Comunicação 360º - edição 14

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ISSN 1809-5704

Nº 14 • Junho • 2010

Agenda

2020 Capa

Contagem regressiva para os novos desafios da Comunicação

Uma publicação



c omunic aç ão Carta ao leitor Um mergulho no futuro

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Artigo

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Entrevista

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Lala Deheinzelin escreve sobre o poder de criar mundos

Rosa Alegria revela sua visão corajosa e de longo alcance

Nicolau Copérnico Prospectando uma nova ordem

Gandhi Uma proposta de liderança horizontal e colaborativa

Platão Convite ao diálogo com os stakeholders

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Julio Verne

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Crônica

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Comunicadores visionários

Despertar em 2020

Humor Viagem à próxima década no traço de Dil Márcio

Tendências Guia para reflexões

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comunicação

ISSN 1809-5704

Diretora Executiva: Jaíra Reis Conselho Editorial: Alexandre Soares, Carina Almeida, Cristina Mello, Eliane Levy de Souza, Flávia Galindo, Gina Mesquita, Gislaine Rossetti, Jaíra Reis, Marcelo Kanhan, Maria Leonor G. Delmas, Paulo Clemen, Raquel Cunha, Simone Soares e Vanessa Aguiar Jornalista Responsável: Jaíra Reis MTB 1.581 Produção de Conteúdo e Design: Casa do Cliente Comunicação 360º Edição: Eliane Levy de Souza e Vanessa Aguiar Direção de Arte: Gina Mesquita Redação: Ademir Veroneze, Alfredo Boneff, Christina Lima, Júlia Lomba, Isabela de Assis, Maíra Gonçalves, Marcos Moura, Mariana Gouvêa, Natália Calandrini e Sânia Motta Produção Gráfica: Adriano Cardozo e Marcio Vilas Bôas Revisão: Cristina Motta e Lourdes Pereira Fotografia: Adriano Cardozo, Carol Jordão e banco de imagens Nós da Comunicação Colaboradores: Carla Güttler, Cyra Morato, Dil Márcio e Malu Gallas Brasil CTP e Impressão: Sol Gráfica Marketing & Comercial: Camila Leite e Marcelo Ivanovitch (21) 3543-7698 midia@nosdacomunicacao.com As opiniões reunidas nesta publicação não representam necessariamente nosso ponto de vista. A revista Comunicação 360º está disponível na íntegra em www.nosdacomunicacao.com publicada sob licença Creative Commons 3.0 Uma publicação

Atendimento ao leitor: contato@revistacomunicacao360.com.br Assinaturas: assinatura@revistacomunicacao360.com.br Parceiros do Conhecimento:

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Um fio de luz Desta vez, a produção da revista exigiu um tempo maior. O tema escolhido demandou uma profunda imersão da equipe, que precisou de alguns meses para avançar dez anos e traçar cenários e desafios da próxima década. E entregar ao leitor neste fim de semestre de 2010 um panorama da Comunicação 2020. O assunto já está em pauta nas grandes organizações, que praticam o planejamento de longo prazo. Mas como desenhar um mapa geral de 2020 se, como observam os pesquisadores, mal se pode prever o que acontecerá em cinco anos? Foi o olhar atento ao passado e ao presente – como o do condutor que mira o espelho retrovisor – que nos permitiu seguir em frente. Com coragem para questionar e aprender, incansavelmente. Partimos de uma interrogação-chave: no ritmo vertiginoso dos avanços científicos, o que faremos com tanta tecnologia? E, desdobrando a pergunta, será que conseguiremos utilizar tantos recursos a favor da humanidade ou, como narcisos fascinados pelo próprio talento criador, acabaremos tragados pelas máquinas que construímos? Sob a inspiração de grandes visionários, como Copérnico, Gandhi, Platão e Julio Verne – que batizam as retrancas da edição –, saímos em campo. Foram incontáveis horas de pesquisa e de entrevistas – preciosas trocas de ideias com pensadores da academia e do mundo corporativo, que, como não podia deixar de ser, resultaram em mais perguntas que respostas. Porque nós, da comunicação, somos movidos por uma saudável inquietude, que orienta nosso senso de investigação. Como jornalistas, tínhamos o compromisso de projetar uma fotografia isenta, real, de 2020. Com suas luzes e sombras. Valeu a pena. Transitando no escuro, exercitamos a imaginação e fomos conduzidos por um fio de luz. A luz do pensamento – de nossa capacidade de reflexão – nos guiará sob a névoa do futuro. Jaíra Reis

Comunicação 360º passa a integrar, a partir desta edição, a rede de conhecimento Nós da Comunicação. Em 2007, a publicação conquistou o Prêmio Aberje Nacional de Gestão de Mídia Impressa e, em 2009, o Prêmio Aberje Capítulo Rio de Janeiro e Espírito Santo de Mídias/Pequenas e Médias Organizações, em parceria com o site Nós da Comunicação


Carta ao leitor


Artigo


Sob o ângulo de

Lala Deheinzelin

O futuro desejavel

da comunicacao Escrevo este artigo como uma ficção embasada por minha experiência em consultoria para governos e empresas, os conceitos que dela derivam e as visões de futuro que resultaram dos workshops que realizamos. Parto de dois temas com que atuo, fundamentais para pensar comunicação em 2020: (1) economia criativa – a grande estratégia de desenvolvimento sustentável do século XXI; (2) criação de futuros desejáveis – um processo essencial para gerar motivação, inovação e oportunidades. Olhando imagens e visões do ‘passado do futuro’ fica claro que aquilo que vivemos hoje foi antes sonhado: telecomunicações, computação, carros, cidades, medicina diagnóstica, formas de lazer. Pelos meios de comunicação, tudo isso mobilizou nosso desejo e inseminou o presente. A comunicação não apenas relata mundos. Ela cria os mundos que relata. Portanto, tem papel fundamental na construção de outros modelos de negócios e de mundo necessários e possíveis

ESTAMOS EM 2020. Já está acontecendo a mudança de época que marca a passagem de milênios, da vida que se organizava em torno do material, tangível e finito (terra, ouro, petróleo) para esta outra época em que o intangível é o elemento central. Isso porque na última década governos e empresas tiveram de trabalhar a partir da centralidade dos recursos que, infinitos, se renovam e se multiplicam com o uso: cultura, criatividade e conhecimento. Ficou claro que não haveria possibilidade de desenvolvimento, sustentabilidade e qualidade de vida se os modelos econômicos e sociais seguissem baseados na exploração dos recursos materiais, que são finitos. Foi preciso aprender a fazer dos recursos intangíveis a ‘matéria-prima’ e a essência de uma nova economia da abundância, potencializada pelos infinitos oferecidos pelas novas tecnologias e a organização em redes e coletivos. Foi preciso criar novos modelos que não apenas tivessem resultados econômicos, como também resultados nas dimensões social, ambiental e cultural/simbólica (o quadripé da sustentabilidade). Foi aí que a Economia Criativa se consolidou como a grande estratégia de desenvolvimento sustentável do século XXI. E a comunicação se consolidou como o elemento facilitador e agregador, que permitiu a convergência e a ação transdiciplinar necessárias para que isso acontecesse. Uma notícia que acelerou essa mudança foi o fato de, após a crise financeira de 2008, a China ter adotado a Economia Criativa como estratégia número 1 de desen-

volvimento para o país (isso é real! Não é ficção). Muitos países, como o Brasil, desconheciam esse fato, e empresas seguiam adotando políticas e prioridades obsoletas. Nos últimos anos, as empresas perceberam que produtos e serviços se assemelham e preço e qualidade são premissas, não diferenciais. Aquilo que pode ser garantia de longevidade, atratividade e fidelização é intangível: marca, design, inovação, atributos culturais, responsabilidade social e ambiental, liderança. Produtos e serviços se distinguem pelo tipo de experiência que provocam (hoje, o motor da economia é menos o produto ou o serviço e mais a experiência vivida, por isso turismo e entretenimento crescem tanto). Valores não são mais medidos apenas quantitativamente, mas qualitativamente. Mede-se não apenas resultado (visão de curto prazo), mas principalmente impacto (visão de médio prazo). A reputação é a grande medida para o valor de uma empresa e instituição, é o que garante sua capacidade de seguir atraindo colaboradores para suas equipes e consumidores que desejem seus produtos e serviços. Vamos agora analisar alguns dos elementos que tornaram possível essa mudança, que, segundo os analistas atuais, colocou o mundo numa agenda que pode representar a solução para muitos dos maiores problemas do planeta e da humanidade. Era da Informação ou Era da Criatividade? – Nesta década, ficou claro que a questão central não é tanto a informação

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disponível,como a cultura e a criatividade que nos dão a capacidade de usá-la. Um paralelo: ter os ingredientes não significa ter o bolo. Falta a receita, o processo, o saber o que/como usar. Isso orientou a reformulação da comunicação nesta década.

‘Hoje, o motor da economia é menos o produto ou o serviço e mais a experiência vivida, por isso turismo e entretenimento crescem tanto’ ‘Os ecólogos socioculturais são novos profissionais, que têm papel central nas decisões, nas esferas pública e privada, e unem comunicação, cultura, direito, economia’

De produtos a processos – Nossos sonhos do passado mostravam um futuro em que a tecnologia, os produtos inventados, eram a solução para tudo. Hoje, sabemos que a tecnologia é meio, não fim, e isso reforçou ainda mais a necessidade de processos: mudar o jeito de pensar e fazer. A comunicação deixou definitivamente de estar vinculada apenas a produto (notícias e informações) e é cada vez mais processo (como conectar e integrar pessoas e sistemas). Ecologia Sociocultural – Consideramos não apenas a ecologia ambiental (tangível) do século XX como a ecologia sociocultural (intangível), essa nova disciplina que integra de forma sistêmica as muitas disciplinas ligadas ao humano. Os ecólogos socioculturais são novos profissionais que têm papel central nas decisões, nas esferas pública e privada, e unem comunicação, cultura, direito, economia. Modems e conectores – No século XX, as telecomunicações e computação puderam evoluir graças ao modem e sua capacidade de integrar e colocar em contato linguagens e sistemas diferentes. Neste século XXI, a mudança de época para a centralidade do intangível e da economia criativa só foi possível graças a profissionais e instituições que atuaram como modem, como conectores. Os novos profissionais e empresas de comunicação são modems promovendo a necessária integração entre áreas de governo, setores de negócios, disciplinas. Capital social, confiança, autoestima – A comunicação tem o poder de construir ou destruir a confiança e a autoestima (de pessoas, comunidades, empresas, cidades), de dizer se o santo de casa faz ou não milagres. Com medo e sem autoestima não há autoconfiança, portanto não há confiança interpessoal,

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o que resulta na falta de capital social. E a chave de desenvolvimento está no capital social – o único que nos falta. A comunicação em 2020 é a da boa notícia, da diversidade cultural, da valorização do santo de casa, de tudo o que fortalece a cooperação e a autoestima. Tempo: único recurso não renovável – Os futuros desejáveis postados na wikifuturos revelam que, para muitos, o tempo é o recurso mais precioso. E o único que de fato não se renova. As novas tecnologias permitiram que conquistássemos o espaço e a quantidade: estamos em muitos lugares simultaneamente. Mas com isso perdemos o tempo e a qualidade. A Comunicação 2020 não apenas nos ajuda a otimizar o tempo como a recuperar e ampliar o desfrute, a intensidade, o sentido que estavam se perdendo na primeira década deste século. Consequências e escolhas – Entre 2010 e 2020, o excesso de informação e demanda, a escassez de tempo e a urgência na mudança rumo à sustentabilidade fizeram com que saber escolher e ter percepção das consequências de cada ato fossem prioridades. A comunicação tornou-se a ferramenta para facilitar escolhas e explicitar consequências. Conclusão Nossa história mostra que a comunicação é o que nos diferencia como espécie e que a criação e o aprimoramento de suas ferramentas – linguagem, símbolos, escrita, imprensa, tecnologia digital – foram os responsáveis pelos saltos de nossa evolução. O futuro ainda não é. Pode ser de muitas maneiras. E a comunicação tem poder criador ao semear as ideias, as visões e os processos que podem construir o mundo melhor que não apenas é desejável, como possível.

Lala Deheinzelin é especialista internacional em economia criativa, sustentabilidade e futuro. Desenvolve seu trabalho por meio de consultoria, palestras e oficinas para empresas, governos e instituições multilaterais. Saiba mais em www.laladeheinzelin.com; www.criefuturos.com www.wikifuturos.com

Mais em Nós da Comunicação Entrevista: Lala Deheinzelin: ‘Economia criativa é ter o foco no futuro’ http://bit.ly/8UL8Qz Multimídia: Lala Deheinzelin fala sobre o uso da tecnologia na aplicação de futuros desejáveis http://bit.ly/wy8Rp



Entrevista De acordo com a comunicóloga Rosa Alegria, para vislumbrarmos o futuro temos de tomar decisões corajosas: acender o farol de milha e desligar o retrovisor. A metáfora não significa desapego ao passado, mas, simplesmente, alude à necessidade de transformar a realidade à frente. O futuro, esse campo ainda inexistente, é justamente seu objeto de trabalho. Mestre em Estudos do Futuro pela Universidade de Houston, Rosa foi executiva de comunicação empresarial em organizações como Avon. Hoje, integra o coletivo Imagens e Vozes da Esperança, que tem um segmento brasileiro (www.ive.org.br) e reúne profissionais da comunicação de todo o mundo para refletir sobre o teor das mensagens veiculadas pela mídia e seus impactos na sociedade. Ao discorrer sobre o perfil dos comunicadores do futuro, mídias sociais, inovação e sustentabilidade, a futurista estabelece formulações instigantes, que dão concretude a aspectos intangíveis, como imaginação e humanismo. Ignorados na maior parte das redações e empresas – ainda que apareçam na retórica marqueteira de determinadas campanhas – esses valores poderiam contribuir para o surgimento de um novo paradigma na comunicação. Trata-se até de uma mudança urgente em face do panorama global de crise em vários âmbitos. Projetar o futuro significa, nas palavras da consultora, enfrentar o desconhecido e alcançar lugares incômodos. Fazer essa viagem inadiável em direção ao futuro é a proposta de Rosa Alegria a comunicadores, organizações e pessoas Alfredo Boneff


Rosa Alegria

A comunicacao da

esperanca Comunicação 360º – Um artigo de sua autoria tem como título ‘Por que estudar o futuro?’. Esse questionamento é sintomático em tempos permeados pelo surgimento de novas tecnologias que parecem diluir o próprio conceito de tempo. Nesse sentido talvez seja possível ampliar a pergunta: por que estudar o futuro diante de um contexto social e, evidentemente, corporativo, em que o imediatismo e a ausência de reflexão parecem ser a regra? Rosa Alegria – Estudar o futuro deve ser a prática mais fundamental dos nossos tempos. Primeiro porque o futuro é o tempo que nos resta, em nível individual ou corporativo. É também o campo no qual vamos tomar decisões. Mediante a aceleração provocada pelas novas tecnologias, os espaços de tempo são muito mais rápidos. Portanto, tomar decisões com tanta rapidez – o que gera incerteza – é mais difícil hoje. Para tomar decisões certas, é preciso entrar em campos ainda não navegados. O futuro é um campo que não existe. Mas pode existir no imaginário. E pode mudar o presente. Assim, existe uma grande diferença entre mudar o presente olhando para trás e mudá-lo olhando para a frente. Olhar para trás é olhar para o passado. O passado tem registros, tem documentos, tem fatos e história. Isso nos dá segurança, nos alicerça para lidar com aquilo que já conhecemos. O cérebro humano está acostumado, desde que existimos como espécie, a lidar com o que conhece. Estamos sempre querendo tocar, ver, provar

que algo existe. Baseamo-nos também nas histórias que ouvimos. Por outro lado, nosso cérebro não está capacitado para lidar com o desconhecido. Quando entramos em contato com ele, ficamos inseguros, com medo de errar. Mas as decisões que temos que tomar hoje, nesses novos tempos em que vivemos quatro crises simultâneas – dos alimentos, energética, financeira e ecológica – têm de ser inovadoras, capazes de transformar a realidade. Se apenas olharmos para o retrovisor, vamos nos limitar a projetar aquilo que já passou, não mudaremos nosso paradigma. Costumo dizer que é preciso acender o farol de milha, pois ele poderá iluminar o que é possível – por meio do pensamento e da imaginação – à frente. Não podemos conhecer o futuro, pois ele não existe. Conhecemos o passado e, mesmo assim, de forma relativa, porque a história é relatada de forma muito parcial, de acordo com as conveniências conjunturais das épocas. Então, esse é o grande dilema. Diria que não existe outro caminho, senão o de termos a coragem de percorrer uma rota que não conhecemos, onde nunca estivemos e não temos ideia do que vamos encontrar lá. É nesse campo que nós, futuristas, trabalhamos junto às organizações. O objetivo é fazer com que as pessoas estejam em lugares nos quais nunca imaginaram estar, por meio do recurso que considero o mais precioso desses novos tempos. Um recurso que não é material ou financeiro, mas renovável e abundante: a imaginação. Por

meio dela é possível influenciar o futuro de uma organização mesmo sem conhecê-lo. Mas é preciso ter coragem para entrar no desconhecido.

Comunicação 360º – O exercício da comunicação na próxima década exigirá novas capacitações e perfis profissionais. Já é possível projetar quem será esse novo profissional e qual será seu papel na comunicação dentro das empresas? R. A. – As projeções são muito relativas, de acordo com os valores de cada futurista. Posso projetar aquilo que já percebo como demandas da sociedade, da nossa civilização e como oportunidades para os comunicadores. Daqui a dez anos podemos imaginar como estaremos caso nada seja feito para mitigar essa situação ambiental, que é a mais grave de todas. Se nada fizermos, a Terra vai continuar viva e nós teremos nos destruído. A espécie humana, da qual fazem parte os comunicadores, não terá provado a sua inteligência. Os comunicadores, neste momento, têm que provar que não são apenas inteligentes, mas conscientes de seu papel no mundo. Considero que estamos vivendo o fim de uma era. E todo fim de era traz o caos. Porém, algo tem que nascer desse caos. Trata-se de uma crise de valores, social, ambiental e financeira. Dentro desse contexto geral, há também uma crise da comunicação, pois há uma ruptura tecnológica que está mudando a profissão. Tenho tido contato com estudantes de comunicação e percebo uma

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‘Por meio da imaginação é possível influenciar o futuro de uma organização mesmo sem conhecê-lo. Mas é preciso ter coragem para entrar no desconhecido’ ‘Se nada fizermos, a Terra vai continuar viva e nós teremos nos destruído. Os comunicadores, neste momento, têm que provar que não são apenas inteligentes, mas conscientes de seu papel no mundo’ ‘O comunicador, além de ser um tradutor da realidade, precisa abordá-la sob um ângulo de 360º. Isso significa mostrar o outro lado, trazer uma proposta criativa, que aponte caminhos e ilumine as pessoas. Que recupere o poder que elas têm de sonhar’

