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PRAZERES O sexo na idade sénior é bom e recomenda-se

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AMIGOS FIÉIS Aquários: o espectáculo da natureza em casa

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ALICE VIEIRA Nunca percebi o que é ter “uma certa idade”

EDITORIAL

Uma revolta de cabelos brancos Mário Zambujal

E d ição Q u i nze n a l | 23 Ma io 201 3 | nº 02 | Ano 1 | € 0,95

Feira do Livro de Lisboa começa hoje

RETROACTIVIDADE NAS PENSÕES

Quem vai pagar a factura dos 740 milhões?

Maior leque de escolha, mais espaços, mais actividades e horários alargados são algumas das novidades da 83ª Feira do Livro da capital que este ano conta com 240 stands > 42

ACTUAL

Ginásios de rua A rua é um bom sítio para se fazer exercício. E há cidades que já oferecem autênticos ginásios ao ar livre > 16

O Governo de Passos Coelho anunciou um novo pacote de medidas que afecta directamente pensionistas e reformados. Há já quem defenda que se trata de uma “autêntica perseguição” > 24 ELECTRICIDADE

BEM-ESTAR

Mude de fornecedor e evite mais surpresas

Produtos naturais que não deve tomar com medicamentos

As contas da luz têm vindo a aumentar desde o início do ano. Saiba as razões dos aumentos, o que lhe é cobrado na factura e por que deve mudar de fornecedor o quanto antes > 8

Produtos naturais podem interagir com medicamentos de forma grave. Os doentes polimedicados são os mais afectados. Afinal, o que é natural, nem sempre faz bem > 28

GONÇALO RIBEIRO TELLES

“Tenho a mania de estar ao serviço do meu País” Com uma carreira de sete décadas, aos 91 anos conserva a boa disposição, o sorriso fácil. Um senhor, a sério > 10


2 EDITORIAL

CURTAS

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

Câmara de Loures lança Cartão Geração S

Mário Zambujal Director do Jornal Sénior

Uma revolta de cabelos brancos Este jovem “Jornal Sénior” nasceu e há-de crescer sem ligações políticas – no sentido em que política se entenda como afeições partidárias. Não significa, isto, qualquer desapreço ou menos reconhecimento dos partidos, como sustentáculos da democracia que todos desejamos tomar por garantidos. Todavia, política é algo de mais constante em cada dia das nossas vidas – não só dias de eleições ou comícios. Fazemos política em cada atitude que tomamos – ou deixamos de tomar. Multidões de seniores organizam-se agora por uma causa. É uma revolta, política, em defesa de uma causa inquestionavelmente justa. A ameaça velada (e não sei se velada será o termo mais apropriado) às reformas e pensões asseguradas (asseguradas? Também aqui hesito na palavra) depois de décadas de trabalho e contribuições para uma velhice tanto quanto possível tranquila, é um ataque sem precedentes, sem respeito e nenhuma sensibilidade social. Não vale a pena esconder que entre os reformados e pensionistas se abate hoje a mais negra das nuvens: o medo. Já sem idades nem aceitação para refazerem as suas vidas (até para emigrarem!) o que lhes entremostram é um cenário de privações acrescidas. Uma imposição da Troika? Haja decoro! Esta trindade de representantes dos credores portugueses tem o direito de esperar que Portugal cumpra as metas a que se comprometeu como membro da comunidade euro. O que não pode é substituir-se ao governo nacional, deliberando as regras para atingir essas metas. Será um governo mole e submisso – o nosso ou de qualquer outro país – o que ajoelhar diante de intromissores nas políticas da sua própria responsabilidade. Não só os reformados e pensionistas mostram a sua revolta, cada vez mais vigorosa. Outros, incluindo lúcidos representantes de entidades patronais já chamaram a atenção: cada corte representaria uma diminuição de rendimento nas famílias. Com todas as óbvias e más consequências na depauperada economia nacional.

Foi lançado no passado dia 21 de Maio, em duas cerimónias públicas realizadas nas Academias Seniores de Loures e Sacavém, o cartão Geração S. Tendo em conta que os seniores representam 17,4% da população residente no concelho, esta edilidade considerou imperativo encontrar uma forma de prosseguir com eficácia o intento de promover hábitos de vida saudáveis, combater o sedentarismo e, sobretudo, a solidão na terceira idade. Assim, e em rede com outras entidades públicas, insti-

Aprovada co-adopção de crianças por casais do mesmo sexo O Parlamento aprovou na passada semana, na generalidade, um projecto de lei do PS para que os homossexuais possam co-adoptar os filhos adoptivos ou biológicos da pessoa com quem estão casados ou com quem vivem em união de facto. Este projecto de lei teve 99 votos a favor, 94 contra e nove abstenções, anunciou a presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves. Votaram a favor as bancadas do BE, PCP, PEV, a maioria dos deputados do PS e 16 deputados do PSD. De acordo com o projecto de lei aprovado, que tem como primeira subscritora a deputada independente Isabel Moreira, “quando duas pessoas do mesmo sexo sejam casadas ou vivam em união de facto, exercendo um deles responsabilidades parentais em relação a um menor, por via da filiação ou adopção, pode o cônjuge ou o unido de facto co-adoptar o referido menor”. Já os três projectos do BE e PEV para alargar a adopção plena de crianças aos casais de homossexuais foram chumbados, com votos contra da maioria da bancada do PSD, do CDS-PP e de seis deputados socialistas. Parque Aquático de Amarante reabre amanhã Reabre amanhã o Parque Aquático de Amarante, o maior parque do género em montanha da Península Ibérica. Para além das

Para cidadãos maiores de 65 anos residentes no concelho tuições e empresas do concelho, foi criado o cartão Geração S, que proporcionará aos seus utilizadores descontos em produtos e serviços importantes para a sua saúde, auto-estima e bem-estar social e financeiro, como sejam tarifas especiais nos serviços de abastecimento de água, isenção de taxas nos processos

paisagens proporcionadas pelo Tâmega, o complexo de 36 mil metros quadrados inclui quatro pistas rápidas, dois escorregas em caracol, uma piscina de aprendizagem e uma piscina para crianças e um restaurante. Para os utentes com mobilidade reduzida, o Parque Aquático de Amarante dispõe de acessos específicos que incluem rampas distribuídas por todo o espaço e estruturas próprias de apoio nas casas de banhos, duches e piscinas. Os bilhetes situam-se entre os 13 e os 17 euros (aos domingos e feriados), sendo que as crianças até aos quatro anos não pagam entrada e dos 5 aos 11 e a partir dos 65 os preços são reduzidos para metade. Estão também disponíveis bilhetes familiares. Mais de 120 mil pessoas visitaram este espaço em 2012. Este ano, o parque estará aberto até dia 22 de Setembro. Olimpíadas Seniores em Castro Verde No âmbito do projecto de desporto sénior do programa “Atividade Com’Vida” da Câmara Municipal de Castro Verde, o estádio municipal 25 de Abril recebeu, no dia 15 de Maio, as V Olimpíadas Seniores. Por razões meteorológicas, a competição ao ar livre não aconteceu, mas os mais de 200 participantes acabaram por integrar numa aula de ginástica no pavilhão da escola D. António Francisco Colaço. Os seniores tiveram também sessões de sensibilização da responsabilidade da GNR, dos Bombeiros Vo-

de obras de reabilitação de edifícios, descontos nos títulos de estacionamento da Loures Parque EM, descontos nas actividades da Gesloures EM, descontos em diversos estabelecimentos comerciais do concelho como centros clínicos e de reabilitação, oculistas, cabeleireiros, centros de estética, pronto-a-vestir, ginásios, etc.. Podem aderir a este cartão os cidadãos maiores de 65 anos residentes no concelho de Loures que se encontrem na situação de reformado, pensionista ou aposentado.

luntários de Castro Verde e pela Universidade Sénior Castrense: a Guarda alertou para as burlas, os Bombeiros falaram da prevenção dos incêndios em casa e, por fim, a Universidade apresentou as vantagens da participação social e da aprendizagem ao longo da vida na promoção do envelhecimento activo. Inscrições abertas: Férias em Fátima para pessoas com deficiência O Santuário de Fátima organiza a oitava edição do programa de férias para pessoas com deficiência e seus pais. Durante uma semana, gratuitamente, os pais ou avós de crianças ou adultos com deficiência podem deixar os seus filhos entregues aos cuidados do santuário ou passar com eles essa semana. A actividade decorre em quatro períodos, sendo que cada pessoa pode apenas participar numa. De 1 a 7 de Agosto, o programa será para os participantes com idades entre os 7 e os 21 anos. De 10 a 16, 20 a 26 e 29 de Agosto a 4 de Setembro será orientado para os adultos. Visitas ao Santuário de Fátima e idas à praia fazem parte do roteiro. A iniciativa destina-se a pessoas que não frequentem instituições, uma vez que, segundo o Santuário, “pretende-se proporcionar um momento de quebra de rotina e de descanso aos pais que cuidam dos seus filhos com deficiência”. As inscrições decorrem até ao dia 30 de Junho. A ficha de inscrição está disponível no site www.fatima.pt ou pode ser solicitada através do 249 539 679.

FICHA TÉCNICA: DIRECÇÃO Mário Zambujal EDIÇÃO Maria Assunção Oliveira (moliveira@jornalsenior.pt) REDACÇÃO Alexandra Peixinho Abreu (aabreu@jornalsenior.pt), Filipa Faustino Arenga (farenga@jornalsenior.pt) COLABORADORES Carla Rodrigues, Humberto Lopes, José Vegar, Leonor Xavier, Manuela Garcia, Marta Martins, Pedro de Freitas (Consultor Médico), Rui Tovar FOTOGRAFIA Rogério Martins (fotografia@jornalsenior.pt) ILUSTRAÇÃO António Pilar COLUNISTAS Alice Vieira, Leonor Xavier, Luís Filipe Pereira DIRECÇÃO CRIATIVA E DESIGN GRÁFICO Nelson Costa COORDENAÇÃO Helena Carvalho (hcarvalho@jornalsenior.pt) DIRECÇÃO COMERCIAL Ricardo Lamy (rlamy@jornalsenior.pt) PUBLICIDADE Mário Serra (mserra@jornalsenior.pt), David do Vale (dvale@jornalsenior.pt) MORADA Rua Duque de Palmela nº2, 2º Dto · 1250-098 Lisboa CONTACTOS Telefone: 00351 213301980 · Fax: 00351 213301986 · geral@ jornalsenior.pt · Apartado3801, EC Santa Marta · 1151-801 Lisboa PROJECTO EDITORIAL Begin Comunicação PROPRIEDADE ProsPerPagina - Edição de Livros e Publicações, Unipessoal, Lda IMPRESSÃO PROS – Promoções e Serviços Publicitários, Lda., Rua Duque de Palmela nº2, 2º Dto. · 1250-098 Lisboa DISTRIBUIÇÃO VASP - MLP - Quinta do Grajal - Venda Seca - 2739-511 Agualva Cacém Nº CONTRIBUINTE 510262988 Nº REGISTO ERC 126360 Nº DEPÓSITO LEGAL 358970/13 ISSN 2182-9233 PERIODICIDADE Quinzenal


23 MAIO 2013 · JORNAL SÉNIOR

Envelhecer Sorrindo nas tertúlias de psicologia sénior no Porto A Agitar, associação responsável pela universidade sénior do Porto, organiza mais uma Tertúlia de Psicologia no dia 27 de Maio, pelas 14h30. O tema deste mês é “Envelhecer Sorrindo”, que tem por objectivo falar do papel fundamental que os idosos têm na sociedade, por exemplo na transmissão de conhecimentos e valores aos netos e, também, de como as limitações da idade são normais mas não impeditivas de um papel activo e construtivo. Estes encontros mensais pretendem proporcionar aos participantes um espaço de partilha, reflexão e discussão sobre vários temas, na perspectiva da psicologia. Os temas são seleccionados conforme os interesses e preocupações que vão sendo demonstrados pelos participantes. As tertúlias têm o valor de inscrição de cinco euros para os associados e de 6,5 para os não associados. A inscrição pode ser realizada através do número 224 087 957, pelo endereço universidadesenior@ agitar.pt ou pelo facebook da Agitar. A associação, sedeada na freguesia de Paranhos, uma das mais envelhecidas da cidade do Porto, organiza um leque variado de actividades e aulas. Câmara do Porto apresenta exposição bibliográfica do poeta Albano Martins No próximo dia 25 de Maio, pelas 16h, vai ser inaugurada na Fundação Engº António de Almeida, na Rua Tenente Valadim, nº 325, no Porto, uma exposição biobibliográfica em homenagem ao poeta Albano Martins intitulada “Tempo e Memória”, que estará patente ao público até ao dia 1 de Junho, de segunda a sexta, entre as 14h30 e as 18h30. Sábado, dia 1 de Junho, entre as 14h30 e as 17h30. A organização está a cargo da Câmara Municipal do Porto, da Fundação Engº António de Almeida e do Instituto Cultural D. António Ferreira Gomes. Albano Martins nasceu em 1930 na aldeia do Telhado, concelho do Fundão, estando a residir na área do Porto desde Outubro de 1969. Licenciado em Filologia Clássica, foi professor do Ensino Secundário, Inspector-coordenador da Inspecção-Geral do Ensino e ainda Professor da Universidade Fernando Pessoa, no Porto. Colaborador, no início dos anos 50, da revista “Árvore”, “ Colóquio-Letras” e a “Nova Renascença”. Foi membro da direcção da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto. É membro da Associação Portuguesa de Escritores e do P.E.N. Clube Português, Membro Honorário da Academia Cabofriense de Letras (Estado do Rio de Janeiro) e doutor honoris causa pela Universidade São Marcos, de São Paulo, Brasil. Foram-lhe atribuídos vários prémios e condecorações e muitos dos seus poemas estão traduzidos em espanhol, catalão, francês, italiano inglês, chinês (cantonense) e japonês. A sua vasta obra (cerca de 40 títulos de poesia,

SENIORES prosa e infanto-juvenil) tem merecido a atenção de alguns dos mais importantes críticos e ensaístas contemporâneos, brasileiros e portugueses. “Viver Melhor” da Santa Casa quer combater o isolamento dos idosos Os utentes idosos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa dispõem agora da possibilidade de participar em aulas de tai-chi e ginástica, em vários jardins de Lisboa. Trata-se do programa “Viver Melhor”, que pretende promover o exercício físico para todos em espaços verdes da capital e através do qual a Santa Casa pretende prevenir o isolamento social e incentivar a prática desportiva junto dos mais velhos. Mas a iniciativa abre-se a todas as pessoas, de diferentes idades, que queiram partilhar deste momento de bem-estar. Até ao final do ano, às segundas, quartas e sextas, sempre às 15h00, técnicos qualificados vão dar aulas gratuitas e abertas de tai-chi e ginástica localizada e específica, em vários espaços da cidade: no Jardim da Estrela, Alameda D. Afonso Henriques, Jardins de Belém, Vale do Silêncio, Mata de Benfica e Quinta das Conchas. Estas actividades vão também ser acompanhadas por equipas de saúde. Quebrar o isolamento e a solidão na terceira idade, constatada pela acção do Programa Intergeracões, que referenciou mais de 23 mil idosos na cidade de Lisboa, é o móbil do “Viver Melhor”. Ópera Juvenil “Kate e o Skate” para avós e netos Se ainda não sabe o que vai fazer com os seus netos no dia da Criança, o Jornal Sénior deixa-lhe uma sugestão: O Teatro Ibérico vai levar ao palco a Ópera Juvenil “Kate e o Skate”, no dia 1 de Junho, pelas 16h00. Sob a direcção musical de Inês Igrejas e encenação de Laureano Carreira, os protagonistas desta Ópera são os Pequenos Cantores do Conservatório de Lisboa. Num grupo de crianças e adolescentes, de aparência absolutamente comum, destaca-se a protagonista Kate. Kate tem uma personalidade forte. Mais duas meninas se destacam, Maria e Rita, as amigas. No outro grupo, o dos rappers e dos graffitters, com o qual inicialmente há confrontos verbais e quase físicos, o chefe é o Bruno, que tem uma atitude desafiadora e pouco social. Tudo se passa num jardim em torno do coreto onde os músicos ensaiam. Os miúdos estão a iniciar as férias e o coreto do jardim é o local dos encontros. Kate — virá a descobrir-se — sofre de uma doença grave e vai viver momentos complicados, assim como todo o grupo, que com ela se solidariza. Mas Kate é rija e com o auxílio do skate, do seu grupo de amigos, do coreto, transformado em nave espacial, da música, do amor e até do irritante Bruno, vai conseguir vencer a doença e até quase virar o Hospital de pernas para o ar.“Kate e o Skate” entra ainda em cena nos dias 2, 9, 16, 23 e 30 de Junho, às 11h.

500 MIL EUROS PARA APOIAR OS MAIS VELHOS. Um prémio para projectos que melhorem a qualidade de vida da 3ª idade. No âmbito da sua política de Responsabilidade Social, o BPI lança a 1ª edição do Prémio BPI Seniores que tem por finalidade apoiar financeiramente, através de donativos, projectos que promovam a melhoria da qualidade de vida e o envelhecimento activo de pessoas com idade superior a 65 anos. O Prémio BPI Seniores destina-se a todas as instituições sem fins lucrativos, com sede em Portugal, que apresentem um projecto contemplando um ou mais tipos de intervenção nas respostas sociais às pessoas com idade superior a 65 anos. O valor total dos donativos a atribuir é de € 500.000: um 1º prémio cujo montante pode ascender até € 200.000 e distinções até € 50.000 cada, para as restantes candidaturas seleccionadas.

Candidaturas até 15 de Junho. 800 22 33 44 (Todos os dias das 8h - 20h) www.bancobpi.pt /premiobpiseniores


4 CORREIO

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

Este espaço é seu Caro leitor, este espaço é seu. Onde pode ver reflectidas as suas opiniões, críticas e sugestões. Faça-nos chegar, via correio electrónico, carta ou telefone, o seu parecer sobre o que lê aqui, o que gostava de ler e também - por que não? -, o que não gostou ou discorda. Pretendemos dar voz a todos os que nos acompanham quinzenalmente, levar a cada leitor informação útil e pertinente mas, sobretudo, tornarmo-nos num amigo que lhe fará companhia e o incentivará a viver melhor os melhores anos. Contacte-nos através do endereço electrónico geral@jornalsenior.pt ou por carta para o Apartado 3801, EC Santa Marta - 1151-801 Lisboa.

Luísa Campos, Lisboa “Li o primeiro número do Jornal Sénior, porque tenho como hábito ler/comprar o primeiro nº de jornais ou revistas. É a única maneira de sabermos do que estamos a falar, quando queremos fazer críticas, positivas ou negativas. Neste caso só as tenho a fazer positivas: achei-o um jornal com “conteúdo”, actual, de leitura fácil e com mensagem positiva e muito bem cuidado em termos de grafia. Tem os ingredientes certos para continuar a servir quem se propõe. Sou aposentada da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, onde não tive uma das carreiras mais longas (37 anos), mas onde também não tive um trabalho fácil na área social. Foi muito rico em termos de prática e de experiências, mas foi também muito desgastante... E escrevi-vos porquê? Porque desde que começaram a existir os sobressaltos em relação aos reformados e pensionistas, (tira pensão... aumenta IRS... inverdades sobre as carreiras contributivas... insegurança na saúde... etc., etc.), que nos quer fazer parecer, que somos uns inúteis que só damos despesa ao Estado, que várias ideias me têm atravessado o espírito sobre esta situação, quando reflicto sobre elas. Uma delas gostaria de ver tratada na comunicação social e parece-me que este jornal é um dos espaços indicados. Falar sobre a contribuição que muitos reformados dão para o bem-estar social e a melhoria da qualidade de vida das pessoas ao fazerem voluntariado. E será que essas horas de trabalho voluntário exercido pelos reformados/pensionistas, não contribuem economicamente para haver algumas poupanças no Estado e nas Instituições? Fica o desafio para um artigo.”

Olívia Garcia Comprei hoje o Sénior. Parabéns. Gostei. Vou tentar ser leitora assídua. A anedota da última página mostrando o ardina a vender o “Prá velhinha, pró velhinho é espectacular. 5 estrelas Recordei o tempo dos ardinas, Sou

do princípio do século passado. PARABÉNS.

Maria Leonor Silva Começo por dar os parabéns pelo primeiro número do JORNAL SÉNIOR e desejar as maiores felicidades. Gostei bastante do jornal, só que estava na esperança de encontrar um lugar para oferta e procura de empregos e não vi... Embora a primeira preocupação seja a de dar emprego aos jovens, por vezes há empregos em que as pessoas de 50/60 anos seriam úteis, nem que fosse com ordenados menores e em Portugal há essa lacuna, há pouca oferta de empregos para as pessoas nesta faixa etária, com experiência, com uma certa fidelidade aos empregos, coisa que os jovens não têm e por outro lado, há tanta gente desesperada... Aqui fica o pedido ou melhor, a sugestão.

António Pires, 67 anos Eram 7 horas da manhã a antena 1 na voz de António Macedo, dava a feliz notícia,” hoje vai sair a primeira edição do Jornal Sénior”, com alguma emoção o meu obrigado de quantos hoje desfrutam desta edição que será certamente o nosso Jornal. Passando pelos temas, é sobretudo a salvaguarda da Língua Portuguesa. Ela está no seu esplendor e no seu rigor máximo acessível a todos os seus leitores. Nada foi esquecido, o País foi abrangido pela notícia. Muitos parabéns.

Associação Amigos da Grande Idade – Inovação e Desenvolvimento Exmo. Senhor Director do Jornal Sénior, não podemos deixar de comunicar a extraordinária expectativa e a quase certeza de que este é um momento único na área do envelhecimento em Portugal, não só pela postura e atitude de V. Exa. e da equipa que tanto elogia e que se vê reflectida nesta primeira publicação. Desejamos profundamente uma mudança de linguagem e de abordagem às questões do envelhecimento, largando o discurso miserabilista e a manutenção da

ideia de que os velhos são todos carenciados e doentes. Desejamos acabar com o protagonismo de histórias de inutilidade, coisas más e até macabras que, no fundo, tentam manter um estigma sobre as pessoas idosas que muito interessa a Instituições que vivem essencialmente à custa desse mau envelhecimento. Julgamos mesmo que este jornal é, finalmente, um sinal da chegada dos Baby Boomers ao nosso País. A geração que mudou o mundo e que começou a fazer 65 anos em 2011. É um fenómeno incontrolável e já tem muito desenvolvimento noutros países. São os novos velhos a necessitar de uma abordagem diferente. Começamos a pensar que a chegada do jornal pode ser o primeiro passo para mudarmos a agulha dos indicadores utilizados para avaliar o nosso trabalho com as pessoas idosas que se tem reportado exclusivamente à percepção e que deve passar a reportar-se a indicadores rigorosos, internacionalmente aceites e reconhecidos. E sabemos que este jornal tem o objectivo de contribuir para a felicidade das pessoas, um grande indicador de desenvolvimento humano: a felicidade interna bruta (FIB). (…) Bem hajam e contem, contem sempre, com esta modesta associação que, por muito pequena que seja, vai continuar nesta caminhada de contribuir para a felicidade das pessoas idosas.

Maria Lisete Costa, Lisboa Professora aposentada mas activa em projectos de solidariedade/voluntariado, associada da “APRe!” Ao Director e a todos os colaboradoras, parabéns pela criação do Sénior ! Pelo preenchimento de uma inexplicável lacuna na sociedade portuguesa - a valorização da pessoa sénior, num contexto de interacção com a restante sociedade - jovens e restantes e nunca de discriminação de qualquer camada etária! Parabéns também pelas temáticas diversificadas e pela informação que fornecem.

Celebremos a Idade! OPINIÃO Joaquina Madeira Coordenadora Nacional do Ano Europeu para o Envelhecimento Activo e Solidariedade entre Gerações (2012)

“Na velhice deixar de se fazer o que já não se pode fazer, não é problema! Problema é deixar de se fazer o que ainda se pode fazer.” Cícero, 120 anos a.C. Gosto de dizer que as pessoas não têm idade, têm vida! O ditado popular até nos ajuda a prosseguir esta bela viagem, por vezes acidentada, que percorremos desde que nascemos: “Enquanto há vida há esperança.” É isso mesmo! Qual a idade que efectivamente tenho? Qual a idade que eu sinto ter? Qual a idade que os outros me dão? Sabemos que as descoincidências são enormes… Mas o que é verdade é que o que os outros pensam de nós marca-nos e influencia-nos e o caso complica-se quando é a sociedade a determinar critérios e a estabelecer regras. Assim foi administrativamente estabelecido que os cidadãos eram considerados velhos, palavra aqui usada no sentido depreciativo, a partir dos 65 anos. Mais ainda, que ao atingirem essa fronteira da idade, iam para um “território de inutilidade”. A comunidade declara que não precisa mais deles e que agora, sem qualquer respeito pela diversidade individual, tendo a idade como único marcador, podem ir descansar desempenhando papéis que a cultura dominante produtivista desvaloriza porque, claro, já não contribuem para a produção de riqueza nem para o PIB… Ora, sabemos que os mais velhos são aqueles que viveram mais, experimentaram e aprenderam mais, tudo o que só a vida vivida pode dar e que isso é único e próprio dos mais velhos pois em mais nenhuma idade se tem oportunidade de adquirir. Já não fazem falta à sociedade? A sociedade pode desperdiçar este capital de conhecimento e experiência? Mas é aceitável que se excluam cidadãos pela idade que têm? A sociedade é

um todo orgânico que não pode dispensar cidadãos sem consequências para si própria mas, antes, valorizar a diversidade, também das idades e das gerações, não colocando uns contra os outros, (que enorme disparate!), mas aproximando uns dos outros em reciprocidade e solidariedade. Gosto desta ideia tão visual que é a de uma “Sociedade Arca de Noé” que a todos acolhe, com respeito pela diversidade, com reconhecimento pela importância e valor de cada um, insubstituível no papel que desempenha para o bem comum e todos diferentes, mas todos iguais em deveres e direitos. De facto, somos uma sociedade que não tem sabido distinguir o que é essencial do secundário, parecendo mais simples lutar pelos princípios, do que vivê-los e fazê-los cumprir. Vivemos o paradoxo de individualmente, cada um de nós querer viver mais tempo, mas não querermos envelhecer nem ser velhos, talvez porque a todo o custo temos querido afastar a morte da própria vida ao ponto de a desumanizarmos (a morte, é claro). Aliás, até há tratamentos e cremes anti-envelhecimento como se de uma doença se tratasse. O que é certo é que o envelhecimento e a longevidade são uma aquisição da civilização, por isso é bom e por isso temos que celebrar a idade e já agora, recuperar o sentido e o alcance desta bela palavra, tão portuguesa, velho(a). É verdade que quando a pronunciamos, vem-nos à cabeça “a velhinha, curvada e de bengala, coitadinha…” puro preconceito que resulta de generalizações! Mas o presente já nos está a dizer que os ditos velhos do século XXI são uma “energia nova” com que a sociedade terá que contar e que ignorá-lo é uma cegueira que se pagará caro no futuro, que é já hoje. Pergunto, haverá melhor alternativa na vida, que ser velho?



