Especial 25 Abril 2014

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Este suplemento faz parte integrante da edição nº 1138 deste jornal e não pode ser vendido separadamente

40 anos do 25 de Abril Salgueiro Maia é a grande figura do 25 de Abril para os autores dos depoimentos que publicamos neste suplemento dedicado aos 40 anos da Revolução dos Cravos. A Justiça e as reformas no sector merecem quase todas as criticas


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40 ANOS 25 DE ABRIL

“Fui vizinha de Salgueiro “Porventura, na Maia e ouvi da sua boca falhámos prossecução alguns dos relatos do 25 de Abril” deobjectivos de Teresa Ferreira Directora Geral da empresa “Águas de Santarém”

Precisamos de outro 25 de Abril? Não, não precisamos de outro 25 de Abril. Os actos revolucionários têm lugar em circunstâncias extremas e para terminar com situações de privação, por exemplo, da liberdade, como era a situação que se viveu durante décadas. Actualmente temos problemas sérios, porventura, falhámos na prossecução de alguns dos objectivos de Abril, mas agora o caminho faz-se com trabalho, não com revoluções. Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? O 25 de Abril deu-se, como sabemos, pela organização, coragem e mérito de um conjunto de pessoas. No entanto, para mim, a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril é, sem dúvida, Salgueiro Maia. Tive o enorme privilégio de conviver muito de perto com ele na minha infância. Nasci em Outubro de 1974, sou do ano da revolução. Morávamos no mesmo prédio em Santarém, nós no 6º andar e ele no 5º. Quem o conhece e privou com ele sabe do que estou a falar - o enorme jeito, afecto e paciência que tinha com as crianças. Foi um convívio muito próximo. Ouvi os relatos mais marcantes daquela madrugada e do dia 25 de Abril de 74 contados na primeira pessoa. Confesso que na altura não percebia a real dimensão e significado do que ouvia. Parecia que o Maia estava apenas a contar uma história…. Vivemos em democracia? Não tenho a menor dúvida que vivemos em democracia, isso é inquestionável. O sistema é perfeito? Claro que não, penso que nenhum o é. Mas temos liberdade de opinião e de expressão, temos ciclos democráticos ao nível central e autárquico perfeitamente definidos e escolhemos através do voto quem achamos que melhor nos representa. Temos oposição para questionar, monitorizar, propor alternativas às linhas que vão sendo traçadas…. Isto é democracia. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Os partidos políticos são fundamentais para a vivência em democracia. Sinceramente, e se chegámos à situação em que hoje nos encontramos – a lutar para sair com alguma dignidade de uma situação de resgate internacional por total incapacidade de nos sustentarmos a nós próprios – é sinal que as coisas correram menos bem. Foi um acumular de decisões menos ponderadas e menos responsáveis que, com toda a certeza, não foram responsabilidade exclusiva de um único governo ou partido político. No entanto, os factos mostram que as situações limite que presenciámos desde que vivemos O MIRANTE 17/ABR/14

em democracia, com necessidade de auxílio externo, ocorreram sempre com governos do mesmo partido… Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? Penso que um país que não tenha uma justiça que funcione de forma eficiente, com uma credibilidade inabalável e com decisões tomadas em tempo útil, é um país com uma imagem diminuída perante os seus cidadãos e potenciais investidores externos com algum interesse em investir no nosso país. De facto, o que temos ouvido sobre alguns casos, não ajuda a gerar confiança numa justiça eficaz e igual para todos. Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Neste ponto, e falo muito por minha experiência, faço uma avaliação muito positiva. Temos centros de saúde e hospitalares muito bem equipados, com capacidade de resposta e excelentes profissionais. Felizmente, recorro com muito pouca frequência a serviços de saúde, mas muito recentemente tive necessidade de ir ao hospital público com uma das minhas filhas e fui muito bem atendida, com profissionais cuidadosos, atentos, experientes. Haverá sempre quem tenha motivos para se queixar, podemos fazer listagens com tudo o que funciona mal e poderia melhorar. A questão é como melhorar, como chegar à porta de todos – não é possível disponibilizar todos os serviços a todas as pessoas de forma quase imediata no local onde residem. Poderia ser desejável, é discutível, mas não é possível. Há listas de espera, há necessidade de fazer deslocações para aceder a alguns serviços/especialidades – sim. Mas não percamos a noção da realidade, da dimensão do nosso país e perceber que, não podendo ter tudo, há que definir estratégias e prioridades. No essencial, acho que o Serviço Nacional de

Abril, mas agora o caminho faz-se com trabalho, não com revoluções”

Saúde funciona e é garantido o acesso a cuidados de saúde a todos os cidadãos independentemente do seu nível de rendimentos. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O poder local ou o poder central? Não tenho resposta objectiva. Ambos são necessários e têm como missão servir os cidadãos fazendo a melhor gestão dos (escassos!) recursos disponíveis. O poder local tem uma grande vantagem, que é também um enorme desafio – a proximidade às pessoas. Conhecer as pessoas, os locais, as experiências e vivências próprias dos locais, ajuda a melhor percepcionar o que é mais urgente, mais necessário e a tomar decisões. Penso que tem um reverso, que os políticos experientes saberão com certeza ultrapassar – uma maior vulnerabilidade decorrente da vivência próxima dos problemas, tendência para aceder ao maior número de solicitações possível e maior dificuldade em dizer não. O poder central ganha em autonomia e inde-

pendência para gerir prioridades e tomar decisões, mas sem o confronto directo com os interessados e consequências das suas próprias decisões. Diria que o poder central, embora mais distante, se tiver boas equipas, dossiers bem preparados e estruturados e pessoas competentes, poderá ser mais racional nas decisões. E os tempos que vivemos apelam a grande serenidade e racionalidade na tomada de decisão. Nem sempre as que mais gostaríamos, as mais populares, mas aquelas que as circunstâncias que vivemos e as reais necessidades do país exigem – não olhando apenas para o curto prazo ou para o próximo acto eleitoral.

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“Tenho memória de um país cinzento que existia antes do 25 de Abril” Francisco Vieira Director Executivo da Insignare Associação de Ensino e Formação Onde estava no 25 de Abril e o que sentiu quando soube o que se estava a passar? Na madrugada do dia 25 de Abril dormia descansadamente numa camarata do Colégio Andrade Corvo, em Torres Novas. O acordar era por volta das 7 da manhã e tínhamos o hábito de ligar os nossos pequenos rádios a pilhas no RCP, ouvindo o programa “Quando o telefone toca”, apresentado por Matos Maia. Inesperadamente, os nossos rádios apenas emitiam sisudas e intrépidas marchas militares. Por mais que procurássemos outra estação, só dava daquilo. Estranhámos. Ao chegar ao pequeno-almoço percebemos que existia algum nervosismo no ar, tendo sido solenemente informados, que tinha havido uma revolução em Lisboa. Admito não ter percebido muito bem do que se tratava. Só após a chegada dos alunos externos, por volta das 9 da manhã, contentes e efusivos, é que percebemos que afinal uma revolução era uma coisa boa. Também ficámos contentes, pela revolução ou talvez por nos terem enviado para casa no período da tarde. Como era demasiado novo quando se deu o 25 de Abril que ideia foi formando desse dia a partir do que lhe contaram ou teve que estudar? Tinha 17 anos, idade mais que suficiente para formar a minha própria visão sobre o momento, particularmente pelo intenso espírito revolucionário vivido nos anos seguintes, pela música e pelas múltiplas leituras e acaloradas discussões. Era tempo de uma imensa Liberdade e de um inesgotável sentido de Mudança. Sabe o que aconteceu a 25 de Novembro de 1975 e o significado desse acontecimento para o país? Tenho uma memória vaga do 25 de Novembro, feita de múltiplas imagens e de uma notória confusão. Relembro figuras como Mário Soares, Álvaro Cunhal, Ramalho Eanes, Otelo e Jaime Neves. Para outras já sou obrigado a algum esforço. Relembro as mocas de Rio Maior, a turbulência vivida por todo o País e um forte sentido de instabilidade e de insegurança. Foi o fim do PREC, da afirmação de uma esquerda radical e o início da vivência democrática que hoje conhecemos. Precisamos de outro 25 de Abril? Precisamos sobretudo de rigor, competência e empenhamento. De um reforço das competências de vida da classe política e da garantia de um verdadeiro sentido de Estado. Precisamos de um projecto colectivo de Nação, da definição do caminho a seguir e de uma renovada atitude solidária. Se conseguirmos garantir isso sem um acto revolucionário acredito que será mais fácil para todos, mas não devemos temer tempos de mudança que nos possam conduzir a um novo futuro. Tem alguma memória que queira partilhar, da vida antes de 25 de Abril de 1974, seja sua ou relatada por familiares ou amigos? São muitas as memórias que tenho dos meus tempos de juventude, mas aquilo que sempre melhor preencheu o meu imaginário foi o tom cinzento que me transmitia o meu País. As pessoas e as coisas. É esse sentido de tristeza fadista, a negro e a cinza, que melhor carac-

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teriza a minha vivência. Fechada, triste, numa educação que me conduzia para um heróico projecto de guerra, que inesperadamente deixou de fazer sentido. Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? Salgueiro Maia. Admito que por ter tido a oportunidade de o conhecer pessoalmente, de com ele ter passado algumas horas a conversar no bar dos soldados no Regimento de Cavalaria de Santa Margarida, num tempo em que a estrutura militar e os seus pares o ostracizavam deliberadamente. Uma pessoa simples, convicta e por isso extraordinária, o meu herói de Abril. Vivemos em democracia? Sim. Alguma incompetência na gestão do nosso destino colectivo não pode colocar em causa o superior desígnio da Democracia em que acredito vivermos. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Os partidos são genericamente a imagem dos seus líderes. E é sobre o seu sentido de liderança e sobre a convicção com que conduzem ou pretendem conduzir o nosso destino que avalio o seu desempenho. Tivemos bons e maus líderes, com bons e maus momentos. Dos partidos fica-me sempre a sensação, eventualmente injusta, de que se caracterizam por um mau desempenho, albergando no seu seio e construindo carreiras de actores políticos impreparados para o exercício de poder que sempre pretendem atingir. Custe o que custar. Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? Uma profunda desilusão. Sobretudo porque sempre acreditei que a justiça seria o nosso incontornável bastião de segurança e estabilidade social. Uma justiça cega e para todos. Afinal vamos assistindo a casos em que se torna difícil compreender a sua morosidade e o seu desfecho. Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Muito bem. Apesar de reconhecer algumas limitações, as vezes em que necessitei utilizar o Serviço Nacional de Saúde fui sempre bem atendido e acompanhado. Penso mesmo que as constantes medidas que diferentes Governos têm aplicado nesta área, têm melhorado a qualidade dos serviços prestados. O SNS é sem dúvida uma das mais importantes conquistas de Abril. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis, poder local ou o poder central? O poder local é responsável por uma melhoria qualitativa do nível de vida das populações, muito especialmente daquelas que se encontram situadas em territórios mais desfavorecidos. Mas porque estamos a analisar patamares diferenciados de governação, admito a complexidade de uma justa comparação, salientando que a questão deve ser colocada entre bons e maus governantes e boas e más decisões. E isso encontra-se nas duas vertentes em análise. Um bom autarca pode fazer muito pelo desenvolvimento do seu território e pela qualidade de vida dos seus concidadãos. Admito que mais do que um poder central fechado, reservado e desconhecedor da realidade que o rodeia. Quando falamos de Estado estamos a falar de quê e de quem? Falamos de uma poderosa máquina burocrática, incansável trituradora de recursos e com uma predisposição constan-

“O Estado é uma poderosa máquina burocrática, incansável trituradora de recursos e com uma predisposição constante para alterar, complicando aquilo que por vezes parece simples, compreensível e ajustado” te para alterar, complicando aquilo que por vezes parece simples, compreensível e ajustado. Mas é esta máquina que nos governa, nos impulsiona e nos limita, preenchida por portugueses como nós, bons e maus, competentes e incompetentes. O Estado é isso tudo e é toda essa gente, ficando-me por vezes a sensação de que se auto protege, a si e aos seus, afastando-se da realidade em que vive a generalidade dos portugueses. Outra coisa são os políticos que dirigem a máquina do Estado… Tem algum testemunho pessoal relacionado com o 25 de Abril, a democracia e a liberdade que queira partilhar com os leitores ? Uma pequena estória que se prende com a minha primeira resposta. Depois do Padre Manuel Alves nos ter mandado para casa, nessa tarde do dia 25 de Abril, veio comigo até Fátima um colega do colégio. Viemos na camioneta dos Claras. Dormiu em minha casa e no dia seguinte partiu à boleia

para Coimbra, onde tinha familiares e amigos a estudar. Um destes dias, no Zé Crispim, em Fátima, um casal africano almoçava numa mesa perto de mim. O homem levantou-se e dirigiu-se a mim: “Então Chico, não me conheces?” Não conheci de imediato. Quarenta anos separavam o nosso último encontro, quando em Fátima, na Rotunda Norte, ele apanhou boleia para Coimbra. Era Fernando Vaz, hoje ministro de Estado do Governo de Transição da Guiné-Bissau e candidato a umas eleições constantemente adiadas. O tal do “infantil”…

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“O Estado é um monstro “O Serviço de que vive à custa do povo Nacional Saúde é uma das grandes em vez de o servir” conquistas do 25 Hermínio Martinho Assessor da Administração da Tecnovia

Onde estava no 25 de Abril e o que sentiu quando soube o que se estava a passar? Estava a cumprir serviço militar em Cabinda, Angola. Soube no próprio dia, já noite. A primeira coisa em que pensei foi no regresso a casa para junto dos meus 4 filhos. Sabe o que aconteceu a 25 de Novembro de 1975 e o significado desse acontecimento para o país? Tratou-se de repor o caminho traçado pelos ideais de 25 de Abril, pondo fim a uma deriva totalitária de esquerda. Precisamos de outro 25 de Abril? Do que precisamos é que as pessoas que assumem

