode ser comida, mas também surpreenderia o espectador, habituado a tomar a semelhança pela realidade (MEURIS, 2007, p. 84).54
Podemos aplicar esse pensamento à relação entre conceito e 54 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “[…] si la imagen utiliza elementos de la realidad, no hace sin embargo tangibles a tales elementos. No se los puede tocar, ya que son pintados. Siendo intangible, la imagen propone figuras que se asemejan a objetos por lo demás tangibles. Conviene por eso que el artista ponga a prueba su imaginación. Supongamos que, como explica Magritte, se representa un tarro de mermelada, producto comestible. Su imagen no se puede comer. Si la combinación de pensamiento e inspiración mueven al pintor a ponerle al tarro una inscripción como <<Esto no es un tarro de
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materialização, teoria e prática. As palavras “experiência” e “escuta” e as consequentes imagens que associamos a elas não são a experiência e a escuta em si. Isso pode parecer óbvio. E o é. Mas talvez a maior complexidade da teoria e da prática esteja em compreender a obviedade da vida. Os rebuscamentos, que fogem à obviedade, muitas vezes são decorações para enfeitar a falta de consistência da ação e do trabalho. Se há algo que dizer, diz-se. Se há algo que mover, move-se. Muitas vezes, a tentativa de buscar palavras e/ou movimentos rebuscados e a sua proliferação são, na verdade, ausência do que dizer ou do que mover. Então, para que dizer ou mover? Nesse sentido, encontra-se aqui um outro paradoxo: questionar a prática desses conceitos neste texto, portanto, não significa realizar a prática proposta. Assim como um texto não consegue dimensionar e traduzir o que seja improvisação ou composição em tempo real, tampouco consegue exprimir a ação da escuta e da experiência. Este texto, portanto, não existe sozinho. Ele está atrelado às ações práticas cotidianas e à produção poética, em busca da coerência do saber/fazer. O leitor nunca terá dimensão daquilo que se discute sem vivenciar a improvisação no próprio corpoespaço e as experiências da escrita do movimento e a do trabalho coletivo, que demanda escuta. A implicação e o esforço necessários para que os conceitos imaginados se concretizem em ação demandam envolvimento, generosidade e controle da vaidade e do ego, para que um indivíduo encontre espaço no outro para a relação. Abrir espaço para que o outro fale ou se mova é diferente de abrir espaço para escutar o outro. Em uma relação, é possível lidar com a fala e/ou o movimento do outro de diversos modos: suprimi-la por imposição; permiti-la sem considerá-la; permiti-la e considerá-la; permiti-la; considerála e rever sua própria fala e/ou movimento com base no posicionamento alheio; entre outras possibilidades. Na perspectiva deste texto, entendese que a improvisação, para conseguir uma dimensão poética e cênica, demanda escuta, ou seja, a consideração do outro (do que diz/move, de como diz/move, com base em qual contexto diz/move). Nesse sentido, um intérprete-criador escreve e inscreve sua dança com o outro e para o outro, mermelada>>, no solamente diría la verdad, ya que la mermelada pintada no puede comerse, sino que sorprendería al espectador, habituado a tomar la semejanza por la realidad”.
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apoiado em sua individualidade. A experiência do tu, como chamou GADAMER, só pode se ter desde a relação em si mesma, desde dentro, sem possibilidade de resolver-se em uma compreensão do outro, como se um estivesse fora dessa relação que vincula, saindo-se dela para conhecer o outro. Quando um sai da relação, na realidade o que faz é deixar de ouvir o outro e de entender desde onde ouve alguém, em que relação se constrói a escuta. [...] […] A experiência do tu é, portanto, sempre a experiência de mim na relação contigo. […] A experiência do tu é deixar que o outro se converta em uma experiência. A experiência da relação é fazer da relação uma experiência (CONTRERAS; DE LARA, 2013, p. 30).55
Improvisar em dança e, principalmente, compor em tempo real, é relacionar-se o tempo todo. É preciso estar implicado em relacionar-se, imerso nessa escolha conjunta e cuidando de que tipo de compartilhamento e experiência se deseja promover. É um lugar de construir, desconstruir e reconstruir, sem uma ordem subsequente, mas aberto às surpresas do tempo presente. É perceber que o conhecimento é impalpável porque é infinito. É reconhecer que a todo conhecimento está relacionada a ignorância e que compartilhar o saber significa também compartilhar o que não se sabe. E aí se situa a improvisação: na honestidade de um corpoespaço vivenciado. “Fazer com um grupo permite que você seja consciente de que as pessoas com quem você está dançando no espaço são seu ambiente. Quando você está trabalhando e há pessoas nele, isso muda seu espaço” (ANNA HALPRIN, 1:04 min)56. E estar em relação com o outro também modifica sua perspectiva acerca do conhecimento, cria novas dinâmicas e expectativas. 55 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “La experiencia del tú, como ha llamado GADAMER, sólo puede tenerse desde la relación en sí misma, desde dentro, sin posibilidad de resolverse en una comprensión del otro, como si uno estuviera fuera de esa relación que vincula, saliéndose de ella para conocer al otro. Cuando uno se sale de la relación, en realidad lo que hace es dejar de oír al otro y de entender desde dónde oye uno, en qué relación se construye la escucha. [...] [...] La experiencia del tú es pues siempre la experiencia de mi relación contigo. […] La experiencia del tú es dejar que el otro se convierta en una experiencia. La experiencia de la relación es hacer de la relación una experiencia”. 56 Dentro do DVD-ROM citado há vários pequenos vídeos. O trecho citado encontra-se no vídeo chamado “Spaces: positive and negative”, dentro da palavra “espaço”, do index. Tradução sob minha responsabilidade do original: “Do with a group, it allows you to be
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Do abraço traço o gesto montado de lego. E espero a forma se delinear. Ao entrar em cena improvisando, os saberes incorporados assumem o risco de uma exposição pública que se conecta aos saberes imprevisíveis ainda não incorporados. E a descoberta desse contato se dá no momento do próprio contato entre intérprete-criador, construção da cena e público, o que deixa o corpoespaço vulnerável e exposto, porque compartilha não apenas suas potencialidades, mas suas fragilidades também, em tempo real. O ensino da experiência é suspender nosso saber, suspender a própria aprendizagem da experiência para estar a espera do que ocorrerá, sem suposições. Neste caso, o atuar nascerá dessa suspensão do saber (MANONI, 1979, pág.143). Porque, paradoxalmente, o que se aprende da experiência é que não se pode confiar na experiência adquirida e que, ao mesmo tempo, essa é a aprendizagem obtida da experiência que permite afrontar novas situações: com a disposição implícita de que nosso saber experiencial nos deu o aval para essa espera sem previsões; a confiança para afrontar novas situações (CONTRERAS; DE LARA, 2013, p. 29).57
A era do Google, em que o acesso a uma grande quantidade de informações faz com que (ingenuamente) acreditemos que somos mais sábios, torna-nos cada vez menos capazes de lidar com as lacunas do saber. De novo, parece difícil lidar com a obviedade, nesse caso, de que é impossível conhecer tudo sobre a vida. E como é preciso sustentar a máscara do domínio intelectual, cada vez menos estamos prontos para aprender, porque estamos cada vez menos dispostos a demonstrar o que não sabemos e em que falhamos. Não há espaço para a aprendizagem, não há espaço para a honestidade, não há espaço para o movimento e nem para a experiência e a escuta. De tanto clicarmos e abrirmos janelas em busca de movimento, aware that the people which you are dancing with in that space is your environment. When you are working and you have people in it, it changes your space”. 57 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “La enseñanza de la experiencia es suspender nuestro saber, suspender el proprio aprendizaje de la experiencia para estar a la espera de lo que ocurra, sin suposiciones. En este caso, el actuar nacerá de esta suspensión del saber (MANONI, 1979, pág. 143). Porque, paradójicamente, lo que se aprende de la experiencia es que no te puedes confiar en la experiencia adquirida, y que a la vez este es el aprendizaje obtenido de la experiencia que permita afrontar las nuevas situaciones: con la disposición implícita de que lo que nuestro saber experiencial nos ha aportado es el aval para esta espera sin previsiones; la confianza para afrontar las nuevas situaciones”.
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ficamos parados, no sentido de estarmos bloqueados (não é uma pausa por opção, mas por fadiga e acumulação desenfreada). É a grandiloquência que leva ao vácuo, como vimos anteriormente na citação de Larrosa. De tanto buscarmos inúmeras conexões instantâneas com outros, ficamos ensimesmados, conectados a uma ou mais máquinas que atuam como próteses de nosso corpoespaço. Ainda na era das redes sociais – na qual a realidade mostrada é a realidade manipulada (virtual), em que se recortam apenas as potencialidades ou se maquiam as fragilidades para mostrar a manutenção de uma vida artificial, supostamente interessante ao indivíduo e ao coletivo – trabalhar com improvisação parece ser um campo de resistência artesanal que assume a responsabilidade da imperfeição e a possibilidade do fracasso. Isso tem um peso. Não é um caminho confortável. E na composição em tempo real, isso ocorre na presença do outro. Todas as nossas ações são editadas, constantemente. Estamos a todo momento editando o que mostramos de nós mesmos, o que fazemos, o que pensamos, o que praticamos. As redes sociais, canais demonstrativos e representativos de uma parte da realidade, dão vazão ao compartilhamento das vaidades: é lugar comum que nos condicionemos aos registros dos sucessos e à sua manipulação (lugares visitados, festas vivenciadas, conquistas intelectuais, presentes recebidos, amores conquistados e mantidos ou trocados, corpos perfeitos). Às vezes, as viagens não foram tão agradáveis, as festas estavam desanimadas e os amores nem estavam tão bem assim, mas isso não importa. O que importa é o que mostramos disso ao outro para parecermos bem sucedidos, dentro do conceito de sucesso mantido socialmente, que visa à perfeição. É a sociedade do “parecer”. Por um lado, não deixa de ser uma estratégia de sobrevivência que haja um lugar virtual e imaginário em que se celebrem apenas as virtudes, sendo elas honestas ou não. Por outro, esse tipo de relação que se estabelece virtualmente invade as relações presenciais e provoca questões. Como este corpoespaço, que deve parecer infalível, lida com a sua falência real? Como disse Claire Filmón em entrevista que cedida a esta pesquisa em 02/07/15, no Centre National de la Danse, em Paris: “Talvez você queria compartilhar sua falência, mas talvez
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você não queira que as pessoas a vejam”58. Desse pont de vista, a improvisação, e particularmente a composição em tempo real, parecem tecnologias ultrapassadas. Esta última coloca o indivíduo (intérprete-criador e público) em contato com a relação presencial, o risco da experiência em tempo real e a possibilidade constante de falência. Ela traz um tipo de relação não mediada (e/ou midiada) e exige uma edição e uma composição em tempo real, sem produção de efeitos, manipulação de imagens ou discursos, colocação de filtros, entre outras possibilidades de intervenção. E todo esse processo se dá de modo consciente, sem ingenuidade na decisão. Os espetáculos de teatro, de música ou de dança têm igualmente uma decisão forçada de certa dimensão performática. O risco de esquecer o texto, de fazer uma falsa nota, de fracassar, instaura uma tensão subterrânea que intensifica a atenção dos artistas e dos espectadores: aquém de todo valor estético, o simples fato de manter seu papel de performer sem falhar já é sempre uma proeza. A beleza própria de um espetáculo vivo detém (entre outras coisas) a parte do imprevisível – e, portanto, da improvisação – que caracteriza todo gesto, pois ele está sempre um pouco em excesso ou em falta em suas programações (CITON, 2014, p. 150).59
A edição do que se mostra em estado não manipulado é muito mais arriscada em função da superexposição que gera. Por isso, o improvisador deve trabalhar diariamente de maneira técnico-criativa: a fim de estar ativo para receber a surpresa da realidade, do tempo presente, para permitirse afetar e criar soluções, caminhos ou proposições com base nisso. A preparação é o próprio fazer. Não há como se preparar para o desconhecido. Mas é possível cercar-se de ferramentas que colaborem para a realização de 58 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “Maybe you want to share the faillure but maybe you don´t want that people see that”. 59 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “Les spetacles de théâtre, de musique ou de danse tiennent également une partie de leur forcé de cette dimensión performantielle. Le risque d’oublier son texte, de faire une fausse note, de chuter, instaure une tensión souterraine que intensifie l’attention des artistas et des spectateurs: en deçà de toute valeur esthétique, le simple fait de tenir son rôle de performeur sans défaillir tient toujours déjà de l’exploit. La beauté propre d’un spetacle vivant tient (entre autres choses) à la part d’imprévisible – et donc d’improvisation – qui caractérise tout geste, en tant que celui-ci est toujours un peu en excès ou en défaut sur ses programmations”.
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escolhas e que criem um estado experiencial de consciência da consciência, que tornem o indivíduo capaz de lidar com o imprevisto sem ingenuidade. Lidar com as falências, e não apenas com as potências, significa aprofundar-se no estudo do corpoespaço. Reconhecer-se em mergulho e escancarar-se. Surpreender-se consigo mesmo e ampliar as possibilidades de ação. Quando alguém se aprofunda em um tema, investigação ou relação, tem mais clareza sobre as coisas e pode tomar decisões imediatas que não são pautadas em reações impulsivas, mas em posicionamentos organizados com base em uma experiência. Seu posicionamento pode se alterar de acordo com a situação dada se houver generosidade para escutar a ação coletiva, a peça. É sabido que tudo influencia tudo e todos a todo momento, mas é preciso saber de que lugar a decisão está sendo tomada. Isso é chamado de critério e é identificado no momento da ação. Como manter o critério com base na escolha e se manter generoso, alicerçado na escuta, demanda ceder poder. Significa o desmantelamento do poder, porque o improvisador não serve apenas a si mesmo, mas a algo que está para além de seu próprio corpoespaço, o trabalho artístico em questão e sua relação com o outro (parceiro de dança) e com o público. O material criado e o posicionamento do artista devem se relacionar com o todo. Mark Tompkins, em seu curso “Real-Time Composition”60, ministrado na casa de cultura de Villava – Atarrabio Kultur Etxea, em Navarra, Espanha, de 21 a 25 de setembro de 2015, quando questionado sobre como lida com a falência durante um espetáculo de composição em tempo real, respondeu: Há algumas maneiras de lidar com esta questão: posso não aceitá-la e tentar escondê-la, posso realizar truques e mostrá-los ou não ao público. O fato é que o público normalmente quer ver algo acabado e não aceita a falência. Na composição em tempo real podem haver pontos altos e baixos. O intérprete-criador pode aceitálos, mas a plateia não, a não ser que saiba observar o espetáculo. Como performer uso as seguintes estratégias: 1) saio de cena e recomeço, reconfigurando o trabalho; 2) mergulho na falência até transformá-la, inclusive com a possibilidade de convertê-la em um êxito; 3) exponho a falência verbalmente em cena, conversando em voz 60 Tradução sob minha responsabilidade: “Composição em tempo real”.
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alta com os colegas sobre o que está ocorrendo e a partir disso construímos novas possibilidades.
São interessantes as perspectivas trazidas por Mark de que a falência pode ser compreendida com naturalidade. É claro que na relação com o público há questões a serem lapidadas, quando tratamos de composição em tempo real. É possível criar uma relação de confiança com a plateia para que ela se coloque de modo ativo, aceite a falência como composição e crie o espetáculo junto com o intérprete-criador, no lugar de esperar algo pronto ou necessariamente bem-sucedido do intérprete-criador? Uma vez que a plateia é parte do espetáculo, é possível estimulá-la a compor em tempo real, como espectadora, e abrir-se para a naturalidade das imperfeições humanas?
Estava ali, fazendo nada, desfrutando nada, permitindo-se nada. Sendo nada. Um nada, tão nada que preenchia todo o espaço.
É possível colocar o público em composição, deslocamento e reflexão como Magritte o fez em sua obra La clave de los sueños? Construir o discurso a partir da vivência conjunta, mesmo que para isso saiamos das normativas vigentes? É possível convidar a plateia a uma experiência? A experiência, a possibilidade de que algo nos passe, nos aconteça ou nos chegue, requer um gesto de interrupção...: requer parar-se a pensar, parar-se a olhar, parar-se a escutar, pensar mais devagar, parar-se a sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos passa, aprender a lentidão, escutar aos demais, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência, dar-se tempo e espaço (LARROSA, 2003, p. 174).61 61 Tradução sob minha responsabilidade, do original: “La experiencia, la posibilidad de que algo nos pase, o nos acontezca, o nos llegue, requiere un gesto de interrupción...:
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Experienciar a improvisação e a composição em tempo real é abrir espaço de interação, de diálogo, de intercâmbio, de percepção intensa, de criação. É como saltar de paraquedas: ter controle e perder controle, colocando-se aberto aos sentidos. É permitir-se o gozo e a frustração e, com base nessas ações, em princípio individuais, compartilhar os sentidos, excitar ou desconstruir o outro por meio das relações que se estabelecem. A escrita e a leitura do movimento na improvisação, portanto, ocorrem simultaneamente, em estado de risco, nas possibilidades de falência e desestruturação de territórios de poder, na descentralização do eu, na prática profunda da experiência e no que isso pode gerar. E parece que esse é um exercício a ser realizado por intérprete-criadores e pela plateia, em comunhão e partir de suas diferenças e semelhanças, seus encontros e desencontros. O corpo é o lugar onde se inscreve cada história singular, o lugar onde os sentimentos e pensamento se manifestam, em pulsações, palavras, imagens, em nós que oprimem ou na brisa que arrefece a alma, mas nem sempre essa inscrição é lida em busca de seu sentido; a experiência é a possibilidade desta leitura, uma leitura necessária para que a marca seja uma verdadeira inscrição que ilumine o sentido do vivido. (CONTRERAS; DE LARA, 2013, p. 31).62
Os sentidos da experiência, na improvisação em Dança Contemporânea, ocorrem no próprio fazer, constroem-se e são reconhecidos enquanto se dança. Na composição em tempo real, as leituras sempre ocorrem de modo subjetivo, no entanto, a escrita deve ser objetiva. A concretude dos movimentos desenha o texto, com base na consciência de quem o escreve requiere pararse a pensar, pararse a mirar, pararse a escuchar, pensar más despacio, mirar más despacio y escuchar más despacio, pararse a sentir, sentir más despacio, demorarse en los detalles, suspender la opinión, suspender el juicio, suspender la voluntad, suspender el automatismo de la acción, cultivar la atención y la delicadeza, abrir los ojos y los oídos, charlar sobre lo que nos pasa, aprender la lentitud, escuchar a los demás, cultivar el arte del encuentro, callar mucho, tener paciencia, darse tiempo y espacio”. 62 Tradução sob minha responsabilidade do original: “El cuerpo es el lugar donde se inscribe cada historia singular, el lugar donde sentimientos y pensamiento se manifiestan, en latidos, en palabras, en imágenes, en nudos que oprimen o en brisa que orea el alma, pero no siempre esa inscripción es leída en busca de su sentido; la experiencia es la posibilidad de esa lectura, una lectura necesaria para que la huella sea una verdadera inscripción que alumbre el sentido de lo vivido”.
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sobre o que diz, como diz, de onde diz e para quem diz. Nessa perspectiva, podemos pensar que a improvisação é, sim, efêmera e duradoura. Efêmera no momento em que a cisão ocorre, mas duradoura pelo corte que provoca no tempo e no corpoespaço, modificando a relação com a realidade e pelas reverberações que provoca. Acordei cheirando flores. Um suspiro. Avoou.
Considerações finais Estabelecer um conceito de corpoespaço, que exploda a cinesfera, exige uma nova percepção do movimento e de como o indivíduo se comporta como mundo. Apagar as fronteiras e entender-se como processo unitário demanda uma percepção de atuação em que o indivíduo assume responsabilidades e coloca-se como construtor direto da matéria prática da vida, na medida em que toma decisões. Isso, pensado como potência na arte da improvisação e da composição em tempo real em dança, traz o desvelamento de um discurso imagético pautado na honestidade, que pode deixar transparecer virtudes e falhas, em cena. Compartilhar essas diferentes leituras com o público reforça a necessidade de novos diálogos entre intérprete-criador e plateia, baseados em cumplicidade, composição mútua, jogo, sinceridade no estabelecimento de acordos de ordem sinestésica. Essa perspectiva cria um tipo de envolvimento das partes que só é possível por meio de uma experiência que permita a profundidade das relações, criada por dispositivos de convivência que se estabelecem na própria composição da dança, por meio do movimento. Talvez o maior desafio desse processo, em um momento social em que o “aparentar” é mais valorizado do que o “ser”, seja encarar, na prática, as obviedades da simplicidade, do desbloqueio da emoção, do esgarçamento da ignorância, da possibilidade do erro. Como dançar o óbvio? Como discutir o óbvio, por meio do movimento? Como avançar como seres humanos (artista e público) com base em nossa obviedade, em nossa falência e em nossa constante mortalidade provocada pelo corte da decisão? Nessa explosão de fronteiras, até onde ouso ir? Até onde me arrisco? 139
Este texto abre mais perguntas do que respostas. Perguntas essas cuja tentativa de respostas só tem sentido no fazer artístico. E, do mesmo modo que as práticas dos workshops e o desenvolvimento do espetáculo Dreams provocaram as questões que permeiam esta escrita, o presente texto modifica por completo meu corpoespaço e, portanto, a continuidade do espetáculo e as práticas docentes em que atuo. Assim, dá-se continuidade aos processos de improvisação e composição em tempo real em sala, em cena e na vida.
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Entrevistas TOMPKINS, Mark. (jul 2015). Entrevistadora: Ana Carolina Mundim. Paris, 2015. 2 arquivos.mov (26 min cada) FILMÓN, Claire. (jul 2015). Entrevistadora: Ana Carolina Mundim. Paris, 2015. 4 arquivos.mov (3 arq, 26 min cada, 1 arq 18 min)
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Ana Carolina Mundim Editor
Maria Lyra Translator
Approaches about improvisation in contemporary dance
Uberlândia 2017
Copyright 2017© Ana Carolina Mundim, 2017
All rights reserved. No part of this book may be reprinted or reproduced or utilised in any form or by any electronic, mechanical, or other means, now known or hereafter invented, including photocopying and recording, or in any information storage and retrieval system, without permission in writing from the publishers.
EDITOR Ana Carolina Mundim EDITORIAL BOARD Adriana C. Omena dos Santos Aparecido José Cirillo Cesária Alice Macedo Gazy Andraus Glayson Arcanjo Lídia Maria Meirelles Leda Maria de Barros Guimarães Luciana Arslan Mourão Mara Rúbia Marques Miguel Rodrigues de Sousa Netto Paula Arbex Raquel M. Salimento de Sá Renato Palumbo Dória REVISORS Marcela Henrique de Freitas Mariana Ferreira Olivia Maria Santos de Lima DESIGNER Emilliano Alves de Freitas Nogueira International Cataloging Data in Publication (CIP) Nelson Marcos Ferreira - CRB-6 / 3074 A154s Abordagens sobre improvisação em dança contemporânea = Approaches about improvisation in contemporary dance / Ana Carolina Mundim (editor) ; Maria Lyra (translator). -- Uberlândia : Composer, 2017. 276 p. : il.
ISBN 978-85-8324-058-7 Texts in Portuguese and English. Includes bibliography. Several authors.
1. Dance - creation. 2. Contemporary Dance 3. Composition in real-time. 4. Improvisation in dance. I. Mundim, Ana Carolina, (editor) II. Lyra, Maria, (translator). CDU 792.8 Av. Segismundo Pereira, 145 - B. Santa Mônica Uberlândia - MG - Fone: (34) 3236-8611 - Cel. 99173-6271 rita@composer.com.br
Approaches about improvisation in contemporary dance
has specific forms, structures and languages. The practice of improvisation in dance is, therefore, based on the organization of elements studied with and by the body, which can be accessed in the processes of real- time composition performed by the group (for example in the show “Sobre Pontos, Retas e Planos”), as fragments that aid the construction of a dance dramaturgy in the here-now3. As Mundim (2012, p. 114) points out about the working procedures of the research group:
In this article, I propose an approximation of these two universes: Brazilian dances and improvisation in dance. I seek to reflect on the possibilities of intersecting these two fields based on the understanding of the processes of improvisation in Brazilian cultural expressions. The intention of this text is, therefore, to reflect on improvisation in Brazilian dances, seeking to present an interpretation on the practice of improvisation and the improviser’s place in these dances; to raise the dimension of the body in Brazilian cultural practices; and to point out possible relations between the peculiar modes of improvisation in Brazilian dances and the processes of improvisation in contemporary dances. In order to accomplish this proposal, I start with the experiences in Brazilian cultural manifestations (especially from congado, reisados, pastoris, cirandas, samba de roda, jongo, capoeira, cavalo marinho and cacuriá), as well as the experiments and studies carried out in a theoretical 3 For more information on technical-creative procedures, artistic practices and theoretical studies carried out by the Research Group Dramaturgia do Corpoespaço, read: MUNDIM, Ana Carolina (org.). Dramaturgia do corpo-espaço e territorialidade: uma experiência de pesquisa em dança contemporânea (Body-space dramaturgy and territoriality: a research experience in contemporary dance). Uberlândia: Composer, 2012.
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DANCING, PLAYING AND IMPROVISING IN BRAZILIAN DANCES: POETICS OF A CROSSROAD
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Jarbas Siqueira Ramos CREATIVE INTERDISCIPLINARITIES IN DANCE COMPOSITION
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Mariane Araujo Vieira PROJECT BODY AND/IN MOVEMENT – THE CHILD AND THE COMPOSITION IN REAL-TIME
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Patrícia Chavarelli Vilela da Silva BODY AND ARCHITECTURE: THE POETICS OF THE ARCHITECTURAL SPACE ON DRAMATURGY IN REAL-TIME COMPOSITION
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Emilliano Alves de Freitas Nogueira IMPROVISATION IN DANCE: BODYSPACE IN EXPERIENCE
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From these meetings, we felt the need to create an extension of the research group, called Conectivo Nozes, which was created in order to broaden the possibilities of dialogue between our studies and the community through the production and circulation of artistic work. There was a desire to provide sharing actions (promoting events, meetings, residences, workshops, presentations) and for the initiative to carry out pedagogical practices in public schools. In addition, Conectivo also produces academic articles, books, documentaries, interviews and the organization of research materials, which can be found online: http://www.conectivonozes.blogspot.com. In this course of work, the group has already undergone different formations and experimented with different ways of structuring, which has brought constant revisions and reflections about its own work and ways of acting. The present book “Abordagens sobre improvisação em dança contemporânea” (Approaches about Improvisation in Contemporary Dance) is organized on the basis of the individual research that originated or was strengthened in this encounter. The book brings together the texts of five researchers who have been part of the group in recent years. The article “O dançar/jogar/improvisar nas danças brasileiras: poéticas de uma encruzilhada” (Dancing, playing, and improvising in Brazilian dances: poetics of a crossroad), written by Prof. PhD. Jarbas Siqueira, articulates the improvisation in the Contemporary Dance and Brazilian dances, based on his experience as a player and performer in Conectivo Nozes. The text is related to his doctoral research, integrated to DINTER/UNIRIO-UFU (PPGAC/ UNIRIO), tutored by Prof. Dr. Narciso Telles and financed by CAPES. The article “Interdisciplinaridades criativas na composição em dança” (Creative interdisciplinarities in dance composition), written by Mariane Araújo Vieira, discusses the possibilities of composition in Contemporary Dance based on improvisation, therefore, creating a dialogue with some contents of Quantum Physics. The text draws on her undergraduate thesis in dance, carried out under my orientation in the Dance Graduation Program of the Federal University of Uberlândia. The article “Projeto corpo e(m) movimento – a criança e a composição em tempo real” (Project body and/in movement - the child and the composition in real-time), from Profa. Ms. Patrícia Chavarelli, shares her experiences over three years with children and young people at Parque 8
São Jorge’s State School, through the “Body and/in movement” extension project. In the text, the researcher approaches different forms of attention (sensitive, relational and creative) that can be worked through the study of movements and real time composition in dance. The article “Corpo e arquitetura: a poética do espaço arquitetônico na dramaturgia na composição em tempo real” (Body and architecture: the poetics of architectural space on dramaturgy in real-time composition), by Prof. Ms. Emilliano Alves de Freitas Nogueira, deals with the physical and socio-cultural aspects of spaces and the ways in which they interfere in the qualities of movements and in the process of creation during real time improvisation and composition in dance. The article “Improvisação em dança: corpoespaço em experiência” (Improvisation in dance: bodyspace in experience), of my authorship, develops the concept of ‘bodyspace’ in real time improvisation and composition in Contemporary Dance. It also discusses the connections with the writing and reading processes involving the viewer in dance improvisation – viewer whose discursive writing process takes place in the actual bodyspace, in the present moment - and in real time composition, where, in a more comprehensive way, on stage, with present audience, possibilities of success and failure are widened. The text is linked to a postdoctoral internship held in 2015 at the Universitat de Barcelona (UB), under the guidance of Prof. Dr. Jorge Larrosa Bondia, funded by CAPES (Postdoctoral Research Abroad/Portaria 36/2013 Postdoctoral Internship - Call I 2015) We hope that the research developed by the group and shared here serves as a channel for dialogue with other interested parties in Dance, with the very intention to strengthening our area of knowledge inside and outside universities, always connecting theory and practice. This book closes a cycle in the path of our group, which recreates and transforms itself from now on, with new configurations. We invite readers to follow the changes to come! For now, we wish you a good reading and invite you to a joint reflection!
Ana Carolina Mundim 9
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In Brazilian dances, the game/play appears as a constituent element of the operandi modus of each manifestation. If in some practices playing is It is thinking of these two dimensions (crossroads and singingdancing-beating cultures) and in all the crossings caused by the relationships established in the ritual/festive practices and processes of each cultural manifestation that I seek to understand the intimate and indivisible relationship of dancing, playing and improvising in Brazilian dances. Considering these terms, I think that the notion of dance is associated with the dimension of play and that in many manifestations the terms dance, game and play mean the same thing. While approaching Brazilian cultures in my studies (thus, approaching Brazilian dance practices), two thoughts have been fundamental to support the reflections that I chose to undertake. The first refers to the idea that the cultural practices encountered by Brazil should be understood as crossroads cultures, as they are the result of intense cultural transformations/ translations/transcriptions based on the (not always friendly) relation between African, European and Native Brazilians on Brazilian soil. The second thought has to do with the idea proposed by Zeca Ligiéro (2011) about “singing-dancing-beating” as a form of expression that embraces a total action from the dancers of such cultural manifestations. In this context, I understand that ritual and votive practices of Brazilian cultures are characterized, precisely, because they do not separate their composing elements (singing, dance, “batuque” (drums), visual materials, plots etc.), thus forming an indivisible and inseparable whole that constitutes the semantic and symbolic universe of each manifestation. In this way, “Sing-dance-beat is not only a form, but a strategy of worshiping a memory, exercising it with the body in its fullness. A kind of organic prayer “(LIGIÉRO, 2011, p. 130). DANCING, PLAYING AND IMPROVISING IN BRAZILIAN DANCES Based on this epistemological posture, placing the observation of Brazilian dances in a perspective of comprehending the interconnected totality of its´s body dimension (movement, dynamics, tonicities) and symbolic dimension (world cosmovision), other important aspects of Brazilian dances become clear for our eyes, such as the intrinsic relationship with play and improvisation.
