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Attachments Copyright © 2011 by Rainbow Rowell Copyright © 2014 by Novo Século Editora Ltda. All rights reserved. Published by agreement with the Author c/o The Lotts Agency, Ltd.
coordenação editorial assistente editorial tradução preparação diagramação revisão adaptação de capa
Renata de Mello do Vale Vitor Donofrio Márcia Men Marília Pagliaro Project Nine Equipe Novo Século Equipe Novo Século
Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo nº 54, de 1995) Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Rowell, Rainbow Anexos Rainbow Rowell; [tradução Márcia Men]. Barueri, SP: Novo Século Editora, 2014. Título original: Attachments. 1. Ficção norte-americana I. Título. 14-11645 CDD-813 Índices para catálogo sistemático: 1. Ficção: Literatura norte-americana 813 2014 IMPRESSO NO BRASIL PRINTED IN BRAZIL DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À NOVO SÉCULO EDITORA LTDA. CEA – Centro Empresarial Araguaia II Alameda Araguaia 2190 – 11º Andar Bloco A – Conjunto 1111 CEP 06455-000 – Alphaville Industrial, Barueri – SP Tel. (11) 3699-7107 – Fax (11) 3699-7323 www.novoseculo.com.br atendimento@novoseculo.com.br
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CAPÍTULO 1 De: Jennifer Scribner-Snyder Para: Beth Fremont Enviado: Qua, 18/08/1999 09h06 Assunto: Cadê você? Ia te matar chegar antes do meio-dia? Estou aqui sentada entre os cacos que restam da minha vida, e você… se eu te conheço, você acabou de acordar. Está, provavelmente, comendo aveia e assistindo a Sally Jessy Raphael. Me mande um e-mail quando chegar, antes de fazer qualquer outra coisa. Nem leia os quadrinhos. <<Beth para Jennifer>> Certo, estou encaixando você antes dos quadrinhos, mas seja rápida. Tenho discutido com o Derek sobre o fato de For Better or For Worse se passar no Canadá ou não, e hoje pode ser o dia em que eles vão provar que eu estou certa. <<Jennifer para Beth>> Acho que estou grávida. <<Beth para Jennifer>> O quê? Por que você acha que está grávida? <<Jennifer para Beth>> Eu tomei três drinques sábado passado.
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<<Beth para Jennifer>> Acho que precisamos ter uma conversinha sobre a cegonha. Não é exatamente assim que isso acontece. <<Jennifer para Beth>> Sempre que eu bebo demais, começo a me sentir grávida. Acho que é porque eu nunca bebo, e, para mim, é óbvio que na única vez em que resolvo me soltar, fico grávida. Três horas de fraqueza, e agora vou passar o resto da minha vida lutando com as necessidades especiais de um alcoólatra fetal. <<Beth para Jennifer>> Acho que não é assim que os chamam. <<Jennifer para Beth>> Os olhinhos dele vão ser separados demais, e todo mundo vai olhar para mim no mercado e murmurar: “Olha aquela bêbada horrível. Não conseguiu largar sua Zima nem por nove meses. Trágico”. <<Beth para Jennifer>> Você bebe Zima? <<Jennifer para Beth>> É bem refrescante, de verdade. <<Beth para Jennifer>> Você não está grávida. <<Jennifer para Beth>> Estou, sim. Normalmente, dois dias antes da minha menstruação, meu rosto enche de espinhas e eu tenho cólicas “pré-colicais”. Mas minha pele está mais lisa que bumbum de bebê. E, em vez de cólicas, estou sentindo uma coisa estranha na região do útero. Quase uma presença. <<Beth para Jennifer>> Eu te desafio a ligar para o Pergunte à Enfermeira e dizer que você sente uma presença na região do útero. <<Jennifer para Beth>> Fato: este não é meu primeiro susto com gravidez. Reconheço que achar que estou grávida é praticamente parte do meu regime pré-menstrual mensal. Mas estou te dizendo, isso é diferente. Eu me sinto diferente. É como se meu corpo me dissesse: “Começou”.