“O Estado em vez de permanentemente promover e premiar a competência e a seriedade, frequentemente alberga e até estimula a incompetência e o compadrio”

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lugares de responsabilidade no país sejam honestas, competentes e verdadeiras. Por outras palavras precisamos urgentemente de acabar com a mentira e a demagogia. Tem alguma memória que queira partilhar, da vida antes de 25 de Abril de 1974? Em Novembro de 1973 recebi em Cabinda uma carta de um amigo que dizia: “Fui votar a semana passada, perguntaram-me se, como estavas em Angola, eu queria votar por ti, e eu votei.” Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? Fernando José Salgueiro Maia, sem qualquer dúvida. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Os partidos políticos são organizações demasiado voltadas para dentro. Na oposição mobilizam as pessoas pela critica, por vezes até recorrendo à má língua. Chegadas ao poder, rapidamente assumem a prática daquilo que antes criticavam. Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? O funcionamento da justiça é para mim, talvez hoje, o maior problema do nosso país. Por vezes dá a ideia que as leis são feitas como as moedas, com verso e reverso. Os processos relacionados com as últimas eleições autárquicas foram paradigmáticos. Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Na minha família, desde o meu neto mais novo (3 meses) à minha sogra (98 anos), temos sido sempre atendidos e tratados com um brio, um profissionalismo, uma compe-

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de Abril. A minha família, desde o meu neto mais novo (3 meses) à minha sogra (98 anos), tem sido sempre atendida no SNS com uma competência e uma dedicação inexcedíveis” tência e uma dedicação inexcedíveis. O SNS é uma das grandes conquistas do 25 de Abril. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O poder local ou o poder central? Sem sombra de dúvidas o poder local. O que não quer dizer que não tenha havido muitos erros e muito esbanjamento de dinheiro. Quando falamos de Estado estamos a falar de quê e de quem? Estamos a falar dum “monstro” que devia existir para estar ao serviço do seu povo e não para viver à custa dele, por vezes até, através duma exploração escandalosa. Estamos a falar de “alguém” que em vez de permanentemente promover e premiar a competência e a seriedade, frequentemente alberga e até estimula a incompetência e o compadrio.

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“As gerações anteriores à minha cresceram com a angústia de irem para a guerra” Carlos Coutinho Presidente do Conselho de Administração da DESMOR Por detrás dos acontecimentos do 25 de Abril de 1974 estão mais de 40 anos de um regime autoritário que governava em ditadura e que usava a repressão para impedir a democracia. Apesar de ter nascido depois da Revolução do 25 de Abril de 1974, desde cedo ouvi, através dos relatos da minha família, os exemplos do que as pessoas tinham de enfrentar no seu dia-a-dia, como a censura, a PIDE, a pobreza, a guerra e a falta de oportunidades para um futuro melhor. Nunca é demais recordar, nomeadamente para a minha geração, que antes do 25 de Abril coisas tão simples e tão básicas como conversar na rua em grupo ou cantar com os amigos estava vedado a todos e que gerações de jovens como eu cresceram com a angústia de ir para a guerra. Todos os portugueses receberam com muita alegria o 25 de Abril, podendo vir para a rua expressar livremente as suas opiniões. Acabava-se um regime totalitário e opressivo. No entanto depois da revolução os portugueses voltaram a passar rapidamente por um período um pouco conturbado, onde se procuravam identificar os então apelidados “fascistas” que foram vítimas de algumas ameaças e no qual se atinge o máximo no chamado Verão

Quente de 75. Em 25 de Novembro as forças da extrema-esquerda tentaram o assalto e sendo derrotadas é aí que se atinge verdadeiramente a democracia. É por isso que não consigo deixar de associar a data do “25 de Novembro” à verdadeira consolidação da democracia, pois foi este dia que pôs o fim à instabilidade social vivida em Portugal, depois da “Revolução de Abril” e que permitiu finalmente um maduro e coerente processo de transição do regime político. A celebração do 25 de Abril, data que marca, acima de tudo, o reemergir da esperança dos portugueses, é o momento certo para acreditarmos que é possível e que essa mesma esperança continua ao nosso alcance, tentando defender os principais valores que a democracia pretende assegurar. Com o 25 de Abril acabou-se com uma ditadura, permitindo que a partir daí o povo escolhesse os seus representantes e, através deles, escolhesse o rumo que entendia querer dar ao país. Neste sentido não é, para mim, compreensível que o poder conquistado, e que é o mais fiscalizado e o único que o cidadão verdadeiramente escolhe de forma directa, tenha a credibilidade e imagem pública tão em baixo, passados 40 anos de democracia. Devemos apostar na revitalização e credibilização do poder político promovendo reformas muito profundas no nosso actual regime político. Reformas que, obviamente, não visam a sua destruição, mas sim o aperfeiçoamento do seu modo

“Não é, para mim, compreensível que o poder conquistado, e que é o mais fiscalizado e o único que o cidadão verdadeiramente escolhe de forma directa, tenha a credibilidade e imagem pública tão em baixo, passados 40 anos de democracia” de funcionamento, de forma que os seus principais valores possam ser defendidos. É a partir de um poder político credível e por isso forte que poderemos avançar com os passos firmes que Salgueiro Maia e os seus militares deram na madrugada de 25 de Abril, rumo a um futuro melhor e mais estável. É fundamental que o País, como um todo, acredite que é capaz e que vai vencer, para conseguirmos compreender as mudanças estruturais que

“Apesar de todos os defeitos o nosso sistema político é o adequado ao nosso país” Miguel Borges Presidente da Câmara Municipal do Sardoal Onde estava no 25 de Abril e o que sentiu quando soube o que se estava a passar? Tinha 8 anos quando se deu o 25 de Abril. Tinha dormido em casa do meu avô, que tinha uma oficina de latoaria na mesma rua da sua habitação. De manhã, ao despedir-me dele antes de ir para a escola, estranhamente verifiquei que estava a ouvir rádio, o que nunca acontecia. Disse-me que nesse dia não havia escola e que deveria voltar para casa. Como era demasiado novo quando se deu o 25 de Abril que ideia foi formando desse dia a partir do que lhe contaram ou teve que estudar? Tenho na memória toda a agitação desses tempos, recordo-me de ter participado, com o meu pai, na manifestação do dia 1 de Maio em Abrantes. Sabe o que aconteceu a 25 de Novembro de 1975 e o significado desse acontecimento para o país? Durante o “Verão Quente” a disputa pelo controlo político agudizou-se, entre militares revolucionários e moderados, culminando em tentativa de golpe de estado no dia 25 de Novembro. Foi um marco histórico na contenção dos excessos revolucionários. Precisamos de outro 25 de Abril? Não. Precisamos sim que, de uma vez por todas, os por-

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tugueses assumam os direitos e deveres conquistados nesse dia, transportando-os para os desafios dos tempos modernos. Tem alguma memória que queira partilhar, da vida antes de 25 de Abril de 1974, seja sua ou relatada por familiares ou amigos? Como disse anteriormente tinha 8 anos, frequentava a chamada 3ª classe. Existiam uns dossiês com as bandeiras de diversos países que gostava de copiar e desenhar. Recordo-me de o meu avô me aconselhar a não desenhar uma bandeira vermelha que tinha uma foice e um martelo. Era a da antiga Rússia. Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? Salgueiro Maia é, sem dúvida alguma, a pessoa que melhor simboliza o dia 25 de Abril. Vivemos em democracia? Sinto-me claramente em democracia. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Considero que, apesar de todos os defeitos que possa ter e são muitos, o nosso sistema político é o adequado ao nosso país. Os partidos políticos fazem parte deste sistema e têm sido, todos eles, fundamentais na nossa democracia. Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? Os custos e a morosidade têm afastado a justiça dos cidadãos. É uma pedra na engrenagem das conquistas de Abril. Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Sou um claro defensor do Serviço Nacional

temos de fazer nas nossas vidas, de modo a conseguir ultrapassar as evidentes dificuldades por nós enfrentadas. Temos de nos capacitar que só em conjunto seremos capazes. E temos de perceber que só solidariamente o conseguiremos. A minha geração deve ter a responsabilidade de colocar nas nossas prioridades quotidianas, a defesa do valor da solidariedade e da justiça social, de modo a honrar o espírito de Abril e igualmente o dever cumprido por Salgueiro Maia na defesa da nossa democracia.

“Tenho gravada na minha memória a chegada do navio “Vera Cruz” a Lisboa vido de Moçambique e a emoção de todos quando ele surgiu à entrada no Tejo! O meu pai estava a regressar da Guerra. O meu regressou!”

de Saúde. Posso testemunhar de tudo um pouco desde o muito bom ao muito mau. Custa-me ver que muitos portugueses para conseguirem uma consulta, tenham que passar horas intermináveis à porta dos Centros de Saúde. Mais uma pedra na engrenagem das conquistas de Abril. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O poder local ou o poder central? Não tenho dúvida alguma da importância e do papel fundamental que o Poder Local tem tido nestes 40 anos de democracia. Quando falamos de Estado estamos a falar de quê e de quem? O Estado somos todos nós. Com os nossos direitos mas também com os nossos deveres. Deveres esses que passam pela obrigação de sermos proactivos neste mesmo Estado. Não nos podemos refugiar no “confortável” papel de observadores. A cidadania, a participação cívica são fundamentais para a consolidação democrática do nosso Estado.

Tem algum testemunho pessoal relacionado com o 25 de Abril, a democracia e a liberdade que queira partilhar com os leitores? Como gostaria de ter vivido essa época de modo diferente! Atendendo à minha idade não pude desfrutar desse período como gostaria. Tenho gravada, como uma das primeiras memórias da minha infância, a chegada do navio “Vera Cruz” a Lisboa vindo de Moçambique. A emoção de todos os presentes quando se avistou esse navio à entrada do Tejo! O meu pai estava a regressar da Guerra. O meu pai regressou! Viva o 25 de Abril. 17/ABR/14 O MIRANTE


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“Muitos portugueses ainda não perceberam que o Estado somos todos nós” António Campos Presidente da Comissão Executiva da Nersant Onde estava no 25 de Abril e o que sentiu quando soube o que se estava a passar? Estava em África, mais propriamente em Moçambique. Tinha 12 anos e, pelas reacções das pessoas mais velhas, era uma boa notícia, de liberdade para todos os portugueses, tanto no Continente como nas Colónias. Como era demasiado novo quando se deu o 25 de Abril que ideia foi formando desse dia a partir do que lhe contaram ou teve que estudar? Naturalmente que seria expressão de liberdade, em todos os sentidos; significaria mais oportunidades, mais liberdade para exprimir pontos de vista diferentes e, naturalmente o País iria ter condições para um desenvolvimento que até aí não tinha tido. Sabe o que aconteceu a 25 de Novembro de 1975 e o significado desse acontecimento para o país? Sei. O País estava a entrar numa nova ditadura, de clara opressão, com nacionalizações selvagens e falta de liberdade para se discordar. Estávamos a ir para um caminho pior que no tempo de Salazar - tudo era controlado e não havia hipóteses de segunda opinião, era a “voz única”… Precisamos de outro 25 de Abril? Não. Sou dos que discorda em completo dessa afirmação. Seria bom que todos fizéssemos um exame de consciência e talvez víssemos que a maioria do povo está muito melhor do que estava. Como era a vida há 40 anos? E agora? Apesar das dificuldades, muitas resultantes desta crise, o País está muito melhor. Para melhorar mais teremos todos que fazer mais por este País: dedicarmo-nos mais, sermos mais empreendedores, mais inovadores e não estarmos à espera que o Estado faça tudo por nós.