Uberlândia 2017
Approaches about improvisation in contemporary dance Translator
Maria Lyra Editor
Ana Carolina Mundim
These “Brazilian dances” were the center of the modernist project of the early twentieth century, when intellectuals such as Mário de Andrade, Câmara Cascudo, Arthur Ramos, Sílvio Romero, among others, engaged in the recording of both musical aspects and “choreography” of several dances in the interior of Brazil. However, it is clear that the recordings made by these researchers/folklorists are much more detailed regarding the songs than the dances, the bodies and their players. It is noteworthy how these dances were described, analyzed and treated by these researchers, who always saw them through the Eurocentric prism, categorizing them as The “Brazilian dances” or “Brazilian folk dances” are a set of various cultural expressions or manifestations that are scattered throughout the national territory and that congregate through the movement, an intimate relation with the sonorities and orality, a whole set of cultural and symbolic know-how of each tradition. Although some of these expressions are “social constants”, (for example, Reisados, which can be found all over Brazil) they preserve unique characteristics depending on each place and each sociocultural reality. PROCEDURES OF OBSERVATION: AN PERSPECTIVE OF THE BRAZILIAN DANCES
EPISTEMOLOGICAL
Starting from my experience, but without being restricted to it, my purpose is to open a space for dialogue about the ways in which Brazilian dances have been repeatedly treated and worked in the universe of academic training in Dance, especially at this moment of expansion of Dance degrees programs in Brazil. Thus, the reader can find here sketches, scribbles, traces of an experience that can inspire those who wish to experience new crossings, new crossroads. and practical way in the Studies Group Dramaturgia do Corpoespaço4, seeking not to fix an idea or concept on the subject, but to enable a more intimate dialogue between these two universes: improvisation in Brazilian dances and improvisation in contemporary dances.
023855 - RITA - CADERNO 18 LADO A
We study in our bodies technical-creative content: mechanisms and resources that contribute to the artistic and professional development of those involved in the research and which provide us with support for the elaboration of a scenic work that allows the transformation of creative games into play-shows, with its poetic compositions in real-time. We study to reshape our ways of seeing the world, living with it and interfering with it. [...] We seek the affective possibilities in our micro relations and micro actions, capable of reverberating in other micro relations and other micro actions.
CONTENTS
Approaches about Improvisation in Contemporary Dance: PRESENTATION The Research Group Dramaturgia do Corpoespaço was created in 2010, as the first action of the Bachelor’s Degree in Dance, implemented in 2011, at the Federal University of Uberlândia. The group, founded by Professor PhD. Ana Carolina Mundim, was initially called “Grupo de Pesquisa Dramaturgia do Corpo-Espaço e Territorialidade”, and has its focus in the bodyspace and its technical-creative possibilities in Contemporary Dance, especially concerning improvisation and composition in real time. In this context, it was the premise of the group, since its inception, the search for dialogue with other areas of knowledge, expanding concepts and practices through interdisciplinarity. The group, composed of teachers, students and technicians has gathered, to this date, besides the members of the Dance Program, researchers from Architecture, Music, Mechanics Physics and Theater. The theoretical-practical contributions brought by these individuals with such distinct perspectives have re-dimensioned the established relationships and created a network of hybrid possibilities in the processes and results of our studies. We understand the Dance as a meeting point. Our actions are permeated by: theoretical discussions, through the reading of several texts, books or articles, and aesthetic appreciation through videos and experiments based on corporal practices. The practices run through the universe of Contemporary Dance, based on propositions with phrases of movement and guided improvisations, jam sessions and games to exercise group perception. The appraisal of videos occurs to share references which come close to our field of study, whether through plays, films, documentaries or interviews. The theoretical discussions have been based on the bibliography previously chosen by the group, which comprises texts discussing improvisation and composition in real time, aspects of the bodyspace, technical-creative procedures and methodologies of work in Dance. During the study of the books, we bring articles and additional texts on the subjects, especially to deepen in the studies of the concepts that guide our research: dramaturgy; bodyspace; improvisation and real-time dance composition. 7
From these meetings, we felt the need to create an extension of the research group, called Conectivo Nozes, which was created in order to broaden the possibilities of dialogue between our studies and the community through the production and circulation of artistic work. There was a desire to provide sharing actions (promoting events, meetings, residences, workshops, presentations) and for the initiative to carry out pedagogical practices in public schools. In addition, Conectivo also produces academic articles, books, documentaries, interviews and the organization of research materials, which can be found online: http://www.conectivonozes.blogspot.com. In this course of work, the group has already undergone different formations and experimented with different ways of structuring, which has brought constant revisions and reflections about its own work and ways of acting. The present book “Abordagens sobre improvisação em dança contemporânea” (Approaches about Improvisation in Contemporary Dance) is organized on the basis of the individual research that originated or was strengthened in this encounter. The book brings together the texts of five researchers who have been part of the group in recent years. The article “O dançar/jogar/improvisar nas danças brasileiras: poéticas de uma encruzilhada” (Dancing, playing, and improvising in Brazilian dances: poetics of a crossroad), written by Prof. PhD. Jarbas Siqueira, articulates the improvisation in the Contemporary Dance and Brazilian dances, based on his experience as a player and performer in Conectivo Nozes. The text is related to his doctoral research, integrated to DINTER/UNIRIO-UFU (PPGAC/ UNIRIO), tutored by Prof. Dr. Narciso Telles and financed by CAPES. The article “Interdisciplinaridades criativas na composição em dança” (Creative interdisciplinarities in dance composition), written by Mariane Araújo Vieira, discusses the possibilities of composition in Contemporary Dance based on improvisation, therefore, creating a dialogue with some contents of Quantum Physics. The text draws on her undergraduate thesis in dance, carried out under my orientation in the Dance Graduation Program of the Federal University of Uberlândia. The article “Projeto corpo e(m) movimento – a criança e a composição em tempo real” (Project body and/in movement - the child and the composition in real-time), from Profa. Ms. Patrícia Chavarelli, shares her experiences over three years with children and young people at Parque 8
São Jorge’s State School, through the “Body and/in movement” extension project. In the text, the researcher approaches different forms of attention (sensitive, relational and creative) that can be worked through the study of movements and real time composition in dance. The article “Corpo e arquitetura: a poética do espaço arquitetônico na dramaturgia na composição em tempo real” (Body and architecture: the poetics of architectural space on dramaturgy in real-time composition), by Prof. Ms. Emilliano Alves de Freitas Nogueira, deals with the physical and socio-cultural aspects of spaces and the ways in which they interfere in the qualities of movements and in the process of creation during real time improvisation and composition in dance. The article “Improvisação em dança: corpoespaço em experiência” (Improvisation in dance: bodyspace in experience), of my authorship, develops the concept of ‘bodyspace’ in real time improvisation and composition in Contemporary Dance. It also discusses the connections with the writing and reading processes involving the viewer in dance improvisation – viewer whose discursive writing process takes place in the actual bodyspace, in the present moment - and in real time composition, where, in a more comprehensive way, on stage, with present audience, possibilities of success and failure are widened. The text is linked to a postdoctoral internship held in 2015 at the Universitat de Barcelona (UB), under the guidance of Prof. Dr. Jorge Larrosa Bondia, funded by CAPES (Postdoctoral Research Abroad/Portaria 36/2013 Postdoctoral Internship - Call I 2015) We hope that the research developed by the group and shared here serves as a channel for dialogue with other interested parties in Dance, with the very intention to strengthening our area of knowledge inside and outside universities, always connecting theory and practice. This book closes a cycle in the path of our group, which recreates and transforms itself from now on, with new configurations. We invite readers to follow the changes to come! For now, we wish you a good reading and invite you to a joint reflection!
Ana Carolina Mundim 9
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DANCING, PLAYING AND IMPROVISING IN BRAZILIAN DANCES: POETICS OF A CROSSROAD Jarbas Siqueira Ramos1
INTRODUCTION My relationship with dance universe was mediated by “Brazilian dances” or “Brazilian popular dances”. Living the festive and ritualistic practices of several cultural manifestations and expressions spread throughout the northern region of Minas Gerais and Jequitinhonha´s Valley made me able to apprehend the intrinsic relations that take place between body, memory, tradition and contemporaneity through dance. These are the grounding material for the research and teaching proposals that I have carried out and developed over the last decade. From another perspective, the contact with dance improvisation, which happened because of the encounter with the Research Group Dramaturgia do Corpoespaço, at the Federal University of Uberlândia2, was very important so that I could understand some modes of operation and organization of the subject´s bodies in the manifestations and expressions, especially in festive and ritualistic processes. Working with this research group, I could observe in my artistic practice some traces of my experiences with Brazilian dances through the way I think and perform dance improvisations. In the research group, improvisation is seen as a way of producing a discourse about the world and as a practice of Contemporary Dance that 1 Professor of the Dance Program of the Federal University of Uberlândia - UFU. PhD in Performing Arts from PPGAC/Unirio. Master in Scenic Arts by PPGAC/UFBA. Master in Social Development by PPGDS/ Unimontes. Graduated in Arts/Theater from the State University of Montes Claros - Unimontes. Treasurer of the Brazilian Association of Research and Post-graduation in Performing Arts - Abrace (management 2015-2016). Member of the Research Group Dramaturgia do Corpoespaço e do Conectivo Nozes. Actor, dancer, cultural producer and researcher of Brazilian culture. E-mail: jarbasramos@ufu.br. 2 The Study Group Dramaturgia do Corpoespaço proposed by the teacher, researcher and artist Ana Carolina Mundim, originally linked to the Dance Course of the Federal University of Uberlândia - UFU, has as its objective the study of improvisation in dance based on the notions of dramaturgy of the body, body space and composition in realtime. For more information about the group, its actions and productions, visit the blog: conectivonozes.blogspot.com.br.
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has specific forms, structures and languages. The practice of improvisation in dance is, therefore, based on the organization of elements studied with and by the body, which can be accessed in the processes of real- time composition performed by the group (for example in the show “Sobre Pontos, Retas e Planos”), as fragments that aid the construction of a dance dramaturgy in the here-now3. As Mundim (2012, p. 114) points out about the working procedures of the research group: We study in our bodies technical-creative content: mechanisms and resources that contribute to the artistic and professional development of those involved in the research and which provide us with support for the elaboration of a scenic work that allows the transformation of creative games into play-shows, with its poetic compositions in real-time. We study to reshape our ways of seeing the world, living with it and interfering with it. [...] We seek the affective possibilities in our micro relations and micro actions, capable of reverberating in other micro relations and other micro actions.
In this article, I propose an approximation of these two universes: Brazilian dances and improvisation in dance. I seek to reflect on the possibilities of intersecting these two fields based on the understanding of the processes of improvisation in Brazilian cultural expressions. The intention of this text is, therefore, to reflect on improvisation in Brazilian dances, seeking to present an interpretation on the practice of improvisation and the improviser’s place in these dances; to raise the dimension of the body in Brazilian cultural practices; and to point out possible relations between the peculiar modes of improvisation in Brazilian dances and the processes of improvisation in contemporary dances. In order to accomplish this proposal, I start with the experiences in Brazilian cultural manifestations (especially from congado, reisados, pastoris, cirandas, samba de roda, jongo, capoeira, cavalo marinho and cacuriá), as well as the experiments and studies carried out in a theoretical 3 For more information on technical-creative procedures, artistic practices and theoretical studies carried out by the Research Group Dramaturgia do Corpoespaço, read: MUNDIM, Ana Carolina (org.). Dramaturgia do corpo-espaço e territorialidade: uma experiência de pesquisa em dança contemporânea (Body-space dramaturgy and territoriality: a research experience in contemporary dance). Uberlândia: Composer, 2012.
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and practical way in the Studies Group Dramaturgia do Corpoespaço4, seeking not to fix an idea or concept on the subject, but to enable a more intimate dialogue between these two universes: improvisation in Brazilian dances and improvisation in contemporary dances. Starting from my experience, but without being restricted to it, my purpose is to open a space for dialogue about the ways in which Brazilian dances have been repeatedly treated and worked in the universe of academic training in Dance, especially at this moment of expansion of Dance degrees programs in Brazil. Thus, the reader can find here sketches, scribbles, traces of an experience that can inspire those who wish to experience new crossings, new crossroads. PROCEDURES OF OBSERVATION: AN PERSPECTIVE OF THE BRAZILIAN DANCES
EPISTEMOLOGICAL
The “Brazilian dances” or “Brazilian folk dances” are a set of various cultural expressions or manifestations that are scattered throughout the national territory and that congregate through the movement, an intimate relation with the sonorities and orality, a whole set of cultural and symbolic know-how of each tradition. Although some of these expressions are “social constants”, (for example, Reisados, which can be found all over Brazil) they preserve unique characteristics depending on each place and each sociocultural reality. These “Brazilian dances” were the center of the modernist project of the early twentieth century, when intellectuals such as Mário de Andrade, Câmara Cascudo, Arthur Ramos, Sílvio Romero, among others, engaged in the recording of both musical aspects and “choreography” of several dances in the interior of Brazil. However, it is clear that the recordings made by these researchers/folklorists are much more detailed regarding the songs than the dances, the bodies and their players. It is noteworthy how these dances were described, analyzed and treated by these researchers, who always saw them through the Eurocentric prism, categorizing them as 4 Since the year 2014, I have actively participated in the Research Group Dramaturgia do Corpoespaço and Conectivo Nozes, an artistic group that emerged as an extension of the research group.
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choreography, entanglements and/or steps, always with the intention of decoding them. For a long time, the understanding of Brazilian dances went through this Eurocentric notion of Dance, which understood them as a sequential chain of steps ordered in time and space, according to the musical rhythm associated with it. However, I have understood, as many researchers in Brazilian dances today, that this notion does not account for all the complexity involved in the organization, performance and execution of these dances, both in their corporeal dimension and in the symbolic dimension. Thus, the need of adopting an epistemological posture that allows meaning and significance to the dances that are placed outside the Eurocentric axis, such as Brazilian dances, has become an emergency for researchers who focus on these materials and these realities. The adoption of another epistemological posture inevitably goes through the reformulation and reorganization of thought and discourse on the subject of study, in this case, the Brazilian dances. It is also a way of putting a closer and deeper position on the dynamics and body states of dance practices found in the several Brazilian cultural expressions. To that end, I bring three proposals in order to organize this observation. The first proposal I bring is that of a displacement of the preestablished idea about Brazilian dances, in the search for an understanding that the approach must consider the cultural diversity, ritual and festive practices that congregate through dance the peculiar ways of organizing knowledge from the most diverse Brazilian cultural groups. Added to this is the relativistic notion that each reality and each culture are culturally specific and that, for this reason, can cause diversified forms of producing meaning. As a second proposal, I suggest that the reflection on Brazilian dances occurs less for the way the dance is performed and more because of the organization and production of symbols presented in each of its expressions. At this point, I corroborate with Domeniciâ&#x20AC;&#x2122;s (2009) thinking about the complexity in the chains of signs implied in each of these dances and the emerging need to understand them in their density. I understand, like the author, that the corporal engagement of the dancers/players produces symbols and meanings, as the know-how becomes â&#x20AC;&#x153;embodied meanings.â&#x20AC;? 14
The third proposal emerges from the need to understand the corporalities through the dancer’s/player´s perspective and, in this way, to produce a thought that prioritizes the decolonization of the body. For that, the intention is to create a more sinuous and metaphorical sight into the Brazilian dances, understanding that they are formed by the different ways in which the dancer defines and redefines the dance. According to Domenici (2009), from this perspective, it is possible to look at Brazilian dances with the same interest that foreign dances look at, as well as to elicit other possibilities for understanding Brazilian dances, for example, body states, metaphors or playwrights of bodies in motion. In assuming a new epistemological posture, seeking to understand and analyze in a more profound, organic and dynamics way the corporal and symbolic dimensions that are involved in Brazilian dances, I try to understand the innumerable variants existing inside these dances, considering that they can admit differences and contrasts, regarding movement, rhythmic accentuation, body tonicity or body drawings in spaces, as asserted by Domenici, (2009), or even in the way of apprehending the symbolic universe and the worldview of the group and/or of what the dancer´s/player´s body expresses. In the meantime, the learning of Brazilian dances takes place as the dancer/brincante (player) creates a relationship with the manifestation and with its teacher, experiencing it over and over. It is not, however, a learning of a model, a copy of movements or a reproduction of the other´s actions. In Brazilian dances, each subject dances in his/her own way, respecting the constraints and hierarchies that each cultural manifestation cultivates. There is no requirement of a single way to perform movement or action, and the differences are seen as the peculiar way in which each person “plays” or “dances.” According to Domenici (2009, p.10), the learning of these dances takes place through the “[...] understanding of general principles, of main traits such as dynamics, qualities, tonic patterns, among others “that determine the “body dynamics”5 of each cultural manifestation and of each subject involved in it. 5 Eloísa Domenici (2009) points out that adopting the term “body dynamics” rather than the term “steps” when we refer to the characteristic elements of the player’s movement in the Brazilian cultural manifestations is a way of trying to account for the diversity and complexity of the movement and of corporalities in Brazilian popular dances.
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Based on this epistemological posture, placing the observation of Brazilian dances in a perspective of comprehending the interconnected totality of its´s body dimension (movement, dynamics, tonicities) and symbolic dimension (world cosmovision), other important aspects of Brazilian dances become clear for our eyes, such as the intrinsic relationship with play and improvisation. DANCING, PLAYING AND IMPROVISING IN BRAZILIAN DANCES While approaching Brazilian cultures in my studies (thus, approaching Brazilian dance practices), two thoughts have been fundamental to support the reflections that I chose to undertake. The first refers to the idea that the cultural practices encountered by Brazil should be understood as crossroads cultures, as they are the result of intense cultural transformations/ translations/transcriptions based on the (not always friendly) relation between African, European and Native Brazilians on Brazilian soil. The second thought has to do with the idea proposed by Zeca Ligiéro (2011) about “singing-dancing-beating” as a form of expression that embraces a total action from the dancers of such cultural manifestations. In this context, I understand that ritual and votive practices of Brazilian cultures are characterized, precisely, because they do not separate their composing elements (singing, dance, “batuque” (drums), visual materials, plots etc.), thus forming an indivisible and inseparable whole that constitutes the semantic and symbolic universe of each manifestation. In this way, “Sing-dance-beat is not only a form, but a strategy of worshiping a memory, exercising it with the body in its fullness. A kind of organic prayer “(LIGIÉRO, 2011, p. 130). It is thinking of these two dimensions (crossroads and singingdancing-beating cultures) and in all the crossings caused by the relationships established in the ritual/festive practices and processes of each cultural manifestation that I seek to understand the intimate and indivisible relationship of dancing, playing and improvising in Brazilian dances. Considering these terms, I think that the notion of dance is associated with the dimension of play and that in many manifestations the terms dance, game and play mean the same thing. In Brazilian dances, the game/play appears as a constituent element of the operandi modus of each manifestation. If in some practices playing is 16
the fundamental basis for the construction of the danced expression, as in the cavalo-marinho (seahorse), bumba meu boi (bumba my ox) or in capoeira, in other practices it is disguised in subtle forms of its expression, as in the oralities of the congados or on the umbigadas of samba’s circles. Taking that into consideration, I agree with Johan Huizinga (2007), when he alludes that it is possible to consider the game and its ludic capacity as the main form of organization of the subjects in society. For the author, playing was the basic element capable of ensuring the organization of societies and the construction of their worldview, because “it is a distinct and fundamental factor, present in everything that happens in the world.” According to Huizinga (2007), the defining characteristic of playing is fun. It is, however, a playful amusement, which associates the rational and operative capacity of the subject with his/her creative dimension. Therefore, playing is fundamental for the development of the world’s aesthetic perception. Another feature of the game is that it is a human activity based on rules, arbitrary or imperative systems, that guide the way the subjects act. Here, I speak from a perspective that understands the practice of Brazilian dances as a specific moment of human action, a cut in time and everyday space and the opening of extra-daily time and space specific to each cultural manifestation. This space, understood by Caillois (1990) as a space-time of game, is established, as “players” feel free to “play”, creating an atmosphere of joy and fun. This is only possible because another fundamental characteristic of the game is the guarantee of freedom, being an obligation or duty only when it is connected or constitutes “a recognized cultural function, as in worshiping and rituals” (HUIZINGA, 2007, p.11). The game is, therefore, a fundamental element of Brazilian dances. When the player dances the player also plays. Play with space, with time, with his/her own memory and with that of the other. Play with the other. Dancing, the game happens; and as the game unfolds, the dance is gaining shape, structure and being embodied. Huizinga (2007, p.11) points out that “every game is capable, at any moment, of absorbing the player entirely”; so I can say that the same goes for Brazilian dances, because dance can “infect” in such a way that both the dancer and the observer can be captured by the images and memories, being absorbed by dance and by the manifestation itself. 17
In this dimension, and considering the ability to establish the game as a collective and individual attribute, the act of improvising refers to the singular ways of putting oneself in relation to the other. I understand improvisation in Brazilian dances as a process of communication in which the body that dances establishes a permanent exchange of information with the subjects that participate in the cultural manifestation, whether they are the dance producers themselves or the spectators. The act of improvising is a polysemous action which starts from the corporeal experience of each subject (but is only completed in the interlocution with the other subjects of the manifestation) and can be thought when the improviser presents his/ her capacity and quality in the execution of the most complex modes of producing the communication about the worldview of the group or society. By improvising, subjects reveal how they understand and interpret the codes of their cultural manifestation, recreating and transcribing the collective memories that form the groupâ&#x20AC;&#x2122;s worldview. Improvising/ playing, the subject remakes his/her dance, not as another form of Brazilian dance organization, but as a possibility of building new discourses and new proposals of play in relation to each other. Improvising is, therefore, a strategy used to put oneself differently in relation to the surrounding world. Just as the game, improvisation occurs at very specific moments in Brazilian dances (and this is also quite distinct in each cultural manifestation). There are times when it is permissible to improvise, just as there are times when improvisation is not well seen. If in cavalo marinho (seahorse) improvisation is the basis of the dance construction, in congada, for example, there are few moments in which one can improvise. The improvisation happens to the extent that there is a relationship of reliability between the master and the dancer/player as much as a trust regarding the performance6 as improviser. The more one has mastered the codes which build up the manifestation, the greater the confidence in performing the improvisation and the greater the complexity present 6 In using the term performance, I am referring at this point to the way of accomplishing the action and not to the language of performance as art. As Shechner (2003) points out, the term performance can refer, from the capacity/quality of action of a car, to the performance of an artist in the creation and presentation of an artistic work. In the case of the artistic work, the director of the action is called performer.
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in the dance performance. The improviser is thus the subject capable of agglutinating the know-how of cultural manifestation using them in diversified ways in their dance performance. It is in these terms that dance takes place in the Brazilian cultural context, by the relation between dancing/playing/improvising. Therefore, there is integration between movements, musicalities, visuals and textualities/orality which characterize the performative practice of the dancer/player of each cultural manifestation, protecting the particular way of expression of each one of these dances. In capoeira, for example, movement occurs in the same dynamics as music takes place in the roda (circle), creating a correlation both regarding the rhythm used by the instruments played, to the textualities presented in each song and to the body dynamics presented by each subject. In this way, movement, musicality and textuality are complementary and inseparable, since dance only occurs when these three dimensions happen in the same time-space. Returning to the initial argument, in which I point out the dimensions of the crossroads and dance-singing-beating as constituent elements of what I present as the dance/ play/improvisation of Brazilian dances, I understand that this set is carried out through the repertoire of each manifestation, of each group, of each subject. I understand repertoire, as well as Diana Tylor (2013), as the practice of embodied memories that occur as the experience of cultural manifestation itself, in the body of subjects, grappling with the specific knowledge of their worldview. The repertoires are the marks, the traces left by the know-how that, constituted in a more ephemeral way, can be erased, forgotten, silenced, emptied because they constitute strong ties, because they make stick onto the body-memory only the indispensable for the maintenance of tradition (whether collective or individual) 7. Improvisation occurs as the repertoire is accessed by the dancer/ player in the moment he/she dances. In the meantime, collective memories and individual memory create a spiral dynamic in the dancerâ&#x20AC;&#x2122;s body 7 Diana Tylor (2013, p 57) reflects on the idea of repertoire: â&#x20AC;&#x153;Part of what performance and performance studies allow us to do then is to take seriously the repertoire of embodied practices as an important system of knowing and sharing of knowledge. The repertoire, at a very practical level, expands the traditional archive used by academic departments in the humanities. â&#x20AC;&#x153;
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recreating/transcribing movements in time-space, agglutinating both restored behaviors and new procedures as the intersections of memories occurring at the time of the action itself. By dancing/playing/improvising, the subject constructs new meanings for his or her way of dance expression. Finally, understanding the indivisibility of the constituent elements of any Brazilian cultural manifestation, improvisation can happen both in the dynamics of dancing body as well as in the musicality and/or orality of the dancer. In Cavalo-Marinho´s manifestation from the forest zone of Pernambuco state, the figures arise as soon as they are evoked, they emerge through the movement of the body as well as through the orality and musicality which characterize them. In the Congada, the improvisation can happen while singing, through the musicality of the instrument or in the structures of the dancer´s body movement. In Capoeira, Reisados, Cantigas and all other forms of Brazilian dance expression, the same relation occurs, producing specific meanings according to each manifestations and to the corporeal realities of the subjects involved in them. THE IMPROVISER IS CREATED ON THE CIRCLE: THE KNOW-HOW OF IMPROVISATION IN BRAZILIAN DANCES The dance/play/improvise “is done in the circle”. The metaphor of the circle/wheel called roda is used here to understand both the operandi locus of the time-space relationship for Brazilian dances and the ritual aspects that involve the worldview of each group and each subject. Circle/ wheel terminology or related terms, for example, “spinning”, are constantly used in Brazilian manifestations as an element for delimiting time-space where the ritual, the party will take place. This can be perceived in some situations: while in capoeira the game only begins when “the circle/wheel is formed”, in the Folias de Reis the walk between the houses for the visits to the baby Jesus are called “giro”. The establishment of this sacred/secular timespace is what guarantees one of the fundamental characteristics of Brazilian dances: performativity. It is in the circle/wheel, in the “giro” (spinning), that the dancing players put themselves before the others’ gaze. It is by circularity that the relation of eternal return to the initial point is established. It is in this timespace that the world spins and always returns to the same place: the starting 20
point of life. It is in the roda (circle/wheel), in the spinning,in the gira, through the circularity of life that occurs the dancing/playing/improvising. Understanding, therefore, that dancing/playing/improvising is a preponderant element for the unveiling of improvisation capacity in Brazilian dances, I can affirm that the act of improvising happens as the dancer dives into the dance/play of his/her cultural manifestation. In these terms, the deeper the deepening of ritual/festive experience, the greater the immersion in the experience of the here-now moment, the greater the possibility of improvisation happening. Although there is freedom to perform improvisation, especially in the moments of meetings for the ritual´s/festive´s preparation, it is notorious the existence of a hierarchy to perform improvisation in Brazilian dances, especially when it happens for a certain audience. In such cases, the groups choose, nominate, or define those who are recognized as the best improvisers to perform for the audience. In Brazilian dances, the good improviser is one who can overcome the limits of dance and maintain in his/her performance the basic and specific symbolic structures, which characterize the dance of his/her cultural manifestation. Thus, the more complex and difficult the performance of the dance is, the greater is the subject´s ability to improvise. Thinking through the basis of the anthropological notions raised by Marcel Mauss (1974), in his studies on body techniques, and by Richard Schechner (2003), regarding the idea of Cultural Performances, it is possible to consider that the dancer/improviser, adds more effectively and with greater virtuosity and dexterity all the constituent elements of cultural manifestation, creating, dismantling, recreating and transcending all modes of communication and all the signs of its cultural expression. When improvising, the intention of the dancer/player is to carry out his/her action with the highest degree of physical, sensitive, emotional, signic and communicative quality. What defines a subject as a great improviser is his or her performance in front of the audience, whether in their community or those on their margins. Thus, a good improviser is a subject capable of performing his/her dance with a high degree of complexity. It is thinking about the issues which involve the improviser’s performance from 21
Brazilian dances that I consider pertinent to establish a reflection on these two conceptual aspects presented: virtuosity and effectiveness. According to Mauss (1974), virtuosity is related to the subject’s technical ability/ability to perform and fulfill a certain action; it could be an everyday action or something extra-ordinary. Still considering Mauss’s (1974) thought, virtuosity becomes evident when the subject’s body presents a body technique8 capable of differentiating its organization and somatic structure from those undertaken by the everyday body. In Brazilian dances, therefore, it occurs as the dancer is required to master specific qualities, abilities and/or abilities of a particular cultural manifestation, such as physical endurance, bodily and vocal dexterity and ease, fluency, the rhythmic (bodily or musical), orality, etc. Virtuosity is also associated with how subjects organize their body memories and place them before another person’s gaze. According to Armindo Bião (2007), in his studies on ethnocenology, this refers to the capacity to create, establish and share altered states of body and consciousness, putting itself in a more or less spectacular way for the other’s gaze in an incessant search for overcoming their limits (physical, emotional, psychological) and their ability to perform during the improvised action. For Oliveira (2006), virtuosity is associated with the ability of the dancer/ player to highlight their movement, their musicality, their vocality and their performance, demonstrating the high level of body quality during the performance of the ritual, regardless of the difficulty that may exist for its execution. From this perspective, a virtuous dancer/player always seeks excellence in the accomplishment of what is proposed. Regarding effectiveness, the thoughts of Marcel Mauss and Richard Schechner are distinct and complementary in their observations. While Mauss (1974) understands it as a capacity for organization of body 8 In addressing the term “body techniques,” I do so by reading and interpreting the notion developed by Marcel Mauss in his studies of the body in everyday and extra-daily practices. In these terms, I refer to techniques not as a unique and exclusive type of training, but as distinct ways of organizing the body to achieve the quality of movement that each dance demands. As an example, I think of the qualities of the musical body in order to achieve the pulsating movement in the congada, the force required to perform maracatu, in the “ginga” and sinuosity required to play capoeira, in the intermittent rotation of the coureiras in the tambor da crioula, in the articular flexibility found in frevo dancers, and so on.