6 CIDADANIA

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

Casas Regionais já não são o que eram

Associativismo regionalista a braços com novos desafios As Casas Regionais, que serviram de porto de abrigo e polo sociocultural aos migrantes rurais do século XX, enfrentam os desafios dos novos tempos e muitas delas definham. São vários os factores que propiciam este declínio, mas o associativismo regionalista tem um papel importante a desempenhar na preservação activa dos valores e tradições regionais. Num mundo globalizado – e num país europeizado – é uma questão de identidade nacional. DR

Texto: Filipa Faustino Arenga

O fluxo migratório do campo para as cidades, que decorreu ao longo do século XX em Portugal, fez com que as associações de índole regional ganhassem um espaço social e cultural cimeiro na vida dos milhões de pessoas desenraizadas, saudosas das suas terras de afecto, das suas tradições, dos seus contextos geográficos e humanos. As chamadas casas regionais – Casa do Alentejo, do Algarve, do Minho, de Paredes de Coura, de Tomar, entre muitas outras – foram durante anos polos socioculturais, em especial na região da Grande Lisboa, o principal destino dos migrantes. Foram essenciais enquanto centros de apoio no processo de adaptação e ofereceram aos associados uma noção de identidade partilhada, de vivência comum e aproximação cultural aos seus valores originais. Poder falar a mesma linguagem, celebrar as mesmas efemérides e tradições, saborear a comida tradicional e assistir a manifestações culturais e etnográficas específicas de cada região tornavam estas associações em pequenos recantos de conforto e de companhia. Carlos Gomes, jornalista e investigador do tema do associativismo regionalista, conta que “a importância das casas regionais, inicialmente designadas por ‘grémios regionalistas’, residia no facto de as mesmas contribuírem para a preservação da identidade cultural e da coesão social das gentes, que um dia foram obrigadas a abandonar as suas regiões de origem. O empobrecimento das zonas rurais a par do desenvolvimento industrial dos principais centros urbanos a partir de meados do século XIX causou um êxodo populacional que ameaçou o seu próprio desenraizamento cultural”. Transmissão de cultura Para além do seu papel junto dos migrantes, as associações regionalistas deram às segundas gerações, já nascidas em ambiente urbano e muito diferente das terras e culturas dos pais, a possibilidade de

A Casa do Alentejo é uma das associações que conseguem manter a actividade

conhecerem de perto estas tradições e valores longínquos – geográfica, histórica e socialmente. Não era invulgar um jovem de um qualquer subúrbio de Lisboa pertencer a um rancho folclórico minhoto, por exemplo, por afinidade familiar à região. O auge deste associativismo deu-se nos anos oitenta e noventa do século passado, uma altura “em que assistimos ao aparecimento de um número apreciável de casas regionais de âmbito concelhio”, acrescenta o investigador, também co-fundador da Casa do Concelho de Ponte de Lima. “Foi um período marcado por uma certa dinamização que se traduziu simultaneamente na formação de vários agrupamentos folclóricos e de música tradicional no seio dessas associações e também fora delas devido a um certo efeito de contágio”. Nem todas vingaram, no entanto: “algumas das que então procuraram dar os primeiros passos ficaram pelo caminho

ou sucumbiram à nascença, como foi o caso de Montalegre, Caminha, Terras de Bouro e Ponte da Barca”. Declínio Depois de um período de grande actividade, muitas das casas entraram em letargia. As razões são várias: o menor fluxo migratório para as cidades e o recurso das pessoas a outras formas de socialização e integração social; envelhecimento da massa associativa activa e dos dirigentes; a falta de interesse ou disponibilidade dos mais jovens para assumir as rédeas das associações; a sua rara existência e divulgação das suas actividades na internet; a crescente escassez de apoios estatais e autárquicos; a desactualização das suas actividades e objectivos face às mudanças sociais em seu torno; os projectos falhados de novas sedes, em que pudessem desenvolver os

seus programas, entre outras. Hoje em dia, muitas destas casas limitam as suas actividades a convívios esporádicos e algumas sobrevivem graças a terem um restaurante típico, pese embora o esforço voluntário da maioria dos dirigentes. O pendor sociocultural de outrora, representando as suas regiões, diluiu-se, em muitos dos casos. “É notória a dificuldade que sentem em encontrar respostas para as exigências dos tempos actuais, adaptando a sua forma de actuação. Daí resulta uma certa incapacidade de envolver as gerações de descendentes que já nasceram longe da região de origem dos seus pais e fazê-las interessarem-se pelas temáticas do regionalismo. Finalmente, o apego aos cargos directivos por parte de alguns responsáveis impede a renovação dos dirigentes e, consequentemente, das mentalidades”, analisa Carlos Gomes. Só no concelho de Lisboa, estima-se que


CIDADANIA 7

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existam cerca de 60 casas regionais, de comarca, concelho e província. Destas, apenas algumas mantêm as portas abertas e outras “arrastam a sua inactividade por períodos bastante prolongados, abrindo as portas para um encontro à volta de um baralho de cartas de jogar ou, ocasionalmente, um almoço de convívio, mas negando sempre o seu estado de agonia”. A extinção formal não é comum: aliás, a única que o fez nos últimos anos foi a Casa de Ourém, em 2010. Antes desta, só “a da Casa de Ovar, na década de sessenta e, nos anos oitenta, a Casa da Comarca de Oliveira de Azeméis”. Aquando da sua extinção, a Casa de Ourém entregou o seu espólio ao Museu Municipal de Ourém, onde se encontrou recentemente exposto ao público na exposição “Da Casa de Ourém ao Km110”. Passado ou presente? Para além de se ter perdido uma parte dos polos de socialização, a diluição das actividades das associações regionalistas coloca ainda uma questão ligada à preservação e transmissão activa das tradições, da memória colectiva, dos valores, da linguagem, das festividades, em suma, das manifestações de identidade regionais, nomeadamente junto de gerações mais novas, que não tiveram oportunidade de viver estas tradições in loco. Mas fará sentido falar da pertinência deste aspecto numa altura em que as identidades regionais e nacionais parecem desvanecer-se nas tendências globais? E, especialmente, em contexto europeu? Carlos Gomes não tem dúvidas: “Precisamente num tempo em que a globalização e a construção de um espaço político ao nível europeu podem representar um risco de perda de identidade dos povos e, consequentemente, da sua liberdade, todas as formas de manter viva a sua cultura adquirem uma maior importância e actualidade. A construção de comunidades políticas e económicas supranacionais não pode, em circunstância alguma, representar a massificação de costumes através de uma “lavagem ao cérebro” dos povos de maneira a fazê-los esquecer as suas origens e identidade, a renegarem o seu passado e abdicarem da sua língua materna. As escolhas dos cidadãos apenas serão verdadeiramente livres se tiverem consciência das mesmas em função dos seus próprios interesses.” José Travaços dos Santos, historiador e vencedor, em 2012, do reputado prémio internacional “Oscar do Folclore”, atribuído pela União Internacional de Associações de Folclore a personalidades que se destacam no estudo e divulgação etnográfica, também se assume nesta defesa. “Numa

Entrada em estilo mourisco da Casa do Alentejo

altura em que estamos a assistir ao diluir dos traços identitários dos povos, nomeadamente na Europa, é essencial preservar o conhecimento acerca destes mesmos elementos distintivos, como a língua, o folclore, a etnografia. O conjunto das iden-

“As casas regionais poderiam prestar um valioso serviço às suas regiões, concentrando funções que as tornariam autênticas delegações dos interesses locais e regionais” tidades regionais forma, sem dúvida, a nossa identidade nacional.” O historiador batalhense, com mais de sessenta anos dedicados à etnografia e etnologia, é realista. “Não se trata de defender que as pessoas andem vestidas com os trajos tradicionais, mas conhecer as origens desses aspectos etnográficos, que muitas vezes são subtis. Haverá uma parte destas tradições que pertencem ao foro museológico, mas há outras diferenças regionais utilizáveis ainda hoje, como é o caso da cozinha regional. Até mesmo os grupos folclóricos: quando as crianças ouvem as actuações, começam invariavelmente a dançar também. Há qualquer coisa que mexe com elas.”

Mas os tempos parecem não estar para isso: “temos uma classe de políticos que só pensa nos lucros materiais e que não pensa no Povo, nas suas necessidades e na sua identidade.” A Câmara Municipal de Lisboa chegou a ter, sob a presidência de Carmona Rodrigues, um gabinete de apoio ao associativismo regional, mas este foi extinto com a actual administração. Perante o declínio do associativismo regionalista, chegou a ser criado, em 2000, o Conselho Nacional das Casas Regionais, que pretendia justamente posicionar esta forma de participação cívica enquanto vector e factor de promoção da identidade nacional. Pode ler-se na sua declaração de missão, relembrada no Almanaque Alentejano de 2012: “Promover a defesa dos valores, da cultura e da diferenciação que identificam cada uma das regiões do País, como forma de afirmação da identidade nacional; proporcionar um espaço de reflexão e debate sobre temas que suscitem o desenvolvimento e o crescimento das regiões; incentivar as relações de intercâmbio e troca de experiências entre as casas regionais; promover e dinamizar iniciativas conjuntas em ordem à preservação e valorização de bens e valores culturais com o reforço da identidade própria de cada região dentro de um todo nacional; suscitar junto das entidades públicas questões abrangentes para a resolução de problemas regionais”. Ao que pudemos apurar, no entanto, as realizações do projecto, aparentemente inactivo neste momento, foram poucas e de pequeno impacto.

Embaixadas regionais Nem tudo é negro neste cenário. Algumas casas continuam a funcionar, algumas conseguiram integrar corpos dirigentes mais jovens e outras até foram fundadas nos últimos anos. Mas, qual é o seu papel, actualmente? Talvez agir mais como as pequenas embaixadas e centros de interesses. “Nas circunstâncias actuais, as casas regionais podem contribuir para a promoção dos interesses regionais e, nalguns casos, para a implementação de melhoramentos locais considerados de grande interesse para as respectivas populações”, defende Carlos Gomes. Por outro lado, o investigador acredita que “sem abdicar da sua natureza popular, as casas regionais deveriam transformar-se em associações prestadoras de serviços, combinando o amadorismo que sempre as caracterizou com um certo grau de profissionalismo que os tempos modernos requerem. Darei, como exemplo, as casas regionais francesas estabelecidas em Paris, mormente a Maison d’Alsace, funcionando exclusivamente como empresas nas quais se consorciam as mais diversas entidades das respectivas regiões para a promoção dos seus negócios.” Na cidade de Lisboa, analisa ainda, as associações podem “tirar partido da sua localização privilegiada que é simultaneamente porta de entrada de numerosos visitantes estrangeiros. As casas regionais poderiam prestar um valioso serviço às suas regiões, concentrando um conjunto de funções que as tornariam autênticas delegações dos interesses locais e regionais.”


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ELECTRICIDADE

Mude de fornecedor e evite mais surpresas As contas da luz têm vindo a aumentar desde o início do ano. Este aumento deve-se ao fim do mercado regularizado de electricidade, já que as tarifas transitórias, que servem para incentivar a mudança para o mercado liberalizado, fazem aumentar os valores das facturas que recebe em casa. Só é obrigatório proceder à mudança de fornecedor no final de 2015, mas quanto mais depressa o fizer, melhor. Texto: Alexandra Peixinho Abreu Fotografia: Rogério Martins

“Costumo pagar 50 euros de electricidade e agora ando a pagar quase 200. Até perguntei à menina da EDP se posso pagar esta factura em 3 vezes. Foi-me dito que sim. Deve ser deste novo aquecedor que comprei porque este Inverno foi mesmo frio”. E é com a conta da luz na mão que João Lino, 90 anos, responde que não fazia ideia que estava obrigado a mudar de fornecedor, deixar o mercado regulado e passar para o mercado liberalizado de electricidade. João Lino é apenas um

dos muitos seniores que entrevistámos a propósito da conta da luz. As respostas são quase sempre as mesmas, a factura aumentou e muito. E não percebem bem porquê. Mas a resposta a esta questão também não é clara, já que a EDP refere que “cada caso é um caso”. As informações sobre a liberalização do mercado da electricidade e também do gás são inúmeras, vêm inclusivamente nas facturas da luz, mas nem sempre é fácil perceber essas mesmas informações, que obrigam a imensas pesquisas pelos sites da EDP, ERSE – Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos – ou da DECO Proteste. Mesmo contactando os serviços

da EDP, via telefone ou presencialmente, a resposta dada não é óbvia, “talvez seja melhor mudar de fornecedor”. “Talvez” não será a resposta adequada já que é obrigatório mudar de fornecedor, até Dezembro de 2015, uma vez que a EDP Serviço Universal vai deixar de fornecer electricidade porque o mercado regulado de electricidade acabou. Implicações para os consumidores A liberalização do mercado de electricidade em Portugal está em curso desde 2000 e entrou, desde 1 de Janeiro de

2013, na última fase, com a extinção gradual das tarifas reguladas para todos os clientes. Desde o início deste ano que já não é possível realizar novos contratos com a EDP Serviço Universal. Os actuais clientes continuarão a ser abastecidos de energia pela EDP Serviço Universal, até escolherem um novo comercializador. Durante este período, será aplicada uma tarifa transitória com preços agravados, fixada pela ERSE - Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos. Convém, no entanto, esclarecer que só a partir de 31 de Dezembro de 2015, os consumidores serão obrigados a mudar de fornecedor, com excepção dos que


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Contratual e os Contratos de Aquisição de Energia, o fomento às renováveis, as rendas aos municípios”, reforça Carolina Gouveia. O valor final a pagar pelos clientes resulta da quantidade de kWh consumidos (lidos ou estimados) a multiplicar pelo preço do kWh. A este valor acresce o valor da potência contratada. Ao valor total soma-se o respectivo IVA, bem como outras taxas e impostos aplicáveis ao fornecimento de electricidade. Vale a pena ler o contador?

beneficiam da tarifa social. Apenas se fizer um novo contrato já em 2013, caso mude de casa, por exemplo, é que já terá de escolher no mercado livre. Entretanto, enquanto não proceder à mudança, a sua factura continuará a incluir as tarifas transitórias, com preços agravados, “de forma a estimular a transição gradual dos consumidores para os comercializadores livres”, como se pode ler no site da EDP. A extinção das tarifas reguladas (já em vigor) significa que todos os consumidores que ainda não passaram para o mercado liberalizado vão ter de cessar o seu contrato com os comercializadores de último recurso (como a EDP Serviço Universal) e fazer novos contratos até ao fim do período transitório com empresas que actuem no mercado liberalizado. Deste modo, os consumidores de electricidade e gás natural que se encontrem no mercado regulado devem começar a informar-se sobre os comercializadores em mercado liberalizado e a procurar as ofertas que melhor se adeqúem ao seu perfil de consumo. (ver caixa) Os preços de venda de electricidade e de gás natural aos consumidores finais deixam de ser fixados pela ERSE que, no entanto, continuará a fixar as tarifas de acesso às redes de electricidade e gás natural, pagas por todos os consumidores, independentemente do seu comercializador de energia.

finais de 2011, (que passou para 23%) e os aumentos periódicos estabelecidos pela ERSE no mercado regulado (a cada três meses). Por outro lado, as facturas excessivas costumam estar também relacionadas com o aumento do consumo no período de Inverno e com os acertos de

enquanto não proceder à mudança, a sua factura continuará a incluir as tarifas transitórias, com preços agravados facturação. Após um período de tempo de facturação baseada em estimativas, o consumidor é surpreendido com uma factura elevada que vem corrigir as estimativas. Para estas situações, é importante que o consumidor verifique a sua factura, pois a empresa não pode cobrar mais do que o consumo efectuado nos últimos 6 meses. Por exemplo, se a factura emitida em Maio de 2013 apresenta consumos até Novembro de 2012, não haverá prescrição, mas se apresentar consumos anteriores àquela data, estarão prescritos. Neste caso, o consumidor deve apresentar reclamação e não proceder ao pagamento até ocorrer a correcção da factura”.

Por que estão a aumentar as facturas de electricidade?

O que estamos a pagar na conta da electricidade?

“De facto, temos sentido um aumento no número de reclamações referentes à facturação elevada do serviço de electricidade”, refere Carolina Gouveia, jurista da DECO Proteste. De acordo com esta responsável, este aumento nas facturas da luz no mercado regulado (EDP Serviço Universal) está relacionado “com o aumento dos tarifários de electricidade, concretamente o aumento do IVA em

“A factura da electricidade, para além do consumo energético, inclui muitos outros custos, como a contribuição audiovisual. Estima-se que 34% traduzem os custos de produção de energia e 22% o uso das redes que conduzem a electricidade até nossas casas. A componente mais pesada, os “Custos de Interesse Geral” (44%), inclui verbas, entre outras, como os Custos para a Manutenção do Equilíbrio

Carolina Gouveia acha que sim, já que “se o consumidor conseguir fazer a leitura do contador dentro das datas estabelecidas pelo comercializador vai evitar a facturação por estimativa e conseguir ter uma facturação que corresponde a 100% ao que realmente consumiu. A importância da realização da leitura é mais acentuada quando o contador está localizado dentro da habitação, pois a empresa terá mais dificuldade em fazer a leitura. A facturação por estimativa, com ausência de leitura real durante um longo período de tempo leva aos chamados acertos de facturação que, normalmente, se traduzem em facturas com valores muito elevados, por isso, aconselhamos que o consumidor dê sempre a leitura dos contadores”. Que conselhos para os consumidores? Na mudança para o mercado liberalizado (sair da EDP Serviço Universal), os consumidores devem começar pela pesquisa dos fornecedores existentes, as tarifas que propõem e as condições. De seguida, comparar as diferentes propostas. Após a escolha do fornecedor, é importante obter informações sobre as condições do contrato. Convém dar particular atenção à existência de um período de fidelização e eventuais penalizações caso desista antes do final do prazo estabelecido. Para efectivar a contratação, basta seguir as instruções dadas pelo fornecedor eleito. Este tratará da passagem de uma empresa para outra, sem prejudicar o consumidor, já que não pode ocorrer a suspensão do serviço. Após a celebração do contrato, o mesmo é submetido a uma validação pela entidade que gere o processo de mudança. Trata-se de um processo rápido que visa verificar dados técnicos e comerciais referentes ao local de fornecimento. Assim que o processo for validado, o novo fornecedor envia uma carta ao cliente a informar o dia a partir do qual o serviço fica activo. Envia, também, as condições do contrato. Se o contrato for celebrado à distância tem, a partir desse momento, 14 dias para cancelá-lo caso, por exemplo, encontre uma oferta ainda melhor. Se a carta do novo comercializador não aparecer, convém contactá-lo e perguntar qual a data de início de contrato. Resta confirmar a mudança nas facturas e se não houve sobreposição de datas. Em resumo, o mercado liberalizado de electricidade veio para ficar. Quando mais depressa mudar de fornecedor, melhor.

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10 ENTREVISTA

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

GONÇALO RIBEIRO TELLES

“Tenho a mania de estar ao serviço do meu País” Texto: Leonor Xavier Fotografia: Rogério Martins

A casa é o primeiro andar de um pequeno prédio semelhante a tantos outros debruados de passeios bem estreitos, pequenos comércios de confecções, mercearias enfeitadas por caixotes de hortaliças e fruta fresca, trânsito prudente com um carro a passar de cada vez, devagar. Aqui em pleno coração de Lisboa, a Rua de São José é morada, refúgio e cenário para uma história de família e um muito especial percurso de vida. Amanhã, 24 de Maio, é dia de festa pelos 91 anos de Gonçalo Ribeiro Telles, o protagonista deste percurso. Nascido em 1922, quase um século passado podemos por ele dizer, citando Miguel Torga, que uma vida longa tem muito para contar. Pontualmente cumprida a hora marcada abre-se a porta da rua, logo depois do toque da campainha, sobem-se dois lances de degraus, e sorridente, é o dono da casa a receber, a orientar o caminho, a apontar a sala de mesa redonda onde lado a lado nos sentamos. Quando no passado dia 10 de Abril recebeu o Prémio Sir Geoffrey Jellicoe, da Federação Internacional de Arquitectos Paisagistas, o mais prestigiante no mundo para o seu ofício e arte, Gonçalo Ribeiro Telles teve consagrada uma carreira de setenta anos dedicada a nobres causas. Merecido prémio para quem desde os tempos de juventude e até hoje tem lutado pela defesa da paisagem, pelo bom ordenamento do território, pela preservação do ambiente, no respeito devido à secular

cultura portuguesa. Estudou arquitectura paisagística na Alemanha e, desde logo, foi desafiando interesses estabelecidos e preconceitos de quem não levava a sério as propostas da profissão nova e inovadora em Portugal. Assim, Gonçalo Ribeiro Telles conseguiu denunciar a desorganização do território, a ocupação tumultuosa do solo, a cultura industrial do eucalipto, o abandono da terra, a especulação

políticos, católico progressista nos anos 60, desde muito cedo aderiu à discussão de princípios e ideias, por isso foi sócio número 1 do Centro Nacional de Cultura em 1945, espaço possível de diálogo aberto, em tempo férreo do regime. Pela concepção dos jardins da Fundação Gulbenkian, que desenhou com António Viana Barreto, Gonçalo Ribeiro Telles foi contemplado pelo Prémio Valmor em 1975. Ali, o visitan-

A minha obra tem como consequência a nossa terra entendida como referência de uma cultura

imobiliária. Defendeu a imensidade da natureza além do espaço urbano. Experimentou a descoberta de beleza e equilíbrio entre o campo e a cidade, defendeu a harmonia entre a cultura e a natureza e a exuberância da biodiversidade que existe em Portugal. Professor proibido de exercer por motivos

te pode imaginar uma paisagem além do entremeado de árvores e arbustos, plantas e flores, tons variados de verde, tingidos de cores. Entre contrastes de sombra e luz, o visitante nunca está só. Ele atravessa a floresta de mistérios até ao céu aberto onde um lago estimula os jeitos e os sentidos, desafiado a acordar emoções ou silêncios

de alma. Na Gulbenkian, Gonçalo Ribeiro Telles consegue desenhar a paisagem que todos nós, portugueses, temos gravada como memória de identidade. No espaço urbano permanece o ritmo da terra, a paisagem não se perdeu, apesar de tantas vezes ofendida. Em épocas diferentes e dimensões variadas, os traçados de Gonçalo Ribeiro Telles foram seguindo. O jardim do Palácio de Mateus, em Vila Real, o corredor verde para Lisboa, o Jardim Amália Rodrigues no Parque Eduardo VII, as hortas urbanas são obras suas. Por estas obras e todas, a sua personalidade é unanimidade nacional. Muito conversou e disse, curtas repostas em altura de muita exposição pública. Interessado, muitos pormenores da actualidade comentou. Bem-humorado, tem riso fácil. Sedutor pela vivacidade da inteligência. Um senhor, a sério. Jornal Sénior (JS) - Quando se fala de si, fala-se de causas, de projectos, de ideais, de força, de determinação, de fé. Entre todas, qual é a sua causa principal? Gonçalo Ribeiro Telles (GRT) - Tenho muitas, felizmente. A minha primeira causa é estar ao serviço. Tenho a mania de estar ao serviço do meu País, da integridade, que é fonte de riqueza cultural no meu País, como minha pátria. JS - Como define a sua obra? Que sentido lhe dá, no todo da sua vida? GRT - A minha obra tem como consequência a nossa terra entendida como referência de uma cultura. Para ser referência, a nossa terra tem de integrar a nossa cultura


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na sua imagem e no seu ser. É o que sucede com Portugal desde o Minho ao Alentejo. Este é um suporte que exige para mim uma dignidade no uso e um respeito por uma história. JS - Dignidade e respeito numa obra de arquitectura paisagística, como se traduzem, como se concretizam? GRT - Traduzem-se na política, na cultura e na estética. Têm de se traduzir nestas três coisas. É a este conjunto que eu chamo dignidade no uso do território. Eu digo: exijo que seja assim. E está tudo dito. Porque há coisas feitas que são indignas do território. JS - Uma árvore pode mudar uma paisagem? GRT - Quem muda não é a árvore, mas é a pessoa que usa, que sustenta a paisagem, como se diz. A paisagem é suporte de uma cultura de uma economia, de uma estética, de um recreio. A árvore está lá, ela pertence a um sistema natural e cultural. As árvores e os seus conjuntos têm uma situação de existência cultural. JS - Que sensação é a de ter quase noventa e um anos? GRT - A velhice corresponde a um espaço e a um tempo vivido. JS - O que é bom? GRT - Não é bom nem mau. É! Com todas as transformações exigidas pelo correr da vida. Não há etapas, há continuidade, há um percurso. JS - O que muda? GRT - Muda a vivência das coisas que acompanham e suportam a idade. Há sempre essa evolução. O ser vai-se integrando na continuidade da vida. JS - Desde a década de vinte da sua infância, já passou por quase um século de tantos acontecimentos na história do mundo. Lembra-se de alguma data, de algum momento especial? GRT - Lembro-me do fim da Guerra. JS - Foi para a rua festejar? O que fez nesse dia? GRT - Fui para a janela. JS - …? GRT - A janela já não tinha as tiras de papel que se punham por causa dos bombardeamentos. Via-se a rua. JS - E do que mais se lembra? GRT - Lembro-me do ser próprio dessa época. O pós-guerra era sempre uma esperança de futuro. Na Alemanha do pós-guerra a força, a vontade de construir sobrepunham-se à realidade, havia festa quando uma obra ficava feita. JS - O mundo estava destruído, por isso essa esperança, essa urgência de reconstrução. GRT - Sim e havia aqueles que o destruíam. E havia um caminho daí para a frente. A minha geração herda muitos dos problemas da Segunda Guerra, incluindo os actos atrozes e um certo heroísmo.

