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O doce sabor da vinganรงa PAU L A
T OY N E T I
B E N A L I A
TALENTOS DA LITERATURA BRASILEIRA
S รฃo Pau l o , 2 0 1 6
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O doce sabor da vingança
Copyright © 2016 by Paula Toyneti Benalia Copyright © 2016 by Novo Século Editora Ltda.
coordenador editorial
editorial
Vitor Donofrio Cleber Vasconcelos
Giovanna Petrólio João Paulo Putini Nair Ferraz Rebeca Lacerda
preparação
revisão
Livia First
Ana Lúcia Neiva
diagramação
capa
Nair Ferraz
Marina Avila
aquisições
Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), em vigor desde 1o de janeiro de 2009. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip) Angélica Ilacqua CRB-8/7057 Benalia, Paula Toyneti O doce sabor da vingança / Paula Toyneti Benalia. Barueri, SP: Novo Século Editora, 2016. (coleção Talentos da literatura brasileira)
1. Ficção brasileira I. Título. 16‑0717
cdd‑869
Índice para catálogo sistemático: 1. Ficção: Literatura brasileira 869.3
novo século editora ltda. Alameda Araguaia, 2190 – Bloco A – 11o andar – Conjunto 1111 cep 06455‑000 – Alphaville Industrial, Barueri – sp – Brasil Tel.: (11) 3699‑7107 | Fax: (11) 3699‑7323 www.novoseculo.com.br | atendimento@novoseculo.com.br
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Para o dono dos meus maiores sorrisos, a luz do meu amanhecer e a fonte das minhas inspirações sobre o que é amar. Alison, meu marido e meu sentido infinito!
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"Existem momentos na vida da gente, em que as palavras perdem o sentido ou parecem inúteis e, por mais que a gente pense numa forma de empregá-las, elas parecem não servir. Então a gente não diz, apenas sente." – Sigmund Freud –
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PRÓLOGO Imagine aquele dia que deveria ser o mais perfeito da sua vida. Imaginou? Pois bem, eu esperava ansiosamente por esse momento. Como poderia o cara mais lindo do colégio, o melhor jogador de futebol da sala, o mais popular das festas e o personagem principal dos meus sonhos simplesmente ter percebido a minha existência? E, para completar, falou para minha amiga que estava querendo me beijar. Claro que isso tudo poderia ser perfeitamente normal se o objeto de desejo de Joe não fosse eu, Julie. Não há nada de anormal comigo. O destino só não foi muito generoso com alguns acontecimentos na minha vida. Nunca conheci meus pais. Eles acharam que não estavam preparados para a responsabilidade e resolveram sair mundo afora. Deixaram‑me com minha avó materna, Helena. Minha avó sempre lutou sozinha para que não me faltasse nada e priorizou a minha educação. Conseguiu uma bolsa de estudos em uma das melhores escolas de São Paulo. O único problema foi que ela nunca teve muito gosto para moda. Então dá para imaginar como eu sempre fui para
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a escola, não é? Vestidos de bolinha, saias de pregas, cores das mais variadas, estampas que iam de frutas a bichos. O cabelo, então… O mais moderno foi um rabo de cavalo, que poderia até ficar bom, se não estivesse do lado da cabeça em vez de estar atrás. Acrescente a isso uma garota tímida, de poucos amigos e que sempre se sentou na primeira carteira da sala. Quando a Meg me disse que ele estava interessado em mim, achei que ia morrer. Talvez eu até tivesse um par com quem dançar na formatura do colegial que seria dentro de algumas semanas. Meg é a única a quem confiei o meu maior segredo. Nunca vou esquecer a sua reação