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Rainbow Rowell

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São Paulo, 2015

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Landline Copyright © 2014 by Rainbow Rowell Copyright © 2015 by Novo Século Editora Ltda. All rights reserved. Published by agreement with the Author c/o The Lotts Agency, Ltd.

coordenação editorial assistente editorial tradução preparação diagramação revisão adaptação de capa

Renata de Mello do Vale Vitor Donofrio Caio Pereira Márcia Men Project Nine Equipe Novo Século Equipe Novo Século

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo nº 54, de 1995) Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Rowell, Rainbow Ligações Rainbow Rowell; [tradução Caio Pereira]. Barueri, SP: Novo Século Editora, 2015. Título original: Landline. 1. Ficção norte-americana I. Título. 14-11662 CDD-813 Índice para catálogo sistemático: 1. Ficção: Literatura norte-americana 813 2015 IMPRESSO NO BRASIL PRINTED IN BRAZIL DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À NOVO SÉCULO EDITORA LTDA. CEA – Centro Empresarial Araguaia II Alameda Araguaia, 2190 – 11º Andar Bloco A – Conjunto 1111 CEP 06455-000 – Alphaville Industrial, Barueri – SP Tel. (11) 3699-7107 – Fax (11) 3699-7323 www.novoseculo.com.br atendimento@novoseculo.com.br

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Este livro ĂŠ para Kai. (Assim como tudo que o importa.)

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Cap

Georgie entrou na garagem, desviando para não acertar uma bicicleta. Neal nunca mandava Alice guardá-la. Pelo visto, ninguém nunca roubava bicicletas em Nebraska – e ninguém nunca tentava invadir a casa das pessoas. Na maioria das noites, Neal nem trancava a porta antes que Georgie chegasse, embora ela dissesse a ele que isso era como pendurar um aviso dizendo favor assaltar à mão armada. – Não – ele dizia. – Isso seria diferente, eu acho. Ela arrastou a bicicleta até a varanda e abriu a porta (destrancada). As luzes estavam apagadas na sala, mas a TV continuava ligada. Alice adormecera no sofá, assistindo a desenhos da Pantera Cor-de-Rosa. Georgie foi desligar e tropeçou numa tigela de leite largada no chão. Havia uma pilha de roupa limpa dobrada em cima da mesa de centro – ela pegou uma peça qualquer para limpar a sujeira. Quando Neal apareceu na passagem entre a sala de estar e a de jantar, Georgie estava agachada no chão, limpando o leite derramado com uma calcinha sua. – Desculpa – ele disse. – A Alice quis colocar leite para a Noomi. – Tudo bem, eu que não prestei atenção. – Georgie levantou-se, amassando a calcinha molhada no punho. Ela apontou para Alice. – Ela está bem? Neal estendeu a mão e pegou a calcinha, depois recolheu a tigela.

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– Está sim. Eu disse que ela podia ficar te esperando. Teve toda uma negociação pra ela comer couve e parar de usar a palavra “literalmente”, porque estava literalmente me deixando louco. – Ele olhou para Georgie, a caminho da cozinha. – Tá com fome? – Tô – ela disse, seguindo-o. Neal estava bem-humorado naquela noite. Geralmente, quando Georgie chegava tarde assim… Bom, geralmente, quando Georgie chegava tarde assim, ele não estava. Ela se sentou no balcão e abriu espaço para os cotovelos, entre contas e livros da biblioteca e folhas de trabalho escolar. Neal foi até o fogão e acendeu uma das bocas. Estava de calças de pijama e camiseta branca, e parecia ter acabado de cortar o cabelo – provavelmente para a viagem. Se Georgie o tocasse na nuca, teria uma sensação de veludo num sentido e de agulhas no outro. – Não sabia direito o que você iria querer pôr na mala – ele disse. – Mas lavei tudo que tava no cesto. Não se esqueça que é bem frio lá. Você sempre esquece do frio. Ela sempre acabava pegando as blusas de Neal. Ele estava tão bem-humorado nessa noite… Sorria fazendo o prato dela. Refogado. Salmão. Couve. Outras verduras. Ele amassou um punhado de castanha de caju e espalhou por cima, depois pôs o prato na frente dela. Quando Neal sorria, suas covinhas pareciam parênteses – parênteses com barba. Georgie quis puxá-lo por cima do balcão e meter o nariz naquelas bochechas. (Era sua resposta padrão para o sorriso do Neal.) (Embora Neal provavelmente não soubesse.) – Acho que lavei todas as suas calças jeans… – ele disse, servindo uma taça de vinho. Georgie respirou fundo. Tinha que acabar logo com aquilo. – Recebi boas notícias hoje. Ele se encostou no balcão e ergueu uma sobrancelha. – Ah, é? – É. Então… Maher Jafari quer o nosso programa. – O que é Maher Jafari?

