Viagem da alma III

Page 1


01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 2

24/08/16 10:32


S

O

N

I

A

R

A

M

O

S

VIAGEM DA ALMA – VOL III

DESTINO, KARMA OU DARMA? ESCOLHAS DE VIVER

São Paulo 2016

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 3

24/08/16 10:32


Viagem da alma - vol III Destino, karma ou darma? Escolhas de viver. Copyright © 2016 by Sonia Ramos Copyright © 2016 by Novo Século Editora Ltda.

produção editorial

revisão

SSegovia Editorial

Silvia Segóvia

preparação

capa

Alline Salles

Dimitry Uziel

diagramação

Claudio Tito Braghini Junior

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), em vigor desde 10 de janeiro de 2009. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip) (Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil) Ramos, Sonia Destino, karma ou darma? : escolhas de viver. -- Barueri, SP : Novo Século Editora, 2016. 1. Carma 2. Darma 3. Espiritualidade 4. Misticismo 5. Transcendentalismo I. Título.. 15-07163

cdd-133

Índice para catálogo sistemático: 1. Carma: Esoterismo 133

novo século editora ltda. Alameda Araguaia, 2190 – Bloco A – 11o andar – Conjunto 1111 cep 06455-000 – Alphaville Industrial, Barueri – sp – Brasil Tel.: (11) 3699-7107 | Fax: (11) 3699-7323 www.novoseculo.com.br | atendimento@novoseculo.com.br

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 4

24/08/16 10:32


Agradecimentos Aos Mestres e Mestras que participam da história da minha alma, e de outros tantos que fazem parte da alma dos leitores. Aos meus familiares, aos meus pais e filhas, genros e netas, por terem existido na minha experiência de vida, no meu destino. Ao meu editor e sua equipe, principalmente à Letícia enquanto fez parte da equipe de trabalho, e à Silvia Segóvia que está me seguindo com gentileza ímpar.

5

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 5

24/08/16 10:32


01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 6

24/08/16 10:32


Propósito da coleção Viagem da Alma A alma humana faz parte de uma chamada energia criadora de todas as coisas, seres e existências. Na maior parte do tempo, aqui na Terra pelo menos, a alma se esquece da sua origem e perde conexão com a energia da vida. Quanto mais longe a alma vai durante sua viagem, mais ela precisa de qualidade de vida. Quanto mais qualidade desejar, mais treinamento energético ela vai atrair. Essa é a intenção da Coleção Viagem da Alma: proporcionar aos leitores o vislumbre de uma escada de evolução, com degraus ou etapas de aprendizado para tornar a viagem da alma mais direcionada e bem vivida. O primeiro volume da coleção tocou um tema energético básico do sistema energético do ser humano, o dos pensamentos. O segundo adentrou um aspecto energético mais complexo, o das emoções, este terceiro volume entra em aspectos energéticos extraordinários e desconhecidos do destino, do karma e do darma1 e o quarto abre o leitor para a possibilidade fantástica do coração, da energia e do amor verdadeiro. 1 Ou dharma como se escreve na sua forma original em sânscrito.

7

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 7

24/08/16 10:32


Todos os volumes da coleção podem colaborar na conscientização sobre um mundo poderoso, são instrumentos para o viajante buscador de novos horizontes, novas escolhas e bem-viver. A linguagem utilizada é nova, trata dos assuntos pouco conhecidos com a certeza de que, provado pela ciência de que somos energia, necessitamos desenvolver uma linguagem nova que espelhe tal visão. Nossa alma é muito mais do que um corpo físico, mais do que os cinco sentidos nos dizem, mais do que nossa história de vida na Terra e mais do que um coração batendo. Boa Viagem!