ENTREVISTA 11 JS - De tantas pessoas notáveis que conheceu, alguma o impressionou, o influenciou? Alguma deixou marcas na sua personalidade? GRT - Impressionaram-me mais as pessoas que comigo viveram, com quem experimentei desde os valores de família até às dificuldades por que passamos. Todos temos uma história pequena à volta de nós. JS - O que passam os mais velhos aos mais novos? GRT - Os velhos ou os anciãos transportam para os mais novos uma série de esperanças que nortearam a sua vida. Aí ponho a problemática política, incluindo a essência do próprio País e as histórias que vão desde os sentimentos até aos valores e à estética. Não retiro das histórias esta Santíssima Trindade, porque com ela completamos a esperança da imortalidade. JS - Sim, mas falando por si, o que tem vontade de transmitir às gerações mais novas? Qual é o seu legado? GRT - O meu desejo é passar ideias, valores e histórias. JS - Diz-se de si que é um sonhador, um visionário. Acredita que podemos transformar o mundo? Fazer política é uma vocação sua? Concorda com a ideia de que todos nós fazemos política, de uma ou outra maneira? É certo dizer que cada cidadão pode ou deve actuar no maior ou menor espaço que seja o seu? GRT - Sim. Somos pessoas. Todos nós fazemos política. JS - Pertenceu à Juventude Agrária Católica enquanto estudante na Universidade. Foi fundador do Partido Popular Monárquico e do Partido da Terra. Subsecretário de Estado do Ambiente nos três governos provisórios e Secretário de Estado do Ambiente no I Governo Constitucional. Ministro de Estado e da Qualidade de Vida no governo da AD criou a Reserva Agrícola Nacional e a Reserva Ecológica Nacional. Sente-se como alguém que desde sempre tem participado nos momentos importantes do País, pelo espírito de serviço de que agora começou por falar? GRT - Nós temos por objectivo as raízes, os espaços e as virtudes. Por esse motivo sou monárquico e democrata e ainda cristão. JS - Tanto que se tem falado de si ultimamente, por ter recebido este Prémio Sir Geoffrey Jellicoe, mas a sua vida tem tantos outros passos importantes. O júri apontou-o como um dos primeiros políticos portugueses a chamar a atenção para as questões ecológicas, a conseguir legislação para a ordenação do território, a entender a política ao serviço do essencial, integrada na vida, na sociedade. GRT -… o prémio deu-me visibilidade. Não esperava recebê-lo. JS - Posso dizer de si que é figura singular? GRT - Mas eu não sou um, sou muitos. Há muitos “gonçalos” que fazem como eu!


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Cidade amiga dos idosos é cidade amiga de todos As cidades portuguesas são ou não são amigas dos seus idosos? A Associação VIDA quis saber isso mesmo e foi perguntar aos próprios o que existe de bom e de mau nas suas zonas de residência. Os resultados desse inquérito nacional constam do estudo cIDADES que, apesar de identificar o que há para fazer, também revela muita obra feita por este País fora. Portugal ainda vai sendo um lugar para velhos. Texto: Carla Rodrigues Fotografia: Rogério Martins

Passeios antiderrapantes, bons serviços de apoio domiciliário, edifícios bem sinalizados, uma rede de transportes públicos eficaz, inclusão dos idosos nas actividades da comunidade e formação sénior são alguns dos requisitos necessários para que uma cidade seja considerada amiga dos idosos. Este conceito foi concebido pela OMS, Organização Mundial de Saúde, que, em 2005, lançou o Guia Global das Cidades Amigas das Pessoas Idosas, posteriormente traduzido para português pela Fundação Gulbenkian. Na sequência dessa iniciativa da OMS, diversos países decidiram adoptar as indicações do Guia e Portugal foi um deles. Mas primeiro houve que fazer um levantamento do que existe e do que faz falta aos idosos portugueses para garantir o seu bem-estar. E para isso nada melhor do que ouvir a opinião dos próprios (com mais de 55 anos), dos municípios e de alguns especialistas. Foi isso que fez a Associação VIDA, Valorização Intergeracional e Desenvolvimento Ativo, com o estudo à escala nacional, intitulado cIDADES. Financiado pela Direcção-Geral de Saúde, Fundação Gulbenkian e Associação VIDA, esse estudo “teve dois objectivos nucleares: apresentar e sensibilizar para o conceito da OMS Cidades Amigas das Pessoas Idosas e verificar a amigabilidade dos municípios portugueses para com elas”, explica Teresa Almeida Pinto, presidente da VIDA e coordenadora do estudo cIDADES. Mãos-à-obra Posteriormente ao estudo nacional, vários municípios decidiram dar seguimento ao processo de inquirição dos seus munícipes e desenvolver o seu próprio estudo local. Ou seja, a título de exemplo, alguns municípios, que contribuí-

ram com um ou dez inquéritos para a amostra nacional, representativa do País recolheram, posteriormente, mais de 300 inquéritos, junto da sua população. Este esforço adicional dos municípios foi apoiado pela Associação VIDA, que a título voluntário e sem qualquer custo para os municípios, procedeu à análise estatística desses dados, oferecendo assim um diagnóstico fundamental a todos os municípios que se comprometeram a dar seguimento a esse mesmo diagnóstico. Espera-se agora que os municípios que aderiram ao cIDADES deitem mãos-à-obra para implementar as medidas para “melhorar ou criar serviços, adequar equipamentos e gerir recursos em prol do bem-estar dos mais velhos”. Para os municípios que aderiram à Plataforma Portuguesa das Cidades Amigas das Pessoas Idosas e Rede Mundial da OMS, dois anos é o tempo máximo de que dispõem para apresentar um Plano de melhoria. A coordenadora do cIDADES acredita na “boa vontade e no empenho dos municípios para responderem e corresponderem às necessidades e expectativas dos seus munícipes mais velhos, até porque agora dispõem de um diagnóstico que lhes dá orientações precisas sobre quais as áreas que necessitam de maior atenção”. Já há bons exemplos mas ainda muito por fazer São vários os problemas identificados no cIDADES, que dificultam o quotidiano dos idosos e que exigem soluções adequadas e imediatas. Problemas de urbanização e de construção de habitações adequadas, problemas de circulação e de transportes, dificuldades na participação social e em actividades de lazer, por serem inexistentes ou por falta de acesso às mesmas, entre outros, integrados em oito grandes áreas de análise: espaços exteriores e edifícios, transportes, habitação,

participação social, respeito e inclusão social, participação cívica e emprego, comunicação e informação e, finalmente, serviços de apoio comunitário e de saúde. Apesar de haver muito trabalho a fazer nestes campos, como se pode aferir no cIDADES, o certo é que também já não faltam exemplos de boas práticas, sem as quais a vida dos mais velhos seria um inferno. Como o serviço ao domicílio a idosos e acamados residentes na freguesia de Santo Ildefonso,

“Comprei duas carrinhas para transportar quem precisa. Eu próprio levo as pessoas. O que eu puder fazer faço, porque os mais velhos merecem todo o respeito” no Porto, criado pelo presidente Wilson Faria, há mais de vinte anos, quando ainda era tesoureiro na junta. Há doze anos que Wilson preside à Junta de Freguesia e “muita obra” fez, mas considera o apoio domiciliário “a mais importante”. No entanto, Wilson está preocupado, porque esse apoio pode estar em risco com o novo mapa das freguesias aprovado em Dezembro e que prevê a extinção de 1.165 das 4.259 existentes. Depois da agregação, que ocorrerá automaticamente após as eleições autárquicas, em Outubro deste ano, Santo Ildefonso fará parte da União das Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Miragaia, São Nicolau e Vitória, tornando-se a terceira maior freguesia do Porto. Quando isso acontecer, “vamos ser mais de 40 mil habitantes. Só espero que o apoio domiciliário aos mais velhos e mais necessitados se mantenha. O isolamento é das piores coisas que pode


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Para os municípios que aderiram à Plataforma Portuguesa das Cidades Amigas das Pessoas Idosas e Rede Mundial da OMS, dois anos é o tempo máximo que dispõem para apresentar um Plano de melhoria acontecer a uma pessoa nessas condições”. Das cinco freguesias a que se vai unir, a sua é a única que presta estes serviços. As outras não os terem, fá-lo temer o pior para os que têm mais de 65 anos, que constituem cerca 30% da população. “Temos treze funcionários que todos os dias vão a casa de 85 pessoas. Fazem limpeza, dão-lhes banho, levam comida, tratam de papelada, enfim, ajudam as pessoas em tudo o que precisam. Se isto acaba, não sei o que vai ser desta gente. O que mais me custa é, de facto, o isolamento de muitos idosos”. Um desses idosos é o ex-campeão nacional de lançamento de dardo, António Cadete, de 101 anos. A idade avançada entorpeceu-lhe as pernas, o que o prende em casa há quatro anos. “Não posso sair, passo o tempo na cama. Estas pernas não são o que eram”. As pernas estão quase mortas, mas a memória continua viva. António recua aos tempos de atleta e o sentido de humor sai-lhe pronto: “Eu era bom a lançar o dardo. Só não participei nos Jogos Olímpicos porque não tinha altura suficiente. Tenho 1,63 metros. Se as pernas fossem mais compridas, teria dado a este País uma medalha de ouro”. Não tem o troféu, mas tem outros que lhe facilitam o dia-a-dia. A vida de António “seria bem mais difícil” sem o apoio ao domicílio prestado pela junta de freguesia, que no caso deste ex-atleta consiste em refeições, higiene pessoal, limpeza da casa e fisioterapia. Não conhece pessoalmente o presidente Wilson, mas dele só tem “coisas boas a dizer”. “Muitas quedas eu já teria dado se não tivesse onde me apoiar” Em Lisboa, na freguesia de Santo Estêvão, a presidente da junta Maria de Lurdes Pinheiro, 58 anos, não é menos popular que Wilson Faria junto da população idosa.

Quando a autarca sai do gabinete e percorre as ruas e vielas estreitas e íngremes deste bairro típico lisboeta, as pessoas com quem se cruza cumprimentam-na e ela responde, tratando-as todas pelo nome. Doze anos de proximidade com as pessoas, a resolver-lhes os problemas do dia-a-dia, só podia dar numa coisa, confiança cega: “Vêm ter comigo para tudo. Tem dias que sou psicóloga, médica, assistente social, motorista, polícia, conselheira. Alguns idosos até me perguntam se devem ou não ir para um lar”. Não é de estranhar, portanto, que muitos lhe confiem a chave de casa. Num bairro como este, com muitas escadarias e calçada escorregadia, os corrimões que Lurdes mandou colocar são uma dádiva, sobretudo para os mais velhos. Maria Teresa, 92 anos, é das habitantes que agradece ter onde se agarrar quando sobe e desce o lanço de escadas que tem à porta de casa. “Fazem muita falta. Muitas quedas eu já teria dado se não tivesse onde me apoiar”, confirma. E acrescenta: “A lavandaria comunitária é outra coisa que dá imenso jeito. É lá que lavo a roupa, porque eu já não tenho forças nas mãos para lavar no tanque. A minha casa é pequena, como a maior parte delas aqui no bairro, não tem espaço para uma máquina”. “Os mais velhos merecem todo o respeito” Mais a sul, na freguesia do Alqueva, onde 60% da população é idosa, os mais velhos, quando têm que se fazer à estrada para irem ao hospital (o mais próximo fica a 20 km, em Portel), contam com a ajuda do presidente Joaquim Romão. A ele está eternamente grata Ana Santana dos Santos, 83 anos, residente nesta aldeia alentejana com menos de 400 habitantes desde que nasceu. “Estou sozinha, os meus filhos estão longe e o que me vai valendo é o senhor presi-

dente, um bom homem, o melhor que a junta alguma vez teve. Joaquim Romão, habituado aos elogios do povo que o elegeu, não estranha a gratidão: “Comprei duas carrinhas para transportar quem precisa. Eu próprio levo as pessoas. O que eu puder fazer faço, porque os mais velhos merecem todo o respeito. Para mim, uma sociedade também se avalia pela forma como trata os seus idosos. Eu próprio sou idoso. Já estou perto dos oitenta”. Iniciativas de proximidade São iniciativas de proximidade como estas que melhoram a qualidade de vida dos seniores. Mas há outras que também já estão em prática nos municípios portugueses, como aponta o estudo Nacional cIDADES Amigas dos Idosos. Por exemplo, na Freguesia do Poceirão, em Palmela, onde as habitações são dispersas e os acessos às mesmas são em terra batida,

“foi colocado ao dispor da população uma carrinha de nove lugares e um motorista, gratuitamente, permitindo aos residentes nas zonas mais isoladas e periféricas o acesso quinzenal aos serviços e comércio localizados na sede da freguesia”. Ainda em Palmela, a autarquia criou a Loja Móvel do Cidadão, convertendo uma carrinha num escritório que circula pelas zonas rurais para atender as pessoas. Tendo uma ligação celular de terceira geração, “disponibiliza serviços online sem necessidade de deslocação para receber resposta a um assunto oficial”. Embora este serviço seja dirigido a todos, “está especialmente dirigido às pessoas com mais dificuldade de locomoção». Para Marc Bovenschulte, um dos especialistas que contribuíram com a sua opinião para a elaboração do estudo, “esta solução permite manter integradas na sociedade as pessoas mais isoladas geograficamente e manter as infra-estruturas políticas sem grandes investimentos”. Também com o objectivo de minimizar o isolamento das populações do interior do concelho e melhorar as suas condições de mobilidade, a Câmara Municipal de Castro Marim - outro exemplo mencionado no estudo -, implementou uma rede de circuitos de transporte social denominada Castro Marim Mais Perto para complementar a rede de transportes colectivos existentes no município. Envelhecer em casa é a expectativa dominante em todo o mundo Mas não é apenas do acesso aos transportes, sobretudo nas áreas rurais (segundo o estudo, em cidades como Lisboa e Porto os inquiridos mostraram-se satisfeitos com a frequência e abrangência dos transportes colectivos), que depende a melhoria da quali-

dade de vida dos idosos. A habitação também é uma das áreas chave que deve ser melhorada. “A indústria de remodelação de habitações já percebeu há algum tempo que a adaptação do espaço doméstico às necessidades específicas que decorrem do processo de envelhecimento vai ser, nos próximos anos, uma das maiores áreas de expansão no mercado. Envelhecer em casa é a expectativa dominante em todo o mundo, mas isso implica garantir que as habitações sejam amigas do idoso para que a experiência em espaço doméstico se faça em condições de segurança e independência”, lê- se no cIDADES. Mas embora também neste aspecto haja muito trabalho a fazer nas cidades portuguesas, a verdade é que em alguns municípios já se implementaram serviços ao domicílio, gratuitos ou parcialmente gratuitos, que consistem em pequenas reparações - trabalhos de electricidade, carpintaria, canalização, serralharia, entre outros -, compra e entrega de medicamentos e outros bens essenciais, recolha e deslocação de cargas, como por exemplo mobílias. São disso exemplos os projectos Bricosolidário, prestado pela Câmara Municipal da Guarda, Câmara Amiga, da Câmara Municipal de Vale de Cambra, Apoio Social Beneficiário Habitacional, promovido pela Câmara Municipal de S. João da Pesqueira, Programa de Melhoramentos Habitacionais, da Câmara Municipal de Mértola, Águeda Solidária, disponibilizado pela autarquia de Águeda. E tantos outros. Muito se faz em prol do bem-estar dos idosos, mas muito mais falta fazer para melhorar a vida dos mais velhos. É como sublinha Teresa Almeida Pinto: “Nenhuma cidade é tão boa que não possa melhorar e nenhuma cidade tão má que não possa também melhorar”. Melhorar com coisas simples como levar a leitura a casa de quem se encontra acamado ou não sabe ler. Como fazem alguns jovens voluntários de Gondomar, no âmbito do projecto Visitas a (VA)Ler, promovido pela Biblioteca de Fânzeres. Tornar as cidades mais amigas dos idosos, adaptando as suas estruturas e serviços para que estes sejam acessíveis e promovam a inclusão dos que têm diferentes necessidades e graus de capacidade, é importante não só para os beneficiários directos como para toda a gente. E disso não duvida Teresa Almeida Pinto, que afirma de forma convicta, que “uma cidade amiga dos idosos é uma cidade amigas das pessoas de todas as idades”.


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Muito prazer em correr Para trás ficou uma vida de trabalho. Agora é hora de viver os anos dourados com saúde e actividade física. Aqui estão alguns seniores que se recusam a passar os dias agarrados ao sofá. Porque a rua é um bom sítio para se fazer exercício e ganhar saúde.

Texto: Manuela Garcia Fotografia: Rogério Martins

Onde é que já vai o tempo do jogo da bola, do arco e do pião? Os dias passados a jogar ao elástico e à macaca, a saltar à corda? E que corpo ficou depois das corridas para a escola, para o emprego e pelos filhos? Que corpo é este que chega agora à idade em que os horários rígidos são metidos no bolso? É sobre seniores com energia de que hoje falamos. Saem para a rua para fazer caminhadas, usar os equipamentos de fitness dos jardins públicos e ganhar resistência física. São a mais duradoura geração de idosos que teima em ser feliz, apesar da actual crise lhe ensombrar os dias. Mas andar a pé pelas ruas, parques e jardins ainda é grátis. Eduardo Abreu é um desses seniores que não dispensa a actividade física. Quase a completar 75 anos, este antigo oficial do Exército não pára. Praticamente todos os dias desce do Restelo, onde mora, segue para os jardins de Belém, aproveita a frente de rio para chegar até à Doca de Santo Amaro e voltar de novo a casa. “Dantes corria. Sempre fiz educação física,

desde o liceu. Mas o meu ortopedista desaconselhou-me a fazê-lo porque o esforço sobre a coluna, apesar dos sapatos adequados, dava origem a que, de vez em quando, tivesse inflamações nas vértebras, na zona lombar e então disse-me para transformar a corrida em caminhadas”. É hora e meia a duas horas em passo bem apressado. Uma rotina que já leva 17 anos, tantos quanto os anos da reforma. E explica porque não dispensa este exercício bem exigente logo pela manhã: “Ginástica podemos fazê-la com um aparelho qualquer, inclusive nestes públicos que há por aí. Mas para melhorar a resistência cardiopulmonar é fundamental fazer esforços prolongados deste tipo”. E orgulha-se de ter “um coração óptimo”. Ginástica no Jardim Em algumas cidades são chamados de aparelhos geriátricos, noutras de fitness. O importante é que estas máquinas começam a fazer parte de alguns espaços públicos, um pouco por todo o País. No Porto, a Quinta do Covelo, na freguesia de Paranhos é o único espaço verde a pôr à disposição do público da Invicta este tipo de

aparelhos, informa-nos o Departamento Municipal de Jardins. Já em Coimbra, o departamento homónimo dá-nos conta de seis espaços dotados com aparelhos geriátricos. O que tem maior utilização e, por consequência, exige mais manutenção é o do Jardim Praça da Canção, mesmo junto ao Mondego. Em Lisboa, dos 126 jardins e parques municipais, em 18 deles há aparelhos de fitness à disposição de todos. O de Belém, mesmo junto ao Tejo é um dos mais procurados. Por ali, há sempre quem pare para fazer uso das máquinas e suar as estopinhas. Como Carlos Alves, que o frequenta há três anos desde que um vizinho lho indicou. Mora na Ajuda e um quarto de hora a pé é o suficiente para ali chegar. Faz de tudo um pouco, assume. E já sente melhorias. “De noite, acordava várias vezes, agora acordo uma duas vezes e está tudo bem”. Mas antes, de começar o exercício, “primeiro, faço o aquecimento, depois é que vou para os aparelhos e faço tudo”. Aliás, tanto o aquecimento, como os alongamentos a fechar uma sessão de exercício físico são de extrema importância. “Fazer o alongamento no final de uma ac-

tividade reduz imenso as consequências em termos de dores musculares, rigidez muscular que possa aparecer no dia seguinte”, sublinha Francisca Fernandes, especialista na área de fisioterapia do envelhecimento e a trabalhar há seis anos com população sénior no Estádio Universitário de Lisboa, onde também ministra aulas de hidroterapia. Também Laura Sousa quase todos os dias do ano desce do Príncipe Real até à frente do Tejo, em Belém, para aí dar uso aos aparelhos. São quase 7 km. Sai de casa cerca das oito da manhã e uma hora depois ela aí está. Faz os exercícios 20, 50 vezes, o que lhe apetecer no momento. “É óptimo e é grátis”, diz por entre risos. “Com as nossas pensões, que são muito baixinhas, ir para um ginásio com este custo de vida não dá”. Dos 66 anos que já conta, viveu toda uma vida a trabalhar como funcionária pública. Primeiro como responsável por uma lavandaria, onde esteve 25 anos e os oito seguintes, numa recepção. “Foi sempre uma vida muito sedentária, agora vingo-me nas caminhadas”. Não é de relações muito próximas com a vizinhança. E com estes passeios sente-se melhor ao nível da

mobilidade e também no ânimo: “Não se conversa muito aqui, não se fazem muitas amizades, mas sempre há uma pessoa ou outra que dá os bons-dias ou pergunta como estamos e vou para casa com outra disposição, vou muito melhor. E o estar aqui a olhar para o rio, isto é uma sorte”. E esta alegria tem razão de ser. “Esta geração de idosos que actualmente temos é duradoura. Com todos os avanços da medicina permite-lhes chegar aos 90 ou 100 anos e em muitos casos com qualidade de vida, muitos activos, alguns deles de idade muito avançada, como o cineasta Manoel de Oliveira” sublinha a fisioterapeuta Francisca Fernandes. Mais, “são realmente activos porque nasceram numa altura em que não havia muito mais a fazer do que andar a pé, cultivar o jardim, passear bastante.Não havia tantos vícios nem tanta comida má”. Mas esta especialista não está tão optimista quanto aos próximos seniores, os que actualmente têm 50 e poucos anos. Apresentam “problemas complicados: hérnias discais e lesões derivadas do sedentarismo”. “São pessoas relativamente jovens, mas muito pouco motivados para a prá-


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tica do exercício físico, com muito poucas referências corporais, grande parte deles com um défice de coordenação grande. Que não teriam razão de ser nesta geração”. E vai mais longe: “Assustam-me porque constato aquilo que todos nós sabemos: as políticas de um envelhecimento activo e de um estilo de vida saudável não existiam e continuam a existir muito pouco”. Daí ser tão importante que cada um descubra e se sinta bem a fazer um determinado conjunto de exercícios físicos. “No fundo é encontrar uma actividade que lhes dê prazer, que os motive, que lhes dê vontade de ir e no dia seguinte ir de novo, quer esteja frio, quer faça calor”, conclui a especialista em fisioterapia do envelhecimento. E o casal Amélia e Maurício Mar-

tins, da Amadora, são o exemplo de quem já não passa sem uma hora a utilizar as máquinas de fitness, com o rio Tejo como testemunha. “Mesmo a chover voltamos na mesma, para a passadeira, ali chama-se patins, para o step, para os equipamentos que não estão molhados. Sempre. Comprámos uma capa para cada um e a gente vem”, assevera ela. E o ritual desta dupla mantém-se há quatro anos, altura em que Maurício se aposentou da PSP. Amélia tinha “um negócio que não estava a dar nada, tive de fechar”. Hoje com 57 anos não pensa em prescindir deste exercício matinal dia sim, dia não. “Às oito vamos à Vela Latina tomar o pequeno-almoço, deixamos lá o carro e caminhamos para aqui”. Ao todo, fazem uma média de seis km a pé. “Mais a manuten-

ção aqui, isto representa mais cinco anos de vida, sinto-me um rapaz novo”, diz Maurício por entre gargalhadas. “Quando a gente começa, chega aqui, somos uns velhos autênticos. Não há a prática de manipulação dos objectos. Mas quando entramos nesse ritmo diário, a gente faz isto com uma perna às costas; começa aqui a fazer cinco ou seis flexões ou abdominais e ao fim de meio ano faz 40-50 ou mais, na maior”. Quando não vêm para Belém, por norma vão para o circuito de manutenção, perto de casa. Começa no Jardim da Amadora e termina nos moinhos da Funcheira. Mas enquanto tiverem possibilidades económicas, Belém é o sítio de eleição. “Até ver, está tudo a correr bem mas da maneira que nos estão a cortar nos vencimen-

tos, qualquer dia vou privar-me de fazer isto. Infelizmente, não vou ter fundo de maneio para isto. Vou ter de fazer opções. É pena mas, olhe…” afirma o antigo chefe da Polícia. Já Amélia é mais peremptória e está mesmo disposta a vender a autocaravana, que lhes permite percorrer o País e andar sem roteiro – algo que muito apreciam – a deixar de fazer estes passeios matinais junto ao rio. Terminado este ritual, regressam à Amadora. “Agora chegamos a casa, é tomar um banhinho, fazer o almoço, almoçar e à tarde é para a cultura, a ler o jornal. E vou passar a comprar o Jornal Sénior”, afirma Maurício Martins com simpatia. E remata bem-disposto: ”Agora é aproveitar ao máximo a vida, estar metido em casa não dá”.