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techniques to be used exclusively when necessary, slowing down, inhibiting and preserving movements in relation to the overwhelming emotion of the moment; for Schechner (2003), efficacy refers to the ability to achieve the desired effect ;during performative action, fulfilling with the highest degree of satisfaction and yield all the aesthetic and ethical standards expected to perform the action. In both perspectives, the effective body is one that performs its actions without waste and without unnecessary use of its technique. An effective subject has sufficient skills to know how to measure the use of his/her abilities and bodily qualities in order to reach and surpass the expectations built on his/her actions. The greater the subjectâ&#x20AC;&#x2122;s consciousness in the use of his/her techniques and in the use of his/her virtuosity, the greater is the ability to make actions effective, and, thereby, distinguish the dancer from other subjects, turning the dancer into a good performer. Efficacy is thus related to the performance of the subjectâ&#x20AC;&#x2122;s actions, aiming to achieve the expected results and to exceed the limits based on the virtuosity of the dancer. In Brazilian dances, effectiveness is associated with the technical conditions that the body has to achieve the qualities required in each cultural manifestation and in each type of dance. I agree with Oliveira (2006) when he calls attention to, in his study about Cavalo Marinho (seahorse dance), the effectiveness as the preponderant element for the construction and full communication of the codes stipulated by the cultural expression. Thus, the role of efficacy is in enabling the symbols and signs printed by cultural manifestation to result in a conscious (by the observer) apprehension of their know-how. According to Turner (1974), the symbolic messages emitted by the subjects of a given manifestation are based on the elements that constitute the very consciousness that they have of that manifestation. I understand that virtuosity and efficacy are not opposed to the spontaneity of the dancers/players and thus are preponderant for improvisation to take place in the several existing Brazilian dances. Freedom of improvisation, coupled with virtuosity and efficacy, leads the improviser to its limit, and thus he/she becomes capable of recreating, transcending, and feedbacking his own manifestation and its codes. Although some cultural manifestations may present more codified structures than others, there is no impossibility for the existence and production of improvisation 23
and the more or less effective permanence of the character of improvisational freedom in Brazilian dances. Thus, it is possible to say that dance/play/improvisation is an inseparable and indivisible set of ways to organize Brazilian cultural manifestations, being a constituent element of several dances and bodies´structures of production throughout Brazil. FROM IMPROVISATION IN BRAZILIAN DANCES TO REAL-TIME COMPOSITION IN CONTEMPORARY DANCES: CROSSROADS POETICS As I said before, dancing/playing/improvising in Brazilian dances is a way to get “in the circle/wheel”. In this circle, freedom of improvisation must be seen as a possibility of constructing embodied meanings based on the repertoire of the subjects who participate in them and of their collectivities. It is exactly in this context that the experience is placed as operator for the construction of senses by the dancer´s body; after all, I believe that the experience/sense9, as proposed by Jorge Larrosa Bondia (2014), is built in the crossings and impregnations that occur in the body and by the body. The experiences lived in the Brazilian cultural manifestations, especially the congado, folias de reis and capoeira, were essential for the organization of my corporality. I start from the assumption that the contact and the relationship with these manifestations and their different body dynamics allowed the constitution of a body repertoire based on complex processes of signification and resignification of these experiences, leaving in the body marks that are constantly crossed (indivisible and simultaneously) by the several body techniques learned in the innumerable daily and extraordinary practices, both in art and in ordinary life.
9 The author proposes to think of the pair experience / sense as a fundamental element for the educational process. The author makes the following statement regarding his idea of experience: “Experience is what passes us by, what happens to us, what touches us. Not what passes by, not what happens, or what touches. Many things happen every day, but at the same time, almost nothing happens to us. It would seem that everything that happens is organized so that nothing happens to us. Walter Benjamin, in a celebrated text, already observed the poverty of experiences that characterizes our world. Never has so many things gone by, but the experience is more and more rare “(LARROSA, 2014, 18).
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In this context, the relationship I establish with improvisation is a reflection of this repertoire of memories embodied by the experience of Brazilian dances. Thus it is clear that the way I move, the decisions I make, the directions I point out, the discourses/statements I present, and the structures I use at the moment I dance are directly linked to the embodied subjective, metaphoric and sensory-motor experiences in this universe. From the established relationship with Brazilian dances to contact with other dance languages (especially contemporary dances), improvisation was a place of research, organization, production and artistic and pedagogical creation, whether in the process of preparing actors and dancers, or in the processes of aesthetic elaboration of characters and/or shows. However, it was only in the year 2011, after joining, as a lecturer, the Federal University of Uberlândia, that I was able to have contact, through the Research Group Dramaturgia do Corpoespaço, with improvisation and composition in realtime as constituent elements of the art piece. In this direction, the encounter with the research group and, consequently, the dive into the universe of improvisation in Contemporary Dance were important both for the understanding of the formative processes impregnated in my dancing body and for the understanding of my repertoire. When the experiences of improvising through Brazilian dances, the embodied memories, and creative practices in the research group intersect, my place as an improviser and interpreter-creator emerges in a very peculiar way while composing in real-time10. Regarding creative processes in real-time composition, I agree with the following note by Ana Carolina Mundim (2012, p.105): Creating the scene in real-time does not mean starting from “nowhere”. From their body laboratories, the creator-interpreters combine vocabulary, repertoire, possibility of body states and use of space and time 10 According to Mundim (2012, p. 105), “Real-time composition requires from the performer-creator, not only a domain of his/her own body, but an increase of collective relations and compositional tools, an attitude of making choices and trust decisions. Connecting with the environment, relating to the proposals offered by it (sounds, gestures, places, situations, etc.) and perceiving the other (artist or spectator) with the completeness of a body who knows how to position itself through the occurrences of life can make of the interpreter-creator a poetic writing in movement.”
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that will serve as a reference for improvisation to be performed on stage. Real-time composition demands from the interpreter-creator, beyond a domain of his/ her own body, a potentiation of collective relations and compositional tools, an attitude of making choices, and confidence in the decisions made. Connecting with the environment, relating to the proposals offered by it (sounds, gestures, places, situations, etc.) and perceiving the other (artist or spectator) with the completeness of a body who knows how to position itself through the occurrences of life can make of the interpreter-creator a poetic writing in movement.
In the work procedures of the research group, there is, based on the relation with improvisation, the construction of a place of affective conviviality that is similar to the ways of doing found in Brazilian popular celebrations. For example, there is in these two universes an intense and respectful process of negotiation between the individualities and the collective, in order to build a collective practice capable of accounting the complexity of the discourse and its emission, both body or oral discourse. Another similarity is found in the ways of relating, since both prioritize the more horizontal forms of cooperation between the subjects, ensuring that hierarchies (yes, they exist and dialogue at all times with the several voices of the individuals involved in the experience of group living together) function in a less rigid and formal way, thus being more malleable and dynamic. On the way the research group works, Mundim (2012, p 114) says: The place of affective coexistence is a constant exercise of strengthening affinities and recognizing distances, negotiating different states and respecting different moods. It is the place of preserving differences with respect, care and dialogue. It is the place where vanities and truths must be diluted in favor of a collective universe. This does not mean to stop positioning oneself or stop stating one’s point of view. It means understanding that each is a subject. Therefore, it is the place where the ‘I’ exists only in the perception of the ‘other’.
My relationship with the real-time composition proposed by the research group had a troubled start. At first, I was used to deal with the 26
almost structured way of improvising in Brazilian dances (though each improviser and every moment of improvisation were distinctly placed as a new, ephemeral way of dealing with symbols and meanings of the cultural manifestation), this is also the tonic of all the creative process that lived or developed. In the contact with improvisation and composition in realtime in the contemporary dances, I had to put myself decidedly in an open relation with the other, in a process of negotiation in which there is so great freedom to exercise dance, but at the same time limited by the proposition that the other brings to the game and by the way it takes space in the scene, and this has become a huge knot to be unleashed. I understood that these knots were caused by the instability of the concepts and ideas about improvisation that I brought in a very stiff and fixed way in my corporality; and that unleashing them would be an exercise in revising those concepts and a relentless epistemic and ontological reorganization of the way I viewed improvisation. Gradually, I realized that the spots of contact between the body dynamics of Brazilian dances and the technical-creative exercises developed by the group were given exclusively by the openness and engagement of the body in relation to the movement. Thus, by triggering metaphors, sensations, places, perceptions, images, sounds and oralities, I constructed a vocabulary interspersed by embodied memories based on Brazilian dances and their nuances of movement, as well as by the new body vocabulary developed in technical-creative exercises in improvisation, in a deep relation of giving in to the laboratories proposed by the group. The bodily qualities learned from the elements of improvisation in Brazilian dances remain as the basis of the body-memory. Among such elements, some were fundamental to my experience, such as playfulness, virtuosity, effectiveness and the integrality/indissociation between movement, musicality and orality, because so far they permeate the processes and practices that I live in, regardless of the context in which I am or of the aesthetic-artistic language chosen. The recognition of these qualities and the study of these elements as creative materials became fundamental for the construction, organization and representation of a living body in the act of real-time composition. Thus, I believe that the experimentation and creation laboratories of the research group were important for the construction of 27
an â&#x20AC;&#x153;incarnate knowledgeâ&#x20AC;? regarding the artistic procedures at the interface between popular dances and contemporary dances, in improvisation and composition in real-time as well as in other forms of expression that emerge from them. What I understand is that the relationship between Brazilian dances and real-time composition presents features that go beyond the process of interlocution between the concepts, procedures or ways of doing improvisation. For artists who set out to experience this practice, the relationship constitutes the basis for a body poetics, which establishes itself at the crossroads of these two perspectives (Brazilian dances and contemporary dances). This is one of the notes that underlie the proposition of elaboration of the metaphor body-crossroad11. I understand the crossroads as the tangential space, the operative locus of crossing two or more roads. The crossroads occur at the nodal point, the meeting point or the intersection between these pathways. When I refer to the crossroad-body, I do it based on the metaphorical elaboration that proposes a shift of attention to the body-space as the nodal point of encounter of distinct ways, such as memory, performativity, repertoire, etc. Here, we may think that the nodal point of improvisation in these different ways of knowing-how takes place at the crossroad-body. To operationalize the elements of real-time composition at this crossroads is, overall, to activate the qualities, mechanisms, sensations and perceptions of the repertoire of this body-memory, allowing to experience the present moment of the dance/play/improvisation and, in this flow, create situations, images, emotions and relationships capable of articulating and materializing a poetic discourse in a group dimension. I think about poetics as an aesthetic element capable of generating emotional, sensitive, affective and critical reactions to a system of meaning and expression, recreating and transcending new ways of being placed in the 11 This term concept was elaborated in the creation of my doctoral thesis in performing arts by the Graduate Program in Performing Arts of the State University of Rio de Janeiro - Unirio. For more information on the subject, see the following reference: RAMOS, Jarbas Siqueira. Epistemological questions about the crossroad-body. Available at: <http:// portalabrace.org/viiicongresso/resumos/jornada/RAMOS%20Jarbas%20Siqueira.pdf>. Accessed on: 14 Sep. 2016.
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world (JAKOBSON, 2003, CAMPOS, 1975). In this perspective, I understand that the poetics of the body is an element capable of creating displacements, frictions, reversals and destabilization in the procedures of aesthetic reading of the world, especially when it is associated with this the processes of interlocution between the body dynamics and embodied repertoires of this body - crossroads and, in the context of this text, the aesthetic qualities of the relationship between Brazilian dances and composition in real-time Reflecting on this relationship in artistic practice, I notice that the composition in real-time happens with the presentification of this bodymemory, these repertoires, these crossroads, triggered by a dancing/ playing/improvising which brings up a relationship of vivacity, playfulness, affectivity and pleasure in the established connection between the improvisers (creator-performers) and between them and the audience, building in the here-now a poetry in movement. FINAL CONSIDERATIONS In accordance with the aforementioned, my intention was not to create generalizations about the artistic practice of improvisation and its innumerable possibilities of acting both in Brazilian and contemporary dances. The objective was to reflect on the imbrication, crossing, crossroads between the two fields of Dance above specified, starting from my experience in these two universes and as a central point of analysis the improvisation and composition in real-time. In this context, four questions emerged as necessary conditions for the production of this reflection: 1) the need to establish an epistemological shift that produces new ways of looking/thinking/saying Brazilian dances in the context of the field of Dance; 2) the understanding that in Brazilian dances the process of dancing/playing/improvising is an indivisible and inseparable whole and that is constituted as the subjects put themselves in the relationship with the other; 3) there is no single way of dancing/playing/improvising, since this relation is established according to the body-life experience of each subject; 4) The processes of overlapping, crossing and crossroads, which arise in improvisation based on the relationship between Brazilian dances and contemporary dances, are reflections of the ways in which each individual constructs his/her poetics by dancing/playing/improvising. 29
To think about the relation of dancing/playing/improvising as a poetic, ethical and aesthetic dimension, both collective and individual, is to seek an understanding of the relationship between Brazilian dances and contemporary dances as a human possibility of expression, creation, existence and resistance. When combined with improvisation and real-time composition, the poetic dimension is consistent with the political dimension, creating new structures for the production of sense and organization of the body moving in space. It is from this perspective that I affirm that the relation between memory, repertoire and presence is a fundamental point for the construction of a discourse and a poetic in improvisation, which can only happen and be accessed in the here-now. Regarding improvisation and composition in real-time, the scenic experiences of creation and composition are always spaces for the construction of poetic discourses which allow the displacement of the literal and metaphorical senses through translations and transcriptions that enhance the relation between the artist/improviser/interpreter-creator and its viewer. In understanding this dimension of real-time composition, it is not difficult to understand that the relation between the discourses of Brazilian dances and contemporary dances necessarily takes place in the body of the subject who dances. The body is thus the nodal point of this relation and of this construction. It is the nodal point of the crossroads. The body-crossroads. When referring to the body-crossroads, term/notion that I have used to elaborate a reflection on the dimension of the body in the interstice between ritual practices and the scene, I try to trigger this relation between memory, repertoire and presence in the relation with the body. I thus understand that the bodyspace-crossroads is the tangential locus in which all the elements (virtuosity, effectiveness, performativity, embodied memories, etc.) converge and define the process of dancing/playing/improvising in Brazilian dances and in contemporary dances. Finally, like any and every artistic process, the construction of this ephemeral and unstable place of composition in real-time invites us to continue reflecting, sensing, feeling, managing and constructing a journey that does not end at the end of improvisation, since the end is always the possibility of a new beginning. I agree with Mundim (2012) when she says 30
that these other paths traced by actions danced in real-time composition are subtle ways of existing, insisting and coexisting. This way, I invite us to experience dancing/playing/improvising based on the interplay between Brazilian dances and composition in real-time. I invite us to allow ourselves to look at the Brazilian cultural manifestations and understand the crossings and crossroads, which take place in our dancing body. I invite us to engage in an affective artistic practice and may we allow the poetic construction of our dancing to be a way of planting and harvesting love and poetry in the form of movement. Who is in it? Let´s go? References BIÃO, Armindo Jorge de Carvalho (Org.). Artes do corpo e do espetáculo: questões de etnocenologia. Salvador: P&A, 2007. CAILLOIS, Roger. O jogo e os homens: a máscara e a vertigem. Trad. José Garcez Palha. Lisboa: Cotovia, 1990. CAMPOS, Haroldo de. A arte no horizonte do provável e outros ensaios. 3ª ed. São Paulo: Perspectiva, 1975. DOMENICI, Eloísa. A pesquisa das danças populares brasileiras: questões epistemológicas para as artes cênicas. In: Cadernos do GIPE-CIT. Universidade Federal da Bahia – UFBA, Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas. Nº 23. Salvador: UFBA/PPGAC, 2009. HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. Trad. João Paulo Monteiro. São Paulo: Perspectiva, 2007. JAKOBSON, Roman. Linguística e comunicação. 19ª ed. Trad. Isidro Blikstein e José Paulo Paes. São Paulo: Cultrix, 2003. LARROSA, Jorge. Tremores: escritos sobre experiência. Trad. Cristina Antunes, João Wanderley Geraldi. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2014. LIGIÉRO, Zeca. Corpo a corpo: estudo das performances brasileiras. Rio de Janeiro: Garamond, 2011. MAUSS, Marcel. Sociologia e Antropologia. Trad. Lamberto Pulcinelli. São Paulo: EPU, 1974. 31
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CREATIVE INTERDISCIPLINARITIES IN DANCE COMPOSITION Mariane Araujo Vieira1
Introduction To create senses, to undo them and build others. To be in relation in the between, in space, in the void and, therefore, organizing disorganizations while dancing, moving in the flow of forces, creating compositions. The relationships between the whole and the parts come together, merge and transform into another oneness. The body is affected by the dynamic matter of the world and responds with other affections, with other worlds. This way, the dance reveals the most concrete invisible that vibrates and transforms into movement. A body that leaks, exchanges sensations and propagates itself. In order to build some thoughts on this body that dances and interacts directly in and with matter, a parallel will be drawn in this article between the physics of the microscopic world and the dance, that is, between micro and macro, between the proven and the experience between creative truths and possibilities and, finally, between matter and subjectivity. More than creating interdisciplinarity, this text seeks to bring to the field of dance what is proven in physics regarding nature, human beings and movement, in order to problematize how this influences the construction of creative thinking and doing. Moreover, this work is not only about analyzing the quantum world, but also about reflecting and appropriating what is seen and what is not seen – which can mutually influence and interconnect each other at all times. In this text, it is possible to perceive that the relations between Quantum Physics and Dance can be closer and that the study of particles influences the ways of understanding the world, showing that the connections of the matter are more integrated than we usually see or think. 1 Dancer, graduated in Dance from the Federal University of Uberlândia, member of the professional group of Contemporary Dance named Strondum and member of the Grupo de Composição em Tempo Real Conectivo Nozes, linked to the Research Group Dramaturgia do Corpoespaço. This work was developed as a monograph research, presented in the year 2016.
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Quantum Physics studies the laws of nature in the microscopic plane, which does not apply to the macro in the sense of mathematical calculation and physical measurements. However, this work will use the scientific discoveries as operative concepts to think about composition for Contemporary Dance. In this sense, there is no intention to explain dance through Physics, since Dance is understood as an area of autonomous knowledge; instead, it seeks to bring and explore concepts of materiality with those of subjectivity. This way, the idea of creating a relation between art and science arises from the need to broaden the view to the organizations created between subjects and researched environments from different perspectives. Through a historical analysis, based on studies by Sommerman (2006), it is possible to understand how the interdisciplinarity between the areas of knowledge has been transformed over the centuries. According to this author, from the twentieth century on, the fields of knowledge were fragmenting and creating barriers for specialization and the building of disciplines. However, in antiquity, scholars who researched several areas of knowledge in a more globalized and less distinctive way elaborated knowledge. The cosmological, anthropological and epistemological visions were imbricated in knowledge. With the advent of universities, around the eighteenth century, religion, tradition, philosophy, and science became independent. The rupture of these knowledge created barriers and separations between the different areas, culminating in the division of knowledge. In this sense, disciplines/subjects have established, over the centuries, some frontiers, but they have not lost the capacity of dialoguing, to renew and expand knowledge. It is with this attempt to broaden, to turn it into something plural, to explore new forms of knowledge about the body and artistic creation that interdisciplinarity will be proposed for two fields that are normally seen separately. One of the main reasons for choosing Quantum Physics is that this area begins to structure a different way of understanding life and its organizations, arguing that it is no longer possible to perceive the world only in a logical, rational and linear way: reality is not just only what it is seen, therefore it is necessary to elaborate a new way of thinking and perceiving the world. In addition, quantum research proves that the essence of matter lies in interconnections, that everything is related. 34
Another important point that Modern Physics discusses is that there are no certainties that are final or definite, only relative truths and probabilities that influence the way of understanding matter and the laws of nature. Thus, Modern Physics does not only work on the description of phenomena, but also it creates perceptions outside the everyday of the human being. Moreover, this branch of science extrapolates connections among the subject, the object, and space-time. In the dance field, these interactions will be thought out and analyzed from the perspective of the dance compositional act, performed by the dancer on stage. This means to problematize the ways of organization and creation of those who dance in real-time while interacting with the surroundings. In this way, there is the interest of looking at the dancer as an autonomous subject and a producer of subjectivities, which influences and recreates the environment in which he/she is placed, as well as is transformed by it. In Contemporary Dance, real-time composition gained ground through dancers and researchers who began to demonstrate, from the 1940s on, some interest in improvisation, contact-improvisation, studies of somatic education and performance. The interest of rethinking the dancer performance on the scene, the questioning upon the creative processes which were too formatted, as well as the questioning upon bodyâ&#x20AC;&#x2122;s disciplinarization and docilization, brought by systematized techniques, were the main aspects that enabled new ways of thinking and doing dance (SILVA, 2005, p.105). The dancer´s freedom for creation enables singular compositions imbricated in the historical-social subjectivity of the individual. This means that the dancer needs to develop abilities of listening to his/her body, the body of others and the objects at the moment of composition: In dance, improvisation is an approach that develops the responsive and intelligent body, to solve the matter of composition quickly. Contrary to the myth that improvisation is spontaneity, this intelligent body selects and resolves situations of improvisation effectively; therefore, it is a highly conscious and rigorous process of creation at the moment (MUNIZ, 2004, p. 78 apud MARTINS et al., 2010, p.70).
In order for the study of real-time composition in dance and Physics be more closely integrated and better explored, the main aspects discovered about 35
the elementary particles that influence the way we understand matter will be defined, among them: the duality of wave-particle, Heisenberg’s uncertainty principle, Bohr’s theory of complementarity, and the multiverse theory.
About the microscopic world Figure 1 - High energy collisions of subatomic particles
Source: RODRIGUES, 2013.
One of the underlying principles of the interrelationships produced by the body in dance is understanding that the body is in relation with the environment, this being a dynamic integration between matter, language, perceptions, flow and others. Both fields (human and environment) are interconnected in order to generate modification among themselves, in the context in which these interactions are established. Quantum Physics describes, in an analytical and theoretical way, how this process happens, through the definition of subatomic particles and their interactions. In addition, quantum study questions stable, linear, and predictable reality and creates a new look at the study of chaos, probability, and uncertainties that influence how we perceive the body in relation to the real. The principles of Quantum Physics’ structuring and other contemporary theories of Physics question the age of thought initiated by the philosopher René Descartes (1596-1650), who presents theories and understanding of the world which mechanize the body and the laws which 36
rule nature. Descartes dominated widely and lastingly from the seventeenth century, and in the field of physics this influence culminated in the theories of one of history’s most recognized physicists, Isaac Newton (1643-1727), who transformed the way nature is understood even now. The predominance of Descartes’ thinking in many areas of knowledge privileged the understanding of nature as a perfect machine led by exact mathematical laws. This thought was the conceptual framework for seventeenth-century science, tested and “proven” in Newton’s experiments. In this way, mechanistic thinking has transformed the way nature is understood, prioritizing the quantification and accuracy of the laws which rule Western society. The universe, and therefore also the body, would be a machine like a clock, which is readable and can “spoil” or “be repaired,” far from being seen as a living and complex structure. According to Capra (2005, p. 46): The Cartesian division between matter and mind had a profound effect on Western thought. It taught us to know ourselves as isolated egos existing “within” our bodies; led us to assign to mental work a value superior to that of manual labor; enabled gigantic industries to sell products - especially for women - that provide us with the “ideal body”; prevented doctors from seriously considering the psychological dimension of disease and psychotherapists dealing with the body of their patients.
Through this understanding, through theories that emerged after Max Planck (1858-1947), about atom´s organization, and Albert Einstein´s theories on the relativity and development of Quantum Physics in the early twentieth century, physicists and scientists began to doubt the mechanical and exact principles, thus producing a new era of scientific and philosophical thought. The main questioned foundations of Newtonian physics, called Principia, were the ideas of absolute space and time (understood separately and independently, as well as something stable and still), the notion of the atom as a hard and solid element, and also the notion of particles´ movement, generated by gravity as a way to explain the phenomena of nature. In addition, Modern Physics questions the predictability of an experiment in its wholeness, since the phenomena of nature occurred in a determined way in the understanding of Classical Physics. As Eisberg (1979, p. 97) states: “In classical physics the basic laws are deterministic [...] however, probabilistic 37
interpretation is fundamental in quantum mechanics, and one must abandon determinism.” The discoveries of Quantum Physics overcome almost a century of revelations, compilations and restructurings, and today it is possible to realize that quantum is more used in the development of the technologies than one normally thinks. Examples are computer, projector and current technologies, which were produced through the discoveries of Modern Physics. The development of this area has caused so much change in the conception of how the human being understands the world that Quantum Physics is often misunderstood and understood as something extraordinary, without explanation, totally subjective. This understanding also hinders the teaching of the principles of Modern Physics in schools, which makes the classical concepts to be prioritized. The early theories that challenged this Newtonian understanding dealt with the magnetic and electric forces, called force fields. These theories were proposed by Michael Faraday and completed by Clerk Maxwell (CAPRA, 2006, p.65). In another area of science, the evolutionary theories of Jean-Baptiste Lamarck and Darwin were presented, which showed that the mechanical principles of Newton and Descartes were too primitive to explain the complexity of micro and macro relationships in the phenomena of nature2. The shift from Classical Physics to Modern Physics was marked by the studies developed by Max Plank (1858-1947) with the spectrum of light in an experiment called black body radiation. In it, this scientist showed that the luminous energy is radiated into individual energy packets, called quanta. These grains of energy are proportional to the color of light (so red light has less quanta than blue or ultraviolet light), so energy depends on the frequency of light. Einstein took over these studies in 1905 and transformed the whole way of thinking physics in the 20th and 21st centuries. In addition to the studies on subatomic particles, Einstein created the theory of special relativity, which determines that space is not three-dimensional (relation between height, width and depth), but four-dimensional, with time being a determining factor, as well as space, which influences matter. 2 To better understand how these theories have been contested, see Fritjof Capra’s The Mutation Point (2005).
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In Quantum Physics, Einstein called the packets of energies - formerly called quantum by Planck - photons. He observed that photons propagated as waves and that this property in photoelectric events occurred in an analogous way in experiments with atomic structures of a portion of matter. In 1923, Comptom proved the corpuscular nature of radiation, an important finding that culminated in Maurice de Broglieâ&#x20AC;&#x2122;s theory the following year: The need for the photon hypothesis, or localized particle, to interpret processes involving the interaction of radiation with matter is clear, but at the same time an undulatory theory of radiation is needed to explain the phenomena of interference and diffraction. The idea that radiation is neither a purely wave phenomenon nor merely a bundle of particles must therefore be taken seriously (EISBERG 1979, p.66).
Broglie had a hypothesis that, just as radiation had a dual behavior, that means wave-particle3, matter also had this property. In this way, the matter would have characteristics of particle (entity confined to a tiny volume) at the same time that it presents/displays characteristics of wave (it extends by a region of the space). G. P. Thomson proved this hypothesis in 1927. The consequence of this discovery altered the concept of the reality of matter, which Capra explains thus: At the subatomic level, one cannot say that matter exists with certainty in definite places; it is said, rather, that it presents â&#x20AC;&#x153;tendencies to existâ&#x20AC;?, and that atomic events do not occur with certainty at defined instants and in a definite direction, but rather that they have tendencies to occur (CAPRA, 2005, p. 58).
In order for these paradoxical understandings about the dual aspect particle to become clearer, it is necessary to understand the structure of an atom. Before, in Classical Physics, the atom was a stable, hard, indivisible structure. Rutherford (1871-1937), who established the theory of radioactivity, realized that atoms were huge regions of space in which electrons, tiny particles, moved around the nucleus (Figure 2). 3 An imaginary speculation of this phenomenon of matter is made by mathematical calculations and reproduced in computer.
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Figure 2 - Rutherford’s atomic model
Source: AGUILERA, 2006.
This uncovered model was named as planetary system, in which negatively charged electrons moved in circular orbits around the positively charged nucleus. The atom, in this sense, is 10,000 times greater than its nucleus; in equivalent proportions. If the electron-wrapped atom envelope were the size of Maracanã, the nucleus would be the size of a pea and the dust-sized electrons spinning at very high speed. Bohr (1885-1962) worked from Rutherford’s model to define that electrons do not circulate at random around the nucleus but have defined energy layers, the lower energy layer being closer to the nucleus and the more energy-intensive layer far from the core. Figure 3 – Bohr’s atomic model
Source: THE EVOLUTION..., s/d. 40
Nowadays, Bohr’s model was overcome by the contemporary model, which was influenced by Erwin Schrödinger (1887-1961), Louis de Broglie (1892-1987), Heisenberg (1901-1976) and Paul Dirac (1902-1984). In this model (Figure 4), the atom is dual (either a particle, or a wave), has no defined orbits and follows the uncertainty principle (explained in the following paragraphs). Thus, the atom consists of the nucleus and the electronic cloud (in which the possibility of finding an electron in a certain place is uncertain). Figure 4 - Current atomic model
Source: DORTE, 2015.
Although Bohr’s model was overcome, he succeeded in developing the theory of complementarity in 1927, which explains that the dual characteristic of the atom occurs in a complementary way, thus “if a measure proves the undulatory character of radiation or matter, then it is impossible to prove corpuscular character in the same measure, and vice versa” (EISBERG, 1979, p.95). This means that both are separately identifiable depending on what is measured, but both are intrinsic properties of the element; the fact of observing or measuring is what defines the property of the particle. Thus, in a given experiment the atom presents itself in an undulatory form, and in another type of experiment the atom is shown as a particle. In the same decade of Bohr, Werner Heisenberg and Erwin Schrödinger postulated the principle of uncertainty, which explains and proves two aspects with mathematical laws: the impossibility of locating the position of the particle and finding the momentum4 exactly in the same 4 A quantity defined as the mass of the particle multiplied by its velocity (CAPRA, 2005, p.110).
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measurement - instead it is either position or momentum that can be found. Another aspect is that trying to measure the particle modifies/disturbs what is observed. Here is an example of this last property: To see an electron we need to illuminate it, because it is actually the photon of light scattered by the electron that is seen by the observer. From there, even before any calculation comes the principle of uncertainty. Just observing the electron disturbs you. The instant we illuminate the electron, it recedes [...] in a way that [...] cannot be completely determined. If we do not illuminate the electron, however, we will not be able to see it (detect it). Therefore, the uncertainty principle [...] expresses the fact that there is always an unmeasurable interaction between the observer and what is observed (EISBERG 1979, p.100).
