A Lua Caprichosa Ricardo Alves Diz a memória popular que a lua é feita de queijo, isso é uma mentira enorme. Também dizem que é caprichosa, quanto a isso... já não sei. A lua é sim, muito vaidosa. Ela também se atrapalha muito, por isso lhe chamam mentirosa. Certo inverno a lua estava a mirar-se sobre um lago, bem para aquele lado do vale, quando notou a sua aparência um pouco mais rechonchuda que o costume. A lua logo se achou muito redonda. Lembro-me desse dia muito bem. Eu estava passando por lá e por vias do acaso acabei por me deparar com a lua, muito chateada, falando com o boneco de neve. Nunca pensei que a neve falasse ou que a lua passasse tempo falando para o boneco. O certo é que a lua estava muito chateada, porque se sentia muito inchada e redonda.
Você já se apercebeu que as estrelas não têm casa? Pois é, as estrelas vivem no espaço e existem noites em que todas vêm para ele brilhar. Um astro em particular, a lua, está sempre mais perto de nós. É uma estrela muito peculiar.
O boneco de neve dizia-lhe que a tinha visto todo o inverno e que a admirava mais agora, mais brilhante e resplandecente. 1
Tudo isto chateou a lua. Ela bem disse para o boneco esperar vê-la mais magra e elegante, mas ele não pôde esperar e derreteu.
Para meu espanto ela estava falando com a lua. A lua vangloriava-se de estar a ficar cada vez mais minguante. A esperta raposa ouvia, mas ouvia com aquelas orelhas compridas e levantadas com que ouve todos os sonhos de alguém.
Sabe, nunca mais esqueci aquele sítio e muitas vezes voltei lá, na esperança de ver a lua brilhando sobre o lago num luar encandeante. O tempo passou. Certa primavera estava eu transportando umas flores, decidi cortar caminho, indo pelo trilho do vale, só na esperança de ver a lua. Como aquele atalho era muito comprido, quando cheguei lá a noite já ia alta e a lua espampanante no seu posto.
O seu focinho também comprido detectou algo de estranho na história da lua. Sabe, vim a saber que o temperamento da lua a nada serve à raposa e por isso, ela não a entende totalmente. Quando falei com ela disse-me que a lua iria ficar cada vez mais esguia e por fim desaparecer.
Nessa noite eu tinha combinado encontrarme com minha amiga raposa. 2
Pois um dia estava eu muito triste na minha casa quando ouvi uma voz vinda da noite. Aquela voz estranha parecia chamarme e, embora no início tivesse medo, acabei por a seguir de novo até ao vale.
Quando lá cheguei notei uma altiva figura sentada no tronco da árvore do lago. Era um mocho.
Por isso decidi ir trazendo mais e mais flores todos os dias ao campo. Mas no fim da primavera vi as flores murchar e a lua desaparecer. Aquele foi um triste verão. Por algum tempo não pisei aquele campo. Sabe? O que fica bem daquele lado.
O mocho tem na natureza a tarefa de vigiar o sono de todo o mundo. Como quase não dorme leva o seu tempo estudando e é muito sábio. Ele disse que me conhecia e que eu não me preocupasse pois a lua iria voltar. O seu olhar pareceu-me tão verdadeiro que por momentos vi a lua brilhar nele.
Essa conversa deu-me mais ânimo e pelo outono já me atarefava de novo de volta do lago. 3
te. Demorei algum tempo a descobrir como tirar água reflectida da lua do lago, mas um dia achei. Por essa altura a lua estava de novo crescendo, mas parecia ser a mesma lua de sempre, o que me deixou feliz.
Nesse momento eu apresentei-me a ela. Naquele momento ela não me assustava tanto pois era menos altiva e eu grande não era.
Hoje vivo aqui em cima junto da lua. Nos dias mais claros em que a ela está mais brilhante e cheia, você pode ver uma luzinha brilhando intensamente junto dela. Sou eu contemplando a lua no lago. Mas se vir uma estrela cadente, numa noite escura sem luar, sou eu correndo para a ir agarrar.
Recordei-lhe de como a tinha visto discutir com o boneco de neve, exibir-se para a raposa e como tinha desaparecido um dia. Tudo isso fez a lua sortir pois viu como eu estava preocupado. Ela explicoume que tudo aquilo era natural nela, e tudo o que vive, muda e se transforma. Eu expliquei-lhe que adoraria viver no céu pois me parece o sítio mais bonito para viver e estaria a seu lado. Vi que isso deixou a lua meio sem graça pois ficou meio corada e laranja. Ela contou-me que se realmente queria viver junto dela, teria de beber da água do lago, bem onde ela se refle4
Dedico esta história À minha família em cujos olhos sempre vi uma estrela. Ricardo Alves
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