29º Aniversário 16-11-2016

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S E M A N Á R I O

Edição comemorativa do 29º aniversário - Caderno 2

R E G I O N A L

Director: António Palmeiro | 17/11/2016 • ANO XXIX • N.º 1273 • 0.75 e

Uma edição no feminino nos 29 anos de O MIRANTE

Este jornal faz parte integrante da edição 1273 (17-11-2016) de O MIRANTE e não pode ser vendido separadamente

O MIRANTE entrevistou e registou declarações de quarenta e nove mulheres da região. A intenção era ouvi-las falar da sua condição de mulheres mais do que das suas profissões, cargos e actividades, porque sobre isso temos falado com elas ao longo de toda a existência do jornal. Quem tiver nas mãos este especial de aniversário e pensar que tem nas mãos quarenta e nove depoimentos repetitivos e monocórdicos repletos de queixas e lamentos, está profundamente enganado. As 56 páginas desta edição estão recheadas de optimismo, humor, ironia, inteligência e sensibilidade. Fica o convite aos leitores para que se aventurem na leitura da edição do 29º Aniversário de O MIRANTE.

Cintia Melo tem 51 anos e é calceteira em Vila Franca de Xira. Esta é a história de uma mulher simples e sem vergonhas daquilo que os outros que a rodeiam possam pensar. Não só escolheu abraçar uma profissão praticamente em vias de extinção como é uma mulher numa área de trabalho masculina.


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Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE

Editorial

Este não é um suplemento monocórdico Uma polifonia feminina a cinquenta vozes

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MIRANTE entrevistou e registou declarações de cinquenta mulheres da região. A intenção era ouvi-las falar da sua condição de mulheres mais do que das suas profissões, cargos e actividades, porque sobre isso temos falado com elas ao longo de toda a existência do jornal. Quem tiver nas mãos este especial de aniversário e pensar que tem nas mãos cinquenta depoimentos repetitivos e monocórdicos repletos de queixas e lamentos, está profundamente enganado. Estas páginas, por onde se estendem as opiniões de tantas mulheres da região, estão recheadas de optimismo, humor, ironia, inteligência e sensibilidade. Quem primeiro se surpreendeu foram os elementos da equipa do jornal que trabalharam nesta edição. São eles que insistem no convite aos leitores para que se aventurem na leitura do mesmo, acreditando que não se irão arrepender. Aos homens em particular é pedido que reflitam sobre aquilo que as mulheres pensam deles. Às mulheres é pedido que cruzem as suas ideias com as das outras mulheres que até podem conhecer mas que agora vão ver num registo muito diferente do habitual. A homens e mulheres é aconselhado que se descontraiam e estejam atentos porque há tanta tirada inesperada e bem humorada que não dá para resumir aqui. O que é dito por cada uma das convida-

Quem tiver nas mãos este especial de aniversário e pensar que tem nas mãos cinquenta depoimentos repetitivos e monocórdicos repletos de queixas e lamentos, está profundamente enganado. das para esta edição de aniversário é dito de uma forma directa e frontal, é verdade, mas com uma subtileza que em vez de provocar dor em quem possa ser atingido, obriga a sorrir e a pensar. Uma característica comum aos homens referida por um grande número de mulheres é o facto de só conseguirem fazer uma coisa de cada vez ao contrário das mulheres que fazem muita coisa ao mesmo tempo. E uma das entrevistadas acrescentou: “Quando tentam imitar as mulheres e fazer várias coisas simultaneamente há sempre desastres”. E o orgulho delas quando falam da capacidade que só elas têm de gerar uma vida?!! A todos uma boa leitura. E fiquem com mais duas linhas: “O que invejo nos homens é o tamanho dos saltos dos sapatos em ocasiões de cerimónia”. “Uma característica comum à maioria dos homens? Têm todos barba!”

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Opinião

O melhor que há-de vir Da minha vida fazem parte as pessoas que dirigem empresas e instituições, as entusiastas, as que não sabem usar diminutivos e palavras moles para desbravar o caminho que escolheram trilhar. As que cortam a direito. As que escondem um coração mole atrás de um pulso firme.

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omemoro estes 29 anos com o espírito de uma mulher que vive e sente-se privilegiada por pertencer a um mundo de Homens mas ... desta vez, directamente, homem não entra! A minha vida são pessoas. As optimistas, as de alma cheia, as que transbordam surpresa através do olhar, as que me surpreendem, as que me desafiam e tiram do sério. A minha vida são as pessoas que me contagiam diariamente com energia positiva e que me ensinam a trabalhar com paixão neste ofício que escolhi. Gosto de ser chamada pelas coisas. Não sou de contemporizações e nunca me resigno para não condicionar o fluxo espantoso da vida. Escolho sempre o caminho onde o vento leva o pó, o sol aquece o frio e a chu-

Joana Salgado Emídio* va limpa tudo. Da minha vida fazem parte as pessoas que dirigem empresas e instituições, as entusiastas, as que não sabem usar diminutivos e palavras moles para desbravar o caminho que escolheram trilhar. As que cortam a direito. As que escondem um coração mole atrás de um pulso firme. A minha vida é uma parte de cada uma destas singulares vidas que retratamos nesta edição e que, como vemos, vão muito além do que podemos desejar ver e sentir. A minha vida não tem partidos, classes, raças e religiões. Sou das pessoas. Sou uma rafeira que fareja, permanentemente, o melhor que há-de vir * Directora Executiva de O MIRANTE

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“Nunca tive problemas em trabalhar e aceitei de bom grado. Foi quando comecei a varrer que comecei a escrever poemas. Agradeço muito a Deus as oportunidades que me deu, como a entrada para o quadro da Câmara de Santarém”, sublinha.

“Considero-me uma guerreira ou não tivesse Lança no nome”

Maria Antónia Lança - A varredora que fazia versos - Santarém Maria Antónia Lança ficou popular em Santarém como a varredora de ruas simpática e comunicativa e também pelas quadras populares que saem da sua cabeça e que gosta de partilhar. Nascida no Alentejo, e irmã da cantora Linda de Suza, teve uma infância difícil e agradece a Deus as oportunidades que lhe deu ao longo da vida.

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irmã Teolinda, mais conhecida por Linda de Suza, tornou-se famosa no final dos anos 70 do século XX graças à sua “mala de cartão”, canção icónica da diáspora portuguesa em França, mas a vida de Maria Antónia Lança também da-

va uma boa história para ser musicada e cantada. Nascida em Beringel, concelho e distrito de Beja, em 28 de Agosto de 1950, no seio de uma família de trabalhadores rurais, viveu uma infância difícil e esteve durante alguns anos, tal como a irmã Teolinda, aos cuidados da Misericórdia de Beja e da Misericórdia de Lisboa devido à doença da mãe. Outras irmãs mais velhas estiveram internadas em asilos ou foram servir em casas de famílias abastadas. Maria Antónia é uma figura conhecida em Santarém há muitos anos. Ficou popular por ser a simpática e comunicativa varredora de ruas mas também pelas quadras que vão saindo da sua imaginação e que gosta de partilhar. Há cerca de 10 anos foi transferida para o serviço de atendimento aos visitantes na monumental Igreja da Graça. “Gosto de conviver com as pessoas. Conhece-se gente de todo o mundo”. Actu-