O que deve ter em conta antes da actividade física

Para quem depois de uma vida de trabalho queira agora começar uma actividade física é aconselhável fazer uma consulta com o médico de família: para ver como está a parte respiratória, fazer análises clínicas, fazer uma boa auscultação para verificar se o coração está a funcionar bem

e se vai aceitar bem o início da actividade física. Já no caso de haver queixas, por exemplo, dores na coluna ou num joelho e se isso afectar o exercício, aí deve consultar-se um fisioterapeuta, um médico fisiatra ou um ortopedista, para saber se no início terá de haver uma medicação

SOS, um anti-inflamatório leve. Na rua, ao vestuário confortável deve aliar-se calçado adequado para fazer marcha, para usar os aparelhos de fitness ao ar livre. Algo muito importante: andar sempre com uma garrafa cheia de água e beber durante o desempenho destas actividades.

Jardins com aparelhos de Fitness Cientes da importância do exercício físico na melhoria da qualidade de vida das populações, especialmente a mais sénior, mas não só, alguns municípios começaram a dotar os parques e jardins com os chamados aparelhos de fitness ou geriátricos. São resistentes, de fácil manipulação e ao alcance de todos. Saiba onde estão LISBOA: http://www.cm-lisboa.pt/viver/ambiente/ jardins-e-parques/aparelhos-de-fitness PORTO Quinta do Covelo: www.cm-porto.pt/gen.pl?p=stories&op =view&fokey=cmp.stories/2385 COIMBRA: Jardim Praça da Canção Jardim Praça dos Açores Junto à Piscina Municipal em S. Martinho do Bispo Junto à Piscina Municipal na Pedrulha Parque Infantil de Eiras Urbanização Valverde – Santa Clara


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Iniciativa promovida pela Rádio SIM põe toda a gente a mexer

A menina dança? Os chás dançantes da Rádio SIM são um êxito entre a população sénior, à qual a estação se destina. A Orquestra Royal toca as favoritas dos velhos tempos que, afinal, ainda põem todos a mexer. A idade não pesa quando nos divertimos. Texto: Filipa Faustino Arenga Fotografia: Rogério Martins

Das centenas de pessoas que saem da composição do metropolitano que acabou de chegar ao Cais do Sodré, destacam-se duas senhoras de vestidos festivos, rendas, apontamentos de lantejoulas; maquilhagem e cabelo a condizer. Adivinhando que partilham o destino final da viagem, alguém lhes pergunta se sabem onde é o Mercado da Ri-

beira. Não precisa de dizer mais. “Vai ao baile da rádio? Nós também! Venha connosco.” E vão, estugando o passo: já são quase quatro da tarde. No átrio do salão de festas do mercado histórico, juntam-se centenas de pessoas para o Chá Dançante organizado pela Rádio SIM, um evento que se repete desde 2009, em diferentes locais do País. Um segurança paciente vai regulando o fluxo para o interior e a palavra espalha-se: já não há bilhetes. Maria, chame-

mos-lhe assim, veio de Sacavém com o marido e ficou à porta. Está desiludida: “Não tínhamos pensado vir, mas gosto de dançar e a Rádio gosta de nos provocar...”. Para a próxima, afiança, “compro os bilhetes mais cedo”. Carminda, 77 anos, e o marido, Manuel, 81, também ficaram à porta, mas não se apoquentam – “fica para a próxima. ARádio SIM está sempre comigo. A Inês [de apelido Carneiro, locutora da estação] está sempre lá em casa”, justifica, como se de uma filha se tratasse.

“Não precisamos de homens para nada!” Na pista, não há acanhamentos. A banda Royal arranca com um medley de Frank Sinatra e de imediato os convivas lançam-se ao que ali vieram fazer: dançar, conviver, divertir-se. Não há tempo a perder. Raquel, Georgia e Beatriz vêm da Rinchoa, nos arredores de Sintra, e entregam-se à música com um sorriso nos lábios. “É a primeira vez que vimos, por curiosidade”, diz Geor-

gia, apenas desacelerando o movimento. “Sou ouvinte da Rádio e desafiei as minhas amigas porque adoramos dançar. Ainda convidámos um senhor, mas levámos uma tampa... Mas não precisamos de homens para nada!”, graceja. E demonstra a razão que tem continuando a dançar. São mais de quinhentas pessoas e há de tudo: sozinhos e acompanhados, vestidos a rigor e com traje informal, saltos agulha e solas de borracha, pares de cara colada e grupos apartados, braços

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“Todos os dias peço a Deus que me deixe levantar para ir dançar”

“Estou sempre desejando que chegue sexta-feira para ir aos bailes. E danço muito em casa, sozinha, a ouvir rádio.”



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partidos e aparelhos cervicais, os profissionais de passo atinado e os que improvisam conforme o ritmo. A lotação da pista não permite linhas rectas: para atravessá-la, há que balançar também. Assim, ninguém esbarra. De resto, nem outra coisa é possível: a música contagia, começa-se a trautear, o pé teima em acompanhar o ritmo, os ombros abanam e, de repente, todo o corpo acompanha. Por fim, na cara rasga-se o sorriso inevitável. É o poder da música.

“Uma boa razão para sair de casa”

“Se não dançasse, estava na cama” Maria Adelaide dá nas vistas, não pelo seu vestido de cetim vermelho com brilhantes mas pela energia e passos radicais. É uma visita habitual de bailes e dos chás dançantes da Rádio SIM. “Todos os dias peço a Deus que me deixe levantar para ir dançar”, diz. Não lhe pesam os 82 anos nem uma vida de ganhos e perdas. O marido, que conheceu e começou a namorar num baile, morreu há mais de duas décadas. Há um ano perdeu uma filha e a outra vive no estrangeiro. “Se não dançasse, estava numa cama”, assegura. “Estou sempre desejando que chegue sexta-feira para poder ir aos bailes. E danço muito em casa, sozinha, a ouvir rádio”. Hoje, Maria Adelaide dança com José Henriques, professor de danças de salão sociais: “sociais porque o importante não é a competição, como agora há muito, mas o convívio, o bem-estar e o exercício. Digo sempre aos meus alunos que a melhor ginástica que podem fazer é dançar, porque mexem os músculos todos e ainda faz bem à cabeça. Estar com outras pessoas num momento de pura diversão também é muito

Agenda Mercado da Ribeira (Lisboa) Os próximos bailes do Mercado da Ribeira estão marcados para os dias 24, 25, 26, 29 e 31 de Maio. Entrada: 3 euros ou 4,5 com lanche Jardim da Estrela (Lisboa) É já no próximo domingo, dia 26, que a rádio SIM organiza mais um baile, desta vez no jardim lisboeta. A orquestra Royal assegura o ritmo deste evento que decorre das 15h às 19h. Alunos de Apolo (Lisboa) A instituição acolhe todas as sextas-feiras matinés que são já um clássico. As senhoras entram de graça, os senhores pagam 2,5 euros.

importante em especial para nós a quem, durante muito tempo, isso não foi permitido”, garante José Henriques. Tem alunos “dos 7 aos 90” e afirma ter “tirado o chumbo dos pés de muita gente”. Um deles é Mário Sereno, que só alinhou nas aulas de danças

de salão para aperfeiçoar o estilo porque, na verdade, sempre dançou, “mesmo nos bailes pimba”: “Não tenho um estilo preferido, desde que dance já me sinto bem, é maravilhoso”. Assim que acaba a entrevista, levanta-se e vai para a pista.

Carnaxide (Oeiras) A C.M. de Oeiras organiza, no dia 1 de Junho, o Baile Sénior dos Santos Populares, em Carnaxide. A festa começa às 15h e a entrada é gratuíta. Santa Luzia (Algarve) A Associação Âncora organiza chás dançantes todas as últimas sextas-feiras do mês. O próximo é no dia 31, pelas 15h, no bar Meia Pipa. Entrada gratuita. Évora A associação Pé de Xumbo organiza bailes todos os terceiros domingos de cada mês. No dia 16 de Junho acontece o próximo, no Espaço Celeiros, pelas 17h.

Anita Guerreiro

“Fico muito feliz por ver as pessoas felizes” A fadista Anita Guerreiro foi uma das figuras presentes no Chá Dançante da Rádio SIM. “Já não danço, mas fico muito feliz por ver as pessoas felizes”. A fadista, um marco

da cultura portuguesa, afirmou ainda que ficou “babada” com a qualidade da orquestra. “Temos excelentes músicos mas muitos vivem mal, não têm trabalho. Ver

aqui esta orquestra maravilhosa, com a capacidade de deixar esta gente feliz, enche-me de satisfação”, refere ainda Anita Guerreiro que, para além de actuar regularmente na casa de fados Faia, está até ao final do ano em digressão nacional, juntamente com Octávio de Matos e Natalina José.

“Sabemos que muitos dos nossos ouvintes gostam de dançar e têm poucas oportunidades para isso. Através das nossas iniciativas, queremos acabar com esta ideia de que os velhos só estão em casa, sentados. Se tiverem uma boa razão para sair, saem”, afirma Dina Isabel, directora da Rádio SIM. Não se cansa de cumprimentar pessoas e entre beijinhos e apertos de mão conta, com satisfação, que “há pessoas que passam pela Rádio só para dizer olá ou entregar uma flor”. A mesa reservada aos profissionais da estação está repleta de petiscos e doces oferecidos pelos ouvintes que ali se deslocaram naquela tarde, também para estar mais perto dos que lhes preenchem os dias com música e companhia. Mais uma pessoa a aborda e dá-lhe os parabéns. “As estrelas dos chás dançantes são os profissionais da estação. Fazemos parte das vidas das pessoas e esta também é uma forma simpática de nos aproximarmos deles”. No popular Facebook, refere Dina Isabel, a Rádio já tem mais de 11 mil amigos, sendo que “alguns deles começaram a usar o computador só por nossa causa”. Para além da “afectividade e proximidade”, uma das marcas da Rádio SIM, afirma, “é encarar os seniores com optimismo e promover essa atitude positiva”. Para além dos chás dançantes, organiza anualmente uma gala, “com artistas também eles seniores, muitos deles esquecidos pelo grande público mas que continuam activos e com a capacidade de trazer muita felicidade às pessoas”.

Mafra Em Jerumelo, no dia 26, pelas 16h, a Associação de Socorros organiza uma matiné dançante. Na Tesoureira, no mesmo dia, às 22h30, a banda Turno da Noite assegura o baile. Viana do Castelo Acontece dia 25 de Maio, pelas 21h30, em Darque, Viana do Castelo, um Baile à Antiga, na sede da SIRD.

Dina Isabel, directora da Rádio SIM



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Jóias que perfumam E se de repente ao usar uma jóia, esta lhe mudasse o estado de espírito por conter pequenas gotas de aroma relaxante ou revigorante? Saiba que essas jóias perfumadas já existem e o conceito está a ser desenvolvido por uma exinvestigadora das áreas de Farmácia e de Medicina: Carolina Mota. A ela está a juntar-se um grupo de criadores tanto designers de jóias como investigadores para aperfeiçoarem os aromas e cremes perfumados.

Texto: Manuela Garcia Fotografia: Rogério Martins

Esta não é uma invenção de agora. O conceito remonta à Idade Média, em que as senhoras usavam bouquets perfumados com um efeito protector e ao mesmo tempo sentimental. Pois se por um lado as condições sanitárias da altura deixavam muito a desejar, por outro, já há muito que se conheciam os efeitos terapêuticos das plantas aromáticas que, mais do que cheirarem bem, davam bem-estar e tranquilidade. Esses bouquets perfumados tinham um nome: tussie-mussie e na época Vitoriana atingiram o seu auge. E este conceito foi a pedra de toque para, no ano passado, Maria Carolina Mota começar a pensar em dar corpo a um novo projecto de aliar ciência e arte. Ou seja, fazer cremes e perfumes para aplicar em jóias. Desde que, em 2001, deixou o trabalho de investigadora no IBILI (Instituto Biomédico de Investigação de Luz e da Imagem), em Coimbra, onde desenvolveu um trabalho ligado ao envelhecimento ocular, que sempre quis juntar ciência e arte. Fez formações na Sociedade de Belas Artes, na Fundação Ricardo Espírito Santo, no Centro Cultural de Belém e na Gulbenkian, num centro de artes em Aveiro,

e mesmo em Inglaterra. E sempre com um pensamento: “De que maneira vou jogar com aquilo que gosto de fazer?” Foi quando lhe surgiu a ideia do projecto ART4USE. “Consistia em pegar em materiais que tinham terminado o seu ciclo de vida e, ao modificá-los e/ou associando-os a outros, dar-lhes dignidade para poderem continuar com uma outra função”. E conta que conseguiu processadores de computador “que têm uns piquinhos em ouro e davam umas peças muito giras”. Mas todas elas tinham um senão: não podia fazer colecções. “Pois se eu andava à procura de peças que já não serviam para nada, era muito difícil encontrar peças que tivessem as mesmas características”. E aí decidiu que tinha de encontrar algo comum a todas elas. E no baú de memórias apareceram as aulas da licenciatura em Farmácia na Universidade de Coimbra, onde sempre gostou de estudar a técnica e a galénica farmacêutica. Esta dedica-se à produção de medicamentos ou cosméticos a partir de plantas. “Na altura, não fazíamos perfumes, mas fazíamos os cremes e era muito agradável”. E assim chegou ao que pretendia: “Quero fazer uma coisa que possa ser rentabilizada, mas que tenha um conceito completamente diferente, de tranquilidade, de intimidade, de bem-estar e, portanto, vou pensar numa

maneira de fazer peças que possam ser perfumadas com esses aromas que eu vou criar”. E assim nasceu em Coimbra a Tussie-Mussie, a marca de bio/eco jóias, adereços e aromas. Cheira bem, faz bem Começou a pesquisar e a melhorar fórmulas farmacêuticas antigas. Sempre com o objectivo de produzir mas não uma produção industrial. Antes, com regras bem definidas: “Queremos plantas aromáticas cultivadas em Portugal e de cultura biológica; queremos que a maior percentagem de óleos essenciais, se possível os 100%, seja produzida no nosso País. Queremos que os produtos sejam preparados exclusivamente por fórmulas galénicas, isto é: evitar tudo aquilo que seja de origem animal. Por várias razões: muitas vezes para conseguir os fixadores de perfumes temos de matar os animais para obter as células sexuais. É quase como ter um casaco de peles de vison; os fixadores que uso são óleos de resinas, até são portuguesas, do campo português”. E assim começou a desenvolver, com o apoio logístico de laboratórios da Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra, a produção de perfumes naturais, óleos essenciais e cremes. E há quatro aromas base: o chocolate/menta, que

é reconfortante; o lavândula ou alfazema que relaxa; o rosmarinus ou alecrim que tem efeito revigorante e citratus ou erva príncipe, que é relaxante e repele insectos. O que no fundo Maria Carolina Mota quer é “ter aromas a que chamo tussie-mussie, porque representam os bouquets perfumados do séc. XXI; É com esses aromas, que podem ser melhorados e adaptados aos dias de hoje, que se perfumam as jóias e os adereços que fazemos, quase tudo o que nós quisermos, para nos manter bem em nossa casa”.

Queremos plantas aromáticas cultivadas em Portugal e de cultura biológica; queremos que a maior percentagem de óleos essenciais, se possível os 100%, seja produzida no nosso País E assim, começou a pensar em peças que queria fazer e que pudessem agregar os já referidos perfumes naturais. E há maneiras mais ou menos tecnológicas de o


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fazer. Ainda contactou um especialista da Universidade de Aveiro, no sentido de saber se deveriam apostar nas nanopartículas, para transportar o aroma. Mas tal hipótese revelou-se ineficaz, ao fim de algum tempo as nanopartículas deixam de cumprir a função. Seria muito investimento para muito pouco. Daí resolveu simplificar. E optou por perfumar as jóias através de um de dois processos físicos. Ou impregnando a jóia com o perfume, absorvendo-o ou mantendo o perfume à superfície da jóia, e em ambos os processos mantém-se o aroma, que é o mais importante. Amigas em parceria No Verão passado, numa acção de formação em joalharia com cerâmica e materiais nobres, no Cencal (Centro de Formação Profissional para a Indústria Cerâmica), em Caldas da Rainha, Carolina Mota conheceu Leonor Vasco e Lucinda Almeida. No tempo que passaram juntas não houve lugar para grandes trocas de ideias, de tão ocupadas que estavam nas tarefas. Uma semana depois, Carolina entrou em contacto com Leonor. “Tinha gostado muito do meu trabalho e do da Lucinda”, ambas com larga experiência em cerâmica, e propôs-lhes parceria, revela Leonor Vasco, designer e professora aposentada. A primeira é de Coimbra, as outras duas são de Lisboa. Daí até marcarem presença, em Outubro último, no Lisboa Design Show, na FIL, foi um passo. “Tivemos muita adesão por parte do público, gostaram muito das jóias e do conceito tussie mussie, o que nos deixou agradadas mas nem sempre isso se traduz em compras”. Leonor e Lucinda apresentaram jóias feitas em porcelana e prata ou com fios de silicone. Já Carolina apresentou jóias em bio-eco-design, aproveitando rendas antigas associadas a prata e outros materiais. Todas registaram vendas. Leonor Vasco, aposentada desde o início do mês, está de momento à procura de um atelier “para ter um espaço próprio para criar”. Quer continuar a fazer jóias e, sobretudo, peças de cerâmica, que produz há algum tempo, por frequentar acções dos mestres barristas. O ter sido professora durante 30 anos deixou-lhe o gosto pelo trabalho com crianças, “gostava de dar workshops de reutilização de materiais,

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fazendo instrumentos musicais, associando arte com música”. O céu é o limite O facto de ter viajado por meio mundo e ter estabelecido inúmeras parcerias internacionais enquanto investigadora ligada à medicina, fizeram de Carolina Mota uma

Conseguimos processadores de computador, que têm uns piquinhos em ouro e dão umas peças muito giras pessoa comunicativa, arrojada e muito lúcida, mesmo quando fala em relação a esta sua nova paixão: a marca Tussie-Mussie. “Estamos a atravessar uma fase complicada no nosso País e aqui poderemos passar a nossa mensagem a algumas pessoas, mas a um número muito reduzido”. Daí que através da micro-empresa que criou, a Passado Presente, esteja já em reuniões e a trabalhar para a próxima etapa: internacionalizar a marca. “Estou já a desenvolver um projecto de viabilidade económica e ao mesmo tempo a fazer um estudo de mercado; desejo dentro de algum tempo experimentar Inglaterra, o mercado inglês”. O conceito é originário de lá, e sublinha: “Há pouco tempo vi a rainha Isabel com um tussie-mussie na mão; é uma palavra que não se usa muito cá mas o conceito está expandido pelo mundo inteiro, é globalizado através dos casamentos e das festas, não há sitio nenhum onde não haja um bouquet perfumado”. Para esta empreendedora, o céu é mesmo o limite. “Não quero franchisings, empréstimos ou business angels, isso são tudo encargos brutais. Com o meu pequeno capital, até onde eu puder ir, vou. Mas as pessoas podem desenvolver parcerias comigo para termos um ‘bolo’, um investimento maior”. E não tem dúvidas: “Individualmente não se chega a sítio nenhum, tem de haver parcerias; e para este projecto quero pessoas que se integrem no espírito que queiram manter-se activas ou pela sua idade ou pela sua maneira de ser”. Já que este, mais do que um projecto comercial é “o projecto para esta fase da vida”.


24 CONVÉM SABER

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

Retroactividade nas pensões

Quem vai pagar a factura dos 740 milhões? O Governo de Pedro Passos Coelho anunciou, no início deste mês, um pacote de medidas que afecta directamente os pensionistas e os reformados. Apesar de ainda nada estar decidido, já consta da 7ª avaliação da Troika e pode ser incluído no Orçamento do Estado para 2014. Para a APRe! – Associação de Aposentados, Pensionistas e Reformados estas medidas anunciadas são “uma perseguição aos reformados”.

Texto: Alexandra Peixinho Abreu Fotografia: Rogério Martins

Numa carta que o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, enviou no início deste mês à Troika vem mencionado um pacote de medidas que diz directamente respeito aos reformados e pensionistas. Deste pacote consta o aumento da idade da reforma sem penalizações para os 66 anos; a aplicação de uma taxa contributiva variável em função do rendimento da pensão, que pode ir dos 3,5% aos 40% e a convergência da Caixa Geral de Aposentações para a Segurança Social. Estas medidas já constam da 7ª avaliação da Troika e estão pensadas para serem incluídas no Orçamento do Estado para 2014. Cada uma das medidas merece por si só uma análise sobre o seu impacto na vida orçamental dos pensionistas. Lá chegaremos, num outro artigo, numa futura edição. Neste número do Jornal Sénior vamos incidir sobre a Convergência da Caixa Geral de Aposentações para a Segurança Social e procurar perceber o que isto significa. O que está em cima da mesa Nas declarações feitas ao País, Pedro Passos Coelho não foi claro sobre quem é que será exactamente atingido por esta me-

dida que impõe uma equiparação nas fórmulas de cálculo das pensões usadas no sector público ao sector privado. O primeiro-ministro apenas afirmou que seria necessário “proceder à convergência das regras de determinação das pensões atribuídas pela Caixa Geral de Aposentações com as regras da Segurança Social, fazendo com que os trabalhadores do sector público e privado fiquem numa situação de maior igualdade, o que não acontecia até agora”. Não fica claro, por isso, se esta convergência nos cálculos das pensões abrange apenas os funcionários públicos que se vierem a reformar a partir de 2014 ou se também poderá afectar os actuais pensionistas. Se assim for, será necessário fazer um novo cálculo retroactivo do valor da reforma. No entanto, e de acordo com Carlos Frade, economista e Presidente do Conselho Fiscal da APRe! – Associação de Aposentados, Pensionistas e Reformados, “o Governo refere que com esta medida pretende poupar 740 milhões de euros já em 2014. Ora, o Governo não explica como chegou aos 740 milhões de euros em 2014 e outros 740 milhões de euros em 2015. A verdade é que será fácil de inferir que pretende fazer retroagir os cortes sobre as pensões já atribuídas, ou seja, sobre os direitos já constituídos. Isto porque, contas feitas, e visando apenas os futuros pensionistas, é impossível a obtenção de uma poupan-

ça anual de 740 milhões de euros”. Carlos Frade alerta para o facto de estarmos “a tratar de matéria muito complexa, não só do ponto de vista de ofensa básica de direitos, como de situações de cálculo não homogéneas, quer entre sistemas, quer intra-sistemas”. (Ver quadro).

Idade da reforma

Como se calculam as pensões hoje Para os funcionários públicos que entraram nos quadros da Administração Pública depois de 1993, as fórmulas de cálculo das pensões já são iguais às do sector pri-

Público

Privado

65 (66?)

65

Trabalhadores admitidos até 31 de Agosto de 1993

Trabalhadores inscritos até 31 de Dezembro de 2001

Tem por base o último salário em 2005, revalorizado com base na evolução salarial da função pública e a média da carreira contributiva de 2005 em diante

Cálculo das pensões

Trabalhadores admitidos a partir de 1 de Setembro de 1993 Aplica-se as regras do privado (melhores 10 dos últimos 15 e média da carreira contributiva

Duas parcelas. A primeira conta os melhores 10 dos últimos 15 anos de descontos até 2006 (para que se reformar até 2016) ou até 2001 (para quem se reformar de 2016 em diante). A segunda parcela é a média da carreira contributiva contada de 2006 ou de 2001 em diante, consoante a data da reforma.

Trabalhadores admitidos depois de 1 de Janeiro de 2005

Inscritos de 1 de Janeiro de 2002 em diante

Inscritos no regime de segurança social: pensão calculada com base em toda a carreira contributiva

Pensão calculada com base em toda a carreira contributiva Fonte: Memorando APRe!


CONVÉM SABER 25

23 MAIO 2013 · JORNAL SÉNIOR

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Em que consiste a convergência da CGA para a Segurança Social e respectiva retroactividade?