If it is not possible to determine the exact location, but probabilities of that location, how is the matter palpable? Many theories are being thought to solve this question, but there are still no metaphors that give clear explanations for this phenomenon, only mathematical calculations. It is possible, however, to analyze that “all things and all moments touch each other at all points, the unity of the whole system is supreme” (ZOAR, 1990, p.19). In this way, the probabilities of the subatomic level are not probabilities of things, but of interconnections that, according to Capra (2005), form networks of connections in which it is not possible to understand separate and independent elements. In their atomic structure, the elements are apprehended by their interconnections: “As we penetrate matter, nature does not show us any isolated ‘building blocks’. On the contrary, it appears before us as a complicated web of relations between the various parts of the whole” (CAPRA, 2005, p. 58).
Connections between particles and composition in Contemporary Dance In the field of Contemporary Dance, there are different artistic paths of composition and experimentation that prevents a static and unique definition of this term. Through a theoretical survey of Dance research, it is possible to say that for many of authors the relation between body, movement and scene is always present. These relationships are traced in 42
singular ways, in the sense they are related to the subject and to the context in which creation takes place. These productions in Contemporary Dance are diverse and involve different techniques, methods and philosophies that began to be developed from the 50’s, with the postmodern movement. In this sense, it is possible to list personalities from the Western history of Dance such as Anna Halprin, Merce Cunningham, Yvonne Rainer, Steve Paxton, Pina Bausch and others (GIL, 2004, p. 146), who have questioned the classic ballet and the Modern Dance, and they created another form of dancing and moving in scene. With such transformations, research in Dance began to look at the body and composition in a more critical and unique way. Through this think and do in Contemporary Dance, with the intention of deepening the studies of quantum in relation to the composition research, this text prioritizes the idea of the composition that occurs in real-time, that is, artistic works that demand of the dancer autonomy of choice during the presentation. This perspective favors the visualization of how the composition is thought of instantaneously with the events, besides being possible to problematize how it is modified in the space-time, how the materiality is formed, how the senses are created, as well as other discussions and reflections which will be traced throughout the text related to the studies of physics. What is already given in the matter is modified poetically at each intervention and unique interaction performed by the dancer. Not only does the body, but it transforms and is transformed into composition. As Susan Buirge points out in the text by Laurence Louppe (2012, p.224): “The whole is not the sum of the parts: the whole of a composition resides in what, at each moment and in each joint, works and disturbs the whole.” This subject who organizes and forms movement in relation to the whole and creates new networks of meanings traces the networks of senses created in the composition. It is possible to understand, in this sense, that composition is also a way of creating units, in which matter and meanings occur together in the subject’s perception. Dealing with these two spheres while forming a single one does not mean homogenizing, transforming into a single thing, but creating 43
interdependent relationships in which the senses are not created without matter, and neither is the inverse. Based on this, in Contemporary Dance composition that occurs in the moment of the action there are always elements that are dynamic and unstable, and that are reorganized with each caused change. There is no registration that is not accompanied by a non-registration. If we are to take the expression as that which is inscribed in the movements of the body ... we can say that every event of any kind (sensorial, existential) that tends to subscribe into the body ... brings with it other events that fail to register, leaving a blank, an unstimulated synaesthetic sequence, never set in motion (GIL, 2004, p. 95).
The composition in dance crosses the visible to perceive the invisible, beyond the form, the sense, the drive, the forces in the flow of energy. For this reason, it is difficult to talk about the unexplainable, the non-definable, and to realize through the body that dance cannot be expressed other than by itself. Dance is matter in the flow of movement that produces utterances in the sensitive field of composition. This relation between matter and aesthetic senses changes the way which composition is understood, in the common sense. As already said, it is not a junction of parts, but interconnections of the concrete, the abstract, the visible, the symbolic, that is, the relation between art and life. Composition, in this sense, empowers the dancer to transform the reality, which was seen and experienced. According to Capra (2006, p.84), “our common notions of reality are limited to our common experience of the physical world and that they must be abandoned whenever we extend this experience.” New meanings are created in interconnection and this gives the audience the possibility of experiencing and realizing that things are more interconnected than we see in everyday life. Thus, the dancer dialogues with what is given and with materiality - and this “power” that the dancer has is not hierarchical, but rather democratic. Through such assumption, there is no composition without experience: this relation occurs in a collective way and a way in which time 44
and space are related. In the same way, not only is the dancer responsible for what he/she creates, but also the audience is responsible for what he/ she composes. The risk runs in two ways, that is, to the subjects who open themselves to the experience of the other and to their own experience.
Compositions The understanding that every movement, every action reverberates and dialogues with the whole, carries responsibilities with what is done on the scene. In this sense, one must perceive composition as a way of relating less individualistically to everything that happens simultaneously. There are several totalities apprehended by different subjects in relation. The reality of a subject dialogues with the totality apprehended by another individual. The reverberations of this macroscopic world in relation to the micro are devices of sensitivity and aesthetic creation that, somehow, draw poetic relations with the audience. The perception of this â&#x20AC;&#x153;wholeâ&#x20AC;? modifies a simple action of those who dance and influence once again the micro and macro relations in constant flow. In this sense, movement deals with forces, particles, voids, matter, and sensitive connections in an interdependent way. In Classical Physics, the succession of states determines a trajectory and, thus, objective reality and predictability became the basis of the scientific paradigm. Quantum Physics shows that matter is composed of subatomic particles that do not occur in isolated forms. This means that as much as scientists find smaller and smaller particles within an atom, these particles do not exist independently. There is, in this sense, an understanding of a common unity in the universe that occurs mainly through interconnections of a complex web of relationships. Although classical thinking does not fit the physics of atoms and what is in the micro world, this theory was important to question whether objective phenomena depended on a divine intervention, a predominant thought in the Middle Ages. In addition, Classical Physics has great importance for the explanation of phenomena on the macroscopic scale, perceptible to humans. So if someone throws a ball up, the certainty that it will fall at a certain point is 100% (if there is no impediment), even if this experiment is performed countless times. Knowledge is important because it gives a certainty in objective aspects of what can or will happen. 45
Still, classical mechanics can explain clearly and cohesively the movements of the human body in relation to the torque, the levers, the forces used in pushing the jumps and in ways to handle an object, which gives the dancer the conditions to become aware of the body movement and thus the dancer has a greater control of the scene. It is in this sense that the techniques of movement are important, so that the dancer can count on a body vocabulary and possible choices of what he/she wants to do and compose on the scene. However, just as Classical Physics cannot explain what happens in the microscopic dimension, the dancer technique is not enough to compose in the event in a sensitive and poetic way. Thus, the need for observation, disposition and transformation combined with the conscious technique of movement become essential when composing the dramaturgical elements in connection. The participation of the observers in these experiments is of great relevance, since he/she decides what he/she will observe and determines some properties that will be analyzed. The observer not only “observes” but also defines reality. According to Heisenberg, “what we observe is not nature itself, but nature exposed to our method of questioning” (HEISENBERG apud CAPRA, 2005, p 110). Thus, the observer who looks distantly and impartially at himself/ herself and in relation to the environment breaks the flow that moves him/ her. According to Zoar (1990, p. 7), “this sense of alienation comes from the sense that we [...] are mere accidental by-products of blind evolutionary forces, [...] without any significant relation to the inexorable forces which drive the world of gross and insensitive matter.” Through this understanding, it is possible to say that composition is in opposition to this place of indifference. In fact, the dancer who makes himself/herself available to the perception and transformation of the whole needs to filter out the various creative possibilities and define where he/she wants to go, how and what to do. In this way, what we do is a reverberation of what constitutes us, what forms us. To think this way is to realize that dance is a movement of something very small that occurs in great proportions. In addition, it seems to me a possibility of crossing the scales of time, size and quantity. 46
Creation in dance, or rather composition in dance, brings to light all these possibilities of dealing with the universe, with chance, with emptiness and with the risk of not being alone. To look at the other as part of oneself and to create relations of meaning in dance composition is to have art as the possibility of perceiving what science cannot explain. It is through this understanding that the dancer participates and observes, in order to compose, becoming also the audience for his/her own creation. The filters created to define what and how to perform the action cross a critical screen between doing and not doing, in which the dancer assumes the position of playwright and director of the work itself. In this sense, the understanding of Quantum Physics creates a new way of looking at the environment in which we live and, thus, generating new possibilities of creation and relation that can overcome the perceptions of the common sense regarding the world. Although this knowledge in the field of physics may be very controversial in our everyday experience, there are no theories that can clearly explain (and that are accepted by the scientific community as the truth) why human beings cannot access those laws that govern matter. These â&#x20AC;&#x153;particles at the atomic level differ from objects on a macroscopic scaleâ&#x20AC;? (GILMORE, 1998, p.13). This means that there is not, yet, a consensus on the explanation, for example, of observing matter as something solid and palpable or of atomic laws not applying to the laws of Classical Physics. Atoms in the sun and distant stars emit light on the same spectrum as the lamp on their bedside table. The passage to quantum behavior is not something that happens only locally; there is some fundamental property of Nature involved. On this scale, energy and time, position and momentum, are blurred (GILMORE, 1998, p. 57).
There are some theories that try to explain this phenomenon in different ways, but none of them is universally accepted. One of them, which I find interesting and which emphasizes the importance of choices made by individuals, is the multiverse theory. This hypothesis defines that with each new choice we make; we create new realities that happen simultaneously. For example, a dancer presenting a real-time composition performance 47
decides to roll on the floor. In this simple movement he/she creates different realities: (a) a world in which he/she rolled and continued the movement from the ground, (b) another world in which he/she did not roll, (c) another in which he/she rolled and remained on the ground, or (d) another in which he/she rolled and hurt himself/herself, in addition to other infinite possibilities. As a consequence of this theory, the spectator is also part of such diverse realities and can create others by means of the choices about what they choose to observe. This means that the observing subject chooses to watch the dancer rolling on the floor or decides to leave, for example. These two possibilities happen simultaneously and unleash new universes, which we do not realize, because according to this theory, the encounter of these realities would provoke the collapse of these universes. Thus, a plurality of infinite realities happens at the same time. The book Alice in the Quantumland presents this phenomenon succinctly: This is not how it seems to us, but this is because the different states of an observer do not know of each otherâ&#x20AC;&#x2122;s existence. When an electron crosses a barrier where there are two slits, it can pass through both the right and the left. What the observer can see is pure chance. You could see that the electron was on the left, but there will be another you who will have seen the electron go from the right. By the time you observe an electron, you divide yourself into two versions of yourself, one to see every possible result. If these two versions never meet again, each of them will continue to ignore the existence of the other. The world splits in two, with two slightly different versions of you. Of course, when these two versions of you start talking to other people, you will need to have different versions of those people as well. What happens then is the division of the whole universe. In this case, it would divide into two, but for more complex observations it would be divided into a larger number of versions (GILMORE, 1998, p.60).
As much as scientists still cannot prove this theory, there is the possibility of reflectively and not accurately bringing the consequences of the choices we make in the world. This makes explicit that we create parallel worlds that impact not only what a person does, but also what everyone does. 48
Moreover, although Quantum Physics still does not apply clearly to the macro sphere, the properties that integrate all matter are composed of atoms, which are made up of electrons, protons, and neutrons. We are particles, emptiness, body, universe. In fact, we are emptier than we normally realize. According to the physicist Paul Davis, the atom consists of electrons that remain in the gravitational field of the nucleus. The [...] electrons have no dimension that can be measured. They swirl in an empty space a trillion times greater than the volume of the nucleus. It can be said, then, that only a trillionth part of the atom is full of matter, but even that would be a generosity, for the nucleus is also not a solid body. Nuclear matter has an unimaginable density: a full spoon of coffee would weigh 1 billion tons! And despite this, much empty space remains within the atom. In this sense we have more voids than mass. We are less solid than we seem or what our intuition allows us to affirm (DAVIS, 1993).
It is not a metaphor to say that we are space, energy and matter. We are, in our constitution, interconnections, connections and relations between all that crosses us, there is a blurring of these concepts. In this sense, in dance, the dancer does not deal with separate, independent parts, but rather with voids that relate to interconnected forces with atoms that have velocity and so on. Dance is the possibility of creation with all it is present in the world. The organization of nature is self-conscious, inherent in our consciousness, but dance is not; it depends on the subject, who creates relationships with what is experienced in the world. In this sense, we are selfconscious in the quality of nature and conscious as artists that trace through movement the interconnections that go from the micro to the macro, from what we perceive, of what we are and, mainly, what can be transformed into action. It is possible to say that through dance we broaden our perception of what is seen and what is not. We dance with the energy flows, with the particles that constitute us and with the other, which is also space-time. There are interconnections that are created and are far from being explained by physics or the exact sciences, which cross the human senses. In this way, we perceive the world in which we live in different ways; which depends on the change of perspective in the experience that are danced, lived, available and creative. 49
Experience is the path of doing that deals with emptiness, with what disturbs, with what it affects and transforms us; it is always matter in relation. Without exact explanations, it creates senses that touch the audience and it creates spaces-times and possibilities. It also touches the poetic senses, bumps into inaccuracies of sensations and affects what is passing, who stays and who goes away. Being in the experience is experiencing matter in another way, looking from another perspective, and creating what was not there yet. Therefore, through this understanding, I do not find it necessary to analyze mathematical calculations or to delve into atomic complexity, as do physicists, in order to understand the magnitude of the universe, which goes from the micro to the macro. Changing perspective while relating subject and world seems to me more interesting as a human being and, of course, as an artist, in order to change a fragmented conception of mechanical things, far from reality, far from the matter. In this way, “Dance is by nature an environment where the relations inherent to the physical dimensions of space can be choreographed as a possibility” (HERCOLES in BANANA, 2012, p.15).
Final considerations To look at the whole is to perceive the interconnections between bodies, forces and objects that create compositions in the danced moment. It is to create in the macro the change in the micro, in the not visible, in the matter as well as in the connections of meaning, in what touches the other. Realizing that these connections are in the matter itself, that subatomic particles are not seen in separate ways, but in a complex network of relationships, is to look at composition in a broader and less hierarchical way. It is, yes, dialogic, receptive and available to movement. Thus, composition combines with the present forces of the universe, which are always dynamic, in search of a relationship of instability and stability, that is, in the search for an infinite equilibrium: To allow oneself to be “invaded,” “impregnated” by the body means, above all, to enter the zone of small perceptions. The vile, clear and distinct consciousness, the intentional consciousness that aims at the meaning 50
and delimits a field of light, ceases to be pregnant for the sake of small perceptions and its twilight movement (GIL, 2004, p. 130).
It is possible to perceive, through these relations, that the very particle that forms matter is not a hard, closed sphere, but an element that has a core with a cloud around it, without boundaries, bound to forces that are beyond what we can understand. We create, just like the atom, clouds of meaning that reach the other, the matter, the subjective. In this way, self-knowledge, that is, the consciousness of the one who dances and the notion of the world, creates bonds of meanings, values and perceptions unique to the dancer and to the audience. The choices and organizations of each dancing subject interfere and create new streams. Thus the composition can be seen as conscious, which does not mean that it is rational. It is a body consciousness that dances and perceives the lines of force and dialogues with them. In order to conclude, we may say that the interdisciplinarity among different fields of knowledge can reveal other unknown, which become important in the creation of the subject in society. The composition, then, becomes more complex and broader, and this requires a greater depth of dance doing in dance research. It becomes more and more emerging to look at composition as the relation of a whole, of a unity that is multiple.
REFERENCES BANANA, Adriana. Trishapensamento: espaço metereológica. Belo Horizonte: Clube Ur=H0r, 2012.
como
previsão
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PROJECT BODY AND/IN MOVEMENT – THE CHILD AND THE COMPOSITION IN REAL-TIME Patrícia Chavarelli Vilela da Silva1
Introduction In my own process of continued education, over the many years of dance studies, I have been noticing the constant presence of studies regarding movement and creation/composition experiences. Back when I worked as a young dancer, investigating movement happened through techniques properly taught by experienced masters; the creation was lived through experiences of choreographic composition received as tasks in some dance classes. In the beginning of my teaching practice, still lacking age2 and experience, investigating the movement ceased to be a unique challenge of the interpreter and also began to be a part of a commitment with children, young and adults, who approached people who dance (ballet, jazz, modern dance, among others). The process of creating and elaborating a choreographic composition became a commitment among these people, because at that giving time and place, the dance teacher was the one responsible for choreographing the artistic work of the students. Over time, the search for the deepening of knowledge has become increasingly enriching. In addition to the technical investigations of movement and creative processes searched since the beginning of my career, I also came to know research improvisation and later composition in real-time. In this sense, participating in the Research Group Dramaturgia do Corpoespaço was very important to deepen these investigations. The directional and systematic study in this collective allowed me to refine and 1 Assistant Professor at the Dance Program of the Federal University of Uberlândia - UFU. Bachelor and graduated in Dance by the Federal University of Viçosa - UFV. Master of Arts from Três Fronteras/PY International University. Member of the Research Group Dramaturgy of the Body. 2 I´ve started teaching ballet classes to 15- year- old teenagers. Inviting young dancers, who dedicated themselves to the ballet, to teach classes was a common practice between dance academy´s owners of my generation.
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expand knowledge in this area, both as a teacher and/or as an interpretercreator. In 2012, the research group had a significant experience with young people from the local public schools while sharing an artistic composition3. At that time, the participation of young people evoked, in the group, reflections on the specific artistic work of that piece, as well as the expansion of the research to other environments. Specifically, the desire to start a work with elementary schools focused on the study of the dance movement and composition in real-time began in the moment. In a dialogue with Prof. Ana Carolina Mundim, coordinator of the research group, the idea of creating an extension educational program arose, associated with the group research in public schools of the city. During the following year, I began an investigation to identify which school could host the project, and, in 2014, the project Corpo e(m) movimento (Body and/in Movement)4 began its actions with Escola Estadual do Parque São Jorge, in the city of Uberlândia. In this space of dialogue, I share reflections about experiences that 3 In 2012, the Research group Dramaturgia do Corpoespaço had the work Sobre pontos, retas e planos (Over spots, lines and plans) approved in a municipal gallery occupation process. The performance was on display for a month at Galeria Lourdes Saraiva, in Oficina Cultural in Uberlândia. In that period, the scene was installed in the gallery and a video of the work was projected without interruption. Three days per week, the research group made a sharing of the fixed-time work disclosed to the public. We contacted public, elementary and middle schools, inviting them to send their students. We received the visit of two schools: Escola Estadual de Uberlândia (Museu) and Escola Municipal Sobradinho (Rural Area). 4 The actions of the project began in March 2014, in the afternoon, with two classes: one in the 4th year, in the first cycle of elementary school, in the afternoon, another, with youngsters of high school, morning period. The first group consisted of 30 students from the same classroom and the second from students from different classes. The group of 4th grade students participated in the project for two consecutive years (2014 and 2015). The high school students only attended for a month; we believe that the fact that the classes take place in opposite turns to regular school classes made participation difficult, since it is quite common for the young people of this neighborhood to start working early. In 2015, we also started working with a 1st grade class, from the first cycle of elementary school; which remained in the project for the following year (2016). The initial idea included the participation of professionals from Dance and Psychology. During the first year of the project, I coordinated and applied the dance activities together with undergraduate students from Dance and the psychologist, Alisson Borges, coordinated and applied activities related to the field of Psychology together with two students of the Psychology course at UFU, Manoela Musa and Giovanna Menezes. From the second year, this interaction was not possible and we only followed the dance activities.
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have been lived through three years of the project, inviting the reader to think about how movement studies associated with improvisation in dance can collaborate in the processes of children and young people education. I believe that for both the study of movements and composition in realtime, the attention of people who dance should be sensitive, relational and creative. These three particularities will be the guiding principles of the discussions throughout this text, with particular emphasis on the situations experienced in the context of the project Corpo e(m) Movimento. Sensitive Attention - Educator and Educator’s Role Before talking about sensitive attention, let me make a comment on ‘attention’. When I started the school work with children aged 9 - 10 in 2014, I realized that the greatest challenge of the work would be concerning attention. The students came to the meetings very agitated, talking a lot, moving towards each other in search of a confrontation5. Movements were performed in order to hit the classmate, and not for the movement itself or for the playful experience that it provided. For example, a simple exercise, such as walking around the room at different speeds, had its focus turned to bumping or beating the classmate while running or walking. The focus of the children’s attention was, for the most part, on aggression towards each other either defending themselves or pushing others. Noticing particularities of the movement itself was something that did not happen in the first months of the project. Being aware of one, being aware of the movement and the given instructions was something achieved with a lot of work and persistence. I could focus this text on the causes of this type of attitude coming from the children, trying to identify that social, familial, educational, psychological (among others) issues would be causing this behaviour. However, this is not my choice at this time. What I want to emphasize at this moment is that the attention focus of the children had to be worked out in the classroom in order to direct it to the movement itself, identifying structural, sensitive and relational particularities in the studies of the movements. 5 The children beated, pushed, and bumped into each other; either by “joking” or due to an explicit desire to attack the other. It was as if they had to “mark territory” all the time, to show who was in charge.
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In this sense, it was necessary to focus on the development of the sensitive attention of the student´s proposers6. For these proposers, increased attention helps to identify ways of conducting activities to promote change in children’s relational attitudes and also helps building a bond with learners. Duarte Jr (2010), in his book O sentido dos sentidos - a educação (do) sensível talks about a sensitive knowledge, a knowledge that is much more than just symbolic or rational. He brings notes from philosophers, physicists, neuroscientists, among others, to discuss how the process of education for the human being can and should happen through diverse interrelationships with the world, whether through perception, relation with the arts or access to contents that allow to know the life of/in the planet. The text of this author leads me to a direct relation with what I believe to be important in the educational process: to educate the sensibility; educate with sensitivity; sensitivity as an educational experience. Therefore, I believe that the only possible way to find a procedure that would help to change the children’s focus of attention was to educate my sensibilities in order to understand what actions were most welcomed by the children so that such actions could be organized in order to help them perform with full engagement and without using the usual habits of movement, as aggression towards each other. I understood that educating with sensitivity is to be attentive to the way the child is every day, whether concerning attention, body organization, mood or health. To experience sensitivity as an educational experience is to learn to develop affection and respect for that human being totally permeated by innumerable interferences (familial, social, mediatic etc.) and that is (re) organized through them. It is to understand that to establish a sensible relationship with the other, certain coexistence is necessary; the coexistence between educator and student places them as two sides of the same coin. The dance class, the investigations of movements, the processes of creation are of co-responsibility of all the participants; the moment of the class is a 6 During the two and a half years of the project, students accompanied me from the Dance course that acted as monitors. In the first year, students who participated were: Gabriela Paes (March and July) and Jessica Kamila (September and October). In the first half of 2015, a student from Pedagogy (who also studies dance) was monitored, Marcelo Borges. In May of that same year, Mariane Araújo, a dance student, who is also a member of the research group, became part of the project and remains until the present day.
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whole; educator and students are the faces of this whole. The awakening of sensitivity of the educator’s capacity for observation allows him/her to perceive the needs of intervention and interference with the children, considering the interventions as procedures of interruption for attitudes that interfere in a negative way in the development of the activities. We call interference the proposition of activities, which provoke the student to act in harmony with the research objectives traced by the project. Classes needed to be organized into movement studies in which the focus of attention was on caring for oneself or the other7. Playful actions were offered, actions that allowed them to explore movements based on a few or several supports, somersaults and bearings all that demanded attention and care either in order to be achieved or to become “comfortable”, without hurting the body when touching the floor. We proposed8 activities in which one had to take care of the other, for example: on the floor we drew a large labyrinth with adhesive tape and, in pairs, while a child tried to cross the labyrinth with closed eyes, he/she was guided by the classmates by the directions verbally given. At another time, the guiding had to occur with tactile stimulus, there could be no talking. Throughout the first year of activities, the priority was given to the study of movement and inter-relational actions. There were some creative experiences, however, I realized that in these moments there were two significant situations: either they tried to imitate something they had seen somewhere (capoeira movements, superhero wrestling, girls dancing on television, etc.) or took the opportunity to bump into a classmate. It was very clear that the children did not feel “comfort” when the proposition was “let’s create”. Oral and movement speech showed that they had met with few references on this direction. I dare to suppose that in the whole educational process of those children (family, school, and social) they were given more orders to do something rather being challenged to create something. 7 Tell the children, ‘Do this or do that,’ ‘learn to take care of yourself, take care of your classmates’ was not good. It was necessary that this could be learned, experienced. It seemed like this had never been taught to the vast majority of them. 8 I clarify to the reader that in the moments when I use the verb in third person and plural I am referring to the actions adopted by myself and by the project collaborators. When the first-person is used I express my opinion. This change of perspective is necessary to express differences.
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Faced with this situation, I tried to bring in most classes activities in which the study of movement took place through a task, for example: they had to move around the room without letting the soles of their feet touch the ground. Through this instruction, children experience different ways of moving without the educator defining the movement that should be performed; it gives a kind of experiential moment, but still gives the child the opportunity to make choices. I realize that, in my organizational logic, I elaborate my classes with two specific moments of investigation: studies of movement and processes of creation and/or improvisation9. This “choice” of thinking the knowledge to be developed as two separate blocks serves to identify what focus I am giving to the propositional experience being worked on. I understand, like many professionals in the field, that there is no way to study them separately, but there is a way to direct attention to what we call “study of movement” or “processes of creation and/or improvisation.” I think that when the focus is on one or the other, sensitive attention is a differential that must be worked out with the students. It enables the expansion of movement repertoire and instigates creativity, which arises from the relations of exchanging with the environment, with the other and with situations. During the first year of school, students were unable to establish these interactions in a meaningful way, however, a relationship of trust and affection was built between the project team and the children, which allowed for modifications to occur as time passed by. They also had experiences of interpersonal living, study of movement and creation that allowed them to apprehend a repertoire of knowledge to be accessed in classes in with an increasing level of complexity.
Relational attention I believe that developing relational attention in dance means to establish more sensitive and refined relationships with one’s own movement and/or with the other and/or with the environment. I consider it essential in motion studies that require greater difficulty in performing and in real9 This organizational logic was not “created” by me, but it is influenced by the practices adopted by the many professionals with whom I had the opportunity to study.
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time compositional processes. I realize that by working with the children, we were able to have improvisation experiences, but it was not yet possible to focus on the creation of an artistic work. This requires a deepening of studies that have not been achieved so far. From the second year of the school project on, the changes were significant. It was noticed that there was maturation and refinement of the sensory-motor organizations, as it became evident the difference in the quality of the movements being performed. The movement that sought the shock, the confrontation, did not disappear, however, changed. Some brawls and peeves remained, but the children came to understand that during class this is not allowed, that the focus should be different. Movement research and creative experiences should be more important during the meeting. It is possible to see that, over time, the relationship established between the educator (s) and the learners and the dialogues about the responsibility of each one in the construction of knowledge helps in the fulfillment of the agreements and in the expansion of the experiences of motion investigation. The establishment of certain “quality” in interpersonal relationships has generated possibilities for creative relationships. When I say quality, I am not referring to something good or bad, but to a gradual conquest of trust, respect, experimentation of different movements in children’s daily lives. By establishing creative relationships between the proposers and the students in the project, we enable creation experiences guided by the relationship with each other and with the environment. With the reorganization of the children’s focus, we were able to introduce experiments in the research group10, both for movement study and composition research.
10 “The Research Group Dramaturgia do Corpoespaço organized working procedures for practical experiments, called Movíveis (Movibles). The Movibles are organized from three axes: 1) structures of movement (points, lines, circles, spirals, levers); 2) game features (coincidence, equivalence, blocking, question in the ear, emphasis); 3) Commands (stop, repeat, continue, rewind, delete). The possible unfolding of each component of these axes provokes a wide range of technical-creative possibilities that, if thoroughly studied, establish instrumentalities that can be activated in improvisation processes or in preestablished choreographic compositions. Understanding how to extrapolate these studies and to resize them poetically is only possible if they become organic by the production of knowledge from the research. “ Text written by Ana Carolina Mundim, available at: <http://conectivonozes.blogspot.com.br/2012/08/nozes-o-conectivonozes-nasceuem-2010.html>. Accessed on: Aug., 2nd, 2016.
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The studies developed in the research group on punctuated movements, straight lines and circles were gradually shared with the students. Investigations in which they could: punctuate the environment of their kinesfera11 with different parts of the body, move around the room only stepping on the spots marked on the floor with tape, touch, using their fingers, a spot of the colleagueâ&#x20AC;&#x2122;s body so that he/she would move that part by moving away from the touch. Construct in/with body lines or circles, in place or in displacement, either in relation to the experience of movement or in a process of creation, establishing relationships with architecture, objects, with colleagues. We have also introduced some game features used by the research group - coincidence and equivalence12. In each of them, we worked first in pairs and then in groups, as follows: in pairs, one person made a certain movement and the other moved in search of a coincidence with the action performed by the colleague. The coincidence here is not understood as copy, mirror, imitation or â&#x20AC;&#x153;shadowâ&#x20AC;? playing. Children might be near or far from each other, might have their faces facing unequal directions, might be positioned at different levels (high, medium, and low), but would seek to establish motions coincident with their peers. For some time, a person was the proposer and, at the sign from the educator, the role was reversed with the classmate. In group research this happens in a slightly more complex way, children move around the room, according to some situation proposed by the educator, and allow themselves to be contaminated by the movement of those around them; this can happen through the relationship established with only one classmate or with several. The level of complexity of propositions might vary according to how students live their experiences.
11 Kinesfera or cinesfera is a concept that belongs to the Laban Method of Movement Analysis. It is the sphere that delimits the natural limit of personal space, around the body of the moving being, whether it is moving or not. I emphasize that the research group, in its discussions and essays, no longer works with this term, because it considers an expansion of the concept of kinesfera coined by Laban in the first half of century XX. In the meantime, I maintain the use of the Labanian term, at this moment, as a resource to exemplify the experience offered to children in a given activity, for didactic reasons. 12 Both equivalence and coincidence can be explored in innumerable ways, they are not restricted to the given examples.
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Regarding the equivalence, the activity could happened as follows: in pairs, a child made a certain movement with the arm and his/her pair tried to move in the most similar way possible, but not with the same limb but with the leg or other part of the body. When the work is in a group, it establishes relationships with several classmates, not just with one pair. The coincidences and equivalences can also be established with the architecture, with objects; these game features give space to numerous variations. From the second year on, children were more aware of these experiments and were expanding their abilities, both on the refinement of movement and also on improvisation and creation. This occurred through wisdom that was developed in experience and did not lead students to a rational or conceptual understanding of these processes, but to an understanding that is of another order. It is related to perception, a sensitive perception of oneself, of its capabilities and limitations, achieving and perfecting new motor and creative competencies. I believe that when the artist develops attention through a narrowing of relationships between himself/herself and his/her surroundings (people, objects, sounds, architecture, etc.), he/she walks towards maturation on the capacity to compose. I think that in this context, creating/improvising/ composing is associated with establishing a relationship. This relationship I am referring to at the moment is similar to that kind of perception that a singer develops; he/she needs to work with the tuning of the voice, with the tuning between his/her vocalization and the sonority of the musical instruments and/or with other voices. When we sing in a group, all in the same tone, we achieve a harmony, a balance of the group. We managed, with the song, to bring the class to the same frequency (sic), the same tune. However, when each one maintains a tone and the class cannot reach an unison, this harmonization process is not viable (PUPO, s/d, p.2).