Maria Antónia Lança almente está de baixa, lutando contra um cancro, e determinada a vencer a batalha. “Considero-me uma guerreira, ou não tivesse Lança no nome”, diz com humor durante a conversa no seu apartamento, um sexto andar do periférico Bairro do Girão, com vista privilegiada sobre a cidade. A mãe de Maria Antónia teve 11 filhos, mas três morreram nos primeiros anos de vida. Eram tempos em que a mortalidade infantil tinha uma dimensão assustadora. O pai queria um rapaz e só à sétima tentativa conseguiu: nasceu Manuel e com ele a irmã gémea que viria a chamar-se Maria Antónia. Ainda pequena, foi para Lisboa com a família. Só aos nove anos entrou na escola primária e nas férias aprendeu a manusear um tear com a irmã Teolinda. Mais tarde viria a ser tecedeira na Venda Nova, Amadora, zona onde residiu durante vários anos antes de vir para o Ribatejo. Foi aí que começou a trabalhar nos jardins, como funcionária da Câmara da Amadora. “Nunca me senti amada pelos meus pais” Maria Antónia recorda os pais como pessoas que souberam transmitir valores e princípios, mas também pouco dadas a

grandes manifestações de afecto. “Nunca me senti amada pelos meus pais, mas antigamente as coisas eram assim, as pessoas não manifestavam os seus sentimentos”. Hoje diz que já ultrapassou isso e que os valores que lhe incutiram foram transmitidos aos seus descendentes. Casada por duas vezes (ambos os maridos já faleceram), Maria Antónia tem cinco filhos (três homens e duas mulheres) e cinco netos, não escondendo orgulho na descendência. Foi mãe pela primeira vez aos 19 anos. Só um dos filhos vive em Santarém, cidade para onde veio morar em 1991 com o segundo marido, que era da Póvoa da Isenta. Não arranjou logo emprego e aproveitou para estudar à noite. Fez o 5º e 6º anos na Escola Alexandre Herculano. Quando já estava a trabalhar no Serviço de Higiene e Limpeza da Câmara de Santarém, fez o 9º ano no Centro de Formação Agrícola de Almeirim, na Herdade dos Gagos. A oportunidade de trabalhar para a Câmara de Santarém como varredora foi agarrada com o mesmo entusiasmo com que desempenhou outras tarefas ao longo da sua vida. Porque é uma mulher que não vira a cara à luta. “Nunca tive problemas em trabalhar e aceitei de bom grado. Foi quando comecei a varrer que comecei a escrever poemas. Agradeço muito a Deus as oportunidades que me deu, como a entrada para o quadro da Câmara de Santarém”, sublinha. À beira da reforma, Maria Antónia Lança concentra-se agora no combate contra a doença. As sessões de quimioterapia deixam mossa, mas ela é uma mulher de antes quebrar do que torcer: “Tenho Lança no nome, não me deixo derrotar. E um dia quando tiver que partir partirei sem medo, porque ninguém cá fica para semente”. No final, pedimos-lhe uma quadra para assinalar o aniversário de O MIRANTE. Maria Antónia enviou-a um dia depois: “Parabéns ao meu Jornal / leio-o sempre com agrado / A competência é fundamental / O empenho de todos está confirmado!”

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“As mulheres já provaram que conseguem fazer tudo o que quiserem”

“As mulheres em geral são mais persistentes e pacientes que os homens”

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Fernanda Alves, 47 anos, proprietária e gerente da Xabigás em Almeirim

e há verdadeira igualdade entre homens e mulheres é coisa que não preocupa Fernanda Alves, gerente da Xabigás, em Almeirim, empresa revendedora e distribuidora de gás. Para ela o importante é já estar mais que provado que a maioria das mulheres, tal como os homens, são capazes de alcançar tudo aquilo que querem. Percebe que a nível social uma mulher, por mais qualidades que tenha, não tem o reconhecimento que tem normalmente um homem nas mesmas condições. A nível político diz que a afirmação das mulheres passa por haver mais mulheres interessadas na política e a candidatarem-se a cargos políticos. A empresária nunca teve pena de não ter nascido rapaz nem considera que exista alguma característica comum a todos os homens. “São todos diferentes entre si, tal como as mulheres”, diz. O que inveja na maioria dos homens é eles terem mais tempo livre porque há coisas que só são feitas pelas mulheres. Quando lhe perguntam qual a percentagem de trabalho de casa que lhe calha responde que é normalmente de 90 por cento. É por isso que defende que em casa quem deve mandar é a mulher porque é ela que tem a percepção do que é preciso. Viúva devido ao falecimento do marido num acidente, diz que nunca lhe tinha pas-

Rosário Saramago, Médica Dentista com clínica no Entroncamento

Fernanda Alves sado pela cabeça ser empresária e ter as responsabilidades que tem mas que sempre encarou o trabalho com determinação, seja na Xabigás, seja em casa. Tem um filho e uma filha e diz que a educação foi igual para os dois. Segundo ela não há educação especial para rapazes nem para raparigas. Gosta de touradas por terem a ver com as tradições da região e já assistiu a algumas. Também costuma assistir, sempre que pode, a jogos do seu Benfica. Gosta também de passear, de fazer crochet e de ler. Falhou a sua previsão sobre o resultado das eleições americanas uma vez que estava convencida que era desta que uma mulher ia ser eleita

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médica dentista Rosário Saramago, gerente de uma clínica com o seu nome na cidade do Entroncamento, considera que, em geral, os homens são mais dominantes mas não foi por causa de qualquer necessidade de assumir um papel dominante que em certas alturas da sua adolescência sentiu pena de não ter nascido rapaz. Foi apenas porque os rapazes tinham mais liberdade. Quanto à principal diferença entre homens e mulheres diz que sente que elas “têm mais persistência e são mais pacientes”. Rosário Saramago considera que a igualdade entre homens e mulheres é mais teórica do que prática e atribui isso à dificuldade em mudar mentalidades. Mas quando fala em mentalidades não se refere às masculinas mas às de todas as pessoas em geral. A médica também é crítica em relação às atenções que certos homens dedicam às mulheres em particular. “Se essa gentileza só se manifesta em relação às mulheres não será isso machismo? Afinal, não devemos ser gentis com todas as pessoas independentemente do sexo, raça ou idade?”, interroga-se. Em termos políticos diz que as mulheres não precisam de qualquer sistema de quotas para se afirmarem e que se continuam afastadas de cargos políticos de topo é apenas

Rosário Saramago

As tarefas domésticas devem ser divididas de forma proporcional ao tempo livre de cada elemento da família por uma questão cultural mas que tal situação já está a mudar. Nunca foi a uma tourada nem a um jogo de futebol. Quando tem tempo livre gosta de ler, brincar, passear e ir ao cinema. Dá como exemplos de escritores preferidos José Rodrigues dos Santos, Jodi Picoult e Lesley Pearse. Defende que as tarefas domésticas devem ser divididas de forma proporcional ao tempo livre de cada elemento da família

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“Aos homens só invejo o “O trabalho que temos tamanho dos saltos dos sapatos feito com as novas gerações em ocasiões de cerimónia” vai gerar mais igualdade” Isaura Morais - Presidente da Câmara Municipal de Rio Maior

Maria do Céu Albuquerque - Presidente da Câmara Municipal de Abrantes

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saura Morais nunca teve vontade de ser homem e diz que aos homens só inveja “o tamanho dos saltos dos sapatos em ocasiões de cerimónia”. É também de uma forma bem humorada que responde quando questionada sobre um traço que seja comum à maioria dos homens. “Têm todos barba!”. Sobre o sistema de quotas que vigora para a composição das listas concorrentes às eleições para as autarquias ou para a Assembleia da República diz que o mesmo tem um efeito perverso. “As quotas só afirmam as mulheres como mais dependentes da boa vontade do sistema e as mulheres não precisam de favores”, defende. Quanto à igualdade de géneros considera que ainda há caminho a percorrer. “Temos evoluído muito nos últimos anos na igualdade do género. Assistimos a muitas transformações na sociedade que têm permitido essa aproximação mas temos que continuar a investir, especialmente ao nível da educação, para podermos continuar a evoluir no bom caminho!”. Posta perante o facto de a única mulher que exerceu até agora o cargo de primeiro-ministro em Portugal (de Julho de 1979 a Janeiro de 1980), Maria de Lourdes Pintasilgo, lembra que ela não foi eleita mas acredita que vai ser possível termos mulheres eleitas directamente para os mais altos cargos políticos. “Maria de Lourdes Pintassilgo não foi eleita, foi indigitada por Ramalho Eanes. Temos uma democracia jovem e, culturalmente, o papel dominante da mulher na nossa sociedade era o de dona de casa. As alterações sociais das últimas décadas têm feito ascender as mulheres a lugares de topo na