8

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 8

24/08/16 10:32


Propósito deste livro Acredito que toda viagem necessite de uma rota. Esta rota exige que a pessoa a trace antes de empreendê-la ou não. Talvez a pessoa só perceba o trajeto que fez depois que chegou a algum lugar, mas o caminho existia. A alma não é exceção. Ela faz uma viagem, cumpre uma jornada ao longo de uma existência na Terra ou ao longo da eternidade. Está sempre em viagem. Em cada viagem um karma ou um dharma. E também um destino. Bernardino Del Boca diz que “a consciência humana está em constante expansão e que em todo lugar da Terra existem agora homens e mulheres que admiram os novos valores que os Mestres trazem da Realidade Espiritual”, que “a expansão da consciência humana não acontece no plano da mente e da matéria, mas somente no plano daquela realidade invisível, divina, sobre a qual se baseia o nosso viver, mesmo que o ignoremos frequentemente”. A humanidade está em plena revolução interior e todos, sem exceção, estão trazendo à luz seus “nós” kármicos para que sejam resolvidos nessa época de possibilidades inusitadas de transformação, transmutação e transcendência. O problema surge quando você vive a época das possibilidades e continua ver e pensar de forma “antiga”. É nisso que entra uma compreensão 9

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 9

24/08/16 10:32


mais simples e realista do que seja o seu destino, karma e darma. Eles são escolhas? O atual estágio de desenvolvimento do ser humano requer uma transformação no modo de ver e pensar, e, portanto, torna-se importante deixar o conceito de karma mais claro retirando-o de um modo de pensar enclausurado no sinônimo de dívida e/ou de castigo, exigente de uma postura de aceitação passiva e culpa. Qual a diferença da linguagem psicológica da religiosa e da energética nesses assuntos? A psicológica quer entender as doenças e dificuldades mentais e psicológicas, a religiosa quer mostrar onde é necessário o perdão divino para os tropeços humanos, e a energética se interessa pela conscientização dos movimentos energéticos, onde somente os instrumentos de poder interior e de conhecimento atraem a atenção. Há conhecimentos que pertenciam a uma elite que, antigamente, sabia ler e escrever. Hoje milhares começam a ter acesso às informações porque os livros se difundiram e o conhecimento também. Os sábios antigos tinham consciência de que o karma era algo tão grandioso que poderia evoluir até que pudéssemos, todos – sem distinção de raça, crença e nação –, abraçar o dharma como lema de vida profundo e total, como o abraço divino que nos espera em cada passo feito com a alma.

10

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 10

24/08/16 10:32


Congregado, a raiva de viver e a angústia do karma O congregado subiu a ladeira íngrime desejando não estar ali. O frio intenso dificultava seus movimentos e a altura da montanha ainda mais. Pensou que estar ali era o menor dos problemas, apesar da temperatura, do cansaço e da falta de ar, já que estava indo ao lugar mais alto existente entre aquelas montanhas onde se achava a única pessoa que poderia ajudá-lo. Ia ao encontro do monge, seu tutor espiritual, a quem amava mais do que tudo na vida, o que era muito em tempos normais, e mais ainda em tempos de crise, como a que estava atravessando há semanas. “Estou sentindo raiva da minha vida, em seguida, não sinto nada, o que é um grande problema para um congregado que deveria sentir compaixão, interesse pela vida, pelos outros e alegria. Acho meu karma injusto, estou sentindo que não tenho o que eu teria direito, que não me acontece nada de extraordinário e que mereço mais do que vivo. No entanto, eu deveria estar preparado para viver em harmonia! Estou tão desesperado. Preciso ouvir meu mestre e escutar suas palavras sábias que sempre me acalmam”, pensou ele. Ao chegar ao seu destino, parou por um instante para retomar fôlego. Não queria aparecer perante o seu tutor como um ser sem controle de si e de sua respiração, apesar de estar totalmente descontrolado. Ele havia caminhado tanto e subido a tais alturas porque sua vida estava de cabeça para baixo. Nem os peixes o queriam mais, mesmo quando ficava horas a fio à beira do rio esperando pescar um que o alimentasse, além disso, os outros congregados o evitavam e sua família se afastara. Sua energia estava por um fio e nada o encantava. Só o seu tutor era capaz de tirar a angústia do seu karma. Sua história de vida estava insuportável. Os anos haviam passado, mas ele continuava a apreciar seu tutor que, apesar da idade avançada, conseguia transmitir, com facilidade, uma grande Energia inspiradora de almas. 11