I recognize that just as singing students need to find a common “tuning” to perform a song together, also in order to perform improvisations and/or collective compositions in dance, we need to “tune in” to everything around us. On this premise, if I cannot compose with the other and with the 61
environment, I am only performing movements at the same time as someone in an identical time-space; but I do not “compose with”, I am “composing at the same time”. The experience of composing at the same time-space is experienced in the lessons of the project from the beginning (even with the difficulties presented previously). However, processes to “compose with” began to happen very early, only after the second year of studies, and only among some children. Those with difficult relationships (in the dimension I have discussed in this article) can only create “at the same time” as their classmates. When I say that I consider it important to work with the children focusing on establishing relationships with their surroundings, I do so based on the desire to develop real-time compositional experiences with them in the future. In the creative investigations carried out in the research group, I have noticed this particularity. I only had the feeling of being composing in real-time as I gradually refined my ability to establish more consistent relationships with the collective of artists with whom I work, with the present sonority(s), with scenography, with the environment in which we were inserted, with the audience, etc.
Creative attention In the Project Corpo e(m) movimento, we work with dance studies in which movement and creation are seen as inseparable issues; they are also considered as opportunity and possibility of knowledge construction, which comprehends a knowledge that arises from doing, experiencing, observing, relating. The creative process is a construction of scenic movement that only happens throughout the experiences. It is not yet ready priorly, it depends on what happens at each stage. One can thus think that the central reference of this process is the body/soma. Realizing that the body is one of the ingredients of the scene induces the research of how to handle all the other ingredients of the spectacular scene. They are choices, because all the time we are being bombarded by ideas that, in order to transform such ideas into scenic actions, it depends on the existence of a selective process that is tracing a creative path (MILLER, 2012, p.148).
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I find it quite interesting to think of the study of movement/creation in dance as a process of choice. I believe that many people choose without knowing what they are doing, without worrying about the extent of the repercussion of their choices. But, in particular, I think that choosing “blindly” can be dangerous. In this sense, we seek to work with children a construction of knowledge that can be accessed in the moment of making choices, so that the process of choosing is associated with the creation of possibilities, so that they can take place in the dimension of the sensible, the rational, the intuitive, but will happen through lived experiences. The attention will be focused on getting to know themselves, the other and the surroundings so that, based on this, it is possible to compose with them. In the beginning of the project, we realized that the children’s attention was not directed towards themselves or their environment, just to what their classmates were doing. They knew that their classmate was pushing someone, but they would “erase from memory” the fact that they did the same. They realized that someone could or could not make a certain move, but they did not pay attention to the way they did it, they did not know that it was in the “how I do it” that the secret of the movement lived. Only as time went by and through proposals in which the attention was directed to the “how” that they were able to identify the fact of not being able to perform a certain movement in the present moment did not mean an incapacity, but that if they kept trying “with attention” at some point they would do it. Based on a redirection of focus, that is, attention to what can be done, it has become possible to create, compose. During the project’s meetings, we were able to propose activities that had, as a priority, creative attention, without losing the notion that the creation/composition actions would take place in the interaction with the environment. As this experience was relatively new to the class, we sought to carry out the propositions with specific directions for each meeting. In a day, they had to create based on the relation with some classmate, in another, with certain object, in another, with the environment etc. In the artistic work Sobre pontos, retas e planos (Over spots, lines and plans) performed by the research group, the scenario is composed through strings and tape. At school, we tried to take, in some meetings, several yards 63
of string that were fixed in the room as if it were a large spider web. Children had to pass through this web without touching it, it could happen freely, without a “control” of who is passing through the web and/or who is at the edges13 waiting to cross the space. After some experimentation, they should all be at the edges and only five children could be in the web environment. If someone exited, another had to take his/her place; if someone came in, someone had to get out. Activities such as this make the student focus on a situation rather than a particular behavior of a particular classmate, and also allow the development of responsibility towards the group task. In some meetings, we developed activities outside the classroom, in external environments that allowed the students a relationship with a different place, in which the proposal was to compose with the particularities of the given space (s). At such times, a bench, a wall, a grid were invitations to create, to move, to explore. They could subvert relations normally built with architecture, they were allowed to use the bench for any movement other than necessarily sitting; they could jump, support their feet or even push the wall or perform other action that they found interesting. Obviously, in several moments I had to intervene and guide, so that along with the freedom of research, we also found responsibility, for the sake of personal integrity, the integrity of others and/or maintenance of the public well being. I realized throughout the teaching-learning process that the children were in a process of understanding that they could create and that could be very enjoyable for them. Over time, the expression of satisfaction for the composing experience became ever present. However, the process of studying improvisation and composition is still at an initial moment of knowledge construction; there was no time for a maturation of this knowledge, but an awakening occurred. We begin to introduce to the children the understanding that improvisation is not doing anything, that dancing is not only having the ability to move to the sound of a song, that composing is not just gathering the “pieces” of something that I know, that I choose. Knowledge and the capacity to create exist as a power in the human being; however, they need a 13 I named as edge the places in the room where the web is not built and where children stand to observe classmates or to wait for an opportunity to participate in the activity.
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certain dedication to happen; especially if they are related to a specific type of knowledge, to an area of knowledge.
Final considerations In this project, it was essential to find the time for waiting; the wait for the time of the other. For a time that is not an everyday time, nor a contemporary time, a time that does not belong to the teacher, to school, and is neither the internet time nor society´s time, ... however, it was important to wait for the time of maturation and acceptance of each child. I am not referring to the physiological, anatomical maturation, but to a maturation that comes from the maturation of the individual as a single and complete being in the universe. As an educator, I had to work as a facilitator in order to develop the capacity to learn the power in every human being; giving the child time for their discoveries, offering varied situations in order to provide experiences that would help us to achieve what have been desired by me since the creation of the project and which extended through all the days we were together with them. I believe that the studies developed can help building childrenâ&#x20AC;&#x2122;s autonomy. I hope we can bring together different references of relationship, mobility, art, perception, and sensitivity from those provided by mass culture, family, and school. These are offered to them in other contexts, without our interference. However, I think, and there lies one of the great challenges of an educator, to bring something that is new (and that can be welcomed strangely simply because it is something unknown) without disrespecting actions and knowledge instituted in a social group, inviting some of its members to think that there is something beyond what they already know and even more: that there is much more than what we are bringing them to know. My intention as an artist-educator is to awaken in the children an immense desire to learn, to pay attention to the issues and particularities of the world (private, collective, natural). The movement is part of the law of nature; in it everything moves, transforms, organizes and reorganizes itself. To build knowledge is to move, and through movement we can 65
create knowledge. I believe that through the development of the “types” of attention I propose in this text, students can awaken a very particular way of being and knowing, not only dance and art, but also life. Feldenkrais (1977, p.67) says that “doing does not mean knowing”, that we learn to move from a very early age, but that it is necessary to develop a consciousness for the movement and that to achieve this goal we must correlate action with intention, and I add, with attention. I recognize that childhood is usually a time of great doings, but that the particularities of knowing are neglected in many families and social groups. It seems to me that in order to strike a balance between the amount of information and technological resources we have at our disposal we need to develop something that many call wisdom. In dance, we can consider that part of the wisdom of an interpretercreator is to know how to manage different knowledge (mechanicalphysiological, expressive, aesthetic) by arranging them in their doing. For a dancer, having balance is, even, knows whether to unbalance. In this sense, José Gil (2004) says that there are “two species of body balance”, one purely mechanical and another “that movement and consciousness introduce into the body”. In this premise, for the dance artist to achieve a “body in balance”, it takes much more than the ability to put “masses in movement”, it takes a set of knowledge agency that is built in doing, something that is accessed by means of a certain level of appropriation of the dancer’s art, “when the consciousness of the movement becomes the movement of consciousness.” (GIL, 2004, p.17) Gil talks about how the dancer’s “concentration ability” brings a differential to his/her dance. In this article, I outline, in agreement with the author, the need to direct the children’s attention so that they gain a kind of knowledge that occurs in/with the movement, in order that they reach a certain appropriation in their capacity to move and that they can print the qualities they desire in their movements. In this search for an appropriation of movement, knowledge is developed in other situations of choice, of life. A very important issue to be emphasized in the work developed in the Project Body and/in movement is the way in which the direction and supervision of the school welcomed the proposal. It is common, when developing a dance work in a school, the yearning and the request to create 66
“dancinhas” (little dances) throughout the school year: dance for mother´s day, Indian´s day, father´s day, festas juninas etc. At no time did the school administration request that this type of action be carried out, allowing the development of activities with the directions that I believe are important. The dialogue with the managers and the class teacher is constant, in the sense of having a follow-up of the development and maturation of the children. I cannot gauge how much they understood the work done, however, there is respect and partnership in what is necessary to make the actions happen. José Gil (2004, p.78) says that dance builds movement on a plane in which the individual is a complete and meaningful being, “because the movement of meaning marries the very meaning of movement: dance is (sic), not ‘mean’, ‘symbolize’ or ‘indicate’ meanings or things, but draw the movement by which all these senses are born. In the dance movement sense becomes action.” Consistent with this author’s claims, we can estimate that when the individual is engaged in developing attention to what he/she performs, having a different perception of his/her actions, he/she becomes more aware of what is done. And the artist-creator, as a social being, in this perspective, creates ties of meanings that are configured in work, in poetics. Inviting children to find wholeness that is built on experience and time is extremely challenging. Providing them with relational opportunities that collaborate to awaken their creativity and creative human capabilities is not an easy task; so there is a constant need for attention to what is done and how it is done. The educator must not forget that what he/she wants to develop in the students is something that he/she must work on himself.
Bibliographic references ALVES, Fátima. Psicomotricidade: corpo, ação e emoção. 4ªed. Rio de Janeiro: WAK Editora, 2008. DUARTE JR, João Francisco. O Sentido dos Sentidos - a educação (do) sensível. 5ª ed. Campinas: CRIAR Edições, 2010. FELDENKRAIS, Moshe. Consciência pelo movimento. 4ª ed. São Paulo: Summus, 1977. 67
_________________. O poder da auto-transformação: a dinâmica do corpo e da mente. Tradução de Denise Maria Bolanho. São Paulo: Summus Editorial, 1994. GIL, José. Movimento Total – o corpo e a dança. São Paulo: Iluminuras, 2004. MARQUES, Isabel. Linguagem da dança: arte e ensino. São Paulo: Digitexto, 2010. MILLER, Jussara. Qual é o corpo que dança? – dança e educação somática para adultos e crianças. São Paulo: Summus, 2012. MUNDIM, Ana Carolina. Dramaturgia do Corpo-espaço e territorialidade – uma experiência de pesquisa em dança contemporânea. Uberlândia: Composer, 2012. ___________________. A pesquisa em dança e as possibilidades de interdisciplinaridade. Anais do CID – Colóquio Internacional do Grupo de Pesquisa O corpo e a imagem no discurso. Vol.1, 2º semestre 2012, pp. 307-315. ___________________. Corpoespaço na dança. VII Reunião Cientifica da ABRACE – 27 a 29 de outubro de 2013. Belo Horizonte/MG. PUPO, Letícia Zamberlan. A Importância da afinação do professor como referência para a criança dos 0 aos 9 anos. Disponível em: <http://www. antroposofy.com.br/forum/download/artigos/A%20Importancia%20 da%20afinacao%20do%20professor.pdf> Acesso em: 13/08/2016.
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Body and architecture: the poetics of the architectural space for dramaturgy in real time composition Emilliano Alves de Freitas Nogueira1 Dancing is making the space visible (Dominique Dupuy). 2
Introduction When speaking of real-time composition in Contemporary Dance, the propositions of movement are made in the scene while the scene is being presented, in such a way that the choices made by the performers are what really guides the paths of the scene´s dramaturgy. In this case, dance is born from the possibility brought by the movements of the performer’s body, taking into account his/her personal and technical repertoire. Thus, dramaturgy is not limited to specific fields of dance modalities, but “the dance movement that a body can create would be the weaver of dramaturgy” (KATZ, 2010, p. 163), opening up to a whole universe of possibilities for movement, action, pantomime, words and images. The choices made by the interpreter in the space allow him/her to have total autonomy and responsibility in the creation. Regarding the choices made in real-time composition, Guerreiro says: One can assume that composition in dance, in general, is an organization between space-time arrangements, 1 Emilliano Alves de Freitas Nogueira is part of the research group Dramaturgia do Corpoespaço (Bodyspace´s Dramaturgy Research Group) since 2010, working also as a set designer and interpreter at the Conectivo Nozes. He is originally from Tupaciguara (MG), graduated in Architecture and Urbanism (UFU), specialist in Visual Arts: Culture and Creation by SENAC / MG and Master of Arts, Subarea Scenic Arts (PPGA / UFU) by the Federal University of Uberlândia. In the visual arts field, he works relating architecture and body, producing drawings, paintings, installations and performances. In the performing arts, he works as an actor, a clown, an interpreter of movement, a set designer and costume designer. He worked as a set designer at the Theater Course at the Federal University of Uberlândia from 2010 to 2016. He is currently a professor at the Architecture and Urbanism Course at the Federal University of Goiás - Goiás Regional, in the area of expression and representation. 2 DUPUY, Dominique. La danse, naissance d’un mouvement de pensée. Paris: Armand Collin, 1989. In: LOUPPE, Laurence, Poética na Dança Contemporânea. Lisboa: Orfeu Negro, 2012, p. 190.
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which operate in the relations between body and environment. The final composition, that is, the ‘art piece’, involves the information inscribed in the bodies (derived from experiences lived in daily life and in dance), which carry aesthetic options (related to notions of dance, or arts, already instituted, for example: classical ballet, modern dance, jazz, etc., and other artistic forms), together with the conditions present in the context given to the composition (GUERRERO, 2008, p.15).
The scenic space is part of the context in which the work is created and presented, therefore, in many of the real-time composition the proposals arrogate from the possibilities of creation that this space offers, providing a direct dialogue between the dramaturgy created with space and its poetic links. This article aims at to discussing how the architectural space influences the choices of interpreters in the construction of dramaturgy, taking into account works that are open to this type of dialogue.
The space of experience Let’s say that I call space all the mechanisms of life. Space is not just where people are, but something active and engaging. Space, as I imagine, excludes the possibility of the existence of an exempt observer, who dominates the world with his/her gaze. It implies participation (MEIRELES, 2009, p.26).
It would be foolish to say that real-time composition can be exempt from interference of the place in which it is performed. This is because “every place radically impregnates (formally, architecturally, sociologically, politically) its meaning in the object (work/art-piece) to which it is exposed to” (BUREN 2001, 91). Bodies that dance in a real-time composition are distinguished from the everyday bodies, since they are in a playing state, requiring attention to the scenic creation during the scene, adding to the listening context (audience, place, roommates). Even if they are places traditionally intended for artistic performances (such as theaters in their most varied formats), they have very particular characteristics, which are often masked in the search for the illusion of suspending reality in the performing arts. These performative bodies end up dilating the experiences in the architectural space, constantly asleep during the day-to-day. 70
The concept of Experience is defined by Bondia (2002) as “what passes us, what happens to us, what touches us. Not what passes, not what happens, nor what touches. [...] Never have so many things been passed, but experience is increasingly rare “(BONDIA, 2002, 21). Bondia affirms that the experience is more and more rare due to the excesses of information, opinion and work, as well as the lack of time. Being in the experience of realtime composition provides an opportunity to relate to and connect with the established context. It is necessary to put us in experience in order to extend the possibilities of scene in real time composition. The excess of information gives place to edition creation in scene, trying to emphasize the choices that were made. The excess of opinion tends to be replaced in the scenic game with the suspension of judgment, showing different possibilities instead of being stuck to right and wrong. Overwork, which represents a long search for productivity, is altered by the pleasure of being in the scene. Also, as in improvisation, the creation happens at the moment of presentation and commitment to correctness tends to be replaced by simply experiencing. Lack of time is counteracted by a suspension of everyday time during the scene. These strategies seek to make whoever is dancing feel a truthful communion with “what passes by, what happens and what touches” them. Thus, the interpreter, when moving in a certain architectural space, begins to reveal the senses, presenting new possibilities of experience. The experienced is enlarged in the scene, waking up what is asleep in daily life, in an intimate relation with the place. Tschumi (1996) says that the experience in the architectural space promotes the encounter between the parts, becoming inseparable in timespace. Entering a building can be a delicate act, but it violates the balance of a precisely ordered geometry. Bodies sculpt all kinds of new and unexpected spaces through fluid or wandering motions. Architecture, then, is just an organism engaged in constant exchange with users whose bodies advance against rules carefully established by architectural thinking. [...] Each door implies a movement to cross its structure. Each architectural space implies and desires the intrusive presence that will inhabit it (TSCHUMI, 1996: 123). 71
To analyze the reverberations of the architectural space on the dancer, the space will be analyzed from two points of view: the physical and the social. The choices made for the formal conditions of architecture can say a lot about their social conditions, making the experience reverberate artistically and revealing a lot about the place. An outstanding architectural experience sensitizes our entire physical and mental receptivity. It is difficult to grasp the structure of feeling, because of its immensity and diversity. In this experience, we discover a combination of the biological and the cultural, the group and the individual, the conscious and the unconscious, the analytic and the emotional, the mental and the physical (PALLASMAA, 2013, p. 486).
It is important to remember that, in experience, the qualities of architecture intersect and often become inseparable. The use of a particular constructive technique, finishing material, the definition of the scale of the building or the type of existing lighting is given by its social value. However, they will be analyzed in this article separately, understanding that the physical and social contents, although interdependent, end up interfering in different ways in the quality of the movement during improvisation. By taking the architectural space as part of the process of real-time composition, dancers are involuntarily taken by circumstances and also begin to create based on spatial perspective. Space acts upon us and can dominate our spirit; a large part of the pleasure we receive from architecture pleasure that we seem to be unable to perceive or which we do not bother to notice - arises in reality from space (SCOTT, in ZEVI, 2009, p.186).
The physical content I will name as ‘physical content of space’ that what is “measurable and measured, examinable, and geometric” (LOUPPE, 2012, p.191). The space, with its formal characteristics, is a condition for the dramaturgic to conceive real-time composition in Contemporary Dance. If we consider that the dramaturgical choices made during the presentations reflect the relations between the dancing body and the place where it is 72
danced, “space takes place in the performance, changing from the space of the performance to the performance of space” (FÉRAL, 2004, p. 198, our translation). In the history of dance, we observed that space occupied in the scene between the dancers and the audience began to narrow from the 60´s on, because artists began to occupy different places other than traditional Italian stage theaters, where the separation between stage and audience is much longer. The artists seek to carry out works that relate directly with the physicality of new places (galleries, streets, squares, churches, parking lots, etc.), breaking the paradigms of the art system regarding market and circulation. By “considering the constituent elements of the place: its physical dimensions and conditions” (CARTAXO, 2009), these artistic works end up having features of site-specific, a concept emerged in the 60´s in the visual arts among minimal artists. Allowing the body to talk to the physicality of the place promotes a “rupture with the ideal character of the modernist space and with the idea of autonomous and self-referential work, giving place to the prioritization of the phenomenological experience of the body” (BRUZZI, RENA, 2015, p.169). It is also noteworthy that even when the real-time composition is performed in Italian stages or scenic spaces where the delimitation between stage and audience is well defined, in most cases there is no desire to create illusion and distance, and despite of spatial separation, dialogue between the parties is frequent. Architecture, then, becomes “supporting or main character, bed of torture or desire, alcove, refuge or prison, according to the way the body uses it as support, trampoline or obstacle” (LOUPPE, 2012, p. 310). Bodies in experience in architectural space are affected by the physical content of the place, its scale, form, materiality, color and texture. The base, cover and vertical planes, and other defining elements of the spaces, in terms of their scale, materiality and format, will be responsible for determining the movement quality of the bodies. The basic plan in Contemporary Dance acts as “support, loving partner or renunciation” (LOUPPE, 2012, p.106), there is a recurrence of “the 73
construction of alignments and bodily supports (including the use of threedimensional breathing), through the use of the ground as a partner and consequently transferences of such studies to the medium and high levelsâ&#x20AC;? (MUNDIM, 2013, p.42). The dimensions of scenic area for the presentation define the performerâ&#x20AC;&#x2122;s perspective. For example, if in a large square the dancer can freely perform his movements without worrying about the limits of the place, when choosing to dance only inside a fountain in the square with small dimensions, his/her movements will be limited. The shape of the floor - straight, with elevations or relegation (such as stairs and uneven planes) - will allow different possibilities of flow, therefore being able to bring the performer to evidence or hiding some of his/her parts. The design of the floor, with different shades of color, material shapes, grout and joints distances, can invite us to play. For example, if the players decide that they will only dance on the grout lines, or when there are two floor colors, they could decide to only dance on the lighter ones. The materiality of the floor - wood, covered by linoleum, stone, ceramic, natural (grass, earth, sand etc.) etc. - will cause different impacts regarding the contact of the body and the ground, consequently, the movement will be adapted to this floor, bringing different reverberations, such as bumps, falls, imbalances, shocks, slides, sounds, among others. Coverage planes help define the boundaries of architectural space. The size of the right foot establishes limits for the movement of performers. The structures that support the cover planes can be used as hangers and jumpers. Uncovered places, such as squares, end up less delimited, causing the natural weather, such as rain, sun and wind to hit the dancer and provoke body states of attention defining qualities of movement. Vertical planes usually delimit where closed spaces begin and end. Walls and pillars are spots of support used by performers during improvisation, because, being fixed and rigid, they end up becoming dance partners. Other space-defining elements, such as openings and stable furniture are dramaturgical facilitators, since they can create entrances, be supporting spots, and be scene partners that change the dynamic. 74
Real-time composition seeks to add to the scene everything that happens around it. In this way, even with a predefined soundtrack or a soundtrack being performed in real-time, the sounds that the space itself produces also come into play. The noises originated from the contact between ground and bodies, also noises produced by the audience (cough, hiccups and conversations, etc.) as well as noises from the environment itself (cars passing by the street, animal noises around, sirens, etc.) compose this major soundtrack created in real-time during the game. Improvisation in dance and the music of space unite in a “reconciliation made historically unthinkable, aspirations that go to the limit of the possible, ... and secret compliances or lawless...guarantee the poetic sources of this instability “(LOUPPE, 2012, p. 318).
The sociocultural content In the space life and culture, spiritual interests and social responsibilities coincide. Because space is not just an empty cavity, “denial of solidity”: it is alive and positive. It is not only a visual fact: it is, in every sense, and especially in a human and integrated sense, a lived reality. (ZEVI, 2009. p.217)
When we consider that the experience in the architectural space goes beyond physicality, the performer will also seek in his movements to reflect upon the socio-cultural conditions that the place carries. “The quality of architecture does not lie in the sense of reality that it expresses, but rather in its capacity to awaken our imagination” (PALLASMAA, 2013, p. 488). If in real-time composition, in Contemporary Dance, the movements are articulated with time and space relations, this way, it ends up taking for itself, besides physicality, the intrinsic social aspects of the place, becoming then a site-oriented work. “The singularity of site-oriented art [is] constituted by the relations of the work with the temporal (updating) and social place (institutional sphere) - configure itself as a field of intellectual and cultural knowledge” (CARTAXO, 2011,p.2). The sociocultural layers promote the creation of skewed narratives between the performer, the place and the audience. These narratives will give shape to the dramaturgy that “is made up of fragmented time, overlapping, repetitions, displacements” (CANTON, 2009, p.15). 75
The organization of socio-cultural readings of space, with the strength that brings to movement causes the artist, at the time of creation and performance, to have a large number of composition strategies to be used while playing. The listening and the selection of information in the scene will be fundamental for the edition of the present data given by the sociocultural conditions and offered by the architectural space to the dramaturgy of composition. “Composing is the opposite of juxtaposition, where the strength of a discourse does not exist, but only a series of isolated, meaningless words” (ZEVI, 2009, p.166). The memory of each place is filled with its sociocultural meanings, and can be defined as “a constituent element of the sense of identity, both individual and collective” (POLLAK, 1992, p. 204). The architectural space itself contains layers of memories, juxtaposed in historical facts, the use of places and the background that these spaces represent for each person. These facts associated both through the movement of performers and through the bodies of those who watch, produce several narratives, dramaturgically nourishing the performances. All the sociocultural content is impregnated through the memory that the architectural space brings in itself. In its ephemerality, the improvisation, which works with the here and now, will deal with these interferences all the time. The facts that are happening at the moment, whether if it is regarding the private life of each dancer or group situations, such as celebration dates or political, economic and cultural events, are expressed in a particular way depending on the “place” where one is, such “place” will influence the movement produced during a performance. The presidential election, mother’s day, birthday, fight with your friend or any other event will manifest in motion, and it will be according to the personal repertoire and where you are dancing. Dancing on September 7th (Brazil’s independence day, often celebrated with parades) in a square creates different effects of dancing than it would in the same day inside a theater. Thus, the place where the presentation takes place will respond in a different way to each event as well. Often, an architectural space, which may be previously unknown to the interpreter, triggers other relations of affectivity, making “the current perceptions of space be duplicated by previous perceptions without that do 76
not regard to repression or conflict among pre-established representations” (GUATARRI, 2016, p.155). For example, if real-time composition is performed in a school, the educational environment causes the interpreter to relate to the memory demands that such place offers. Even though he/she might never have been to this school, his/her understanding of the school environment reflects in the movements. If the dancer has studied there, the events of the past are impregnated in his/her body and can appear on stage as dramaturgy. These dramaturgies produced by each performer will interbreed with the dramaturgies produced by the architectural space, by the other performers and also by the viewer who is part of the scene in the Contemporary Dance. Thus, we search for: The creation of a state of provocation to be experienced mutually between interpreter-creator and audience, and we build up a thought where the viewer contemplates the scene, from his/her singularity, from empathy and distance that he/she establishes with the interpretercreator through the choreographic structure and through the connections that are done, intervening in the performance (MUNDIM, 2013, p.267).
Final considerations Improvisation is a dialectic between the dancer’s deep resources, the event brought about by experience, and the gaze that reflects and gives us new perspectives, or that, on the contrary, shifts the boundaries of the possible with a renewed force (LOUPPE, 2012, p.236).
Dance is the “updating of a single body experience, the materialization of time and space in relation to a witness-perception, and the body-to-body relationship established in a shared duration” (LOUPPE, 2012, p.361). Therefore, improvisation in dance is to understand the architectural space as a partner in dance. Dance with and in the architectural space. Guatarri (2006) argues that contemporary spaces interpellate the viewers in a variety of ways: historical, functional, affective, symbolic, and stylistic. “It would not be too much to emphasize that the consistency of a building is not only of a material order, it involves machinic dimensions and 77
non-corporeal universes” (GUATARRI, 2006, pp. 160-161). Therefore, when improvising in dance, one apprehends a climate to establish affective and aesthetic spatial relations. We cannot ignore that the performer also interferes directly in the architectural space. From the moment we dance in the architectural space, this space also dances in the dancer, making the exchanges between performer and architecture interfere all the time in the spatial qualities. To stop thinking about the architectural space as a conditioning factor in the dramaturgy of real-time composition is to miss the opportunity to make dance a poetic way of perceiving the common confrontations of everyday life.
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Improvisation in dance: bodyspace in experience Ana Carolina Mundim1
Introduction This text shares part of the postdoctoral internship research named “Improvisação em Dança: corpoespaço em experiência” (Improvisation in Dance: bodyspace in experience) held in 2015, at the University of Barcelona, under the academic advising of Prof. Dr. Jorge Larrosa Bondia, funded by a CAPES scholarship, within the Postdoctoral Internship Program - Call I 2015, Postdoctoral Research Abroad. This internship represented an important stage of a study process that has been developed since 2000, as it aimed at refining the concept of bodyspace in dance improvisation based on my own practical experience, being part of workshops given by Mark Tompkins, Simone Forti and an approach towards the work of Julyen Hamilton throughout 2015. In addition, an artistic residency was held at the Institut del Teatre, city of Vic, Catalonia, Spain, culminating in the creation and presentation of a realtime self-authored solo composition, called Dreams2. The interviews with Mark Tompkins, Julyen Hamilton, Claire Filmón, Roberto de Oliveira and Anton Lachky, besides the ones already taken in the year 2014 with Lisa Nelson, Kate Duck, Tica Lemos and Dudude Hermann, were also precious to mature the arguments that stand out in this text. All of these materials were references to studies and artistic production and do not necessarily 1 Ana Carolina Mundim is an interpreter-creator in the field of Contemporary Dance and Improvisation, actress and photographer. Bachelor and educador (Unicamp), Master’s degree in Arts (Unicamp), Doctorate in Arts (Unicamp and UAB - Spain) and Postdoctoral Internship (at UB (Spain). She is currently a professor at the Federal University of Ceará. She coordinates the Artistic and Research Group Conectivo Nozes and Dramaturgia do Corpoespaço, respectively, that are dedicated to improvisation and real- time composition. She participated in many artistic residencies in Celrá (Spain), Ipatinga (Brazil), Fortaleza (Brazil), Fontcoberta (Spain), Shanghai (China), Uberlândia (Brazil), Belo Horizonte (Brazil) and Vic (Spain). She studied body in dance improvisation since 2000. She participated in workshops with important artists such as Dudude Hermann, Tica Lemos, Beth Bastos, Kate Duck, Lisa Nelson, Mark Tompkins, Simone Forti and Julyen Hamilton. Founder of the improvisation event: Temporal – encontros de dança contemporânea e composição em tempo real. 2 https://www.dropbox.com/home/Dreams?preview=Dreams+final+com+entrada-HD+ 1080p.mov
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appear here explicitly, but it is important to notice that they gave support to the organization of the thoughts that I share, because they moved me as an artist, teacher, researcher and citizen of the world. Therefore, all the theoretical reflection that is organized here is built from the improvisation trainings experienced and the artistic work developed. Its frame, however, is not in the descriptive sharing of processes, but in the materialization and written provocation of the issues raised in practical action, including the poetic permission of sensible and sensorial construction of the word/bodyspace in textual movement. Although the interdisciplinarity with artists and authors from other areas of knowledge may be a constant in the articulation paths of this research, which also involves a continuous practical/reflective work with the research group Dramaturgia do Corpoespaço, more and more there is a quest for producing a thought that could emerge from the dance field itself. The arguments presented here, therefore, originated from an organic and experiential path.