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Tem alguma memória que queira partilhar, da vida antes de 25 de Abril de 1974, seja sua ou relatada por familiares ou amigos? Tenho uma passada quando tinha 7 anos. Como era hábito em África as famílias juntavam-se aos fins-de-semana para conviver. Numa noite, que presumo ter sido um sábado, apareceram uns civis com armas na mão e foi o caos total. Percebi, mais tarde, por explicação do meu pai, que era a PIDE. Pensavam que era uma reunião conspiratória contra o regime e entraram de rompante para suspender a “dita” reunião. Ficou-me na memória, até hoje. Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? Naturalmente Salgueiro Maia e depois Jaime Neves. Vivemos em democracia? Claramente. Não tenho dúvidas. Basta ver as televisões e ler os jornais - falam de tudo, como querem e lhes apetece. Algumas vezes a Liberdade, mal usada, em Democracia põe em causa, erradamente, os valores e o bom nome das pessoas. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Os partidos políticos são a emanação do povo. Os políticos são aqueles que, em determinado momento, se predispõem para representar o povo. Não são maus nem bons, são o espelho da sociedade que somos. Se os não consideramos temos a obrigação de ter intervenção política e não sermos só treinadores de bancada. Essa posição é cómoda mas não resolve nada. Há muita gente na praça que só sabe criticar mas, quando são chamados a fazer alguma coisa, ou fazem igual ou pior. Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? Julgo que é o sector mais fustigado pela opinião pública, porque de facto alguns assuntos não andam e há demasiada burocracia. Na Justiça ainda há muito para fazer, embora pense que as pessoas dão o seu melhor;

“Os partidos políticos são a emanação do povo. Os políticos são aqueles que, em determinado momento, se predispõem para representar o povo. Não são maus nem bons, são o espelho da sociedade que somos” falta-lhes, no entanto, melhor organização, mais meios e legislação mais simples, com modelos mais eficazes. Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Já foi pior. Mas comparando com muitos países, incluindo europeus, temos um Serviço Nacional de Saúde acima da média, com grandes profissionais, faltando-lhes, em algumas situações, uma organização e modelo mais eficientes. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O poder local ou o poder central? Não tenho dúvidas que é o poder local, pela razão da sua proximidade com os cidadãos. Conhecendo melhor as suas necessidades e os seus anseios é mais fácil dar-lhes resposta. Quando falamos de Estado estamos a falar de quê e de quem? O Estado é a “coisa pública”. Para mal do País muitos portugueses não se deram ainda conta de que de facto “Estado” somos todos nós e todos nós contribuímos para a formação do Estado. Daí que, quando se trata de exigir, exige-se ao Estado, quando se trata de contribuir já não convém contribuir para o Estado… É urgente que todos compreendam quais são os seus direitos e quais são os seus deveres. Tem algum testemunho pessoal relacionado com o 25 de Abril, a democracia e

a liberdade que queira partilhar com os leitores? Nada em especial. Adoro a Democracia, não conseguiria viver sem Liberdade. O que posso dizer é que nunca deveremos baixar os braços para que a Liberdade não seja posta em causa. Só tenho receio dos que nunca partilham a liberdade, não a praticam internamente, não admitem a pluralidade no seu seio e não se abrem ao debate de ideias, mas que, todos os dias, enchem os pulmões de ar e gritam “Liberdade”... Estes são modelos de que deveremos fugir, esperando que se auto-destruam. “Liberdade” não pode ser, não é, uma palavra oca, abstracta, só teoria. “Liberdade” vive-se no dia-a-dia, na prática da vida, com o trabalho de todos nós, com os nossos valores, pensando mais do que no nosso umbigo, no Portugal que queremos deixar aos nossos filhos, esforçando-nos por construir o caminho de uma “Liberdade mais responsável” e de uma “Democracia mais adulta”. Penso que foi para isso que os mais bem intencionados militares fizeram o 25 de Abril.

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“Alguns atropelos à democracia afastam-nos dos valores de Abril” Vítor Silva Labrincha Director Comercial da Tagusgás Bem hajam os homens da Escola Prática de Cavalaria de Santarém, comandados por Salgueiro Maia, aos quais coube o papel mais importante: a ocupação do Terreiro do Paço e dos ministérios ali instalados. A coluna de blindados vindos da cidade ribatejana chega a Lisboa ainda o dia não tinha despontado, ocupa posições frente ao Tejo e controla, sem problemas, aquela importante zona da capital. O “ Pai “ da Liberdade, Salgueiro Maia, desloca parte das suas tropas para o Quartel do Carmo onde está o chefe do Governo, Marcelo Caetano, que acaba por se render no final do dia com apenas uma exigência: entregar as responsabilidades de governação ao General António Spínola, para que “o poder não caia nas ruas e “pinta” o quadro da liberdade de opinião. Anteriormente ao 25 de Abril de 1974 estão mais de 40 anos de um regime autoritário que governava em ditadura e fazia uso de todos os meios ao seu alcance para reprimir as tentativas de transição para um estado de direito democrático; a censura, a Pide a Legião e a Mocidade Portuguesa são alguns exem-

“Actualmente podemos falar livremente, viver num novo espaço europeu e ter acesso directo ao Mundo sem receio de censura ou perseguições”

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plos do que os cidadãos tinham de enfrentar no seu dia-a-dia. Noutra vertente , a pobreza, a fome e a falta de oportunidades para um futuro melhor, frutos do isolamento a que o país estava votado há décadas, provocaram um fluxo de emigração que agravava, cada vez mais, as fracas condições da economia nacional, sendo a “gota de água” que espoletou esta acção revolucionária foi sem dúvida a Guerra Colonial. A mudança demorou a ser implementada. Foi preciso empenho, coragem e sacrifícios de muitos anónimos para construir um país diferente onde pudesse existir Liberdade, Solidariedade e Democracia. Foi necessário aprendermos a viver em Democracia e a saber o significado de Tolerância. Actualmente podemos falar livremente, dizer aquilo que concordamos e o que não apoiamos, integrar associações, viver num novo espaço europeu e ter acesso directo ao Mundo sem receio de censura ou perseguições. Portugal e os portugueses tiveram de se habituar a viver em democracia para, a seguir, serem confrontados com uma aprendizagem acelerada de convivência e com a participação num espaço transaccional, a partir de 1986, com a adesão às Comunidades Europeias o que implicou a alteração radical das regras; do ponto de vista económico esta adesão viabilizou parcialmente um processo de ajustamento modernizante de valores, estruturas, atitudes e comportamentos, que teve origem em 1974, num país onde o proteccionismo e o ‘condicionamento’ foram quase sempre a regra. Apesar dos ganhos de Abril, diria que … «Tudo vale a pena se a alma não é pequena», reza um adágio português. Se assim é, então o 25 de Abril e anos consequentes só não valeram a pena se não tivermos a coragem e a honestidade de reconhecer que foram cometidos graves atropelos à democracia e erros que nos afastam dos valores de Abril (Liberdade, Solidariedade e Democracia).

40 ANOS 25 DE ABRIL A adesão à Comunidade Europeia viabilizou parcialmente um processo de ajustamento modernizante de valores, estruturas, atitudes e comportamentos”

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40 ANOS 25 DE ABRIL

“Temos o desafio de nos superarmos para fazermos todos os dias um novo Abril “ Maria do Céu Albuquerque Presidente da Câmara Municipal de Abrantes Com o 25 de Abril de 74 iniciámos um novo ciclo. Investimos em infra-estruturas, essenciais para aumentar a qualidade de vida das pessoas. Investimos na saúde, nomeadamente na prevenção. Mas também no Serviço Nacional de Saúde, inclusivo, acessível, público. Na educação, aumentando a escolaridade obrigatória e a tão esperada igualdade de oportunidades, mais recentemente com a requalificação do parque escolar. Na cultura com a criação de uma rede pública de bibliotecas municipais, de teatros municipais. Criámos uma rede de infra-estruturas científico-tecnológicas, que cria conhecimento, ciência ou tecnologia e sobretudo valor acrescentado na economia. Quisemos ultrapassar as nossas debilidades e colocar-nos a par da Europa, onde entretanto fomos integrados. Hoje podemos ter orgulho dos níveis de qualificação, da educação e da ciência que atingimos.

Sabemos que é preciso fazer mais e melhor, nomeadamente alocar os recursos de forma a permitir o desenvolvimento de uma base produtiva sustentável que permita alavancar a economia e o desenvolvimento social. Portugal precisa de desenvolver uma estratégia de crescimento económico que assente no conhecimento, na tecnologia e na ciência. Precisamos de mais qualificação e mais emprego. Nunca como agora o país viu sair os seus, os melhores à procura de oportunidade. Nunca como agora o país atingiu um nível de desemprego que afecta todos e em especial os jovens. É a falta de visão estratégica que empurra de novo o país para a pobreza. Na conjuntura actual, onde as famílias se encontram mais vulneráveis do que nunca, são as câmaras que se substituem ao Estado para garantir o acesso às condições essenciais para manter a dignidade humana. Temos o desafio de nos superarmos todos os dias. Criando, inovando. Fazendo no quotidiano um novo Abril. Nas pequenas e nas coisas maiores. As autarquias estão na primeira linha de resposta em qualquer momento, mesmo nas alturas mais conturbadas. Indo ao encontro

“Na conjuntura actual, onde as famílias se encontram mais vulneráveis do que nunca, são as câmaras que se substituem ao Estado para garantir o acesso às condições essenciais para manter a dignidade humana” das necessidades e expectativas das pessoas. Desenvolvendo políticas de proximidade. Criando condições para tornar o seu território mais competitivo. Desenvolvendo políticas de coesão. Extravasando as suas competências, mas sempre com o fim último, o de servir os seus cidadãos.

Tal como nós, o Estado tem que se adaptar, tornar-se mais amigo e mais próximo dos cidadãos e das empresas. Precisamos de um Estado mais eficiente, mais eficaz, mas acima de tudo, mais justo e mais credível. Para que todos possamos saber com o que contar, precisamos de um novo compromisso com o contrato social.

“Sem o 25 de Abril eu não teria sido eleito para o cargo que ocupo hoje” Rui Medinas Presidente da Câmara Municipal da Golegã Precisamos de outro 25 de Abril? A minha convicção é de que não precisamos. Apenas precisamos que os que ainda têm medo, receios ou dúvidas, se libertem. Isso deve acontecer no dia-a-dia, nas decisões que cada um de nós é chamado a tomar. Tem alguma memória que queira partilhar, da vida antes de 25 de Abril de 1974, seja sua ou relatada por familiares ou amigos? Há época ainda não tinha cinco anos completos pelo que as recordações não estão muito presentes. Dos relatos de familiares, registo um que me parece fazer toda a diferença entre o antes e o depois: o medo que pairava e que inibia as pessoas de falarem livremente, em grupo particularmente, umas com as outras. Tem algum testemunho pessoal relacionado com o 25 de Abril, a democracia e a liberdade que queira partilhar com os leitores? De facto sim e bem recente por sinal, que faço gosto em poder

“O Estado é de todos e de cada um de nós. É esse o grande desafio do século XXI que se nos coloca” 10

partilhar com os leitores. Há circunstâncias em que a vida nos proporciona momentos únicos, absolutamente excepcionais. Quem diria que, aos 44 anos, saberíamos entender muito melhor e valorizar extraordinariamente o significado do que ocorreu há 40 anos. Se não vivêssemos em democracia, certamente, hoje não seria presidente da Câmara Municipal da Golegã. Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? O General António Ramalho Eanes, personalidade ilustre, muitas vezes esquecida em todo o processo de consolidação do regime democrático que hoje vivemos em Portugal uma vez que todos nos focalizamos sempre na Revolução dos Cravos em Abril de 1974, mas que liderou com sucesso o movimento militar de operacionais que em 25 de Novembro de 1975 parou o Processo Revolucionário em Curso (PREC), permitindo assim o crescimento à jovem democracia iniciada um ano e meio antes. O país ficou a ganhar com o 25 de Novembro de 1975? Sim, com certeza. Após um Verão Quente de disputa entre forças revolucionárias e forças moderadas, pela ocupação do poder do Conselho da Revolução, civis e militares começaram a contar espingardas para um possível confronto armado. Este, tantas vezes anunciado pareceu por fim inevitável, quando, na madrugada de 25 de Novembro de 1975, tropas pára-quedistas ocupam diversas bases aéreas, na expectativa de receber apoio do COPCON. Mas opondo-se-lhes eficazmente um grupo operacional de militares, chefiado por Ramalho Eanes, impediu a revolta substituindo o PREC - “Processo Revolucionário em Curso” pelo “Processo Constitucional em Curso”. O país ficou a ganhar.

“Vivemos em democracia mas constato que, passados 40 anos, muitos dos meus concidadãos ainda não se conseguiram libertar! Afinal, o país que temos hoje é o reflexo do somatório das atitudes e dos comportamentos individuais. Será que se acomodaram?” Vivemos em democracia? Sim, vivemos em democracia. Constato, no entanto, que passados 40 anos, muitos dos meus concidadãos ainda não se conseguiram libertar! Afinal, o país que temos hoje é o reflexo do somatório das atitudes e dos comportamentos individuais. Deixo uma reflexão: Será que se acomodaram? Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? São pilares fundamentais do nosso sistema democrático. Obviamente com erros ao longo do percurso! Mas viveríamos melhor, ou teríamos um sistema democrático mais evoluído, mais maduro, protagonizado pelos falsos movimentos de independentes que, salvo honrosas excepções, estão ao serviço de projectos

pessoais que não conseguiram fazer vingar dentro dos partidos que tanto criticam, e de onde são originários. Em absoluto, não, não estaríamos melhor. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O poder local ou o poder central? Sem qualquer dúvida, o Poder Local. Duas palavras. Sensibilidade, proximidade. Quando falamos de Estado estamos a falar de quê e de quem? De todos e de cada um de nós. É esse o grande desafio do século XXI que se nos coloca. Talvez com as gerações vindouras esse desígnio se concretize e consolide. 17/ABR/14 O MIRANTE