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Não consigo parar de me preocupar com o que vem depois. Primeiro, eu fico enjoada. Aí, fico gorda. E daí eu morro de um aneurisma na sala de parto. <<Beth para Jennifer>> OU… daí você dá à luz uma linda criança. (Viu como você me enrolou para embarcar na sua viagem de gravidez fictícia?) <<Jennifer para Beth>> OU… daí eu dou à luz uma linda criança, que eu nunca verei porque ela vai passar todas as horas em que estiver acordada em uma creche com alguma escrava ganhando salário mínimo, que ela então vai pensar que é a sua mãe. Mitch e eu tentamos jantar juntos depois que o bebê foi para a cama, mas estamos ambos exaustos o tempo todo. Eu começo a cochilar enquanto ele me conta sobre o seu dia; ele fica aliviado, porque não estava a fim de falar mesmo. Ele come seu pão com carne moída em silêncio e pensa na nova (e jeitosa) professora de economia doméstica do colégio. Ela usa sapatos de salto alto pretos, meia-calça nude e saia de rayon que sobe pelas coxas sempre que ela se senta. <<Beth para Jennifer>> O que Mitch acha? (Sobre a Presença no seu útero, não sobre a nova professora de economia doméstica.) <<Jennifer para Beth>> Ele acha que eu devia fazer um teste de gravidez. <<Beth para Jennifer>> Um bom homem. Talvez um cara de bom senso como Mitch estivesse melhor com aquela professora de economia doméstica. (Ela jamais faria pão com carne moída para o jantar.) Mas acho que ele está preso a você, principalmente agora, com uma criança com necessidades especiais a caminho.
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CAPÍTULO 2 – Lincoln, você está com uma aparência terrível. – Obrigado, mãe. Ele teria que aceitar a opinião dela. Não tinha se olhado no espelho hoje. Nem ontem. Lincoln esfregou os olhos e passou os dedos pelo cabelo, tentando abaixá-lo… ou talvez apenas tentando dar uma ajeitada. Talvez devesse tê-lo penteado quando saiu do chuveiro na noite anterior. – Sério, olhe para você. E olhe para o relógio. Já é meio-dia. Você acabou de acordar? – Mãe, eu só saio do trabalho à uma da manhã. Ela franziu o cenho, depois lhe entregou uma colher como se esta fosse a melhor opção para ele. – Aqui – disse ela –, mexa esse feijão. – Ela ligou a batedeira e meio que gritou por cima do barulho. – Eu ainda não entendo o que você faz naquele lugar que não pode ser feito à luz do dia. Não, docinho, não desse jeito, você está só fazendo carinho nele. Mexa com vontade. Lincoln mexeu com mais força. A cozinha toda cheirava a presunto, cebola e mais alguma coisa, algo doce. Seu estômago estava roncando. – Eu já falei – disse ele, tentando ser ouvido –, alguém tem que ficar por lá. Caso haja um problema nos computadores, e… eu não sei… – O que é que você não sabe? – Ela desligou a batedeira e olhou para ele.