Isaura Morais

“Não se reconhece o valor com mimos e atenções, reconhece-se com respeito e consideração pelo seu trabalho e competência”. vida política e, mais tarde ou mais cedo, poderemos vir a ter mulheres a ocupar os mais altos cargos da nação”. A presidente da Câmara Municipal de Rio Maior encara de forma crítica as atenções e deferências usadas em relação a mulheres que exercem cargos políticos quando elas estão no exercício dos mesmos. “Não se reconhece o valor com mimos e atenções, reconhece-se com respeito e consideração pelo seu trabalho e competência”. Quando lhe perguntamos qual considera ser a maior vantagem das mulheres, em geral, relativamente aos homens, diz que são mais intuitivas e acrescenta que o 6º sentido efectivamente existe. Defende que: “Quando duas pessoas dividem o mesmo espaço manda o consenso e o bom senso!” e sobre a forma como ocupa as horas vagas responde com uma pergunta: “Que horas vagas?”

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presidente da Câmara Municipal de Abrantes acredita que a igualdade plena entre homens e mulheres vai ser alcançada e explica os motivos que a levam a pensar assim: “Essa minha certeza vem da confiança que deposito no trabalho que temos vindo a desenvolver, nas novas gerações… homens e mulheres que acreditam num mundo construído, dia-a-dia, de forma partilhada e alicerçada no facto de assumirmos as nossas diferenças como a nossa força motriz!”. Sobre o caminho já percorrido lembra que só quem não quer é que não vê. “Se olharmos para trás não podemos deixar de valorizar o trabalho empenhado, de muitos homens e de muitas mulheres, em resultado do qual estamos paulatinamente a construir esse futuro. Portugal é, nesta matéria, um bom exemplo – há 45 anos atrás, as mulheres no nosso país tinham seguramente muito menos direitos e liberdades fundamentais.”, afirma. A autarca diz que nunca teve pena de não ter nascido rapaz e que não inveja nada nos homens porque a inveja é um sentimento que faz por não ter e porque a inveja entre géneros é um conceito que para ela não faz sentido. “A nossa força está nas nossas diferenças. Somos diferentes e precisamos das diferenças para construirmos o nosso caminho comum”, sublinha. Defende o sistema de quotas em vigor para a constituição de listas de candidatos mas como uma situação transitória. “Concordo com as quotas porque de outra forma existiriam lugares a que as mulheres ainda hoje não teriam acesso. A criação de um sistema de quotas permitiu evoluir mais rapidamente na mudança de mentalidades e na produção de oportunidades para as mulheres mas acredito firmemente que as gerações mais recentes e as seguintes se encarregarão de tornar este sistema obsoleto”. Quando decidiu ter actividade política Maria do Céu Albuquerque ouviu alguns avisos relativos à possibilidade de as funções como autarca a fazerem descurar o seu papel de mãe e de mulher mas com esforço e determinação conseguiu provar que poderia conciliar os vários papéis. Quanto ao facto de alguns mimos e atenções serem mais

Maria do Céu Albuquerque

Quanto ao facto de alguns mimos e atenções serem mais manifestações de cavalheirismo e de simpatia do que de verdadeiro elogio ao seu trabalho político, refere que se limita a aceitá-los de bom grado. “Receber mimos e atenções é uma necessidade de qualquer ser humano. Os afectos não têm ‘género’” manifestações de cavalheirismo e de simpatia do que de verdadeiro elogio ao seu trabalho político, refere que se limita a aceitá-los de bom grado. “Receber mimos e atenções é uma necessidade de qualquer ser humano. Os afectos não têm ‘género’”. Diz que em sua casa quem manda é a democracia e que o contributo de cada um para as tarefas domésticas não tem que ser medido a régua e esquadro, mas entendido de acordo com uma partilha aceite por todos. Se em vez de filhas tivesse tido filhos acredita que a educação teria sido feita da mesma forma. “Com muito amor, respeito e regras”. Gosta de ler escritores da América Latina, nomeadamente Gabriel Garcia Marques e Mário Vargas Llosa e é também do outro lado do Atlântico que lhe chega a sua música preferida, através de nomes como Elis Regina, Tom Jobim ou Chico Buarque. Nos últimos tempos tem também ouvido com mais atenção alguns fadistas

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Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE Teve pena de sair da tropa mas revela que os primeiros tempos como militar não foram fáceis. Muitas vezes chorava ao telefone quando à noite a mãe lhe ligava para saber como estava mas nunca desistiu de prosseguir o objectivo que tinha traçado

Rita Pinto

De chefe de tanque no Exército para defensora da segurança no trabalho da Resitejo Rita Pinto admira a mãe por ter adoptado uma criança abandonada com problemas Aos onze anos de idade perdeu o pai com quem tinha grande cumplicidade. Aos 23 ganhou uma irmã mais nova quando a mãe adoptou uma criança deficiente que ela adora. Foi para a tropa e chefiou um tanque de guerra. Jogou futsal a nível federado. Agora é engenheira do Ambiente na Resitejo e vela pela segurança de duas centenas e meia de trabalhadores. Chama-se Rita Pinto, tem um filho de seis anos e é um exemplo de mulher.

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uando tinha vinte e três anos, Rita Pinto, ganhou uma irmã de cinco anos, adoptada pela sua mãe, que tinha enviuvado. A menina tinha sido abandonada pela mãe biológica e tinha uma incapacidade cognitiva de sessenta por cento. A situação, uma das mais marcantes da sua vida, é referida como um exemplo da força e do querer de sua mãe que muito admira e que aponta como exemplo de mulher. Rita Pinto, agora com 33 anos, divorciada e com um filho de seis anos, tem naquela irmã uma grande companheira, com

quem passa muito tempo. Tem também duas irmãs mais velhas de quem gosta imenso. “Admiro a minha mãe por ela ter adoptado a minha irmã mais nova. Também gostava, se algum dia tiver possibilidades, de seguir aquele seu exemplo”, diz. A trabalhar desde 2013 na Resitejo, entidade que trata dos lixos dos municípios do Médio Tejo, como Engenheira do Ambiente, Rita Pinto, natural da Chamusca, também é uma mulher fora do comum. Antes do actual trabalho foi chefe de carros de combate no Campo Militar de Santa Margarida. Aliás, foi a primeira mulher da unidade com aquelas funções e logo num carro de combate pesado, conhecido por tanque. Naquelas funções tinha de saber fazer de tudo um pouco, desde conduzir a viatura de cinquenta toneladas de peso, até disparar o canhão com que a mesma estava armada. Na Resitejo as suas funções são as de zelar pela segurança dos trabalhadores, avaliando os riscos e minimizando a possibilidade de ocorrerem acidentes. Considera que em situações de acidentes é essencial manter a calma, coisa que aprendeu no tempo em que esteve no exército. Possui formação em socorrismo e já teve de prestar os primeiros socorros a alguns funcionários em pequenos acidentes de trabalho. Mas até agora não teve de inter-

vir em situações graves, apesar de se sentir preparada para tal. A engenheira da Resitejo confessa que teve pena de sair da tropa mas revela que os primeiros tempos como militar não foram fáceis. Muitas vezes chorava ao telefone quando à noite a mãe lhe ligava para saber como estava mas nunca desistiu de prosseguir o objectivo que tinha traçado e sente-se orgulhosa dessa sua atitude.