40 ANOS 25 DE ABRIL

“O 25 de Abril não é uma foto mas sim um filme em movimento...” Nuno Pinto de Magalhães

mulher na sociedade portuguesa, como a neDirector de Comunicação cessidade de, para se deslocarem ao exterior, da Sociedade Central de Cervejas precisarem de ter a autorização expressa dos maridos...Já para não falar no impacto trauOnde estava no 25 de Abril e o que sentiu matizante que a guerra colonial tinha nas faquando soube o que se estava a passar? mílias portuguesas ... No dia 25 de Abril de 1974 tinha acaba- Quem é a pessoa que melhor simboliza do de fazer 18 anos, estava no 7.º ano, no o 25 de Abril? Em vez de pessoa, escolho Liceu Pedro Nunes, em Lisboa, e soube da a Manifestação em Julho de 1975, na Fonnotícia por um telefonema do meu pai que te Luminosa. tinha ido à Alemanha e que possivelmente Vivemos em democracia? Sim, repito, apenão conseguia regressar na data prevista por sar do sistema em que vivemos necessitar de o aeroporto de Lisboa estar condicionado permanente ajustamento às realidades e depor movimentações de tropas! A minha pri- safios de um Mundo cada vez mais Global. meira reacção foi perceber melhor o que se Que avaliação faz dos partidos políticos estava a passar e qual o propósito desta mo- ao longo dos últimos 40 anos? Com os vimentação! Foi um sentimento simultâneo seus altos e baixos, mas em constante evolude expectativa, de curiosidade, de alguma in- ção e nem sempre para melhor, nem com os segurança e mais tarde de esperança por um melhores. Temos assistido a um downgrade mundo melhor, mais aberto, mais moderno, da qualidade dos políticos ... Contudo, não mais livre e com maior igualdade de oportu- consigo conceber o regime democrático sem partidos políticos. nidades para todos... Sabe o que aconteceu a 25 de Novembro Que avaliação faz da forma como funciode 1975 e o significado desse aconteci- na a justiça? Pouco eficaz, lenta, burocrátimento para o país? O 25 de Novembro foi ca, desacreditada e corporativa é a principal o restabelecer, após um período de grande causa, quanto a mim, da desacreditação dos turbulência política de golpes e contra gol- cidadãos nas instituições. No entanto, tampes, do espírito que esteve na base do 25 de bém nesta matéria penso que está em curso Abril, ou seja o da democracia representati- uma reforma na qual deposito grandes exva, baseada no voto popular, à semelhança pectativas e esperança. do que se vivia na grande maioria dos países Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional da Europa Ocidental. Precisamos de outro 25 de Abril? Não. Co- de Saúde? Em termos gerais de uma forma mo disse Winston Churchill “A democracia positiva, embora exista sempre espaço para é a pior forma de Governo, à excepção de melhorar. Reconheço todavia uma dedicação todas as outras que foram experimentadas.” e profissionalismo relevantes, às vezes ainda O sistema democrático representativo que sem os meios necessários, mas sem dúvida temos funciona, tem é que ser permanente- esta foi, e é, uma das grandes conquistas do mente aperfeiçoado e ajustado à realidade. regime democrático, nomeadamente a acesMas é do interesse de todos manter a estabi- sibilidade a todos os cidadãos. lidade, sem a qual é impossível continuar um Quem melhor serve os cidadãos e usa os caminho de crescimento e desenvolvimento. recursos disponíveis? O poder local ou o Mesmo que por vezes exista a tentação de poder central? Temos melhores exemplos pensar que “isto com uma revolução é que no poder local, mas a dimensão das suas se resolvia...”, e apesar das “dores” por que questões e a sua proximidade com os cidatemos passado nos últimos tempos, o facto dãos interessados tem sido um facilitador. é que, estamos indubitavelmente melhor do Temos, todavia, nas autarquias casos isolaque estávamos há 20 anos. Logo, a solução dos de verdadeira corrupção e atentados ao passa por corrigir, ajustar e não por inter- ambiente, onde tudo vale ... romper bruscamente o caminho - “o 25 de Quando falamos de Estado estamos a faAbril não é uma foto, mas sim um filme em lar de quê e de quem? De todos nós, que elegemos os nossos representantes para nos movimento ...” Tem alguma memória que queira parti- governarem... Sou favorável ao regime do lhar da vida antes de 25 de Abril de 1974, voto obrigatório. O cidadão individual tem seja sua ou relatada por familiares ou essa responsabilidade perante o colectivo e amigos? São diversas as memórias e nem quando não a exerce deveria perder o direito todas más, diga-se de passagem, mas o que de manifestar-se. mais me chocava era o papel subalterno da Tem algum testemunho pessoal relacionado com o 25 de Abril, a democracia e a liberdade que queira partilhar com os leitores? Tive experiências únicas que me ajudaram na minha formação como homem, cidadão e profissional, durante a década de 70, tais como: ter concorrido às eleições da Associação da Faculdade de Direito, ter concorrido e sido eleito Delegado Sindical, pelo Sindicato dos Escritórios e ter ganho as eleições numa lista para a Comissão de Trabalhadores da Sede da Central de Cervejas, lista essa que integrava pessoas com quem aprendi muito como o Dr. Nascimento Rodrigues, que foi ministro do Trabalho do VII Governo Constitucional, Consultor da OIT e único português a presidir à Conferência Internacional do Trabalho e ainda Provedor de Justiça da República Portuguesa.

“Sou favorável ao regime do voto obrigatório. O cidadão individual tem essa responsabilidade perante o colectivo e quando não a exerce deveria perder o direito de manifestar-se”

“A justiça é pouco eficaz, lenta, burocrática, desacreditada e corporativa é a principal causa, quanto a mim, da desacreditação dos cidadãos nas instituições”

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40 ANOS 25 DE ABRIL

“Não concebo a democracia sem mais igualdade e mais justiça social” Francisco Oliveira Presidente da Câmara Municipal de Coruche Na madrugada de 25 de Abril estava na Azambuja. Tinha apenas 9 anos mas apesar de ainda criança o rebuliço que se passava, a alegria e a ansiedade das pessoas e sobretudo as canções que ficaram conotadas como as canções de Abril e da Liberdade faziam eco na rádio. Vivia-se o momento com grande alegria, mas ao mesmo tempo ninguém sabia ao certo como seria o futuro.

“Uma das maiores conquistas de Abril foi o Poder Local, a verdadeira porta aberta do Estado e que contribuiu para o desenvolvimento económico e social do país”

Portugal acabado de sair de uma ditadura pelas mãos do MFA era ainda instável, o que seria este novo Portugal livre? O entusiasmo da democracia e de tudo aquilo que era possível e durante décadas tinha sido adiado. O meu percurso foi feito em Liberdade e o 25 de Abril representa os valores e princípios que fazem a democracia, não concebo a ideia de democracia sem mais igualdade, mais justiça social, um SNS, emprego e escola pública. Dizia a canção de Sérgio Godinho que “só há liberdade a sério quando houver / a paz, o pão, habitação, saúde, educação” e “quando houver liberdade de mudar e decidir”. A liberdade, esta liberdade estava acima do sonho e queria políticas concretas num palco de instabilidade, marcando o 25 de Novembro de 1975, o final do período revolucionário que se seguiu ao 25 de Abril. Nesta altura Portugal estava à beira de uma guerra civil, no chamado «Verão Quente», havia em Portugal um clima de tensão latente. Houve ataques às sedes dos partidos políticos, as quais eram saqueadas e queimadas, a reforma agrária, os saques, o controlo da comunicação social, a unidade sindical, temia-se que uma nova ditadura se instalasse e desta vez uma ditadura comunista. O 25 de Novembro e personalidades como

“Como autarca em Coruche sinto a missão de servir a causa pública, de promover o desenvolvimento do meu concelho e de lutar para contrariar as ameaças às conquistas de Abril” Mário Soares foram determinantes na nossa história e permitiram que ideais fossem materializados na constituição e o rumo da democracia prosseguisse sem riscos. Quarenta anos volvidos da Revolução dos Cravos é inegável a evolução de Portugal quer em matéria de acesso à educação quer em matéria de desenvolvimento, mas é também inegável que a canção da Liberdade continua nos tempos de hoje em que tantas das conquistas de Abril são colocadas em causa a fazer sentido, sobretudo quando diariamente a pobreza aumenta, o SNS e a escola pública são ameaçados e a equidade social é cada vez menor. Não se trata de uma nova revolução, mas fazer cumprir Abril. Uma das maiores conquistas de Abril foi o Poder Local, a verdadeira porta aberta do Estado e que contribuiu para o desenvolvimento económico e social do país. Como autarca em Coruche sinto essa missão de servir a causa

pública, promover o desenvolvimento do meu concelho e lutar para contrariar essa ameaça às conquistas de Abril; cada vez que um munícipe se dirige ao meu atendimento por motivos de pobreza, falta de emprego, por não ter médico de família ou quando nos retiram serviços públicos de proximidade. “Vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar” e um país só pode estar melhor se as pessoas viverem melhor. Porque Abril foi feito por pessoas, para um país livre. É essa a luta que quem assume responsabilidades deve cumprir.

“Com tristeza vejo centros “Presenciei o ataque de forças de saúde encerrados e militares ao RALIS pessoas sem médico” (Sacavém). Foi José António Oliveira

Presidente do Conselho de Administração dos SMAS de Vila Franca de Xira Onde estava no 25 de Abril e o que sentiu quando soube o que se estava a passar? Encontrava-me a trabalhar nesse dia procurei saber o que se estava a desenrolar à minha volta. Infelizmente, só após as 18h00 a empresa permitiu a saída dos funcionários, o que levou a uma “correria” à informação. Claro que, lentamente, a verdadeira liberdade veio chegando, à data, através de inúmeras formas. Sendo jovem, foi muito importante para o meu desenvolvimento como cidadão toda a liberdade obtida. Como viveu o que se seguiu ao 25 de Abril? Nesse período, e sendo já trabalhador-estudante, todo o desenvolvimento da revolução foi vivido em todas as suas peripécias, desde o PREC até à solidificação do Movimento das Forças Armadas. Sabe o que aconteceu a 25 de Novembro de 1975 e o significado desse acontecimento para o país? Foi um dos momentos mais importantes na fase revolucionária, em que o “25 de Abril” estava a ser colocado em causa. Felizmente, no interior do Conselho da Revolução, existiram mentes lúcidas que evitaram esse perigo. A história é testemunha disso. Precisamos de outro 25 de Abril? Neste capítulo teremos de enquadrar o “tipo” de 25 de Abril, se é que eles existem. Se é o defender as conquistas sociais e liberdades

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conquistadas há 40 anos… que se encontram gradualmente em perigo… pela via democrática será de pensar nisso. O voto é uma arma muito forte. A abstenção não. Tem alguma memória que queira partilhar, da vida antes de 25 de Abril de 1974, seja sua ou relatada por familiares ou amigos? Como jovem à data e trabalhador numa indústria do Estado (Exército) o dia-a-dia era feito com muito cuidado, pois a disciplina militar também se aplicava aos trabalhadores civis, seria mais pelo que ia ouvindo dos colegas mais velhos. No entanto lembro-me que presenciei o ataque de forças militares ao RALIS (Sacavém), - nesse dia nem se trabalhou… -, foi algo que jamais esquecerei. A negociação e rendição dos revoltosos e perto da hora de jantar… tudo desapareceu. Foi um facto! Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? À data: Capitão Salgueiro Maia. Sem dúvida. Vivemos em democracia? Com todas as diferenças políticas e ideológicas, direi que sim. Um bom exemplo é esta entrevista/depoimento. Hoje é possível; em 24.04.1974, não. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Como tudo na vida. Viveu-se de tudo. Participou-se em tudo. Hoje, penso sinceramente que cada vez mais os partidos políticos devem fazer uma análise interior neste século devido ao facto de em cada segundo a sociedade estar em constante mudança. A luta pela sobrevivência vem criar distâncias entre estruturas que dificilmente podem vir a ter bons resultados.

algo que jamais esquecerei. A negociação e rendição dos revoltosos e perto, da hora de jantar… tudo desapareceu. Foi um facto!” Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? Nesta área…a edição não chegaria para a resposta. Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Com uma tristeza profunda. Basta verificar as contas do Ministério. Centros de Saúde encerrados, milhares de utentes sem médicos. Kms percorridos entre montes e vales, vales e montes, para uma urgência. VMERS paradas sem tripulações. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O poder local ou o poder central? Aqui, não tenho dúvidas. O poder local. Aquele que verdadeiramente está junto do seu eleitor. Mas um poder constantemente atacado nas suas competências todos os dias. É público. Quando falamos de Estado estamos a falar de quê e de quem? Estado deveríamos ser todos, mas temos (já o referi) a abstenção que leva a um Estado cada vez mais “fraco”. Tem algum testemunho pessoal relacionado com o 25 de Abril, a democracia e a liberda-

de que queira partilhar com os leitores? Pessoalmente, posso dizer que sendo no início da minha vida um trabalhador diurno e estudante nocturno, o “25 de Abril” possibilitou-me estudar, criar condições pessoais sustentáveis, mas também ter uma consciência de que trabalhar para a “causa pública” é aliciante, mas muitas vezes incompreendido, sendo neste capítulo a face mais visível para uma solução que se quer rápida. O trabalho autárquico nunca está terminado. Diariamente os desafios são diferentes e constantes. As pessoas merecem esse respeito.

17/ABR/14 O MIRANTE


“Celebrar Abril é denunciar o que põe em causa a liberdade”

40 ANOS 25 DE ABRIL

“Tirando a liberdade o resto foi uma desilusão”

Ricardo Gonçalves

João Artur Rosa

Presidente da Câmara Municipal de Santarém

Administrador da Risa

Sempre ouvi falar da noite agitada e igualmente serena de 24 para 25 de Abril. Sabemos que as revoluções trazem consigo alterações profundas e esta teve consequências incríveis no nosso país, derrotando um regime fascista e ditatorial de mais de quarenta décadas, que censurou e silenciou o povo português. Esperava-se muito desta revolução. Com toda a legitimidade, o povo contava com melhores condições de vida e um futuro melhor para os seus filhos e por isso aderiu de alma e coração aos ideais do Movimento das Forças Armadas, na esperança de que com novas pessoas e outro sistema político as coisas evoluíssem com a criação de novas oportunidades. Os meses que se seguiram à revolução foram caracterizados por alguma confusão, sendo, felizmente, findados com o golpe contra-revolucionário do 25 Novembro de 1975. A revolução trouxe a liberdade imediata e a contra revolução a liberdade efectiva. Conquistaram-se direitos fundamentais como a liberdade de expressão e de pensamento, a liberdade cultural e a liberdade eleitoral e, lentamente, as condições de vida foram melhorando. Mas o país foi lançado numa desordem política, social e económica da qual passados 40 anos não conseguimos recuperar totalmente. A situação tem piorado de dia para dia com o incremento do custo de vida e o encerramento de muitas empresas, originando os grandes níveis de desemprego, actualmente vividos, sem que os governantes consigam dar uma resposta efectiva a este flagelo. Os tempos de crescentes dificuldades económicas e sociais exigem maior responsabilidade por parte dos agentes políticos. Há que reparar a confiança da sociedade civil na classe política, desgastada por um sistema que “substituiu a excelência pelo favoritismo”. É necessário um empenhamento muito grande, político e social, no sentido de promover as transformações que são precisas fazer na nossa economia. A existência de uma capacidade política mobilizadora é fundamental, não se podendo aceitar que o intento de um Estado se resuma apenas a percentagens e números. Importa traçar um rumo constante de prosperidade para Portugal. Para a minha geração celebrar Abril e viver a democracia é denunciar, com serenidade e exigência, os perigos que põem em causa a liberdade dos cidadãos. Cada um de nós tem o dever de contribuir para o aperfeiçoamento do sistema democrático que nos comanda, melhorando o dia a dia e perseguindo a esperança e a liberdade que motivou Abril. Como autarca devo esta especial responsabilidade da defesa do poder democrático que nasceu em Abril, defendendo a proximidade das pessoas e a legítima preocupação em satisfazer as suas necessidades e O MIRANTE 17/ABR/14

“Há que reparar a confiança da sociedade civil na classe política, desgastada por um sistema que “substituiu a excelência pelo favoritismo”

“Sinceramente, não gosto muito de falar do 25 de Abril. Em 1974 tinha vinte anos e para mim foi o despertar para a política. Acreditei que era possível, através da democracia, criar um sistema melhor para todos. Passados quarenta anos reconheço que a grande vantagem da democracia foi a liberdade, nomeadamente a liberdade de expressão. Tudo o resto foi uma desilusão, pois o poder económico e financeiro condicionam a democracia em geral e tenho dúvidas que o inverso seja possível”

resolver os seus problemas. Tem sido a partir desta contante ambição que temos alicerçado toda a nossa história e os seus sucessos, pelo que importa dignificar o passado e honrar os ideais e valores da liberdade.