O Governo ainda não explicou como pretende fazer a convergência das regras de cálculo das pensões do sector público e privado

Se o cenário de aplicar de forma retroactiva as novas regras de cálculo for assumido, levanta questões de ordem constitucional, principalmente no que diz respeito à protecção dos direitos adquiridos

vado. Mas para quem entrou antes desta data, a fórmula é diferente, o que abrange a grande maioria dos pensionistas actuais. Os pensionistas que se reformarem hoje devem ter em conta duas componentes no cálculo da sua pensão: a primeira componente é até 2005 e deve assumir-se como referência o valor do ordenado recebido em Dezembro desse ano, a que se deve juntar os aumentos salariais até ao momento. A segunda componente é o ordenado médio registado entre 2006 e 2013. No regime geral também devem ser tidas em conta duas componentes para o cálculo das pensões para quem começou a trabalhar antes de 31 de Dezembro de 2001: a primeira leva em conta os dez melhores ordenados dos últimos 15 anos até Dezembro de 2005. A segunda componente é o ordenado médio registado entre 2006 e 2013. O Governo ainda não explicou como pretende fazer a convergência das regras de cálculo das pensões do sector público e privado, “mas se se assumir o cenário de aplicar de forma retroactiva as novas regras de cálculo, tal levanta questões de ordem constitucional, principalmente no que diz respeito à protecção dos direitos adquiridos pelos actuais pensionistas”, alerta Carlos Frade da APRe!. Ainda assim o relatório da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, apresentado na passada semana em Paris, também defende a inclusão dos pensionistas actuais da Caixa Geral de Aposentações nos cortes que o Governo propõe. A OCDE concorda que os cortes nas pensões da Caixa Geral de Aposentações devem ser retroativos. O relatório pedido pelo Governo sobre a reforma do Estado escreve que a convergência entre os dois sistemas deve abranger não apenas os futuros como os actuais pensionistas. A APRe! manifesta-se, através do seu “memorando”, enviado à comunicação social, totalmente contra

a convergência das regras de pensões entre o sistema público - gerido pela Caixa Geral de Aposentações - e o sistema privado - gerido pela Segurança Social com efeitos retroactivos. Até porque “a convergência está em curso desde 2005 e sempre se entendeu que a mesma deve ser feita de forma gradual. Logo, é inadmissível, diríamos mesmo muito ofensivo, o Governo querer fazê-la de supetão. Ainda por cima, querer fazê-la com fundamento na aproximação do valor médio das pensões é totalmente desprovido de sentido. Só podemos comparar médias quando se trata de universos iguais, o que não é o caso. É obrigação básica de qualquer governo equacionar as decisões e os compromissos internacionais que assume dentro de quadro da Constituição em vigor e dos vínculos contratuais assumidos pelo Estado”. Corrida às reformas para evitar cortes O anúncio da convergência dos sistemas de reforma entre a Caixa Geral de Aposentações e o regime geral da Segurança Social, de que muito se tem vindo a falar, desencadeou no ano passado uma corrida às reformas que fez entrar nos serviços quase 30 mil pedidos só nos últimos três meses do ano, dois terços do total de 2012. A intenção do Governo de colocar os beneficiários da Caixa Geral de Aposentações e da Segurança Social debaixo de um “sistema de cálculo único” acabou por fazer disparar em 50 por cento o total de pedidos de reforma em relação a 2011. Apesar de a entrada dos papéis nas repartições, houve apenas luz verde para 20.734 pedidos, o que coloca o total anual 12,2 por cento abaixo de 2011. No ano passado, 70% das pensões da Caixa Geral de Aposentações tinham valores inferiores a 1000 euros e 27,3% estavam entre os 1000 e os 2000.

Carlos Frade, dirigente da APRe!

Ainda de acordo com o Relatório e Contas da Caixa Geral de Aposentações, o “afluxo excepcional de pedidos, ocorrido no final de 2012, foi desencadeado pelo conhecimento prévio do agravamento das condições de passagem à aposentação a partir de 2013 (...), sendo que os pedidos entrados em 2012 têm garantidas as condições de aposentação vigentes no ano”. Um sinal de que a apresentação do pedido de reforma terá antes de mais que ver com esse anúncio das intenções governamentais de colocar os sistemas da Caixa Geral de Aposentações e da Segurança Social sob as mesmas regras de cálculo é lido na entrada dos pedidos: a maioria foi apresentada nos últimos três meses do ano, entre Outubro e Dezembro. Os funcionários públicos procuram desta forma evitar duas das alterações impostas pelo Executivo de Pedro Passos Coelho: o aumento da idade de reforma e os cortes nos montantes das pensões.

Essa convergência traduz-se em fazer equiparar a fórmula de cálculo das pensões da Caixa Geral de Aposentações (CGA) com a fórmula de cálculo do regime contributivo da Segurança social. O que ninguém sabe, porque o Governo não esclareceu, é se essa convergência é feita para os futuros ou para os actuais pensionistas, bem como se a base de convergência a aplicar diz respeito à formula de cálculo actual ou para a fórmula de cálculo que à data em que os pensionistas da CGA requereram a sua aposentação. Se a fórmula de cálculo for a actual usada pela Segurança Social haverá também de fazer convergir os pensionistas da própria Segurança Social com pensões atribuídas antes da Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro. Grosso-modo, a fórmula actual de cálculo da Segurança Social considera 80% de toda a carreira contributiva, em que o rendimento anual das remunerações é revalorizado de acordo com os índices de inflação. Enquanto a fórmula de cálculo actual da Caixa Geral de Aposentações considera 90% da remuneração base mensal auferida no ano de requerimento da pensão, relativa ao tempo de serviço até 2005, mais os anos de contribuição após o ano de 2005 até à data de autorização da aposentação. A complexidade, as particularidades e a diversidade de situações das pensões contributivas de cada um dos regimes em análise é de tal ordem, quer em função do tempo quer em função das carreiras contributivas, que pode afirmar-se que praticamente cada caso é um caso. No entanto, especialistas que efectuaram estimativas para vários cenários, concluíram que as pensões dos reformados até 2005 teriam um corte de 11%; os reformados em 2007, um corte de 9,6%; e, os reformados em 2012, um corte de 8,3%. “A verificarem-se essas percentagens, estamos perante uma questão de injustiça agravada, na medida em que a degradação da pensão é maior no grupo de pessoas em que já consolidaram há mais tempo a sua situação de reforma e que supostamente são mais velhos e se encontram numa situação de maior fragilidade. Isto é uma perseguição aos reformados ”, remata Carlos Frade, da APRe!.


26 PRAZERES

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

O sexo na idade Sénior

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Pedro de Freitas MD, PhD Médico Sexologista Clínico Doutorado em Sexologia Clínica (EUA) Professor Associado da AACS (EUA) pfreitas1957@gmail.com

Existe uma atitude cultural que valoriza apenas a juventude e a beleza do corpo o que contribui em grande escala para que se espere que os mais idosos sejam assexuados! Nada menos verdade! Infelizmente, ainda existem muitos estereótipos que os mais idosos não são atraentes, não se interessam por sexo e que perderam a capacidade de ter uma relação sexual gratificante. Outro mito urbano… Mas, o problema é que esta variedade de atitudes negativas na sociedade acerca do comportamento sexual dos mais velhos os (nos) influencia, assim como à população em geral e aos técnicos de saúde que os (nos) deveriam ajudar. Como também bem sabemos os media também não ajudam e condicionam, nesta como em muitas outras matérias, a atitude social. De facto, está provado (estudo de Kass, 1981) que os idosos introjectam atitudes negativas às quais são expostos e se percepcionam como não sexuais. Por outro lado, está bem documentado que ao compararmos a sexualidade em múltiplas culturas, como o fizeram Winn e Newton (1982) em 106 culturas distintas, se chega à conclusão que a continuidade do relacionamento sexual na população mais idosa em muitas sociedades está ligada a factores culturais que são determinantes para esse mesmo comportamento sexual. Um “problema” que, afinal, não é A sociedade é vista como restringindo a sexualidade nos mais idosos e estudos feitos em lares da chamada 3ª idade (designação

que me desagrada tanto como quando me chamavam criança aos 16 anos…) demonstram que qualquer forma de expressão sexual é considerada um problema comportamental e que deve ser “tranquilizado” (Brown, 1989). Mais grave ainda, quando são detectados comportamentos erotizados entre os idosos nessas instituições, são interpretadas como fruto de doença, senilidade ou mesmo “falta de juízo” e frequentemente medicados para “se acalmarem”. Tal é a falta de à vontade e de preparação que os técnicos têm para lidar com uma realidade que desconhecem e um “problema” que, ao fim e ao cabo, não o é! Para além de tudo isto, e como se não bastasse, existe ainda outra realidade adversa: quem fala dos problemas sexuais com os mais velhos? Diga-me o/a leitor/a se alguém já se preocupou com esse aspecto tão importante da sua vida? Em geral o comportamento sexual na idade madura reflecte o padrão habitual ao longo da vida, isto é, os que foram mais sexualmente activos nos anos de juventude, mantêm este padrão na idade madura. Tal é a conclusão do estudo de White realizado em 1982 e que a prática clínica confirma em absoluto. Do outro lado da moeda está o facto de que as atitudes negativas em relação ao sexo aprendidas na juventude podem prejudicar seriamente a capacidade de desfrutar do sexo em idades posteriores (Deacon, Minichiello, Plummer, 1995). Apostar na auto-estima Todos sabemos que muitos casais de longa duração (algo cada

vez mais raro nas gerações posteriores às nossas) têm que lidar com o problema da monotonia da sua relação. É conhecido igualmente o impacto negativo da reforma, das alterações da performance sexual e a consequente quebra na auto-estima. Mas deveremos aceitar passivamente esta realidade? Claro que não e em artigos futuros iremos voltar a abordar esta temática com sugestões para ultrapassar esta fase tão normal e esperada. E se tudo o que foi dito atrás é importante, existe ainda outra realidade que, em Portugal e noutros países latinos, se reveste da maior importância: a religião. Ao restringir o sexo à procriação e

ignorar a importância da intimidade e prazer sexual, a religião nega, ou induz a que seja negada, esta importante componente da vida. Sei que é uma área controversa, que vivemos num país de forte tradição católica, mas nunca encontrei qualquer fundamento bíblico para esta atitude por parte da Igreja, antes pelo contrário! É lamentável que a interpretação dada pelos Homens se sobreponha muitas vezes à verdadeira mensagem Cristã, mas contra isso pouco ou nada podemos fazer. Como “dica” final gostaria de vos recordar alguns nomes mundialmente conhecidos de mulheres e homens que, apesar da sua

idade, continuaram a ser considerados símbolos sexuais: Sara Montiel, Mae West, Beatriz Costa, Jane Fonda, Sophia Loren, Henry Ford, Richard Gere, Roger Moore, Sean Connery, Pierce Brosnan e tantas/os outras/os. Apostar na auto-estima e auto-confiança é de longe o maior afrodisíaco! Como? Mais à frente iremos dar mais umas “dicas”. Boa leitura, e até daqui a 15 dias. Enquanto Sénior não escrevo ao abrigo do novo acordo ortográfico. Espero que os meus leitores me acompanhem nesta pequena rebeldia, já que na nossa idade nos podemos permitir a estes e outros pequenos luxos…



28 BEM-ESTAR

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

Campanha de alerta a doentes polimedicados

Produtos naturais que não deve tomar com medicamentos Alguns produtos naturais podem interagir com os medicamentos de forma grave. Os doentes que tomam vários medicamentos, já de si um factor de risco, são especialmente afectados pelas muitas interacções negativas possíveis com uma grande variedade de produtos de origem natural. Aloe, gingko biloba, alcaçuz, mirtilos, sumo de laranja e até o inocente chá de camomila estão na lista, entre muitos outros. Afinal, o que é natural, nem sempre faz bem. DR

“Se não fizer bem, mal também não há-de fazer”, ouve-se muitas vezes a propósito dos produtos naturais. Mas isto está longe de ser verdade e pode até induzir em erros que se traduzem num impacto negativo directo na saúde. No caso dos doentes polimedicados, na sua maioria idosos, este risco é ainda maior, uma vez que ao perigo da interacção entre os medicamentos se alia uma maior probabilidade de se ingerir produtos naturais que com aqueles interajam. O Observatório de Interacção Planta-Medicamento (OIPM/FFUC), da Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra, estuda há já vários anos a forma como alguns medicamentos são afectados pela toma simultânea de produtos naturais, tais como suplementos com os mais di-

ferentes objectivos, chás, comprimidos com produtos naturais, entre outros. Segundo Maria da Graça Campos, coordenadora do OIPM, “um factor de grande preocupação na auto-medicação é o facto de, em média, 70 % das pessoas que tomam medicamentos ditos naturais não dizerem ao médico que os estão a tomar. É de entendimento comum que o que é natural não faz mal e, não só não dizem ao médico, como ignoram que o ‘chá’ que tomam, diariamente, pode ter interferências directas com o medicamento prescrito pelo seu médico.” Informação não é obrigatória Algumas das plantas são de uso muito comum em Portugal, como a camomila e outras surgem em soluções oferecidas pelas empresas de produtos naturais que posicionam estes produtos, sob for-

ma de cremes, suplementos, cápsulas e chás, para o tratamento das mais diversas maleitas e preocupações, da falta de memória ao emagrecimento, passando por tudo o resto. Parte do sucesso de mercado destes produtos, de venda livre, assenta na premissa de não haver quaisquer efeitos colaterais. Lendo bulas, caixas e sites de várias marcas e empresas (entre as quais, as que se assumem como líderes de mercado), não se encontra quaisquer referências a possíveis interacções, sobredosagens ou toxicidade. E, na verdade, as marcas de cápsulas, infusões, chás, xaropes e outros não são obrigadas, por lei, a fornecer esta informação, o que deixa o consumidor sem informação essencial. Maria da Graça Campos diz a este propósito que as empresas “não são obrigadas mas deveriam colocar. Se sabem que podem interagir com um ou outro medicamento, isso seria uma mais-valia para

todos”. Um bom exemplo desta falta de informação pode ser a erva de São João, também conhecida por hipericão, que é comercializada livremente e aconselhada no tratamento de estados depressivos leves e ansiedade. Ora, esta planta corta o efeito da pílula anti-concepcional, diminui o efeito dos medicamentos para controlar o colesterol elevado, pode diminuir a dose de medicamentos para o cancro e pode até, se tomada em excesso, ter efeitos negativos e duradouros na saúde mental. Num site de uma popular marca de cápsulas naturais vendidas em farmácias, são descritas as vantagens da erva e no fim do texto pode ler-se que não apresenta quaisquer efeitos secundários. Mais nada. Como este, há muitos exemplos. Depende do consumidor estar informado e, antes de adquirir um destes produtos, consultar o médico ou o farmacêutico. Graça Campos diz que, “em DR

Texto: Filipa Faustino Arenga*


BEM-ESTAR 29

23 MAIO 2013 · JORNAL SÉNIOR

princípio, os farmacêuticos têm obrigação de saber tudo isto” e que as pessoas “podem e devem perguntar por possíveis interacções”. As farmácias da Associação Nacional de Farmácias dispõem de um programa informático que ajuda os técnicos a fornecerem essas informações detalhadas aos consumidores. Na consulta com o médico, “cada vez mais sensibilizados para as interacções”, deve sempre ser mencionada a toma de produtos naturais, incluindo cremes, chás, infusões e até alguns alimentos, se tomados regularmente ou em grande quantidade. “Em muitos dos casos, são os médicos que solicitam a

nossa ajuda, mais especificamente quando são urgências hospitalares.” Polimedicados em risco O OIPM lançou, esta semana, uma campanha de alerta à população polimedicada com o nome “Aprender Saúde entre as Plantas e os Medicamentos”. Anabela Mota Pinto, docente da Faculdade de Medicina de Lisboa, também fundadora do OIPM, esclarece que “geralmente é considerado que os doentes polimedicados são os que tomam mais de cinco medicamentos”, ao que acres-

cem os medicamentos de venda livre e os produtos naturais disponíveis. Conforme um estudo da Faculdade de Medicina de Lisboa, sob coordenação de Alexandra Pinto, em 2013, as doenças que mais levam ao consumo de medicamentos em Portugal são a hipertensão, a patologia articular, hipercolestrolémia (colesterol elevado), perturbações do sono e doenças cardiovasculares. Segundo o mesmo estudo, as pessoas idosas tomam, em média, sete medicamentos por dia. Por exemplo, a mesma pessoa pode sofrer, em simultâneo, de doença cardiovascular, diabetes, demência e doença onco-

lógica. O uso crónico de medicamentos acontece mais entre as mulheres e nas pessoas idosas. Graça Campos acrescenta ainda que, por si só, “a polimedicação aumenta o risco de doença iatrogénica (reacções adversas à medicação), estimando-se que o risco de reacções adversas seja de 6% quando dois medicamentos são administrados simultaneamente. O número de polimedicados em Portugal está a aumentar e esta campanha do OIPM pretende esclarecer esta população acerca das interacções que mais a podem afectar.

Medicamentos mais comuns em Portugal e as plantas que podem afectar o seu desempenho Pressão arterial alta O efeito dos anti-hipertensores (medicamentos para baixar a pressão arterial) pode ser aumentado pela toma de gingko, folhas de oliveira ou pelo alho (quando consumido em grandes quantidades na alimentação ou em suplementos). Isto significa que a pressão arterial baixará demais. O gingko está presente em muitos suplementos destinados à melhoria de memória e falta de energia. Já o chá preto e chá verde (da planta do chá Camellia sinensis), erva-mate e guaraná, podem fazer aumentar a tensão uma vez que contêm cafeína. O mesmo

pode acontecer com o ginseng asiático e o alcaçuz, presente, por exemplo, em suplementos de emagrecimento, muito populares nesta altura do ano. Diabetes Os efeitos dos medicamentos usados para controlar os níveis de açúcar na diabetes podem ser aumentados se, ao mesmo tempo, se consumirem plantas como o aloé, goma de guar, psílio, sementes de linhaça, ginseng americano, noni, mirtilos, bardana, sabugueiro, entre outros. Daqui podem resultar episódios de hipoglicémias (níveis baixos de açúcar),

que geralmente se associam à medicação e nunca com produtos que estão a ser consumidos simultaneamente. Colesterol elevado O efeito de medicamentos para baixar o colesterol (sinvastatina ou atorvastatina) pode ser diminuído pelo consumo continuado da erva de São João ou da salvia, ou mesmo pelo consumo diário de elevadas quantidades de sumo de laranja. Também pode ocorrer uma maior permanência destes mesmos medicamentos no organismo devido ao consumo de outras plantas tais como o ginseng, o aloé

ou a raiz dourada. Esta situação pode resultar numa maior incidência de efeitos secundários e toxicidade associados ao medicamento, tal como a rabdomiólise e consequentes dores musculares.

DR

Outras interacções planta-medicamento

Mais informações

Gingko biloba: pode interagir com anticoagulantes (como a varfarina), antiagregantes plaquetares (tais como o ácido acetilsalicílico, presente nas aspirinas, entre outros), medicamentos contra a pressão arterial elevada (como a nifedipina e a nicardipina), antidepressivos (como a trazodona), cardiotónicos (como a digoxina, presente nos medicamentos para a arritmia), entre outros.

A lista aqui apresentada não é exaustiva, pelo que, se toma medicamentos e produtos naturais, deve aconselhar-se junto do seu médico ou farmacêutico. O OIPM/FFUC dispõe também de uma linha de apoio à população e aos profissionais de saúde: 239488484. No site www.oipm.uc.pt (secção Base de Dados) estão disponíveis mais informações.

Aloe vera: pode interagir com medicamentos cardiotónicos (como a digoxina, pre-

sente nos medicamentos para a arritmia), diuréticos tiazídicos (usados nos doentes com tensão arterial alta), antiagregantes plaquetares (como o ácido acetilsalicílico), anestésicos (tais como o sevoflurano, desencadeando hemorragias uma vez que diminui a agregação plaquetar) e ainda com alguns antineoplásicos (usados para combater o aumento das células cancerígenas).

Chá verde: pode interagir com anticoagulantes (varfarina) e medicamentos usados no tratamento de cancro (como o bortezomib).

Camomila: pode interagir com medicamentos como a varfarina, aumentando o risco de hemorragia.

Pólen apícola: os flavonóides presentes no pólen apícola interagem com a varfarina resultando num risco de hemorragia.

Farelo de trigo: as fibras presentes no farelo de trigo comprometem a absorção da digoxina, o que significa que o medicamento pode não ter o efeito pretendido.

* Com revisão científica de Maria Graça Campos, coordenadora do Observatório de Interacção Planta-Medicamento


30 NUNCA É TARDE

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

Identificado maior obstáculo à interacção dos idosos com tecnologia digital

“Em frente a estas coisas sinto-me tolo” Ser do tempo em que bastava carregar num botão é um desafio, agora que as máquinas obedecem mais a toques, arrastos e cliques. É esta a principal barreira entre tecnologia digital e utilizadores mais velhos, revela Ian Hosking, da Universidade de Cambridge. “Os séniores tendem a culpar-se”, revela. Mas o problema não está nas pessoas, está na tecnologia, diz o investigador. Há muito para fazer na sensibilização da indústria mas o grupo que coordena criou um método para ajudar as empresas a desenhar aparelhos para todos os públicos Texto: Filipa Faustino Arenga

O senhor B., de oitenta de dois anos, é convidado a sentar-se à mesa, onde repousa um smart phone. É-lhe pedido que faça uma chamada: afinal, é um telefone. O senhor B. pega no telefone a medo, olha demoradamente para o objecto e diz: “Bom, já sei que dia é e que horas são...“, continuando a olhar para o telefone sem saber ainda como cumprir o pedido. Por fim, vê uma tecla verde ao fundo e carrega. “Verde costuma querer dizer ‘seguir em frente’, imagino que deva ser por aqui”. E era, com mais uns passos pelo meio. De seguida, foi-lhe pedido que aquecesse uma sopa no forno micro-ondas de visor digital: o processo foi igualmente desafiante. No fim da avaliação, parte de uma experiência de interacção entre seniores e tecnologia digital, o senhor B. não esconde a frustração: “Sou uma pessoa capaz,

independente, construí a minha vida a pulso, mas em frente a estas coisas sinto-me... tolo”. Esta sensação é partilhada por milhões de seniores, que se sentem pouco à vontade com a tecnologia digital, assuma ela a forma de um forno micro-ondas, um telefone de última geração, um tablet ou um computador. O prestável senhor B. foi voluntário nos testes de interacção, ergonomia e acessibilidade levados a cabo pelo Centro de Design de Engenharia da Universidade de Cambridge, Reino Unido. Ian Hosking, o seu responsável, tem dedicado a sua vida profissional ao estudo deste tema. Em entrevista ao Jornal Sénior revela que uma das principais dificuldades é a diferença de hábito de interacção: as pessoas com idades mais avançadas vêm de um tempo mecânico, em que carregar num botão correspondia a um efeito previsível na máquina e em que os símbolos eram básicos e conhecidos. A identificação que o senhor B. fez do código de cor da tecla é exemplo disto mesmo. A Era digital trouxe novos mecanismos de interacção, como o swype, o manipular por arrasto dos objectos nos ecrãs touch (de toque) e uma linguagem baseada em ícones e palavras estrangeiras com

significados muito específicos no contexto tecnológico. O tamanho das teclas, as cores, a profusão de mensagens em cada ambiente que competem por atenção e a presunção que os utilizadores conhecem a linguagem e os símbolos são outros dos entraves à interacção. A indústria parece apenas conceber produtos para os mais jovens, que cresceram com o evoluir destas tecnologias, que vêem bem, que têm dedos mais finos em mãos que não tremem. Em vez de culparem a máquina, os utilizadores seniores tendem a culpar-se e a sentirem-se inadequados. Mas há sinais de mudança na indústria. Jornal Sénior (JS) - Como surgiu o trabalho deste centro? Ian Hosking (IH) - O Centro de Design de Engenharia começou por fazer parte do programa idesign, que tinha por objectivo estudar o design inclusivo e foi lançado há já mais de dez anos. Isto foi seguido pelo programa KT-EQUAL, que se foca na transferência de conhecimento deste trabalho inicial à indústria, dando recomendações por exemplo. JS - Quais as principais conclusões? IH - A mais importante foi a necessidade de compreender e aceitar a diversidade da população no que toca a capacidades sensoriais, cognitivas e motrizes. Ou seja, como as capacidades como a visão, a audição e a coordenação fina vão mudando ao longo da vida. O factor que mais afecta a interacção com objectos mais complexos, como os chamados telemóveis inteligentes, são as capacidades cognitivas. JS - Foi criado algum instrumento que possa avaliar e guiar na concepção de aparelhos mais inclusivos? IH - Criámos o Inclusive Design Toolkit [que significa à letra: caixa de ferramentas de design inclusivo], que está disponível na internet para uso de todos os que concebam aparelhos digitais. Contém um processo e várias ferramentas e métodos para desenhar de forma inclusiva. O site é www.inclusivedesigntoolkit.com

DR

JS - Por que razão muitos seniores têm dificuldade em interagir com smartphones, internet ou outros ambientes digitais? IH - A maior barreira são as exigências cognitivas, uma vez que o estilo de interacção é pouco familiar, como é o caso do swipe [palavra que significa seleccionar conteúdos através de arrasto com

os dedos] para atender uma chamada telefónica. JS - Fala da Era analógica vs Era digital. Quais as principais diferenças entre estas duas e de que forma afectam a população sénior? IH - Na realidade, esta é uma questão complexa. Mas destaco a maior variedade de estilos de interacção disponíveis nos ambientes digitais (rato, toque, arrasto, por exemplo...) que são pouco familiares a utilizadores mais velhos, que podem ter dificuldades em apreendê-las. E é importante, sobretudo, que a tecnologia ofereça algo que seja de utilidade para os utilizadores sénior. JS - Os produtos tecnológicos vendidos como “para seniores” são na sua maioria produtos e soluções para pessoas com deficiência. Como avalia esta situação? IH - É normal ser diferente. Noutras palavras, somos todos diferentes uns dos outros e é essencial que as empresas reposicionem esta questão como uma necessidade comum a todos os utilizadores. JS - Observando os utilizadores nas suas experiências, existe algum denominador comum nas suas atitudes? IH - O que salta à vista é como as pessoas se culpam a si mesmas. É razoável pensar que isto pode fazer com que os utilizadores se sintam inadequados, quase como se não pertencessem a esta sociedade, mas é algo de muito complexo e depende de cada indivíduo. JS - Sente que os utilizadores mais velhos rejeitam a tecnologia à partida? IH - Tal como na questão anterior, depende de cada indivíduo. JS - Trabalha com a indústria. Os utilizadores seniores são uma preocupação entre os fabricantes? IH - Varia muito de organização para organização. E ver os seniores como apenas um segmento é errado. É preciso que se segmente mais este mercado para se poder abordar as suas necessidades específicas de forma adequada. JS - Como vê a aparente incoerência entre as tendências de design e da tendência demográfica, nomeadamente na Europa? IH - Pelo que tenho visto, há uma crescente atenção ao mercado dos utilizadores seniores. No entanto, há muito para fazer.