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 11

24/08/16 10:32


“Não é tarefa simples e a maioria dos humanos desanima da espiritualidade, da grande Energia, porque é um processo constante de superação maior: deixar de ser terrestre, animal, para ser divino. Como custa atuar a alquimia de si”, pensou o congregado. Inspirando profundamente para recuperar o fôlego da longa subida, sentou-se à beira da trilha sobre uma pedra. Estava bem próximo do seu destino, o mosteiro. Há alguns anos o seu tutor morava ali, entre as nuvens. O congregado olhou para a construção que se encaixava entre as rochas escuras enormes, o que lhe dava um ar misterioso e ainda mais frio do que a temperatura externa. Não era um edifício feito de promessas calorosas. Era um local de isolamento e de morte, no entanto, o fato de estar espremido entre as encostas de pedra passava a ideia de estar no útero da montanha, transmitindo a sensação de renascimento e a saída para a luz do sol que a banhava em certas horas do dia. Rochas escuras em que a luz penetrava por arcos. A mulher sempre arca para dar à luz! Certa vez, o monge havia explicado que o arco é a representação da saída da vida como o bebê que sai de sua mãe para a luz do dia. Naquela ocasião, o congregado perguntara: – Mestre, se o arco subentende o nascimento, qual a importância do círculo? – O círculo é o trajeto necessário para o renascimento. O arco é nascimento e o círculo, renascimento. – Onde está esse círculo? – Na sua consciência! No conhecimento adquirido, treinado e vivido. – Conhecimento do quê? – Conhecimento da circunferência, o que significa um círculo e a vida. Um arco em cima e um arco embaixo formam um círculo. Tanto acima como abaixo. Tanto dentro como fora. As representações simbólicas são sempre parciais, para que os homens possam completá-las. Ou seja, um arco subentende o círculo. Os símbolos são indícios de algo maior ou mais completo. 12

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 12

24/08/16 10:32


– Você também é uma representação pela metade na minha vida, pois eu o vejo como um arco que me joga para o infinito! – disse o congregado com amor pelo seu professor de compreensão. O congregado refletiu por uns instantes até que surgiu com uma lógica paralela que só pode advir do Infinito para o coração do homem: – Mestre, esta vida que estou vivendo agora é uma entrada para o Infinito? O Monge Azul sentiu alegria e riu. A Luz entrou com força no ambiente, uma Luz divinamente ancorada numa energia de consciência única de amor e conhecimento. – Seu questionamento sincero vale uma resposta de benção. Você está pensando com amor e treinando aprender com o conhecimento das eras e de suas encarnações – disse o Monge Azul. O monge se demorou um pouco para dar a devida importância à pergunta. A reflexão e a pausa podem enfatizar o ensinamento, como o Monge sempre dizia aos seus congregados. – Seu karma e sua vida atual podem ser uma porta se o desejar. O Divino experimenta degraus e nuances de energia através do seu sentir e agir. Poucos têm consciência disso, mas assim é se você o desejar; depende da escolha de cada um fazer da sua encarnação uma porta para o Infinito ou um lodaçal sem fundo, sem margem e sem flores que se abram para o sol. – Diga-me: a sua vida de agora é uma porta para o Infinito? – Para a eternidade, certamente para a Eternidade. O Infinito é o aspecto inconcebível para mentes humanas, mesmo para um monge que tem controle de sua respiração. Como poderia a mente humana imaginar sequer o que seja o Infinito se mal entende o que é finito? O Infinito é algo sem nome, impossível de ser concebido pela mente humana. A Eternidade é uma parte do Infinito com a qual temos maior familiaridade. Afinidade. Minha vida de agora, deste momento do tempo, é um portal para o sem tempo, para o invisível e para a Eternidade. O tempo tem seu curso determinado por nascer, 13