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40 ANOS 25 DE ABRIL

“A diabolização dos políticos não ajuda em nada a preservar a democracia” Vasco Estrela Presidente da Câmara Municipal de Mação Como era demasiado novo quando se deu o 25 de Abril (tinha dois anos e meio) que ideia foi formando desse dia a partir do que lhe contaram ou teve que estudar? A ideia de que o País se tinha libertado de um regime ditatorial, onde a liberdade de expressão não existia, as liberdades individuais eram cerceadas e que, em bom rigor, impedia o desenvolvimento do mesmo ao nível económico e social e do próprio País como um todo. Sabe o que aconteceu a 25 de Novembro de 1975 e o significado desse acontecimento para o país? O 25 de Novembro teve uma grande importância para a estabilização da democracia em Portugal, porque impediu a concretização de alguns excessos que poderiam pôr em causa o processo iniciado em 25 de Abril de 74. Precisamos de outro 25 de Abril? Precisamos que os valores do 25 de Abril se concretizem na plenitude e que Portugal seja um País que propicie aos seus cidadãos igualdade de oportunidades, independentemente da raça, credo, situação socioeconómica ou local de residência. Todos nós, enquanto cidadãos, temos obrigação de ajudar a que os desígnios de Abril ajudem Portugal.

Tem alguma memória que queira partilhar, da vida antes de 25 de Abril, que lhe tenha sido relatada por familiares ou amigos? Tenho relatos de familiares meus que tiveram “problemas” por manifestarem opiniões contrárias ao regime de Salazar. Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? Felizmente, em Portugal existem muitas pessoas que têm simbolizado o 25 de Abril ao longo destes 40 anos, por atitudes e práticas consentâneas com os objectivos daqueles que fizeram aquele dia. Vivemos em democracia? Parece-me evidente que vivemos em democracia. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Como em todas as actividades, e sendo próprio da natureza humana, há políticos e políticas que merecem avaliação positiva e negativa. A diabolização dos políticos, nos quais me incluo, não ajuda em nada a preservar a democracia e a desenvolver Portugal. Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? A justiça em Portugal, como outros sectores da actividade do Estado, tem sido, ao longo dos anos, alvo de uma degradação da sua imagem, que importa alterar porque entendo que a esmagadora maioria dos agentes da justiça não merecem os epítetos de que têm sido alvo e também eles fazem o melhor para que um pilar

“As ingerências do Governo nas autarquias são contrárias aos ideais de Abril” Alberto Mesquita Presidente da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira Falar sobre o 25 de Abril, quando se comemora o 40.º aniversário da Revolução, é, no meu caso particular, falar de um momento de grande emoção, de sonhos e utopias. Hoje, passadas quatro décadas, tenho o sentimento do dever cumprido, mas também a consciência de que ainda não se conseguiram direitos que supostamente eram adquiridos, mas que em ápices, deixam de o ser. É inegável que Portugal e os portugueses têm hoje melhor qualidade de vida do que há 40 anos. Temos, no concelho de Vila Franca de Xira, abastecimento de água e saneamento, temos acessibilidades, temos espaços de cultura, de lazer, de recreio e desporto, temos equipamentos de saúde, de ensino e de apoio social. Ou seja, concretizámos muitos dos sonhos de Abril.

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Também não é menos verdade que deveremos continuar a cumprir Abril. É um caminho exigente, a percorrer todos os dias. Sobretudo na luta contra a pobreza e exclusão social, pela igualdade plena de direitos entre todos os cidadãos, pelo combate ao desemprego e o direito ao trabalho, à habitação, à saúde, à educação e à segurança. A diferença entre o Abril já cumprido e o Abril a cumprir está, também, na diferença entre a Administração Local (que, na generalidade, cumpre) e a Central (que na essência não tem vindo a cumprir). Aproveito aqui para introduzir uma questão, a meu ver, tão importante como é o papel dos municípios e das freguesias na consolidação do regime democrático. É comummente reconhecido que a nossa proximidade, enquanto autarcas, da população e dos seus problemas, é benéfica, porque quanto mais próximos, mais identificados estamos com as necessidades dos cidadãos. Por isso, se têm revelado boas as decisões de transferências de competências e meios, quer da administração central para os municípios, como destes para as freguesias, desde que, naturalmente, acompanhada pelos essenciais recursos financeiros e humanos para a sua execução, como sucede no concelho de Vila Franca de Xira. As ingerências permanentes do Governo e da Administração Central na autonomia das autarquias, consagrada na Constituição, e, por con-

“A justiça em Portugal tem sido, ao longo dos anos, alvo de uma degradação da sua imagem que importa alterar. A maioria dos agentes da justiça não merecem os epítetos de que têm sido alvo porque fazem o melhor para que um pilar essencial da democracia cumpra o seu papel” essencial da democracia cumpra o seu papel. Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Um testemunho muito positivo, com excepção de um caso pontual, não tenho, pessoalmente, razão de queixa do SNS. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O poder local ou o poder central? Independentemente do cargo que ocupo, parece-me inequívoco, porque os dados também o referem e a população também o sente, que é o Poder Local. Quando falamos de Estado estamos a falar de quê e de quem? Estamos a falar de todos nós, que temos a obrigação de exigir que aque-

les que, em cada uma das ocasiões e circunstâncias, administram a causa pública o façam tendo em conta que gerem aquilo que é de todos e que está ao serviço do povo, na prossecução de interesses comuns e não individuais. Tem algum testemunho pessoal relacionado com o 25 de Abril, a democracia e a liberdade que queira partilhar com os leitores? Não partilho nenhum testemunho, mas permito-me solicitar a todos que, em todos os momentos, contribuam para que os ideais que nortearam o 25 de Abril sejam cumpridos. Todos temos essa obrigação, nos direitos e deveres que temos e devemos sempre observar.

“É urgente voltar a introduzir na agenda política uma matéria da maior importância e que se assume como a grande possibilidade de consolidar o poder dos municípios a favor das pessoas. Falo da Regionalização. É o próximo passo que Abril deve cumprir” seguinte, na capacidade destas em responder aos problemas concretos da população, são absolutamente contrárias aos ideais de Abril. Por isso, coloco uma questão: vivemos em que Democracia? As instituições democráticas funcionam e não são postas em causa. É também verdade que as forças de poder operam hoje em dia, em muitos casos, em outros organismos dirigidos por não eleitos. E o poder político democraticamente eleito, e por isso representativo da população, perde muitas vezes poder de influência face a outras regras de funcionamento da sociedade. Por tudo isto, também considero que é urgente voltar a introduzir na agenda política uma matéria da maior importância e que se assume como a grande possibilidade de consolidar o poder dos municípios a favor das pessoas. Falo da Regionalização. É o próximo passo que Abril deve cumprir.

“A diferença entre o Abril já cumprido e o Abril a cumprir está, também, na diferença entre a Administração Local (que, na generalidade, cumpre) e a Central (que na essência não tem vindo a cumprir)” 17/ABR/14 O MIRANTE


“Acredito que vamos retomar o Portugal solidário de Abril”

40 ANOS 25 DE ABRIL

Diamantino Duarte Administrador Delegado da Resitejo - Gestão e Tratamento dos Lixos do Médio Tejo Falar do 25 de Abril de 1974 é falar de algo que para a minha geração se tornou um marco nas nossas vidas. Para mim em especial é recordar um momento único que tive a felicidade de poder viver por dentro, minuto a minuto desde as 7 da manhã desse inesquecível dia. Era como militar da Armada e estava de serviço do centro de comunicações do Grupo Número Dois das Escolas da Armada no Alfeite. Quando tive a felicidade de ouvir as primeiras comunicações dos meus camaradas sobre o movimento que já decorria no Terreiro do Paço de imediato percebi que aquilo que para nós, militares com algum conhecimento da realidade e eu felizmente pude tê-la, há muito pressentíamos, estava finalmente a acontecer. Esse foi o dia que mudou o curso da história não só em Portugal, mas que também veio a ter importância noutros países como a Espanha e a Grécia. Infelizmente para Portugal os tempos que se seguiram não foram tempos fáceis. Muita gente aproveitou essa janela para ajustar contas com o passado. As expropriações que então ocorreram são disso um mau exemplo, assim como outros factos que em nada se justificavam. Relembro só algumas: a célebre manifestação silenciosa, as agressões físicas registadas na reforma agrária, as perseguições pessoais, etc. Felizmente que muita gente da sociedade civil e muitos dos militares de Abril nunca se deixaram embriagar por esta onda e conseguiram ter a sensatez necessária para que Abril se cumprisse até hoje. É verdade que o Portugal de hoje já muito pouco tem a ver com o meu Portugal de Abril, pois esse Portugal era e foi durante alguns anos um Portugal fraterno, onde o princípio da solidariedade social era a sua principal marca, onde foi possível construir um verdadeiro Serviço Nacional de Saúde e se criaram as condições para que ricos e pobres tivessem o mesmo direito à sua educação. Onde foi possível criar um poder local que sempre soube estar ao serviço das suas populações, criando de uma forma, que hoje podemos considerar excepcional, as condições básicas para um melhor bem-estar das sua populações. Para ilustrar esse facto recordo só duas medidas levadas a efeito por este poder local: o fornecimento da energia eléctrica e o abastecimento de água que em 1974 ainda não eram um bem ao alcance de todos os portugueses.

“Hoje temos um Portugal onde a ganância e o oportunismo têm a primazia e onde impera o ‘chico espertismo’ e não a competência”

O MIRANTE 17/ABR/14

“Continuo a ter a esperança que esta crise nos vai obrigar, a todos, a repensar a nossa sociedade e que esse repensar nos traga o conhecimento, a lucidez e a humildade para retomar o Portugal de Abril” Hoje temos um Portugal onde impera o “eu” e onde pouco importa o “vizinho”, onde a ganância e o oportunismo tem a primazia, onde impera o “chico espertismo” e não a competência, onde os que têm a responsabilidade de gerir os destinos do País não são os mais competentes mas são aqueles que fazendo da vida política a sua profissão vão ocupando os lugares de acordo com a sua filiação partidária, onde temos uma justiça cada vez mais desigual. Todos os dias somos confrontados com notícias de uma justiça para pobres e uma justiça para ricos. Este não é o Portugal que Salgueiro Maia e Melo Antunes sonharam quando, conjuntamente com muitos homens bons, fizeram Abril. Apesar do momento difícil que vivemos continuo a ter a esperança que esta crise nos vai obrigar, a todos, a repensar a nossa sociedade e que esse repensar nos traga o conhecimento, a lucidez e a humildade para retomar o Portugal de Abril, o Portugal solidário, o Portugal onde o problema do meu semelhante também é o meu, o Portugal onde não exista desemprego, não exista a pobreza, onde não existam crianças que pelo facto dos seus pais não terem condições financeiras, ficam impedidas de aceder ao conhecimento, à educação e à saúde, onde os mais velhos, depois de uma longa vida dura de trabalho, possam gozar merecidamente a sua reforma e onde possamos continuar a VIVER ABRIL e celebrar aqueles que o proporcionaram.