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profunda incerteza entre eles. Mas dentro dela pode estar o pulo da inovação, da mudança. A partir desse contexto faço uma recomendação e uma projeção: que o paradigma da comunicação seja o de criar uma nova história. Esta sociedade não está sendo nutrida pelo entusiasmo ou pela esperança. Não está sendo nutrida pela solução. Na verdade, está sendo envenenada pela descrença, pela tragédia e pela sombra. Temos que redirecionar o nosso foco. O comunicador, além de ser um tradutor da realidade, precisa abordá-la sob um ângulo de 360º. Isso significa mostrar o outro lado, trazer uma proposta criativa, que aponte caminhos e ilumine as pessoas. Que recupere o poder que elas têm de sonhar. Hoje, pelo que recebemos dos meios de comunicação, o comunicador vem sendo um instrumento de perpetuação do caos. Ele tem de se perguntar qual é a sua função neste mundo e o que pode fazer para beneficiá-lo com seu talento e seu poder. Esta é a grande virada da comunicação. Ela tem que ser um construto cultural de uma nova imagem de mundo, de uma nova história. O comunicador do futuro, daqui a dez anos, pode assumir o papel de promover a criação de um novo imaginário. O fato continua sendo a matéria-prima, mas por que não acrescentar o que está nascente? Por que não trazer tendências, possibilidades, um olhar à frente? Definitivamente, temos de acreditar naquilo que não existe. Ou melhor, naquilo que pode existir a partir da nossa capacidade de criar o novo. Comunicação 360º – Em que medida as novas capacitações exigidas dos profissionais da comunicação vão estar relacionadas a novas tecnologias ou farão parte de uma mudança mais ampla, de paradigmas culturais e da assimilação de novos conhecimentos? Com isso, a palavra inovação ganharia mais abrangência, superando um contexto marcadamente tecnológico? R. A. – Tanto o cidadão comum quanto o profissional de comunicação, em suas diferentes realidades, estão cada vez mais fortalecidos pela independência, pela liberdade e pelo poder de vigilância sem intermediários, sem filtros. Mas é preciso que esses comunicadores se apropriem

dos recursos tecnológicos e que possam exercer, com plenitude, a sua cidadania dentro da profissão. Que eles possam cumprir seu papel de forma construtiva, promovendo diálogo nesse mundo da interatividade. O mundo da internet ainda está na infância. Atualmente, a capacitação tecnológica está sobrando. O que é realmente necessário é a recuperação da consciência humana. É responder à pergunta: o que eu faço com isso? Será que continuo fazendo a mesma coisa que fazia no jornal, na redação? Em relação à inovação, não acredito, nesse momento, que inovação possa estar dissociada de sustentabilidade. Chega de farra! Só os Estados Unidos, atualmente, jogam fora 400 mil celulares por dia. Inovação, por si só, não vale nada se não for concebida sob a ótica da sustentabilidade. A inovação tem que ser social, não só de máquinas ou artefatos. Tem de ser inovação de processos. Tanto que hoje, quando falamos de design, o termo não se limita à confecção de objetos, inclui projetos e ideias. O design pode desenhar novas cidades, novas gestões dentro das empresas. Existe subjetividade na inovação. A inovação é cada vez mais intangível, subjetiva e desmaterializada. Estamos entrando no mundo da invenção das soluções, mas soluções não propriamente para atender às necessidades de consumo. Soluções para atender às necessidades do mundo. Comunicação 360º – Acredita que os profissionais da comunicação do futuro terão a capacidade (e o desejo) de receber, decodificar e disseminar informação sob uma perspectiva mais humanista e menos técnica? R. A. – Devemos redirecionar o significado da comunicação. O que nós fazemos não é comunicação. O que se faz em todas as vias midiáticas é informação, algo tragado à força por todos os que leem, veem e ouvem. Acabamos influindo no sistema cognitivo das pessoas apenas informando e não interagindo. Fico otimista com a era digital pela ausência de intermediários e porque ela promove conectividade. Nesse universo, uma marca pode sofrer grandes riscos se não for honesta com seus consumidores. Com essas novas tecnologias estamos entrando em uma era de transparência. O comunicador do futuro é aquele que olhará cada vez mais para o pequeno, o micro. O jornalista, em particular, deverá


celebrar e acolher as pequenas histórias. Terá uma atividade cada vez mais localizada. Não estará mais somente na esfera planetária, global, nacional. Comunicação 360º – Como pode ser avaliada a relevância de redes sociais como Twitter e Facebook para a formatação de uma nova forma de fazer comunicação a médio e longo prazos? De que forma a comunicação pode escapar do império da superficialidade e da autorreferência – tão associadas a essas mídias –, gerando conhecimento? R. A. – A interatividade – desprovida de intermediários com vários interesses comerciais – é legítima e promove oxigenação nas vias da mídia. É uma transição maravilhosa, mas temos de saber usar essas ferramentas. Há utilizações muito ruins. Está havendo uma decadência do Twitter porque não há nada relevante. As pessoas não estão qualificando as mensagens. Precisamos ressignificar a utilização dessas mídias. Acredito que vivemos hoje um neo-Renascimento. Estamos todos mais poderosos pelas tecnologias participativas e somos capazes de criar como nunca. No Renascimento, eram poucos os gênios privilegiados que criavam. Atualmente, somos todos autores. Vivemos a época do consumo autoral, do jornalismo cidadão. O tempo do ‘prosumidor’, aquele que produz e consome. É o que chamo de sociedade ‘midiocrática’. A ‘midiocracia’ é uma nova ordem de poder que vem por meio da interação direta do indivíduo com a mídia. Portanto, para aperfeiçoar essas mídias, teríamos de nos reunir em torno de forças potencialmente criativas, reunindo grupos de interesse para criar soluções de ordem ambiental, social ou organizacional. Hoje, vejo muita dispersão nessas mensagens. Não que não seja importante nos autorreferenciarmos, mas essa autorreferência não é saudável por ser uma expressão dissociada da realidade. Ainda estamos subutilizando as redes sociais. Elas têm que ser mais construtivas e pautadas em serviços. Comunicação 360º – O futurista Paul Saffo identificou uma nova era econômica, em que os ‘protagonistas são capazes de produzir e consumir na mesma ação’. Esse novo ator econômico, caracterizado pela interatividade das redes sociais, poderia

criar valor em uma simples busca no Google ou contribuição à Wikipedia. Concorda com essa percepção e, em caso positivo, como as corporações deverão lidar com esses novos consumidores-criadores? R. A. – Esse conceito de ‘prosumidor’ foi preconizado, já em 1980, por Alvin Toffler, quando escreveu A terceira onda. As empresas devem estabelecer novas relações com esses consumidores. Mesmo porque, possivelmente, eles nem serão mais chamados dessa forma. Não adianta uma empresa se limitar a ouvir uma reclamação ou sugestão e registrá-la. A organização deve estar preparada para receber ideias e dar o retorno. Existem alguns exemplos de organizações que criaram redes sociais como Nokia, Santander e Natura. Mas ainda são iniciativas muito restritas ao discurso. O ‘prosumidor’ tem várias vertentes. Existe aquele que deseja um produto tão exclusivo que não há empresa capaz de fabricá-lo. Então, ele quer que a empresa o ajude a produzir. Temos outro perfil, daquele que liga para a empresa, sugere uma ideia e quer ser homenageado por isso. Há ainda aquele da rede social, a quem chamo de ‘tribalista digital’. Ele quer entrar no site da empresa, escolher a cor do celular, definir o design da capinha etc. Enfim, não tem volta. As empresas precisam acordar para essa nova realidade. Nesse contexto, a comunicação corporativa deverá analisar os diferentes perfis desse ‘prosumidor’. Mas acho que ainda não acordou. Principalmente a publicidade. Não queremos mais ver ícones, projeções do que não somos. Não queremos que se produzam subjetividades externas às nossas. Queremos nos ver. Comunicação 360º – Projetar uma nova comunicação para o futuro significa abordá-la sob o prisma da sustentabilidade. Como avalia nossas corporações nesse aspecto? Estamos superando a etapa dos discursos relacionados unicamente ao meio ambiente (nem sempre efetivos) em direção a práticas sustentáveis em termos de gênero, raça, opção sexual e inclusão social? R. A. – Percebo que existem sérias intenções no mundo das empresas de se fazer alguma coisa. Mas não posso afirmar que a maior parte delas está fazendo algo substancial. As organizações que

‘O comunicador do futuro pode assumir o papel de promover a criação de um novo imaginário’ ‘Inovação não vale nada se não for concebida sob a ótica da sustentabilidade. A inovação tem de ser social, não só de máquinas ou artefatos. Tem de ser inovação de processos. Tanto que hoje design não se limita à confecção de objetos, inclui projetos e ideias. O design pode desenhar novas cidades, novas gestões nas empresas’ ‘Estamos entrando no mundo da invenção das soluções, mas soluções não propriamente para atender às necessidades de consumo. Soluções para atender às necessidades do mundo’ ‘Teríamos de nos reunir em torno de forças potencialmente criativas, reunindo grupos de interesse para criar soluções de ordem ambiental, social ou organizacional. Ainda subutilizamos as redes sociais. Elas têm que ser mais construtivas e pautadas em serviços’

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‘Está havendo uma decadência do Twitter. As pessoas não estão qualificando as mensagens. Precisamos ressignificar a utilização dessas mídias’

‘A comunicação corporativa deverá analisar os diferentes perfis do “prosumidor”. Mas acho que ainda não acordou. Principalmente a publicidade. Não queremos mais ver ícones, projeções do que não somos. Queremos nos ver’ ‘Não acredito ainda em sustentabilidade, pois não vejo as empresas com atitudes verdadeiramente humanistas no ambiente de trabalho’ ‘Aposto na comunicação da verdade, na publicidade da verdade. Não é pecado vender. Mas é pecado vender mentiras’ ‘A comunicação não pode ser apenas um retrato da destruição. Tem que ser também um retrato de nossa potencialidade como civilização. Um retrato da criatividade, da solução, da esperança’

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levam a sério a sustentabilidade têm que ter um olhar bastante holístico. Não adianta só salvar o rio da poluição ou criar uma creche para crianças carentes se, dentro da empresa, não há uma política interna justa, não existe igualdade de gênero, qualidade de vida. Acho que ainda estamos vivendo uma crise, um processo esquizofrênico, mesmo com avanços visíveis. São poucas as empresas que estão levando a sustentabilidade sob uma abordagem holística, integral. Isso significa olhar para fora, para dentro, ao redor. A grande fronteira a ser transposta para as empresas é olhar para o indivíduo. Perceber se ele está sintonizado com sua missão, se está feliz naquilo que faz na organização. Para salvar o rio, esse indivíduo precisa estar bem. Não pode estar massacrado dentro da empresa, sofrer assédio moral ou injustiças, vivendo num ambiente sem transparência, sem uma comunicação aberta. Não se pode pedir a um profissional para engajar-se numa campanha de voluntariado se ele não está sendo acolhido ou respeitado. Poucas empresas observam esse aspecto. Há muito discurso e pouca prática. É fundamental tornar o ambiente de trabalho feliz, fazer com que as pessoas se sintam felizes em vez de obrigá-las a trabalhar dez horas por dia. Deixar as pessoas respirarem para que delas venha o máximo de criatividade. Essa criatividade não vem de um cérebro cansado, de uma mente pressionada. Não acredito ainda em sustentabilidade, pois não vejo as empresas com atitudes verdadeiramente humanistas no ambiente de trabalho. Comunicação 360º – Um novo modelo de comunicação pressupõe um novo modelo de desenvolvimento, pautado a partir de valores intangíveis, sob uma ótica mais humanista e, portanto, mais colaborativa e acolhedora. Esse processo de mudança já está em progresso? Diante dessas perspectivas é possível afirmar que a comunicação do futuro será mais feminina?

não. Os comerciais saem do ar pela vigilância da sociedade em relação à ética que norteia essa comunicação. Se as empresas não levarem isso a sério... O poder que, nós, cidadãos, temos para derrubar a reputação de uma empresa, hoje, é imenso. Isso vem de uma crise de confiança. Hoje, somos muito mais céticos e descrentes em relação às corporações. É aí que entra o comunicador. Livre de intermediários, ele tem todo o poder para transmitir uma informação efetiva à sociedade. A comunicação deve ser informativa. Queremos saber o que realmente vale a pena saber. Chega de simbologias, iconografias. Aposto na comunicação da verdade, na publicidade da verdade. Não é pecado vender. Mas é pecado vender mentiras. É possível vender informando e conscientizando. Valores como respeito são universais, não necessariamente femininos. Mas ninguém melhor do que uma mulher para ter percepção do cuidado da vida, do acolhimento, pois ela perpetua gerações. A comunicação em favor da vida é uma comunicação com valores femininos, sim. Portanto, acho que a comunicação não pode ser apenas um retrato da morte, da destruição. Tem que ser também um retrato de nossa potencialidade como civilização. Um retrato da criatividade, da solução, da esperança. Não dá para imaginar essa garotada de dez anos sendo invadida por imagens e mensagens como as que vemos hoje: violência, hiperconsumo, medo. É muito perigoso ver as crianças crescendo dentro dessa cultura. Porque, futuramente, serão adultos, serão lideranças cada vez mais medrosas, atrofiadas e descrentes. O nosso legado na condição de comunicadores e cidadãos é fazer com que elas acreditem no futuro. E, da forma como a comunicação vem sendo feita, não atende a essa expectativa.

R. A. – Vejo alguns sinais nesse sentido dentro da própria web. Na mídia de massa, não. Não vejo quase nada. Pelo contrário. Percebo muita resistência. Vejo o movimento da sociedade, que está mais vigilante e vai conduzir essa mudança. Vemos, atualmente, comerciais saindo do ar porque a população achou que eram mentirosos. Isso nunca aconteceu antes. Antigamente, tiravam-se comerciais do ar apenas pelos critérios da autorregulamentação. Hoje, Mais em Nós da Comunicação Artigo: Da Matrix ao Self: o desafio evolucionário da mídia e das organizações http://bit.ly/c9hSEZ


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Copernico


insondavel No século XV, Nicolau Copérnico revolucionou o pensamento ocidental ao contrapor-se à teoria geocêntrica defendida pelo cientista grego Cláudio Ptolomeu. Mesmo sem um equipamento de grande precisão, ele revelou que a Terra girava em torno do Sol, não sendo, portanto, a protagonista do Universo. Ao fazer isso, o astrônomo, matemático, economista e médico polonês desbancou a crença de que a humanidade merecia ser o centro das atenções. Quase 500 anos depois, em 2006, a revista Time concedeu seu tradicional prêmio Personalidade do Ano a todos os produtores individuais de conteúdo da web – ou seja, você e eu. Finalmente, de forma coletiva, como usuário da internet, o homem teria recuperado seu poder, sendo alçado novamente ao cerne dos acontecimentos? Ou será que, hoje, o que importa nem é estar no centro – que desapareceu dessa intrincada teia, em constante expansão – mas simplesmente participar da rede, compartilhar conhecimento? Manter uma postura ‘antropocêntrica’ não encontra mais espaço no mundo de hoje, atesta o pensador Silvio Meira: “Sendo todos nós parte de uma ecologia complexa, diversa, é muito improvável que nos sustentemos em um mundo orientando-o inteiramente para atender nossas demandas”

Mariana Gouvêa e Christina Lima

mundo novo

Na palestra “Collaborative learning in the digital social medium” (Aprendizado colaborativo nas mídias sociais digitais), que apresentou na Olimpíada do Conhecimento, em março, no Rio de Janeiro, o filósofo e pensador tunisiano Pierre Lévy lembrou que as gerações anteriores não conseguiram vislumbrar nosso tempo, o que nos leva a crer que não seremos capazes de antever o futuro. Para Lévy, podemos visualizar apenas as bases técnicas do futuro – reflexão que reforça a impressão de que não iremos além de traçar o mapa tecnológico dos próximos dez anos. Mas até que ponto dominamos as tecnologias que concebemos para nos comunicar eficientemente? De acordo com Lévy, o desafio é transformar o conhecimento implícito em explícito e criar diálogo. Como encarar esse desafio no mundo web? Na mesma palestra, o pensador relembrou a característica que distingue os seres humanos: a habilidade de manipular símbolos. Por extensão, eles têm consciência de si mesmos, capacidade de dialogar e de contar histórias. Segundo Lévy, os meios de comunicação aumentaram essas capacidades. Será, porém, que conseguiremos, algum dia, utilizar satisfatoriamente a habilidade de manipular os símbolos que criamos? Seremos capazes de articular o acervo de informações e tecnologia que acumulamos? Afinal, o que o futuro nos reserva?

Objetos ou sujeitos de seu tempo? “A maioria das pessoas se deixa levar pelo dia a dia e não se engaja na construção

do futuro.” É o que argumenta Silvio Meira, cientista-chefe do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (C.E.S.A.R.) e professor de Engenharia de Software da Universidade Federal de Pernambuco, explicando por que “a relação com o porvir é temerária”. Ele vai além: “As pessoas que demoram muito a aceitar o futuro são sempre as últimas a fazerem parte dele. São objetos e nunca sujeitos. Estão sempre em um grupo de excluídos”, afirma Silvio. Ao olhar para um futuro em que a conexão entre as pessoas aumentará cada vez mais – porque o ser humano é gregário e quer fazer parte de um mundo mais conectado –, Silvio enxerga duas alternativas possíveis: ser contra ou a favor desse cenário. Mas cada posicionamento tem sua consequência. “Existe a possibilidade de dizer: ‘Não vou atrás desse negócio de smartphone porque já fui atrás de internet, aprendi a mandar e-mail e agora não vou mandar e-mail de smartphone’. Mas daqui a dez anos, quando todos estiverem mandando e aproveitando as oportunidades de negócio e desenvolvimento pessoal e social, você vai ceder. Aí está o temerário: chegar muito depois, quando a maioria das pessoas já chegou. É ser apenas o objeto e nesse caso, o objeto último da história’, analisa. Para o pesquisador, quem se recusa a aceitar e se incluir no futuro acaba se transformando em custo. “Toda vez que falamos de gente excluída, que tem medo do que está acontecendo, que precisa ser treinada para se inserir, estamos falando de um grupo para o qual, em última análise, precisaremos criar um plano de inclusão”,

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foto: Reprodução

Pierre Lévy

‘O desafio é tornar o conhecimento implícito em explícito e criar diálogo’ Pierre Lévy

‘As pessoas que demoram muito a aceitar o futuro são sempre as últimas a fazerem parte dele’ Silvio Meira

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avalia. Este grupo, para Meira, se perdeu no tempo e terá de ser recuperado de alguma forma. Silvio amplia a questão analisando-a sob a lente social: o que acontecerá aos milhões de brasileiros que estão tendo escola de má qualidade? “Teremos que carregá-los nas costas e criar programas de compensação educacional e social. Quem não sai junto com o futuro, vira custo – porque se torna parte do passado, e alguém tem de pagar essa conta”, avalia. O mais crítico, segundo Meira, é que a humanidade nunca foi capaz, em qualquer estágio de seu desenvolvimento, de levar – ou preparar – todas as pessoas para o futuro ao mesmo tempo. “Muitas sempre sobram e se perdem. Porque não enxergaram oportunidades, porque não se dedicaram, porque não havia alguém olhando e se preocupando com elas.” Para o consultor, uma vez que a necessidade de se criar planos de inclusão para o futuro é irreversível, a saída é minimizar o número de pessoas que precisarão ser carregadas “no braço” para o futuro. “Podemos reduzir ainda mais esse grupo se uma parcela suficientemente grande de pessoas entender que o futuro tem tudo a ver com elas – e que elas têm de lutar para não fazerem parte desse legado compensatório da sociedade”, afirma. “Quem não está preparado agora para o futuro precisa olhar para os lugares de onde vem e, quando aparecer o próximo Twitter, pode até ser a pessoa número 150.000.000 a entrar, mas não pode esperar três anos para entrar em uma rede que passa a ser uma parte considerável do processo de entendimento do mundo.”

A construção do futuro E o que significa, efetivamente, participar da construção do futuro? Para Meira, nada mais é do que identificar as possibilidades que podem se transformar em realidade. “Existe uma porção de adolescentes hoje, no Brasil, querendo namorar o [cantor] Justin Bieber. Algumas acreditam que exista uma possibilidade concreta de realizar isso. Mas esse futuro é real para quantas delas? Uma em 50 milhões. Isso não é um plano de futuro.” Ele contrapõe com um exemplo mais ‘pé no chão’: que tal aprender a falar inglês? Considerando que este é o idioma mais

falado no mundo dos negócios, que é possível se virar em qualquer país do mundo falando a língua e, inclusive, se comunicar com Bieber, um bom plano de futuro é decidir que está na hora de aprender inglês – e trabalhar agora para que isso aconteça”, sugere. Constatar que a internet se tornará uma linguagem comum para absolutamente todo o mundo já é uma previsão consumada e que continuará se comprovando nos próximos dez anos. Mas Silvio mostra preocupação com a superficialidade ao afirmar que não bastará simplesmente saber usar a web. “Qualquer pessoa vai saber fazer isso; é como saber falar. Mandar e-mail, entrar em um site, criar uma conta, participar de uma rede social, fazer upload de um vídeo não serão diferenciais competitivos. O diferencial será entender que a internet é um ambiente de inovação, programável, no qual podemos construir interações e processos de negócios. E entender que temos de nos preparar para fazer essa construção agora. Quem não estiver se preparando para isso, daqui a três anos vai descobrir um bocado de meninos de 15, 20 anos que sabem, e vai se perguntar como eles aprenderam. Foi lá no passado, construindo um pedaço do futuro”, estabelece.

Sustentabilidade sob uma perspectiva isenta Associar futuro a juízos de valor do tipo ‘melhor ou pior’ é inevitável. Mas, para Meira, avaliar se, no curso da evolução tecnológica, o ser humano está caminhando para ser melhor é um julgamento que depende de uma hierarquia de valores que vai sendo construída paralelamente ao futuro. “Para meus pais, que nasceram na década de 1920, o mundo era melhor no passado, apesar de toda a pobreza ou doença que havia ao redor. Era o mundo da década de 1950, de Juscelino, em que eles tinham 30 e poucos anos. Hoje, têm 80 e poucos – com todos os problemas associados à idade – e vivem em uma realidade muito distante daquela em que nasceram e tiveram seu ápice.” Silvio conclui que o crivo de ‘melhor’ é relativo: “Não existe um futuro que seja homogeneamente melhor para todos, porque isto é totalmente pessoal”.

Mais em Nós da Comunicação Entrevista: Silvio Meira: ‘Se estiver esperando o futuro acontecer, é melhor ficar apavorado agora’ http://bit.ly/NIC6x


resolve. “A humanidade precisa economizar energia. Mas, historicamente, uma das medidas típicas de desenvolvimento do mundo ocidental tem sido o consumo de energia per capita. O brasileiro consome 1.750 kW/h por ano e, nos Estados Unidos, se consome cinco vezes mais. Mas é interessante para o planeta consumirmos o que os americanos consomem?”, exemplifica. “É como um fabricante de cerveja dizer que o Brasil precisa melhorar porque os alemães tomam 100 litros de cerveja por pessoa por ano e nós tomamos 25 litros. E por que temos que tomar 100 litros? As comparações são sempre desse tipo”, reflete.

Para a professora e pesquisadora Eliana Monteiro, doutora em Tecnologias da Comunicação e Estéticas, não será a tecnologia que tornará a humanidade melhor. A questão, para ela, nem é o que é melhor. “O que importa é que as ferramentas tecnológicas nos permitem perceber um mundo mais diverso.” Silvio também interroga o que seria ‘melhor’: “As pessoas se acostumaram a votar no Big Brother, ter nota na escola, então querem saber o tempo todo se estamos progredindo para um lugar melhor. Não. Estamos indo para um lugar diferente”. À luz do mítico fim do mundo profetizado para 2012, ele relativiza os conceitos de ‘melhor’ e ‘pior’ que inevitavelmente usamos ao nos referirmos ao futuro. “Na atual conjuntura, pode ser que estejamos caminhando para o fim da humanidade em um milhão de anos. E pode ser que o fim da humanidade seja melhor para o planeta.” Ao pensar no caminho para um mundo sustentável e mais equilibrado, o pesquisador levanta uma questão que frequentemente nos escapa: “Sustentabilidade pode significar que algumas coisas precisarão ser melhores, mas que outras deverão ser necessariamente piores”.