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 13

24/08/16 10:32


viver e morrer; na Eternidade, o curso é de ida e volta. Tudo que vem volta. Tudo que veio do ponto de origem primordial volta e nada sai do âmbito eterno. Isso é compreensível para a mente humana. O que começa tem fim, como o karma. O que vem vai voltar para a Luz Eterna. Todo amor e dedicação formam um círculo de nascimento eterno. Na Eternidade, a morte desaparece, é só ir e vir. – Você acha que gosta da sua vida de agora tanto quanto vai gostar de outras na Eternidade? – Eu não preciso achar nada ou ter qualquer opinião sobre isso, caro congregado. Não preciso nem gostar. Eu preciso amar! Neste momento, sou um monge e vivo em contato com as montanhas, ensinando, praticando, aprendendo e ensinando novamente. Nada disso é eterno. Tudo isso é transitório. Esta é minha estória no tempo, entretanto, é o meu amor que faz dela uma história da eternidade. Renegar nossa estória de vida é deixar de trazer a eternidade para a Terra. O herói é o homem que traz a força eterna, aquela que não passa nunca, para o dia a dia, para sua luta. É isso que faz com que um herói transcenda a morte e torne-se parte da Eternidade. Amar é isso, é transcender a morte, é ver a presença da Eternidade em tudo e todos os eventos. O amor traz a alma, símbolo máximo da Eternidade no homem, no indivíduo, para as suas ações, e tudo fica encantador e possível. A alma é o rastro do Divino na individualidade. – Ter opinião não resolve questões como essa ou outras? – Amar é o que resolve questões mesmo como essa. A lembrança daquele diálogo tão antigo quanto aquelas rochas onde o congregado estava pisando após a escalada até o portal do mosteiro brotou do seu coração com energia clara. Suspirou profundamente. Ele havia ido ali porque não estava mais suportando o peso emocional e físico da sua vida na Terra, mas agora, nas alturas de uma montanha sagrada, após uma longa caminhada, parado na porta de um mosteiro, teve recordações de diálogos com seu Mestre que estavam sanando seus problemas, sem nem precisar ver o mestre fisicamente. A raiva e a angústia que sentia desapareceram. É claro 14

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 14

24/08/16 10:32


que a proximidade com a energia do lugar e do seu Mestre Azul já estavam atuando nele com força, pensou. As pessoas não deixam de frequentar lugares sagrados por esta razão. Elas desejam receber os influxos de certas pessoas e lugares. Assim estava acontecendo com ele. A energia de seu Mestre o alcançava fisicamente porque estava perto dele e o curava emocionalmente porque se lembrava de um ensinamento cheio de energia e clareza. Tudo porque resolvera fazer uma pausa para respirar, que acabou sendo uma pausa de amor e conhecimento, um momento de cura da sua angústia e desassossego. Uma meditação guiada pela sabedoria. Todo o peso que sentia no coração, o que sentia pelo seu destino e karma, desapareceu, seu corpo ficou leve para descer a ladeira, sua mente ria enquanto os lábios sorriam. Tudo mudara porque sua perspectiva se deslocara. A percepção deslizara entre dimensões, dando nova energia. Seu tutor era mesmo um portal do invisível eterno que respondia antes mesmo de ser interrogado. – Vou voltar e refletir sobre o meu destino antes de falar com meu Mestre. Preciso aprender com minha ânsia, meu destino e meu karma.

15

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 15

24/08/16 10:32


01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 16

24/08/16 10:32


1 Minha experiência direta sobre o karman Q

– uem você viu durante o coma não é o seu protetor, como acredita. Você é ele. Ele é você. A imagem que lhe apareceu durante o coma é o seu corpo na encarnação anterior a esta. Senti meu coração parar e, ao mesmo tempo, desandar em batidas como se tivesse corrido uma maratona de muitas vidas até chegar àquele momento crucial de experiência direta com o que ouvira e lera sobre encarnações e karman. Meus pensamentos deram um salto e o meu coração entrou numa dimensão em que a compreensão penetrou pouco a pouco na minha vibração. – Eu fui ele? – disse eu acordando para uma nova realidade, embora ainda parecesse distante. A emoção que senti foi tão forte que todo o ambiente me pareceu suspenso em luz e nada. O outono iniciara há pouco e o ar úmido ainda não penetrara os ossos, mas senti muito frio e calor durante aqueles momentos. 17