quando contei: – Meg, preciso lhe falar uma coisa, mas você tem que prometer não falar para ninguém, nunca, nem sob tortura. – Pode falar, Julie, eu prometo. – Olhe, é que eu… Nossa, tenho vergonha de lhe falar isso. Nunca beijei nenhum garoto… – falo tão baixo que acho que Meg não escutou, mas, pela sua expressão de choque, ela entendeu. – Meu Deus, como assim?! Nem um selinho, nada?! – Ela não estava muito impressionada com minha proeza. – Nada. Você sabe, nunca fui a favorita dos garotos. – Estava envergonhada de dizer isso. Abaixei a cabeça e esperei seu julgamento. – Olhe, é que eles não conseguem ver a garota especial que você é. Isso vai mudar, você vai ver. Até o baile isso vai mudar. – E, sem mais uma palavra, foi embora. Acredito nas palavras dela, Meg sempre está certa do que diz. Então, depois de duas semanas, ela traz a grande notícia:
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– Você não vai acreditar! Ontem estávamos em uma rodinha brincando de verdade ou desafio e Joe confessou que sempre teve vontade de beijá‑la! Meu Deus, Julie, você tem noção do que é isso? Ele quer ficar com você! – Meg estava muito empolgada, batia palmas e dava pulos de alegria. Eu fiquei sem reação, tentando entender como isso era possível. – Meg, eu… eu… – Não conseguia falar, nem respirar. Mas um sorriso, que não estampava meu rosto há muito tempo, apareceu. – Olhe, eu já combinei tudo com ele. Depois da aula, naquela pracinha da esquina, ele vai estar esperando por você. – Meg me abraçou. – Estou feliz por você, Julie! Não aguento de ansiedade e não consigo mais prestar atenção em nenhuma aula. Isso nunca acontece comigo. O sinal me tira dos devaneios. Quando a aula termina, saio e caminho devagar. Minha vontade era correr, mais seria muito humilhante chegar antes de Joe. Quando me aproximo da praça, eu o vejo encostado no muro. Lindo de morrer, com aquele jeito convencido de ser, mascando chiclete. Mil coisas passam pela minha cabeça. Se ele vai dizer que sou linda, que gosta de mim, que sempre me amou. Mas, quando me aproximo, ele me empurra no muro e diz: – Vamos acabar logo com isso. Então me perco em uma confusão de línguas, com gosto de menta. Não vejo estrelas e sou pega tão de surpresa que, antes que eu feche os olhos, o beijo acabou.
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– Meu Deus, garota, se eu soubesse que você beijava tão mal eu teria pedido o dobro a Meg por esse favor. – Com raiva, ele vira as costas e vai embora. Lágrimas escorrem pelo meu rosto. Como pude ser tão boba? Nunca tive amigos e achei que Meg realmente era importante na minha vida. E Joe, como pude sonhar com esse monstro? Corro para casa, preciso que minha avó me abrace e diga que vai ficar tudo bem. Mas, quando chego, várias pessoas estão à porta, me olhando. Entro e vejo minha avó caída no chão. – Vó, fale comigo, vó! – grito e sacudo seu corpo, mas ela não responde. Está morta. Sento ao lado dela, abraço as pernas e choro por tudo, pela minha avó, pelos meus pais, por Meg, por Joe. Choro porque estou sozinha. – Meu bem, levante‑se, vamos comigo, preciso ver aonde vou levá‑la. – Um policial se aproxima. – Não tem para onde me levar, não tenho ninguém, você não entende! – grito, como se ele fosse o culpado. – Olhe, vou levá‑la para um abrigo, alguém vai cuidar de você. – Ele me pega pelo braço, mas, antes de sair, seguro nas mãos da minha avó e juro que vou me vingar de todos. Não sei como, mas meus pais vão precisar de mim, Meg vai ser humilhada como eu e Joe vai implorar por um beijo meu!