Bodyspace in movement «Space does not exist. It is a concept created by humans. We create space.» With that phrase, Julyen Hamilton3 began his course The Space Issue at Carthago Delenda Est, in Brussels, Belgium, which took place between March 16th and 20th, in 2015. To think the constitution of concepts considering our own existence and through its corporeal materialization seems to be a sensible path for understanding that these constructs, despite presenting an inherent objectivity, are also permeated by subjective experiences. Discussing a concept is an attempt to materialize into words a given phenomenon. Although concrete, because they occur physically in a temporary or permanent way, phenomena are perceived, analyzed and studied by human bodies and, therefore, filled with subjectivity. Thus, Julyen’s phrase brings to light how our ways of perceiving space are linked 3 Julyen Hamilton is an English dancer and improviser based in Banyoles, Spain. His work in dance, both in companies and solos, is focused on instant composition and is organized based on principles, which include the study of space, time and rhythm, character composition, use of voice and production of text. More details about his work can be found at: http://www.julyenhamilton.com.
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to what we create as human beings, that is, inherent in the body. Bodyspace and its multiple forms of conceptualization. Space is an abstract term for a complex set of ideas. People of different cultures differ in the way they divide their world, in the way of assigning values to their parts and measuring them [...]. [...] However, there are certain common cultural similarities, and they rest primarily on the fact that man is the measure of all things. In other words, the fundamental principles of spatial organization lie in two types of fact: the posture and structure of the human body and the relations (whether close or distant) between people. Man, as a result of his intimate experience with his body and with other people, organizes space in order to conform him to his biological needs and social relations. The word “body” immediately suggests an object rather than a living and spiritual being. The body is a “thing” and it is in space or occupies a space. On the contrary, when we use the terms “man” and “world,” we not only think of man as an object in the world, occupying a small part of space, but also of the man inhabiting the world, directing and creating it. In fact, the simple English term world contains and conjugates the man and his environment, because his etymological radical Wer means man. Man and world indicate simpler ideas abstracted from man and the world, especially body and space, remembering, however, that he not only occupies it, but directs and orders according to his will. The body is “living body” and space is a space construct of the human being (TUAN, 2013, p.49).
Taking that into consideration, it is possible to think the bodyspace from its relation man/world, as living a organism that is organized as experience in movement. Every body is a space and every space is a body, and this body is not necessarily human. An element of nature, for example, is a body. It is also known that the space exists without man, because of the existence of other planets in which there is no human life. However, man does not exist without space and through his experience produces all knowledge created on space and from it. All experience is concrete and subjective, objective and emotional, individual and social (but it is an individual reading of a social 82
practice). “My body is the true belly bottom of my world, not in the sense of a central perspective of observation, but as the only place of reference, memory, imagination and integration” (PALLASMA, 2013, p. 104). In a broader sense, the corporeal space is beyond what is visible and beyond what humanity is. However, since it is not possible to comprehend the whole world, what is being considered here is a reading of bodyspace based on the human perspective and what is materialized as existence4. Space is in itself, or rather, it is the in itself par excellence, its definition is to be in itself. Each point of space exists and is thought where it is, one here, another there; space is the evidence of where. Guidance, polarity, involvement are in it derived phenomena, linked to my presence (MERLEAUPONTY, 2004, pp. 33-34).
Space is in itself; and human presence articulates its own phenomena, therefore we may think that movement is the very process of materialization. At one level of analysis time-geography deals with the time-space’ choreography ‘of the individual’s existence... an individual’s existence can be diagrammatically described as a trajectory, the’ daily ‘- or’ life-path ‘of movement - or weaving dance through time-space (A. PRED apud MERRIMAN, 2010, p. 427).
The corporeal choreographic drawings delineated as space can establish, based on a network of movements, structures that work as material devices, generating images, always placed in relation to something and always contextualized. From this perspective, I am world (not the world). “So we’re like a microcosm of the whole universe. Because we are part of the universe, we are part of nature. Everything is one thing “(ANNA HALPRIN, 2:43 min) 5. I am bodyspace, acting constantly in action or in silence and the awareness of each perspective launched by the movement is transfigured into position. 4 What I call materialization includes visible and invisible (but noticeable) issues. However, we will not enter into matters like spirituality and energy in this text, although we might mention, for example, the work of Anna Halprin, who was very attached to these themes. 5 ANNA HALPRIN, dancing life/danser la vie. Production: Contredanse - Baptiste Andrien & Florence Corin. Brussels: Éditions Contredanse, 2014. 1 DVD-ROM (375 min), color.
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Human consciousness is a corporeal consciousness; the world is structured around a corporeal and sensorial center. “I am my body,” says Gabriel Marcel; “I’m what’s around me,” says Wallace Stevens; “I am the space where I am”, determines Noël Arnaud; and, finally, “I am my world,” concludes Ludwig Wittgenstein (PALLASMA, 2013a, p.14).
I am world. I am bodyspace. However, to understand bodyspace from the self (from the “I” as a world) is not to fall into the trap of human prepotency, which is to see oneself as the central axis of the universe from where everything occurs, disregarding another, but the opposite: it means to perceive oneself in a humble way, in our smallness. Speaking from within is a decision generated exactly from one’s own limitations and vulnerabilities. “And everything we perceive about the world lives through our body. It cannot live anywhere else except through us “(ANNA HALPRIN, 2:17) 6. On the other hand, to speak of oneself is also to consider the other, since existence only occurs in collective connections and in the perception that an individual is social. “Dance is not about you. It’s about us “(ANNA HALPRIN, 0:13 s) 7. Clearly, there is no way to understand the world from the perspective of others, but only from the perspective of experience itself. “We contemplate, touch, and measure the world with all our physical constitution and existence, and the world of experience is organized and articulated around the center of the body” (PALLASMAA, 2013b, p. 125). An experience, therefore, will never be neutral, and therefore a conceptual proposal that could emerge from it will not be either. It is possible to approach the practice and the thought of others from a standpoint of imagination and/or empathy, but not actually experiencing them. Thus, thinking bodyspace from itself is to perceive it from a possible place and as far as it is possible. “There is a phrase from Kierkegaard that states, ‘It is necessary to find a place from which to look’. That is, first we have to find a place, only then we can look at it. If 6 ANNA HALPRIN, dancing life/danser la vie. Production: Contredanse - Baptiste Andrien & Florence Corin. Brussels: Éditions Contredanse, 2014. 1 DVD-ROM (375 min), color. 7 ANNA HALPRIN, dancing life/danser la vie. Production: Contredanse - Baptiste Andrien & Florence Corin. Brussels: Éditions Contredanse, 2014. 1 DVD-ROM (375 min), color. Inside the cited DVD-ROM there are several small videos. The passage quoted is in the video called “Collective Energy”, within the word “space”, of the index.
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we look without having found a place from where to look, we will not see anything “(FERNÁNDEZ-SAVATER, 2011, p.1) 8. It is from this bodyspace place, which is perceived in movement, that creation flourishes and from where concepts unfold. From a place that starts from itself, but conscious and open to others, within its collective nature.
All creation is belief. Of and from, dandelion.
Adoption. Donation. Digestion. Transformation.
I chew what I swallow and blow very slowly until it becomes an ocean, and covers the red land in veil. The same that entrenches my feet, making me dust and pores. I dance the air that draws me. I recreate. I transcript. I fold the certainties like origamis and unfold them in wrinkle uncertainties to unveil the unknown. I wait for the movement to move, in its silence, risking myself butterfly, building and ground. All creation is belief. A Bet. Arousement. I make skyscraper love, in every corner, with every gesture. I make grass love at each texture, at every protest. I make cement love the scent of seeds sprouting green. All creation is belief. Invention. Imagination. 8 Translation under my responsibility from the original: “Hay una frase de Kierkegaard que dice: ‘Hay que encontrar el lugar desde el que mirar’. Es decir, primero tenemos que encontrar un lugar, sólo luego podremos mirar. Si miramos sin apoyarnos en un lugar, no veremos nada”.
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“To imagine, in human terms is to exist” (MANGUEL in TAVARES, 2012, p.11) 9. Imagination is a sensory organ. We exist based on the concepts we create, but rather, in order to create them, we exist according to the way in which we experience the world. An inexperienced concept is an empty concept. One must smell the jasmine to know smell. One must burn the flesh to know burns. Kiss to taste the kiss. Breathe to feel like air. One must shred to feel like gravel. Move to know how to move. Enjoy the ocean to know it as salt, horizon and water. Otherwise, what we have is just an idea of what the smell of jasmine, burn, kiss, and air might be... Concepts may include ideas, but do not consolidate in them; they consolidate in the doing. The choreography of the words written in this paper is composed only by the living and experienced bodyspace and is only kept alive if practiced by other bodyspaces, which will transform it. Bodyspace in action is constituted by the senses in experience and by the memory that is created in body architecture through flesh, bones, joints, organs and sensors. From this movement in conscious compass comes the dance, which improvises theoretical-practical knowledge based on its memory-archive. We are connected to the world through our senses. The senses are not mere passive receivers of stimulation, and the body is not just a point for the world observation in a centralized perspective. Nor is the head the only place of cognitive thinking, since our senses and all our body existence can structure, produce, and store silent existential knowledge. The human body is a wise entity. Our whole being in this world is a sensory and embodied mode of being, and it is precisely this sense 9 Translation under my responsibility from the original: “Imaginar en términos humanos, es existir”.
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of being that forms the basis of existential knowledge. “An understanding is not a state that reaches the human reality from the outside; it is a characteristic way of existing, “as Jean-Paul Sartre states (PALLASMA, 2013a, p.14).
We therefore constitute existential knowledge and, considering the way we feel and perceive the world; we delineate what we call reality. And reality is also corporeal perspective. Reality constitutes bodyspace. There is not a unique body but multiples, which date, repel, consubstantiate, intertwine, destroy, question, distance, approach, copulate, dissolve, overlap, support and make up each other. Thus, reality is also dropped in multiple possibilities, reasons and different readings. As we move, “each angle generates a change regarding the reading of the movement” (HAMILTON, 2015)10. The bodyspace that observes also reads the movement from where it is and depending on its angle of observation will also have a specific reading about the change of each angle of the moving body. And so, as a matter of dance, one must have a criterion within subjectivity: to understand bodyspace from itself is to understand oneself in relation and not in isolation. In the same workshop already mentioned in this text, Julyen Hamilton said three sentences that, although shared at different times, are grouped here: “Space allows relationship”, “Space is an issue and therefore something that concerns one person or more”, “Space invites” (HAMILTON, 2015). Beyond that, bodyspace only exists in relation (to something/to someone), especially in the dancing movement. Therefore, not everything fits into this dance. But what dance? In the first instance it is necessary to know what dance, who/where dance, in relation to whom/what dances? Seeking clarity through these and other issues, it fits what happens in relation, in negotiation, in listening, in agreement. It is what the dialogue allows, depending on a composition, according to the artistic work.
10 Sentence said in the workshop previously mentioned in this text, given by Hamilton in Brussels.
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It was just one. In contemplation. The fat yellow moon, fished by the star, jumped out of the water and hung to dry. From the top immersed itself as a white light like an ocean lighthouse in the sea. Invaded I saw me as floating brightness, tasting a fast light flight. I lost weight and heard a whisper: if you want to contemplate, lose yourself into swimming.
The connections are structured in the experiments. It is in the dive that we perceive weight and weightlessness, we find directions or we lose orientation, we flatten, we drown, we resist or we fall and we rise. “Man, through his simple presence, imposes a scheme in space. Most of the time, he is not aware of it” (TUAN, 2013, p. 51). To become conscious is to dialogue, to interact, to position oneself. As in poetry, it perceives the moon and the sea. Anna Halprin, in a video commenting on the work of Leonardo da Vinci, The Vitruvian Man (1490), says: Then you have the shadow of the figure with the legs coming together and the arms going up. And so he is trying to communicate the sense that the body is going vertically up. Now if you do an up position, it is possible to do that way, but if you got the sky up there and you report to the sky, the whole body shifts and the whole body goes up. So it has a difficult dynamic and you feel yourself not in the position facing the sky but you feel yourself becoming sky (ANNA HALPRIN, 1:39 min).11
To perceive oneself as sky, moon, sea, street, building. In Anna Halprin’s vídeo Returning Home (2003)12, these relationships are visible. It is possible to appreciate one´s bodysea, body-tree, bodywind and the corporeal-spatial choreographic trajectories, which continuously transform 11 ANNA HALPRIN, dancing life/danser la vie. Production: Contredanse - Baptiste Andrien & Florence Corin. Brussels: Éditions Contredanse, 2014. 1 DVD-ROM (375 min), color. Inside the mentioned DVD-ROM there are several small videos. The passage quoted is found in the video called “Leonardo da Vinci”, within the word “space”, of the index. 12 A short fragment of the video can be found at: https://www.youtube.com/watch?v=EvyI2MXzy4c.
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the integrated movements of art as celebration of nature and nature as artistic manifestation. Move and be moved. â&#x20AC;&#x153;Space [...] is given by the capacity to moveâ&#x20AC;? (TUAN, 2013, p.22). And motion only occurs as space. Spacebody, Bodyspace. I touch the stone, which touches the rock that I am. I peel sand and collect the grains to swallow them in the flood that dilutes me. I devour air in order to float and ground in order to become gravity. I dance what moves me and move what dances me. To invigorate bodyspace senses, to tear away its unconscious automatisms, to move it from familiar fields of action or even to make it notice these fields from other broader perceptions may expand the perspectives of creation and potentiates decision-making in dance. This understanding brings a paradigm shift about how we put ourselves in the world or how we compose artistically. Rudolf Von Laban (1879-1958), already at the beginning of the twentieth century, proposed a practical thinking and bodily experimentation that dealt with the spatial matter and dealt with the relation man/nature at all times. For Laban, the experience of nature meant dance. Thus, everyone who was able to experience nature could dance. Nature exposed spatial and dynamic prototypes, which he also found in the body and the movement. He held that the structures of the body, movement and nature are harmoniously connected: harmony was the result of the active interrelations between body action (movements) and its organic models found in nature (spatial and dynamic prototypes, such as crystalline forms) (Grau and Jordan, 2000, p. 58).
He already considered that space was designed based on the dancerâ&#x20AC;&#x2122;s body, in the dance. He created a structure of studies for body and space, which consisted of different organizational layers that could interweave in the technical-creative process. The Choreutics or Spatial Harmony, considered 89
a theory of space, requires the consciousness and mastery of directional guidance and the appreciation of the extent and shape of motion. The notion of extension and size of movement is associated with the structure of the human body, such as the vertical and bilateral extension, and with the notion of the sphere of movement, which can grow and shrink by means of the stretching and bending joints. Laban distinguished space in general from the reach space immediately around the body and named it kinesphere (MALETIC, 1987, p.74).
The spatial relations in Choreutics were defined by harmonic principles, which were thought of in a logical order underlying the evolution of forms in space. Scales of spatial direction perceived these shapes in a central, peripheral, and transverse way. For space exercises, Laban used the crystalline forms, particularly the octahedron, the cube, and the icosahedron. “The five polyhedra or Platonic solids (the cube, octahedron, tetrahedron, icosahedron, and dodecahedron), serve not only as visualizations or schematizations of the environmental space directions, but also as metaphors for the dynamic shaping of expressive movement forms” (MALETIC, 1987, p.67). And it was in the icosahedron that Laban found the crystalline form which better corresponded to the potentials of human movement. While Choreutics deals with structural aspects of the movement within the rhythm of the forms, Eukinetics embraces the temporal and dynamic occurrences. Eukinetics was considered by Laban “[...] as a part of the study of Choreutics in which the dynamics structure of movement can be determined (MALETIC, 1987, p.97). It is the qualitative study of movement, based on four factors: weight, space, time and fluency. The combination of the movement factors generated the organization of eight basic actions of effort: to wring, to press, to flick, to dab, to glide, to float, to punch, to slash. In the first edition of The Mastery of Movement on the Stage, Laban refers to Effort as the inner impulse from which movement originates. […] Most significant is Laban´s correlation of the attitudes towards motion factors and the various levels of consciousness. Attitudes towards space are associated with attention and man´s power to thinking, attitudes towards weight with intention and with sensing, attitudes towards time 90
with decision and intuiting, and attitudes toward flow with progression and feeling (MALETIC, 1987, p. 100).
Based on these principles, Laban argued that a temporal art could only achieve its complete development with a notation that could capture, preserve and examine its ephemeral creations (MALETIC, 1987, p. 113). In this way, he created a notation of movements, at first, called Choreographie, followed by Kinetographie (1928), which in its Greek etymology means “writing of the movement” and finally established as it became known worldwide as Labanotation, being this last term suggested by the Dance Notation Bureau of New York and accepted by Laban. Through his theoretical-practical research, Laban organized, in a powerful way, a research structure of the body in movement in relation to space, which created/creates possibilities of improvisation for creation and for that reason his studies still remain as a great reference in the field of Dance. Isadora Duncan (1877-1927), contemporary of Laban, also developed some of her work based on the relation with nature, connected with the movements of plants, wind, sea, clouds, among others. Her professional universe, which was based on improvisation, deconstructed paradigms about technique-creation in Dance, which until then was strongly based on classical ballet practices, taught within a formal and rigid aesthetic structure. Considered as one of the forerunners of the Modern Dance, she was known for her revolutionary spirit and actions. She danced barefoot, with loose hair and flowing robes, and sought inspiration in Greek culture, breaking the dance patterns established at the time. Isadora was a figure who created ruptures as a dancer and dance teacher and, through her practices, left historical residues that reverberate until the present time. One of her students who became world renowned was Anna Halprin, who has followed a very different artistic path from Isadora’s, but shows that she has maintained an interest in the connection that can be established between dance and nature, between body movement and space movement. Anna Halprin (1920) who studied not only with Isadora Duncan but also with Ruth St. Denis, throughout her career has gone through other influences, such as her husband, the architect Lawrence Halprin, whom she met at the University of Wisconsin, and Margaret H’Doubler, her teacher at the same institution (1938). These last two references have brought her the 91
interest to investigate more deeply aspects of anatomy, improvisation and the architectural relation of the body. Lawrence had studied at Harvard University with architects attached to the Bauhaus, such as Marcel Breuer, Walter Gropius and Laszlo Moholy-Nagy. [...] the ideas of Moholy-Nagy and other Bauhaus thinkers, coupled with conversations with Lawrence, prompted Anna to think about the nature of ‘choreography space’, and she would later go on to become one of the pioneers of (postmodern) dance and performance out of the theatre and into a range of public spaces (MERRIMAN, 2010, p. 433).
Anna reconfigured the idea that performance space should take place in the theatre building. Advancing in the experiments performed outside the theatre, which as we have already seen, were initiated by Laban and Duncan, Anna proposes dance as a performance act in places such as the beach, the streets, the top of the mountain, bus stops, etc. Through her studies, she realized that a body’s current movement patterns were reflected by a total holistic relationship with everything that happened in her life (ANNA HALPRIN, 00:37). The relations between body and space became more and more intimate and became more and more as perceived unity. In 1952, when Anna and Lawrence moved to Kentfield, Lawrence designed with Arch Laureter an open wooden dance deck, suspended on a hill and surrounded by trees. It was designed for the experience of the movement and as it did not really have a centre like in a usual room, provoked in Anna a change of perspective about the use of space. Among their studies, the couple’s dedication to understanding the movement in their spatial connection was significant. Lawrence stated: The essence of my interest in movement and in choreography is that I always like to design for people and people are never static. They are always moving. The only way that they can realize their relation to environment is by moving through it or being affected by it someway. Since I don’t just design for visual appreciation of design but also very strongly for the social impact of the design and how people are going 92
to react to it and how they are influenced by it, I have had to study with my wife how people’s movement affects the environment interactively and how the environment affects them. So I´ve spent a lot of time thinking about movement through space interacting with environments and how it affects the design of the environment where the people are going to move in (ANNA HALPRIN, 0:16)13.
Such understanding of a moving body, which perceives dance as architecture and architecture as dance, nature as dance and dance as nature, architecture as nature and nature as architecture, reconfigures modes of action and understanding of the concepts which supports them. Anna (MERRIMAN, 2010, p.443) discusses how the non-rectangular form of the deck forced a reorientation of the dancer, since the referential points of a cube ceased to exist (front, back, sides and high): “[...] the space explodes and becomes mobile. Movement within a moving space, I have found, is different than movement within a static cube “(HALPRIN, 1956, apud MERRIMAN, 2010, p. 433). Some of the dancers who studied with Anna continued this vanguard movement that had been structured and disseminated. Trisha Brown, Simone Forti, Yvonne Rainer, Meredith Monk and Robert Morris are examples. Together they were part of the Judson Dance Theatre, a collective of dancers, musicians, and visual artists performing at Judson Memorial Church in Manhattan, New York, between the ages of 62 and 64. Steve Paxton, Deborah Hay, David Gordon, Lucinda Childs joined them, among others, who then followed their own paths, maintaining to this day, artistic productions and processes of formation which influence the contemporary scene. Dancers’ embodied movements shape and enliven spaces, and in the 1960s avant-garde performances increasingly worked outside conventional training and performance spaces such as the studio and theatre, taking dance into the streets, breaking down conventional divisions between performer and 13 ANNA HALPRIN, dancing life / danser la vie. Production: Contredanse - Baptiste Andrien & Florence Corin. Brussels: Éditions Contredanse, 2014. 1 DVD-ROM (375 min), color. Inside the cited DVD-ROM there are several small videos. Inside the cited DVDROM there are several small videos. The passage quoted is found in the video called Lawrence Halprin: changing places (1986), within the word “space”, of index.
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audience, and challenging ‘the boundaries between dance and day-to-day movement and claim[ing] any and all human movement as potential dance. Avantgarde choreographers and dancers started to rethink and explore the relationship between embodied performance practices and performance spaces, inhabiting architectural spaces and environments in inventive and creative ways. We could label these dancers and choreographers as laymen geographers, writing and performing spaces through their embodied movements and animations of landscape (MERRIMAN, 2010, p. 430).
Traces which move, fold, unfold, bend and twist, composing new routes through the decomposition of the structure, de-structuring to restructure, mapping and remapping choreographically movements through movements of rupture which reverberate historically and reveal genealogies. The dance lived and perceived from other places. The Judson Dance Theatre was born from a course directed by Robert Dunn in the 1960s. John Cage, a co-worker of Merce Cunningham (who also studied with Anna Halprin), invited Dunn - who was a musician, not a dancer - to offer this course for composition at Cunningham’s own studio, located in the Living Theatre building. The name Judson Dance Theatre came from an action from the group of new choreographers who attended the course when, in the summer of 1962, the group sought for a place to perform their experimental piece in the shape of a concert and they were hosted by Judson Memorial Church, a liberal Protestant congregation located at Washington Square, Greenwich Village (BANNES, 1993, p. xi). Within the class processes, Dunn used in his work references of the chance method (método do acaso – as it became known in Brazil)14, work that Cunningham developed from 1951. This process of chance, after the dancer and choreographer read The Book of Changes (I Ching) and become an adept of Zen Buddhism, under Cage’s influence, is one of the most relevant points of his work: “ choreographed phrases previously composed would be submitted to a raffle, through the I Ching, through coins and other means, to decide in which 14 In English the method was known as chance operation (WOSNIAK, 2010).
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order they would succeed, what their rhythmic pattern and duration would be, how many and which dancers would be assigned these phrases and how to distribute everything in space “(AMORIM, QUEIROZ, 2002, 8889). In this simultaneous view of moving bodies, there is no central focus, except where the viewer, if not absorbed by the total effect, focuses on each moment. [...] [...] The term event, coined by Cunningham, designates pre-choreographed dances sections, which, by raffle, have their parts trimmed, reordered and ‘sticked together’ so that in each performance a self-sufficient repertoire is formed in a unique way. Due to the possibilities of chance and randomness procedures, one event is never the same as another (WOSNIAK, 2010).
Playing with the possibilities of bodyspace composition in several dispositions and times, with changing relations, deconfigured the certainties and implied another state of these bodyspaces involved in the performance act (interpreter-creators, technicians and audience). Dunn’s course, therefore, has already begun influenced by these shifts of thought-action that were being experienced. The first five students were Paulus Berenson, Marni Mahaffay, Simone (Forti) Morris, Steve Paxton and Yvonne Rainer (BANNES, 1993, p.7). Steve Paxton, a native of Arizona, studied with Cunningham, Marta Graham, Doris Humphrey and Jose Limon. About the time he was in Dunn’s course, Steve considers: The work that I did there was first of all to flush out all my ‘why-nots’, to go through my ‘why not’ circles as far as I could until getting bored with the question. ‘Why not?’ was a catchword at that time? It was a very permissive time (PAXTON, 1975 apud BANNES, 1993, p. 9).
This mode of action-thought unveils a creative attitude towards dance practices, starting from entirely experimental processes. Why not try it, why not do it, why not take the risk? In spite of the solid references, the experience and the possibility of detaching oneself from specific rules and formats of any order (technical, creative, formative) brought to Paxton a freedom of bodyspace action that could enlarge the spectra of creation and generate knowledge production with basis in the artistic making itself. 95
Risk. (Air) risk. I risk the air, the other, between one and another. Weight and gravity, horizontalized. I redress the space and resist; fast vertical body. Suspended, I create another time, I connect; in a moment, me, in the next, the other, different sings, different corners. Not surprisingly, from 1972, proving life on the move, the dancer and choreographer Steve Paxton began developing a movement system called Contact Improvisation. The improvised dance form is based on the communication between two moving bodies that are in physical contact and their combined relationship to the physical laws that govern their motionâ&#x20AC;&#x201D;gravity, momentum, inertia. The body, in order to open to these sensations, learns to release excess muscular tension and abandon a certain quality of obstinacy to experience the natural flow of movement. Practice includes rolling, falling, being upside down, following a physical point of contact, supporting and giving weight to a partner. Contact improvisations are spontaneous physical dialogues that range from stillness to highly energetic exchanges. Alertness is developed in order to work in an energetic state of physical disorientation, trusting in oneâ&#x20AC;&#x2122;s basic survival instincts. It is a free play with balance, self-correcting the wrong moves and reinforcing the right ones, bringing forth a physical/ emotional truth about a shared moment of movement that leaves the participants informed, centered, and stimulatedâ&#x20AC;? First definition by Steve Paxton et al., 1970, of CQ, Vol 5: 1, Fall 1979. http://www.contactquarterly. com/contact-improvisation/about.
It is noticeable, based on the definition that Paxton outlines about the 96
system of motion he produces, that concepts of mechanical physics about bodyspace are studied as practice. Becoming aware of how the body selforganizes itself to survive is one of the points of explorative action. The “small dance” (stand or small dance) enhances the perception of micromovements that we do to keep us standing in a proprioceptive exercise. It consists in finding a comfortable standing position and pausing, only identifying the movements generated by the body to remain in that position and how constant these changes are even in apparent pause. Within a kinaesthetic exploratory field, paths between horizontality and verticality and their possible displacements are also studied, focusing on falls and rollings. The understanding of how the body slides or rolls after a fall, to seek greater absorption of impact is, in this case, based on Paxton’s influences on the martial arts, especially Aikido, whose main action is the quest for the neutralization of external attacks by means of a defensive character. Rolling and sliding are also used in the dialogue with the partner, from a spot of contact. Through this spot, also, mutual support is sought (I support the other at the same time that I am supported and in which both are supported by the ground). This place of contact is not just about hands. Hands serve as a supporting tool, but they are not central elements in established relationships. By the exchange of weights and the understanding of principles involved in the realization of liftings, in corporeal-spatial perception, the possibility of identifying two organisms in one is created. Finding bases in positions of alignments and motions in spirals, redoubling attention to the body as a whole, expanding the capacities of perceived bodily-spatial adjustments in the “little dance” and understanding the individual adaptive possibilities and these individuals in relation expand the three-dimensional power created by the movement. The listening and availability of bodyspace are fundamental for the activation of movement and interlacing with the other. The Ouiji dance collaborates to sharpen this listening process and provides immediate changes in the moving relationship based on subtle changes of pressure15. It is noticeable how bodyspace begins to get articulated from another 15 These references on technical issues of contact improvisation can be found on the website: http://www.bodyresearch.org/contact-improvisation/fundamentals-of-contactimprovisation/.
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point of view. The frontal and vertical relations strongly emphasized in the ballet dissolve. Modern aesthetics demarcated mainly in the Isadora Duncan dances (movements initiated by the solar plexus with continuous flow), of Marta Graham (with focus in contraction and release), of Doris Humphrey and its successor Jose Limón (with focus in falls and recoveries) are questioned and reviewed. The movement creates greater probabilities of trajectory, it can arise and end at any point of the body, it articulates and disarticulates itself. Contact Improvisation, like many other avant-garde performance arts that emerged during the 1960s and 1970s, challenged existing assumptions about the spatialities of both the performance and performancespaces. Whereas ballet choreographers have traditionally focused much of their attention on the visual appearance and ‘spatial design’ of dancers’ movements, subjugating the role of touch, sound and kinaesthesia to the lines and shapes viewed by an audience and framed by a proscenium arch, contemporary avant-garde and experimental performers have focused much more on the kinaesthetic sensibilities, experiences and spatialities of embodied performance practices, where the doing and the process of performing may be deemed more important than viewing a performance. The focus is on dance as a processual, embodied movement practice which brings about ‘transformations in movement space’, engaging ‘the whole of the senses in bending time and space into new kinaesthetic shapes. (MERRIMAN, 2010, p.430)
This way we may notice that the mastery of forms begins to give place to the mastery of senses, which generates forms in which the body is perceived beyond its visible physical structures. Simone Forti, for example, develops sensory and kinesthetic aspects in her work. In her path, she had Merce Cunningham, Anna Halprin and Marta Graham as references. The dancer goes through different periods of her artistic work, which begins with minimalist constructions, followed by studies on the movements of animals. In the last two decades, she began to structure a work that she still develops, called Logomotion, an improvisational narrative dance, whose core is to find the connection between the movement and language awarenesses. Her creation always brings everyday aspects (observation of movements and 98
subjects of everyday life) and the relation with nature and, in this sense, the body is always understood as a theoretical/practical unit. In the interview given to Patrick Steffen, published in the magazine Contact Quaterly (https://community.contactquarterly.com/journal/view/onallfours), Simone Forti says: When I first moved to Vermont, where I lived for 10 years and did a lot of gardening, a lot of my moving and talking had to do with the garden and with the politics of the garden. For instance, oregano. It’s very aggressive; it will take over and it will kill everything around it and become bigger. Mint and chamomile do it too. There are many plants that want to take over. So if you plant them next to each other there are battles. That was very interesting! When you are working in the garden, you have time to daydream, so I had a lot of thoughts about politics, about what was happening in the world; it would come to me while I was digging out the potatoes! And so I would mix those thoughts together in the performance and there is something realistic about how thoughts come. Today I like to say “body-mind-world.” […] So I try to work in a language that reflects both the rational and the kinesthetic suspicions, intuitions, fears…
Clearly, Simone Forti’s speech and work illuminate a discussion on bodyspace, unfolding the complexity of the subject. From my point of view, the relationship with nature (plants and animals, for example) and its political perception does not appear in her work as a metaphor but as the very act of becoming physical of what is perceived as bodyspace. In this sense, there is a whole change of paradigms that, as we have seen, had already been constructed since Laban, Duncan and Anna Halprin, in which this body that moves and dances begins to take responsibilities which broaden its aspects of action before society. There is no body apart from space. The individual does not watch the changes occurring. Each one is part of the changes in the collective scenes that are organized as bodyspace, acting and suffering the actions. The engagement is direct. Dance Constructions (1961), for example, presents a series of choreographies that reorient the body in a variety of ways: using the body itself to climb (Huddle), ropes hanging from the ceiling (Accompaniment for 99
La Monte’s 2 Sounds, La Monte’s 2 Sounds and Hangers), sliced wooden board with ropes to keep the bodyspace inclined (Slant Board), boxes (Platforms), pan with nails (Sensor)16, see-saw (See-Saw), and wooden boxes which work as small cars dragged by rope (Rellers). From where I see, how I see, what I see. Do I see? Perspective, glide. Inclined body, body in (un) balance, disarmed body, crossed body. Suspeeeeeennnnnded body I think. Contemporary of Forti, Yvonne Rainer, who also studied with Graham and Cunningham, is markedly influenced by the contact with the work of John Cage, from the Judson Dance Theatre, and, as a result, also began to work based on minimalism and tasks which seek to integrate everyday movements with dance vocabularies. The mind is a muscle is one of her best-known works. The Mind is a Muscle combined some new work with pieces that had been tested in performance already, including a number of variations built from Rainer´s most well-known dance sequence, Trio A. Trio A has served as a kind of backbone to Rainer’s dance practice since it was first performed as The Mind is a Muscle, Part 1 at the Judson Church in 1966. The approximately four-and-a-half minute piece (its exact timing depends on who is performing it) comprises a sequence of movements that are without phrasal segmentation and so appear to be continuous in motion, without still moments of registration. The choreography persists in a perpetually unpredictable manner, deliberately refusing familiar dance patterns that rest upon arcs of development and climax (WOOD, 2007, p.4).