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 17

24/08/16 10:32


Lembro-me de ter olhado estarrecida para a mulher que pronunciara a frase. A sarda era de estatura mediana, cabelos negros e olhar penetrante. Uma conhecida me havia mandado até ela por me ver em dificuldades de saúde. Manuela, que havia sido ajudada também, imaginou que o mesmo aconteceria comigo. O seu nome era Ana Mereu. A casa dela era muito simples e limpa. Ela era uma sensitiva com grande conhecimento das matérias sutis, uma daquelas que desvendam o brilho da alma para os que querem ir além do brilho de estrelas, ou seja, do visível. Ana e eu conversamos muito de tudo, até que contei a ela como confiava na proteção de meu avô materno, um médico paranormal e habilidoso cirurgião, do qual só havia ouvido falar. Ele falecera anos antes que eu nascesse. Relatei como eu estivera em coma no parto de minha segunda filha e de como ele fora a presença confortante que me estendeu uma das mãos para que eu voltasse a mim e ao mundo e pudesse cuidar de minhas filhas por alguns anos. Fora, então, que ela fizera aquela afirmação surpreendente. “Você é ele”, um “ele” que voltara. Ana Mereu parecia saber que podia dizer tal frase, que encontraria terreno fértil, apesar de representar um grande risco, essa de penetrar com ímpeto a vida de eternidade de outra pessoa. Ela encontrara terreno fértil primeiro por eu ter nascido e crescido no Brasil onde todos ouvem falar, desde a mais tenra idade, sobre karma, reencarnação e outras vidas, onde vemos centros espíritas em todas as cidades, onde a diversidade religiosa é tão comum quanto o feijão com arroz. Na minha infância, meu pai falava com naturalidade de sua filosofia, explicava o que era ser espiritualista, a distinção entre se sentir espiritualista e espírita, de medicina psicossomática, medicinas alternativas, como a homeopatia; repetia constantemente as estórias de seus tios, 18

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 18

24/08/16 10:32


espíritas, o que falavam, ensinavam ou viviam, comentava milagres que viveu com Nossa Senhora e da cunhada que trocou, literalmente, a vida dela pela dele numa época em que a falta de penicilina o destinara à morte por nefrite aguda. Ele nunca me mostrou um livro que pertencesse a uma religião específica, jamais frequentou nada além da igreja católica em ocasiões obrigatórias, como casamentos, batizados e enterros. No entanto, operou e tratou de doentes que lhe foram enviados de estados distantes por indicação de centros espíritas, todos operados com proteção de Bezerra de Menezes, sem jamais ter pisado num centro espírita ou espiritualista, sem ter rituais senão o seu código de vida, de ética e de devoção à simplicidade e verdade. Para ele, o trabalho dedicado, a devoção interior e o sistema de vida eram incindíveis da Fé. Minha mãe não compartilhava da paixão espiritualista de meu pai, todavia, compartilharam o grande amor por Nossa Senhora, pelo bem do próximo e pelo mistério. Ela acreditava no valor do trabalho, na caridade desinteressada e no caminho espiritual. Acreditava profundamente na possibilidade humana de ter visões, clarividências e compreender os sonhos. E, se por toda a vida ela tentou contestar a existência de várias encarnações para uma alma, no final da sua ela reviu seus conceitos com coragem e lucidez. Dois meses antes de desencarnar, ela se levantou de madrugada para poder tomar café comigo, o que estranhei bastante, sete anos depois que eu encontrara a sarda. Ela perguntou de maneira bem direta: – Minha filha, você realmente acredita que a gente renasça e que existam mais vidas? Depositei meu olhar cheio de amor sobre ela sabendo que as perguntas mais profundas vieram à tona agora que sentia não ter nada a perder. – Sim, minha mãe. Tenho certeza. – Como é que você sabe? – insistiu. 19