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“Vivemos em democracia embora haja quem nos queira convencer do contrário” Paulo Queimado Presidente da Câmara Municipal da Chamusca Como ainda não era nascido quando se deu o 25 de Abril que ideia foi formando desse dia a partir do que lhe contaram ou teve que estudar? Para quem nasceu, como eu, na geração pós 25 de Abril, e não vivemos este marco histórico do nosso país, é difícil perceber o clima que se vivia antes da Revolução dos Cravos. No entanto, sempre me foram transmitidos os valo-

“Já me dizia um antigo presidente de junta que um euro no Estado central vale um e meio numa câmara e dois numa junta”

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res de Abril pelos meus pais e as dificuldades que toda a gente passou antes do 25 de Abril. Mas o que sempre me foi transmitido foi de uma luta feita pela implementação de um regime democrático e em defesa de uma solução política para a guerra colonial. Sabe o que aconteceu a 25 de Novembro de 1975 e o significado desse acontecimento para o país? O 25 de Novembro foi o momento depois do Verão Quente de 75, momento de euforia após as primeiras eleições livres por sufrágio universal em que, a meu ver, se começa a delinear efectivamente um Estado democrático em Portugal. A tentativa de golpe de Estado com a ocupação das forças pára-quedistas, o processo de contra-revolução, e todos os acontecimentos posteriores até ao final do ano significam a consolidação do Estado de direito democrático que vivemos até hoje. Precisamos de outro 25 de Abril? Acho que não precisamos de outro 25 de Abril. Do que precisamos é de mais pessoas sérias, justas e com princípios. Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? Sem dúvida, Salgueiro Maia. Vivemos em democracia? Vivemos em plena democracia, embora ainda haja gente que queira fazer parecer que não. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Como todas as organizações são feitas por pessoas, umas mais

“Acho que não precisamos de outro 25 de Abril. Do que precisamos é de mais pessoas sérias, justas e com princípios.” competentes, outras mais sérias… Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? Com a reforma do mapa judiciário tenho a certeza que estamos a retroceder. Os tribunais, símbolos de um Estado de direito, estão a desaparecer das nossas vilas e cidades e, não havendo proximidade, sente-se um abandono da justiça em relação ao cidadão. Isso sim pode criar um problema. Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Tenho sido sempre muito bem atendido. Mas também aqui existem algumas lacunas nomeadamente nos serviços de proximidade ao utente. É um problema com que nos deparamos nas freguesias mais distantes, mas que com a boa vontade dos serviços de saúde,

temos vindo a suprir. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O poder local ou o poder central? Cada um nas suas competências serve bem os cidadãos. As opções políticas é que podem não ser as melhores. Mas considerando que as juntas de freguesia são aquelas que estão mais próximas da população, são aquelas que prestam um serviço mais directo ao cidadão. E já me dizia um antigo presidente de junta que um euro no Estado central vale um e meio numa câmara e dois numa junta. Quando falamos de Estado estamos a falar de quê e de quem? Estamos a falar de todos nós, cidadãos com direitos e deveres.

17/ABR/14 O MIRANTE


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“O poder local tem vindo a ser atacado e tenta-se diminuir a sua capacidade de intervenção” Carlos Coutinho Presidente da Câmara Municipal de Benavente Onde estava no 25 de Abril e o que sentiu quando soube o que se estava a passar? Tinha completado 11 anos e não tinha ainda consciência do que estava a acontecer. Frequentava a telescola no edifício onde hoje está instalada a Junta de Freguesia de Samora Correia e, nesse mesmo dia, na escola apercebi-me que algo se estaria a passar até porque um dos meus colegas que residia junto ao antigo posto emissor do Rádio Clube Português transmitiu-nos que os militares estavam lá junto das populações e até referiu que a população estaria a partilhar com os militares as laranjas dos quintais. Como era demasiado novo quando se deu o 25 de Abril que ideia foi formando desse dia a partir do que lhe contaram ou teve que estudar? Senti que os tempos que se seguiram ao 25 de Abril foram empolgantes mesmo para uma criança como eu era, até porque a minha família estava muito ligada ao que foi a contestação ao regime fascista, por isso participei no movimento que surgiu com a revolução. Foi algo muito bonito na vida dos portugueses vivenciando-se uma grande disponibilidade de todos para participarem na resolução dos problemas colectivos e na satisfação após as conquistas que iam conseguindo. Fui ganhando, não só uma consciência política na altura mas tomando igualmente consciência do que foram 50 anos de fascismo com a negação aos portugueses de um acesso a uma condição de vida melhor. Sabe o que aconteceu a 25 de Novembro de 1975 e o significado desse acontecimento para o País? Antecedendo o 25 de Novembro tivemos o chamado “Verão Quente” onde estava em curso o PREC em que as forças de esquerda estavam a implementar um conjunto de medidas revolucionárias entre as quais as nacionalizações e a reforma agrária. Porém, começou a surgir alguma violência quando começaram a incendiar as sedes do Partido Comunista sobretudo no norte do País e vivíamos uma situação de iminente guerra civil. As forças armadas estavam divididas, uma parte afecta a uma ala mais à esquerda outra parte a uma ala mais à direita e no dia 25 de Novembro estivemos muito próximos de escrever uma página muito complicada na vida dos portugueses. Na altura estiveram envolvidas grandes potências mundiais, recordo a intervenção do embaixador dos EUA, Frank Carlucci. Na realidade ficámos também sem saber o que seria o nosso caminho se tivessem sido prosseguidas as medidas que estavam a ser preparadas. Precisamos de outro 25 de Abril? Não precisamos de outro mas de respeitar os ideais da Revolução, porque todos aqueles que estiveram na luta, e alguns perderam a sua vida por ela, nunca lhes passaria pela cabeça que chegaríamos onde estamos hoje com uma grande parte da população a passar tantas dificuldades. Não precisamos de outro 25 de Abril mas sim de alterar as políticas que têm sido prosseguidas no nosso País. Tem alguma memória que queira partilhar, da vida antes de 25 de Abril de 1974, seja sua ou relatada por familiares e amigos? Vivíamos num regime muito fechado e embora houvesse actividade política ela era feita de forma a que não tivéssemos acesso, mas o que O MIRANTE 17/ABR/14

sempre me foi relatado por familiares e amigos foi a vontade de mudança. Contavam que acolhiam em suas casas alguns opositores ao regime que tinham que viver na clandestinidade. Alguns familiares meus estiveram directamente envolvidos durante anos na luta anti-fascista. Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? O 25 de Abril não é algo onde possamos individualizar alguém, temos a figura de Salgueiro Maia como aquela que identifica a Revolução, mas prefiro destacar os portugueses no seu todo porque o que seria um golpe de Estado levado a cabo pelos militares acabou por ser uma Revolução onde os portugueses saíram à rua e quiseram participar nessa luta pela Liberdade. Vivemos em democracia? Sim, claro, mas podemos questionar se é esta a democracia que gostaríamos. Julgo que a participação dos cidadãos é fundamental mas nestes últimos anos o que temos vivido é o oposto do que se viveu no 25 de Abril que será uma desistência por parte das pessoas. A acção de alguns partidos ao longo destes 40 anos levou a isso, criaram um desencanto nas pessoas por fazerem tantas promessas em campanha eleitoral e depois no Poder não cumprirem praticamente nada. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Não posso conceber a democracia sem os partidos políticos como pilares. Não acredito em movimentos populares porque penso ser necessário haver responsabilização e para isso é fundamental a intervenção dos partidos. De qualquer forma, considero que os partidos que têm tido responsabilidades governativas não têm vindo a desempenhar correctamente o seu papel, havendo assim uma grande descrença nos políticos e cumprindo a todos dignificar de outra forma a sua intervenção. Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? Penso que a justiça é um dos pilares da democracia, mas hoje o sentimento que existe entre as pessoas é de que a justiça é morosa e que não é igual para todos porque defende mais os poderosos. Não vai ajudar em nada a reforma judiciária que está em curso afastando a justiça dos portugueses. Precisamos de uma justiça de proximidade e que esteja acessível a todos. Que testemunho pode dar como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Foi uma das grandes conquistas de Abril, e era exemplar pela sua universalidade. Ultimamente temos vindo a assistir a um Serviço Nacional de Saúde que se vai afastando das pessoas nomeadamente com o surgimento do modelo de privatização dos serviços de saúde com o qual não concordo. O acesso aos cuidados de saúde deve ser igual para todos e precisamos de qualidade e universalidade nesta área. A falta de médicos é igualmente uma grande dificuldade que vamos sentindo. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O Poder Local ou o Poder Central? O Poder Local que foi mais uma conquista de Abril, desempenhou e desempenhará o papel ímpar na democracia. Basta pensarmos no que era o nosso país antes do 25 de Abril, como eram as cidades e as vilas e como estão agora totalmente infra-estruturadas. Apesar disso e de ter dado um contributo líquido para a redução do défice, o Poder Local tem vindo a ser atacado e tenta-se diminuir a sua capacidade de intervenção. Quando falamos em Estado estamos a falar

“Recordo-me que, na minha rua, logo após o 25 de Abril, as infra-estruturas foram construídas pelos moradores. As pessoas colectaram-se e deram o seu trabalho. Aquilo ficou na minha memória como exemplo dos tempos que se viviam” de quê e de quem? Falamos de uma organização de sentido político que tem a responsabilidade de governar um País que assenta em três níveis de poder: deliberativo, executivo e judicial. Tem como obrigação organizar a sociedade e contribuir para uma sociedade mais justa. Tem algum testemunho pessoal relacionado com o 25 de Abril, a democracia e a liberdade que queira partilhar com os leitores? Recordo-me que, na minha rua, logo após o 25 de Abril, as infra-estruturas foram construídas pelos

moradores. As pessoas colectaram-se e deram o seu trabalho. Aquilo ficou na minha memória como exemplo dos tempos que se viviam. Na altura não havia grandes unidades comerciais mas apenas mercearias e pequenas lojas e lembro-me também da construção da Cooperativa de Consumo em Samora Correia, onde um conjunto de pessoas, eu próprio por lá andei, adaptou um barracão para que os produtos pudessem ser vendidos a preços mais baratos. Era um envolvimento extraordinário.

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Só valorizamos o que conhecemos, o que respeitamos… Fernanda Asseiceira Presidente da Câmara Municipal de Alcanena A valorização do 25 de Abril, que neste ano de 2014 assinala os seus 40 anos, passa pelo conhecimento que temos, não só sobre os acontecimentos marcantes do próprio dia, como por tudo o que originou a conspiração que lhe deu origem - o pré 25 de Abril assim como por compreender o que mudou - o pós 25 de Abril. Para quem não tinha idade para se recordar desta data histórica e por isso marcante para Portugal, o papel da educação e da formação sobre o tema, transmitido quer pelas famílias, quer pelas escolas, é de extrema relevância. Acresce ainda o papel de todos nós, forças vivas, associações, entidades, personalidades várias que, por todo o país, vão comemorando ano após ano o dia da Liberdade. Hoje, para as gerações mais novas, poderá ser difícil compreender o significado desta data… por sua vez para os que viveram a guerra colonial, que perderam lá os filhos, os pais, os amigos…, para os que sentiram e sofreram as consequências da repressão que levou à prisão muitos presos políticos… jamais se esquecerão desse passado, e desta data, assim como de todos os que contribuíram e lutaram para que esse dia acontecesse, e da canção …«E depois do Adeus..». Guerra Colonial …Repressão…Prisão…Morte… Ditadura …quem viveu esse período jamais se esquecerá !! Apesar de distante são palavras associadas ao nosso Portugal antes do 25 de Abril. Importa não esquecer que não se trata de ficção de um qualquer filme… é a realidade da história do nosso país. Os Capitães de Abril lutaram por um país novo que, não obstante vicissitudes várias, conduziram a novos paradigmas : Da Liberdade, da Democracia, do Desenvolvimento, da Educação, da Participação Cívica… Não reconhecer o que foi conquistado é ignorância e ingratidão. Desvirtuar os valores e princípios alcançados é irresponsabilidade e incompetência. Não seria apenas neste dia, que se desdobra em sessões solenes, que devíamos recordar Abril… Se todos os dias deviam ser Natal… todos os meses deviam ser Abril… é uma cultura… um pensamento, um sentimento, que deve estar presente nas nossas participações, nas nossas acções, na nossa Vida. Ser um (a) Cidadão(ã) mais consciente do seu passado, mais activo(a) no seu presente e mais reflexivo(a) perante o seu futuro é continuar a lutar por um Portugal melhor! Honremos a memória de Abril!

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“Não reconhecer o que foi conquistado é ignorância e ingratidão. Desvirtuar os valores e princípios alcançados é irresponsabilidade e incompetência.”

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“Não podemos ser um país que maltrata os idosos e incentiva os jovens a emigrar” Pedro Ribeiro Presidente da Câmara Municipal de Almeirim Para quem nasceu em 1974 falar do 25 de Abril é falar do que se leu, viu na televisão e ouviu contar a pessoas mais velhas. As minhas primeiras percepções, ainda muito jovem, sobre a importância do 25 de Abril resultaram da visualização de slides e fotografias tiradas pelo meu pai, ex-combatente em Moçambique. Como todos os miúdos, gostava de ver aquelas imagens apesar de não ter a verdadeira noção do que tinha sido a realidade daquela guerra.