Internet: de supérfluo a serviço básico

O paradoxo cíclico

foto: Leo Caldas/ Titular Fotografia

Na visão de Silvio, o que precisará ser melhor e o que precisará ser pior é o paradoxo cíclico de causa e efeito que não se

Silvio Meira

Silvio faz uma projeção para os próximos anos. “Se pedíssemos a alguém, no ano 2000, para prever o futuro, seria difícil visualizar que todos teriam smartphones (telefones com funções de acesso à internet, visualização de documentos, agenda, acesso a e-mails etc.) em 2015”. Mas esta é uma tendência tecnológica que Meira define como “inarredável” para os próximos cinco anos: todos os ‘phones’ serão ‘smart’ e, portanto, a internet será móvel. “Você não quer ter acesso em casa, no trabalho, no avião: quer ter a internet com você, no lugar onde estiver. Então, a tendência é que a tecnologia esteja com você, qualquer que seja ela. Mais cedo ou mais tarde, se a demanda por internet móvel tiver respaldo do ambiente político e regulatório, é possível imaginar que grande parte do que fazemos hoje no computador seja feita em um smartphone. Assim, o provimento tende a se universalizar”, observa o pesquisador. Universal, natural, parte integrante do dia a dia, o acesso ilimitado à internet poderá passar de supérfluo a básico. “A obviedade é que, se todos os phones serão smart, passarão a não ser mais

‘Mandar e-mail, entrar em um site, participar de uma rede social, fazer upload de um vídeo não serão diferenciais competitivos. O diferencial será entender que a internet é um ambiente de inovação, no qual podemos construir’ Silvio Meira

‘As novas tecnologias simplesmente são como a fotografia, o cinema e a televisão na época em que apareceram. Temos de saber lidar com dispositivos nos seus tempos’ Eliana Monteiro

Mais em Nós da Comunicação Entrevista: Henry Jenkins: ‘A cultura digital mistura cultura popular com conteúdo da cultura de massa’ http://bit.ly/b3aMZq

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foto: acervo pessoal

Eliana Monteiro

‘Não me arrisco a fazer projeções para o futuro, porque o real é muito mais contundente do que qualquer imaginário’ E. M.

‘Imaginar que conseguiremos sobreviver sem saber programar software, em um mundo que é complexo e totalmente programável, é basicamente ser levado pelos acontecimentos’ S. M.

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chamados de smartphones. Aconteceu o mesmo com o conceito de ciberespaço. Em 1995, muita gente dizia que havia chegado uma nova era, a do ciberespaço. E de repente esse ciber tomou conta de tanta coisa que o ciberespaço deixou de ser ciber e voltou a ser o simples espaço”, analisa Silvio. “Em primeiro lugar, não estamos falando de phones. Uma das certezas, hoje, é de que esse instrumento que carregamos na mão, que ainda atende pelo nome de telefone celular, é uma ferramenta na qual o telefone é apenas uma das aplicações. Para muita gente – como eu, que uso o telefone em meu smartphone de forma completamente esporádica –, essa não é a função principal. O smartphone proporcionou capacidades completamente novas: ‘programabilidade’, modularização, localização geográfica e mapas, o acesso a redes sociais, a possibilidade de tirar uma foto e mandar imediatamente para alguém”, afirma. Para Silvio, a oportunidade de se ligar a diferentes pessoas e mundos na internet – em especial, nas redes sociais e nos blogs – possibilitou, em primeiro lugar, conectar mais e melhor as pessoas que têm uma relação entre si: família imediata, parentes distantes, amigos, colegas de trabalho. O especialista saca um exemplo de sua própria vida pessoal para explicar a ideia: “Minha casa é comprida e, vez por outra, minha mulher aparece no Twitter avisando que o jantar está pronto. Ela sabe que estou on-line e que meu computador toca um alarme toda vez que alguém me manda uma direct message no Twitter. Então, em vez de gritar, me manda uma mensagem”.

Conexão ‘versus’ comunicação A professora Eliana Monteiro mostra um efeito colateral da comunicação direta oferecida pela internet. “Passei um período estudando na França e falava com meu marido pelo Skype. Com meu irmão, falava somente por e-mail. Quando cheguei de viagem e vi os dois me aguardando, percebi que estava com muito mais saudade do meu irmão. Isso porque ‘via’ meu marido em tempo real, diariamente, e meu irmão, não – e se ‘estava’ com meu marido todos os dias, não tive tempo de ter saudade. O Skype é capaz de suprir algumas faltas. Ocorre aquilo que o teórico francês Paul Virilio chama

de telepresença em tempo real”, reflete. Eliana pondera, no entanto, que no século XXI “precisamos dessas ferramentas para atuar e se adequar ao mundo e às coisas do mundo”. Nesse sentido, ela reforça que as novas tecnologias não podem ser vistas sob uma perspectiva maniqueísta, como boas ou ruins. “Simplesmente são, como a fotografia, o cinema e a televisão na época em que apareceram. Temos de saber lidar com os dispositivos nos seus tempos.” Mesmo com um olho no futuro, Eliana finca os pés no agora. “O que se valoriza não é uma visão futurista, mas como a tecnologia nos joga no presente. Não me arrisco a fazer projeções para o futuro, porque o real é muito mais contundente do que qualquer imaginário. O 11 de setembro deixou isso bastante claro. Nem a ficção foi capaz de criar aquele acontecimento”, afirma. Em um mundo em rede, não há comunicação sem conexão. Mas estamos realmente nos comunicando melhor? Silvio responde: “Você precisa ter o que dizer, e eu preciso ter a disposição para ouvir e a energia eventualmente necessária para entender. Na era dos blogs, descobriu-se que, para cada blogueiro que escreve, nove visitantes estão dispostos a comentar e 990 tendem a ler só o título do post. Então, a questão é: a maioria das pessoas não tem nada a dizer mesmo. Ou, se tem, não quer dizer. Ou, se quer dizer, é para um círculo muito fechado. Isso não está errado, o universo é assim mesmo”, afirma.

Um aprendizado incessante Independentemente de se ter ou não algo a dizer, o registro de ideias é parte importante do processo de aprendizado. Segundo Pierre Lévy, quando o ser humano aprende, precisa comunicar a síntese desse aprendizado. E os blogs, para ele, são uma ferramenta adequada para isso. “Com sorte, pessoas lerão, assistirão, responderão àquele conteúdo, e se criará diálogo. Devemos colocar nossa memória nas ‘nuvens’ [referindo-se ao meio virtual] para poder compartilhá-la com outras pessoas”, sugeriu Lévy na palestra que realizou em março, no Rio. Para o filósofo, sistemas baseados na interação social aberta – como Wikipédia e Twitter – demonstram que as pessoas colaboram

Mais em Nós da Comunicação Entrevista: Fábio Fernandes: ‘A cibercultura é a verdadeira cultura contemporânea’ http://bit.ly/aAD7cI


a fim de criar uma memória comum. Um mundo em que as ‘coisas’ mudam o tempo todo naturalmente pressupõe que as pessoas precisam se transformar e se adaptar na mesma velocidade – o que significa que os profissionais têm de estar sintonizados com o mercado de trabalho. Mas, na visão de Silvio, há uma questão imutável: o profissional mais requisitado, hoje e no futuro, é aquele capaz de aprender. “Isso ficará cada vez mais claro à medida que se tem uma interpenetração muito maior das várias facetas do conhecimento – temos que entender de marketing, de mídia, de biologia, de computação. Quem não se preparar para aprender coisas que não necessariamente dependem de sua educação básica está literalmente desabilitado a participar de qualquer futuro”, afirma Silvio. Mas como se capacitar para o futuro? “Entenda de software, de programação. Seja qual for sua área de atuação”, responde Silvio. “A mola motriz da sociedade da informação e do conhecimento em que vivemos é software. Tudo a nosso redor envolve software. Um prédio é totalmente desenhado por software. Um site é feito em software. Um carro é feito em software e, dentro dele, está cheio de softwares. Distribuição de energia elétrica e de água, coleta de esgoto, uma ligação telefônica e Skype são possíveis por causa de software”, enumera. Silvio explica que quem souber escrever software terá um imenso diferencial competitivo e sustentável, porque todo o resto do planeta depende – e dependerá ainda mais – de quem sabe programar. “Se não souber escrever software – e não falo de usar uma linguagem de programação sofisticada, complexa, mas saber qual é o software da sua profissão e como se ajuda a escrevê-lo –, você definitivamente terá um problema de competitividade em um futuro bem próximo.” Para Silvio, isso já vale para muitas carreiras – um engenheiro que apenas saiba usar um software de sua área, e não souber escrevêlo, já não é um profissional de primeiro time. Silvio prevê essa necessidade também para os cirurgiões – que, no futuro, programarão robôs para fazer operações. “Imaginar que conseguiremos sobreviver sem saber programar, em um mundo que é complexo e totalmente programável, é basicamente aceitar ser levado pelos acontecimentos e pelo porvir”, projeta.

Uma ecologia complexa Mais do que saber se relacionar e falar mais de uma língua, a capacidade essencial aos novos tempos não é técnica: segundo Silvio, precisaremos olhar o mundo de forma não antropocêntrica, conscientes de que não somos o centro ao redor do qual tudo gira. “Sendo todos nós parte de uma ecologia complexa, diversa, problemática em suas muitas facetas, é muito improvável que nos sustentemos em um mundo orientado para atender somente as nossas demandas”, analisa. “Isso acontece tipicamente nos condomínios: todos batem palmas porque os filhos aprendem na escola que a natureza tem que ser preservada, que devemos proteger o mico-leão dourado. Mas quando há uma votação para derrubar as mangueiras e os cajueiros para fazer uma quadra de tênis – que será usada dez horas por mês –, os condôminos são a favor. A ideia é: vamos pagar o custo do mundo lá longe, mas vou continuar cuidando da minha vida como se só eu existisse. Isso é inconsequente, incoerente e uma prova de total despreparo”, acrescenta. O que o mundo precisará, no futuro, é de gente com visão ampla, “que olhe para nossa história, nosso presente, e traga o futuro para cá, considerando os erros que sabemos ter cometido até agora”, de acordo com o cientista. “Construir um mundo um pouco mais equilibrado vai levar tempo, mas se não começarmos não chegaremos a lugar algum. Isso vale para absolutamente todas as profissões.” Dirigindose à repórter, Silvio arrisca: “Se você pensar que essa revista é feita para sua própria glória pessoal, ela pode durar mais uns dez números, se tanto”. “De resto, o que as pessoas precisam saber é o que previu Machado de Assis: o futuro sempre vem. E ele nunca se engana. Pode resistir o quanto quiser, mas quem está com 40 e poucos anos agora precisa ficar esperto. Comece a aprender a usar, com proficiência, as ferramentas que as pessoas de 20 anos

Mais em Nós da Comunicação Entrevista: Ieda Tucherman: ‘A mídia dá visibilidade à ciência que retribui com a ideia de atualidade’ http://bit.ly/9TRVgX

usam. Se não, será trocado por elas. Na próxima década, no mercado de trabalho, virão os jovens que passaram os últimos 15 anos na internet, nas lan houses, nos celulares, nos ambientes de mobilidade. E esse pessoal está prontinho para assumir o lugar de quem não tem a preocupação em estar conectado. É tão simples quanto isso. Sempre foi assim. Não está acontecendo nada de novo, é só olhar a história da humanidade”, finaliza Silvio.

‘Quem não se preparar para aprender coisas que não necessariamente dependem de sua educação básica está literalmente desabilitado a participar de qualquer futuro’ S. M.

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foto: Divulgação

Na ficção científica, as pistas para o amanhã

‘O presente já contém o futuro, e esse futuro explica o presente. O que é agora é o que será um dia’ Richard Barbrook

‘A cibercultura é nossa verdadeira cultura contemporânea’ foto:Acervo Pessoal

Fábio Fernandes

Ieda Tucherman

‘Seremos, cada vez mais, homens-máquina’ Ieda Tucherman

‘Ao mesmo tempo, a tecnologia transforma a cultura e a cultura está mudando a tecnologia’ Henry Jenkins

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Mais em Nós da Comunicação Entrevista: Hy Mariampolski: ‘O Brasil deve ter uma comunicação consistente e em voz alta’ http://bit.ly/b76Jtt

Outros desafios De acordo com Fábio Fernandes, os desafios de uma sociedade integrada pela computação pervasiva, porém, serão menos tecnológicos e mais sujeitos a outras exigências, de logística e segurança, por exemplo. “Há muitos anos ouvimos em simpósios de tecnologia a velha história da geladeira que será capaz de, por meio de um chip, saber quando determinado produto acabou e solicitar automaticamente o artigo ao supermercado”, conta. Projetar e construir uma geladeira assim já é possível, e certamente em 2020 teremos modelos muito mais ‘inteligentes’. “Mas como utilizaremos uma geladeira dessas em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, onde é cada vez maior o número de assaltos a condomínios, por exemplo?”, questiona. “E não se trata apenas de configurar a geladeira, mas de configurar todo um sistema logístico de entrega, que continua a envolver seres humanos.” Segundo Ieda Tucherman, professora do programa de Pesquisa e Pós-graduação da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ECO-UFRJ), em um período de dez anos perceberemos nesses seres humanos “características de hibridização com as máquinas comunicantes”. Para a pesquisadora do CNPq na linha do Imaginário Tecnológico, assim como o celular hoje começa a englobar mil funções, nossas roupas serão capazes de regular temperatura, informar níveis de glicose e lipídeos, nossos relógios (se ainda existirem) serão GPS e/ou controladores de taxa de insulina a disfoto:Pisco Del Gaiso

Richard Barbrook

O inglês Richard Barbrook, cientista político e professor de Hipermídia da Universidade de Westminster, em Londres, fez um passeio ao futuro do passado ao escrever o livro Futuros imaginários – Das máquinas pensantes à aldeia global (Editora Peirópolis, 2009). Ele inicia a obra com reminiscências da visita que fez, aos 7 anos, à Feira Mundial de Nova York, no Queens, em 1964, uma exposição que reuniu a ideia do amanhã de várias nações. Ao comentar conceitos já velhos conhecidos, como inteligência artificial e sociedade da informação, ele escreveu: “A profecia sobre a sociedade da informação se aproxima de sua realização a cada lançamento de novas partes de programas e equipamentos computacionais. O presente já contém o futuro, e esse futuro explica o presente. O que é agora é o que será um dia. A realidade contemporânea é a versão beta de um sonho de ficção científica: o futuro imaginário”. Para Fábio Fernandes, pesquisador e professor dos cursos de Tecnologia, Mídias Digitais e Jogos Digitais da PUC-SP, a ficção científica, no cinema e na literatura, moldou nossa visão de futuro criando a cibercultura que conhecemos hoje. “Essa é, realmente, nossa verdadeira cultura contemporânea. E quem postulou isso não fui eu, e sim Pierre Lévy, há mais de dez anos”, indica. Se o filósofo da informação já cantava essa pedra há uma década, o que podemos esperar em matéria de comunicação para os próximos dez anos? Fernandes aposta na computação ‘pervasiva’, acessível aos usuários em qualquer lugar a qualquer tempo. “Se alguém pensa que o iPad é apenas um modismo, pode tirar o cavalinho da chuva”, avisa. Ele é apenas a primeira leva de uma série de dispositivos computacionais cada vez mais poderosos que irão, definitivamente, conectar lares e integrar nossos equipamentos móveis. “Assim como hoje é impossível imaginar a vida sem celulares, em 2020 será impossível imaginar como podíamos ter vivido sem integração entre dispositivos e, principalmente, sem computadores realmente portáteis e poderosos.”

Fábio Fernades


tância, informando ao médico e permitindo que este administre remotamente as substâncias necessárias etc. “Algumas destas coisas já existem, outras aparecem como promessas. Seremos, cada vez mais, homens-máquina”, resume. A visão de Ieda para a comunicação em 2020 é complementar à ideia que a pesquisadora tem em relação às tendências para a comunicação propriamente dita, e também para a vida, sobretudo porque acredita que, hoje, somos definidos como uma sociedade tecnológica de comunicação, caracterizada pela prática de um capitalismo cognitivo. “Dizendo de maneira mais simples: tanto a vida é concebida como informação quanto a ideia de informação é a que fundamenta a noção de valor. Vivemos uma estreitíssima relação de saber-poder em que talvez o movimento político mais importante seja o do desenho das redes de comunicação”, define. “Estas serão tanto mais democráticas e generosas quanto mais horizontalizadas, interconectivas e ‘acentradas’, desvinculadas de controles das tradicionais instituições políticas.” Em entrevista ao site Nós da Comunicação, Richard Barbrook também falou sobre o protagonismo exercido pelos usuários que trafegam por essas redes comunicativas. “No início do século XXI, os usuários da internet são, ao mesmo tempo, consumidores e produtores de mídia, e o comunismo cibernético existe aqui e agora. Entretanto, a chegada da sociedade da informação não precipitou uma transformação social mais extensa. A internet é apenas uma ferramenta útil, e não uma tecnologia redentora. Na teoria sem fetiche, são os humanos os heróis da grande narrativa da história.” Podemos dizer que Henry Jenkins, fundador e diretor do programa de Estudos

foto: Ito

Henry Jenkins

de Mídia Comparada (CMS) do Massachusetts Institute of Technology (MIT), concorda com Barbrook quando afirma que a web não teria a forma atual se não houvesse muitas pessoas buscando uma plataforma pela qual poderiam se conectar facilmente com amigos e familiares. Ou se essas pessoas não quisessem participar mais ativamente da sua cultura ou se não tivessem interesse em produzir e compartilhar informações. “A criação da web acelerou a rotatividade econômica e cultural porque suas características nos dão controle sem precedentes sobre a habilidade de produzir e fazer circular cultura”, acredita o pesquisador, autor do livro Cultura da Convergência (Editora Aleph, 2008), que está à frente também do Convergence Culture Consortium (C3), instituição facilitadora de relações entre a pesquisa acadêmica e a indústria de mídia. “Portanto, ao mesmo tempo, a tecnologia transforma a cultura e a cultura está mudando a tecnologia.” Um dos vídeos da popular série Did you know? – formada por clipes que apresentam por meio de dados e edição frenética as profundas transformações experimentadas por nossa sociedade em termos de comunicação e comportamento – revela que as dez profissões mais procuradas em 2010 simplesmente não existiam em 2004. Mas em 2020 quais ofícios e habilidades serão valorizados, e por quê? Segundo Jenkins, todas as profissões contemporâneas são profissões de comunicação e, de uma forma ou de outra, estão tendo maior controle sobre a construção de suas próprias imagens e interface com seus públicos. “Mas certamente haverá novos conhecimentos em torno das comunicações”, aposta. “O antropólogo Grant McCracken, por exemplo, propôs que as empresas introduzam a figura de um CCO (Cultural Chief Officer) em suas diretorias como forma de monitorar e responder rapidamente às mudanças de cultura nas organizações. Se as companhias fizessem isso, criariam muito mais empregos para quem tem formação em Ciências Humanas”, acredita. “Mas, além disso, todos os funcionários em todos os níveis têm de descobrir como podem e devem utilizar suas expandidas capacidades de comunicação de nossa era, a fim de melhorar o desempenho no trabalho.” “É difícil fazer previsões específicas, por-

Mais em Nós da Comunicação Multimídia: Richard Barbrook fala sobre tecnologia, mídia e sociedade vigiada http://bit.ly/aZcEZ

‘2020 vai chegar antes do que pensamos’ Hy Mariampolski que, em um mundo de mudanças tão rápidas e dispersas, uma década pode ser uma vida inteira. Mas podemos vislumbrar algumas tendências gerais em relação à cultura, que aponta para maior participação, maior diversidade e maior capacidade de comunicação”, afirma Jenkins sobre o futuro da mídia e do entretenimento. “Os principais desafios estarão relacionados aos termos de nossa participação na web 2.0 e como ela se tornou um campo de batalha entre os direitos de mídia na opinião de produtores e de consumidores”, explica. “Serão lutas legais, em termos de propriedade intelectual; econômicas, em termos de negócios justos; educacionais, em relação ao acesso às habilidades necessárias à participação; culturais, no que diz respeito à forma como lidamos com a diversidade global e também sociais em relação ao desenvolvimento da ética nas comunidades on-line”. Para Hy Mariampolski, antropólogo e diretor da QualiData Research, empresa especializada em pesquisas qualitativas e estudos de mercado pelo método etnográfico, dez anos são um bom recorte de tempo para análise, pois é um período que somos capazes de imaginar. “Mas 2020 vai chegar antes do que pensamos”, adverte. “Haverá ainda mais envolvimento com mídia e mais oportunidades de comunicar de maneira individualizada. Na próxima década, as pessoas vão se manter cada vez mais conectadas. Como hoje, tudo continuará acontecendo em ritmo acelerado e o compartilhamento das experiências por meio digital vai aumentar”, prevê.