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 19

24/08/16 10:32


– A senhora sabe quem era meu pai? E minha mãe? – Sei, respondeu com ênfase. – A senhora sabe o que estudei e em que trabalhei por tantos anos? – Sim, eu sei. – Então, como é que se explica o fato de eu tratar ou ensinar médicos todas as semanas dos últimos anos se não houver outras vidas? De onde pode vir tudo isso? – É verdade. Não tem lógica se não imaginarmos outras vidas! Ela me abraçou com gratidão e retribuí com o coração. Assim sendo, não é de se admirar que, mesmo morando na Europa, onde se pensa estar distante de assuntos espirituais, os quais fazem parte da vivência diária dos brasileiros, eu me deparasse com a possibilidade de “descobrir” a estória de minha vida passada. Descobrir vida passada significa encarar possíveis karmas, possíveis compromissos adiados, possíveis resistências antigas que encontrarão lições mais árduas e significa, sobretudo, fazer uma escolha de amor mais consistente onde doer mais. Conhecer uma encarnação era lidar com algo muito diferente do que eu vivera até então. Sabia, instintivamente, que, onde eu tivesse mais apegos, fossem afetos que opiniões, aí a energia entraria com maior intensidade gerando o chamado “resgate”. Eu ainda desejava meus apegos mais queridos, mais fortes e mais contundentes. Temia ter dons como todas as pessoas e não queria cuidar de um. Isso tudo me passou pela cabeça naqueles instantes determinantes e assustadores. Mesmo porque, uma coisa é alguém lhe dizer que você viveu como um faraó do Egito ou como um mago etrusco há milênios, outra coisa bem diferente é afirmar que você encarnou alguém conhecido, cujas fraquezas são notadas, comentadas, cujos efeitos de seus atos foram sentidos pelos filhos e que se refletem no presente. Uma coisa é imaginar algo, outra é lidar diretamente com os efeitos reais. Claro que também existe o lado chamado “bom”, mas ele só pode ser conscientizado anos depois da descoberta ao longo do caminho e do despir-se de máscaras. 20

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 20

24/08/16 10:32


Não prolonguei minha estada na casa de Ana, a sarda. Eu queria ir embora dali porque pressentia o que estava por vir. Ela compreendeu o turbilhão que atravessava minhas entranhas e, com carinho, me disse generosamente que não podia fazer mais nada por mim, que eu teria que ser operada o mais rapidamente possível e que meu destino estava lacrado, tão forte, que nada o impediria, nem mesmo a minha recusa. Ela era a terceira pessoa que falava de destino lacrado pelo plano invisível. Meu destino era atender pessoas, meu karma era aprender a amar isso e, quem sabe, algum dia, tudo seria somente darma, uma benção. É claro que ninguém, a princípio, aprecia falar desse assunto, menos os incautos. Eu não era diferente. Destino lacrado é algo que tira a sensação de poder sobre a sua vida e o ego reage muito mal. Acabei sendo operada, três meses depois e, em seguida, fui tentar desvendar algo mais sobre o que a sarda me dissera, mesmo porque, durante o tempo da minha recuperação, acabei percebendo que havia “coincidências” demais entre aquele personagem que aparecera durante o coma e eu. Anos e anos de trabalho interior tiveram início a partir daquela frase e daquele encontro numa tarde de outono com uma sarda corajosa. Hoje envio a ela bençãos diárias porque me empurrou para o processo de conhecer de onde vinham e vieram muitos eventos dessa minha vida. Conhecer “a” outra vida, outros atos, outras escolhas de vida me permitiram compreender profundamente a vida. Um presente de incalculável valor. A certeza de que vivemos a eternidade por partes e por ciclos numa continuidade que requer responsabilidade e compromisso. A certeza de que um propósito conduz a evolução mais do que teorias e conjecturas. Não indico regressão provocada a ninguém porque, como bem aprendi, quando você está numa crise existencial completa de desgastes emocionais afetivos, financeiros e familiares, tomar conhecimento de outros piques emocionais provoca uma voragem energética delicada de ser gerida. 21

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 21

24/08/16 10:32


A partir daquele momento, nenhuma teoria sobre Karma seria teoria para mim. Havia se tornado uma experiência direta. Eu passara a viver conscientemente meu karman e minha reencarnação na prática, todavia, décadas se passariam até eu viver o entendimento do meu dharma, e, mais ainda, o Dharma.

22

01Viagem_da_Alma_vol3_OK.indd 22

24/08/16 10:32




Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.