MUITO POR CONTAR 31

23 MAIO 2013 · JORNAL SÉNIOR

Luisa Frade dos Santos, Almoster

“Coisa boa é o posto de saúde e o médico” Texto: Leonor Xavier

Nasci no dia 25 de Abril de 1938, parece-me a mim que é isso. Nasci n’ Almoster, depois fui para o Casal Paúl, a minha mãe tinha lá a casa. O meu pai também era do Casal Paúl, não sei o que ele fazia, quando morreu tinha eu quatro anos. Acho que estava na tropa. Tenho um retrato dele na tropa. O dr. Veríssimo, de Santarém, tinha uma casa no Casal Paúl e era muito amigo daquela gente pobre. Foi ele quem me arranjou para eu ir para o Asilo de Santo António, em Santarém. Nós éramos quatro irmãs, eu a mais nova, tinha quatro anos quando fui e fiquei lá até aos dezoito anos sem vir a casa. A escola e tudo era lá, só vínhamos à missa à rua, sempre debaixo de forma, não podíamos falar com ninguém sem pedir ordem às senhoras que iam a tomar conta da gente. Ficávamos em camaratas que eram grandes, uma quadrada e duas compridas, estávamos lá cinquenta e tal crianças, tudo meninas. Acordávamos às sete horas, fazíamos as camas. Três vezes por semana tomávamos banho, havia umas grandes casas de banho com chuveiros e banheiras. De quinze em quinze dias vinham as visitas, tínhamos uma casa grande para as receber. A minha mãe ia lá. As meninas só iam para casa depois dos dezoito anos. Se não tivessem família, o Asilo tomava encargo de arranjar para onde elas fossem. Tenho só a 3ª classe Tínhamos uma casa de costura e uma cozinha. Fazíamos o comer, íamos três para a cozinha e duas para o refeitório, sempre com uma directora. Só não cozíamos o pão, ia lá o padeiro. Ninguém entrava sem tocar ao portão. A escola ia até à 4ª classe, lá mesmo. Eu tenho só a 3ª classe. Depois fui para a costura. Fazíamos os bibes e os sapatos para usar em casa. Havia uma mesa muito comprida e a directora ficava na ponta, a dar as linhas. Quando acabavam, a gente ia lá mostrar e pedir mais. Brincávamos. No fim do jantar íamos sempre para a cerca brincar um bocado. No Verão íamos até ao jardim ou às Portas do Sol, tudo debaixo de ordem. A gente lavava a roupa, tínhamos dois grandes tanques. Aos 18 anos saí, vim para casa da minha mãe e tornei a ir para Santarém. Para ser-

vir. Mas não gostei e vim-me embora. Depois fui para a plantação do arroz. Depois fui para Almoster servir um casal. Tinha 19 anos. Daí casei com o rapaz que estava a trabalhar na moagem da farinha para o pão para este meu patrão. Ele tinha mais dez anos que eu. Namorámos, não chegou a um ano. Casámos em Almoster e houve festa em Vila Nova, que ele era de lá. A lua-de-mel foi aqui em casa. Naquele tempo, quem é que tinha dinheiro para lua-de-mel? Nós tínhamos era fazendas. Trabalhei no campo, depois na fábrica das manilhas, depois em Santarém a dias. Casei a 27 de Outubro e o meu filho nasceu a 28 de Março. Tive mais um, mas ele morreu, tinha este seis ou sete anos. Morreu no hospital de dona Estefânia tinha dezoito dias, disseram que foi uma broncopneumonia. Tinha nascido tão bem aqui em casa, com o médico à cabeceira. Depois sempre vivi aqui. Ganhava 33 escudos por mês Naquela altura os ordenados eram pequenos, mas havia fartura de azeite, trigo e milho para vender, que os tínhamos nas quatro fazendas. Quando me casei as fazendas davam para o ano todo. Ele ficou à mesma a trabalhar, ganhava 33 escudos por mês. Fomos muito felizes, graças a Deus. A gente é que fazia a roupa dos homens em casa, quando precisava de pano branco para fazer cuecas ou camisas ou lençóis, comprávamos ao Joaquim Carvalho e só pagávamos a despesa no fim do ano. Criávamos uns porcos e com eles pagávamos a dívida. Quando foi da Guerra eu não senti a fome no colégio, mas as minhas irmãs sentiram, elas iam de madrugada para a porta da padaria em Almoster a ver se conseguiam comprar um pão. Do 25 de Abril, soube pela telefonia. Disseram que foram daqui de Santarém para Lisboa. A primeira vez que votámos estivemos quase todo o dia em Almoster, a bicha ia da Junta até à estrada nova, só os velhos ou os doentes podiam passar à frente. Agora a minha vida modificou muito, porque há dois anos o filho desempregado voltou para a minha companhia. O que eu recebo não chega aos 600 euros por mês com as reformas, a minha e a de viúva. A vida aumentou muito. A vida é muito complicada. Uma coisa boa é o posto de saúde e o médico. Na televisão vejo as novelas. E gosto muito de ouvir os políticos a falar.

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32 DESPORTO MEMÓRIA

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

PORTUGUESES NA FINAL DA TAÇA DE ESPANHA

A honra de jogar e ganhar no Santiago Bernabéu DR

TEXTOS Rui Tovar Com a ampliação do Estádio de Chamartín (mais tarde, Santiago Bernabéu), em 1947, a Espanha passou a contar com um dos maiores e mais funcionais recintos da Europa, o que determinou que ali passassem a decorrer os principais eventos a nível de equipas e de selecções do país vizinho. Propriedade do Real Madrid, tal facto não impediu que, desde essa altura, mais de metade das finais da Taça de Espanha ali se disputasse, como agora voltou a acontecer. Um hábito que, curiosamente, caiu no goto (quem diria!) do seu rival da

cidade, o Atlético. Por quatro vezes e em tempos bem distintos, os “colchoneros” tinham conquistado ali o troféu, frente à equipa da casa. Nos vencedores, dois portugueses, Jorge Mendonça, em duas ocasiões, e Futre pontificaram. Refira-se que também Nuno e Hélder, ao serviço do Deportivo Coruña, se sagraram vencedores (2-1), frente ao Real, na final de 2002. E que Baía, Couto e Figo triunfaram (3-1) igualmente naquele recinto, mas em representação do Barcelona e frente ao Bétis (dois golos de Figo), em 1997. Porém, considerando apenas o “derby” madrileno, só Mendonça e Futre cometeram, de facto, a proeza de ganhar ao Real e no campo dele. “Naqueles tempos, era costume jogar-se a final da Taça no Santiago Bernabéu, quaisquer que fossem as equipas, porque era o maior estádio de Espanha”. A

justificação de Jorge Mendonça, herói português do Atlético Madrid nos anos 60, ganha corpo por mais umas décadas. Como em 1992, quando Futre ergue a taça. “Em 1991, jogámos no Bernabéu com o Maiorca. No ano seguinte, com duas equipas de Madrid, não havia necessidade de mudar de estádio”, defende o extremo português. Agora, em pleno século XXI, e apesar da global melhoria das infra-estruturas desportivas, o Bernabéu continua a merecer as preferências, tendo recebido, como já se disse, a final da Taça do Rei de 2013 entre os rivais da capital (ver notícia mais detalhada na página de “actualidades”). E se o anfitrião Real Madrid até estava na disposição de prescindir dessa vantagem, pelo prazer de desviar o palco da final para Camp Nou, casa do outro rival Barcelona, já o Atlético Madrid surpreendeu

O Rei entrega a taça DR

Luis Figo de cabeça atada

mais uma vez ao sugerir o Bernabéu por tradição, por ser talismã e por se revelar mais vantajoso no que respeita ao apoio (quantos mais lugares, melhor para os milhares de adeptos colchoneros, foi o argumento invocado). Curiosamente, a última final Atlético-Real no Vicente Calderón, casa do Atlético, em 75, deu a vitória aos visitantes, nos “penalties”.

Futre: a Taça das mãos do Rei

O Atlético Madrid é um clube especial. Vende tantos jornais em Barcelona que até o “El Mundo Deportivo”, feito e impresso na Catalunha, lhe dedica 20 páginas diárias. O seu nome assusta por essa Europa fora, mas nunca ganhou uma Taça dos Campeões, “só” uma Taça das Taças e duas Ligas Europa. É um grande em Espanha, mas nunca conseguiu sair da sombra do Real. Nunca? Não, houve um tempo em que o Atlético se divertia a derrubar o arqui-rival, e em pleno Santiago Bernabéu. Dois exemplos ilustram essa capacidade de surpreender, ambos com o cunho muito pessoal de Jorge Mendonça. Dois de Julho de 1961. Final da Taça entre os dois clubes de Madrid, pela segunda época consecutiva. E sempre no Bernabéu. Em 1960 (sem Mendonça), o Atlético ganhara 1-0. No ano seguinte, já com o português, mais do mesmo (3-2). “Era a equipa de Di Stéfano, Puskas, Kopa, Gento... Gente que jogava de olhos fechados. O Di Stéfano, então, dominava a bola com todas as partes do corpo: cabeça, coxa, peito, pé, calcanhar, eu sei lá. Um fenómeno sem igual”, lembra Jorge Mendonça, formado no

Contratado no Verão de 1987, como trunfo eleitoral do presidente Jesus Gil y Gil e um mês depois de se sagrar campeão europeu pelo FC Porto, o extremo-esquerdo Paulo Futre assumiu-se imediatamente como patrão da grande área – e também do Atlético, ao lado dos brasileiros Alemão e Baltazar. Nas cinco épocas em que brilhou em Madrid, ganhou duas Taças do Rei, ambas no Santiago Bernabéu, mas só uma com o Real. É a final de 1992. “Não se imagina a rivalidade. Os jogadores do Atlético e do Real Madrid nem se podiam ver na rua ou num restaurante, numa guerra também patrocinada pelos presidentes dos clubes de então: o Ramón Mendoza e o Gil y Gil. E o Hugo Sánchez [avançado mexicano do Real] morava no mesmo bairro que eu. Era uma pressão enorme e isso reflectia-se no campo. Daí que os dérbis de Madrid tenham assumido aquela importância gigantesca nos anos 90.” Dia 27 de Junho de 1992. O Rei Juan Carlos entra na bancada VIP, ouve-se o hino espanhol e os capitães escolhem o campo. De um lado, Chendo. Do outro,

Sporting, emprestado ao Braga e posteriormente ao Deportivo antes de chegar ao Atlético. “Nessa tarde, marquei o 3-1. A alegria era tanta que saí coxo nos festejos do golo. A malta toda saltou para cima de mim e fui a cambalear para o meio-campo. O Di Stefano ainda reduziu, mas não chegou” Cinco de Março de 1965. O Real Madrid não perdia em casa há 131 jogos para o campeonato (sim, é verdade, desde 1957) e é Jorge Mendonça quem garante a vitória por 1-0, aos 76 minutos. “Garanto-lhe, não fiz nada de jeito nesse jogo, mas aquele remate de primeira saiu-me particularmente bem. Os adeptos do Atlético ficaram loucos, como deve imaginar,

não é?”, conta ainda Mendonça. “Durante anos e anos, as pessoas cruzavam-se na rua comigo e falavam-me desse jogo. E lembravam-me sempre que o Real não perdia desde 1957. Eu já sabia toda a história de cor e salteado, mas é sempre um orgulho ouvi-la uma vez mais.” Jorge Mendonça é imediatamente comparado a Eusébio e por uma razão compreensível. Como Eusébio havia sido o líder de uma memorável goleada do Benfica ao Real Madrid [5-1 na Luz, para a Taça dos Campeões], apenas uma semana e meia antes desse golo, a imprensa catalã, segundo o próprio Mendonça, “aplaudiu as pérolas negras, que derrubaram o império branco.” RT DR

Atlético de Madrid com Mendonça

DR

Jorge Mendonça: um golaço para a história

Paulo Futre

Futre. É verdade, o português já era o capitão de equipa, homem da total confiança do treinador (Luis Aragonés, campeão europeu pela Espanha em 2008) e do excêntrico presidente que sempre o apoiou. “Esse jogo foi o meu melhor de sempre. Um ambiente frenético e uma primeira parte de sonho. O Schuster marcou o 1-0 num espectacular livre directo a 25/30 metros da baliza”, relata Futre. “O 2-0 chegou-nos perto da meia-hora, desmarquei-me pela esquerda, entrei na área e atirei por cima, entre o Buyo e o poste, que golo! Na segunda parte, o nosso guarda-redes Abel ainda defendeu um penálti de Míchel para segurar o 2-0. No final, recebi a taça das mãos do Rei, outro momento inesquecível.” RT


DESPORTO MEMÓRIA 33

23 MAIO 2013 · JORNAL SÉNIOR

SPORTING Conquista da Europa foi há quase meio século DR

terra, um sensacional triunfo por 5-0, em Alvalade, com três golos de Osvaldo Silva) e as “negras” com Atalanta e Lyon, ambas decididas em Espanha. Sem esquecer um golo incrível do

“lionês” Combin, em Alvalade, que surpreendeu Carvalho, ou de um outro, oportuníssimo, de Osvaldo, em Madrid, que abriu as portas à presença na final. Como já se disse, no confronto decisivo houve dose dupla de MTK. A 13 de Maio desse ano, Bruxelas atraiu milhares de fiéis seguidores do leão, que, apesar de todos os condicionalismos, ali se deslocaram para assistir “in loco” à partida. Na capital belga, o resultado ficou-se pelo empate a três golos, num jogo de cortar a respiração, com o marcador a registar várias alternâncias de comando. Perante o impasse, novo encontro ficou logo acordado, então para Antuérpia, 48 horas depois. Sem poder contar com o lateral e muito influente Hilário – que já não actuara no jogo anterior por se ter lesionado num confronto com o V. Setúbal para a Taça de Portugal – e com o restante plantel “preso por arames” tal o desgaste, o Sporting cumpriu a finalíssima com muitas dificuldades. O golo de Morais, aos 20’, conduziu a equipa para uma toada de maior contenção e posse de bola, o suficiente para anular as ofensivas e o que restava do ânimo do colectivo magiar. Nesse dia memorável, o Sporting apresentou a seguinte constituição: Carvalho; Pedro Gomes, Alexandre Baptista, Fernando Mendes e José Carlos; Pérides e Geo; Figueiredo, Mascarenhas, Osvaldo e Morais. No primeiro jogo, havia actuado Bé e não fora utilizado Pérides. Em 2005, a equipa leonina esteve perto de reeditar a façanha, mas a tentativa frente ao CSKA de Moscovo, não foi coroada de êxito. RT

onde pontificavam Bobby Charlton, Denis Law e George Best, virando uma eliminatória que parecia já ter dono. De facto, depois de um traumatizante 1-4 da 1ª mão, fruto também de uma arbitragem escandalosamente pró-inglesa, a equipa leonina conseguiu, em Alvalade, o milagre dos 5-0, com três golos de Osvaldo Silva (Geo e Morais

marcaram os restantes), e, acima de tudo, com uma actuação inexcedível que levou ao rubro os muitos milhares de adeptos que acorreram e superlotaram o recinto. Foi a melhor exibição da temporada e, para muitos observadores, uma das dez melhores de sempre do já longo historial do clube. RT

A equipa do Sporting que ganhou a Taça das Taças, 1963-64. De pé: Carvalho, Fernando Mendes, Alexandre Baptista, Pérides, Pedro Gomes, Manuel Marques (massagista) e José Carlos; em 1º plano: Osvaldo, Mascarenhas, Figueiredo, Géo e Morais DR

A final da Liga Europa disputada no passado dia 15, em Amesterdão, entre Benfica e Chelsea, e de cujos pormenores lhe damos conta em outro local desta edição, trouxe à memória o feito europeu do Sporting de há precisamente 49 anos, com a conquista da Taça dos Vencedores de Taças. Depois de dois triunfos do Benfica na Taça dos Campeões a colocarem bem alto a fasquia do nosso prestígio, a proeza leonina que se lhes seguiu confirmaria o alto apreço de que usufruía então o futebol português no contexto internacional. Foi também no dia 15 de Maio. Mas de 1964. Antes, o Sporting eliminara sucessivamente os italianos do

Atalanta (ao cabo de 3º jogo e prolongamento), os cipriotas do Apoel, os ingleses do Manchester United e os franceses do Lyon (após 3º jogo e também 30’ de tempo-extra). Para não fugir à regra, a final com os húngaros do MTK Budapeste conheceu, igualmente, dois episódios e só na repetição do jogo, com o tal golo de Morais de canto directo, é que foi possível apurar o vencedor. Feitas as contas, os “leões” fizeram 12 jogos, em vez de nove, e gastaram 19 horas e meia para chegar ao título, mais seis horas do que estava previsto. Foi, pois, uma aventura de deixar toda a gente de rastos. Para a História ficou, sobretudo, a goleada de 16-1 frente ao Apoel,

Morais, o do “cantinho” que deu a vitória na final da Taça, aqui num jogo frente ao F.C.Porto

o que constitui ainda hoje recorde das competições da UEFA. Igualmente notícia foi a recuperação conseguida perante o Manchester de Charlton, Law e Best (depois do 1-4 em Ingla-

A noite mágica frente ao Manchester Se a aventura europeia do Sporting nessa época de 63-64 foi toda ela brilhante, com destaque para o novo máximo de 16

golos num só jogo (18 na eliminatória), é imperioso que se diga que, em termos exibicionais, a data de 18 de Março de 64 ficou

como a mais eloquente de toda a campanha. Nessa noite, o Sporting vulgarizou os mestres do M. United,


34 EDITORIAL

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

FC Porto conquista 27.º título e sagra-se tricampeão nacional Festa azul e branca por todo o País. O FC Porto festejou, no último domingo, 19 de Maio, a conquista do 27.º título de campeão nacional de futebol da I Divisão portuguesa. Os dragões, que entraram na última jornada da prova a depender de si próprios, não vacilaram e derrotaram, no Estádio da Mata Real, o Paços de Ferreira, que terminou a competição num honroso terceiro lugar, por 2-0. Golos de Lucho González, na cobrança de um penálti, no primeiro tempo, e de Jackson Mártinez, já na segunda parte. Terminado o desafio, os azuis e brancos fizeram a festa até de madrugada. Pinto da Costa, o presidente dos tricampeões, celebrou mais um título e não deixou de atirar, na hora da vitória,

Modalidades

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F.C. Porto celebrou vitória na Liga. Dragões acabaram prova com mais um ponto do que o Benfica

‘farpas’ ao rival Benfica. Relativamente a Vítor Pereira, a continuidade do treinador que, nas duas últimas épocas, liderou os

portistas a dois títulos nacionais, enquanto técnico principal, permanece nesta altura como uma incógnita.

Benfica aponta à 25.ª Taça de Portugal para ultrapassar semana negra em Maio

DR

Leonardo Jardim é o novo treinador do Sporting O sucessor de Jesualdo Ferreira no comando técnico da equipa de futebol do Sporting está escolhido. Leonardo Jardim, de 38 anos, ex-treinador do Olympiakos, da Grécia, que já orientou, em Portugal, o Beira-Mar e o Sporting de Braga, já foi apresentado e vinculou-se aos leões por dois anos. O madeirense vai procurar, no futuro, recolocar o Sporting no topo. A temporada, prestes a acabar, o que acontecerá após a final da Taça de Portugal,

Oito dias de agonia. De nada valeu, ao Benfica, a vitória por 3-1 no Estádio da Luz sobre o Moreirense, uma vez que, à mesma hora, o FC Porto também triunfou e garantiu, assim, mais um título de campeão nacional. Depois de derrotado por 2-1, já no período de compensação, na final da Liga Europa, em Amesterdão, diante dos ingleses do Chelsea, e após deixar fugir um título que esteve à mercê, para o FC

Porto, resta agora ao clube da Luz acabar a época com um triunfo: no domingo, 26 de Maio, no Estádio Nacional, o emblema de Lisboa mede forças com o Vitória de Guimarães na final da Taça de Portugal. Um troféu que o Benfica já ergueu, no seu historial, em 24 ocasiões. Jorge Jesus, treinador dos encarnados desde 2009/2010, deverá renovar, nos próximos dias, o contrato que o liga ao clube.

DR

Beira-Mar e Moreirense descem à II Liga NACIONAL

Técnico assinou contrato por duas temporadas

não correu de feição ao histórico clube de Lisboa. Os verdes e brancos terminaram o campeonato nacional numa inédita sétima posição, lugar que deixa o Sporting fora das competições europeias em 2013/2014. Ainda assim, os leões bateram na última jornada da Liga o Beira-Mar, em Aveiro, por 4-1.

José Mourinho abandona Real Madrid DR

O que há muito vinha a ser noticiado, um pouco por todo o mundo, já é oficial: O mediático treinador português José Mourinho vai deixar o cargo de técnico principal do Real Madrid. O Chelsea, de Inglaterra, pode ser o destino de Mourinho, no que seria um regresso do português aos blues, ainda orientados pelo espanhol Rafael Benítez, e também a território britânico. Carlo Ancelotti, italiano que comanda o Paris Saint-Germain, de França, é uma das hipóteses para render o português na formação madridista, presidida por Florentino Pérez.

O Beira-Mar e o Moreirense são as duas equipas que, na época 2012/2013, não conseguiram assegurar a permanência no escalão principal do futebol português. Descem, por isso, à II Liga nacional. Arouca junta-se a Belenenses na subida à PRIMEIRA DIVISÃO O Arouca vai marcar presença, na próxima temporada, no campeonato da I Divisão do futebol português. Algo que acontece, refira-se, pela primeira vez no palmarés do clube. Além do Arouca, o histórico Belenenses está de volta ao convívio dos grandes, tendo-se sagrado, inclusivamente, esta época, campeão da II Liga portuguesa. Final da Liga dos Campeões em Wembley FALADA EM ALEMÃO Dois conjuntos germânicos, Bayern Munique e Borússia Dortmund, jogam no sábado, 25 de Maio, a final da Liga dos Campeões de futebol em Wembley, Inglaterra.

FC Porto campeão de andebol e hóquei Além do futebol, o FC Porto celebrou, nos últimos dias, outros dois títulos de campeão nacional. E ambos com um sabor especial, dado que os dragões festejaram os campeonatos de andebol e, igualmente, de hóquei em patins, perante os seus adeptos. Nos dois casos, após triunfos, sexta-feira, 17 de Maio, e no sábado, 18 de Maio, sobre o rival Benfica, no andebol e no hóquei, respectivamente.

Benfica campeão de voleibol e à frente no basquetebol No jogo de repetição, na sequência de um protesto apresentado pelo adversário, o Benfica recebeu e venceu no Pavilhão da Luz o Sporting de Espinho, por 3-1, e assegurou desta forma a conquista do título de campeão nacional de voleibol. Já no basquetebol, os encarnados estão a um triunfo do bicampeonato, depois de, nos dois primeiros encontros, em casa, perante a Académica de Coimbra, terem averbado duas vitórias nos duelos com os estudantes.

Lesão de Fábio Lima une futsal português Fábio Lima, jogador da equipa de futsal do Rio Ave, viveu um drama nos últimos dias, mas já foi operado e está a recuperar bem. O futsalista sofreu uma lesão assustadora, ao tentar um corte de “carrinho” durante uma partida com os Leões de Porto Salvo, relativa ao play-off do campeonato nacional da modalidade. Uma lasca, no piso do pavilhão, perfurou-lhe uma zona do corpo mas o que, a princípio, deixou todos a pensar o pior não passou, felizmente, de um susto. O futsal português não ficou indiferente ao sucedido e as mensagens de apoio a Fábio Lima têm sido uma constante nos últimos dias.

António Félix da Costa corre no Mónaco António Félix da Costa, piloto português de 21 anos, compete este fim-de-semana no Mónaco: sábado, 25, e domingo, 26 de Maio, respectivamente. Duas corridas referentes ao campeonato World Series By Renault 3.5, a antecâmara de acesso à Fórmula 1 (F1), disciplina máxima do automobilismo. O jovem piloto sonha com um lugar na F1 no Mundial do próximo ano, em 2014. A concretizar-se, será o quinto português a integrar esta classe automóvel.