Hy Mariampolski


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Gandhi


Lideranca

em um novo tempo

Originada do inglês ‘leader’, a palavra líder significa guia. Líder é, portanto, aquele que tem capacidade de inspirar, indicar o caminho e desenvolver seus colaboradores no percurso rumo às metas estabelecidas. Um bom gestor não se impõe pela força ou pelo poder, conquista seus colaboradores com persuasão, confiança e, principalmente, respeito. Ele tem segurança e, por isso, não se sente ameaçado por compartilhar decisões, ouvir sua equipe e ser receptivo a novas ideias e sugestões. Trabalha em grupo, com simplicidade e empatia, em favor de conquistas para todos. Em nossa história, um exemplo de liderança horizontal é Mahatma Gandhi. Ele lutou por toda a vida, de forma não-violenta, buscando a paz mundial e a independência da Índia, seu país de origem. Defensor da Satyagraha – traduzida como ‘caminho da verdade’ –, abriu mão de tudo para servir à sociedade, tornando-se, mais do que um pacifista político, um líder espiritual. Com sua humildade, inspirou e conquistou a admiração de aliados e adversários. Assim como Gandhi, os líderes de nosso tempo terão de ser mais simples e trabalhar de forma integrada com sua equipe para alcançar melhores resultados. Eles também precisarão entender que o autoritarismo não leva a lugar algum. Como disse Gandhi, “o único tirano que aceito neste mundo é a voz interior, suave e serena” Sânia Motta, Maíra Gonçalves e Alfredo Boneff

O cenário corporativo da próxima década vai exigir uma maior interdependência das esferas econômicas, sociais e ambientais. E isso requer novas habilidades dos profissionais, principalmente dos líderes, que precisarão pensar a empresa de modo sinérgico, com uma ótica mais ampla e holística. “Estamos vivendo um momento de importantes transformações, mas acredito que a completa transição possa levar uns 20 ou 30 anos. Com certeza haverá a substituição do atual modelo de gestão, baseado na noção de abundância, em que a natureza sempre esteve disponível para as organizações, por um modelo de escassez dos recursos naturais. Sendo assim, teremos de aprender a trabalhar de forma mais sustentável, conciliando os resultados econômicos com os socioambientais. E essa será uma mudança fundamental”, explica o jornalista Ricardo Voltolini, diretor da consultoria Ideia Sustentável, especializada em estratégia e inteligência em sustentabilidade. Mas de que forma o líder poderá incorporar essa nova postura em seu dia a dia? Adotando um comportamento flexível e exercitando o poder de adaptação às diferentes situações. Segundo Voltolini, uma habilidade imprescindível ao gestor é a de aprender a aprender. “Ele deixará de ser um superespecialista para ser generalista, contribuindo para o crescimento de seu grupo. Outra capacidade essencial é que ele seja um empreendedor, isto é, que trabalhe com motivação, entusiasmo e foco, concentrando seu desempenho para o crescimento da empresa. É o que chamamos de intraempreendedor”, destaca.

Ao avaliar esse cenário, Voltolini traça “como exercício de projeção” o perfil dos líderes do futuro. “Certamente ele será um profissional mais sensível e humanizado, capaz de dialogar bem e identificar pontos de interseção entre o negócio e os interesses da sociedade. Por isso, o melhor líder de 2020 será o gestor sustentável, que agir de acordo com princípios éticos e for coerente com o que faz e fala. Em resumo, acredito que ele tenha de ser um excepcional comunicador”, analisa.

A arte de ensinar Pensar e planejar o futuro também devem fazer parte da rotina de um líder. “Como gestor, sempre dediquei parte do meu tempo para refletir sobre o negócio, e isso é essencial. Empresas de consultoria como a minha, que trabalham com estratégia inteligente, têm o dever de se reinventar constantemente”, relata. Voltolini tem outra preocupação: construir seu legado. “Em algum momento, minhas atividades vão diminuir e precisarei ter outras pessoas preparadas para seguir adiante com o mesmo propósito. Por isso, estou começando a ensinar novos líderes a adotarem posturas que promovam mudanças e gerem bons resultados tanto para a sociedade quanto para o planeta”, ressalta. Nesse contexto, Voltolini acredita que o líder também exerça um papel de educador. “Tenho uma enorme satisfação de poder ensinar. Para mim, é muito gratificante inspirar e sensibilizar pessoas”, pontua o consultor, que completa:

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foto: Divulgação

Ricardo Voltolini

‘Descobrimos que as redes sociais são um fabuloso universo de relações e conexões entre pessoas, ideias e empreendimentos. O que se está tentando descobrir agora é como as redes sociais geram valor econômico para as empresas’ Ricardo Voltolini

‘As escolas de negócio ainda funcionam com um software antigo, trabalham muito o racional e pouco o comportamento e a atitude. Nosso grande desafio é fazer com que os jovens saiam das universidades preparados para lidar com as tendências do novo tempo’ R. V.

“A grade curricular atualmente oferecida pelas universidades proporciona aos estudantes um ensino de especialidade. Por isso, costumo dizer que as escolas de negócio ainda funcionam com um software antigo, ou seja, trabalham muito o aspecto racional e pouco a questão do comportamento e da atitude, fundamentais aos profissionais de hoje. Esse é nosso grande desafio: fazer com que os jovens saiam das universidades preparados para lidar com as tendências do novo tempo.” Para Voltolini, essa qualificação dos profissionais será cada vez mais exigida pela empresa, que, por sua vez, sofrerá pressão da sociedade para adotar um novo modelo de gestão. Isso quer dizer que a organização precisa ir além do trivial, ou seja, da excelência na produção e da geração de serviços e empregos. É esse ir além que vai garantir, junto a uma boa reputação, sua sobrevivência no mercado.

Cabeça no futuro e pés no chão Com os olhos voltados para o futuro, a Alpargatas vem fazendo história, seja com seus produtos inovadores, ou com suas irreverentes campanhas publicitárias. Criadora das ‘legítimas Havaianas’, a empresa não para de inventar acessórios que ‘todo mundo usa’. A diretora de Negócios Sandálias, Carla Schmitzberger, mostra o jeito Alpargatas de gerir sua equipe. A rotina de trabalho de Carla comprova que a empresa investe nos colaboradores e desenvolve uma inteligente gestão de liderança. Um exemplo é a prática de convocar a equipe para discutir o andamento dos negócios. “Ouvir nossos profissionais é o primeiro passo para saber o que vai bem e o que precisa ser melhorado. Nesses encontros, provoco o grupo para que os funcionários reconheçam os desvios e identifiquem o que pode ser aperfeiçoado”, ressalta. E acrescenta: “Quando faço isso, permito que eles participem da elaboração das estratégias, o que é importante para atingir as metas de mercado tanto no Brasil quanto no exterior”.

Gestor do amanhã Quando o assunto é o futuro, Carla afirma que, na Alpargatas, o planejamento é fundamental para prever os próximos passos. “Devo passar mais de 50% de meu tempo analisando ou aprovando

planos apresentados pela equipe”, revela. E prevê: “O líder que souber dar voz e ouvir as ideias sugeridas pelos colaboradores, ganhará espaço nas organizações, é o profissional do futuro”. As habilidades exigidas não param por aí. Para ela, o líder que tem bagagem cultural é capaz de se antecipar aos acontecimentos. “Gestores bem informados têm mais facilidade para entender e captar novas oportunidades, chamo isso de ‘pensamento lateral’. Ou seja, é a capacidade de achar uma solução para os problemas que, aparentemente, não podem ser resolvidos”, observa. E completa: “Os líderes também têm uma maior facilidade de entender o consumidor. Este último tem a palavra final sobre o sucesso ou o fracasso de um novo produto, marca ou serviço. O líder precisa compreender a necessidade de captar o perfil de nosso cliente”, enfatiza. Carla ressalta ainda que o encontro de gerações na liderança enriquece o ambiente corporativo. Com experiências distintas e únicas, profissionais Y, X e baby boomers são importantes para assegurar a diversidade e a variedade de estilos e competências à organização. Segundo ela, os valores da empresa precisam ser únicos, mas o conhecimento variado é positivo, pois embala a empresa em um ‘mix’ de inovações. Nesse sentido, a Alpargatas desenvolve seus líderes com o programa Ciranda de Ideias – sob uma estrutura matricial, grupos multifuncionais contribuem apontando melhorias para a companhia.

O poder das redes Entender o desejo do consumidor é mais um dever dos líderes da Alpargatas. Por isso, estar onde ele se encontra é estreitar as distâncias entre empresa e cliente. Por ter seu maior foco nos jovens, a Alpargatas direciona naturalmente suas ações de relacionamento para as redes sociais. “Essas novas mídias servem para apontar tendências. Usamos os recursos tecnológicos para nos comunicar com esses consumidores. O relacionamento funciona e garante um bom retorno à empresa. Essa é mais uma prova de que um bom gestor deve manter-se ligado nos campos de interesses do cliente”, reforça. Mas Carla alerta que a tecnologia não fará milagres. Ela acredita que o líder

Mais em Nós da Comunicação Entrevista: Ricardo Voltolini: ‘O comunicador não pode mais prescindir do trabalho com as mídias digitais’ http://bit.ly/apvrpf

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expostas e vulneráveis. E aí, caberá ao comunicador desenvolver a capacidade de monitorar permanentemente essas redes. Será mais um papel desse profissional, que deverá, acima de tudo, ser um profundo conhecedor do universo tecnológico e das possibilidades que ele oferece”, aponta.

precisa desenvolver atributos, mas, deve ser, acima de tudo, um bom comunicador. “O maior desafio dele será encontrar a fórmula para se aproximar de seus stakeholders e, posteriormente, saber gerenciar o grande número de canais de comunicação. Acredito que a saída esteja na pulverização e o principal desafio é tentar passar as diferentes mensagens para a grande variedade de segmentos que se deseja atingir”, conclui.

Comunicação sem fronteiras

Carla Schmitzberger

foto: Divulgação

Diante do cenário de interconexão dos próximos anos, as pessoas terão de aprender a lidar com o desafio de conviver com uma comunicação sem fronteiras. A ideia de transmitir mensagens para diferentes segmentos de públicos era muito comum nos anos 70 e 80, quando ainda existiam os manuais de Relações Públicas das empresas. “Era possível escolher os canais de comunicação e desenvolvê-los de acordo com o público de interesse, ou seja, fatiar o discurso de modo conveniente. Mas esse mundo não existe mais”, enfatiza. Voltolini reforça que, hoje, qualquer deslize pode repercutir rapidamente e as mídias digitais só contribuem para isso. Nesse contexto, como as organizações sobreviverão? “As empresas estarão mais

Do mesmo modo, os líderes precisam estar cada vez mais antenados com as redes sociais. “Para mim, esse é um exercício bastante artificial, até mesmo porque sou de uma geração analógica. No entanto, faço questão de estar ligado às principais mídias e procuro aprender muito com elas. O Linkedin é um exemplo. Participo de um grupo internacional que discute sustentabilidade e todo dia aprendo um pouco com pessoas de diferentes países, que vivem realidades distintas. Isso é muito enriquecedor”, conta. E acrescenta: “Descobrimos que as redes sociais são um fabuloso universo de relações e conexões entre pessoas, ideias e empreendimentos. O que se está tentando descobrir agora é como, no âmbito do trabalho, essas ferramentas geram valor econômico para as empresas, uma vez que sua contribuição para estreitar relacionamentos já foi comprovada.” Ao mesmo tempo em que usuários, principalmente jovens, utilizam as mídias apenas como entretenimento, tantos outros jovens talentos usam a rede como um espaço para a troca de conhecimento e uma rica fonte de pesquisa. “O acesso à tecnologia – e, portanto, às redes – é comum a todos. A diferença está nas capacidades, nos objetivos e nas convicções de cada um. São esses aspectos que irão determinar a forma de aproveitamento das mídias digitais.” De acordo com Voltolini, cada vez mais esse novo profissional conectado, capaz de traduzir as mensagens da empresa nas mídias sociais, ganhará espaço nas organizações. “Ele deverá funcionar como um intérprete daquilo que circula na rede, podendo, quem sabe, antecipar determinados focos de conflito ou identificar novas oportunidades no mercado. É óbvio que todos esses profissionais terão de ser extremamente capacitados. Os mais aptos serão os capazes de sobreviver nessa selva corporativa. Por isso, é comum vermos jovens de cerca de 25 anos ocupando cargos de liderança. Isso já é um importante sinal de evolução.”

‘Devo passar mais de 50% de meu tempo analisando ou aprovando planos apresentados pela equipe’ Carla Schmitzberger

‘Gestores bem-informados têm mais facilidade para captar novas oportunidades, chamo isso de ‘pensamento lateral’ – a capacidade de achar uma solução para os problemas que seriam impossíveis de serem resolvidos’ C. S.

‘O melhor líder de 2020 será o gestor sustentável, que agir de acordo com princípios éticos e for coerente com o que faz e fala. Em resumo, um excepcional comunicador’ R. V.

Mais em Nós da Comunicação Entrevista: Michele Hunt: ‘O conceito de uma liderança onisciente é obsoleto’ http://bit.ly/aoWWIT

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foto: Alexandre Campbell

A escalada de um jovem líder

Rafael Liporace

‘O jovem acha que vai aprender apenas na prática, não entende que faculdade não é somente um diploma’ Rafael Liporace

‘Se a internet da empresa cai, é como se tivesse acabado a água ou a luz da sua casa. É claro que precisamos da tecnologia, mas sem nos tornarmos seus reféns, afinal ela existe para facilitar nossos hábitos e não para moldá-los’ R. L.

‘Não acho que seja importante para um líder estar conectado a todas as mídias. Para mim, são meios frios’ R. L.

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“Entrei na faculdade como um jogador de futebol de salão e saí um empresário.” É assim que Rafael Liporace, sócio e diretor geral da Biruta Mídias Mirabolantes e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-RJ), resume sua história. Aos 29 anos, Rafael já construiu uma trajetória profissional digna de grandes executivos. “Entrei na universidade para estudar durante um ano apenas, pois começaria a jogar futebol de salão fora do Brasil. Mas, durante esse tempo, percebi que realmente gostava de comunicação e que o mundo esportivo era muito imprevisível. Comecei, então, a me dedicar mais aos estudos e ingressei na empresa júnior da faculdade. Junto com outros estudantes, criei uma equipe e trabalhamos muito para fazer daquela empresa a nossa empresa. Com esse esforço, entregamos à ESPM um dos melhores, senão o melhor, resultado da júnior até hoje”, conta. Pouco depois, quando cursava o sétimo período, Rafael aceitou o convite de um professor para substituí-lo em uma empresa, em um cargo de liderança. Na mesma época, uma pesquisa do Jornal do Commercio apontou o jovem empresário como um dos grandes profissionais da primeira década de 2000. “Estava gostando da progressão da minha carreira, mas dois itens não me agradavam: a exigência do domínio da língua inglesa – pois para ser executivo, é fundamental o conhecimento do idioma – e o fato de não querer ser rotulado com uma matrícula, o número 23 do marketing , por exemplo”, explica. Foi nesse momento que Rafael foi apresentado, por um amigo, a um de seus sócios, Alan James. Em seguida, vieram Matheus Meirelles e Romulo Groisman, completando o time. “Eram quatro jovens acreditando que poderia dar certo, abrindo mão de uma carreira promissora para se tornarem empreendedores. Mas desde o início pensávamos que, se fosse para empreender, seria com base em nossas premissas de liderança. Foi assim que, em 2003, surgiu a Biruta Mídias Mirabolantes. Hoje, sete anos depois, temos uma média de 60 colaboradores e estamos presentes em três cidades do Brasil: Rio de Janeiro, São Paulo e Fortaleza”, relata.

Além de toda a experiência adquirida na prática, Rafael credita parte de seu sucesso profissional ao aprendizado na universidade. “Se não fosse a educação técnica que tive, poderia não ter o conhecimento necessário para seguir o caminho certo. O estudo faz muita falta, não só para quem não tem acesso a ele, mas para quem não o leva a sério, não entende sua importância. Infelizmente, e agora falo como professor, as pessoas ainda não têm essa clareza. O jovem acha que vai aprender apenas na prática, não entende que faculdade não é somente um diploma”, diz.

Gestão baseada na confiança Gerindo uma companhia com cerca de 70% do capital humano formado por colaboradores de até 25 anos que estão na primeira ou, no máximo, na segunda experiência profissional, Rafael diz que a pergunta que mais ouve é: como você consegue liderar tantos jovens? “Respondo que procuramos mostrar para toda a equipe que nós também trabalhamos. Sou o primeiro a chegar, procuro ser um dos últimos a sair, não venho aqui por hobby. E sempre que chego, falo com todo mundo e mostro para eles o valor de cada um aqui na empresa.” De acordo com Rafael, implantar uma política de gestão horizontalizada é fundamental para manter um bom relacionamento entre líderes e liderados. “Isso é muito legal aqui na Biruta. Consideramos que todos são igualmente importantes”, afirma. E acrescenta: “Se hoje sou um bom líder, não é apenas por eu ter capacidade de liderar, mas porque tenho uma equipe que me ajuda a organizar e a cuidar de tudo.” Para ele, essa integração só acontece porque, como um bom líder, procura passar confiança e inspirar seus colaboradores. Exemplo disso foi a superação de uma crise na Biruta. “Passamos por uma difícil situação e fizemos um acordo com nossos profissionais: ficaríamos seis meses sem dispensar ninguém nem reduzir as despesas, mas teríamos de trabalhar muito e nos dedicar ainda mais para virar o jogo. Se em seis meses nada mudasse, eu fecharia as portas, pois não iria mandar metade do pessoal embora. Em quatro meses conseguimos recuperar o negócio. E sabe por que deu certo? Porque temos confiança uns nos outros”,

Mais em Nós da Comunicação Reportagem: Comunicação interna como instrumento mobilizador http://bit.ly/bOvNYl


ressalta. Ele diz ainda que é fundamental dar o exemplo: “Precisa de alguém para produzir? Eu vou. A empresa necessita de recursos financeiros? Coloco do meu bolso. Precisa que eu atenda telefone? Eu atendo. Isso faz muita diferença, pelo menos aqui, na minha realidade”, observa. Com o negócio bem estruturado e uma equipe consolidada e comprometida, Rafael conta que já consegue dedicar metade de seu tempo para refletir sobre o futuro. “Penso muito na melhoria da gestão e no ambiente de trabalho. E nesse aspecto também conto com a colaboração de todos. Uma vez por mês, fazemos uma reunião com grupos interdisciplinares, compostos por, no máximo, duas pessoas de cada área, para ouvir o que eles têm a dizer e sugerir”, destaca.

Pluralidade Biruta O mix das gerações X, Y e baby boomers, segundo Rafael, também agrega valor a uma empresa, uma vez que reúne diferentes experiências, habilidades e ideias. “Acredito que a pluralidade é a grande fórmula do sucesso. Na Biruta, contamos com o apoio do Carlos Henrique Sampaio, gerente de Controle e nosso xerife de 45 anos. Digo para todo mundo que o que ele já viveu, eu não posso comprar. É a experiência que ele adquiriu”, aponta Rafael, que completa: “Aqui nós temos profissionais de várias idades e acho que é esse misto que faz a diferença. Achar que apenas os jovens podem dar certo não é bom.” Paralelamente à bagagem cultural, Rafael reconhece a importância da tecnologia. “Se você disser que sua vida não é facilitada por um blackberry é mentira. Hoje em dia, se a internet da empresa cai, é como se tivesse acabado a água ou a luz da sua casa. É claro que precisamos da tecnologia, mas sem nos tornarmos seus reféns, afinal ela existe para facilitar nossos hábitos e não para moldá-los”, enfatiza. Mas surpreende ao falar das redes sociais: “Não acho que seja importante para um líder estar conectado a todas as mídias. Para mim, são meios frios. Eu, por exemplo, não tenho blog, Orkut nem Twitter e não sinto falta deles. Prefiro o relacionamento direto, chegar de manhã e dar bom dia a cada um de meus funcionários, pessoalmente. Pode ser que, quando eu tiver mil colaboradores e 15 filiais, eu precise me tornar um ‘ser digital’, mas essa

ainda não é minha realidade”, detalha. O empresário acrescenta que as ferramentas digitais têm contribuído para que se confunda ainda mais a vida pessoal com a profissional, que estão cada vez mais próximas. “Isso acontece não apenas com os gestores, mas com todo mundo. A grande questão é você saber diferenciar uma da outra e buscar o equilíbrio. Por isso, é preciso ter muito cuidado para que sua vida pessoal não se torne um espetáculo profissional nem sua vida profissional se torne um espetáculo pessoal”, lembra.

Uma fórmula simples para o futuro Por tudo isso, Rafael acredita que seja fundamental entender como a tecnologia vai evoluir. Porém, enfatiza que mais importante ainda é não esperar por essa evolução para tomar suas decisões. “Você não pode simplesmente ser um barco à deriva e seguir para onde a onda te levar. É preciso ter um norte, uma direção. E se posicionar. Hoje, nos reconhecemos como uma empresa de inovação. Essa é a nossa essência”, reforça. E alerta: “A organização que não se descobrir precisará ter cuidado para não morrer. O mesmo serve para as companhias que não se preocupam com seus funcionários. Essas, eu digo que são ‘burras’ porque, mesmo com toda a tecnologia, cada vez mais as pessoas serão essenciais.” Para Rafael, o líder da década de 2020 terá de se adaptar ao mesmo contexto. “Esse é o principal exercício que faço. O líder que daqui a dez anos conseguir ser mais simples do que é hoje – e menos refém da tecnologia – vai ser o verdadeiro líder, mesmo nas grandes organizações, finaliza.

‘É preciso ter muito cuidado para que sua vida pessoal não se torne um espetáculo profissional nem sua vida profissional se torne um espetáculo pessoal’ R. L.

‘Você não pode simplesmente ser um barco à deriva e seguir para onde a onda te levar. É preciso ter um norte, uma direção. E se posicionar’ R. L.

‘Não dá para pensar a tecnologia como um fim em si mesmo, e sim usá-la a serviço de algo produtivo’ R. V.