“Saibamos nós, sociedade, mudar, melhorar e reavivar os sonhos de quem esteve disponível a perder a vida pela liberdade”

O MIRANTE 17/ABR/14

Acho que para uma geração o 25 de Abril, mais do que a liberdade, representou o fim de um pesadelo de ver partir os seus amigos e familiares para a Guerra. Passados 40 anos e apesar de muitos erros que cometemos, e cometemos muitos enquanto povo, a verdade é que Portugal é hoje outro País. Aquilo que outros fizeram em cem anos nós fizemos em poucas décadas. Na educação, na saúde, no apoio social, pilares base de um Estado social, as diferenças são abismais, apesar do ataque que tem sido perpetuado nestes últimos anos contra estas áreas. Como todos dizem, 25 de Abril é liberdade. E liberdade só existe, só pode existir e só faz sentido, com justiça, justiça social e desenvolvimento económico. Um povo sem pão nunca pode ser um povo livre. Com um desemprego perto dos 20% e um desemprego jovem ainda mais elevado. Com gente a sobreviver em vez de viver para que uns quantos banqueiros recuperem o que perderam numa “economia de casino”. Um País que maltrata os seus idosos e incentiva os seus jovens a emigrar corre o sério risco de ser um País que, no futuro, regressa ao passado. Muitos têm sido aqueles que dizem que necessitamos de um outro 25 de Abril. Eu sou dos que entendo que Portugal necessita de pessoas com os ideais de quem fez o 25 de Abril. De gente com sentido de Estado. De gente que se preocupe menos consigo e muito mais com a

“Aquilo que outros fizeram em cem anos nós fizemos em poucas décadas. Na educação, na saúde e no apoio social, que são pilares base de um Estado social” sociedade. De gente que saiba assumir as mudanças com a convicção de que essas mudanças são fundamentais para melhorar um País ainda a necessitar diminuir diferenças entre quem muito tem e quem nada espera. 40 anos depois necessitamos de acordar todos os dias e recordar Sophia de Mello Breyner Andresen - “Esta é a madrugada que eu esperava/ O dia inicial inteiro e limpo/ onde emergimos da noite e o silêncio/ E livres habitamos a substância do tempo.” Que aqueles que, fruto de comportamentos indignos e egoístas, preocupados apenas consigo e com os seus lóbis nunca mais obriguem ninguém a dizer “…nesta noite solene vamos acabar

com o estado a que chegámos. De maneira que quem quiser, vem comigo para Lisboa e acabamos com isto. …” Saibamos nós, sociedade, mudar, melhorar e reavivar os sonhos de quem esteve disponível a perder a vida pela liberdade. Esta será com toda a certeza a maior homenagem que podemos fazer ao Homem que um dia saído de Santarém prendeu um ditador e regressou ao seu quartel sem nada pedir em troca. Apenas com um sentimento enorme do serviço cumprido.

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“Eu e a minha irmã nascemos em França por o meu pai estar envolvido na luta contra a ditadura” Pedro Magalhães Ribeiro Presidente da Câmara Municipal do Cartaxo Onde estava no 25 de Abril e o que sentiu quando soube o que se estava a passar? Eu tinha pouco mais de um ano de idade quando se deu o 25 de Abril. Por motivos políticos, uma vez que o meu pai esteve envolvido na luta contra o fascismo, nasci em França. Regressámos a Portugal em Junho de 1974, dois meses após a revolução. O que significou para si o 25 de Abril? Proporcionou à minha geração viver em liberdade. Aos militares de Abril e a todos aqueles que, ao longo de décadas, sofreram na pele as adversidades da ditadura, devemos uma palavra de agradecimento. É nossa responsabilidade honrar a memória daqueles que fizeram Abril. Precisamos de outro 25 de Abril? A revolução de Abril será sempre uma obra inacabada. Todos os dias temos que cumprir os ideais de Abril. Todos os dias temos que trabalhar por uma sociedade mais justa, mais livre e mais solidária. Tem alguma memória que queira partilhar, da vida antes de 25 de Abril de 1974, seja sua ou relatada por familiares ou amigos? Tenho a memória transmitida pelos meus pais e avós. Muitos desses meus familiares tinham militância no Partido Comunista Português, espaço político que encontraram para lutar contra o fascismo. Face a essa luta, eu e a minha irmã nascemos em França e a história das nossas vidas também é contada por Abril. Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? Salgueiro Maia. Um homem de-

terminado que teve a capacidade de mobilizar mulheres e homens corajosos, para dar início à revolução de 25 de Abril. A humildade com que pautou a sua vida constitui um exemplo para todos nós. Vivemos em democracia? Sim. Com todas as suas imperfeições, próprias da natureza humana, existe a liberdade de escolha dos nossos representantes. Existe a liberdade de escolha, em regime de igualdade, para escolhermos aqueles que nos representam. Reconheço que existe ainda muito por fazer para aumentar a transparência das decisões públicas e para reforçar os níveis de participação e o envolvimento dos cidadãos nas tarefas colectivas. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Os partidos políticos são, na sua base, associações constituídas por mulheres e homens, reflectindo os defeitos e as virtudes dessa nossa condição humana. Cada um deles defende diferentes modos de organização social e económica, em função dos seus pressupostos ideológicos. Julgo que um certo descrédito que paira na nossa sociedade sobre os partidos políticos resulta da falta de respostas aos reais problemas das pessoas, das empresas e das instituições. Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? Um conjunto de processos mediáticos, que envolvem pessoas e instituições com poder económico, dão a percepção pública de que existe uma justiça para ricos e uma justiça para pobres. Penso que os operadores judiciais também são vítimas do ineficaz e complexo quadro legal, criado pelo legislador, em que trabalham. O país tem a obrigação de assegurar uma justiça mais próxima e célere para todos

“Foi o 25 de Abril que me deu a oportunidade de tirar um curso superior” Júlia Amorim Presidente da Câmara Municipal de Constância Eu tinha 10 anos quando foi o 25 de Abril. A minha infância foi toda ela marcada pela guerra colonial, visto que o meu pai era militar de carreira e fez várias comissões nas antigas colónias. Quando eu tinha apenas seis dias de vida o meu pai partiu para Angola. Quando voltou, dois anos depois, eu não o conhecia e recusava o seu colo. Para mim, então, o meu pai

“Foi o 25 de Abril que me deu, como às outras mulheres, o direito de votar e de ser cidadã de corpo inteiro” 20

era o meu avô porque este, sim, estava presente, via-me crescer, ensinava-me a ser gente todos os dias. Tinha eu 7 anos, em 1971, a guerra colonial separou a nossa família quando a minha mãe, levando a minha irmã, abalou para África, para junto do meu pai, e eu e o meu irmão ficámos cá, entregues aos cuidados dos avós. Para a criança que eu era, o 25 de Abril foi, antes de mais, o primeiro dos três D’s do programa do MFA – Descolonizar. O fim da guerra colonial, após 13 longos anos de um esforço imposto, injusto e inútil, significou o regresso definitivo do meu pai a casa e a estabilização da nossa vida familiar. Por outro lado, o 25 de Abril abriu portas aos outros D’s – Democratizar e Desenvolver. A democracia chegou logo e foi-se depois consolidando, num processo complexo que se encontra, ainda hoje, longe de estar concluído, faltando aprofundá-la de modo a que, mais do que representativa, ela seja, acima de tudo, uma democracia participativa. Mas ultrapassou-se a ditadura e passámos a viver num país livre, sendo o poder local democrático uma das maiores conquistas e das maiores construções do Portu-

“Reconheço que existe ainda muito por fazer para aumentar a transparência das decisões públicas e para reforçar os níveis de participação e o envolvimento dos cidadãos nas tarefas colectivas” os cidadãos. A justiça é um pilar fundamental de um Estado democrático. Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Eu sou um utente que recorre muitas vezes ao Serviço Nacional de Saúde. Fui transplantado e sou acompanhado apenas em hospitais públicos. Sou defensor de um maior investimento no Serviço Nacional de Saúde, que não deixe ninguém de fora em função do seu rendimento. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O poder local ou o poder central? Tenho, para mim, comprovado em diversos estudos técnicos, que quem está mais próximo, gere com maior eficiência

os recursos que tem à sua disposição. Nesse sentido, considero que, em determinadas áreas, a descentralização de competências da administração central para a administração local tem sido positiva, nomeadamente para facilitar o acesso dos cidadãos aos serviços públicos. Tem algum testemunho pessoal relacionado com o 25 de Abril, a democracia e a liberdade que queira partilhar com os leitores? Há cerca de quinze anos, juntamente com outras forças partidárias, criámos a iniciativa “Filhos de Abril”, que teve por objectivo principal promover o envolvimento dos mais jovens do nosso concelho na temática da revolução de Abril, através de um conjunto de actividades culturais, desportivas e recreativas. É importante fazer Abril, é assegurar que as gerações vindouras continuem a cumprir o sonho de uma sociedade mais livre, mais igual e mais fraterna.

“O concelho de Constância, pequeno pedaço do Portugal interior, é bem o espelho da transformação, imensa e sem precedentes que se verificou em Portugal” gal destes últimos 40 anos. O desenvolvimento é o que sabemos. Cometeram-se muitos erros e houve muitas atitudes reprováveis, mas o país está hoje outro, a todos os níveis. Basta pensar em três aspectos dos tantos que mudaram a nossa vida colectiva: as infra-estruturas (vias de comunicação, hospitais, escolas, saneamento básico, rede eléctrica, instalações desportivas, equipamentos de apoio à infância e à terceira idade, espaços de lazer, etc, etc, etc.) e nas outras duas conquistas maiores destes anos de democracia – o ensino universal e gratuito até ao 12.º ano e o Serviço Nacional de Saúde. O concelho de Constância, pequeno pedaço do Portugal interior, é bem o espelho dessa transformação imensa e sem precedentes. Eu própria sou testemunho vivo da mudança que Abril permitiu. Foi o 25 de Abril que abriu à rapariga que eu era a possibilidade de prosse-

guir estudos e alcançar um grau superior. Foi o 25 de Abril que me deu, como às outras mulheres, o direito de votar e de ser cidadã de corpo inteiro. E foi o 25 de Abril – e o voto livre e democrático do povo do concelho de Constância – que me deu a maior honra da minha vida: a de ser a primeira mulher a presidir à câmara municipal da minha terra. 17/ABR/14 O MIRANTE


“Como autarca tenho obrigação de defender uma das grandes conquistas de Abril” Isaura Morais Presidente da Câmara Municipal de Rio Maior O 25 de Abril de 1974 é, para mim e para a maior parte dos portugueses, um acontecimento que ficará indelevelmente marcado na nossa história e memória como um dos mais belos sinónimos de Liberdade, um dos pilares fundamentais em que assenta o nosso sistema democrático. Democracia e Liberdade que hoje vivemos em Portugal porque um punhado de militares, no dia 25 de Abril de 1974, libertou o nosso país da mordaça da Ditadura, restituindo aos portugueses o sonho de um futuro mais solidário. Era na altura muito nova para ter a percepção de hoje sobre este dia. Não posso precisar se nesse dia estaria na escola ou em casa dos meus pais mas sei que só no final do dia tivemos noção que algo se passava no país. Recordo-me com algum detalhe de meses mais tarde estar com o meu pai no centro de Rio Maior, em manifestações de agricultores, provavelmente aquando da fundação da CAP. Só mais tarde tive consciência do papel de Rio Maior no período do PREC. Recebemos nessa época o epíteto de “Terra da Moca”, algo que ficará para sempre na nossa história enquanto comunidade, embora as acções que levaram a essa designação possam, no olhar distante da história, não ter sido as mais correctas. Hoje guardo na memória esses dias e os principais responsáveis pela revolução dos cravos e pelo período revolucionário que a ele se seguiu e, nem que seja somente para honrar essa memória e a dos imensos anónimos que, por todo o país, tiveram papel fundamental na implantação do sistema democrático que nos rege, cada um de nós tem a responsabilidade e o dever de contribuir para o seu aperfeiçoamento, melhorando-o dia após dia, perseguindo incessantemente o sonho que deu corpo às motivações dos heróicos Capitães de Abril. Para isso é essencial o interesse pelas questões de natureza política, para que os cidadãos possam escolher de maneira fundamentada as diferentes opções e projectos que lhes são apresentados pelos agentes políticos, tanto nos actos eleitorais, como na gestão da coisa pública. É, para mim, crucial para a qualidade da nossa Democracia que todos os cidadãos, sem excepção, participem activamente na discussão e na decisão dos assuntos que dizem respeito ao bem comum, e que o façam tanto no seio das famílias, como nas tertúlias, nas associações da sociedade civil, nas organizações políticas ou em qualquer outro palco que seja apropriado para esse fim. Como autarca tenho especial obrigação de defender uma das grandes conquistas de Abril, o poder local democrático. A tradição municipalista portuguesa só ganhou quando se abriu a todos a escolha dos seus líderes locais, dos representantes das freguesias e concelhos que nestes 40 anos assumiram a tarefa de, junto do poder central, reclamar mais e melhores condições de vida para os seus munícipes. Enquanto ocupar este cargo essa será uma das minhas principais preocupações, melhorar a qualidade de vida de quem em mim confiou para gerir os destinos de Rio Maior.