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– Acho que talvez eles queiram que eu trabalhe à noite para que eu não me aproxime de mais ninguém. – O quê? – Bem, se eu chegar a conhecer as pessoas – disse ele –, talvez eu possa… – Mexa. Fale, mas mexa. – Se eu começar a conhecer as pessoas – continuou ele, mexendo –, talvez não me sinta tão imparcial quando estiver impondo as regras. – Ainda não gosto do fato de você ler a correspondência dos outros. Especialmente à noite, em um prédio vazio. Isso não devia ser o serviço de ninguém. – Ela experimentou o que estava batendo com a ponta do dedo, depois ofereceu a tigela para ele. – Aqui, prove isso… Em que tipo de mundo nós vivemos, para isso virar uma carreira? Ele passou o dedo pela borda da tigela e experimentou. Cobertura. – Pode me passar o melado? Ele assentiu. – O prédio não fica completamente vazio – disse ele. – Tem gente trabalhando na redação. – Você conversa com eles? – Não. Mas eu leio seus e-mails. – Não está certo. Como as pessoas podem se expressar num lugar assim, sabendo que alguém está vigiando seus pensamentos? – Eu não estou nos pensamentos deles. Estou nos computadores, que são da empresa. Todo mundo sabe que isso acontece… – Era desesperador tentar explicar. Ela nunca sequer tinha visto um e-mail. – Me dê essa colher – suspirou ela –, você vai estragar a tigela toda. Ele entregou a colher e se sentou à mesa da cozinha, perto de um prato de pão de milho quentinho. – Nós tivemos um carteiro uma vez – disse ela –, lembra? Que lia nossos cartões-postais? E ele sempre fazia comentários. “Estou vendo que a sua amiga está se divertindo na Carolina do Sul.” Ou: “Eu mesmo nunca estive no Monte Rushmore”. Todos eles deviam ler os cartões-postais, todos aqueles carteiros. O pessoal do correio. É um serviço repetitivo. Mas aquele quase se orgulhava disso. Parecia se gabar. Acho que ele contou aos vizinhos que eu assinava a revista Ms.
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– Não é desse jeito – disse Lincoln, esfregando os olhos de novo. – Eu só leio o suficiente para ver se eles estão quebrando alguma regra. Não é como se eu estivesse lendo os diários deles ou algo assim. A mãe não estava ouvindo. – Você está com fome? Parece estar. Para falar a verdade, você parece deficiente… Aqui, querido, me passe aquele prato. Ele se levantou e entregou-lhe um prato, e ela o segurou pelo pulso. – Lincoln… Qual o problema com as suas mãos? – Problema nenhum. – Olhe para os seus dedos, eles estão cinza! – É tinta. – O quê? – Tinta. Quando Lincoln trabalhava no McDonald’s na época do colégio, o óleo de fritura se entranhava em tudo. Quando ele chegava em casa à noite, tinha no corpo inteiro a sensação que se tem nas mãos quando a gente acaba de comer batatas fritas. O óleo penetrava na pele e nos cabelos. No dia seguinte, ele suava esse óleo nas roupas que usava na escola. No The Courier, era tinta. Uma camada cinzenta cobria tudo, não importando o quanto alguém limpasse. Uma mancha cinza cobria as paredes texturizadas e os azulejos acústicos do teto. Os revisores do turno da noite manuseavam os jornais, cada edição, quentinhos, diretamente do prelo. Eles deixavam impressões digitais cinza em seus teclados e mesas. Para Lincoln, eles pareciam toupeiras. Gente séria, com óculos espessos e pele acinzentada. Mas isso podia ser pela iluminação, pensava ele. Talvez não os reconhecesse à luz do sol. Em cores vivas. Eles com certeza não o reconheceriam. Lincoln passava a maior parte de seu tempo no departamento de Tecnologia da Informação, no andar inferior. Cinco anos e duas dúzias de lâmpadas fluorescentes antes, ali havia sido uma câmara escura, e com todas as luzes e os servidores, era como estar sentado dentro de uma enxaqueca. Lincoln gostava de ser chamado até a redação para reiniciar uma máquina ou dar jeito em uma impressora. A redação era ampla e aberta,
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com uma longa parede de janelas, e nunca ficava completamente deserta. Os editores do turno da noite trabalhavam até tão tarde quanto ele. Eles se sentavam num amontoado em uma das pontas da sala, sob uma fileira de televisores. Havia duas que se sentavam juntas, perto da impressora, que eram jovens e bonitas. (Sim, Lincoln havia se decidido, era possível ser bonito e parecer uma toupeira ao mesmo tempo.) Ele imaginava se as pessoas que trabalhavam à noite saíam em encontros durante o dia.
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