Faz também questão de afirmar que está grata ao exército por lhe ter incutido valores essenciais para a vida, como o sentido de responsabilidade e o espírito de camaradagem e de entreajuda. Por ser uma das primeiras mulheres na unidade militar, Rita Pinto confessa que na altura a sua presença não era muito bem vista por alguns militares do sexo masculino. Os primeiros tempos foram muito exigentes. Dá como um pequeno exemplo, o facto de ter que se levantar todos os dias mais cedo que os outros para fazer a sua higiene pessoal, de forma a não estar misturada com os homens. O que lhe valeu na altura foi ter crescido como uma “Maria-rapaz”, graças ao pai a quem fazia companhia para todo o lado até à altura do seu falecimento, devido a um tumor, quando ela tinha 11 anos. Rita Pinto foi jogadora federada de futsal, tendo terminado a carreira há quatro anos. Jogou no Goleganense, no Riachense e no CAD do Entroncamento. Apesar do seu ar feminino confessa que sempre teve “mais tendência para coisas masculinas”. Afirma que é decidida mas que actualmente está fortemente concentrada no seu trabalho não fazendo planos e vivendo um dia de cada vez. Na Resitejo, onde entrou nos quadros após um estágio, tem de lidar com todo o tipo de situações e tem de ter a capacidade de fazer com que sejam cumpridas as normas de segurança, não através de uma posição policial mas de insistência, persistência e persuasão usando para tal a sua natural afabilidade e o seu discurso simples mas directo e decidido

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“Não invejo nada aos homens e gosto imenso de ser mulher” Maria Amélia Rodrigues Carvalho Sousa Macedo - gerente da Autogirar Tem dois filhos e uma filha e diz que os educou com amor, carinho e bom senso mas que a educação da rapariga não foi decalcada da dos rapazes. Maria Amélia Sousa Macedo percebe que as mulheres continuam a ser discriminadas mas que sistemas impostos, como o das quotas para a política, não são a melhor forma de atingir a igualdade.

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aria Amélia Rodrigues Carvalho Sousa Macedo, gerente da Autogirar – Sociedade Comercial de Automóveis, Ldª de Santarém, diz que participou em muitas reuniões de trabalho, tanto naquela qualidade como na de presidente da Associação de Concessionários da NISSAN, em que era a única mulher e que isso nunca a intimidou. “Não invejo nada nos homens e gosto mesmo de ser mulher. Considero que homens ou mulheres têm características próprias que não são determinadas pelo sexo”, declara, explicando de seguida que isso não significa que exista igualdade. “Penso que nas sociedades ocidentais se verificaram progressos em termos de igualdade mas não creio que possamos dizer que existe igualdade plena. Por exemplo, ao nível dos salários ainda há muitas situações em que se paga de modo diferente a homens e a mulheres e também sabemos que na contratação, muitas vezes, se deixa de admitir mulheres apenas porque estas podem vir a ser mães… Mas penso que estamos no caminho da mudança”, defende. Maria Amélia Macedo lembra que na sua empresa trabalham homens e mulheres e que o que conta é o trabalho de toda a equipa. “O meu objectivo diário é ter a capacidade de gerir o melhor possível a nossa empresa, contando com a ajuda preciosa de uma grande equipa que trabalha connosco, com a ajuda e o desempenho brilhante do meu marido na área das vendas, com as minhas duas irmãs e com a mais valia que é ter um pai de 78 anos que dedica toda a sua experiência à nossa empresa”. Reconhece que qualquer mulher que queira dedicar-se à política tem que abdicar de muitas coisas e que nem sempre é fácil ser aceite num mundo ainda muito masculino. Percebe o sistema de quotas que obriga à inclusão de um certo número de mulheres nas listas de candidatos para deputados ou para autarcas mas não gostava que fosse assim. “As mulheres não deviam precisar de regras legalmente impostas. Gostava mais que as escolhas fossem feitas por mérito e capacidade de trabalho. Essa ideia das quotas pode ser perversa, na medida em que separa as mulheres dos homens e na medida em que abre caminho a mais quotas para outras categorias”, reflecte. Provavelmente tendo-se a si como referência diz que, de um modo geral, as mulheres são mais organizadas e versá-

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As empresas com mulheres na direcção têm mais lucros que as geridas só por homens” Maria Pinto Correia Watts - Directora Geral Clinicalm - Clínica Médica e Dentária

Maria Amélia Sousa Macedo

“O meu objectivo diário é ter a capacidade de gerir o melhor possível a nossa empresa, contando com a ajuda preciosa de uma grande equipa que trabalha connosco teis. “Conseguimos fazer muito mais coisas em simultâneo que os homens…”, resume. Com algum humor refere que em casa as tarefas são repartidas mas nem sempre por igual. “(...) há coisas que sou eu que faço e outras o meu marido e os meus filhos, às vezes em percentagens desequilibradas !!”. Sobre a educação dos filhos, Maria Amélia Sousa Macedo diz que não é indiferente o facto de serem rapazes ou raparigas. “De uma forma geral devem ser educados com muito amor e muita atenção mas é claro que há algumas diferenças ao nível da educação. Tenho dois rapazes, o Bernardo com 25 anos e o Gonçalo com 20 anos e tenho a Carlota que tem 23 e teve que imperar o bom senso”, refere. Gosta de estar com amigos, de ver um bom filme e de ler um bom livro. Na altura em que respondeu às questões de O MIRANTE estava a ler “A Amiga Genial”, de Elena Ferrante. Mas os poucos tempos livres que tem não são todos reservados para actividades intelectuais. Como ribatejana de gema que se preza de ser já assistiu a algumas touradas e como adepta do Sporting também já foi ao futebol

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A Médica Dentista é contra a lei que obriga os partidos políticos a incluir uma determinada percentagem de mulheres nas suas listas. Diz que uma das razões para as mulheres não estarem na política é falta de vontade das próprias. Em vez da lei diz serem preferíveis iniciativas que estimulem salários comparáveis e horários flexíveis.

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com grande sentido de humor que a Médica Dentista e directora geral da Clinicalm de Almeirim responde à pergunta do questionário de O MIRANTE relativa a uma característica comum a todos os homens. “Ainda não conheci um que não gostasse de cerveja.”, afirma. Ainda sobre os homens diz que quase todos aparentam ter uma grande auto-confiança. E acrescenta que só conseguem fazer uma coisa de cada vez, ao contrário das mulheres que são “multi-tasking”. Perante este quadro não espanta que Maria Pinto Correia Watts diga que nunca teve pena de não ter nascido rapaz. Questionada sobre o facto de haver poucas mulheres na política considera que existirão várias razões mas que “a falta de motivação e de modelos positivos e a própria visão política do universo eleitor feminino” contribuem para isso. E refere a propósito que as maiores críticas de uma mulher são sempre outras mulheres. Acrescenta que é contra a Lei da Paridade que obriga os partidos a colocarem uma percentagem de mulheres nas listas. “Acho preferível iniciativas que estimulem salários comparáveis e horários flexíveis”, defende. Sobre a igualdade entre homens e mulheres diz que em Portugal ainda não existe e que tal facto não acontece apenas no nosso país. “Basta olhar para a grande diferença entre salários entre homens e mulheres a desempenharem as

Maria Pinto Correia Watts

“Cresci a ir a corridas de touros e adorava. Hoje em dia sinto-me dividida entre as minhas raízes e a consciência de que não é muito correcto para com o touro mesmas funções. No Reino Unido, por exemplo, existe um discrepância de quase 14% entre os salários de homens e mulheres que trabalham a tempo inteiro. Mas as coisas estão a mudar e países como a Suécia estão perto de extinguir essas diferenças”. O que também vai mudar, na sua opinião, é a discriminação no acesso a cargos de chefia. “Os números mostram que as empresas com mulheres no quadro da direcção têm uma margem de lucros superior a empresas com uma direcção exclusivamente masculina. A grande questão continua a ser a maternidade e a mentalidade errónea de que uma mulher com filhos não se consegue dedicar da mesma forma ao trabalho como um homem”, afirma. Maria Pinto Correia Watts gosto de ler um bom livro ou de viajar para um lugar novo e tenta manter um aula de yoga semanal. Natural de Santarém sente-se dividida em relação às touradas. “Cresci a ir a corridas de touros e adorava. Hoje em dia sinto-me dividida entre as minhas raízes e a consciência de que não é muito correcto para com o touro”, desabafa

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“Homens com carreiras exigentes estão a perder o privilégio de estar com os filhos” Júlia Amorim - Presidente da Câmara Municipal de Constância

Quando era nova zangavase com a mãe por isentar o irmão da realização de tarefas domésticas. Apesar disso nunca desejou ter nascido rapaz. Reconhece que a igualdade entre homens e mulheres só existe na lei. Defende que tanto homens como mulheres tenham mais tempo para estar com os filhos.