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– É o cara daquele canal com quem eu tenho conversado. Aquele que fez o The Lobby e aquele novo reality sobre fazendeiros de tabaco. – Ah, sim – Neal fez que sim. – O cara do canal. Pensei que ele estivesse te dando um gelo. – A gente também achou que ele estivesse – disse Georgie. – Pelo visto, ele é assim frio mesmo. – Hmm. Uau. Que notícia boa. Então… – Ele pendeu a cabeça para o lado. – Por que você não parece feliz? – Eu estou, estou superanimada – disse Georgie. Num guincho. Credo. Devia estar suando. – Ele quer um piloto, roteiros. Vai rolar uma reunião pra falar sobre o elenco… – Que ótimo – disse Neal, esperando. Sabia que ela não estava abrindo o jogo. Georgie fechou os olhos. – … no dia 27. A cozinha caiu em silêncio. Ela abriu os olhos. Ah, lá estava o Neal que ela conhecia e amava. (De verdade. As duas coisas.) Os braços cruzados, os olhos estreitos, os nós de músculo nos cantos do maxilar. – Vamos estar em Omaha no dia 27 – ele disse. – Eu sei. Neal, eu sei. – E aí? Tá pensando em voltar mais cedo pra L.A.? – Não, eu… a gente tem que preparar os roteiros antes disso. Seth achou… – Seth. – A gente só fez o piloto – disse Georgie. – A gente tem nove dias pra escrever quatro episódios e se preparar pra reunião. É uma sorte termos tempo livre do Jeff’d Up essa semana. – Vocês têm tempo livre porque é Natal. – Eu sei que é Natal, Neal. Não vou faltar no Natal. – Não? – Não. Só não vou… pra Omaha. Pensei que todos nós podíamos não ir pra Omaha. – Já temos as passagens. – Neal. É um piloto. Um contrato. Com o nosso canal dos sonhos.

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Georgie teve a sensação de estar recitando falas de um roteiro. Já tivera a mesma conversa, quase idêntica, naquela tarde, com Seth… – É Natal – ela argumentara. Estavam no escritório, e Seth estava sentado do lado dela na grande mesa que partilhavam. Ele a encurralara. – Fala sério, Georgie, a gente vai comemorar o Natal. Vamos ter o melhor Natal de todos depois dessa reunião. – Diga isso às minhas filhas. – Vou dizer. Suas filhas me adoram. – Seth, é Natal. Essa reunião não pode esperar? – Passamos nossa carreira inteira esperando. Tá acontecendo, Georgie. Agora. Finalmente acontecendo. Seth não parava de dizer o nome dela. Neal estava fulo da vida. – Minha mãe está esperando por nós – disse. – Eu sei – ela sussurrou. – E as crianças… Alice mandou um cartão pro Papai Noel avisando que estaria em outro endereço, pra que ele soubesse que ela vai estar em Omaha. Georgie tentou sorrir. Tentativa fracassada. – Acho que ele pode se virar. – Não é isso… – Neal enfiou o saca-rolhas numa gaveta, depois a fechou com raiva. Falou, bem mais grave: – Não é esse o ponto. – Eu sei. – Ela inclinou a cabeça sobre o prato. – Mas a gente pode ir ver a sua mãe no mês que vem. – E a Alice vai faltar na escola? – Se for preciso. Neal tinha as duas mãos sobre o balcão, retesando os músculos dos antebraços. Como se estivesse retroativamente se preparando para más notícias. A cabeça baixa, o cabelo caindo sobre a testa. – Essa pode ser a nossa chance – disse Georgie. – Nosso próprio programa. Neal fez que sim, sem erguer a cabeça. – Certo – disse. Sua voz soou suave e sem emoção. Georgie esperou.

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Às vezes ela se perdia quando discutia com Neal. A discussão passava para outra coisa – algo mais perigoso – e Georgie nem percebia. Às vezes Neal terminava a conversa ou a abandonava enquanto ela ainda estava tentando se explicar, e ela continuava argumentando muito tempo depois dele ter desistido. Georgie nem sabia se aquilo podia ser chamado de discussão. Ainda. Então ficou esperando. Neal pendeu a cabeça. – O que você quer dizer com “certo”? – ela perguntou, finalmente. Ele se afastou do balcão, braços estendidos e ombros retos. – Significa que você tem razão, claro. – Ele começou a limpar o fogão. – Você tem que ir a essa reunião. É importante. Ele disse isso quase que com leveza. Talvez tudo fosse ficar bem, no fim das contas. Talvez ele até ficasse animado por ela. Em algum momento. – Então – ela disse, testando a atmosfera entre os dois. – Vamos ver de ir visitar sua mãe mês que vem? Neal abriu a máquina de lavar louça e começou a juntar pratos. – Não. Georgie apertou os lábios, mordendo-os. – Não quer que a Alice falte à aula? Ele fez que não. Ela ficou olhando enquanto ele abastecia a máquina. – Nas férias, então? Ele fez um movimento curto com a cabeça, como se algo tivesse roçado sua orelha. Neal tinha orelhas lindas. Um pouco grandes demais, viradas no topo, feito asas. Georgie gostava de segurar a cabeça dele pelas orelhas. Quando ele deixava. Ela podia imaginar a cabeça dele em suas mãos agora. Sentir os dedões acariciando as pontas das orelhas, os nós dos dedos roçando o cabelo curto. – Não – ele repetiu, de pé, limpando as mãos nas calças do pijama. – A gente já comprou as passagens. – Neal, tô falando sério. Não posso faltar nessa reunião. – Eu sei – ele disse, virando-se para ela. O rosto sério. Congelado.

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Na época da faculdade, Neal pensara em alistar-se no exército; teria sido ótimo na parte de dar notícias terríveis ou executar uma ordem de partir o coração sem entregar quanto isso lhe custava. Com essa expressão, dava para pilotar o Enola Gay. – Não entendi – disse Georgie. – Elas podem comemorar o Natal com você quando voltarmos. Vão adorar. Comemorar duas vezes. Georgie não soube como reagir. Se pelo menos Neal estivesse sorrindo quando disse a última parte… Ele apontou para o prato dela. – Quer que eu esquente pra você? – Não precisa – ela disse. Ele assentiu com um gesto curto, depois passou por ela, inclinando-se apenas o suficiente para encostar os lábios em sua bochecha. Depois foi para a sala de estar e tirou Alice do sofá. Georgie pôde ouvi-lo falando com a filha antes de subir as escadas. – Pronto, filhinha. Tô aqui.

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