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“É crucial para a nossa Democracia que todos os cidadãos participem activamente na discussão e na decisão dos assuntos que dizem respeito ao bem comum”

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40 ANOS 25 DE ABRIL

“A justiça é fraca perante os fortes e forte perante os fracos” António Ceia da Silva Presidente da Entidade Regional de Turismo do Alentejo e Ribatejo Onde estava no 25 de Abril e o que sentiu quando soube o que se estava a passar? Estava na escola, tinha 11 anos, era muito novo para sentir qualquer tipo de emoção especial. Apenas notei nos meus familiares, amigos, professores e população em geral uma certa agitação. Sentia-se que havia qualquer coisa que estava a afectar significativamente o país, mas não tinha bem noção do que se estava a passar, embora, em fase posterior e nos dias seguintes, tenha procurado informar-me do que se passava. Na altura não tínhamos internet, as pesquisas eram diferentes, mas procurei alguns livros que abordavam questões relacionadas com a democracia, porque havia um conjunto de termos e expressões que para mim eram novos. Precisamos de outro 25 de Abril? Não. Penso que do ponto de vista do espírito revolucionário não será necessário um 25 de Abril. Mas eventualmente num conjunto de situações associadas com questões sociais, um estado social mais forte mais coeso, mais solidário e com um conjunto de valores que estavam presentes no espírito do 25 de Abril, como uma sociedade mais fraterna e solidária, eventualmente aí eu diria que é preciso um 25 de Abril todos os dias. É quase como o Natal que é todos os dias, portanto o 25 de Abril também será todos os dias que nós quisermos. O que penso que é importante vivermos em todos os momentos da nossa vida é o espírito do 25 de Abril, dos homens que fizeram o 25 de Abril e portanto aí eu diria que precisamos de um 25 de Abril todos os dias na nossa maneira de ser e de pensar e de estruturar o nosso pensamento. Tem alguma memória que queira partilhar, da vida antes do 25 de Abril de 1974, seja sua ou relatada por familiares ou amigos? Tenho algumas noções de alguns familiares que foram apoquentados pela polícia política na altura. Tinha alguns tios que sempre manifestaram a sua oposição ao regime e portanto, obviamente, que guardo algumas memórias dessa irreverência, do momento em que ser democrata não era fácil, ou seja do 24 de Abril e de um conjunto de vivências associadas a essa forma de estar muito peculiar, em momentos que eram mais difíceis e que não seria tão fácil manifestar essa posição. Senti, no entanto - e é importante dizê-lo - que houve em Portugal com a chamada Primavera Marcelista alguma melhoria nas condições económicas das famílias, nomeadamente das famílias de classe média. Contudo essa Primavera Marcelista não se transformou num Verão, exactamente, porque faltou a componente social, política e democrática. E recordo-me também desses momentos. E recordo, especificamente, da forma como em muitas situações as conversas eram tidas em sigilo, às escondidas e isso de facto é algo que mantenho vivo na minha memória. Quem é a pessoa que melhor simboliza o 25 de Abril? Curiosamente é um homem ligado a Santarém. É de facto Salgueiro Maia que simboliza o espírito e a forma desinteressada de viver o 25 de Abril e que - por razões da sua vida pessoal e de sua saúde - infelizmente saiu do nosso convívio muito cedo. É a pessoa que simboliza a revolução naquilo que ela de

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melhor simboliza, no que de mais significativo teve que é a vivência e a atitude desinteressada em todos os aspectos. Portanto Salgueiro Maia é o símbolo dessa vivência associada ao 25 de Abril. Vivemos em democracia? Sim. Como diria Churchill “a democracia é o pior de todos os sistemas tirando todos os outros”. A democracia tem defeitos como é lógico. É uma democracia recente faz agora 40 anos. 40 anos é uma idade que ainda necessita de algum amadurecimento, como nós percebemos ao longo do percurso da nossa vida, e portanto há aspectos a melhorar. Todos os dias nos deparamos com situações a que o sistema não responde, nomeadamente em matérias de cariz social, solidariedade social. Enfim…arrepia-nos ainda muito ouvir o Grândola Vila Morena, portanto é significativo que de facto a democracia simboliza muito para todos os que têm uma forma de estar na vida muito em prol dos outros, com dedicação e empenho pela causa pública. E é lógico que essa mesma democracia tem essas dificuldades no terreno, nalguns aspectos não conseguiu materializar-se. Diria que, eventualmente, o cidadão comum pode estar um pouco desiludido com muitos aspectos que esperava concretizarem-se pós 25 de Abril mas que acabaram por não se concretizar. De qualquer das formas é sempre melhor do que viver numa ditadura ou em sistemas de pseudomocracia. Apesar de todos os defeitos vivemos em democracia. Que avaliação faz dos partidos políticos ao longo dos últimos 40 anos? Costumo dizer, muitas vezes, que temos muita tendência a culpar os políticos e os partidos por tudo o que está errado na nossa sociedade e na nossa vida. Costumo dizer que os partidos políticos e as pessoas e os políticos não nascem de geração espontânea como os cogumelos, vêm da sociedade. E, portanto, os partidos políticos nesse aspecto reflectem a sociedade e a sociedade também não é perfeita. Mas há percurso que penso que apesar de tudo os partidos políticos fizeram em prol da defesa da democracia. Diria que os partidos políticos são o garante dessa liberdade, dessa diversidade de opiniões e é muito mau quando colocamos em causa os partidos políticos porque é preferível criticarmos de uma forma positiva, falarmos, como costumo dizer, mais do conteúdo do que da forma. Portanto o que está em causa não são os partidos, é muitas vezes a forma como eles actuam, o que fazem e não fazem. Acho que devíamos colocar mais essa opinião critica em relação ao que entendemos que os partidos políticos deviam fazer e não fizeram. Mas os partidos políticos são a base essencial da vivência democrática e simbolizam e devem expressar o que são as várias correntes de opinião da sociedade. E quando não o fazem, hoje em dia, a própria sociedade permite já candidaturas independentes que se têm vindo a afirmar e o cidadão é, acima de tudo, o garante formal da vida democrática. Que avaliação faz da forma como funciona a justiça? A justiça penso que é de facto o pior dos problemas de concretização do 25 de Abril e da vivência democrática. Tem muito a ver com a forma como se legislou à volta deste edifício que é a justiça e neste momento é cada vez mais premente não a justiça mas a não justiça. O que os cidadãos muitas vezes colocam

“Precisamos de um 25 de Abril todos os dias na nossa maneira de ser e de pensar e de estruturar o nosso pensamento” é que há uma justiça para os pequenos - para os que não têm acesso a bons advogados que saibam manusear o sistema penal e trabalhar bem as incongruências que qualquer sistema de justiça tem - e outros conseguem como recentemente se viu, que os seus processos prescrevam. Conseguem controlar o edifício da justiça e o cidadão pequeno, muitas vezes por situações mais simples, acaba por sentir a força da justiça. Portanto diria que a justiça é fraca perante os fortes e forte perante os fracos. É talvez o sector que menos conseguiu consolidar-se – e não tem a ver com os profissionais tem a ver com a forma como os códigos e os procedimentos legislativos foram feitos e, na minha opinião, mal feitos em muitas situações. Que testemunho pode dar da forma como tem sido atendido no Serviço Nacional de Saúde? Tenho excelentes e más experiências. Eu diria que aqui como em tudo na vida há boas e más situações, bons e maus profissionais e é muito difícil fazer uma avaliação genérica a nível pessoal. No entanto, como tenho experiências de ter sido atendido noutros sistemas de saúde internacionais devo dizer que o sistema de saúde de Portugal é dos melhores do mundo, nomeadamente pelo seu carácter universal. Hoje não é tão gratuito como devia ser, em alguns casos até mais caro que os serviços particulares, mas de qualquer forma há um princípio universal que todos temos os mesmos direitos no Serviço Nacional de Saúde e, claramente, Portugal é dos melhores. Devemos fazer tudo para que quer a saúde quer a educação possam manter-se com o carácter universal. O estado nunca pode deixar de exercer o seu papel. Aliás, é para isso que os cidadãos pagam impostos. Porque esse é o desafio de um país que recolhe impostos aos cidadãos para saber distribuir e estes serviços são imprescindíveis. Quem melhor serve os cidadãos e usa os recursos disponíveis? O poder local ou o poder central? Sem dúvida, para mim, o poder local. Tenho tido uma ligação muito forte com os municípios, hoje com 58 câmaras, durante muitos anos com 47, e não tenho dúvidas que o poder local em Portugal é o grande exemplo da forma de exercer política no País. Com problemas, com defeitos, com situações não tão boas como desejamos, mas em termos genéricos o poder local é o que está mais próximo dos cidadãos, aquele que os cidadãos mais julgam e julgam no sentido positivo. E o poder local é responsável pelo desenvolvimento que o País conseguiu atravessar nos últimos anos. Pelo que foi possível fazer no interior do país, em relação aos valores é aquele que melhor utiliza os recursos. Quando falamos de Estado estamos a falar de quê e de quem? Falar de Estado… se eu tivesse 50 jornais para escrever sobre esta pergunta seria pouco. O Estado é o que consideramos como um edifício abstracto mas que para nós é essencial num conjunto de garantes da vivência democrática, da segurança, do bem-estar dos cidadãos e para um conjunto de serviços como a saúde, as questões de igualdade social. Portanto, diria que olhamos

para o Estado de uma forma desconfiada - há quem diga que não quer o Estado às segundas, quartas e sextas mas venha o Estado às terças, quintas e sábados – mas o Estado é fundamental e essencial, um Estado ao serviço dos cidadãos, e que nós olhemos para o Estado como “algo” que é essencial para garantir esse Estado democrático, a nível de segurança e da família mas também para ser responsável por uma sociedade mais livre, equitativa, mais generosa e solidária. Tem algum testemunho pessoal relacionado com o 25 de Abril, a democracia e a liberdade…. Era muito jovem, não seria honesto se fizesse grandes referências pessoais, mas sem dúvida que a democracia e a liberdade são dos bens que quase como os serviços na área da infraestrutura e dos resíduos sólidos que nós não vemos mas que são essenciais. A democracia e a liberdade é algo que só sentimos verdadeiramente quando não temos. Estou a escrever estas notas no Dia do Pai, que felizmente ainda tenho, mas não tenho mãe, e nós só conseguimos dar o verdadeiro valor às coisas quando as perdemos. Portanto a democracia e liberdade é algo que faz parte do nosso íntimo, que convive connosco todos os dias, mas que não damos o valor que merece e devíamos respeitar mais a democracia e a liberdade de uma forma solidária e, muitas vezes, é a velha máxima que só nos lembramos de Santa Bárbara quando faz trovões. Eventualmente só quando sentirmos que está em causa esses princípios é que damos o devido valor e a devida relevância ao sistema democrático e à liberdade.

“A justiça é o pior dos problemas de concretização do 25 de Abril e da vivência democrática. Tem muito a ver com a forma como se legislou à volta deste edifício que é a justiça. Neste momento é cada vez mais premente, não a justiça, mas a não justiça” 17/ABR/14 O MIRANTE


“Precisamos de uma revolução mas com recurso às armas da participação cívica” “Émaispara mim Ramiro Matos Advogado e presidente do Núcleo de Santarém do Banco Alimentar contra a Fome Sou daqueles que não posso responder à pergunta: Onde estavas no 25 de Abril?. Não posso pela simples razão de ter nascido no início de 1975, em pleno PREC. Mas ouvi, li, estudei, aprendi o significado e a importância da revolução. O exemplo vinha do seio da família, onde um familiar directo tinha sido perseguido e preso pela PIDE, pelo simples facto de ter opinião, de discordar e de dizê-lo frontalmente. Em 1975 tornou-se militante do PPD, seguindo Francisco Sá Carneiro por todo o lado. O 25 de Abril foi um marco de viragem na sociedade portuguesa. Não podemos, contudo, esquecer outros marcos importantes no pós 25 de Abril, como o Golpe Militar de 25 de Novembro de 1975 e a constituição de Abril de 1976, datas muitas vezes esquecidas – uma sondagem recente demonstra que 25% dos portugueses não sabem o que foi o PREC, e não têm opinião sobre as nacionalizações e o processo de descolonização. É de especial relevância que as nossas crianças e jovens possam estudar este processo de viragem histórica. Mas é muito mais importante que o possam fazer numa perspectiva evolutiva, estudando o desenvolvimento, ao longo de 40 anos, da nossa “recente” democracia, que nos trouxe a liberdade, mas que ainda tem um longo caminho para fazer.

O MIRANTE 17/ABR/14

Abril trouxe-nos um conjunto de pilares democráticos que muitos sub-40 desconhecem. A liberdade de expressão, as eleições livres, a liberdade de imprensa, os partidos políticos, são de conhecimento mais abrangente, mas as questões mais concretas para o nosso dia-a-dia como o poder local democrático, o salário mínimo nacional, as pensões sociais, o subsídio de desemprego, entre muitas outras questões estruturantes, são tidas como adquiridas, faltando a noção de que foi a democracia constitucional que nos permitiu tais direitos fundamentais. Porém, é para mim mais importante, volvidos 40 anos, reflectir no que falhámos desde 1974 do que passarmos a vida a exaltar o 25 de Abril, agarrados às mudanças de então, esquecendo a necessária evolução e as mudanças que ainda nos faltam implementar. A grave crise que vivemos neste momento é uma consequência dos erros da democracia. A conjuntura actual, que alguns defendem como de “falta de democracia”, pode assemelhar-se a uma ditadura institucional, onde somos obrigados a seguir o inevitável guião de entidades internacionais, nossas credoras, fruto dos sucessivos erros de governação que foram alimentando a dívida pública, sem o cuidado da sustentabilidade das medidas, das políticas, numa lógica de “quem vier a seguir que feche a porta”. Impõe-se esse debate. Não precisamos de uma nova revolução nos termos em que foi feita em 74. Precisamos de uma revolução mas com recurso às armas da participação cívica. Precisamos rapidamente de concretizar a reforma do Estado, aproveitando para reformar também as mentalidades. Portugal ainda precisa de muitas revoluções sec-

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importante, volvidos 40 anos, reflectir no que falhámos desde 1974 do que passarmos a vida a exaltar o 25 de Abril, agarrados às mudanças de então, esquecendo a necessária evolução e as mudanças que ainda nos faltam implementar”

toriais. Na justiça, na saúde, na educação, na segurança social e noutras áreas. E têm de ter um apoio abrangente, desprendido de tácticas eleitoralistas, de ideologias bacocas. Só assim conseguiremos reconstruir um país sustentável. Os partidos políticos, uma das maiores conquistas de Abril, têm também de evoluir, não podendo continuar numa caminhada fechada sobre si, por vezes até autista. Têm de fazer o “mea culpa” abrindo-se à sociedade, dando-se a conhecer, deixando de ver eleições internas como meios para atingir o poder pelo poder, trazendo para o seu seio os melhores,

sem temer que os mais experientes e conhecedores possam fazer sombra aos que fazem dos partidos o seu modo de vida, dizendo sim, sem questionar. Os níveis de abstenção são reveladores das fragilidades da nossa democracia e da desacreditação na política. Em 74 quebraram-se fortes amarras. Mas a construção da democracia em Portugal ainda está longe de ter chegado ao fim. As correntes continuam a existir, mais fracas mas igualmente cerceadoras de um futuro melhor.

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17/Abr/14 O MIRANTE


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