16 Some of these works can be seen at: http://www.claragraziolino.com/es/installaciones/ 1961-simone-forti-dance-constructions-2/ and the structure thought for them can be found in the book Simone Forti: Thinking body.
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Trio A17 was a short dance with a long phrase of movement and the tasks that guided such phrase were: the distribution of energy, the emphasis on the approximation between movement execution and neural perception and the absence of interaction with the audience. The tasks made every movement avoid visual contact with the observers through the movement of the eyes or the head. Again, the body is reconfigured into other patterns and based on new procedures, creating other levels of relationship and contact through movement. A year earlier, in 1965, Rainer had already announced a shift in the way of doing/thinking the dance, when she wrote her famous manifesto of the no, which contributed to the rupture that was taking place at the time. Her manifesto said (http://www.1000manifestos.com/yvonne-rainer-nomanifesto/): No to spectacle. No to virtuosity. No to transformations and magic and make-believe. No to the glamour and transcendence of the star image. No to the heroic. No to the anti-heroic. No to trash imagery. No to involvement of performer or spectator. No to style. No to camp. No to seduction of spectator by the wiles of the performer. No to eccentricity. No to moving or being moved.
Through this manifesto, Rainer tore up the boundaries of dance and made room for other modes of thought and action, which included the possibility of thinking of non-movement as movement, as dance. And, as we have seen, in the 70â&#x20AC;&#x2122;s we would notice the number of existent movements in the pause, as can be seen in the already mentioned small dance, proposed by Steve Paxton. With a provocative and questioning act of the existing social norms, Rainer made of its own corporal space a political discussion, when in the 17 The Trio A video can be watched at: https://www.youtube.com/watch?v=TDHy_nh2Cno
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eighties she became celibate and a feminist activist, for years later declare herself as homosexual. In the previous decade, from Yvonne Rainer’s dance company and her play Continuous Project - Altered Daily emerged The Grand Union, a dance improvisation group that lasted from 1970 to 1976 and featured Barbara Dilley, Douglas Dunn, David Gordon, Nancy Lewis, Steve Paxton (in this context, he created Contact Improvisation) and Trisha Brown. Many of the proposals that revolutionized the thought about body and movement, which have reverberated so far in dance theories and practices, occurred in this period. Trisha Brown, who at that time became strongly known for using various spaces in her creative productions, performed important experiments primarily focused on the study of gravity and body weight. In her most recognized work, called Early Works (1963-75)18, the dancer and choreographer used buildings, galleries, urban and natural spaces, expanding discussions about the body. In Man Walking Down the Side of a Building19, 1970, a person comes down walking on the sidewall of a building, from the top to the floor, perpendicular to the ground. Body vertigo. Perceiving the body upside down, walking horizontally in a building (or rather, walking horizontally as a building), completely alters its position and its relational perspective. In artistic residence experienced with Julyen Hamilton in 2010 in different spaces in Banyoles, Spain, he said: “To learn to roll, you have to be generous to understand that you will not be on the top all the time. There will be times when someone else will be on top and you will be underneath.” Julien’s words inspire a political thought about the conditions that the body delineates in movement, in dance, and on how perspectives alter one’s perception. Once again, we understand that, beyond the creation of metaphors, what we see here is the physicalization, through poetic structures, of the actual political relations under discussion. Fall and recovery; touch devices 18 You can view images of reperformance of this work at the following address: https:// www.youtube.com/watch?v=TCQhi_7xa9s 19 You can see images of the reperformance of this work in 2013 at the following address: https://www.youtube.com/watch?v=1wUI7CL5jaY
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based on contact improvisation, from a mutual affinity; immobility in mobility and mobility in immobility; the perspectives of displacement; the understanding of center and periphery, absence of center, multiplicity of functions, focus and unfocus, appearance and disappearance, activation and cession. Moving issues. Bodyspace in continuous action. In this context, thinking bodyspace as separate elements makes no sense. As Mark Tompkins points out in an interview given to this research in July 2015, (TOMPKINS, 3m55s, archive 1): Body separate from space? Are you kidding? (laughs) It makes absolutely no sense. NO SPACE, NO BODY! NO BODY, NO SPACE! It’s always bodies in space that make a composition. When you perform, the first thing is to see where you are, to read the space and the potentials and to keep scanning and acting until the end. There is never a body without a space. It’s unconceivable.
From this bodyspace in movement, it may be possible to embrace Ebeling’s concept of space as the inorganic extension of human skin: Instead of being surrounded by space, the living subject becomes space. It is as if the figure of Vitruvius was not inscribed but coincided with the macrocosmic circle. In essence, there is no difference between microcosms and macrocosms; the figure is cosmos. While the skin normatively demarcates the interchanges between the interior and the exterior, the Ebeling membrane knows no such distinctions; is a permeable boundary. Everything becomes part of a larger animated continuum that is released to create new wrappings beyond the body and buildings (PAPAPETROS apud AVILÉS, 2015, p.17). 20
Although Ebelin was one of Laban’s students, his thoughts instigated us to think of the explosion of the kinesfera, so that bodyspace advances 20 Translation under my responsibility, from the original: “En el lugar de estar envuelto en el espacio, el sujeto viviente se transforma en espacio. Es como si la figura de Vitruvio no estuviera inscrita sino que coincidiera con el círculo macrocósmico. En esencia, no hay diferencia entre microcosmos y macrocosmos; la figura es cosmos. Mientras que la piel demarca normativamente los intercambios entre el interior y el exterior, la membrana de Ebeling no conoce tales distinciones; es un umbral impermeable. Todo pasa a formar parte de un continuo animado mayor que se libera para crear nuevas envolventes más allá del cuerpo y los edificios”
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in the proposition of new orders and new senses. This is the conceptual proposal defended in this text and based on which the presentations on the ways of thinking/doing improvisation and composition in real-time in Contemporary Dance were developed in this research.
Real-time composition in dance: the experience of the act Dance is an on-site event. Although registered in video or in photography, it needs the face-to-face act in order to exist. Especially in the twenty-first century, when technology, primarily through social networks, completely changes the modes of relation and interaction between people, virtualizing contacts, insisting on the production and enjoyment of a face-toface act seems to be a handmade action of resistance. In May 2015, during the workshop “Working with objects within the dance-space on stage” in Berlin (Radialsystem), Julyen Hamilton pointed out the relations between absence and presence in current relational practices: today, when a person is face-to-face with someone, he/she is constantly checking emails, WhatsApp messages and Facebook, searching for those who are not around. It is a constant check of absence. Relations, therefore, are fragile and unstable and the senses of presence change. It is a constant presence-absence and absence-presence. The body is in two or more places at the same time (presence and virtual), which may also lead us to be nowhere metaphorically. Although it acts in multiple places, it is not allowed to experience any of these places and slides over them superficially. As a bodyspace, on the one hand, this new way of relating (no longer so new) generates a greater freedom of displacement, because stability tends to cause us to be static. On the other hand, fragility frequently brings with it a state of tension, due to the great amount of information it promotes, generating new momentary chain actions, which presents surprising factors. To put something in tension is to make it susceptible to dissolution. In fact, this is what the etymology of the Latin verb tendere already expresses. Here, tension (of tendere) is originally “to have duration (of time), to stretch, to extend”. That which stretches, which expands, therefore, does not hold definitively, is “tenuous” (DE OLIVEIRA, 2004, p.10). 104
Contextualizing the etymology of the word tension in the present time, we realize that the stretching times are getting shorter. Nothing extends for a long time in society, therefore, dissolutions happen more quickly. How to produce knowledge based on this, if information continually dilutes the other? How to carry out research, which presupposes deepening and long study extension, at the time of dissolution practices? How to deal with a face-to-face dance practice in a universe of absentpresences? Some of these issues are presented in this text, which does not intend to answer them, but to problematize them in order to collaborate with possible reflections. Contemporary dance improvisation can deal with this field of tension and conflict. Therefore, improvisers must insist on constant experiential practices, so that they are able to deal with the tension created by the unknown at the time of artistic production, which is a practice considered ephemeral. In the etymology of the greek word Ephemeros, we can find the meanings of Epi, which means “about,” and of Hemerai, which corresponds to the “day”, about the day. Something that only exists one day. At the same time, improvisation requires study, attention. A full quality of attention, experienced face-to-face. The word attention comes from the latin attentio, -onis, which means application, effort, care. The word care comes from the latin cōgitātu-, and is linked to reflection, to thought. Something that requires reflection and thought also requires investigation and deepening, which requires constancy and time extension. Here a paradox arises. In fact, the very act of writing about improvisation, in a non-improvised way, is already a paradox itself. Improvisation, therefore, is something that occurs in the present time (here and now), which is increasingly fast and unstable, but based on a field of knowledge that has been built over time, that is, grounded in questions that, in a sense, makes them stable as support in the experienced bodyspace, lasting in time. The latin word to last means exactly “resistance to time.” Can anything be ephemeral and enduring at the same time? 105
Roupnel’s intuition states: 1. The absolutely discontinuous feature of time. 2. The absolutely punctual feature of the instant. Therefore, Roupnel’s thesis accomplishes the most complete and most straightforward arithmetic. The duration is nothing more than a number whose unity is the instant (BACHELARD, 1999, p.35). 21
From the moment the movement is established in its ephemerality in the body, it produces a change. This change is permanent, in the sense that it has been performed and cannot be changed. It is possible to propose a new action, but you cannot modify the previous one. A choice was made and, among many possibilities, one was chosen. As Roupnel suggests, the duration is based on the moment. There is a responsibility in the decisionmaking. For a follower of Roupnel, an act is first of all an instantaneous decision and this decision is the one that carries the whole load of originality [...] [...] to feel the moment, we must return to the clear acts of consciousness. [...] we will see that life cannot be understood in a passive contemplation; to understand it is more than to live it, to truly propel it (BACHELARD, 1999, p.20). 22
The word “decision” comes from “cut”, “scission” (de + cision). So, once a decision is made there is a split, a definition.
21 Translation under my responsibility, from the original: “La intuición temporal de Roupnel afirma: 1. El carácter absolutamente discontinuo del tiempo. 2. El carácter absolutamente puntiforme del instante. Por tanto, la tesis de Roupnel realiza la aritmetización más completa y más franca del tiempo. La duración no es sino un número cuya unidad es el instante”. 22 Translation under my responsibility, from the original: “Para un seguidor de Roupnel, un acto es ante todo una decisión instantánea y esa decisión es la que lleva toda la carga de la originalidad. […] […] para sentir el instante, nos es preciso volver a los actos claros de la conciencia. […] veremos que la vida no se puede compreender en una contemplación pasiva; compreenderla es más que vivirla, es verdaderamente propulsarla”.
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Scar cutting the flesh that ceases the curve that shrinks the corner creating a falling cyst. A choice then eliminates a number of other possibilities and modifies the body space permanently. Julyen Hamilton, during the same workshop already mentioned in Berlin, said: “You choose the movement you produce. You produce one movement and not another, and therefore there is no freedom in that.” Each choice, each scission determines a path and brings refinement in its own development (scrutinizing, disassembling, reassembling, reinventing, etc.). The place of scission, however, is quite different from the place of dissolution. That is, at the same time that improvisation deals with constant tension and dissolution, because it is influenced by the speed of information received by the bodyspace, it also deals with the decision that is provoking a permanent change; it is a cut in time based on the bodyspace. Each choice is deep and takes on responsibilities as it establishes another relational field. Therefore, a new decision can be made, causing new changes, but this scission is based on the consciousness of the act or, still, on the consciousness of the consciousness of the act. Keeping oneself just in tension and dilution can lead to a lack of clarity and a suppression of decision-making. Improvisation, therefore, seems to pursue more attention in the clarity of decisions than the tensions and dilutions it provokes. The tensions and dilutions seem to be directly linked to the rapid production of information, without having time for a digestion or reflection on what is produced. The decisions seem to be more linked to the production of actions, based on a cut from a conscious process, although immediate. It seems that here it is necessary to make a distinction between production of actions and production of information. From the Latin informatio, onis the word “information” means to conceive an idea, whose etymological root, eidos, that is, image. However, the word “action” derives from the Latin actio-onis and it has as meaning acting; act; effect; work. The improvisation, although it generates images, happens, previously, in the act. As we all know, improvising is distinct from composing in real107
time. Improvisation does not necessarily requires an audience. Composition in real- time does. In this sense; composition in real-time is the art piece itself. It is not so much linked to a field of ideas, which will not become action, but to action itself as a field of knowledge. In psychotherapy and even in education one thing is clear: what move the person is not abstract ideas (sic) but the lived experience. Ideas (sic) can open up paths, but taking steps along these paths is a matter of experience. Ideas (sic) can also institute misconduct we know that. There is undoubtedly a great and sometimes arduous work to be done in the world of ideas (sic). But it does not replace experience, direct experience; it integrates with it, that is the true (AMATUZZI, 2007, p.8).
Improvisation also does not happen based on the production of ideas, but through the concrete action of the body that, reflecting on itself in real-time, writes movements which provoke imaginary senses. “[...] Experience is first experience, not ideas or words. Therefore, to be able to say something of the experience, the thought has to create. It has to be invented to be said in another plane (that of ideas and words) what only happens by living “(CONTRERAS; DE LARA, 2013, p. 37)23. The bodyspace acts through the movement, causes a scission, and with this split ideas and tensions can emerge, but for the scene to sustain itself as a poetic proposition, it is not based on ideas and tensions that are constantly diluted, even though the scene will establish a dialogue with these ideas and tensions. The word “movement” comes from the latin movere and means to move, to displace, to set in motion. In the first half of the nineteenth century, it also began to be used to define a group that aims social or political changes. The action of writing the movement, therefore, occurs in the doing itself. Movement itself causes change it is action itself. In his course “Evolving technique and making dances”, at New Dance Studios in Amsterdam (January 05-16, 2015), Julyen Hamilton pointed out: 23 Translation under my responsibility, from the original: “[...] la experiencia es en primer lugar vivencia, y no ideas o palabras. Por eso, para poder decir algo de la experiencia, el pensamiento tiene que inventar. Tiene que inventar para decir en otro plano (el de las ideas y las palabras) lo que sólo acontece viviendo”.
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Thatâ&#x20AC;&#x2122;s the movement, now. You will not work to improve it later. In improvisation one needs to be agile to celebrate the movement. Each movement is exactly what it is. There is no movement, which prepares the other. Otherwise you are discrediting what you are doing. Each movement is emotional, because each movement comes from the space that I am allowing to transit. If you turn your head subtly to the right everything changes. 24
According to such thought, improvisation is based on the fact that one learns it in the very act of moving. Not before and not after. This does not mean that improvisation does not require study. On the contrary, what Julyen proposes is that there should be such a great refinement of meticulous study of action that every movement must be carried out with seriousness and depth in real- time in order to provoke a reverberation. Each movement has its importance and its responsibility. In the case of the real-time composition, a subtle modification of the position of the body on the scene causes a large change in reception. There is no time for reflection before or after the action. Observation, reflection and reception occur in the action itself, that is, they are immediate actions that happen within another action, which is movement. It is necessary to instantly analyse what is being accomplished and take responsibility for that action. In this sense, Julyen Hamilton argues that improvisation is not bound to freedom, since with each choice made, it is necessary to delve into each one of them, deepening and assuming its decision. While we choose something, a number of other options are eliminated. Being aware of the decision and body in motion within the context in which it is inserted is dangerous, because it is the place where everything becomes relevant. When we refer to the word everything, we do not consider everything in the plural, but in the singular, that is, every thing, every movement. When one is not aware of oneâ&#x20AC;&#x2122;s body, one becomes naive. For example, when you are in a city that you do not know, everything is strange, because you do not know the risks you are running, the places that are dangerous or not, and you are not aware of the social rules. When one becomes conscious, one loses naivety and gains responsibility. Awareness raising generates another bodyspatial implication, with notion of risk, responsibility, and active acting. This 24 Notes carried out in real-time during the course.
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determines the kind of experiential relationship that will be established. Improvisation is not naive. You have to know the context, take risks and make conscious decisions. “Those who take risks are the ones who open new worlds, discover new ways of being human, new ways of behaving and discover new things about the world” (MARK WRATHALL, 1:33)25. One must be aware of being conscious and go beyond experience to not be paralyzed only in the first sensation it brings. Experience also requires responsibility and deepening. It is crucial to notice how the absence of consciousness can create confusion. In his course “The space issue”26 in Carthago Delenda, Brussels (March 16-20, 2015), Julyen Hamilton approached this matter by making a connection with the process of learning a language: In learning a language, for example, there is a moment of disorientation when it is still unknown. The language becomes several sounds gathered and blended into a musicality. When the learning of each sound occurs, one can separate the basics and the confusion ends. Each element has its place and can link to another27.
The pronunciation of a word is concrete, for there are letters and sounds in it. This is reality. But the reality produced by each person will have a reading through his or her own perspective, experience and subjectivity. Although concrete, words are just words. They are part of a speech coded by a language for a collective organization. If you do not have the code, they will have no meaning to you. The meanings of words are inventions that have been adopted and repeated over time by a particular culture and, while we do not know them, we can even imagine other possible meanings that could be attributed to each word. The Belgian René Magritte (1898-1967) was an artist who provoked reflection on the use of words and their possible alternation of meanings. Even recognizing the meanings of words in their own language, he shifted them in his creative proposition, stimulating the questioning about the connections between image and word. 25 BEING IN THE WORLD. Direção: Tao Ruspoli. NY: Magusta Productions, 2010. 1 DVD (80 min), color. 26 Translation under my responsibility: “A questão espaço”. 27 Notes carried out in real-time during annotation made in the course.
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The matter of the incongruous appearance of the artist was whether words in actual use truly represent what one does not believe. Thus, in The Key of Dreams (1972)28, a picture divided into four compartments, a bag is subtitled “The sky”; a razor, << The bird >>; a leaf of a tree is subtitled as << The table >>. But the fourth image, which represents a sponge, carries the caption of “The sponge”. In the living mirror, there are bubbles or clouds in the style of comic strips, with words or phrases: << character exploding with laughter >>; << horizon >>, << closet >>, << cries of birds >>. From one painting to another, two types of approach to the phenomena that the painter wanted to illustrate, as well as two perceptions demanded from the spectators of his works. In The Key of Dreams, fully recognizable objects face each other in a definition that does not concern them: in current language, the razor is not called << bird >>. Only one of the objects represented carries the usual name: the sponge. Here the desire to disorientate with images is well presented if they are in reference to the usual meaning. [...] More than painting, this is a matter of language. One word for another, a word for another distinct image that one expects, one or several words to suggest an image that is not represented. [...] [...] Demolition of current ideas: this is exactly the purpose of the Key of Dreams, which shows objects defined by words that do not correspond to them. Establish very safe definitions: the poetry brought by images should replace the literal reading of these. What matters is not what the picture shows, but what it suggests. Rebuilding a language: the proximity of unexpected objects, imbricated or not by written words paradoxically creates other meanings applied to things that at first sight seemed obvious (MEURIS, 2007, p.127). 29 28 An image of the work can be found at: http://obrarenemagritte.blogspot.com.br/2011/01/la-clave-de-los-suenos-1930.html 29 Translation under my responsibility, from the original: “La cuestión en apariencia incongruente que planteaba el artista era saber si las palabras, en su uso corriente, representan verdaderamente lo que uno no cree. Así en La clave de los sueños (1972), cuadro dividido en cuatro compartimientos, una cartera lleva por subtítulo <<El cielo>>; una navaja, <<El pájaro>>; una hoja de árbol va subtitulada como <<La mesa>>. Pero la cuarta imagen, que representa una esponja, lleva el subtítulo: <<La esponja>>. En El espejo viviente, hay burbujas o <<nubes>> al estilo de las tiras cómicas, con palabras o
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This changes reality and builds a new one. It multiplies realities and make them change through awareness, which occurs individually. In the case of language, awareness is given by learning a vocabulary, a grammatical system, and the interpretive and meaning-making capacities. This is how the composition is organized. In the case of writing words, reading and reflection take place after the production of the writing action. Words are seductive, because they fly and go to other places, they spread, are used, reused, interpreted, invented, reinvented, distorted. They bring comfort and a sense of continuity, a sense of eternity to its capacity for perpetuation, especially in written language. Every action, before being collective, is individual. However, writing is most commonly triggered in an individual way only. As a gesture, it runs the risk of being egocentric if carried out for self-perpetuation. But even if it is based on this risk, it is something of the body materialized in an object (book, article, poem, etc.). In the act of writing, there is a decision-making, in which a concrete universe is created, in which there will be concordances and disagreements, incorporations or distances. From decision making and registration, one person creates space for the other to make their own decision. However, words can also be used for false discursive compositions, based on a rhetoric that aims to manipulate others. Such words are often organized for the maintenance of hierarchical powers and structures and often disconnect from practical doing. Based on repetition and suffocating in its’ own conditioning defined as vocabulary, words can create immutability frases: <<Personaje reventando de la risa>>; <<horizonte>>, <<armario>>, <<gritos de pájaros>>. De un cuadro al otro se manifiestan dos tipos de aproximaciones a los fenómenos que el pintor quería ilustrar, así como dos percepciones que exigía de los espectadores de sus obras. En La clave de los sueños, los objetos totalmente reconocibles se enfrentan a una definición que nos les concierne a priori: en el lenguaje corriente, la navaja no se llama <<pájaro>>. Solamente uno de los objetos representados lleva el nombre habitual: la esponja. Ahí se aprecia bien la voluntad de desorientar con imágenes en referencia al sentido habitual. […] Más que de pintura, se trata aquí de lenguaje. Una palabra por otra, una palabra por otra imagen distinta a la que se espera, una o varias palabras para sugerir una imagen que no está representada. […] […] Demolición de las ideas corrientes: ése es exactamente el propósito del cuadro La clave de los sueños, que muestra objetos definidos por palabras que no se corresponden con ellos. Establecer definiciones muy seguras: la poesía aportada por las imágenes debe sustituir a una lectura literal de éstas. Lo que importa no es lo que el cuadro muestra, sino lo que sugiere. Reconstruir un lenguaje: la proximidad de objetos inesperados, imbricados o no por palabras escritas, crea paradójicamente otros significados aplicados en cosas que a primera vista parecían evidentes”.
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in sociocultural positions, even though they may produce utterly contrary discourses to convince a non-existent practice. According to Jorge Larrosa: As José Luis Pardo said, “to access the language we have to speak a language, and speak it from within, with our own voice and with our own language. And that makes the words leave us a residue on the tip of the tongue, a taste of the mouth (sweet or bitter, good or bad), which they let us know (they give us to taste). So, although language has rotted us, most people do not realize it, do not feel nauseous and do not feel sick: because they lost their language, because they do not have or never had a voice of their own, a language of their own, because only thus, without language, one can speak, without disgust, a rotten language. […] [...] To Lord Chandos first the great words become impossible, those, which are so abstract, so general, so solemn, so lying, so grandiloquent and so empty. Maybe they realize they no longer want to say anything, being so vain and so swollen. Secondly, it becomes impossible the judgments on general matters, on matters of court and parliament, on everything that, according to this artificial construction called “actuality”, should be important. Perhaps the words may perceive what these judgments and opinions have of precipitate, artificial, conventional. Perhaps the language without the language of journalists, experts, politicians and officials, of those who manufacture the present, the “present”, and the owners of “actuality” can be felt. Thirdly, banal judgments also become impossible, the ones that occur automatically and without thinking about everyday conversations (LARROSA apud CONTRERAS, DE LARA, 2013, p.96). 30 30 Translation under my responsibility, from the original: “Como disse José Luis Pardo, ‘para acceder al lenguaje tenemos que hablar una lengua, y hablarla desde dentro, con nuestra propia voz y con nuestra propia lengua. Y ello hace que las palabras nos dejen un residuo en la punta de la lengua, un sabor de boca (dulce o amargo, bueno o malo), lo que ellas nos hacen saber (nos dan a saborear)’. Por eso, aunque el lenguaje se nos haya podrido, la mayoría de la gente no se da cuenta, no siente nauseas y no se siente enferma: porque ha perdido la lengua, porque no tiene, o nunca ha tenido, una voz propia, una lengua propia, porque solo así, sin lengua, puede hablar, sin asco una lengua podrida […]. […] A Lord Chandos primero se le hacen imposibles las grandes palabras, esas que son tan abstractas, tan generales, tan solemnes, tan mentirosas, tan grandilocuentes y tan vacías. Tal vez se da cuenta de que ya no quieren decir nada, de tan vanidosas y de tan hinchadas. Segundo, se le hacen imposibles los juicios sobre temas generales, sobre los asuntos de la
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It becomes clear, therefore, how words can be organized for the production of an eloquent discourse that empties itself or for the emission of judgments of inconsistent values. Both do not start from an experiential practice, but from a set of ideas thrown to the air that aims, in fact, to camouflage the absence of this practice, creating an illusion about it. In addition, they can produce the illusion of a practice. The film Exit through the Gift Shop31, produced by Banksy, seems to us an interesting example of how the manipulation of words can create a reality based on a fiction. The film tells the story of Mr. Brainwash, a graffiti artist who builds his career and fame before actually producing any kind of artwork. The lies told by the protagonist of the film make of him a celebrity. The complexity of the manipulative layers contained in the discourse expands, creating a hyperreality, which reaches the borderline situation on the day of the vernissage of its first individual exhibition - of megalomaniac proportions - there is a row of people waiting for the gallery’s gates to open, while there was still no exposure within the site. And in exposing his work in public, the layers of discourse overlap between themselves, as new discourses of public enjoyment are created based on the supposed work that was not intended as a work. The architecture of discourse is built on a collection of overlapping voids, which fills a place. The work is created based on a lie (or the production and manipulation of a supposed truth: resemblance), which does not expose failure, but put some makeup on it. Mr. Brainwash, despite not being prolix, knows how to use the words and manipulates it to create a reality, based on what his own pseudonym suggests: a brainwashing. Rhetoric can give an appearance of depth to superficiality. In this way, it is possible to maintain territories of power, simplified schemas and lack of reflection, because they are discourses that do not consider the other in dialogue, which do not create space, although corte y del parlamento, sobre todo aquello que, según esa artificiosa construcción llamada “actualidad”, debería ser importante. Tal vez percibe lo que esos juicios y esas opiniones tienen de apresurados, de artificiales, de convencionales. Tal vez siente ahí la lengua sin lengua de los periodistas, de los expertos, de los políticos y de los funcionarios, de los que fabrican el presente, de los “actuales”, de los dueños de la “actualidad”. Tercero, se le hacen imposibles también los juicios banales, esos que se dan automáticamente y sin pensar en las conversaciones de todos los días”. 31 EXIT THROUGH THE GIFT SHOP. Direção: Banksy. Madrid: Avalon, 2009. 1 DVD (88 min), color.