RUTIS, a rede que une as academias e universidades seniores Estamos em Abrantes, Almada, Almeirim, Amadora, Angra do Heroísmo, Armamar, Beja, Borba, Braga, Caldas da Rainha, Caminha, Castelo Branco, Coimbra, Constância, Covilhã, Elvas, Entroncamento, Esmoriz, Évora, Famalicão, Faro, Funchal, Fundão, Gaia, Golegã, Gondomar, Grândola, Guimarães, Lagos, Lamego, Leiria, Lisboa (20), Loulé, Loures, Matosinhos, Miranda do Corvo, Miranda do Douro, Moimenta da Beira, Montemor-o-Novo, Montemor-o-Velho, Moura, Odivelas, Odemira, Oliveira de Azeméis, Pinhel, Ponta Delgada, Ponte de Sor, Portalegre, Portimão, Porto (12), Santa Maria da Feira, Santarém, Santiago de Cacém, Seia, Setúbal, Sines, Sintra, Torres Vedras, Valença, Valpaços e mais. Veja em www.rutis.pt

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36 AMIGOS FIÉIS

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

Escolher um aquário

O espectáculo da natureza em casa

DR

É um cenário vivo, com muito para ver e descobrir. É uma janela aberta para um mundo natural complexo, cheio de nuances e particularidades e uma beleza incomparável. Os peixes podem não parecer os amigos mais fiéis, mas o entusiasmo dos aquaristas constitui uma pista para o quão interessante pode ser manter um habitat aquático. As opções são vastas. Os cuidados a ter também.

passatempos preferidos em todo o mundo. Um aquário bem feito pode ser também um elemento decorativo magnífico para ter em casa. Para os avós, por exemplo, um aquário é um passatempo apaixonante para manter em conjunto com os netos. No entanto, um aquário não é apenas um elemento decorativo ou algo que possa ser terminado se afinal não der jeito: é um ecossistema onde vivem não só os peixes, mas também plantas aquáticas e microorganismos. O facto de não ser um ambiente natural coloca sobre o responsável pelo aquário a tarefa de garantir a alimentação, a limpeza, a oxigenação, a temperatura, a acidez, a adequação do habitat e a combinação certa de espécies, entre outros factores. Acima de tudo, é necessário compreender que os peixes são seres vivos sensíveis e com necessidades e que adquirir um aquário é um compromisso que não deve ser assumido por impulso. A escolha de um aquário e suas espécies é um processo ponderado e implica alguns custos. A visita a uma loja da especialidade é essencial.

um peixe de cinco cm em adulto precisa de cinco litros de água, que significa que dez peixes destas dimensões enchem facilmente um aquário de 60 cm, que contém cerca de 53 litros. Filtro Os peixes precisam que a água esteja limpa, que é a missão do filtro. Este deve ter a capacidade de litros/hora de cerca de duas a cinco vezes o número de litros do aquário. Os filtros internos, que se colocam no interior do aquário, são menos dispendiosos mas também menos eficientes e necessitam de ser limpos semanalmente. Os externos podem ser de cascata ou de balde e são equipados no exterior do

aquário, necessitando de limpeza, em média, quinzenalmente. Termostato É este equipamento que mantém a água a uma temperatura agradável aos peixes, não só os de água quente como alguns de água fria que não suportam o ambiente a menos de 18 graus. A temperatura ambiente da casa e as correntes de ar influem na temperatura da água. A luz solar directa sobre o aquário deve ser evitada. Iluminação A luz artificial é importante sobretudo para os aquários com plantas. Algumas plantas

Tamanho Texto: Filipa Faustino Arenga

Para quem nunca teve um aquário o apelo pode parecer pouco claro. Os peixes não nos dão mimo, não se deixam afagar, não se enroscam no nosso colo. A sua beleza e variedade de comportamentos, entre muitos outros factores, fazem deles, um dos

O tamanho deve ser adequado ao tipo de peixe que vai receber. É importante também ter em conta que um aquário cheio pesa muito. Existem mais pequenos mas é, geralmente, considerado que um aquário de 60 cm é o ideal para principiantes, porque é mais fácil de manter em condições térmicas e químicas estáveis. Por norma,

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também servem de complemento alimentar a algumas espécies de peixes.

manutenção adequada. Aliás, todo o processo de montagem de um aquário e escolha das espécies deve passar pela visita e consulta de uma loja especializada, onde os especialistas, por norma entusiastas do aquarismo, darão todas as informações pertinentes e poderão aconselhar sobre todos os aspectos a ter em conta. Não é de mais relembrar que nem todas as espécies são compatíveis entre si nem no que toca ao ambiente, que deve ser o ideal para todas as espécies escolhidas para partilhar aquele espaço. Na internet, existe uma fonte inesgotável de informação e muitos fóruns onde podem ser colocadas questões e obter a preciosa ajuda dos amantes dos peixes.

Substrato Doce ou salgado? O substrato é o fundo do aquário e pode ser de areia, areão, pedrinhas e substrato para as plantas. A areia pode ser recolhida na natureza, mas deve ser fervida primeiro. Química Entre os indicadores químicos, o mais importante é o ph, a acidez da água. Cada espécie de peixe vive num valor ideal de ph, pelo que é necessário ter este factor em conta na escolha dos peixes e monitorizar frequentemente os níveis. Cenário O cenário deve corresponder o mais possível à proveniência das espécies escolhidas: abrigos de pedra, galhos, plantas, diferentes areões são alguns elementos que permitem aos peixes viver em condições mais próximas aos da natureza e conferem ao aquário verosimilhança ao habitat natural. A maioria dos aquaristas também opta por colocar plantas, não só porque dão aos peixes esconderijos adicionais e algum complemento alimentar mas também porque oferecem ao aquário mais um elemento de beleza cénica. Podem ser misturados exemplares artificias e naturais. Alimentação

Cada espécie de peixe tem o seu atractivo, dinâmicas e comportamentos diferentes. Mas as diferentes espécies precisam de diferentes condições: o ambiente no aquário pode ser de água doce ou água salgada, tropical ou fria, o que determina as espécies de peixes que lá vivem e implica diferenças no nível de manutenção. Para além da salinidade da água, nem todas as espécies são compatíveis no que toca a comportamento e níveis ideais de temperatura e acidez (ph), pelo que é sempre necessário informar-se antecipadamente e planear que tipo de peixes pode juntar no mesmo aquário.

Água doce fria Estes aquários devem permanecer entre os 15 e os 22 graus, dependendo das espécies que alojarem. Apesar de poderem não requerer aquecimento, os aquários de água doce fria exigem o uso de um filtro mais potente. Por outro lado, os peixes atingem tamanhos maiores, pelo que os aquários devem também ser maiores. O cálculo deve ser cinco centímetros quadrados de água por um centímetro de peixe. O peixe-dourado é a espécie mais popular deste tipo de habitat e, mantido em condições saudáveis, pode atingir mais de 20 cm e viver até dez anos. O peixe-dourado gosta de aquários grandes e de companhia, ao contrário do que é comum ver-se. As carpas são populares mas são indicadas para lagos, não para aquários, devido às suas dimensões. Os danios, rápidos e sociáveis, gostam de grupos da sua espécie. Água doce tropical

O clássico aquário balão com um peixinho dourado costuma ser o primeiro contacto com o aquarismo e, muitas vezes, o único. E é incrível como algo tão banal pode ser tão errado. Os aquários balão não oferecem as condições ideais para manter um peixe: o formato mais fechado no topo não permite uma grande superfície de contacto com o ar, o que ajuda a oxigenar a água, permitindo aos peixes respirar; o espaço é insuficiente para algum peixe viver em condições saudáveis; a abertura e a falta de espaço propiciam o tradicional “salto suicida”, que inclusivamente é atribuído ao stresse sentido pelos peixes nestes ambientes, entre outros factores que limitam a qualidade (e esperança) de vida do peixe.

Que peixes escolher? Tendo tudo isto assegurado e montado, chega a hora de popular o aquário. Não se deve atender apenas à beleza dos peixes e esquecer todos os outros factores, como a

Equador. Os aquários de água doce podem ser frios ou tropicais (água mais quente).

Os aquários de água doce tropical necessitam de termostatos para manterem o ambiente ameno, com a água a rondar os 25 graus, uma temperatura que pode variar conforme as espécies. Por norma, o cálculo a fazer nestes aquários é de 25 cm quadrados por cada centímetro de peixe adulto. Água doce São muitas as espécies, entre elas espadas, platis, betas, discos e gupis, algumas das Os aquários de água doce são mais fáceis mais populares. Variam muito em formade manter e por isso são mais indicados to mas têm em comum a beleza e pertenpara principiantes. Estes aquários são mui- cerem a este que é um dos mais populato populares, sendo também uma vanta- res entre aquariófilos. As comunidades gem a imensa variedade de peixes disponí- de gupis com as suas barbatanas caudais vel no mercado. Na natureza, apesar de os maiores que o corpo e com cores e padrões peixes de água doce terem por habitat uma exuberantes proporcionam ao aquarista quantidade minúscula da água disponível um espectáculo único. Os betas também na Terra, representam 41% do têm barbatanas vistosas e vitotal de espécies, que vem em comunidade. aumentam com Importantes tama proximidabém são os de ao peixes de AQUÁRIOS BALÃO fundo,

Cada espécie tem a sua alimentação preferida. No mercado existe comida processada específica para todos os tipos de peixe, sendo que algumas são, no entanto, mais comuns e baratas que outras. As misturas podem ser vegetarianas ou conter pequenos organismos como plancton ou artémia. Algumas espécies carnívoras precisam de carne fresca: os aquaristas oferecem complementos como bocados de coração de boi limpo de sangue, o que é muito apreciado por estes habitantes do aquário. Outras espécies deliciam-se com miminhos de pepino ou curgete fresca, por exemplo.

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AMIGOS FIÉIS 37

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como as coridoras, que desempenham um importante papel na limpeza do aquário. Os discos, cujo nome faz justiça ao seu formato peculiar, apresentam matizes diversas e constituem um aquário de grande beleza, mas com grande necessidade de espaço. Os ciclídeos são uma importante família de peixes que representam cinco por cento dos vertebrados do planeta. São 1.900 espécies, oriundas das Américas, África, Madagáscar e Sri Lanka, sendo que são os africanos os que apresentam uma coloração mais exuberante, em especial os dos lagos Vitoria, Malawi e Tanganika. O plecostumus é um peixe de fundo de aspecto jurássico que se dá bem com os ciclídeos africanos e pode atingir mais de 20 cm. Água salgada Os aquários marinhos não são os mais indicados para principiantes uma vez que são muito sensíveis a alterações na água. Precisam de pelo menos 50 litros de água salgada. A sua beleza é muito peculiar, com cores e formas muito extravagantes e hábitos interessantes. Nos aquários de água salgada podem ser criados crustáceos e corais que, a par das rochas, são muito importantes para alguns peixes. Água salgada fria Os ambientes de água salgada fria não são comuns em aquários domésticos, uma vez que precisam de muito espaço e as espécies são muito robustas. As cores destes peixes, como as espécies atlânticas, são mais apagadas que os seus congéneres tropicais. Apanhar uma dourada ou uma sardinha na costa portuguesa e colocá-la num aquário é possível, mas provavelmente o animal vai morrer de stresse. Água salgada tropical Os peixes marinhos de água quente são muito coloridos e apresentam um vasto leque de formas e comportamentos. Os preços destas espécies são dos mais elevados, o que torna esta opção mais dispendiosa. O peixe-anjo, o peixe-borboleta, o peixe palhaço (o “Nemo” do filme Disney, que chegou a estar em risco de extinção devido à pesca desenfreada com vista à comercialização), o peixe-vaca, a moreia ou o gama real são algumas das espécies mais procuradas para este ambiente invocador dos mares paradisíacos de onde são originais.


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IDANHA-A-VELHA

Uma nave atravessa os séculos Assentada entre a Serra da Gardunha e a raia espanhola, Idanha-a-Velha é uma das aldeias históricas menos conhecidas. Um património marcado pela herança da presença visigoda e uma generosa rede de trilhos são boas razões para mais do que uma visita à região.

Texto: Humberto Lopes Fotografia: Humberto Lopes

Não é sem causa que a terra beirã acolha as chamadas aldeias históricas portuguesas. Dispostas ao longo da raia, frequentemente em outeiros fortificados, une-as, entre outros atributos, o fado de terem sido pontas de lança em épocas de conflitos nacionalistas. Idanha-a-Velha, a mais meridional de todas, responde na sua identidade, à semelhança das suas pares, a um certo imaginário rural português, que articula com um importante legado histórico e patrimonial. O território circundante, da Gardunha à fronteira, é de feição constante, com poucos sobressaltos topográficos. É um cenário sereno e concordante, este,

de suaves colinas e breves vales pouco pronunciados, uma ou outra penedia discreta e tímida, quase tudo tomado estes dias por um verde exuberante, por mor de um Inverno que foi magnânimo em águas. Predominam as várzeas húmidas e férteis, onde pastam sossegados rebanhos, bucólicas ribeiras de água argêntea e límpida, apenas ocasionalmente atalhadas por penhascos susceptíveis de se nomear como tal. As excepções avistam-se à distância. Monsanto, burgo encavalitado num cerro maciço, “morro bárbaro, medonho e orgulhoso”, como o descreveu Fernando Namora, que lá exerceu clínica entre 1944 e 1946, e Penha Garcia, de casario branco colado numa encosta abrupta e inclinado à luz do sul. Conta o concelho da Idanha com 17 freguesias e em todas podemos

recensear pretextos para visitas. Os roteiros possíveis contemplam grande variedade de dimensões, do património à gastronomia, das actividades de lazer, como a caça ou a pesca, até aos passeios por trilhos temáticos, como são os da Rota dos Fósseis, em Penha Garcia, ou os que serpenteiam pelos arrabaldes de Idanha-a-Velha e que são um dos personagens centrais deste roteiro. Um mal dos tempos: a desertificação Mais de vinte anos após o lançamento do programa de intervenção sobre as aldeias históricas, se o património físico reconquistou dignidade e amor-próprio e a paisagem urbana renovada alcançou certo brilho sob as luzes da ribalta turística, há pelo menos

um desiderato que ficou pelo caminho e esta é uma regularidade partilhada por quase todas as povoações intervencionadas. A tendência para a desertificação humana, a par do envelhecimento da população residente, é um dado que caracteriza a maior parte destas povoações. Não se estranhe, pois, o silêncio que por vezes pesa sobre as suas ruas. Uma reportagem realizada há alguns anos pela RTP sobre o nascimento de uma criança na Aldeia da Pena (a primeira em dez anos) era sintomática de uma das consequências desse fenómeno de desertificação. Em Idanha-a-Velha, o último censo identificou pouco mais de meia centena de residentes e uma média de idades bastante elevada: mais de 70% dos habitantes têm mais de 60 anos. Fenómenos demográficos à par-

te, Idanha-a-Velha tem uma história e um património singulares, que nos últimos anos tem vindo a ser objecto de valorização. Ocultos no subsolo jazem, ainda, muitos registos da rica história local. Não raro acontecem descobertas arqueológicas no decorrer de obras, tal como aconteceu durante a intervenção na casa de habitação recuperada para posto de turismo, quando se revelou a presença de uma casa romana do séc. I d.C. no subsolo. A cidade que veio à luz no século de Augusto Se a memória da ruralidade beirã do povoado pode ser apreciada no edifício recuperado do antigo Lagar de Varas (onde está instalado o Museu Epigráfico Egitaniense), é sobretudo o passado roma-


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no e visigodo que ilumina a visita a Idanha-a-Velha. Relativamente ao primeiro, a velha ponte que atravessa o Ponsul, trecho da antiga rede de vias peninsular, é um eloquente testemunho, tal como o são as várias casas romanas da aldeia e os vestígios do que terá sido o espaço das termas. Sob os arcos da ponte muitas águas correram, assim como muitos foram os caminheiros que a cruzaram. Ao transitar por ela, lembrar-se-á o viajante contemporâneo que antes dele, há uns bons dois mil anos, já por ali passavam andarilhos, a caminho de Conímbriga,

Astorga e outros tantos destinos. Idanha-a-Velha foi cidade romana, fundada provavelmente no século I a.C. (durante o consulado de Augusto) e bispado visigótico nos seus tempos áureos. Era conhecida por Civitas Igaedinatorum, quando um édito de Vespasiano a elevou à condição de cidade. A transferência do episcopado para a Guarda, no século XII, terá marcado o princípio do crepúsculo. A consolidação da linha fronteiriça terá contribuído também para o declínio da velha Egitânia. A Basílica é, essencialmente, invenção visigótica, edificada a partir

de uma construção anterior, um templo paleocristão, com muitas modificações subsequentes. É um edifício compósito, com três naves e sete arcos, por si só testemunho do encontro de culturas e civilizações que teve lugar em Idanha-a-Velha e que legou um conjunto monumental de características únicas. De nave central austera, foi mesquita ao tempo dos árabes e ostenta elementos da arquitectura manuelina, como manuelino é, ainda, o pelourinho da praça principal. Ao lado da Basílica podemos ver um impressivo conjunto de lajes, ruína que

resta da residência episcopal visigótica. Por ali se descobriram algumas lápides com inscrições que se referem a divindades pagãs. Práticos, os conquistadores de Roma, que lograram juntar, há vinte séculos, quase toda a Europa num único Império, trouxeram-nos muitas inovações e ainda uns quantos cultos — como o da deusa Vénus, cujo templo em Idanha-a-Velha haveria de desaparecer para dar lugar à Torre de Menagem, erguida pelos Templários sobre um podium romano. Consta que era consagrado à deusa Vénus.

Terra de azeite e de quanto do seu fazer e guarda

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A Rota da Egitânia e outras caminhadas À volta de Idanha-a-Velha há uma série de trilhos com diferentes extensões e graus de dificuldade, que – entre outras benesses – podem oferecer ao viajante uma imagem mais vivida do património natural da região. Com olhos diligentes e alguma fortuna, acabará o caminheiro por dar com alguns dos tesouros faunísticos, bem como – e neste capítulo com menos embaraço – com a flora de que se tece a paisagem beirã neste recanto. Os compêndios da especialidade registam mais de duas centenas e meia de vertebrados:

lobo, raposa, veado, javali, cegonhas negra e branca, águia-real e águia imperial, abelharuco, grifo, abutre do Egipto, etc. Quanto à flora, mora por ali uma meia centena de famílias, estando recenseadas mais de trezentas espécies: o rei rosmaninho e uma imensa plêiade de súbditos, como a giesta, a esteva, o tojo, o jasmim e o tomilho. Uma paisagem perfumada. À vista desarmada saltam as oliveiras, o sobreiro, a azinheira, o carvalho negral e o pinheiro manso. O olival e o montado mediterrânico reinam na área envolvente da aldeia. Falta acrescentar que por

estes dias de Primavera muitas dessas espécies se mostram floridas. O momento é, também, o da papoila, flor de existência fugaz, mas radiante como poucas. Há-as brilhando nos campos em volta e junto a algumas casas da aldeia. Alguns dos trilhos, como o que leva a Monsanto (7km) e o que segue para capela da Senhora da Azenha (14 km), lá para os lados de Penha Garcia, começam junto à Porta Norte, onde se encontram um pano de muralha e dois torreões restaurados. O mais fácil, sem assinaláveis desníveis, liga a aldeia à Idanha-a-Nova (o PR2,

a «Rota da Egitânia», 8,5 km) e principia na porta em arco junto à Catedral. Acompanha, durante algumas centenas de metros, o curso do Ponsul e passa, pouco antes de chegar a Idanha-a-Nova, junto à albufeira da barragem local. Claro que sempre se pode percorrer parcialmente cada um deles, à medida do tempo disponível e do empenho dos caminhantes, como extensão das visitas ao património da povoação.

Os domínios dos Templários chegaram a incluir, também, Proença-a-Velha, a pouca distância de Idanha-a-Velha. A Igreja da Misericórdia, de raiz românica, é uma das duas visitas aconselhadas nesta aldeia, onde sobrevivem casas beirãs de xisto, algumas com típicas varandas de madeira. No templo, singelo, há um retábulo de talha dourada cuja pintura data do início do séc. XVII. Terra de bem enraizadas tradições e saberes no que toca à produção de azeite, Proença-a-Velha acolhe um excelente espaço museológico sobre o tema. A maquinaria e utensílios reunidos numa antiga propriedade agrícola “falam-nos” sobre esse alimento milenar que tanto caracteriza a culinária mediterrânica e que sempre teve enorme importância cultural e económica para a região. A história narrada pelo acervo do complexo de lagares de Proença tem um alcance temporal e espacial enorme, já que abarca um período de tempo de dois milénios e uma actividade comum a amplo número de povos, civilizações e culturas. O acervo reúne exemplos de tecnologias de produção tradicionais de azeite, como o lagar de varas de Proença, que é um dos maiores do país e tem um sistema semelhante ao que existe em Idanha-a-Velha. O núcleo agrega centenas de outras peças, testemunho das técnicas e de toda a cultura ligada ao azeite. Numa galeria localizada à entrada do complexo está exposto um conjunto de objectos que mostram os contextos em que o azeite tem expressão e foi ou é usado – o funcional, o alimentar, o sagrado, etc. Entre o acervo, encontramos coisas tão diversas como peças art deco e lucernas achadas em escavações na vizinha Idanha-a-Velha.


40 SABERES

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Muito facilmente hoje se criam mitos ou verdades destorcidas da realidade. Uma dessas maiores verdades-mentiras é que o aumento dos custos com a saúde em Portugal se deve ao envelhecimento da população. Segundo os estudos, entre outros, de Pedro Pita Barros sabemos que as “alterações na composição demográfica da população não têm efeito significativo no crescimento da despesa per capita em saúde, seja a percentagem de população acima de 65 anos ou acima de 80 anos”. O inquérito Nacional de Saúde de 2006 indicava que o número médio de consultas para a faixa etária (25-64 anos) era de 1,01

e nos maiores de 64 anos, 1.5, o que não é uma diferença significativa ou “com efeito, a percentagem dos inquiridos (com mais de 50 anos) que declarou ter necessidade de cuidados de saúde regulares foi de apenas 10%, subindo para os 13% na faixa dos 65-74 anos e para 17% na dos75+” (Cabral e Silva, 2012). As despesas com a saúde, per capita em 1980, eram de 43 euros e em 2005 1.231 euros. Ou seja o aumento das despesas na área da saúde não é causada unicamente pelo envelhecimento da população, os factores que mais encarecem a saúde são a medicação/terapêutica, os exames de diagnóstico e as novas téc-

nicas e tecnologias. Ainda lendo Barros, “o principal desafio do envelhecimento no sector da saúde não é o acréscimo de despesa. Os desafios e riscos colocam-se noutros campos: - Organização e resposta a diferentes necessidades;  - Capacidade de utilizar os mecanismos actualmente existentes.” Afinal, neste caso e noutros que veremos, a “culpa” não é dos idosos. O envelhecimento da população acarreta problemas financeiros para o sector da saúde, mas está muito longe de ser o único ou o principal.

Acontece...

Elvas acolhe o XII Encontro Nacional de Academias e Universidades Seniores

© Miguel Claro

É já no dia 25 de Maio (sábado) que se vai realizar o XII Encontro Nacional de Academias e Universidades Seniores, em Elvas que irá juntar dezenas de universidades e mais de 1.200 pessoas, estando já a lotação esgotada. Recordamos que recentemente as fortificações de Elvas foram consideradas património da huma-

nidade pela UNESCO. O programa inclui, durante a manhã, uma visita à cidade e à tarde o almoço e a grande festa de convívio no coliseu de Elvas, que é a maior sala de espectáculos do Alentejo e do Sul de Portugal. Durante o evento estará patente uma mostra dos trabalhos e actividades de algumas das UTIs do Alentejo. Este

Conteúdos cedidos pela

“Os idosos não atrofiam o sistema nacional de saúde”

Luis Jacob, Professor do ensino superior com o título de especialista em Gerontologia

Universidade de Verão no Crato A Universidade Sénior de Verão 2013 (No trilho dos Templários) é uma iniciativa da RUTIS e da Universidade Sénior do Crato para maiores de 50 anos e vai desenvolver durante cinco dias um conjunto de actividades lúdicas, culturais, turísticas e formativas, das quais destacamos a oficina de olaria, prova de vinhos, espectáculos musicais, uma palestra sobre os templários, a visita a Marvão e ao mosteiro da flor da Rosa. Decorre de 26 a 30 de Junho na vila alentejana do Crato. Para mais informações consulte www.rutis.pt

ano a convidada especial é a jornalista e escritora Isabel Stilwell que irá falar do seu mais recente livro “Histórias para os Avós Lerem aos Netos”. O evento terminará com o tradicional desfile de bandeiras e a passagem de testemunho para Grândola que será a organizadora do XIII Encontro Nacional das UTIs.

Beja recebe V Gala de Dança Sénior em Abrantes SéniorGYM Aconteceu...

A V Gala de Dança Sénior da RUTIS decorreu a 14 de Maio de 2013 no Teatro S. Pedro, em Abrantes. A organização da Gala esteve a cargo da RUTIS e da Universidade da Terceira Idade de Abrantes (UTIA). O dia começou com a recepção às universidades no largo 1º de Maio em

Abrantes onde alunos da UTIA “apadrinharam” as universidades convidadas. Foram elas a Universidade da Terceira Idade de Alenquer, a Academia Sénior da Covilhã, o CUTLA da Amadora, a Academia Sénior do Fundão e a Universidade Sénior do Seixal. O almoço foi depois servido no restaurante Jardim das Cascatas, em Alferrarede, um local muito aprazível e muito apreciado pelas universidades. A par de todas as actividades da RUTIS, esta gala caracterizou-se pela alegria e dinamismo de todos os seus participantes. Desta feita, a diversidade também se fez notar com as diferentes escolhas das universidades que participaram. Desde música do panorama folclórico português

às já conhecidas danças de salão, passando pelas danças do mundo, onde toda a plateia pôde assistir a performances ao som de música desde África às Caraíbas. A Câmara Municipal de Abrantes, que disponibilizou a sala para este evento, esteve representada pela presidente Maria do Céu Albuquerque. A professora Maria do Rosário Chambel, coordenadora da UTIA, considerou este evento bem-sucedido apesar de todo o trabalho inerente ao mesmo. “Preparar a visita, preparar os almoços e coordenar as madrinhas e os padrinhos que acompanharam as respectivas universidades, não foi fácil mas é um trabalho que é necessário para uma boa organização e nós gostamos muito de receber e de organizar estes eventos”.

A Universidade Sénior CUTLA da Amadora esteve presente no SéniorGYM (Festival Nacional de Ginástica, Saúde e Vida Activa para maiores de 50 anos) que decorreu a 20 de Abril na cidade alentejana de Beja. Este festival foi organizado pela Federação Portuguesa de Ginástica para as suas filiadas, mas este ano em virtude do acordo entre a Federação e a RUTIS, as Academias e Universidades Seniores também puderam participar, tendo sido a rede representada pelos alunos, professores e dirigentes do CUTLA. Este festival visa a promoção de um estilo de vida saudável e activo entre os seniores e a interacção entre os participantes num ambiente festivo e desportivo.