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Para além da tecnologia

Pingue-pongue com Michele Hunt

“Não adianta você contar com a tecnologia e não estar preparado para assumir um posto de liderança. Para isso, é essencial ter bagagem cultural e uma boa escolaridade. É preciso ser alguém que saiba ler e interpretar o mundo de forma inteligente. É óbvio que a tecnologia na mão desse profissional vai frutificar e gerar resultados muito mais importantes. Não dá para pensar a tecnologia como um fim em si mesmo, e sim usá-la a serviço de algo produtivo”, defende Voltolini. Ao falar sobre a importância do conhecimento e da experiência para a educação de um líder, Voltolini reforça que cada geração – X, Y e baby boomers – tem atributos específicos e, por isso, a convivência entre elas tende a ser boa para todos. “A agilidade que as novas tecnologias imprimem às relações é uma característica atual, que pertence às gerações mais jovens. Os baby boomers ainda estão acostumados a outro tempo, mais demorado e menos tenso. E é com os jovens que eles vão aprender a lidar com essas mudanças e a adquirir uma rápida capacidade de adaptação e de flexibilidade. Mas eles também têm muito a ensinar em diferentes aspectos, como coerência, fortes valores humanistas, além de respeito ao próximo e à diversidade”, opina. Mas, segundo Voltolini, a principal característica de um líder comprometido é sua contribuição para a sustentabilidade da empresa. “Cada vez mais esse gestor terá de ser ele mesmo e se tornar um exemplo vivo das mudanças que quer operar no ambiente de trabalho”, pontua. Para o consultor, esse tipo de líder ainda é uma minoria nas empresas. “Acredito que ainda tenhamos mais chefes do que líderes. Chefes geralmente são aqueles que se adaptam melhor a solucionar problemas com base em experiências do passado. Os líderes são capazes de construir o futuro a partir de uma visão, de uma ideia”, explica. E complementa: “Não adianta um líder pregar a sustentabilidade, dizer que o funcionário precisa equilibrar a vida pessoal com a profissional e ele mesmo trabalhar 20 horas por dia. Ou então cobrar esse equilíbrio, mas encher de atribuições os colaboradores que compõem sua equipe. Com tudo isso, me parece que os líderes, acima de tudo, terão de ser ainda mais transparentes, valor em ascensão no mundo de hoje”.

‘O conceito da liderança onisciente é obsoleto’

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Catalisadora de mudanças nas ações de líderes. Esta é a função que a socióloga norte-americana Michele Hunt vem desempenhando, desde 1995, em organizações como Hewlett-Packard. Mobil Oil, U.S. Food and Drug Administration, Motorola e Boeing. Mesmo que a natureza de seu trabalho ainda não seja muito conhecida no Brasil, ela é o que se pode chamar de uma profissional do futuro. Em síntese, seu papel é o de construir um novo perfil de liderança, pautado em valores sustentáveis como diversidade e colaboração. Michele esteve no Rio de Janeiro recentemente, como palestrante do 36º Congresso de Recursos Humanos do Rio de Janeiro, promovido pela Associação Brasileira de Recursos Humanos entre os dias 8 e 10 de junho. Sua apresentação focalizou a gestão de pessoas em eventos como a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro. Mas, a fundadora da empresa de consultoria Vision & Values e autora do livro Dream Makers – Fazedores de Sonhos (Qualitymark Editora, 2001), falou também de sua trajetória. Uma história rica, na qual não faltam episódios de racismo na infância pobre em Detroit e o suporte familiar para superar obstáculos e alcançar suas próprias conquistas. No início de sua carreira, na década de 1970, a socióloga enfrentou desafios ao se tornar uma das duas primeiras mulheres a supervisionar presidiários no Departamento Correcional de Michigan. Por meio de ações que estimulavam a autoestima e a integração, ela atingiu resultados expressivos, como o aumento do percentual de presos com diploma universitário de 30% para 100% em apenas um ano. Na década de 1990, Michele atuou no governo de Bill Clinton, na condição de diretora-executiva do Instituto Federal de Qualidade, liderando um bem-sucedido programa de aperfeiçoamento do desempenho das agências

governamentais. Primeira mulher a fazer parte da equipe gerencial da Herman Miller – tradicional fabricante de mobiliário para escritório – a autodenominada baby boomer falou à Comunicação 360° e ao site Nós da Comunicação sobre as perspectivas das lideranças para os próximos anos e a influência das redes sociais em sua atuação. Para Michele, concretizar sonhos não é um conceito etéreo, místico. Antes, significa trabalho árduo e colaborativo para obter resultados. A partir dessa visão objetiva, ela não hesita em afirmar: “No futuro, não haverá espaço para a liderança heroica, para o grande expert”. Comunicação 360° – O cenário das corporações na próxima década vai exigir novos perfis profissionais e capacidades. Já é possível projetar um modelo de liderança que vai comandar esse processo? Seria o ‘líder visionário’ que você descreve em seu livro? Michele Hunt – Em minha opinião será, definitivamente, o líder visionário. Ele se caracterizará pela capacidade de perceber o potencial de realização de seus funcionários. Não haverá mais o velho modelo em que as pessoas de uma organização são tratadas como meros instrumentos. Será uma liderança pautada por respeito e dignidade, por meio de um trabalho colaborativo em equipe. Isso muda fundamentalmente o papel das lideranças. O velho perfil é daquele chefe que sabe tudo, que vê tudo e toma as decisões isoladamente. É um perfil vertical. Além disso, esse líder tem a crença de que as pessoas não são confiáveis, que têm limites para o seu crescimento profissional. Portanto, o papel básico de uma liderança não é apontar direções, mas engajar as pessoas em uma visão compartilhada. O conceito da liderança onisciente e onipresente é obsoleto.


foto: Alexandre Campbell

Comunicação 360° – Em que medida as capacitações exigidas para as lideranças do futuro estarão relacionadas a novas tecnologias? Nesse contexto, como os jovens profissionais da geração Y poderão superar os desafios à frente? M. H. – Não acredito que as capacitações estarão estritamente ligadas à tecnologia. A proliferação da tecnologia, particularmente da internet, a conectividade por meio dos smartphones, se potencializam sobretudo por meio de uma mudança de valores. Criamos tecnologia devido a um desejo inequívoco de inovar, de nos expressarmos. Teremos cada vez mais tecnologia porque as pessoas vão mudar sempre. Vamos precisar dessas ferramentas, desses mecanismos para nos conectarmos. Minha percepção é de que há muito mais pontos positivos do que negativos, apesar de a mídia destacar os negativos. O desafio para essas pessoas que se expressam e se relacionam por meio da internet é colocar suas habilidades a serviço não apenas das próprias necessidades, mas transformá-las em conhecimento para um mundo novo. Comunicação 360° – Você está nas redes sociais? Como avalia o papel de redes como Twitter e Facebook, entre outras, para a atuação das lideranças? M. H. – Estou no Facebook e no Twitter. Totalmente conectada (risos). Não poderia abrir mão dessas ferramentas. Dessa for-

‘No futuro, não haverá espaço para a liderança heroica, para o grande expert’ ma, estou conectada ao mundo, adquiro novos conhecimentos. Os lideres de gerações antigas talvez ainda não tenham se dado conta da importância das redes sociais. Nos Estados Unidos, o grupo que mais cresce entre usuários da internet é o dos aposentados. Eles utilizam a web de várias formas. Desde a pesquisa para ehealth até encontros amorosos. A geração baby boomer, da qual faço parte [Michele tem 60 anos], está se recusando a diminuir a marcha. Mas é evidente que os lideres do futuro precisam usar melhor as redes sociais. Trata-se de um instrumento poderoso para conhecer a opinião das pessoas sobre a organização. Toda empresa deveria ter um blog aberto com opiniões diversas dos colaboradores e dos consumidores. Comunicação 360° – Seu livro aborda o desafio de mudar modos de pensar arraigados no panorama competitivo dos negócios. Nesse sentido, como percebe a postura das grandes empresas em relação à sustentabilidade? M. H. – Posso falar das companhias que conheço nos Estados Unidos. A maior parte das empresas deveria rever suas práticas de sustentabilidade. É evidente que não se reinventaram, não absorveram novas ideias. Parecem não perceber o que acontece fora de seu pequeno mundo. Tome o exemplo do mercado financeiro. A maioria das empresas neste segmento não leva em conta os valores básicos relacionados a pessoas. Não é possível ser sustentável guiado apenas pelo lucro. Você pode ter lucro e ser benéfico, mas a partir de um proposta a longo prazo. Mas sou otimista. Viajo por todo o mundo e percebo líderes reconhecendo erros e constatando: é preciso aprender a agir de forma diferente.

lho. Os jovens profissionais se recusarão a trabalhar para empresas afastadas dessas premissas. Muitos estão deixando essas organizações conservadoras justamente porque elas não levam em conta a dignidade das pessoas, não se preocupam em criar uma cultura baseada em aprendizado, em educação. Os jovens profissionais por vezes preferem sair de seus empregos, ganhar menos e criar um negócio próprio. Não querem compactuar com práticas ultrapassadas. Dinheiro, definitivamente, não é sua única motivação. Comunicação 360° – Você foi a primeira mulher a ocupar um cargo no time gerencial da Herman Miller. A partir dessa experiência, acredita ser possível projetar um futuro em que as corporações serão pautadas pelo trabalho colaborativo e uma visão mais feminina? M. H. – Não acredito que haja outra escolha. A liderança do futuro estará atrelada a essas características. As equipes de liderança precisam de diversidade. De outra forma acaba predominando uma espécie de pensamento único. Quando uma mulher integra essas equipes, naturalmente existe um pensamento mais balanceado, uma valorização maior de aspectos familiares, ambientais, culturais e comunitários. Não tenho dúvidas de que um time colaborativo é a forma possível de alcançar resultados e metas. Não há mais espaço para a liderança heroica, para o grande expert. Cada vez mais as equipes de liderança serão formadas por pessoas com diferentes expertises em torno de um objetivo comum.

Comunicação 360° – Acredita que os profissionais do futuro – os chamados nativos digitais – serão capazes de atuar sob uma perspectiva mais humanista, baseada em valores como ética, educação e cultura? M. H. – Nenhuma companhia sobreviverá se não for capaz de integrar valores humanistas a suas ações. Simplesmente porque não conseguirão força de traba-

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Dialetica

A próxima década promete marcar uma virada no relacionamento das empresas com seus stakeholders. Antes de mais nada, qualquer estratégia corporativa deixará de ser assunto exclusivo da organização: será tema da competência de todos os agentes relacionados ao negócio. A previsão, sinalizada por especialistas, pode parecer redundante. Afinal, as organizações já incorporaram os públicos de interesse em suas ações, certo? Errado. Hoje, existem iniciativas isoladas de empresas visionárias. Mas quem pretende se manter no mercado com competitividade deve correr para encampar o paradigma do futuro: engajar stakeholders. Caberá a eles dizer onde os resultados em sustentabilidade precisam aparecer, reduzindo as pressões sociais. E mais: indicar oportunidades de negócios até então despercebidas. Foi consultando sociedade civil, associações, clientes e instituições científicas que a BASF, por exemplo, listou inovações tecnológicas possíveis para produtos responsáveis. A formação dessa extensa rede de cooperação permite que cada participante contribua com sua visão particular de um problema. Trocando em miúdos, unir competências é o único caminho para se encontrarem soluções que garantam a sustentabilidade do negócio. Assim como na Grécia antiga Platão se valia da dialética – caracterizada pela oposição de ideias – para sair do senso comum e trazer à tona a verdade, as organizações precisam aprender a ouvir outros interlocutores para ir além do que o filósofo chamava de ‘mundo das aparências’. Do diálogo, defendido pelo pensador, virão as respostas para os desafios de 2020

do relacionamento

Cidadania corporativa nasce com os stakeholders O conceito ‘stakeholder’ foi desenvolvido nos anos 1980 pelo filósofo e professor de administração de empresas R. Edward Freeman, a partir de seu primeiro uso em um memorando interno do Instituto de Pesquisa de Stanford, nos Estados Unidos. Na ocasião, em 1963, o termo foi definido como “grupos sem o apoio dos quais as organizações deixariam de existir”. Porém, a importância de se estabelecerem vínculos responsáveis ganha força apenas na década seguinte, com a globalização, o liberalismo e a minimização do Estado. No cenário da época, de um lado, os defensores do livre mercado percebiam os lucros para os acionistas como o único fator de decisão nos negócios. Por outro, pensadores começaram a sustentar que as empresas deveriam beneficiar todos os stakeholders, assumindo o papel de “cidadãs corporativas”. O argumento era o seguinte: à medida que os Estados nacionais reduziam sua função, as corporações precisariam se unir a outros atores para prover o equilíbrio econômico, social e ambiental. As distintas visões foram confrontadas nos principais fóruns de políticas internacionais no fim dos anos 1990, como o Fórum Econômico Mundial de Davos, o G-7 de Denver e a Conferência do Banco Mundial/FMI de Hong Kong. De lá para cá, a polêmica avançou para um entendimento geral de que o mundo precisa de corporações comprometidas – ainda que especialistas apontem para a persistente dificuldade em se passar do discurso à prática, com resultados consistentes. A questão é séria: o livro Feitas para Durar - Práticas bem-sucedidas de empresas visionárias, dos americanos James C. Collins e Jerry Porras, indica que empresas motivadas por algo além do lucro superaram seus concorrentes aficcionados por resultados financeiros para os acionistas. Mas, para que uma empresa mude sua forma de agir, precisa considerar que a sustentabilidade corporativa também está ligada a fatores externos, que lhe servem ou não de incentivo. Segundo artigo de Volker Rittberger, Berthold Rittberger e Guillermo Jiménez, publicado em junho de 1998 na @lliance, revista de cunho social, o Produto Interno Bruto (PIB) – principal referência para verificar o crescimento econômico de um país – desconsidera, o que vale até hoje, qualquer indicador relacionado aos impactos ambientais e sociais. O custo disso, segundo os autores, é a poluição, o desgaste dos recursos naturais e outras mazelas. Os estudiosos valorizam a criação de indicadores com outros parâmetros, a exemplo do Índice de Desenvolvimento Humano da Organização das Nações Unidas.

Natália Calandrini e Júlia Lomba 35 comunicação


foto: Divulgação

Joe Sellwood

‘As organizações têm uma abordagem de comunicação, mas apenas para convencer o outro lado. Esse convencimento parte de um equívoco, pois muitas vezes quem fala tem apenas parte da informação para as soluções de sustentabilidade’ Joe Sellwood

‘Engajar é sentar-se à mesa pensando uma coisa e sair pensando outra. Se você não mudou sua ideia, provavelmente não engajou o outro’ J. S.

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O relacionamento das empresas com stakeholders se desenvolveu tanto que especialistas identificam três fases em sua evolução. Há os relacionamentos de primeira geração, que se caracterizam pela postura reativa das companhias em situações de conflito ou de novas demandas. Os de segunda geração, que representam um avanço ao adotarem o gerenciamento de riscos. Na terceira geração, as companhias promovem a colaboração e o reconhecimento dos agentes relacionados ao negócio – o verdadeiro engajamento – de forma a alcançar um patamar de competitividade sustentável. Essa é a tendência para 2020. Na avaliação do especialista norte-americano Joe Sellwood, representante da organização sem fins lucrativos AccountAbility na América Latina, ainda predomina no mercado o comportamento de segunda geração. Raramente temas surgidos fora das organizações são reconhecidos como prioritários ou mesmo relevantes. O especialista é categórico: “O reflexo automático das empresas é rejeitá-los”. Hoje, entretanto, com a mudança de cenários, o diálogo vem se tornando imperativo. “As organizações têm uma abordagem de comunicação, mas apenas para convencer o outro lado. Esse convencimento acaba sendo feito em cima de um equívoco, pois muitas vezes quem fala tem apenas parte da informação necessária para as soluções de sustentabilidade do negócio”, afirma.

São muitos os casos para ilustrar a situação. Joe cita uma empresa que era constantemente alvo de críticas, apesar de suas ações em benefício da comunidade. Ao ser apresentado às demandas apontadas pelo público externo, o CEO reagiu afirmando já usar as estratégias adequadas. A resposta do consultor: “O senhor está agindo de forma inversa. Estratégico é o que as pessoas de fora estão falando”. Recado entendido, a companhia redirecionou sua forma de abordar a sustentabilidade, partindo para o engajamento exigido pelo relacionamento de terceira geração. Para Joe, a chave para o bom relacionamento com stakeholders é justamente estar aberto para aprender com o outro. “Engajar é sentar-se à mesa pensando uma coisa e sair pensando outra. Se você não mudou sua ideia, provavelmente não engajou o outro. Esse é um teste para saber se está se envolvendo com os outros ou só tentando convencê-los”, orienta.

Aliando competências O primeiro passo para se acertar no relacionamento com os stakeholders é identificar as prioridades para a sustentabilidade do negócio. Parece fácil, mas aí reside um dos erros mais comuns. “A sustentabilidade é complexa, pois cobre diferentes assuntos e agentes. Fica fácil se perder. É fundamental saber diferenciar assuntos realmente importantes dos simplesmente prioritários e verificar as questões que têm a ver não só com a companhia, mas com vários atores”, afirma Joe. A partir dessa orientação, a empresa pode engajar seus stakeholders, inclusive por meio de parcerias multissetoriais. Isso já é comum em planos bilaterais entre governos, como os que buscam soluções para problemas climáticos. Mas o princípio pode ser replicado em outras áreas. A ideia é aliar competências para solucionar questões – ou seja, um verdadeiro trabalho de equipe. Joe resume: “Quem realmente conseguir trabalhar junto com os agentes ligados ao negócio sairá na frente”. O consultor dá um exemplo. Um frigorífico pode ter um plano de produção alternativa de gado. Porém, para mudar práticas em grande escala com um modelo de menor impacto, precisará estabelecer entendimentos com produtores de diferentes portes, ONGs, acadêmicos, bancos, varejistas, reguladores. Para solucionar a

Mais em Nós da Comunicação Artigo: Evandro Ouriques: Gestão e Mente Sustentável, o Quarto Bottom Line http://bit.ly/bmYgsZ


ponder e entregar”, analisa, adiantando que a AccountAbility lançará por aqui, no fim do ano, um módulo prático da norma AA1000 (leia mais no quadro Guias de relacionamento) com orientações para as empresas nesse sentido, além de divulgar uma pesquisa de mercado comparando as práticas brasileiras de engajamento com as de outros países Desde já, uma coisa é certa: os brasileiros precisarão correr se quiserem ser mais assertivos na próxima década. Para Joe, a pressão de grupos sociais tende a crescer e, em 2020, haverá pouco espaço para o mero discurso. “Cada vez mais entraremos na época do ‘me mostre, não me diga’. O aspecto de ‘responder e entregar’ será mais crítico para todas as empresas.” Joe acredita que as crescentes exigências por um diálogo mais efetivo com os stakeholders trarão novas atribuições à comunicação corporativa. Em sua opinião, a área, que “tem uma longa trajetória de via de mão única”, precisará criar uma cultura de buscar soluções conjuntas, engajando stakeholders em suas estratégias e ferramentas.

questão, esses diferentes grupos terão de se juntar de forma efetiva. A própria AccountAbility recorre ao networking como sistema de governança. Stakeholders com que atua de maneira mais próxima ajudam a avaliar seus planos e impactos. A instituição também ajuda a conectar agentes em todo o mundo. É o caso do MFA Forum, aliança internacional de empresas, agências de desenvolvimento, ONGs e organizações trabalhistas que incentiva a competitividade nas cadeias de suprimento em nível global. Segundo Joe, o uso da internet e das redes sociais virtuais oferece ganho em escala para as ações articuladas com stakeholders, pois fomenta um número maior de parcerias em diferentes regiões do globo e potencializa a disseminação de experiências. “Juntar pessoas fisicamente para criar confiança, trocar ideais e ‘codesenhar’ soluções é necessário para sair do paradigma de isolamento. Mas, para ganhar escala, uma conexão virtual acaba sendo muito importante.”

Estabelecendo a cultura de resultados

BASF rumo a 2020

Gislaine Rossetti

foto: Rodolfo Grabner

Com mestrado em Política Pública e Economia Ecológica e 11 anos de experiência no Brasil, Joe percebe que o país conta com grande potencial para inovar e promover o engajamento de stakeholders. Porém, ele observa que ainda nos falta planejamento. “Um processo estruturado deve ter as etapas de analisar e planejar; engajar e aprender; e responder e entregar. O Brasil tem muita experiência em engajar e aprender, mas peca no aspecto de analisar e planejar, ou seja, de entender aonde realmente quer chegar. Isso acaba afetando a capacidade de res-

A multinacional BASF, presente em 39 países com suas unidades de produção, já considera os stakeholders diretamente relacionados ao negócio nas ações corporativas. E isso deve se intensificar. Com o olhar voltado para o futuro, a empresa alemã lançou, no fim de 2009, a Estratégia 2020 para a América do Sul, pautada em sua ‘ambição de sustentabilidade’: “crescer de forma sustentável com pioneirismo e competência, sendo valorizada pelas partes interessadas nos países onde atua”. Para reforçar essa meta, a empresa lançou uma logomarca, a Pegada Sustentável, sugerindo uma abordagem com contornos específicos nessa região. Na prática, isso significa alinhar as oportunidades de negócio a uma atuação responsável em sintonia com as megatendências mundiais que se apresentam, como o crescimento e o envelhecimento da população; a globalização e o surgimento de mercados emergentes; o ritmo acelerado de urbanização; e a elevada demanda por energia e seu consequente impacto climático. “A Estratégia 2020 é uma continuidade da Estratégia 2015 – que tem como principal meta alavancar os negócios da empresa na região. O desafio é viabilizar a expansão sustentável

‘Quem realmente trabalhar junto com os agentes ligados ao negócio sairá na frente’ J. S.