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a casa da presidente da Câmara Municipal de Constância as tarefas são partilhadas mas na contabilidade geral Júlia Amorim acaba por ter a seu cargo cerca de 60 por cento do total que há a fazer. Uma situação a que não dá grande importância embora diga que o que mais inveja nos homens é o tempo livre e refira que quando era nova o irmão estava dispensado de fazer tarefas domésticas. Apesar disso diz que nunca teve pena de não ter nascido rapaz. “(...) nem mesmo quando eu e a minha irmã nos zangávamos com a minha mãe porque tínhamos de ajudá-la nas tarefas domésticas e o meu irmão era dispensado”, sublinha. Autarca há muitos anos, acredita que não há mais mulheres na política porque muitas optam por não participar activamente e também porque os homens acabam por ter melhores condições para o fazer. Mas na sua opinião a situação poderia ser bem pior sem o sistema de quotas, apesar de ser contra ele. “As mulheres não precisam de um sistema de quotas para se afirmarem, precisam é que lhes dêem condições e oportunidades. Contudo e porque até alguns partidos políticos não conseguiram implementar internamente a paridade, infelizmente tiveram que legislar sobre esta matéria. Por princípio sou contra as quotas mas reconheço que é um mal necessário. Acredito que virá o dia em que não haverá essa necessidade”, declara. Lamenta as desigualdades entre homens e mulheres e refere que algumas situações de discriminação são concretizadas de forma inconsciente. “Apesar do princípio da ‘Igualdade entre mulheres e homens e a não discriminação’, estar expressa na Constituição da República Portuguesa, bem como inúmeras medidas estarem legisladas em Portugal e na União Europeia com vista à promoção dessa igualdade, a verdade é que (...) subsistem desigualdades a nível económico, político, social e cultural. E o mais grave é que (...) por vezes a discriminação faz-se de uma forma inconscien-

Júlia Amorim te, o que é deveras perigoso”, alerta. Júlia Amorim gostava que fossem criadas condições “(...) em favor das mulheres e dos para terem mais tempo para se dedicarem à família e ao lazer”. E acrescenta: “Penso até que é tempo dos homens com carreiras profissionais exigentes perceberem que estão a perder uma grande oportunidade e o grande privilégio de estarem mais tempo com os filhos(as)”. A presidente da Câmara Municipal de Constância gosta que o seu trabalho seja reconhecido e diz que muitas atenções de que foi alvo se deveram a isso, embora perceba que alguns desses gestos, que aprecia, como qualquer mulher, tenham por base apenas a cortesia e o cavalheirismo. Foi uma vez a uma tourada pela mão do avô quando tinha dez anos e também só viu um jogo num estádio envolvendo um dos clubes grandes mas decerto não irá esquecer um jogo da selecção para um campeonato da Europa em que a filha, então com nove anos, foi uma das escolhidas para entrar em campo de mão dada com um dos jogadores participantes. Nos tempos livres gosta de ir ao cinema, de conhecer coisas novas e...de não fazer rigorosamente nada

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comemorativa do 29º aniversário

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2º caderno

Alguns amigos ajudaram-na também nesses tempos difíceis convidando-a a integrar o grupo de música popular Barquinha Saudosa, que este ano foi registado como associação e onde é figura de proa. “Hoje reconheço que foi a minha salvação. Nunca esquecerei esse acto de amizade”, diz.

Dar alegria aos outros para conseguir vencer as tempestades da vida

Tina Jofre

Tina Jofre - artista multifacetada de uma vila poema chamada Constância Maria Cesaltina Ferreira, ou Tina Jofre o seu nome artístico, é uma personalidade bem conhecida em Constância pela sua ligação à música, à cultura e à vida associativa. Uma mulher com uma vida rica e multifacetada que enfrentou a viuvez compondo e cantando a sua tristeza.

O

dia 21 de Abril de 1999 fica marcado para sempre na vida de Maria Cesaltina Gomes Pereira Dias Ferreira. A nefasta notícia de que o seu marido, Rui Jofre, tinha morrido na sequência de um acidente com o helicóptero que pilotava no norte do país fez o seu mundo despenhar-se. Aos 51 anos perdia o companheiro de uma vida, o piloto que se perdera de amores por ela quando, ainda um jovem oficial da Base Aérea de Tancos, vira a jovem Cesaltina cantar e tocar acordeão na festa de Limeiras (Vila Nova da Barquinha). O homem que construiu o “castelo” dos seus sonhos para a sua “princesa” na Quinta da Capareira, à saída de Constância em direcção a Abrantes. “O dia mais negro” da sua vida deixou-a de rastos, tal como às filhas do casal, Elsa e Sara. Ruía pelos sortilégios do acaso, pela

força bruta de um vendaval, uma história de amor que Cesaltina viveu durante mais de 30 anos e que está bem documentada pelas fotografias e outros objectos espalhados pelo amplo salão da casa que agora habita sozinha. “Não consigo sequer pensar noutra companhia. Era uma pessoa excepcional, um homem insubstituível”, diz com emoção. Foi à música que Cesaltina, mais conhecida no meio artístico como Tina Jofre, se agarrou para tentar superar a dor e enfrentar a viuvez. “Não sou mulher de desistir. Comecei a compor e a cantar a minha tristeza”. Tem várias letras dedicadas ao marido. Alguns amigos ajudaram-na também nesses tempos difíceis convidando-a a integrar o grupo de música popular Barquinha Saudosa, que este ano foi registado como associação e onde é figura de proa. “Hoje reconheço que foi a minha salvação. Nunca esquecerei esse acto de amizade”, diz. Tina Jofre já actuou em Itália, Suíça, França, Brasil, São Tomé. Compõe, toca e canta. Tem carteira profissional, está filiada no Sindicato dos Músicos e registada como cantautora na Sociedade Portuguesa de Autores. Participa em muitos espectáculos solidários sem cobrar cachê. “Sempre que me pedem eu vou. Se Deus me deu voz foi para cantar”. E a sua veia artística não se esgota na música. A pintura, seja em tela, azulejo ou porce-

lana, é outra actividade que desenvolve e já participou em exposições em Portugal e no estrangeiro. Os rios, Camões e a política Maria Cesaltina nasceu em Constância no dia 1 de Agosto de 1947. É oriunda de uma família muito conhecida na vila e não se vê a viver noutra terra. As suas memórias de infância estão umbilicalmente ligadas à geografia local. O pai tinha um barco para transporte de mercadorias, também fazia as ligações entre as margens dos rios e era pescador. “Chegava a ter seis homens para o arrasto das redes na pesca do sável”, conta. E a pequena Cesaltina, nascida a poucos metros da foz do Zêzere, habituou-se desde cedo a conviver com os rios e as suas manhas. O pai até fez um barco só para ela – chamava-se “Joaninha” - e ela remava, pescava e até ia à caça com o pai. “Adoro Constância e os rios”, diz. Essa paixão está aliás bem expressa nalgumas letras de sua autoria. O entusiasmo pela música vem também dessa infância feliz e colorida. Após o ensino primário foi aprender música com um acordeonista da zona e mais tarde estudou no Conservatório de Tomar. Foi também muito jovem que começou a cantar e a entrar em espectáculos de teatro e variedades, festas e bailaricos. Com o nascimento