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Capítulo 1 Dez anos depois… – Clarice, você tem que entender que chegou a hora, tenho que voltar para o Brasil. – Mas, Julie, você é minha família, não pode me abandonar aqui! – Com aquele jeito de garota mimada, Clarice faz um biquinho e implora. – Não dá. Se você quiser vir comigo, sabe que vou ficar feliz. Mas não posso mais adiar. Já tenho todas as informações e estou preparada para voltar – digo, tentando convencer a mim mesma. – Julie, minha maior preocupação é com você, amiga. Deixe essa vingança boba para trás, esqueça tudo. – Suas palavras de preocupação me emocionam. – Não dá, eu vivo por isso. Se não fosse por essa vingança, você sabe que eu não estaria mais neste mundo. Ela é a minha motivação. Então, Clarice me abraça. – Vá, mas, por favor, faça o tiver que fazer e volte. O passado ainda dói muito, mas me sinto preparada para enfrentar tudo. A minha vida foi dedicada a isso. Estudei como nunca, me esforcei e, mesmo contra todas as possibilidades de
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uma garota que morava em um abrigo, consegui uma bolsa para estudar Administração em Harvard. Mudei‑me para os EUA e conheci Clarice, que é brasileira. Nós nos tornamos a família uma da outra, apesar de ela ter sua família muito amada no Brasil. Mas, vendo seus familiares só duas vezes por ano, Clarice também se sentia muito solitária. Nós nos conhecemos em uma agência de modelos, onde eu fazia trabalhos para conseguir me manter. Com 1,75 m, corpo magro, cabelos loiros ondulados e olhos verdes, consegui o trabalho, começando como modelo fotográfica e fazendo alguns desfiles quando aparecia a oportunidade. Com esse trabalho, consegui contratar um detetive particular no Brasil. Por meio dele descobri o paradeiro dos meus pais, que continuam juntos, morando em São Paulo, uma típica família de classe média. E o que mais doeu foi descobrir que eles tinham mais dois filhos e que seguiam suas vidas como se eu nunca tivesse existido. Descobri também sobre a Meg. Ela dá aulas em uma escola de dança. Mora sozinha e, em todos os anos em que foi sondada pelo detetive, trocou de namorado como se troca de roupas. Já Joe assumiu os negócios da família em uma multinacional. Sempre sai com mulheres lindas, mas nunca se envolveu com ninguém por muito tempo. Pelo que me avisaram, ele se acha dono do mundo. Nunca vai lembrar que destruiu a minha vida. Naquele dia, quando Joe voltou para a escola depois de ter me beijado, contou para todos os garotos sobre a pior experiência da sua vida. Nos poucos dias de aula que tivemos antes do final do ano, fui vítima de risadas e apelidos maldosos, que tento esquecer todos os dias. E, como descobri, ele está contratando uma assistente pessoal. Vaga que estou disposta a preencher. Por isso, preciso voltar. Urgente! 14
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Capítulo 2 Joe Meu Deus do céu, não é possível que, em São Paulo, com 12 milhões de habitantes, não exista um ser humano que tenha os requisitos para preencher a vaga de minha assistente pessoal. A última, que ficou comigo por dois anos, resolveu brincar de casinha e engravidou. Resultado: me deixou na mão. Todos os dias chegam centenas de currículos. Depois que colocamos o anúncio no jornal, eles não param de chegar. Esses currículos são separados pela equipe de RH e as pessoas que se encaixam no perfil são chamadas para uma entrevista seletiva; depois, as que passam nessa entrevista são encaminhadas até a minha sala para uma entrevista final. O que tem acontecido é que as candidatas que chegam até mim são realmente muito qualificadas, só que a mais nova que entrou na minha sala tem 55 anos. Eu não quero uma avó para mim. Quero uma assistente pessoal linda, gostosa. Não que eu me envolva com elas. Nunca faço isso. Se fizer, tenho que contratar uma por semana, e já vi que isso não é tarefa fácil. Mas eu gosto de ser visto com mulheres bonitas, já que essas muitas vezes me acompanham em jantares de negócios. E