‘O grande desafio nesse cenário interativo é tornar as coisas cada vez mais simples diante de um mundo cada vez mais complexo’ Gislaine Rossetti

Mais em Nós da Comunicação Entrevista: Mark Schumann apresenta as novas regras do engajamento de colaboradores http://bit.ly/bvKgUU Multimídia: Gislaine Rossetti fala sobre projetos de sustentabilidade da BASF http://bit.ly/93VQkJ

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foto: Arquivo BASF

Elisabeth Schick

‘A área de Comunicação deve contribuir facilitando o networking e aproximando diferentes stakeholders de dentro e de fora da empresa’ Elisabeth Schick

‘O Brasil tem muita experiência em engajar e aprender, mas peca no aspecto de analisar e planejar, ou seja, de entender aonde realmente quer chegar’ J. S.

‘Cada vez mais entraremos na época do “me mostre, não me diga”. O aspecto de “responder e entregar” será mais crítico para todas as empresas’ J. S.

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dos segmentos agro e de tintas, além de identificar novas oportunidades nas áreas químicas”, afirma Gislaine Rossetti, diretora de Comunicação da BASF na América do Sul. Nesse contexto, o mapeamento de stakeholders – realizado por cada segmento de negócio da BASF na América do Sul, levando em conta seu local de inserção, a cadeia de valor e o ambiente globalizado – é uma ferramenta para identificar as grandes demandas direcionadoras à inovação. Gislaine explica: “A indústria química inova a partir do entendimento dos desafios da sociedade e de como as megatendências irão influenciar esse cenário a curto, médio e longo prazos”. Em 2008, a BASF deu um passo à frente ao iniciar um processo formal de engajamento de seus stakeholders em sua política de sustentabilidade, a partir de uma metodologia desenvolvida pela AccountAbility.

Planejamento sustentável Desde então e sempre com visão de longo prazo, o planejamento de todos os segmentos de negócio da BASF considera as opiniões das partes interessadas. Para se ter ideia, já no primeiro ciclo de consulta foram ouvidos 39 stakeholders – entre organizações da sociedade civil, associações de classe, clientes e institutos científicos. Eles manifestaram suas expectativas com relação a inovações em tecnologia e produtos responsáveis. “É neste sentido que a empresa busca atender à principal preocupação citada pelas entidades ouvidas, que é a inovação em tecnologias responsáveis para gestão de resíduos e economia de energia”, declara Ana Lúcia Suzuki, gerente de Responsabilidade Social Corporativa da BASF para a América do Sul, no site da empresa. Para a vice-presidente mundial de Comunicação e Relações com o Governo da BASF, Elisabeth Schick, o que faz a diferença nas ações de sustentabilidade é a diversidade de pensamentos. Em sua visão, os resultados surgem exatamente da interdisciplinaridade, ao integrarem diferentes expertises. No âmbito públicoprivado, um bom exemplo foi a recente parceria da BASF com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), garantindo a aprovação do cultivo comercial no Brasil da soja Cultivance – primeiro produto tolerante a herbicidas Mais em Nós da Comunicação Artigo: Fabrício Saad: Fidelização de clientes e stakeholders http://bit.ly/duA0SB

geneticamente modificado e desenvolvido com tecnologia nacional. A conquista permitirá aos produtores agrícolas utilizarem menos insumos para fazer o controle de plantas daninhas, além de assegurar maior produtividade. O lançamento do produto será feito no Brasil, a partir da safra 2011/2012.

Abordagem adequada aos novos tempos E a comunicação da BASF, que mudanças ela anuncia para os próximos anos? Gislaine afirma que a configuração de uma sociedade multimidiática pede uma nova abordagem no relacionamento com todos os interlocutores ligados ao negócio, substituindo o diálogo restrito entre público interno e externo por uma comunicação focada em toda a cadeia de valor. “Em nosso mapeamento, buscamos classificar os stakeholders de acordo com seus atributos em cada esfera de relação, para saber quem são de fato os formadores de opinião.” Elisabeth ressalta que a comunicação corporativa não é a única responsável por esse processo: “A área deve contribuir facilitando o networking e aproximando diferentes stakeholders de dentro e de fora da empresa”. Com as mídias sociais digitais, essa missão se intensifica. Na opinião de Elisabeth, os comunicadores do futuro devem criar competências para usar esse novo canal como complemento dos demais. Além disso, ela defende o monitoramento da comunicação na web, permitindo que se identifique de que forma eles modificarão a comunicação como um todo.

Evandro Ouriques


foto: Amanaje Fotografia

Ana Lúcia Suzuki

Indo além de construir a ponte dos relacionamentos, os comunicadores têm o desafio de se tornarem verdadeiros consultores para a organização. De acordo com Gislaine, a grande questão nesse cenário interativo é ‘tornar as coisas cada vez mais simples diante de um mundo cada vez mais complexo’. “Isso muda completamente a temática da comunicação. Precisamos estar atentos aos aspectos técnicos e estratégicos, preparando a empresa para transitar nesse ambiente”, analisa. Para mostrar a importância da atuação dos comunicadores como consultores, Gislaine revela que a BASF lançou este

ano uma diretriz de mídia social on-line para orientar os colaboradores ao redor do mundo no uso das novas ferramentas de comunicação. “Ao mesmo tempo em que o colaborador faz parte da organização, ele está interconectado, podendo emitir mensagens que podem afetar a imagem e a reputação da empresa”, observa. A diretora acrescenta que a BASF está implantando uma plataforma para identificar novas oportunidades na web. “As mídias sociais digitais são mais que ferramentas, elas representam uma nova forma de interação. É preciso, no entanto, estar presente nas redes de forma responsável”, alerta.

A exigência de um novo modelo mental Propomos uma reflexão. Em cada canto do planeta, pelo menos um grupo está, neste momento, dedicado a debater grandes questões para a sustentabilidade mundial. Deixe a sala de reunião e caminhe pela rua. Novo cenário: buzinas indiscriminadas no trânsito, empurrões em vez de ‘com licença, por favor’ e – cuidado! – lá vem lixo pela janela do carro. Para transformar o mundo em um

Guias de relacionamento A AccountAbility lançou, em 1999, a série de normas AA1000, que orientam as organizações na elaboração de estratégias de sustentabilidade, com foco no engajamento dos stakeholders. Seus princípios também ajudam a estabelecer padrões e metas de atuação. Outra recomendação das normas é a divulgação de informações-chave: estratégias, objetivos, normas e resultados devem ser abertos ao público, tanto como contribuição quanto para avaliação. Dessa forma, a empresa ou entidade civil imprime transparência e credibilidade a suas ações. As normas são regularmente revisadas e enriquecidas por meio de consultas aos stakeholders de interesse. E, apesar de compatíveis com os padrões do relatório Global Reporting Initiative (GRI) e das normas ISO, permitem adaptações aos desafios de cada organização. Uma iniciativa similar é a certificação B Corporation, conferida nos Estados Unidos pela ONG B Lab a empresas que sigam um modelo de gestão voltado para os interesses dos stakeholders. A proposta da organização é criar um novo setor da economia, que capitalize o poder dos negócios para solucionar problemas sociais e ambientais. Este ano, a organização conseguiu aprovar no estado de Maryland uma lei criando a figura da benefit corporation, a corporação benéfica – aquela que cria benefícios públicos e gera valor para os acionistas. Pela lei, ela deve incorporar os valores em seu estatuto, reportar anualmente suas atividades benéficas e se submeter a auditorias de terceiros para avaliar seus impactos.

Mais em Nós da Comunicação Multimídia: A relação empresas-agências de comunicação http://bit.ly/aDKZbn

lugar com mais respeito e melhor relacionamento entre as pessoas, precisaremos antes mudar as mentalidades quanto às pequenas ações cotidianas. A partir da constatação de que as ações de sustentabilidade não têm o efeito esperado, o professor Evandro Vieira Ouriques, da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ECO-UFRJ), criou a ‘gestão da mente sustentável’. Trata-se de uma extensão do conceito triple bottom line (em que a sustentabilidade tem base social, ambiental e econômica), incorporando o modelo mental para definir o ‘quarto bottom line’. Para o acadêmico, é a partir de uma verdadeira mudança no pensamento e no sentimento que as pessoas promoverão transformações reais em outras esferas. Ele parte da ideia de que não há separação entre o individual e o coletivo. Porém, segundo o coordenador do Núcleo de Estudos Transdiciplinares de Comunicação e Consciência (NETCCON), na prática existe uma desconexão entre esses dois universos. Em artigo publicado na rede de conhecimento Nós da Comunicação, Ouriques registra: “É preciso treinar a mente para a ação transformadora no mundo, diante da qual não cabem as respostas prontas entregues por intenso, concentrado e monocórdico delivery midiático, educacional, familiar e social”. Comunicação 360º perguntou ao consultor Joe Sellwood se, para encarar os desafios da sustentabilidade, os gestores precisam mudar seu modelo mental. A resposta foi simples: “As pessoas que mais precisam mudar rejeitam isso. Acredito que o contexto garante as condições para as mudanças acontecerem. Os profissionais perceberão, na prática, que seu comportamento culminou nas crises e que, se continuarem, a situação poderá piorar”.

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foto: Pérsio Lima

Pingue-pongue com Eliane Dal Colleto

Consumo 2020: a revolução já começou Tryvertising: ‘lojas-laboratório’ em que o cliente testa o produto e dá seu parecer. Nowismo: exigência pelo consumo instantâneo, que leva as empresas a correrem contra o tempo. Estas são apenas duas entre incontáveis palavrinhas incorporadas ao dicionário do marketing que anunciam a progressiva inclusão de um importante stakeholder – o consumidor – no centro das estratégias corporativas. Para a jornalista Eliane Dal Colleto, gerente de Comunicação Corporativa da consultoria Nielsen Brasil, pós-graduada em Propaganda e Marketing e MBA em Gestão de Negócios, a tendência se apresenta hoje, mas será aprofundada na próxima década. Afinal, só estando bem perto do consumidor é possível responder a demandas que mudam a cada momento, tornando-se cada vez mais exigentes e urgentes. A especialista, que há dez anos acompanha tendências de consumo internacionalmente, identifica o acelerado crescimento da classe C (responsável por 60% do aumento do consumo) e o envelhecimento da população como as bases dos novos desafios do Brasil em 2020. Em todo o mundo, as soluções prometem surpreender, como sugerem as bebidas com vitaminas ‘ativáveis’. Porém, por mais visionária que seja a estratégia, ela só funcionará se a empresa, em atitude de humildade, rever posicionamentos durante a execução. É o que defende Eliane em entrevista exclusiva à Comunicação 360º

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Comunicação 360º – O que representa o crescimento da classe C no Brasil? Eliane Dal Colleto – Ele vem trazendo mudanças no consumo desde 2002, quando as primeiras pesquisas sugeriram análises mais detalhadas do poder de compra desse stakeholder, até então pouco estudado. Naquela época, 78% dos consumidores da classe C pagavam suas compras em dinheiro, 57% julgavam o preço como o atributo mais importante na decisão de compra e 52% se declaravam infiéis às marcas que consumiam. Hoje, o cenário é diferente. Com a inflação sob controle, o aumento de renda da população, os programas sociais do governo e a maior capacidade de planejamento das contas, essa camada da população entrou definitivamente para o universo do consumo. A classe C representa hoje uma fatia de 60% do mercado brasileiro. São pessoas que buscam praticidade, bem-estar e cuidados com a saúde, tanto quanto as classes sociais mais altas. Mas esse não é o único fator responsável pelas mudanças no consumo. Na década de 80, por exemplo, 54% da população estavam em idade economicamente ativa, contra 68% em 2009. A força de trabalho feminina representava 19% e, agora, 44%. As empresas estão adequando seus produtos e serviços a este novo Brasil. Comunicação 360º – Além da oferta de produtos a preços competitivos, quais serão as novas demandas dos consumidores? O que o marketing precisará fazer para atendê-las? E. D. C. – Consumidores, independentemente de sua classe social, tendem a ficar

mais exigentes no mundo inteiro, pois a informação fácil tem o poder de instigar, gerar dúvidas, fazer pensar. Por este motivo, de nada adiantam grandes ideias e grandes campanhas se houver pouco foco na execução. Refiro-me a planejar, executar, acompanhar, medir resultados e rever posicionamento. Admitir que uma ação foi ‘legal’ mas não trouxe retorno é uma atitude de grandeza e maturidade no mundo corporativo. Porém, o melhor – apesar de mais difícil – é perceber a dificuldade e ajustar o projeto ainda durante sua execução. Afinal, o mercado muda, assim como o cenário econômico e as pessoas. A vantagem está em acompanhar rapidamente a mudança. Comunicação 360º – A comunicação voltada para nichos de mercado continuará sendo uma tendência em 2020? E. D. C. – Acredito que sim. Em 2020, teremos ainda mais veículos segmentados, porém me questiono sobre os reais nichos de mercado. Vejo hoje uma saturação de veículos, uma proliferação de conteúdos que gera distorções e perda de tempo. Apesar disso, percebo que os nichos de mercado para a comunicação estão cada dia mais ligados às mídias digitais. As campanhas de massa continuarão existindo, porque são a porta de entrada para novos públicos. Mas não serão suficientes, como já não são atualmente. Nesse contexto, vale notar que hoje o mercado não pode se basear apenas no enquadramento social, econômico ou demográfico dos consumidores, pois ele é multifacetado. O consumidor não é, ele está. Dois consumidores aparentemente


diferentes podem ter as mesmas necessidades e expectativas em relação a um produto, em determinado momento. O que vai definir a relação deles com a marca, seja de um produto ou ponto de venda, é sua experiência no momento da compra. Comunicação 360º – O sentido de urgência, próprio do mundo 2.0, chegará – ou já chegou – ao consumidor brasileiro? E. D. C. – Pesquisas globais apontam essa tendência há alguns anos e no Brasil não é diferente, pois a escassez de tempo permanece como o grande desafio das sociedades. O ingresso maciço das mulheres no mercado de trabalho contribuiu para o contexto, já que a decisão de compra continua centrada na dona de casa, muitas vezes provedora da família. Comunicação 360º – Que outros desafios o país trará para o marketing? E. D. C. – Segundo dados do IBGE, em 2020 o número de brasileiros acima de 50 anos de idade será duas vezes e meia maior que em 1981. Estima-se que esse grupo representará 23% da população, contra os 16% registrados em 2005. Surge uma pergunta óbvia: o que as empresas estão fazendo para atender estes consumidores com mais idade e ainda elevado potencial de consumo? ‘Estão fazendo muito’ é a resposta. Desde produzir embalagens com informações nutricionais mais fáceis de ler até produtos com apelo de saúde e de praticidade. Comunicação 360º – Aponte outras projeções de consumo para 2020. E. D. C. – Só em alimentação, a próxima década será cheia de novidades. Os produtos já estão chegando com apelo de solução de problemas e não apenas de redução de riscos. Existem bebidas com vitaminas específicas acondicionadas na tampa para você escolhê-las e acioná-las no momento do consumo (as activate drinks), extratos de tomate com megapropriedades benéficas à saúde (conhecidos como fruitflow), bebidas que combatem radicais livres (como as beauty drinks da Nestlé) e até chocolate que contribui com a saúde do coração (mars nutrition cocoavia). Isso sem contar a evolução do varejo. Lojas inteligentes avisarão as pessoas quando os produtos estiverem acabando em suas residências ou indicarão promoções via celular quando os clientes passarem perto da loja. Em 2020, é provável que

consumidores mais conscientes comprem produtos perto de suas casas para minimizar os impactos do transporte ao meio ambiente. Esta é a principal tendência que almejo ver concretizada. Comunicação 360º – Acredita que o aumento do consumo é compatível com os ideais de sustentabilidade? Como, por exemplo, colocar tantos carros na rua sem poluir o meio ambiente? E. D. C. – Sim, acredito que seja compatível assistir ao crescimento do consumo no Brasil sem ferir os ideais de sustentabilidade. Devemos aproveitar as boas e más experiências dos países desenvolvidos para fazer diferente quando for preciso. É injusto levantar uma bandeira de consumo versus ideais de sustentabilidade exatamente no momento em que uma importante parcela da população está conquistando seu lugar ao sol. Colocar mais veículos na rua é um problema, mas não é privando consumidores do sonho do carro próprio que vamos construir um país mais justo. É investindo em segurança e transporte público. Comunicação 360º – Especialistas brasileiros afirmam que o consumidor emergente – que vem se somando à classe média – se torna cidadão na medida em que adquire poder de compra. Até que ponto o consumo e as facilidades de crédito trazem cidadania e tornam as pessoas mais felizes? E. D. C. – O consumo torna as pessoas mais felizes, sim. O poder de compra dispara o sentimento de inclusão e pertencimento. Significa fazer parte da sociedade. Consumir de forma consciente é um segundo passo. É fácil falar em consumo consciente para quem sempre teve oportunidade de consumir. O difícil é explicar a importância disso para as camadas da população que até ontem não tinham esse privilégio. Mas não estou dizendo que devemos deixar de buscar a conscientização, até porque o exemplo dos países com alto grau de consumo sem limites nos mostra dia a dia os efeitos dessa postura. O indiano C. K. Prahalad dizia que o desafio não será criar produtos cada vez mais inovadores, e sim que atendam à base da pirâmide. Eu também acredito que realmente é possível erradicar a pobreza por meio de estratégias de negócios.

Mais em Nós da Comunicação Entrevista: Eliane Dal Colleto: ‘compartilhar informações é papel também de cada funcionário da empresa’ http://bit.ly/9NaGAo

‘E provável que consumidores mais conscientes comprem produtos perto de suas casas para minimizar os impactos do transporte ao meio ambiente’ ‘Os nichos de mercado para a comunicação estão cada dia mais ligados às mídias digitais. As campanhas de massa continuarão existindo, mas como porta de entrada para novos públicos’ ‘A classe C brasileira busca praticidade, bem-estar e cuidados com a saúde, tanto quanto as classes sociais mais altas’

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Julio Verne


Guiados pela

imaginacao

Escritor do século XIX, Julio Verne tinha um talento visionário. Autor de obras de aventura, como Viagem ao centro da Terra e Cinco semanas em um balão, é considerado o pai da ficção científica. Sua literatura, povoada por máquinas voadoras e outros equipamentos exóticos, teria inspirado muitos inventos. Verne acreditava que “tudo o que um homem é capaz de imaginar, um outro é capaz de realizar”. Muitos outros escritores, artistas e cineastas imaginaram o futuro, frequentemente sombrio. Quem não se lembra do clássico Blade Runner, que retratou o planeta que teremos em breve, em 2019, povoado de androides confundidos com humanos pelas ruas de Los Angeles? Recentemente, o longa de animação Wall-E descreveu um mundo onde as pessoas se comunicarão apenas pela internet e a Terra seria convertida em um grande depósito de lixo. Sem recorrer a ficcionistas ou visionários, ouvimos representantes da academia e do mercado para traçar os possíveis cenários e desafios da comunicação em 2020: no ambiente corporativo, nas mídias, nas relações de trabalho, na educação e na cultura. Projetamos o que está por vir buscando visões ancoradas no conhecimento – do passado e do presente. Mas, tal como Verne, nossos consultores indicam que precisamos nos deixar guiar pela imaginação. Apenas exercitando a capacidade de reflexão conseguiremos conceber um amanhã grandioso. Como bem diz o cineasta Silvio Tendler, nossa relação com a história não deve ser nostálgica, mas “para conhecer o mundo e olhar para o futuro”

Isabela de Assis, Ademir Veroneze, Mariana Gouvêa e Maíra Gonçalves Colaboraram:

Sânia Motta e Marcos Moura

Imagine a seguinte cena: estamos dentro de uma grande empresa em 2020. Caminhamos pelos corredores indagando sobre a comunicação corporativa. Qual seria sua dimensão nessa organização? Onde estariam seus profissionais? Trabalhando numa sala ampla, média ou pequena? Ocupando estrategicamente uma mesa ao lado do presidente ou seria mais fácil encontrá-los em agências ou home offices? Para Ricardo Benevides, doutor em Literatura Comparada pela Uerj, professor das Faculdades Hélio Alonso (Facha) e coorganizador do livro Por dentro da Comunicação Interna: tendências, reflexões e ferramentas, em 2020 a comunicação corporativa terá mais espaço e apoio político dentro das organizações. “Digo isso porque temos visto um movimento gradual, porém contínuo – dos últimos dez anos para cá –, de empresas em busca de uma maneira de se comunicar mais profissional e baseada na verdade, ampliando constantemente seu ângulo de visão”, afirma. Professora de Comunicação Corporativa da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), que atuou como executiva de comunicação em empresas com Xerox e Coca-Cola Brasil, Marilene Lopes também compartilha desse olhar otimista: “Quero imaginar 2020 com corporações, pessoas e governos de fato preocupados em refletir e fazer profundas transformações comportamentais e de atitudes para a construção de um mundo melhor, mais justo e verdadeiramente sustentável”, diz ela. A professora da PUC acredita que o papel das assessorias de imprensa também deverá ser repensado e será objeto de muitos estudos até 2020. “Hoje, não se trata de criar e manter um bom relacionamento

com a imprensa ou de tratar o jornalista como ‘cliente’. Agora, qualquer pessoa é produtora de conteúdos favoráveis ou desfavoráveis a empresas e pessoas, espalhados em redes de relacionamento cada vez maiores e diversificadas. Esta é uma mudança extraordinária que está ocorrendo”, analisa. Para o jornalista Ricardo Voltolini, diretor da consultoria Ideia Sustentável, o avanço tecnológico exigirá atenção permanente das empresas. Nesse contexto, a comunicação e a mensagem exigirão cuidados especiais. Isso quer dizer que o profissional de comunicação corporativa precisará ter ainda mais habilidade para articular e fazer a leitura dos diferentes conhecimentos que interferem no negócio da organização. “Assim como a tecnologia permite que as respostas cheguem cada vez mais rápido, no mundo conectado os comunicadores devem estar atentos, pois haverá necessidade de reagir prontamente. Isso significa que o retorno aos consumidores, à comunidade em que atua e aos fornecedores e acionistas terá de ser imediato. Precisamos saber que a tecnologia encurta distâncias, mas o profissional tem de oferecer respostas cada vez mais ágeis”, ressalta. “O comunicador deverá ter uma compreensão clara desse quadro e a comunicação corporativa precisará conjugar a técnica com valores e princípios. Chamo isso de ‘comunicação consciente’. Não será mais possível ter um profissional aplicando somente as noções teóricas, pois o que ele aprendeu na faculdade terá de ser reinventado permanentemente. A complexidade exigirá muito mais dele, que deverá adquirir conhecimento, agilidade, domínio técnico dos instrumentos, assim como valores e princípios”, conclui Voltolini.