do Clube Estrela Verde, que ajudou a fundar pouco tempo após a revolução de 25 de Abril de 1974, envolveu-se na parte cultural e ajudou na organização de espectáculos vários. Falar de Constância e de cultura sem falar de Camões é improvável. Cesaltina é uma admiradora do poeta e durante muitos anos colaborou assertivamente com a Associação Casa-Memória de Camões e com o Jardim-Horto Camoniano, projectos criados pela jornalista lisboeta Manuela Azevedo, de quem foi uma espécie de braço direito. Ao longo de quase 20 anos fez muitas visitas guiadas de escolas ao Jardim-Horto e envolveu-se noutras iniciativas. “Sempre sem qualquer remuneração, apenas por amor a Constância”, sublinha. Pessoa multifacetada e muito conhecida na vila natal e nas redondezas, Cesaltina experimentou também a política. Em 1997 foi candidata à junta de freguesia pelo PSD. O resultado foi fraco e a história por aí se ficou. “Não quiseram, paciência...”. A música, a casa, as duas filhas e as duas netas chegam bem para lhe preencher os dias. “Cantarei até morrer e morrerei como as árvores, de pé”, assegura

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13 | 17 Novembro 2016

2º caderno

Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE

“Também já há homens com dificuldade de se afirmarem em determinadas profissões” Maria João Maia - Professora e directora de turma na Escola Profissional de Rio Maior

Há um lobby masculino da política que dificulta a entrada de mulheres mas estas também se afastam devido à falta de tempo. O facto da idade fértil das mulheres coincidir com a altura em que o seu desempenho profissional é maior obriga-as a uma opção muito difícil, defende a professora Maria João Maia.

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aria João Maia reconhece que chegou a lamentar ocasionalmente não ter nascido rapaz mas que isso lhe passou depressa. A professora e coordenadora de projectos na Escola Profissional de Rio Maior lembra que em algumas profissões as mulheres têm que trabalhar mais que os homens para se afirmarem mas diz, com ironia, que actualmente já há homens que também têm dificuldade em afirmar-se em determinadas profissões. Falando ainda sobre os homens diz que são todos diferentes mas que há traços comuns à maioria. Têm tendência a sobrevalorizar o seu trabalho e subvalorizar o trabalho das mulheres em geral e como funcionam por objectivos têm dificuldade em realizar várias tarefas simultaneamente. “As mulheres para além de trabalharem em termos profissionais ainda têm as tarefas domésticas (gestão doméstica), a educação dos filhos (acompanhamento a um sem número de actividades extra curriculares), são seres multitasking.” Acredita que existe um lobby masculino na política, o que diz ser uma questão bastante controversa que já foi objecto de vários estudos e debates e que esse será um dos motivos para que haja poucas mulheres em cargos políticos relevantes. O que mais critica nos homens é não aproveitarem produtivamente o tempo disponível. Interrogada acerca da percentagem de tarefas domésticas que tem normalmente a seu cargo diz que deverá andar pelos 70 por cento. Para a professora Maria João Maia há vá-

Maria João Maia rias explicações para o facto de as mulheres terem mais dificuldade no acesso a cargos de direcção e chefia. “As mulheres são “penalizadas” pelo facto de a idade em que são mais produtivas em termos profissionais (início e consolidação da carreira) coincidir também com o período em que são mais férteis para engravidar (serem mães) e cumprirem assim um dos desígnios mais importantes das suas vidas. Ou seja, têm que fazer uma opção difícil. Acredito que a maior parte das mulheres que chegam longe na política ou no meio empresarial (sem generalizar) ou abdicam de ser mães ou têm um grande suporte familiar”, defende. A mesma explicação é dada para a falta de mais mulheres na política. “Ninguém segue a vida pública por obrigação. Tem que ser por gosto. E o serviço público deve ser quase um “sacerdócio. As mulheres têm menos oportunidades pois têm de conciliar a vida pública com a vida familiar e profissional o que já por si é muito absorvente. Também nesta matéria os homens estão em vantagem”, defende

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2º caderno

Délia Café, quarta classe em criança, nono ano terminado já mulher e mãe, é inteligente, atenta, de opinião própria e garra ribatejana. É a mulher que todos querem ter como amiga e com quem ninguém deseja falhar. Não tem papas na língua

Délia Café

A generala dos tachos que não suporta ver campinos mal fardados em dias de festa Délia Café trabalha na Junta de Freguesia de Benavente e é cozinheira por paixão “Cozinhar é o mais privado e arriscado acto. No alimento coloca-se ternura ou ódio. Na panela verte-se tempero ou veneno. Cozinhar não é um serviço, é um modo de amar os outros”. A frase, escrita pelo escritor moçambicano Mia Couto, inspirou-se em mulheres como Délia Café, “generala” da cozinha na festa da Picaria, em Benavente.

É

considerada a “generala” da cozinha no almoço anual da Picaria nas festas de Benavente, sua terra natal. Chama-se Délia Café e cresceu na freguesia de Barrosa, onde hoje mora com o rapaz que conheceu aos 14 anos. Um campino, claro. É apaixonada pela festa brava e por tudo o que diz respeito ao trabalho dos campinos. Considera-se perfeccionista e diz-se “refilona” por ter o coração ao pé da boca mas tem também um lado tímido, ligado à sua maior virtude: a generosidade. Não recebe um cêntimo para organizar o almoço para 400 pessoas, que acontece no sábado da festa da Picaria, que coincide com a Festa da Sardinha Assada. Há 27 anos que ajuda e há seis que é a coman-

dante dos tachos. Entre os campinos, a palavra de Délia é lei. Deixou de montar a cavalo, porque acha que ficou “forte” depois de ter tido a sua segunda filha. “Acho que não ficaria elegante em cima do cavalo”, desabafa. Délia Café, quarta classe em criança, nono ano terminado já mulher e mãe, é inteligente, atenta, de opinião própria e garra ribatejana. É a mulher que todos querem ter como amiga e com quem ninguém deseja falhar. Não tem papas na língua: “Se vejo um campino mal fardado no desfile, refilo logo. Aliás, não admito isso”, sublinha, feroz e doce. Tudo isto é possível nesta mulher que se diz aventureira e sonha viajar – adorava conhecer o Brasil. Só conheço Espanha”, lamenta. Ir viver para outro lado está fora de questão. “Não iria aguentar as saudades dos toiros e dos cavalos”, diz. Délia não é cozinheira de profissão – trabalhou numa fábrica e agora é auxiliar na Junta de Freguesdia de Benavente. Mas é cozinheira de coração. Deu os primeiros passos na arte de transformar os alimentos em iguarias na Casa Agrícola Fernando Palha, onde o marido trabalhou. “Faziam-se muitas festas, almoços e jantares e a cozinheira, a D. Florinda, ensinou-me muito. Foi lá, na Quinta da Foz, que aprendeu a fazer a famosa Sopa da Foz: “É quase igual à Sopa da Pedra, mas junta-se couve lombarda”, revela.