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também porque olhar não faz mal para ninguém. Quem prefere trabalhar olhando para o deserto, se pode ficar olhando a praia? Agora estou esperando por mais uma além das cinco que já passaram na minha sala hoje. Meu humor nesse exato momento está péssimo. Fico com minha cadeira virada para a vista maravilhosa de São Paulo que meu escritório proporciona. Escuto passos e percebo que a candidata se aproxima da minha mesa. – Senhor Joe, a candidata está aqui. O senhor precisa de algo mais? – minha secretária pergunta. – Não, Norma. Pode se retirar. Só ligue para o Mike e diga que estou a fim de uma boa balada hoje – digo isso sem me dar ao trabalho de virar a cadeira, porque eu sei que meu humor só vai piorar quando eu fizer isso. – Que horário devo combinar com Mike? – Mande‑o me esperar. Só isso – digo, já perdendo a paciência. Mike é meu amigo e companheiro de baladas. Conhece todos os lugares onde há mulheres bonitas. O silêncio toma conta da sala quando Norma se retira. Respiro fundo e me viro para atender a avó do dia. Mas perco o ar quando dou de cara com o par de pernas longas mais bonitas que já vi na vida, longos cabelos dourados, um rosto angelical que só pode ter sido esculpido por Deus e, para completar, um par de olhos verdes que me encaram com certa hesitação. – Boa tarde, senhor Hesgher. A voz? Um som para os ouvidos. Será que ela é real ou só estou delirando depois de um dia exaustivo? – Bom dia, senhorita… – Percebo que não sei seu nome. Pego o currículo que está sobre a mesa, mas, antes que eu veja, ela completa minha frase: – Julie Orner. Levanto‑me, tentando ser um cavalheiro, e a cumprimento: 16
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– Bom dia, senhorita Julie Orner. – Quando toco sua mão, percebo que está suada e trêmula. Ela está nervosa. – Poderia me falar um pouco sobre seu currículo? Assim não preciso ficar lendo. Prefiro palavras ditas – digo, olhando em seus olhos, tentando não perder a compostura. – Não tenho experiência profissional na área, mas me formei em Administração em Harvard e estou buscando uma oportunidade – ela diz. – E por que, Julie, alguém formado em Harvard iria querer trabalhar para mim como assistente pessoal? – Lanço um sorriso cínico, esperando realmente entender isso. – Estou pedindo o emprego e você deve analisar se estou apta ou não. Os motivos para me candidatar são pessoais e não lhe interessam – ela retruca. Essa doeu. – Você quer o emprego, mas tem a audácia de me desafiar? – pergunto, nossos olhos estão fixos um no outro. A tensão é visível e o tesão que estou sentindo também. – Desculpe‑me, não foi minha intenção desafiá‑lo – ela diz de forma muito amável, mas seus olhos mostram algo além que não sei decifrar. Uma mistura de ódio com paixão, talvez. – Eu posso até contratá‑la, mas gostaria de explicar as regras que estão no contrato antes de você assinar, e também precisamos negociar o seu salário. – Não precisa me explicar, eu aceito o trabalho, onde posso assinar? – Percebo que ela olha para a porta e tem pressa para ir embora. – Mesmo que eu pague menos do que você gostaria? Não quer saber nada? Qual é o seu problema? Eu não mordo… Aliás, você vai ter que conviver muito comigo se aceitar o trabalho e me parece que você está desconfortável com isso – digo sorrindo. Estou gostando dessa coisa de gato e cachorro e começo a pensar em como isso seria entre quatro paredes. 17
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– Na verdade estou cansada, cheguei de viagem ontem e estou tentando me organizar no Brasil novamente. – Percebo que a canseira é visível em seu rosto. Apesar da maquiagem, são visíveis as olheiras. – Se precisar de alguma coisa, a empresa está à disposição para ajudar. Então você assina aqui… – mostro o local exato do contrato de trabalho – e pode começar na próxima semana. Assim, pode terminar de se estabelecer. Enquanto Julie assina, percebo que, apesar do esmalte escuro, é possível ver que suas unhas estão roídas, revelando alguns traços de ansiedade. Sempre sou muito observador com meus funcionários e, apesar de eles terem me apelidado de coração de gelo, busco, do meu jeito, ajudá‑los sempre. Eles não imaginam que eu sei sobre esse apelido ridículo, mas sempre sei de tudo. E alguma coisa me diz que preciso saber algo da Julie. Não sei o que ainda, mas vou descobrir o que uma mulher tão bonita e inteligente está fazendo na minha sala praticamente implorando para ser minha assistente pessoal, o que não vai acrescentar em nada em seu currículo. Sem falar do salário que é um dos mais baixos pagos pela empresa. – Aqui está, senhor Joe. Que horas devo me apresentar na segunda? – ela pergunta. – Primeiro, vou pedir que me chame de Joe. Já que vamos trabalhar juntos, essa coisa de senhor fica meio irritante. Pode vir às oito horas. Peça para Norma lhe entregar umas anotações com coisas que você precisa saber sobre o que não deve fazer quando estiver na minha presença. – Muito obrigada, com licença – ela pede e se retira da sala. Não perco a oportunidade de conferir seu corpo por trás. Essa mulher é linda e com certeza vai me trazer muitos problemas e banhos frios.
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