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Ricardo Benevides

O papel da academia

‘Temos visto um movimento gradual, porém contínuo – de dez anos para cá –, de empresas em busca de uma maneira de se comunicar mais profissional e baseada na verdade, ampliando seu ângulo de visão’ Ricardo Benevides

‘A comunicação corporativa precisará conjugar a técnica com valores e princípios. Chamo isso de “comunicação consciente”’ R. V.

‘Você não consegue se desligar do trabalho intelectual. Ele reside no seu cérebro, e cérebros não batem ponto’ Silvio Meira

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Ricardo Benevides também ajuda a traçar o perfil do novo comunicador: “Minha aposta – e de grande parte da academia – é de que serão pessoas com formação humana mais complexa, sob o ponto de vista interdisciplinar”, observa. Para ele, se vivemos no passado a apologia da técnica e do domínio instrumental para profissionais que se lançavam no mercado, hoje já encontramos demandas no segmento da comunicação corporativa que representam desafios para quem tem o mero perfil de “executor”. O professor antevê que a próxima década terá profissionais com domínio teórico-prático muito diversificado, com base em estudos de Sociologia, Antropologia e História. “Os comunicadores precisarão estar antenados com as transformações tecnológicas e investigações nas áreas específicas cada vez mais entrelaçadas, a partir dos saberes das academias de Relações Públicas, Jornalismo, Publicidade e Administração”, reflete. Para responder às novas demandas do campo da comunicação em 2020 a academia terá de mudar, como observa Ubiratan D’Ambrosio, professor emérito de Matemática da Unicamp. “A comunicação vai evoluir em direção à transdisciplinaridade, no sentido de buscar novos modelos de conhecimento. A organização da academia – departamentos, disciplinas etc. – está mais do que obsoleta”, diz ele. Segundo Ubiratan, os alunos hoje buscam conhecimento de uma forma transdisciplinar, transcultural e, sobretudo, utilizando meios de comunicação. “A academia ainda não descobriu esses meios. O que eu penso que vai acontecer é um rompimento com o esquema de disciplinas tradicionais e uma procura por outras formas de conhecimento”, reflete. Jornalista veterano, Fritz Utzeri também acredita que a academia não tem conseguido acompanhar os avanços digitais na área de Comunicação. “A que ensina jornalismo já estava defasada em relação às redações normais, do meu tempo. Com relação ao jornalismo eletrônico, aí eu tenho a impressão de que a distância é imensa e cada vez maior”, opina. Para ele, as pessoas estão ficando tão assoberbadas por coisas diferentes o tempo todo que logo não saberão interpretar textos. “A universidade passa então a ter a missão de orientar o estudante sobre aonde buscar a informação, como se cuidar para não ser manipulado e discernir aquilo que é fundamental do que

Mais em Nós da Comunicação Multimídia: Marilene Lopes fala sobre a ‘Política de Portas Abertas’ http://bit.ly/bVNpps

é acessório, basicamente”. (Leia o quadro Jornalismo, publicidade, cultura: o futuro escrito em bits)

Revolução no mundo do trabalho O que a próxima década trará para as relações de trabalho? Sem dúvida, teremos muitos desafios pela frente. “Acredito que, a partir de 2020, todas as atividades dependentes da força humana que sejam realizadas de forma imprecisa poderão e serão executadas por robôs. Dessa forma, caberá aos humanos apenas a atividade intelectual”, analisa Silvio Meira, cientista-chefe do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (C.E.S.A.R.) e professor de Engenharia de Software da Universidade Federal de Pernambuco. Para ele, ninguém conseguirá evitar trabalhar 24 horas por dia, por uma simples razão: “Você não consegue se desligar do trabalho intelectual. Ele reside no cérebro, e cérebros não batem ponto”. Quem se assusta com a necessidade de estar quase 100% do tempo conectado ao trabalho, segundo Silvio, precisa mesmo estar atento: “Se você é gerente e perdeu uma oportunidade de emprego porque teria que ficar disponível o tempo todo com um blackberry, isso significa que em breve você será inútil para o mercado”. Ricardo Voltolini observa, entretanto, que as relações de trabalho serão mais flexíveis, como resposta às dificuldades de locomo-

Marilene Lopes


ção, em especial nos grandes centros urbanos. “Num mundo cada vez mais conectado, a tendência é que os locais de trabalho não tenham tanta importância. Acredito que os escritórios passarão a ser pontos de encontro nos quais as pessoas exercitarão a convivência. As conexões serão cada vez mais profundas e haverá flexibilidade nessas relações”, antecipa. Diante do cenário esperado, de ampliação do segmento de Comunicação Corporativa, Ricardo Benevides acredita que existirão mais agências e profissionais empregados no setor privado. Para ele, mais comunicadores atuarão em home offices, porém não tanto quanto supõem o que ele chama de “futurólogos deslumbrados pelas inovações tecnológicas”. E justifica: “Haverá sempre demanda pela comunicação face a face, que humaniza as relações e sedimenta as trocas simbólicas entre pessoas e organizações”. Marilene faz coro: “A utilização dos meios digitais, por mais intensa que seja, não deverá substituir as relações olho no olho”.

Tudo converge para a educação Silvio pondera que nem as empresas e muito menos os profissionais estão preparados para a realidade de 2020. “A sociedade adestra as pessoas para se tornarem animaizinhos de escritório, gentis e educados, chegando de manhã ao trabalho, batendo ponto, fazendo alguma coisa mesmo que seja irrelevante, e saindo no fim da tarde com cara de feliz. Para que isso mude é preciso mudar o sistema educacional. E isso vai acontecer? Vai nada. Levará uns cem anos para isso mudar”, observa o professor. De fato, num cenário em que o capital intelectual terá um grande peso, investimentos e transformações na educação são imprescindíveis, como analisa Ricardo Voltolini. “Se o Brasil quiser estar inserido em uma política sustentável, é preciso capacitar as futuras gerações, melhorando a qualidade da educação básica. As pessoas precisam aprender a pensar”, diz ele.

De volta à Pré-história? Em seus livros O pão nosso e o Futuro do trabalho na Era Tecnológica – Em busca do tempo perdido, o psicanalista Osmar de Almeida Santos analisa as duas grandes revoluções que ocorreram – a Agrícola, há 10 mil anos, e a Industrial, há 200 anos – para entender as mudanças que vêm se processando hoje e as que estão por vir no mundo do trabalho. Segundo ele, essas revoluções tiveram um impacto psicológico significativo sobre o homem. Os livros refletem sobre a importância da Revolução Agrícola para a história da humanidade, que impactou radicalmente a maneira como nossos antepassados viviam. Ela transformou o homem nômade e caçador em um ser que construía moradias mais permanentes e aperfeiçoava métodos de produção da comida. A Revolução Industrial, por sua vez, criou o emprego – trabalho assalariado “garantido”. Essas duas revoluções, segundo Osmar, mataram no homem o gosto e a arte da sobrevivência, da iniciativa, do risco calculado – ou seja, aptidões desenvolvidas há mais de 500 anos, que ficaram gravadas em nossa memória coletiva, trazendo uma espécie de nostalgia e conflitos inconscientes sobre o que seria melhor: estabilidade ou aventura? De acordo com o psicanalista, precisamos entender que na Era Tecnológica não existe mais a ideia de emprego seguro. Cada vez mais o trabalho se tornará esporádico, casual, e as legislações que asseguram direitos de todos os tipos serão vistas como coisa do passado. Ou seja, precisamos recuperar dentro de nós o espírito de caçador da Pré-história, como explica um trecho do livro: “A dissolução do conflito neurótico, atávico, do homem – risco versus aventura – vai ter que ser resolvida pelo computador, pela informática, pela tecnologia avançada”.

Mais em Nós da Comunicação Colunas: Todas as colunas de Ricardo Benevides no ‘Nós da Comunicação’ http://bit.ly/YHXfk

Ubiratan D’Ambrosio

‘A comunicação vai evoluir em direção à transdisciplinaridade, no sentido de buscar novos modelos de conhecimento’ Ubiratan D’Ambrosio

‘A utilização dos meios digitais, por mais intensa que seja, não deverá substituir as relações olho no olho’ Marilene Lopes

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‘Está faltando uma inteligência sustentável, que precisa ser formatada dentro dessa relação cérebro/mente/ consciência’ Regina Migliori

Regina Migliori

‘A universidade passa a ter a missão de orientar o estudante sobre onde buscar a informação, como se cuidar para não ser manipulado e discernir aquilo que é fundamental do que é acessório’ Fritz Utzeri

‘As pessoas precisam aprender a pensar’ Ricardo Voltolini

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Na Neuroeducação, uma nova perspectiva para 2020 Presidente do Instituto Migliori e consultora de Cultura de Paz da Unesco, Regina Migliori observa que o entendimento de comunicação evoluiu de uma atitude reducionista – de mera transmissão de informação – para processos interativos, que envolvem diálogo e, como resultantes deles, os relacionamentos. Esse processo, de acordo com Regina, levou a uma profunda transformação na postura do comunicador e na utilização dos veículos e ferramentas que se tornaram disponíveis. “Quando isso tudo aconteceu, achava-se que a revolução da comunicação já estava pronta”, diz ela. No entanto, segundo a consultora, o que vemos hoje é um salto talvez ainda mais impressionante. “Trata-se do entendimento do que acontece com as pessoas num processo de comunicação. Isso está sendo possível por conta do desenvolvimento das chamadas ciências da cognição, da Neurociência e de todo um conjunto de conhecimentos sobre o funcionamento do cérebro, da mente e da nossa consciência. Hoje temos novas áreas de investigação para penetrar nesse universo: o que acontece com as pessoas, sob o ponto de vista do cérebro, da mente e da consciência?”. Para exemplificar, Regina cita o Neuromarketing, que busca compreender por que as pessoas se interessam por determinado produto, o que elas sentem ao consumi-lo e como o consumo pode ou não ser estimulado. “Conhecendo o Neuromarketing, começamos a rever o tamanho da responsabilidade do profissional de comunicação sobre o que acontece

com as pessoas em um determinado processo de comunicação”, observa a especialista. Além disso, lembra Regina, hoje a Neurociência já consegue identificar o ponto exato do cérebro em que processamos valores éticos – o chamado cérebro ético: “Essa região pode ou não ser ativada por um processo de comunicação”. Diante disso, Regina imagina para 2020 um conjunto novo de responsabilidades a ser assumido pelos profissionais de comunicação no sentido de se perceberem como responsáveis pela constituição e disseminação de uma inteligência sustentável. “Hoje, falamos muito de viver no dia a dia sem causar prejuízo ao planeta e às futuras gerações. As pessoas desejam isso, mas elas estão encontrando dificuldades em formular planos e estratégias para concretizar seus desejos. Está faltando uma inteligência sustentável, que precisa ser formatada dentro dessa relação cérebro/mente/consciência”, afirma. Com o objetivo de levar todas essas ideias para o campo da educação, uma parceria da especialista com a Fundação Douglas Andreani inaugura, em agosto, em Campinas, um laboratório de Neuroeducação. “A proposta é disseminar entre os educadores técnicas conhecidas da Neurociência nos processos educativos”. O laboratório faz parte de um programa de formação de educadores e tem como objetivos estimular a pesquisa como interface entre as ciências da cognição, a Neurociência e a educação; a capacitação dos educadores; e a integração com projetos afins que estão surgindo ao redor do mundo.

Mais em Nós da Comunicação Artigo: Regina Migliori: Da neurociência às práticas sustentáveis: incorporando valores à sustentabilidade http://bit.ly/9JMlDa


Jornalismo, publicidade, cultura:

o futuro escrito em bits

Qual é o futuro da imprensa? O desafio de projetar esse cenário foi aceito por Fritz Utzeri, que tem mais de 40 anos de jornalismo e está hoje totalmente afeito às mídias digitais. Entre outras funções, foi diretor de redação e correspondente internacional do Jornal do Brasil e atualmente coordena a Comunicação da Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro, além de editar o jornal eletrônico Montbläat. Olhando adiante da atual proliferação de veículos e da fragmentação de informações nos blogs e twitters, ele prevê uma completa convergência de mídias que marcará o retorno do jornal ao lugar central na disseminação de informações. E vai além: “O que vai desaparecer não é o jornal, mas o suporte em que ele é impresso”. Fritz lembra que, ao longo dos anos, grande parte dos equipamentos e processos que existiam entre a máquina de escrever e a rotativa desapareceram. “A revelação no laboratório fotográfico e umas sete toneladas de máquinas se foram. A próxima coisa será o Titanic de impressão [o jornalista se refere ao parque gráfico das editoras].” Para ele, é justamente na esteira do aparecimento de novos meios digitais que essa mudança ocorrerá. “Surgirá uma nova espécie de papel digital que, além de melhorar em muito a comunicação, irá aumentar a lucratividade do jornal, eliminando a impressão e a distribuição convencionais.”

Partindo desse papel digital como novo suporte, Fritz vislumbra um jornal com três fortes características. Primeiro, ele será mais dirigido aos interesses do leitor. Se um assinante gosta de esporte, a editoria correspondente chegará a ele contendo o máximo de informações disponíveis. A segunda característica se refere à constante atualização do conteúdo. Voltaríamos um pouco, talvez, ao tempo em que os jornais tinham várias edições por dia. A nova tecnologia é capaz de recuperar essa atribuição perdida com a chegada da televisão. O terceiro atributo tem a ver com a possibilidade de o jornal se ‘linkar’ a outros formatos. Ou seja, caso alguém queira rever os lances de um jogo, clicará na foto e a imagem entrará em movimento com possibilidade, inclusive, de narração.

‘A comunicação é o grande negócio do século XXI’ F. U.

Produção em rede, ditada pela colaboração Além disso, as práticas de compartilhar conhecimento e trabalhar em rede se consolidarão nesse novo modelo: o jornalismo colaborativo – que inclui a contribuição dos leitores, tanto por

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meio da produção de artigos, muitas vezes sobre temas complexos, quanto pelo simples envio de imagens, relatos e opiniões. Outro efeito é a perda da posição quase absoluta que os jornais mantinham de detentores da verdade e da razão. “Às vezes, o leitor tem coisas muito mais importantes para dizer e sem os vícios de interpretação do jornalista porque talvez conheça de perto a situação em pauta”, assinala Fritz. O jornalista afirma que essa é uma tendência irreversível que se pode observar facilmente ao se compararem edições antigas, em que as cartas dos leitores ocupavam um pequeno espaço no canto do jornal, com as atuais. Ele cita o exemplo de O Globo, que mantém duas páginas de opinião e uma terceira página do leitor. Ressalta em seguida a importância de ouvir o público para saber com quem está falando e o que se tem a falar. Isso evitaria a deficiência que Fritz identifica na cobertura da área de Economia nos jornais brasileiros. Segundo o jornalista, ela não consegue ver os fatos do ponto de vista do leitor. “Parece que os textos são feitos para serem lidos por banqueiros e eu, como sujeito da classe média, não vejo ali o que me interessa.” De acordo com Fritz, seria muito bom existir um jornal que tivesse uma variedade de opiniões e nuances. Isso será possível nos anos à frente, quando a interação entre a redação e o público aumentar cada vez mais. “Em determinado momento desse jornal que estou vendo para o futuro, haverá até mesmo uma seção de atendimento ao leitor em tempo real.” Sim, essa interação ocorrerá on-line, durante 24 horas por dia, segundo o jornalista. Isso aumentará enormemen-

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te o trabalho e a capacidade de trabalhar com as ferramentas que estarão disponíveis. Ele dá um exemplo desse avanço no presente: “Não tenho mais de procurar informações no setor de arquivo, de bater o texto na máquina de escrever e de corrigir. Hoje, trabalho mais e nem sempre isso resulta em mais valia, ou seja, o patrão não paga mais por isso. Mas a velocidade do processamento da informação e a capacidade de distribuição da informação se multiplicaram.” Fritz defende que o novo jornal constituirá uma solução para a publicidade também. Segundo ele, ela é mal resolvida nos jornais eletrônicos atuais. “A coisa que mais me irrita é a invasão do pop-up. No jornal impresso, você pode evitar a publicidade, ela não aparece em cima da notícia que você quer ler.“ O jornalista diz que o jornal em papel digital ajudará os publicitários a reorganizarem os anúncios, possivelmente retomando a distribuição que é feita nos jornais hoje – o que ainda não é possível no computador por questões técnicas. Para Fritz, a publicidade também vai tirar vantagem do fato de – sem os gastos com impressão e distribuição – o preço do jornal cair e a quantidade de leitores se multiplicar.

Os rumos dos empreendimentos de comunicação Diversos jornais estão desistindo da forma impressa e experimentando padrões de conteúdo pago na web. Fritz destaca o centenário e respeitado The Christian Science Monitor, jornal norteamericano que há pouco mais de um ano fez essa transição. “Ele tem mais leitores do que antes e gasta tão menos devido ao corte de distribuição e impressão que, mesmo com, digamos, uma queda de 70% no faturamento de publicidade, ainda é mais rentável do que no formato anterior. É claro que esse é o caminho.” Mas, convenhamos, não será fácil trilhá-lo. Afinal, criou-se a ideia de que a transmissão de informações na internet deve ser gratuita e ainda estão sendo definidos os parâmetros de direito autoral para esse meio. O que acontece, de acordo com Fritz, é que o desenvolvimento da tecnologia hoje é muito mais rápido do que

o da lei. “Essa cultura pode ter raízes no hábito de obter informações de graça – teoricamente – pelos telejornais ou mesmo alguns jornais impressos gratuitos. Mas, em geral, essas informações superficiais não têm grande importância porque não possuem opinião nem análise.” Fritz considera justo que os jornais cobrem pelo uso de suas fotos e outros recursos para os quais despendem altas somas. “Usálos de graça mataria a galinha dos ovos de ouro. E quem produziria conteúdo a partir de então?”. É por isso que volta e meia Fritz compra fotos de jornais para estampar em seu próprio jornal, o Montbläat. Há cinco anos o jornal digital Montbläat é feito inteiramente em um sistema de voluntariado e confirma que os nichos de informação continuarão aumentando. Seus assinantes são geralmente da terceira idade, 96% deles com educação superior e mais de 60% com pós-graduação. “É um público altamente segmentado que quer se informar e discutir temas”, descreve Fritz. Semanalmente, ele é enviado de um modo que o jornalista considera arcaico e ao mesmo tempo moderno: uma newsletter é disparada para os assinantes, que, mediante um clique, são direcionados para o conteúdo. Outra iniciativa recente de Fritz é voltada para o público jovem. A fim de conquistar leitores para uma revista cultural da Secretaria de Cultura do Rio, ele contratou um profissional na faixa dos 20 anos. “Resolvi o problema: ele traduz as mensagens para a linguagem adequada ao Twitter.” Fritz se mostra otimista em relação aos investimentos feitos em comunicação. Para o jornalista, a euforia despertada pela web, em seus estágios iniciais, já passou. Ele se recorda de um episódio do ano 2000, quando trabalhava no Jornal do Brasil: “uma colega falou que iria trabalhar em um portal e eu não tinha noção do que era isso. Eu estranhava a sobrevivência de um sistema que não cobrava, não tinha propaganda e pagava salários altíssimos aos profissionais. E estava certo: o negócio explodiu e ficou um campo cheio de cadáveres. Só sobreviveram os que estavam ligados a outros negócios.” Atualmente, mal conseguimos nos organizar diante da web 2.0 e já se fala na web 3.0, ca-


paz de organizar a confusão digital e as informações de nossos dias. Fritz é um dos que apostam que em um futuro próximo teremos realmente buscas capazes de entender o que estamos procurando. “Desde quando o Google foi ao ar, conseguimos achar as coisas facilmente. Logo alguns sistemas vão se aperfeiçoar e poderemos conversar com eles com uma linguagem coloquial: ‘explique melhor isso’ ou ‘cadê a informação sobre isso?’. Vamos saber exatamente o que queremos e, ao longo do processo, desdobrar a informação. Não consigo ver aonde vamos parar porque o céu é o limite.”