Próxima edição a 06 de Junho


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36 horas de Cultura

Saia de casa e divirta-se DR

Em todas as edições o Jornal Sénior escolhe para si as melhores propostas culturais activas no País. A ideia é construir um roteiro simples e atraente, que o ocupe da tarde de sexta-feira até ao fim da noite de Sábado. As ideias mudam de edição para edição, conforme a oferta que está disponível. No entanto, é ponto assente que todas as manifestações de cultura serão contempladas, da música ao desporto, passando pela arte, pelo teatro, pela literatura e por todas as outras. A alma alimenta-se também dos nobres produtos gastronómicos, do vinho e dos seus parceiros e, assim sendo, incluímos também sugestões de restaurante, bares e hotéis.

Sexta – feira, 18 h Lentamente, e com algum atraso em relação à tradição ocidental, o “cocktail” começa a ganhar território nas preferências dos portugueses. Ao lado dos tradicionais bloody mary e margarita, começam a surgir novas combinações e novos ingredientes, como o smooth & easy, com ananás, ou o cosmopolitano, que tem frutos vermelhos. Em Lisboa, os principais bares e restaurantes já tem especialistas capazes de preparar uma bebida decente, mas valerá a pena dar um salto ao “Clérigos” ou ao Hotel Porto Palácio, no Porto, ou ao “Estado Líquido” ou ao “Bistro 100 Maneiras”, em Lisboa. Bem aconchegados, é então altura de avançar para a cultura.

Sexta-feira, 21 h

bastante acessíveis. Um dos pontos que vale a pena conhecer é a galeria Dama Aflita, no 84 da rua da Picaria. O espaço especializou-se em desenho e ilustração, e apresenta material bastante sólido.

Sábado, 10 h

seu da cidade. Trata-se da exposição fotográfica “10 Regiões Vinhateiras Europeias Património da Humanidade”, que inclui os nossos Alto Douro e Ilha do Pico, nos Açores. A qualidade das fotos é superior, e a realidade humana e natural que mostram um verdadeiro assombro.

Sábado, 15 horas

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Não há maneira de contornar a arte. O Verão está aí à porta e museus e galerias aproveitam para jogar os últimos trunfos fortes antes do começo da nova temporada, em Outubro. No Porto é obrigatório percorrer a antológica de Alberto Carneiro, na Fundação de Serralves, com o sugestivo título “Arte Vida/Vida Arte – Revelações de Energias e Movimentos da Matéria”. A mostra exibe um conjunto extraordinário de obras de Carneiro, onde este conta a seu modo a relação entre natureza e arte, e como pode ser feito o cruzamento das duas. Nos arredores de Lisboa, mais especificamente no Paredão do Estoril, há uma proposta curiosa, a quinta edição do “ArteMar”, que desta vez contempla 11 esculturas feitas de material reciclado, retirado de matérias “que deram à costa”. Os cabos marítimos, as redes, os plásticos, são alguns dos materiais utilizados, na sua maioria como veículos para alegorias que reescrevem a nossa relação com o mar, a terra e o céu.

A tarde de sábado em Lisboa só tem uma morada. A Feira do Livro está no Parque Eduardo VII e a cidade e arredores irão certamente encaminhar-se para lá. A feira está mais simpática, os pavilhões são mais acessíveis, e todas as editoras procuram capitalizar com o evento, lançando um tsunami de títulos. Assim, é uma boa ocasião para encontrar bons autores e bons títulos, com preços reduzidos na maior parte dos casos. As editoras costumam também levar os respectivos acervos, o que permite uma série de aquisições estratégicas. Por exemplo, abastecer de livros infantis para todo o ano, ou começar finalmente a investir nos policiais negros de autores escandinavos. O Porto este ano não tem feira do livro, mas tem excelentes livrarias e alfarrabistas. Uma passagem pela “Lello & Irmãos” é sempre um regalo para a vista, mas vale também a pena procurar informação na internet, e ir em busca de dois ou três bons alfarrabistas da cidade. Encontrar uma primeira edição de Miguel Torga é, afinal, um momento raro.

Jorge Gonçalves

Em Lisboa, o destaque vai todo para a estreia no Teatro Nacional D. Maria II da peça “O Campeão do Mundo Ocidental”, encenada por Jorge Silva Melo. A peça, escrita em 1907 por John Synge, é um bom retrato da sociedade europeia, e do poder do sonho e da utopia para eliminar uma realidade demasiado dura. No Porto, a noite de sexta-feira é uma boa altura para espreitar a cena independente de arte, que continua a ser bastante e forte, e com propostas muito interessantes, quer ao nível de novos artistas que surgem, como também por apresentarem preços

No Porto, tem obviamente todo o destaque a cozinha do Hotel “The Yeatman”, que escolheu uma linha criativa cosmopolita e por vezes arrojada, mas sempre

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Em Évora, vale a pena visitar o Convento de Nossa Senhora dos Remédios, e conhecer com lentidão a exposição aí patente, ligada a objectos religiosos e sagrados. Fora das principais cidades, Lamego tem uma proposta bastante atraente, no mu-

ovo, para além da sopa de beldroegas, um must que só a imaginação do Sul poderia inventar. Nos segundos, há muito para cantar, mas merecem saliência os filetes de robalo com arroz de tomate, e os pezinhos de coentrada.

firmemente ancorada em bons produtos e tradições nortenhas. É uma experiência gastronómica que tem mesmo que se ter, até porque o espaço é simpático. DR

Em Évora, com bom tempo, um destino recomendável é a vila de Monsaraz, que mantém aquele seu encanto especial.

Sábado, 20h30 É tempo de procurar um sítio ameno e cativante para um bom jantar, que atenue a fadiga causada pela demanda de tanta cultura. Os lisboetas recebem boas notícias, com a reabertura da Charcutaria Lisboa (Alecrim 47ª). A Charcutaria ensaia agora uma fórmula que pode ser interessante, assente na mistura de finas especialidades alentejanas, a pratos de inspiração “gourmet do Sul”. Nos primeiros temos as já míticas empadas, bem acompanhadas pelas migas de batata e

Em termos de tesouros da gastronomia, os hotéis ganham também espaço a Sul. O Hotel Convento do Espinheiro é uma boa proposta em Évora, já que a confecção assenta em produtos locais, trabalhados com primor. As 36 horas de cultura ficam assim fechadas com chave de ouro.

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Selecção de José Vegar


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23 MAIO 2013 · JORNAL SÉNIOR

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Feira do Livro de Lisboa: roteiro das novidades para debater o papel da literatura na actualidade. Durante o ano de 2013, estas conferências decorrem em 15 cidades diferentes, estando na Feira do Livro de Lisboa no sábado, 25 de Maio. Pelas 16h, José Rodrigues dos Santos discorre sobre se a literatura pode ter um carácter político e pelas 18h30, Dulce Maria Cardoso, João Tordo, Denise Mina, Mathias Enard e Rosa Liksom debatem o futuro do romance literário.

Rogério Martins

Bem seguro

Investir em livros Os livros raros e antigos continuam a ser um dos melhores investimentos na categoria dos bens culturais. Os três argumentos principais para o investimento em livros são a importância do objecto, a sua qualidade estética e o seu valor de mercado. Quanto ao primeiro argumento, quanto mais importante for o texto ou o autor, mais valioso é o livro. Assim, textos maiores do renascimento ou dos séculos XVIII e XIX continuam a atingir elevadas cotações, como também, no campo da literatura, aqueles associados aos autores mais importantes. A beleza estética do objecto livro e a boa qualidade do papel são igualmente determinantes, especialmente se estivermos a falar de livros do século XX, que sofreram intervenção de grandes designers gráficos. Finalmente, o valor do mercado é decisivo, e um autor norte-americano terá sempre uma cotação maior do que um português. Como pano de fundo de todos estes fundamentais, o investidor deve ter em conta que o decisivo no mercado é o livro ser uma primeira edição, estar em bom estado de conservação e possuir, se possível, uma assinatura ou dedicatória do autor. Quando se decide por entrar neste mercado, o investidor deve procurar estabelecer um racional para a sua futura colecção. Existem os tradicionais, como “ficção universal”, ou “grandes mestres”, mas podem também ser outros como “literatura africana”, ou “thrillers”. O investidor deve notar que o livro é sempre um veículo de escolha de todos os saberes e expressões, o que faz com que seja perfeitamente correcto, e valioso, investir numa colecção dedicada aos livros de

viagens, aos tratados matemáticos ou aos manuais de botânica. Claro que o investimento pode obedecer, também, a vários racionais em simultâneo, mas a dispersão é de evitar. Com a chegada das plataformas digitais, a capacidade de pesquisa dos investidores aumentou de modo tremendo. A grande referência é a Abebooks (www. abebooks.com), um local que reúne praticamente todos os dealers de livros, com predominância dos saxónicos. Depois da pesquisa, o investidor deve ter em conta que um sector de forte presença no mercado é o das casas leiloeiras, com as maiores, como a Sotheby´s e a Christie´s, a dominarem o mercado internacional, e as nacionais, como o Correio-Velho, a fazerem o mesmo no nosso país. Assim, consultar a informação sobre os leilões periódicos é fundamental. Finalmente, os grandes operadores do mercado são os livreiros de livros antigos e raros. Embora com excepções, a tendência ainda hoje é para os livreiros se especializarem na produção do seu próprio país, o que faz com que a pesquisa tenha sempre de ser nacional. Por sua vez, dentro das fronteiras geográficas, os livreiros têm também tendência em procurar a especialização temática, da poesia às biografias. Assim, os primeiros tempos do investidor devem ser de grande paciência, procurando encontrar o livreiro que melhor o pode ajudar a detectar os exemplares que lhe interessam. No caso português, o ponto essencial de começo é a Feira do Livro Antigo e Raro da Rua da Anchieta, no Chiado, que se realiza uma vez por mês, já que um grande número de livreiros de referência está presente. A partir daqui, é necessário percorrer os vários livreiros do eixo Rua do Alecrim- Rua do Século- Largo da Misericórdia, e começar a identificar as referências. Apesar de ser um negócio, o investidor deve ter em conta que a relação com o livreiro só funcionará, se for pessoal. Na verdade, os livreiros são pessoas muito emocionais. JV

Começa hoje a 83ª edição da Feira do Livro de Lisboa. Até dia 10 de Junho, os visitantes contam com algumas inovações que se traduzem num maior leque de escolha no que toca a espaços e actividades. Sendo ao ar livre, no parque Eduardo VII, também a data mais próxima do Verão permite um maior usufruto do evento, tanto durante o dia como de noite. Os horários alargados são nota disso mesmo: de segunda a quinta, das 12h30 às 23h; sextas, até às 24h; sábados e vésperas de feriado das 11h às 24h e domingos das 11h às 23h. Descansar Logo à partida, visitar os 240 stands e participar em inúmeras actividades pode parecer cansativo e até o parque Eduardo VII convida ao relax e à contemplação. São muitos os espaços livres onde os visitantes podem sentar-se e descansar. Este ano, o evento vai contar com mais dois espaços para relaxar, as chamadas zonas lounge, localizadas junto ao auditório APEL. Para comer, são sete os restaurantes e bares disponíveis no complexo da feira – mais as banquinhas de farturas, pipocas e outras guloseimas. Existem bebedouros espalhados pelo parque e cinco casas de banho em todo o recinto. Espaço Infantil As crianças contam com um espaço onde podem participar em actividades como os serões de contos, ateliês de ilustração e de arquitectura, música, teatro, Robertos, histórias para bebés, contos em Inglês, lançamentos de livros, animação de rua e “sussuradores” de palavras. Nos dias 1 de Junho, Dia da Criança, e 5 de Junho, Dia do Ambiente, os mais pequenos terão também um programa especial. Conferência de Edimburgo Mais uma novidade: a inclusão de Lisboa no roteiro da reputada Conferência de Edimburgo, uma conferência mundial de escritores que se juntam

Noite da Literatura Europeia É já amanhã, dia 24, que decorre a primeira Noite de Literatura Europeia. A partir das 18h30, e em oito cenários literários, os autores e actores e estudantes da Escola Superior de Teatro e Cinema farão leituras de obras de escritores que marcam a actualidade. Afonso Cruz (Portugal), Wolfgang Herrndof (Alemanha), Carme Riera (Espanha), Mathias Énard (França), Rosa Liksom (Finlândia), Massimo Gramellini (Itália), Keith Ridgway (Reino Unido) e Lucian Vacilescu (Roménia) são os autores convidados. Todas as sessões têm a duração de 15 minutos e entrada gratuita. Clube de Leitura Outra das inovações da 83ª Feira do Livro de Lisboa será o Clube de Leitura, feito em associação com clubes literários, como a Comunidade de Leitores de Paisagens Literárias de Lisboa e a Comunidade de Leitores. O primeiro traz, já no dia 26, “A Noite de José Saramago”, peça que fala da madrugada de 25 Abril de 1974, numa sessão conduzida por Ana Isabel Queiroz e com a participação de Pilar del Rio, presidente da Fundação Saramago. O segundo abordará a obra de Lídia Jorge, dez anos volvidos sobre o lançamento do livro “O Vento Assobiando nas Gruas”. A sessão, que acontece dia 8 de Junho, contará com a participação da autora e será conduzida por Filipa Melo, do Clube. Ambas decorrem no Auditório da APEL, na feira. Mobilidade reduzida Segundo a APEL, as características do parque garantem a acessibilidade a pessoas com mobilidade reduzida. Para além disso, também conforme informações da associação, uma das tarefas da equipa de voluntários (mais uma novidade deste ano) é justamente apoiar estes visitantes. Só existe uma casa de banho com acesso a pessoas com mobilidade reduzida e fica no café Central Parque. FFA


44 RADAR

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

Drones pacíficos

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brevoam áreas de difícil acesso ou onde haja suspeitas de actividades ilegais e transmitem informações essenciais: grupos de caçadores que perseguem animais, madeireiros que tentam abater árvores em zonas protegidas ou até a localização de novos ninhos de orangotangos - a lista de vantagens é longa. Com base nas informações recebidas

os guardas podem enviar piquetes para interceptar os ataques de forma muito mais eficiente e tirar o melhor partido dos recursos disponíveis. Este projecto tem o patrocínio de várias organizações internacionais, entre as quais o fundo Google Impact Awards, que doou cinco milhões de dólares para a aquisição dos drones e o treino dos guardas florestais.

Corrupção afasta ‘cérebros’ O nível de corrupção de um país está directametne relacionado com a sua capacidade de atrair trabalhadores qualificados, afirma um estudo recentemente publicado na revista Nature. Segundo as autoras, Andrea Ariu e Mara Pasquamaria Squicciarini, o nível de corrupção de um país é um factor determinante na decisão de lá trabalhar ou não – pelo menos no que toca a trabalhadores com altas qualificações. Assim, os países com elevados índices de corrupção têm difi-

culdades em manter os seus “cérebros” – que preferem emigrar – e também em atrair trabalhadores estrangeiros de elevado nível, pois também eles escolhem outros destinos. Incentivos não ajudam Esta tendência verifica-se mesmo quando comparando países do mesmo nível económico, onde as perspectivas financeiras sejam idênticas e mesmo perante

incentivos estatais: em condições semelhantes ou mesmo ligeiramente piores, os mais qualificados preferem trabalhar em sociedades com menos corrupção. As autoras alertam para o facto de não ser suficiente investir na educação para garantir mão-de-obra qualificada no futuro – é também necessário combater a corrupção ou o investimento irá beneficiar outros países. Mais informação em http://www.nature.com/embor/journal/ vaop/ncurrent/index.html

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um fio de lã ultra fino e macio, que patentearam e que garantem não ter qualquer semelhança com as camisolas das avós. O dinheiro para arrancar com a produção foi angariado na plataforma Kickstarter, onde alguém com uma ideia pode apresentá-la e pedir o “patrocínio pessoal” de todos os que estiverem interessados em

Um cientista em cada garagem A ideia, segundo Antony Evans, um dos autores, é incentivar o máximo possível de jovens a imaginarem e testarem as suas próprias experiências, partilhando todo o seu método e mostrando o que já é possível fazer de forma independente. Os avanços exponenciais que se têm verificado em diversos campos das ciências têm reduzido imensamente os custos de vários processos, de tal forma que já estão acessíveis a quem quiser pesquisar, experimentar, inovar. Aqui trata-se, “simplesmente”, de introduzir genes fluorescentes (os mesmos dos pirilampos) numa planta ‘segura’. Próximo passo, a Rosa

Cem dias sem lavar a camisa

As calças de ganga acabam de ganhar um par à altura, a acreditar na recém-criada empresa Wool&Prince: uma camisa de homem que não se enruga e não ganha cheiro mesmo se usada durante cem dias seguidos sem ser lavada. Este é o mote dos inventores, que estudaram durante seis meses as melhores opções para obter

E ainda partindo do Kickstarter surge outra inovação com potencial para mudar o nosso dia-a-dia: plantas fluorescentes, que poderão, um dia, substituir os postes de electricidade nas ruas das cidades. A ideia não é de agora; há vários anos que projectos semelhantes têm sido desenvolvidos em laboratórios. A novidade é que esta equipa de entusiásticos biólogos, a trabalhar na Califórnia, quer criar plantas fluorescentes para distribuir pelos apoiantes do projecto, incluindo todos os códigos e passos do processo, numa abordagem que apelidam de “abertura radical”.

ajudar. Reuniram assim mais de 240 mil euros (tinham pedido só 20 mil) e já estão a produzir as camisas para os cerca de 2.300 apoiantes iniciais do projecto, que poderão dentro de alguns meses confirmar se os cem dias sem lavagens são ou não um sonho mítico. (http://woolandprince.com/).

A equipa começou por trabalhar com a Arabidopsis, uma planta da família da mostarda, por estar bastante estudada, não ser tóxica nem comestível e não apresentar quase nenhum risco de se reproduzir na natureza. No entanto, perante a entusiástica reacção pública, decidiram estender o projecto à mais familiar e atraente Rosa. Para já explicam que toda a planta será fluorescente, mas no futuro poderão estudar a possibilidade de tornar apenas as pétalas luminosas. Confirmam no entanto que não será tão cedo executada a utópica ideia de ruas iluminadas por plantas. Mas, como provaram com este projecto, tudo depende do interesse do público. (http://glowingplant.com)

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O uso de drones é um dos temas quentes do momento e a discussão pode ficar mais animada ainda, com sugestões inéditas para os veículos aéreos não tripulados. Desta vez trata-se de os usar para detectar caçadores furtivos em reservas naturais protegidas. Nos últimos meses foram noticiadas duas gigantescas matanças de elefantes em África - nos Camarões e no Chade -, num total de quase 400 animais mortos pelas presas de marfim. Alguns grupos de conservação da natureza, sem mãos a medir nos esforços, físicos e criativos, para combater a caça ilegal, esperam que a tecnologia os possa agora ajudar na luta. Graças a uma equipa baseada na Suíça, que desenhou um drone de baixo custo equipado com câmara, sensores e GPS, há já guardas florestais um pouco por todo o mundo a receber treino no uso dos pequenos aviões. Nas selvas do Nepal, da Namíbia e do Congo, entre outras, so-

À luz da planta


PASSATEMPOS 45

23 MAIO 2013 · JORNAL SÉNIOR

CRUZADAS DIRECTAS

PALAVRAS CRUZADAS

SOPAS de LETRAS Localize as palavras da lista. Podem ser encontradas em todos os sentidos, inclusivé na diagonal.

Conteúdos cedidos por Edições MTC http://edicoesmtc.blogspot.com

SUDOKU

Dificuldade FÁCIL

SOLUÇÕES


46 ESPECIAL

JORNAL SÉNIOR · 23 MAIO 2013

Lançamento do Jornal Sénior O Clube de Jornalistas foi pequeno para receber todos os convidados que, no passado dia 8 de Maio, ali se deslocaram para dar as boas-vindas ao quinzenário Jornal Sénior. Jornalistas, empresários, amigos, família, reunidos numa festa, receberam de braços abertos este novo projecto que tem como missão dar voz aos seniores deste País, informá-los, esclarecê-los mas, sobretudo, representá-los. Em suma, um amigo que se leva para casa e se apresenta a toda a família. Registamos aqui alguns momentos… Fotografia: Rogério Martins

Alexandra Abreu, Mário Zambujal e Maria Assunção Oliveira

Mário Zambujal, Director do Jornal Sénior

Leonor e Adriano Eliseu

Mário Zambujal e João Paulo Sacadura

Maria João e Rui Tovar

Carlos Bravo


ESPECIAL 47

23 MAIO 2013 · JORNAL SÉNIOR

Pedro de Freitas e Maria Assunção Oliveira

Cristina Ovídio e Leonor Xavier

Adriano Eliseu e Francisco Moura

Alice Vieira e Margarida Mercês de Melo

Mário Zambujal, Cesário Borga e Fernando Dacosta

Júlio César

Alice Vieira e Silva Pinto

Nelson Costa e Rui Tovar

Em primeiro plano, Paulo Farinha

Joaquina Madeira

João Malheiro e Adriano Eliseu


48 ÚLTIMA

CRÓNICA

CÁ POR MIM Alice Vieira Pela primeira vez na minha vida faço parte de uma equipa que está a fazer nascer um novo jornal. Todos aqueles por onde passei tinham já dezenas e dezenas de anos de trabalho, tradição e público. Desta vez é uma aventura. E também, ao que se diz, este é um jornal destinado àqueles a quem já cantaram os “parabéns a você” muitas e muitas vezes. Óptimo. Sinal de que estão vivos – coisa de que nem todos os vivos se podem gabar. Mas esta coisa da idade é sempre muito relativa… …”Coitado, já tinha uma certa idade”, diz-se normalmente quando morre alguém não muito novo. Mas eu nunca percebi o que é ter “uma certa idade”. Tenho sempre diante dos meus olhos – colado na parede onde também estão coladas as fotografias dos homens da minha vida, entre os quais os netos… – um postal que em tempos um amigo me enviou de Berkeley e que, numa tradução tão aproximada quanto possível, diz: “Que idade terias se não soubesses a idade que tens?” E posso garantir-lhes que a resposta varia todos os dias. Neste momento, por exemplo, a tentar sair de uma gripe que parece ter-se apaixonado inabalavelmente por mim, se eu não soubesse a idade que tenho era bem

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capaz de jurar que andava aí pelos 200, mais Manuel de Oliveira, menos Manuel de Oliveira. Mas antes de a gripe me ter atacado, eu diria que andava aí pelos 30 ou 40. “Esse é que é o teu mal! Pensas que tens 20 anos, e não tens! ”, refilava ontem a minha filha, quando entrou no meu quarto para me deixar os remédios na mesa de cabeceira. (Não liguem. No fundo, no fundo, mas lá mesmo bem no fundo o que ela queria dizer era “coitadinha, estás doentinha e a morrer” e fazer-me tap tap na cabeça.) Isto tudo só para dizer que velhice é coisa muito discutível. E que, por mais que se refile e se entre em depressão, ainda não se inventou outro meio de se viver muito tempo. Mas para os que, às vezes, estão quase a sucumbir a esse peso da idade, nada melhor do que ligarem para o Canal Parlamento, e olharem para aquelas bancadas: há deputados (não, não vou dizer o nome de nenhum embora às vezes bem me apeteça), aí na casa dos 30/40, que eu juro que já nasceram com 100 anos em cada ombro: falam com 100 anos em cada palavra; exibem ar de mau com 100 anos em cada sobrancelha. Se calhar a maioria de nós, que entramos agora nesta extraordinária aventura de fazer um jornal como este, não estará nos seus, digamos, verdes anos de adolescência e juventude. Pois não. Mas, sem nenhuma espécie de saudosismo, assiste-nos a todos a enorme vantagem de termos conhecido o antes e o agora. A maioria de nós foi do tempo da caneta, das máquinas de escrever com aquelas fitas metade vermelhas metade azuis, que era preciso fazer render ao máximo porque eram caras e o chefe fazia sempre cara feia quando era preciso requisitar alguma — mas também é do tempo dos computadores. A maioria de nós foi do tempo do chumbo, das velhas

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rotativas, das linotypes, da maquetagem a régua e esquadro nas enormes folhas de papel — mas também é do tempo das páginas formatadas no ecrã. A maioria de nós foi do tempo em que o jornalismo se aprendia com os mais velhos, ali na tarimba, com os nossos erros, com as dezenas de vezes que tínhamos de rescrever a notícia e nem pensávamos que algum dia viria a ser de outra maneira — mas também é do tempo das escolas de jornalismo. Isto para não falar da maior diferença de todas: a maioria de nós foi do tempo da censura, das páginas retalhadas pelo lápis azul, da angústia de perder as ligações se os jornais se atrasassem – mas também é do tempo da liberdade. Mas, ó gente, o que eu queria mesmo dizer – e juro que ninguém me encomendou o discurso nem sequer falei com os chefes – era que, e parafraseando o título de um filme dos Irmãos Coen, “Este jornal não é para velhos”! Pois, se calhar não vamos ter aqui todos os dias notícias e reportagens do Justin Bieber (tadinho, acho que lhe foi apreendida droga no carro, vejam lá!, só tenho coisas que me ralem…),nem me estou a ver de plantão à casa da Venda do Pinheiro — mas não falharemos certamente o que acharmos de interesse, seja qual for a nossa idade, e seja qual for a idade que tem quem nos vai ler. Cá por mim, irei escrever com o mesmo espírito com que escrevi em todos os jornais por onde andei. E, já agora, bem podemos aproveitar um slogan que anda aí estampado na parte de trás dos assentos de muitos táxis --“Entre no dia com um sorriso!”— e entrar também neste jornal com um enorme sorriso. Pelo menos de quinze em quinze dias, a vida vai sorrir-lhes um bocadinho mais. Cá por mim, farei tudo por isso.

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