Preparam 70 kg de carne e descascam 200 kg de batata para a festa Para alimentar as 400 pessoas que almoçam no sábado da festa da Picaria em Benavente, Délia junta “uma meia dúzia” de ajudantes e começa na quinta-feira a organizar e a definir tarefas. Às onze e meia de sábado o almoço tem de estar pronto. A ementa é fixa – e deliciosa – “É sempre Jardineira e Sopa de Peixe. O que equivale a preparar 70 quilos de carne de vaca, descascar 200 quilos de batata, cortar outros 30 de feijão verde, entre outros vegetais que fazem parte da receita”, explica. Na cozinha, é sempre “uma barulheira”, com a alegria a comandar. “Vamos trabalhando e contando anedotas. As mulheres mais velhas “picam” as mais novas. “Contam histórias dos maridos e coisas assim”, revela Délia de riso solto. Cozinhar é algo que faz sempre com pra-

zer. “Todos os fins-de-semana tenho a casa cheia de gente. Gostam muito da minha feijoada e do galo com grão que eu faço”, conta. Também é sempre convidada para ajudar na festa de Vila Franca de Xira: “Faço o jantar do dia da corrida nocturna e os pequenos-almoços de quatro dias”, explica. E muitas vezes é ela quem oferece, da sua quinta, a carne para as refeições. Não ganha um cêntimo, recordamos. “Cozinho por amor à festa brava”, diz, com convicção. Délia Café mora com o marido e as duas filhas em Barrosa, numa quinta onde não faltam porcos, galinhas ou patos. “Nesta altura tenho ainda dois bezerros que tenho de alimentar a biberão”, revela. Para isso, acorda todos os dias às seis da manhã. Trata dos animais, prepara o franel do marido. “Sou muito feliz com a vida que tenho”. Conheceu o marido, Mário Café quando tinha 14 anos. “Eu dançava no rancho, ele ofereceu-me uma rosa. Foi amor à primeira vista”. Apesar de, na dança, Mário Café ser “pé-de-chumbo”, é considerado um dos melhores campinos do Ribatejo. Trabalha actualmente na ganadaria do recentemente falecido David Ribeiro Telles e é o orgulho de Délia: “Sou mais vaidosa com ele do que comigo”, admite. Também é ciumenta. “Na festa de Azambuja, vi uma rapariga montada com ele no cavalo e fui logo direita a ela e desmontei-a”, conta. Mário Café que assiste à conversa, limita-se a rir porque conhece bem a mulher. Ela resume a receita para um bom casamento. “O sucesso de uma relação é o respeito e nós respeitamos muito o espaço um do outro”, remata

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15 | 17 Novembro 2016 PUBLICIDADE

2º caderno

Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE


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comemorativa do 29º aniversário

“Ainda quero ver uma mulher como presidente de um dos grandes clubes de futebol” Diva Cobra - Presidente do conselho de administração da Desmor - Rio Maior Educar os filhos de acordo com o sexo só ajuda a manter as desigualdades entre homens e mulheres que continuam a existir na sociedade. Essa é a opinião de Diva Cobra que só lamentou não ter nascido rapaz quando era jovem e eles não a deixavam jogar à bola.

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ortugal não tem muitas mulheres em cargos de liderança política e Diva Cobra, presidente do conselho de administração da Desmor - Empresa Municipal que gere o complexo desportivo de Rio Maior - diz que para a situação se alterar necessitamos de uma democracia mais consolidada. Curiosamente, quando se fala do futuro não diz que tem o desejo de ver uma mulher eleita Presidente da República mas sim presidente de um grande clube de futebol chamando a atenção, de forma indirecta, para um sector onde ainda deverá haver menos mulheres do que na política. A gestora diz que a igualdade entre homens e mulheres não existe mas regista as melhorias que têm vindo a aconte-

Diva Cobra cer. “Penso que existe igualdade ao nível do ensino, do trabalho e do emprego mas não sinto que exista ao nível da família e naquilo que é a conciliação entre a vida profissional, familiar e pessoal. É uma questão cultural mas tenho esperança que consigamos evoluir nesse sentido. Se olharmos para os dados relativos à violência doméstica sobre as mulheres, e aos níveis de participação feminina no desporto, vemos que ainda temos algum caminho a percorrer”, refere. Uma outra situação a que Diva Cobra considera necessário dar atenção prende-

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-se com a educação que algumas famílias dão aos filhos. Infelizmente não é dada a mesma educação a filhos e filhas. E entristece-me um pouco ver isso na minha geração, onde as coisas já deveriam ser tão diferentes …” Sobre quem manda em casa é peremptória. “Responsabilidades repartidas por todos, inclusive pelos mais novos, para um dia mais tarde saberem ‘mandar’ nas suas próprias casas”. E há alguma razão para as mulheres continuarem tão afastadas dos lugares de chefia? A presidente do Conselho de administração da Desmor pensa que a pouco e pouco essa questão vai sendo resolvida. “Acho que esses números tendem a ser cada vez mais equilibrados. Valoriza-se cada vez mais a qualidade e a competência independentemente do género. No entanto, penso que o facto de muitas mulheres não enveredarem por cargos de chefia ou maior responsabilidade se prende com a falta de disponibilidade que advém da conciliação entre a vida profissional, familiar e pessoal. Mas cabe às mulheres também mudar isso”, diz. Nos tempos livres Diva Cobra gosta de ler, ouvir música e de correr. Não é apreciadora de touradas

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Se olharmos para os dados relativos à violência doméstica sobre as mulheres, e aos níveis de participação feminina no desporto, vemos que ainda temos algum caminho a percorrer”, refere.


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A freira que gosta de rir e que na infância jogava à bola e subia às árvores Amália Saraiva está na Congregação das Irmãs Reparadoras de Nossa Senhora de Fátima Gosta de rir, de ler, de ir ao cinema e ao teatro. Decidiu ser freira aos vinte anos e apesar dos pais serem pessoas de fé ficaram surpreendidos com a sua decisão. Foi Missionária em Moçambique e Timor e diz que aprendeu muito com aqueles a quem foi ajudar. É, desde Janeiro de 2015, directora da revista Stella.

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os 20 anos já Amália Saraiva tinha decidido que caminho trilhar na vida. Diz que sempre demonstrou uma enorme vontade em conhecer Deus e que a sua vocação se foi fortalecendo e esclarecendo ao longo do tempo. No entanto, nem tudo foi fácil. Quando comunicou à família a sua decisão de seguir a vida religiosa, a primeira reacção do seu pai foi demovê-la. “Ninguém tinha percebido que queria ser freira por isso quando lhes comuniquei a minha intenção ficaram muito surpreendidos. Disse-o de forma muito determinada o que criou alguma tensão e sofrimento. O meu pai tentou demover-me dessa ideia num primeiro momento. Apesar de ser uma pessoa de fé, tinha idealizado outra coisa para mim. A minha mãe também ficou surpreendida mas aceitou logo. Depois desse primeiro choque apoiaram-me”, recorda Amália Saraiva, que tem mais dez irmãos. A freira Amália Saraiva, da Congregação das Irmãs Reparadoras de Nossa Senhora de Fátima, que se situa a poucos metros do Santuário de Fátima, teve uma infância feliz na aldeia de Santa Marinha, concelho de Seia, na Serra da Estrela, onde nasceu há 53 anos. Gostava muito de brincar e era uma Maria-rapaz. Jogava à bola com os rapazes, andava de bicicleta e subia às árvores. Na adolescência chegou a ter alguns pretendentes mas recusou sempre namo-