Cultura digital para todos No cenário em que o jornal impresso tende a desaparecer, o livro é, na opinião de Fritz, um caso à parte. “Ele tem um outro significado, por isso continuará existindo.” O jornalista explica que, nos Estados Unidos e na Europa, cada título é lançado em duas edições. Primeiro, aquela que os americanos chamam de ‘hard cover’, edição de luxo, com apuro estético e tiragem limitada. Depois, em ‘pocket book’, o chamado livro de bolso. “O livro de arte – uma bela edição do Dom Quixote com ilustrações de Gustave Doré, por exemplo – nunca será substituído porque é um objeto de desejo. Quanto ao livro comum, não há razão para comprálo quando se pode ter uma biblioteca com 30 mil títulos com o tamanho e o peso de um livro de bolso.” Se para o consumidor o acesso a e-books, livros digitais, significa praticidade e economia, para os autores isso pode ser um bom negócio. A divisão de lucros que se faz hoje – 50% para a editora, 40% para a gráfica e 10% para quem escreve – mudará com a supressão da editora e da gráfica. Fritz aponta que o mesmo está acontecendo com o cinema: o celuloide está sendo substituído pelo meio digital, abrindo a possibilidade de distribuir filmes para o mundo inteiro ao mesmo tempo. (Leia mais sobre cultura digital e cinema no Pingue-pongue com Silvio Tendler) Além dos efeitos na grande imprensa, que outros setores seriam impactados pelo papel digital? A convergência total dos meios de comunicação marcaria o fim não apenas do papel convencional,

mas da maior parte das plataformas físicas: do DVD, do cartão de memória etc. “Você vai comprar um pacote com muitos terabytes de informação e pagar uma quantia irrisória por cada conteúdo que consumir. A comunicação é o grande negócio do século XXI”, afirma Fritz. E essa realidade está mais próxima do que se pensa. “Os softwares e hardwares que vão existir daqui a dez anos estão sendo produzidos nos laboratórios, hoje.” Contudo, a popularização do papel digital poderá ser instantânea ou retardada, dependendo da viabilidade econômica. Fritz lembra o lançamento das televisões de plasma, que chegaram a custar R$ 60 mil e agora são compradas por R$1,2 mil. “É preciso que a tecnologia seja confiável, tenha boa qualidade e custe barato para ser generalizada. Isso é uma questão de tempo”, conclui. Fritz reflete também sobre o mercado da comunicação. Se, de um lado, a tecnologia propicia uma produção cada vez mais veloz do conhecimento – que deve abrir novas oportunidades profissionais que mal conseguimos antever – de outro, como assimilar tanto conhecimento? “Não há como ser aquele grande humanista, conhecedor e intelectual que existiu no Renascimento e até no século XIX. Porque o volume de informações que ele recebia em uma vida inteira hoje é recebida em um dia, apesar de a capacidade humana de processar informação não ter mudado.

Ninguém é capaz de ler um livro de dez mil páginas em dez minutos, nem escrever um texto de cem laudas nesse prazo”, afirma.

Registros do amanhã Fritz levanta outra importante questão da era digital: como preservar toda a memória do conhecimento que estamos gerando? “Nunca tivemos um sistema tão vasto para colecionar ou para guardar memória, mas, ao mesmo tempo, tão frágil”, observa. Aos riscos comuns, ele acrescenta que uma enorme tempestade solar, uma supernova ou mesmo a explosão de uma bomba atômica podem apagar toda a informação digital armazenada. Sem perder o bom humor, o jornalista lembra que não há mais espaço nas paredes dos templos para toda a informação que conseguimos produzir até hoje, e alerta: “Se não for criada logo uma tecnologia de armazenamento imune a vírus e pulsos magnéticos, não sei o que será”.

‘O livro tem outro significado, por isso continuará a existir’

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Pingue-pongue com Silvio Tendler

2020 pelas lentes de um cineasta

Imaginar um cenário de futuro é um desafio para o cineasta Silvio Tendler: “Graças a Deus, sou documentarista. Só trabalho com o passado!”, brinca o diretor de Utopia e Barbárie, longametragem que resultou de uma pesquisa de 19 anos. Mas como ele diz que “trabalhar com o passado é construir o futuro”, convidamos o diretor de Jango e Anos JK, professor de Comunicação Social da PUC-Rio e Conselheiro do Nós da Comunicação, a refletir sobre comunicação e cultura em 2020 Comunicação 360º – Estamos cada vez mais conectados. Parece que nunca nos comunicamos tanto. Como vê esse movimento? Silvio Tendler – É como relação sexual de porco espinho: não sei se é bom ou se dói. Nunca tivemos tanta tecnologia e tantos mecanismos de comunicação e nunca a mídia foi tão controlada quanto agora. Então, temos dois lados: um extremamente positivo, que é o da fácil circulação de ideias, e, ao mesmo tempo, um controle totalmente esquizofrênico do que deve ou não acontecer. Ao mesmo tempo em que a rede difunde as ideias com uma rapidez nunca vista, algumas permanecem enclausuradas. Comunicação 360º – As redes sociais possibilitaram uma comunicação mais intensa, porém também mais fragmentada. Isso preocupa você? S. T. – Completamente. O mundo todo está fragmentado. E o pior é que não só a comunicação, mas essencialmente a política. Hoje, não vemos frentes atuando de maneira coordenada contra problemas concretos. O que existe é uma política multifacetada em que cada grupo expressa seu ponto de vista e sua luta. Comunicação 360º – Você faz parte de redes sociais? S. T. – Eu tenho Facebook e Orkut, mas não entro muito, não. Acho tudo muito chato. Vivemos numa sociedade absolutamen-

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te exibicionista. Se houvesse Facebook e Orkut na época da ditadura, não precisaria de SNI nem de tortura. Você sabe quem é quem pela internet. Quando compro uma encrenca na rede, a primeira coisa que faço é entrar no Google e ver quem é o meu inimigo. Por outro lado, as novas tecnologias têm dominado ‘cenas’ fantásticas. De um modo geral, não tenho nada contras elas. Comunicação 360º – Como imagina a comunicação em 2020? S. T. – Vejo a comunicação em 2020 muito problemática no que diz respeito aos direitos autorais. Esse é um território onde há uma batalha campal entre as grandes empresas, querendo se apropriar até dos bens coletivos e transformando tudo em lucro, e uma juventude rebelde, que quer romper com as fronteiras e lutar pela inexistência dos direitos autorais. Nessa batalha, temos de navegar e decidir o que será a criação futura. Comunicação 360º – Quais seriam os maiores desafios para o comunicador em 2020? S. T. – Você quer um cenário negativo ou positivo? Acho que a população vai ser muito maior e vamos enfrentar sérios problemas com os bens naturais, como água, luz e gás. Como construir um mundo de felicidade e abundância com a população crescendo muito e uma concentração de renda cada vez maior? Eu não sou um socialista otimista. Acho que estamos construindo um mundo de muito egoísmo, no qual os ricos serão muito ricos e os pobres, muitos pobres. Então, a comunicação vai ser usada como um forte elemento de controle social. Comunicação 360º – E a internet em 2020? S. T. – Eu acho que hoje já é possível a existência de uma certa democracia eletrônica. O exemplo recente do Ficha Limpa [movimento contra a candidatura de políticos com pendências judiciais], envolvendo 4 milhões de cidadãos, é significativo. Imagina reunir tantas assinaturas em tão pouco tempo sem a internet? As coisas ruins e boas dependem da leitura que você faz delas. Por exemplo, o fato de meu filme estar disponível na internet é ruim para a minha produtora, mas, para mim, como artista

que está ganhando visibilidade, é bom. O olhar do menino da periferia é outro: ele fica radiante por baixar o filme na internet: primeiro pelo lado transgressor da coisa, segundo pela acessibilidade. Comunicação 360º – Como você imagina o cinema daqui a dez anos? S. T. – Um dos desafios é o fato de as novas tecnologias estarem se tornando corriqueiras. Hoje, as salas de cinema 3D são um sucesso, mas quando as pessoas tiverem o 3D em casa, como vai ser? Daqui a dez anos, a interatividade será uma realidade. Acredito que o final do filme poderá ser modificado. Além disso, vamos precisar aperfeiçoar cada vez mais o som, por conta do hometheater. Acredito também que o cinema terá cheiro. Mas como vamos conseguir, num espetáculo de massas, glamourizar o mau cheiro? Tenho um amigo que diz que não existirão filmes de guerra enquanto não houver cheiro de cinema, pois a guerra tem um cheiro muito característico. Mas será que as pessoas vão suportar? Será que precisaremos glamourizar isso, como fazemos com a fotografia hoje? São esses desafios que teremos de enfrentar. Comunicação 360º – Acredita que, até lá, as pessoas vão deixar de ir ao cinema? S. T. – Acredito que não. O cinema tem todo um ritual: você se arruma, compra pipoca. O pulsar coletivo é mágico. Os filmes nunca se remuneraram tão mal e as salas nunca estiveram tão cheias como agora. Eu acho que o cinema, enquanto espetáculo, não vai acabar. Ele está mudando de categoria. Mas você está perguntando sobre daqui a dez anos e hoje em dia isso é muito. Somos incapazes de prever hoje o mundo daqui a seis meses. Eu não sei em que grau de neurose estaremos daqui a dez anos, se o consumo da publicidade, por exemplo, será algo absolutamente corriqueiro. No futuro, os filmes não vão se pagar na sala de cinema. Eles vão chegar às salas praticamente pagos ou por um esquema brutal de merchandising incorporado à obra ou pela presença forte do patrocinador. Dificilmente, no futuro, você vai pagar um filme pela bilheteria.

Mais em Nós da Comunicação Entrevistas: Silvio Tendler: ‘Nunca tivemos tantos mecanismos de comunicação e nunca a mídia foi tão controlada’ http://bit.ly/dvbBIZ



cronica


2020,

manha de dezembro

Eliane Levy de Souza

Dezembro de 2020, quase 2021. Acordo com a sensação de ter feito uma longa viagem. Sonhei com 2010 e a impressão é de que visitei outro mundo, tamanha a distância entre a realidade de hoje e a de uma década atrás. Imagine: faz apenas dez anos que a sustentabilidade se impôs como uma condição de sobrevivência. O desmatamento grassava em dimensões amazônicas, os artefatos tecnológicos eram concebidos à margem da responsabilidade ambiental e as empresas precisavam lançar mão dos ‘créditos de carbono’ – certificados conferidos às instituições que conseguiam reduzir a emissão de gases do efeito estufa – para tentar compensar os impactos ambientais que causavam. Rio sozinha diante da cafeteira wireless ao me lembrar que, mesmo pensando de forma sustentável no âmbito profissional, cultivávamos hábitos insustentáveis na vida pessoal. A cada ida ao mercado, carregávamos mais alguns sacos plásticos para casa. Comprávamos roupas demais, a cada estação, a ponto de desejarmos ter um closet, um quarto apenas para elas. E nós, mulheres, ainda pintávamos as unhas – ou seja, usávamos esmalte no próprio corpo. Chegamos a tingir as unhas de verde, azul e lilás, provavelmente influenciadas pelo filme Avatar. Felizmente, a indústria cosmética evoluiu o suficiente para tornar nossa vaidade saudável. A tecnologia proliferava em progressão estratosférica. Ingressei na cyberesfera com o encantamento de quem vai ao planetário pela primeira vez. E rendi-me a uma rede de relacionamento, o Twitter, a única que me pareceu ser, de fato, uma rede de comunicação a serviço da inteligência. Com a vantagem de restringir as mensagens a até 140 caracteres – um luxo! Amava esse exercício de síntese. Em uma delas, gastei menos da metade do espaço para pedir: ‘Desculpe, preciso do livro de filosofia que lhe emprestei’. Ainda havia operadores em serviços hoje totalmente automatizados. Mas seu treinamento lhes garantia menos recursos para dialogar com o interlocutor que o repertório de inputs/outputs com que nossos robôs são programados para desempenhar, hoje, a mesma função. Mais espantosa ainda era a existência de ouvidorias em todas as empresas públicas e privadas que se prezassem. Funcionavam como uma instância final a que se recorria, em total desespero, para tentar solucionar problemas quase sempre simples, que nenhum outro setor resolvia. Como não podia deixar de ser, a comunicação corporativa passou a acumular essa função. De repente, sou assombrada por palavras de ordem do mundo corporativo de 2010: missão, valores, ética. Era uma época em que a comunicação se prendia basicamente à forma, como um discurso a reforçar o óbvio, revestido de conceitos como ‘alinhamento de processos’ ‘gestão por competências’, ‘boas práticas’ e ‘melhoria contínua’... Bem diferente da comunicação que exercemos em nossos dias. Uma comunicação humanista, que ouve mais do que fala. Tácita, implícita em qualquer conteúdo produzido por qualquer empresa sustentável. Nem faz tanto tempo assim, mas tremo ao me dar conta de que, em 2010, vaticinava-se o fim das mídias não virtuais. Corro em direção à porta e volto a respirar ao encontrar, repousando sobre o taPETinho da entrada, o meu jornal diário. Eliane Levy de Souza é jornalista, formada em Comunicação Social pela PUC- Rio, com pós-graduação em Significação pela Escola de Comunicação da UFRJ. Atualmente, é diretora do Núcleo Editorial da Casa do Cliente Comunicação 360º e conselheira do Nós da Comunicação 53 comunicação


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• Charges • Cartuns • Caricaturas • Ilustrações • Esculturas • Palestras • Retratos espirituais • Brindes


Sustentabilidade

Desafios

•relações de trabalho flexíveis (p.44)

•reforçar o planejamento (p. 28, 37)

•rede de cooperação (p. 35)

•universidade ensina a buscar a informação (p. 44)

•simplicidade (p. 31)

(p. 13)

•ressignificar o uso das mídias

•redes de comunicação horizontais (p. 23)

(p. 31)

•vida pública X privada

•velocidade incomensurável da informação (p. 48)

•relação saber/poder (p. 23)

•pulverização (p. 29)

•proliferação de veículos (p. 41, 47)

•midiocracia (p. 13)

•jornalismo colaborativo (p. 47)

•jornalismo cidadão (p. 13)

Quais são os principais cenários e desafios da Comunicação na próxima década?

•quarto bottom line (p. 39)

•parcerias multissetoriais (p. 36)

•olhar holístico (p. 14, 27)

•networking como governança (p. 37)

•mapear stakeholders (p. 38)

•liderança horizontal (p. 27)

(p. 48, 50)

•redefinição dos parâmetros de direito autoral

(p. 49)

•preservar a memória do conhecimento

•informação superficial X opinião e análise (p. 48)

2020

•liderança educadora (p. 27)

•gestão horizontal (p. 30)

•gestão baseada na escassez de recursos (p. 27)

•recursos intangíveis (p. 17)

•mundo programável (p. 21)

•investimento em educação (p. 45)

•exibicionismo (p. 50)

•interação redação-público (p. 47, 48)

•individual X coletivo

(p. 39)

•convergência de mídias (p. 47)

•controle da mídia (p. 50)

•conteúdo pago X gratuito (p. 48)

•consumo autoral (p. 13)

•fatos do pontode vista do leitor (p. 47)

•convergência transdisciplinar (p. 17)

•comunicação para facilitar escolhas (p. 18)

(p. 50)

•energia/impacto climático (p. 37, 50)

•diversidade de pensamentos (p. 39)

•discurso X prática (p. 14)

•crise de valores (p. 11)

Credibilidade da informação •comunicação consciente (p. 43)

•comunicação fragmentada

•capitalismo cognitivo (p. 23)

Um guia para

•escrever software (p. 21)

•equilíbrio pessoal/profissional (p. 32)

•engajamento de stakeholders (p. 35)

•educação de qualidade (p. 45)

•economia criativa (p. 17)

•ecologia sociocultural (p. 18)

•divulgação de informações-chave (p. 39)

•corporação benéfica (p. 39)

•comunicação consciente (p. 43)

•busca semântica (p. 48)

Desafios

•crescimento/ envelhecimento da população (p. 37, 50)

41%

•comunicação aberta (p. 14)

•crescimento da classe C (p. 40)

Cenários

•codesenhar soluções (p. 37)

•atitudes humanistas no ambiente de trabalho (p. 14)

•crescente urbanização (p. 37)

Cenários

•aprender com o outro (p. 36)

Em uma enquete do Nós da Comunicação, elencamos sete macro-

questões, classificadas por percentual de relevância e comentadas

pelos leitores. Com base nesses dados, relacionamos cenários e de-

safios apontados pelos especialistas que ouvimos. Como resultado,

obtivemos um índice de reflexões. Em poucas linhas e de forma

despretensiosa, traçamos, assim, uma agenda para a

Comunicação 2020.

Diante das muitas questões que a nova década nos reserva, essa agenda permanece em aberto. Mas

pode ser um ponto de partida para uma comu-

valores humanistas e princípios benéficos

nicação mais consciente, sustentável, baseada em

Vanessa Aguiar

15%


•tryvertising (p. 40)

•transformar conhecimento implícito em explícito (p. 17)

•trabalhar as ciências da cognição/neurociência (p. 46)

•ser sujeito (e não objeto)do futuro (p. 17)

•relações de trabalho flexíveis (p.44)

•reforçar planejamento (p. 28, 37)

•redefinição de conceito da propriedade intelectual (p. 23)

•projetar futuros desejáveis (p. 17)

•produtos responsáveis (p. 38)

•processo: novo jeito de pensar e fazer (p. 18)

•ótica sustentável (p. 12)

•telepresença (p. 20)

•redes sociais construtivas e pautadas em serviços (p. 13)

•recuperação da consciência (p. 12)

•promover diálogo (p. 12)

•promoção de conectividade (p. 12)

•programas de compensação educacional e social (p. 18)

•logística e segurança (p. 22)

•investimento e transformação da educação (p. 45)

•internet móvel (p. 19)

•internet como serviço básico (p. 19)

•internet como ambiente de inovação e negócios (p. 18)

•era da transparência (p. 12)

•democracia eletrônica (p. 50)

•computação pervasiva (p. 22)

•busca semântica (p. 48)

•barateamento da tecnologia (p. 49)

(p. 20)

•oxigenação da mídia (p. 13)

•o custo dos que ficam à margem da tecnologia (p. 18)

•o ciberespaço é o espaço

•midiocracia (p. 13)

•hibridização de pessoas com máquinas (p. 22)

•diversidade (p. 19)

•diferentes usos da tecnologia (p. 29)

•usuários com protagonistas das redes comunicativas (p. 23)

•tribalistas digitais (p. 13)

•ruptura tecnológica (p. 11)

•‘programabilidade’, modularização, geolocalização (p. 20)

digital/social •ampliar acesso da 3ª idade (p. 33)

•ausência de intermediários (p. 12) •comunismo cibernético (p. 23)

Inclusão

•melhorar ambiente de trabalho (p. 31)

•mapear stakeholders (p. 38)

•liderança visionária (p. 32)

•investir em motivação (p. 17)

•investimento em educação (p. 45)

•integração entre governo e setores de negócios (p. 18)

•intraempreendedorismo (p. 27)

•profissionais e empresas como modens (p.18)

•pluralidade (p. 31)

•organização em redes e coletivos (p. 17)

•mix de gerações (p. 28, 31, 32)

•capital social (p. 10)

Desafios

•inovação social e de processos (p. 12)

•gestão de liderança (p. 28)

•foco na execução (p. 41)

•estreitar a distância empresa-cliente (p. 28)

Inovação •capital intelectual (p. 45)

14%

•engajamento dos stakeholders (p. 9)

•design de ideias (p. 12)

Cenários

•criar uma nova história (p. 12)

•cooperação (p. 18)

Desafio

•conhecimento transdisciplinar (p. 21,44)

•colaboração para criar memória comum (p. 20)

•‘codesenhar’ soluções (p. 37)

•aprender a aprender (p. 21, 27)

•acolher ideias (p. 13)

Cenários

11%


1%

Desafios

•parcerias em diferentes regiões do globo (p. 37)

(p. 12)

Cenários

•surgimento de mercados emergentes (p. 37)

(p. 43)

•retorno imediato aos stakeholders

•relações de trabalho mais flexíveis (p.44)

•recuperar e ampliar o sentido, a intensidade (p. 18)

•flexibilidade (p. 32)

•velocidade do processamento e distribuição da informação (p. 48)

(p. 43)

•retorno imediato aos stakeholders

•responder e entregar (p. 37)

•publicidade da verdade (p. 14)

•monitoramento permanente das redes (p. 29)

•medição de impacto X medição de resultado (p. 17)

(p. 38)

•mapear stakeholders

(p. 29)

•gerenciamento de múltiplos canais de comunicação

(p. 39)

•comunicadores como consultores

•comunicação consciente (p. 43)

•tecnologia imprime agilidade às relações (p. 32)

•tempo como único recurso não renovável (p. 18)

•coerência (p. 32)

•nowismo (p. 40)

•atração/retenção de talentos (p.17, 33)

•antecipar focos de conflitos (p. 29)

Reputação

•vigilância da sociedade (p. 14)

•poder do cidadão (p. 14)

•interconexão (p. 29)

•empresas mais expostas (p. 29)

•crise de confiança (p. 14)

•colaborador conectado (p. 39)

Cenários

•diversidade cultural (p. 13)

Globalização

•olhar para o pequeno, o micro

Desafios

•atividade localizada (p. 13)

Timing •dificuldade de locomoção nos grandes centros urbanos (p. 44)

Desafios

•capacidade de adaptação (p. 32)

Cenários •demandas cada vez mais exigentes e urgentes (p. 40)

10%

8%


crianças têm paixão pela química Fazer com que as próximas gerações se interessem por química é importante para o futuro da humanidade. Por isso, nós desenvolvemos o programa ReAção no Brasil, no qual as crianças podem aprender ciências de forma prática e divertida. Estudantes e tubos de ensaio finalmente se dando bem? Na BASF, nós transformamos a química. www.basf.com/chemistry



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