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they make it seem otherwise. It is fundamental to understand how these discourses guide the knowledge about what is proposed as reality and actuality, determining some absolute truths, almost always incontestable. He weaved the words like a patchwork quilt. He set the web and hoped for it to fall apart. Regarding dance, specifically in real-time composition, how does the process of writing the movement take place? The speech of the word is not the body. It’s part of it. The body is discursive, however, it is not just the words that compose this discourse. It is not just the words that determine the text of the movement. According to Ferlosio: [...] dance is similar to a text [...]; and this similarity seems so important to me in an institution as dance, so connected to its way of proceeding and its meaning, that where the text is missing, I deny that there is dance. It must be one of the most essentially textual things that probably is, even the first text that has existed, much earlier, perhaps, than the language texts themselves of mnemonic depository, and, more of course, than the << Carmen Arval >> writings; and perhaps it was the mother of the first ones - because it had given space to the idea of literal conservation, by another more direct participation, as to have associated a verbal composition to its own deposit - and consequently of what the text is. A proof of the dance textual tenacity would be the fact that the earliest known Latin text is precisely the verbal staff of Mars dance, the famous << Carmen Arval >>, dating back to the seventh century BC, although known only by a transcription of the second century AD (FERLOSIO, 1981, p.210). 32
And he keeps going: But I do not want in any way to unify the verbal text concomitant to a dance with the text of the dance itself, which are movements that constitute it; on the contrary, 32 Translation under my responsibility, from the original: “[…] la danza tiene carácter de texto […] y ese carácter me parece tan importante en una institución como la danza, tan ligado a su modo de proceder y a su sentido, que donde falte el texto me niego a que
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I am interested in contemplating the different modes of relation that can exist between the two texts (FERLOSIO, 1981, p.210). 33
Referring to text and discourse, in the context of Contemporary Dance and real-time composition, is far beyond thinking only of the use of the word as movement, in the description that seeks a kind of dance record or in the “literal” description of what is produced with the body. In dance improvisation, the process of discursive writing occurs in the body itself, in the present moment, and in real-time composition it occurs on the scene, with the presence of the audience. The solution of movement and the action of movement are in the body itself, in the here and now. The solution and action of movement may or may not involve the verbal word, but in both cases, there is text writing and discourse produced by the friction between decision and image. In addition, the act of improvising can be collective in countless situations. However, collective decisions are made on the basis of individual decisions within that set. The decision is individual, but the act is collective, so the individual decisions must be taken in relation to the context, the whole, the other or something, in real-time. There is no time to prepare a speech or to manipulate it. Such aspect makes the improviser work on the collective in another perspective of speech and movement writing. Clarity and decision must be immediate to offer the other the possibility of decision. And the reading of what happens must also be immediate during the action itself, to develop the ability of reading the whole context and how the individual haya danza. Debe de ser de las cosas más esencialmente textuales que hay; probablemente, incluso, el primer texto que ha existido, mucho antes, quizá, que los propios textos lingüísticos de depósito mnémico y, por supuesto, que los Carmen Arval>>, escritos; tal vez ha sido incluso la madre de los primeros – ya por haber suscitado la idea de la conservación literal, ya por otra participación más directa, como el haber asociado una composición verbal a su propio depósito – y consiguientemente de lo que el texto es. Una prueba de la tenacidad textual de la danza sería el hecho de que el texto latino más antiguo que se conoce sea precisamente la pauta verbal de una danza de Marte, el famoso << Carmen Arval>>, fechado por los expertos hacia el siglo VII a.C., aunque conocido solamente por una transcripción del siglo II d.C. […]” 33 Translation under my responsibility, from the original: “Pero no quiero, en modo alguno, unificar el texto verbal concomitante a una danza con el texto de la danza misma, que son los movimientos que la constituyen; antes, por el contrario, me interesa contemplar los distintos modos de relación que puede haber entre uno y otro texto”.
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decision can influence the collective one. A decision may even include pause and silence, but this must be precise. When we deal with real-time composition, we add another layer of reading: besides the immediate reading that the interpreter-creators must have of themselves, of the other and of the context created, tuning the consciousness to the images and situations they are producing, there is also the reading of each viewer about what they see and how it relates to the fruition of the show. The bodyspace, although it experiences specific sociocultural codes, brings with it a capacity of discourse regardless of the territory in which it is. And although there are daily gestures that are established as collectively recognizable codes of language, the range of possibilities of movements transcends these aspects, and when this occurs in dance, for example, we find in western culture a difficulty of appreciation and reading the movement. In other words, although the movement is at first something inherent to the human body, in western culture, we are not used to reading movements, which can organize themselves through logic and linear systems, and/or through kinaesthetic perceptions, not necessarily linear ones. Dance places the interpreter-creator and the spectator facing this issue. In real-time composition in dance, the discourse is organized directly in real-time, and based on its clarity opens space for the other, for confirmation or contestation, for dialogue. The refinement of what is said and how it is said based on the movement is indispensable so that it does not happen in the production of random movements that also can be constituted like empty and superficial speeches. In this sense, the search for the sincerity of the movement, supported in the sensitive listening of the body and its honest dialogue with the proposed situations, is a way of orienting itself in the improvisational action, in a state of composition. From this point of view, the real-time composition process goes through a deepening of the experience in the bodyspace and of the contents that are created relating to each other, based on this experience. [...] the term experience, by its origin, means what has been withdrawn (ex) from a test or trial (-perientia); a knowledge acquired in the world of empiricism, that is, in sensory contact with reality. Experience is related 117
to what is seen, touched or felt, rather than thought. What is deduced from what is seen is not properly “experiential”, but thought. Experiential knowledge is directly produced by contact with the real (AMATUZZI, 2007, p.9).
Through this contact with the real, it is very important to be aware that the artistic proposition only happens through the reverberation provoked by this experience. There is no manipulation of speech or of this reality, and this opens space for each player to perceive this reality from his/her point of view, and not from a previous external induction (which the dancer begins to unconsciously assume as his/her own, after the convincing process). When we understand the notion of bodyspace and perceive the power that exists in the possibility of movement, regarding the transformations that it can generate, there is a risk of producing an egocentric self-reduction, in which the creator-interpreter closes in himself/herself even and falls in love with his/her own production in such a way as to disregard the other. Trusting in the material produced is necessary, but it is important not to let one drown in selfness, otherwise there is no configuration of an artistic production. The scene is the moment in which this individual experience widens its perception for the production of a joint action (between interpretercreators and between them and the audience). Joint attention [...] introduces the effects of a face-toface spell, which treats our affectivity through the inter-fertilization of communicating cross-attentions in a relationship of immediate presence of body to body. This face-to-face spell is of a different nature from the media spells that channel our collective attention because it is a scale necessarily limited by the number of participants. If it loses in extension, it gains, however, in intensity. That is why we are still going to the show (CITTON, 2014, p.154).34
It is possible that this face-to-face spell is what the Spanish poet and playwright Frederico García Lorca (1898-1936) called elf, in his lecture Theory and game of the elf: 34 Translation under my responsibility, from the original: “L’attention conjointe [...] instaure des effets d’ENVOÛTEMENT PRÉSENTIEL qui tratement notre affectivité à travers l’entre-fécondation d’attentions croisées communicant dans une relation de
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[...] the elf is a power, not an act; it is a struggle, not a thought. I heard an old master guitar player say, “The goblin is not in the throat; the goblin goes up through the insides from the bottom of the feet.” That means, it is not a matter of faculty, but a true living style; that is, of blood; that is, of very old culture, of creation in act (LORCA, 2003, p.2). 35
And later, he completes: All the arts are capable of the elf, but where they find more field, of course, is in music, dance and spoken poetry, since they need a living body to interpret them, because they are forms that are born and die perpetually and raise their contours on an exact present (LORCA, 2003, p.6). 36
The function of the artist, therefore, is to control the apparition and disappearance of this elf in the connective relation that establishes with the audience and to control the intensity of its appearance to fertilize the necessary complicity with the audience to build the work. In this sense, being attentive to the other, to the immediate perception and the listening are prime conditions for an improvisation to be configured as a scenic proposal. And this only occurs in the opening to the experience. But in what concept of experience and in what concept of listening do we base ourselves? These two words became a trend in Brazil among psychologists, artists and educators of the 20th and 21st centuries, following trends of a global thinking, especially based on research produced in Europe. These are widely repeated words presence immédiate de corps à corps. Cet envoûtement présentiel est d’une nature différente des envoûtements médiatiques qui canalisent notre attention collective, parce qui’il se constitue à une echelle nécessairement limitée par le nombre de participants. Ce qu’il perd en extension, il le gagne toutefois en intensité. Voilà sans doute pourquoi nous allons encore au spetacle”. 35 Translation under my responsibility, from the original: “[...] el duende es un poder y no un obrar, es un luchar y no un pensar. Yo he oído decir a un viejo maestro guitarrista: “El duende no está en la garganta; el duende sube por dentro desde la planta de los pies.” Es decir, no es cuestión de facultad, sino de verdadero estilo vivo; es decir, de sangre; es decir, de viejísima cultura, de creación en acto”. 36 Translation under my responsibility, from the original: “Todas las artes son capaces de duende, pero donde encuentra más campo, como es natural, es en la música, en la danza y en la poesía hablada, ya que estas necesitan un cuerpo vivo que interprete, porque son formas que nacen y mueren de modo perpetuo y alzan sus contornos sobre un presente exacto”.
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on which countless researchers have already considered and formulated concepts. About the origin of the word “experience”, Amatuzzi writes: Who could have imagined that “danger” and “pirate” were words related to “experience”? So it is. According to the Houaiss & Villar (2001), from the old latin verb periri, we find the last participle peritus, which went directly to Portuguese through perito, habilidoso, experimentado. Hence also with the preposition “ex” arises in the latin experientia, which means proof, essay, attempt, experience, and in imperial latin, acquired experience. Thus the term experience can mean both an attempt, a proof, in a more objective sense of something that is done, and that which is left from several tests in the course of life itself, in a now more subjective sense. They derive from that: experimentum (proof by facts) and the adjective expertus (experienced, who gave evidence to knowledge - where in English expert, of specialist, and in Portuguese experto in the sense of versed, knowledgeable, but not to confuse with smart that has another source). From periri (trying, proving, undertaking, experiencing), from which came experience (which derives from the attempt, from the enterprise), also derived periculum (trial, proof, risk, examination), adjective periculosum (risky, dangerous) verb periclitor (to make an attempt, to risk, to put in danger), peritus (that knows by experience, expert, instructed), imperitia (malice, ignorance). From there they derived in Portuguese to: experience, danger, dangerous, perilous, expert, expertise. Also according to Houaiss and Villar (2001) all these words are related to the greek peíra (proof, attempt), the verb peirao (to try, to undertake), Peiratés (one who tries a coup, bandit, pirate), empeiría, (experience, and, as a direct import made by philosophy, “empiria”, a collection of data known not by logical reasoning but by sensory experience) and empeirikós (which is related to experience) (see also Ernout & Meillet, 1967) (AMATUZZI, 2007, p.88).
We see how the origin of the word “experience” is linked to risk, to sensoriality, to experimentation. Based on this, we deduce that inherent in the word “experience” there is an apprehension and a body appropriation of a certain fact or situation, which happens through an openness to experience the unknown. 120
In order to experience the unknown, listening is necessary. The word “listening” comes from the latin auscultare, which means listening with attention. In this text, listening is the ability to consider the other and his/ her actions/thoughts, including opening oneself to a possibility of changing one´s own actions/thoughts based on dialogue. Thus, it is a matter of listening not only to the perspective of meaning, but as a symbolic field. And, as experience, it means the quality, intensity and depth with which a given situation is experienced. It is not only what one experiences, but how one lives. In this context, it is the experience based on a corporeal-spatial presence, which has to deal with the current virtuality, but does not settle in it. Hannah Arendt used to say that it is not possible to think without personal experience. It is the experience that sets in motion the process of thinking. We think because something happens to us; we think as a product of the things that happen to us, based on what we live, as a consequence of the world that surrounds us, which we experience as our own, affected by what passes us. It is the experience that prints in us the need to rethink, to return to the ideas we had of things, because precisely what experience shows us is the insufficiency or dissatisfaction of our previous thinking; we need to think again because we already value the previous view of what we live or what we see passing, what passes us. What actually makes the experience be is this: that we must think again (CONTRERAS, DE LARA, 2013, p.21). 37
Therefore, experience passes through the incarnate fact and the ability to review it. It seems to be very closely linked to processes of reflection, based on presence and listening, not only in the past, but in the present which is configured as past, as soon as it occurs. It is born of the capacity to 37 Translation under my responsibility, from the original: “Decía Hannah Arendt que nos es posible pensar sin experiencia personal. Es la experiencia que pone en marcha el proceso de pensamiento. Pensamos porque algo nos ocurre; pensamos como producto de las cosas que nos pasan, a partir de lo que vivimos, como consecuencia del mundo que nos rodea, que experimentamos como propio, afectados por lo que nos pasa. Es la experiencia la que nos imprime la necesidad de repensar, de volver sobre las ideas que teníamos de las cosas, porque justamente lo que nos muestra la experiencia es la insuficiencia, o la insatisfacción de nuestro anterior pensar; necesitamos volver a pensar porque ya nos vale lo anterior a la vista de lo que vivimos, o de lo que vemos que pasa, que nos pasa. Justo, lo que hace que la experiencia sea tal, es esto: que hay que volver a pensar”.
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open up to the new, to revise the old, or to create the new, revising the old, passing through reception and the production of new proposals, and thus connecting passivity to activity. The main question is: at what point do the words “experience” and “listening” stop being just words-concepts and become action? In 2015, in his workshop “Working with objects within the dance-space on stage” held in Berlin (Radialsystem), Julyen Hamilton said: The name given to words can make them static. For example: if something is a pen, it is not a chicken. If you know the pen and what it is made of, this creates a dynamic. You realize that not all pens are the same; they have shapes, weights, materials, and different colors.38
It is just by experiencing each pen, having the experience of the body in relation to the pen, that you can have a dimension of what each pen can mean. And it is a dimension, since the contact of each individual with each pen will bring new meanings to that relation, to the individual and to the object. Therefore, speaking about experience is not living experience, just as talking about listening is not listening. The concept is not the reality itself. Meuris, in his book Magritte, discusses how this artist, distinguishing the similarity of reality, used the image in art pieces: [...] if the image uses elements of reality, it does not, however, make it tangible to such elements. You cannot touch them, since they are painted. Being intangible, the image proposes figures that resemble otherwise tangible objects. It is therefore appropriate for the artist to test his imagination. Let us imagine that, as Magritte explains, a jar of marmalade, an eatable product, is represented. Your image cannot be eaten. If the combination of thought and inspiration moves the painter to put into the jar an inscription such as << This is not a marmalade jar >>, not only would he tell the truth, since the painted marmalade cannot be food, but it would also surprise the spectator, who is used to take the resemblance by reality (MEURIS, 2007, p. 84). 39 38 Notes under my responsibility, carried out in real-time during the course. 39 Translation under my responsibility, from the original: “[…] si la imagen utiliza elementos de la realidad, no hace sin embargo tangibles a tales elementos. No se los puede tocar, ya que son pintados. Siendo intangible, la imagen propone figuras que
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We can apply these thoughts to the relationship between concept and materialization, theory and practice. The words “experience” and “listening” and the consequent images that we associate with them are not the experience and the listening itself. This may seem obvious. And it is. But perhaps the greatest complexity of theory and practice lies in understanding the obviousness of life. Over embellishing, which run away from the obviousness are often decorations to embellish the lack of consistency of action and work. If there is anything to say, it is said. If there is something to move, move. Often, the attempt to seek out words and/or embellished movements and their proliferation represent, in fact, the absence of what to say or why to move. So, what to say or why to move? In this sense, there is another paradox here: to question the practice of these concepts in this text, therefore, does not mean to carry out the proposed practice. Just as a text cannot scale and translate whatever is improvisation or composition in real-time, neither can it express the action of listening and experience. This text, therefore, does not exist alone. It is linked to everyday practical actions and poetic production, in search of the coherence of the know-how. The reader will never have a dimension of what is discussed without experiencing improvisation in the bodyspace itself, without the experiences of writing the movement and of collective work, which demands listening. The implication and effort required for imagined concepts to come to fruition require engagement, generosity, and control of vanity and ego, so that one individual finds space in the other for the relationship. Give space for the others to speak or move is different from opening up space to listen to the other. In one relation, it is possible to deal with the speech and/or the movement of the other in several ways: suppressing it by imposition; to allow it without considering it; allow it and consider it; allow it; consider it and review your own speech and/or movement based on the position of others; among other possibilities. In the perspective of this se asemejan a objetos por lo demás tangibles. Conviene por eso que el artista ponga a prueba su imaginación. Supongamos que, como explica Magritte, se representa un tarro de mermelada, producto comestible. Su imagen no se puede comer. Si la combinación de pensamiento e inspiración mueven al pintor a ponerle al tarro una inscripción como <<Esto no es un tarro de mermelada>>, no solamente diría la verdad, ya que la mermelada pintada no puede comerse, sino que sorprendería al espectador, habituado a tomar la semejanza por la realidad”.
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text, it is understood that improvisation, in order to achieve a poetic and scenic dimension, demands listening, that is, the consideration of the other (of what the other one says/moves, how the other one says/moves, based on which context the other person says/move). In this sense, an interpretercreator writes and inscribes his/her dance with the other and for the other, based on his/her individuality. The experience of the “you”, as GADAMER has called it, can only be from the relation itself, from within, without possibility of solving itself in an understanding of the other, as if one were outside of that relation that binds, leaving it to know the other. When one leaves the relationship, in reality what he/she does is to stop listening to the other and to understand from where he/ she listens to someone, in what relation the listening is constructed. [...] [...] The experience of “you” is therefore always the experience of me in the relationship with you. [...] The experience of you is to let the other become an experience. The experience of the relationship is to make of relationship an experience (CONTRERAS, DE LARA, 2013, p.30). 40
Improvisation in dance and, mainly, composing in real-time, is to relate all the time. One must be involved in relating, immersed in this joint choice and taking care of what kind of sharing and experience one wishes to promote. It is a place of building, deconstructing and rebuilding, without a subsequent order, but open to the surprises of the present time. It is to realize that knowledge is impalpable because it is infinite. It is to recognize that all knowledge is related to ignorance and that sharing knowledge also means sharing what is not known. And in there lies improvisation: in the honesty of an experienced bodyspace. “Doing something in group allows 40 Translation under my responsibility, from the original: “La experiencia del tú, como ha llamado GADAMER, sólo puede tenerse desde la relación en sí misma, desde dentro, sin posibilidad de resolverse en una comprensión del otro, como si uno estuviera fuera de esa relación que vincula, saliéndose de ella para conocer al otro. Cuando uno se sale de la relación, en realidad lo que hace es dejar de oír al otro y de entender desde dónde oye uno, en qué relación se construye la escucha. [...] [...] La experiencia del tú es pues siempre la experiencia de mi relación contigo. […] La experiencia del tú es dejar que el otro se convierta en una experiencia. La experiencia de la relación es hacer de la relación una experiencia”.
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you to be aware that the people with whom you are dancing with in space are your environment. When you are working and there are people in it, it changes your space. “(ANNA HALPRIN, 1:04 min). And being in relation to the other also modifies your perspective on knowledge, creates new dynamics and expectations. From the embrace I trace the constructed gesture of lego. And I hope the shape to be delineated. Improvising on the scene, embodied knowledge takes the risk of a public display that connects to unexpected knowledge that has not yet been incorporated. And such discovery of this contact takes place at the moment of the contact between interpreter-creator, construction of scene and audience, which leaves the body vulnerable and exposed, because it shares not only its potential but also its fragilities, in real-time. The teaching of experience is to suspend our knowledge, to suspend our own learning of experience to be waiting for what will occur, without suppositions. In this case, acting will arise from this suspension of knowledge (MANONI, 1979, p.143). Because, paradoxically, what is learned from experience is that is not possible to rely on the acquired experience and that, at the same time, it is this learning coming from the experience that enables to confront new situations: with the implicit disposition that our experiential knowledge has given us the endorsement for this waiting without predictions; the confidence to face new situations (CONTRERAS, DE LARA, 2013, p.29). 41
The era of Google, where access to a great deal of information makes us (naively) believe that we are wiser, makes us less and less able to deal 41 Translation under my responsibility, from the original: “La enseñanza de la experiencia es suspender nuestro saber, suspender el propio aprendizaje de la experiencia para estar a la espera de lo que ocurra, sin suposiciones. En este caso, el actuar nacerá de esta suspensión del saber (MANONI, 1979, p. 143). Porque, paradójicamente, lo que se aprende de la experiencia es que no te puedes confiar en la experiencia adquirida, y que a la vez este es el aprendizaje obtenido de la experiencia que permita afrontar las nuevas situaciones: con la disposición implícita de que lo que nuestro saber experiencial nos ha aportado es el aval para esta espera sin previsiones; la confianza para afrontar las nuevas situaciones”.
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with the gaps in knowledge. Again, it seems difficult to deal with the truism, in this case, that it is impossible to know everything about life. And because we need to hold the mask of the intellectual domain, we are less and less ready to learn because we are less and less willing to demonstrate what we do not know and fail. There is no space for learning, there is no room for honesty, and there is no room for movement and neither for experience nor for listening. As much as we click and open windows searching for movement, we remain still in the sense that we are blocked (it is not an option to pause, but the pause is done because of fatigue and unrestrained accumulation). It is the grandiloquence that leads to the vacuum, as we saw earlier in the quote from Larrosa. Since we seek innumerable instantaneous connections with others, we become self-absorbed, connected to one or more machines that act as prosthesis of our bodyspace. Still talking about the era of social networks, the reality shown is a manipulated (virtual) one. It is used to only crop out the potentialities and the fragilities are disguised to show the maintenance of an artificial life, supposedly interesting to the individual and to the collective. In this context, working with improvisation seems to be a field of artisan resistance that assumes responsibility for imperfection and the possibility of failure. That has a weight. It is not a comfortable way. And in real-time composition, this occurs in the presence of the others. All our actions are edited, constantly. We are constantly editing what we show of ourselves, what we do, what we think, what we practice. Social networks, demonstrative and representative channels of a part of reality, give space to the sharing of vanities: it is a commonplace that we are conditioned to the records of successes and their manipulation (places visited, celebrations experienced, intellectual achievements, gifts received, love conquered and kept or exchanged, perfect bodies). Sometimes the trips were not so pleasant, the parties were disheartened and the loves were not so good, but that did not matter. What matters is what we show to the other to look successful, within the concept of socially maintained success, which aims at perfection. It is the â&#x20AC;&#x153;appearenceâ&#x20AC;? society. On the one hand, it is still a strategy of survival that there is a virtual and imaginary place where only virtues are celebrated, whether they are honest or not.
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On the other hand, this type of relationship that is established virtually invades face-to-face relationships and raises some issues. How can this body, which must seem infallible, deal with its actual failure? As Claire Filmón said in an interview given to this research on 02/07/15 at the Center National de la Danse in Paris: “Maybe you wanted to share your failure, but maybe you do not want people to see it”. From this point of view, improvisation, and particularly composition in real-time, seem like outdated technologies. This last one puts the individual (interpreter-creator and audience) in touch with the face-to-face relationship, the risk of real-time experience and the constant possibility of failure. It brings a kind of relationship that is not mediated (and/or measured) and requires editing and composition in real-time, without producing effects, manipulating images or speeches, filter placement, among other possibilities of intervention. And this whole process is done in a conscious way, without naivety in the decision. Theatrical, music or dance performances also have a forced decision of a certain performative dimension. The risk of forgetting the text, of making a false note, of failing, establishes an underground tension that intensifies the attention of artists and audience: regardless of any aesthetic value, the simple fact of maintaining its role of performer without failing is always a challenge. The beauty of a living show is (among other things) the part of the unpredictable - and therefore of improvisation that characterizes every gesture, for it is always a little too much or lacking in its programming (CITON, 2014, p.150). 42
Editing what is displayed in the unmanipulated state is much more risky because of the overexposure it generates. Therefore, the improviser must work daily in a technical-creative way: in order to be active to receive 42 Translation under my responsibility, from the original: “Les spetacles de théâtre, de musique ou de danse tiennent également une partie de leur forcé de cette dimensión performantielle. Le risque d’oublier son texte, de faire une fausse note, de chuter, instaure une tensión souterraine que intensifie l’attention des artistes et des spectateurs: en deçà de toute valeur esthétique, le simple fait de tenir son rôle de performeur sans défaillir tient toujours déjà de l’exploit. La beauté propre d’un spetacle vivant tient (entre autres choses) à la part d’imprévisible – et donc d’improvisation – qui caractérise tout geste, en tant que celui-ci est toujours un peu en excès ou en défaut sur ses programmations”.
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the surprise of reality, the present time, to allow himself/herself to affect and create solutions, paths or propositions based on this. Preparation is the doing itself. There is no way to prepare for the unknown. But it is possible to surround oneself with tools which can help to make choices and create an experiential state of consciousness of consciousness, that make the individual able to deal with the unforeseen without naivety. Dealing with failures, not just with potential, means going deeper into the study of the body. Recognizing yourself in the diving and be wide open, surprising yourself and expanding your possibilities for action. When one delves into a subject, investigation, or relationship, one has more clarity about things and can make immediate decisions that are not based on impulsive reactions but rather on organized views based on an experience. Your positioning may change according to the given situation if there is generosity to listen to the collective action, the piece. It is known that everything influences everything and everyone at all times, but we must know from what place the decision is being made. This is called the criterion and is identified at the time of action. How to maintain the criterion based on the choice and to remain generous, based on listening, demands to give up power. It means the dismantling of power, because the improviser serves not only himself/herself but something beyond his/her own bodyspace, the artwork in question, and his/her relationship to the other (dance partner) and the audience. The material created and the positioning of the artist must relate to the whole. Mark Tompkins, on his â&#x20AC;&#x153;Real-Time Compositionâ&#x20AC;? course, taught at the Villava-Atarrabio Kultur Etxea cultural house in Navarra, Spain, from September 21st to 25th, 2015, when asked how he handles failure during a composition, replied: There are a few ways to deal with this: I may not accept it and try to hide it, I can perform tricks and show them or not to the audience. The fact is that the audience usually wants to see something finished and does not accept failure. In real-time composition there may be highs and lows. The interpreter-creator can accept them, but the audience does not, unless the audience knows how to observe the piece. As a performer I use the following strategies: 1) I leave the scene and restart, reconfiguring 128
the work; 2) diving into failure until turning it, even with the possibility of converting it into a success; 3) expose failure verbally on the scene, talking loudly with colleagues about what is occurring and from there we build new possibilities.
The perspectives brought by Mark that failure can be understood naturally are interesting. It is clear that in the relationship with the audience there are issues to be improved, when we deal with composition in realtime. Is it possible to create a relationship of trust with the audience so that it actively positions itself, accepts failure as composition, and creates the piece together with the interpreter-creator, instead of expecting something ready or necessarily successful from the interpreter-creator? Since the audience is part of the piece, is it possible to stimulate it to compose in real-time, as a spectator, and to make the audience open to the naturalness of human imperfections?
I was there, doing nothing, enjoying nothing, allowing nothing to myself. Being nothing. A nothing, so nothing, that filled the whole space.
Is it possible to push the audience into composition, displacement and reflection as Magritte did in his work The Key of dreams? To build the discourse from the joint experience, even if to do so we leave the current regulations? Is it possible to invite the audience to an experience? The experience, the possibility of something happens to us, happens or arrives in us, requires a gesture of interruptionâ&#x20AC;Śit requires us to stop thinking, stop looking, stop listening, to think more slowly, to stop, to feel more slowly, suspending judgment, suspending the will, suspending the automatism of action, cultivating attention and delicacy, opening the eyes and ears, talking about what is happening to us, to 129
learn slowness, to listen to others, to cultivate the art of meeting, to be silent, to have patience, to give ourselves time and space (LARROSA, 2003, p.174). 43 Experiencing improvisation and composition in real-time is opening space for interaction, dialogue, exchange, and intense perception, creation. It’s like a parachute jumping: having control and losing control, being open to the senses. It is to allow oneself to enjoy and to be frustrated and, based on these actions, in individual principles, to share the senses, to excite or deconstruct the other through the relations that are established. The writing and reading of the movement in improvisation, therefore, occur simultaneously in a state of risk, in the possibilities of failure and destructuring of power territories, in the decentralization of the self, in the deep practice of experience and in what this can generate. And it seems that this is an exercise to be performed by interpreter-creators and the audience, in communion and from their differences and similarities, their encounters and disagreements. The body is the place where each singular history is inscribed, the place where feelings and thoughts are manifested in pulsations, words, images, oppressing nodes or the breeze that cools the soul, but this inscription is not always read as search for meaning; the experience is the possibility of this reading, a necessary reading so that the mark is a true inscription that illuminates the sense of what was lived (CONTRERAS, DE LARA, 2013, p.31). 44 43 Translation under my responsibility, from the original: “La experiencia, la posibilidad de que algo nos pase, o nos acontezca, o nos llegue, requiere un gesto de interrupción...: requiere pararse a pensar, pararse a mirar, pararse a escuchar, pensar más despacio, mirar más despacio y escuchar más despacio, pararse a sentir, sentir más despacio, demorarse en los detalles, suspender la opinión, suspender el juicio, suspender la voluntad, suspender el automatismo de la acción, cultivar la atención y la delicadeza, abrir los ojos y los oídos, charlar sobre lo que nos pasa, aprender la lentitud, escuchar a los demás, cultivar el arte del encuentro, callar mucho, tener paciencia, darse tiempo y espacio”. 44 Translation under my responsibility, from the original: “El cuerpo es el lugar donde se inscribe cada historia singular, el lugar donde sentimientos y pensamiento se manifiestan,
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The senses of experience, in Contemporary Dance improvisation, occur in the doing itself; are built and are recognized while dancing. However, in real-time composition, the readings always take place in a subjective way, the writing must be objective. The concreteness of the movements draws the text, based on the awareness of who writes it about what he/she says, as he/ she says, of where he/she says and for whom he/she says. From this perspective, we may think that improvisation is rather ephemeral and enduring. Ephemeral at the moment when the split occurs, but lasting by the cut that causes in time and in the body, changing the relationship with reality and the reverberations it causes. I woke up smelling flowers. A sigh. It flew.
Final considerations Establishing a concept of bodyspace, which explodes the kinesphere, requires a new perception of movement and how the individual behaves as world. To erase the boundaries and to understand oneself, as a unitary process demands a perception of performance in which the individual assumes responsibilities and places himself/herself as a direct creator of the practical matter of life as he/she makes decisions. All this, thought as a power in the art of improvisation and real-time composition in dance, brings the unveiling of an imagistic discourse based on honesty, which can show virtues and failures, on the scene. Sharing these different readings45 with the audience reinforces the need for new dialogues between interpreter and audience, based on complicity, mutual composition, play, sincerity in the establishment of agreements of a synesthetic order. This perspective creates a kind of involvement from both parts, which is only possible through an experience that allows the depth of the relationships, created by devices of conviviality that are established in the dance composition, through movement. en latidos, en palabras, en imágenes, en nudos que oprimen o en brisa que orea el alma, pero no siempre esa inscripción es leída en busca de su sentido; la experiencia es la posibilidad de esa lectura, una lectura necesaria para que la huella sea una verdadera inscripción que alumbre el sentido de lo vivido”. 45 The word “readings” here means the ways, movements and scenes that can be read, the ways reception can occurs.
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Perhaps the greatest challenge of this process, in a social moment in which “pretending” is more valued than “being,” is to face in practice the obviousness of simplicity, of unlocking emotion, of shredding ignorance, of the possibility of being wrong. How to dance the obvious? How to discuss the obvious, through movement? How to advance as human beings (artist and audience) based on our obviousness, our failure and our constant mortality provoked by the decision cut? In this explosion of borders, how far do I dare to go? How far do I take the risk? This text raises more questions than answers. Such questions whose attempts to answer only make sense in artistic making. And, just as the practices of the workshops and the development of the piece Dreams provoked the questions, which permeate this writing, this text completely modifies my bodyspace and, therefore, the continuity of the piece as well as the teaching practices in which I act. Therefore, we continue the processes of improvisation and composition in real-time in the classroom, on stage and in life.
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