rar. “Nessa altura eu já sentia uma grande vontade de conhecer Deus e de fazer bem aos outros. Foram estas duas ideias que me trouxeram para aqui,”explica. Amália Saraiva pormenoriza o caminho percorrido. “O chamamento não é claro, no início. Não sentimos o chamamento de forma clara e explicita. Isso vai-se esclarecendo ao longo tempo. Durante o processo do caminho da fé tive muitas dúvidas mas nunca tive dúvidas em relação à minha vocação. Nunca tive dúvidas que este era o caminho que queria para mim”, conta. Licenciada em Educação, e com uma especialização em educação de adultos, foi missionária. Esteve três anos em Moçambique e três meses em Timor. Garante que trouxe consigo uma riqueza imensa de ambas as experiências. “Quando pensamos em ir para as missões achamos que vamos ajudar as pessoas e dar um contributo válido no aprofundamento da sua fé e a nível do desenvolvimento humano e educativo. Na verdade trazemos muito mais do que eventualmente podemos dar. As pessoas, que são os nossos interlocutores e formandos, são também nossos formadores. É uma troca de experiências muito rica uma vez que estamos num ambiente que desmonta todo o nosso esquema mental.” A Irmã Amália Saraiva dirige, desde Janeiro de 2015, a revista Stella - criada pelo padre Manuel Formigão (fundador da Congregação das Irmãs Reparadoras de Nossa Senhora de Fátima) há cerca de 80 anos. Não vê televisão por opção, à excepção dos noticiários. Tem telemóvel e utiliza a internet mas recusa-se a ter conta na rede social Facebook. “Quando me convidaram para directora da revista Stella impus como condição que eu não tivesse que ter conta no Facebook. A revista pode ter e a conta ser gerida por outra irmã. Não sou apreciadora das redes sociais, não me identifico com esse tipo de comunicação, embora lhe reconheça a utilidade. De resto, utilizo a internet que é um instrumen-

Amália Saraiva

to de trabalho muito importante”, explica. Considera-se uma pessoa com sentido de humor e gosta de se rir com as pessoas que sabem rir-se da vida. Vai ao cinema ver filmes “muito direccionados”. “A Ressurreição” foi o último que viu este ano. Recentemente foi ao teatro, com a sua irmã mais nova que vive em Lisboa, ver a peça “Um Diário de Preces”, depois de ter gostado muito de ler o livro com o mesmo título. Ler é um dos seus passatempos preferidos. Gosta de passar as suas férias na sua aldeia com a família. As festas do Natal e da Páscoa são passadas com a sua família de opção, na Congregação. “Se houver um acontecimento importante na nossa família por esta altura vamos ter com

Não vê televisão por opção, à excepção dos noticiários. Tem telemóvel e utiliza a internet mas recusa-se a ter conta na rede social Facebook.

eles”, afirma. O seu dia-a-dia é passado entre a oração e o trabalho. O dia começa com meditação, seguindo-se uma oração comunitária. Além de dirigir a revista Stella, a irmã Amália trabalha no núcleo museológico que a Congregação está a criar para expor e dar a conhecer o espólio do Padre Manuel Formigão, cujos restos mortais serão trasladados para a casa da Congregação em Janeiro do próximo ano

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comemorativa do 29º aniversário

2º caderno

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“Há uma coisa que os homens nunca poderão valorizar que é a dádiva de dar à luz”

“A lei da paridade pode vir a ser útil no futuro para garantir a presença de homens na política”

Há 19 anos que o sector profissional da empresa da Família (Ribatubos) leva Teresa Rosário a lidar, no seu dia a dia, maioritariamente com homens. Este facto nunca lhe causou constrangimentos nem embaraços pois para Teresa o que conta não é o género, mas a competência. Lamenta, que em certos sectores de atividade, onde as mulheres valem tanto como os homens, continue a existir discriminação salarial.

As declarações da presidente da Câmara Municipal de Alcanena sobre a igualdade de género e sobre as diferenças entre homens e mulheres são sérias e bem fundamentadas mas por vezes Fernanda Asseiceira tempera-as com observações reveladoras de uma fina ironia.

Teresa Rosário, administrativa na empresa Ribatubos, Santarém

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ão há qualquer razão para manter as mulheres afastadas de lugares de chefia só por serem mulheres. Essa é a opinião de Teresa Rosário da empresa Ribatubos - Tubagens e Acessórios com sede em Santarém. A administrativa e filha do proprietário da empresa, Joaquim R. Luís, diz que o que conta é a competência e em matéria de competência as mulheres têm vindo a mostrar que conseguem ser tão ou mais competentes que os homens, seja em que sector for. Para sustentar o que diz chama a atenção para a educação ou a saúde onde as mulheres já atingiram a igualdade com os homens e refere outros sectores onde isso também já aconteceu, embora se mantenha uma injustificável diferenciação salarial. A Ribatubos é uma empresa familiar que resultou de um projeto lançado junto com o seu pai , na sequência de insolvência da empresa onde eles trabalhavam. Teresa Rosário pode apresentar no seu

Fernanda Asseiceira - Presidente da Câmara Municipal de Alcanena

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Teresa Rosário currículo o facto de ter participado no arranque e consolidação do projecto ao longo dos últimos 19 anos. Durante esse tempo, o facto de ser mulher nunca representou qualquer entrave nem provocou qualquer constrangimento, apesar da maioria dos clientes serem homens, ela sempre gostou de ser mulher. Embora procure ter como ponto de comparação entre homens e mulheres as capacidades e competências, Teresa Rosário diz que, de certa forma, os homens acabam por estar em desvantagem, pelo menos em termos biológicos, uma vez que não conseguem gerar uma nova vida. “Os homens jamais poderão valorizar a dádiva de dar à luz”, refere. No entanto, concede-lhes um ponto a favor. “Acho que, de um modo geral, eles lidam melhor com as adversidades. Nós mulheres somos mais complexas”, declara. Quando recebe elogios ou é alvo de atenções Teresa Rosário parte sempre do princípio que está perante sinais de consideração e de reconhecimento e não apenas de gestos de simpatia ou de cavalheirismo. Em relação a educar filhos ou filhas diz que o essencial é incutir-lhes valores como respeito, honestidade, dignidade. Nos tempos livres gosta de estar com a família, sair com os amigos ou de passear. Gosta de touradas e costuma assistir porque tem sangue ribatejano e também gosta de ver futebol quando joga o Benfica, seja no estádio ou na televisão. Leitura só se for nas férias e de preferência algo romântico

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caminho faz-se caminhando e caminhando com optimismo. Esta poderia ser uma forma de resumir o pensamento da presidente da Câmara de Alcanena, Fernanda Asseiceira, sobre o acesso das mulheres a cargos de direcção e chefia e sobre o facto de muitas serem preteridas em favor de homens apesar das suas capacidades e qualidades. “O meu caso reflecte o oposto! Fui eleita presidente de câmara. É um facto que ainda não há muitas. Também conheço algumas mulheres empresárias! Também não são muitas. Mas o caminho está a ser percorrido. Há mulheres muito competentes e as oportunidades vão acontecer. Sou optimista a esse respeito”, declara. Diz também que: “São importantes mais medidas de reforço da conciliação familiar com a vida profissional”. Sobre a igualdade refere: “Um grande caminho já foi percorrido, no sentido de termos uma sociedade mais igual, mas admito que muito ainda falta fazer”. A autarca considera que o sistema de quotas imposto por lei para as listas de candidatos a cargos políticos foi uma ajuda no sentido da igualdade. “A Lei da Paridade é para igualizar o acesso quer de homens quer de mulheres! Se não tivesse existido o sistema de quotas teríamos hoje menos mulheres na política. São medidas que fazem sentido num determinado tempo. Se hoje podem não fazer sentido isso é óptimo. Só significa que o seu objectivo foi atingido”. E Fernanda Asseiceira não resiste a uma pitada de humor ao considerar que o sistema acaba por ser sempre útil. “Até porque vai ser necessário para um dia garantirmos a presença dos homens!”. Quando decidiu entrar na política a fa-

Fernanda Asseiceira mília não foi grande apoiante da sua decisão mas também não criou grandes obstáculos. As opiniões de familiares e amigos foram ouvidas com a atenção que diz dar a todas as críticas. “As nossas funções são públicas e eu considero natural a avaliação ou criticas que são feitas à nossa acção. Mas também considero que se tem que valorizar mais a crítica positiva”, defende. Sobre a forma como está no cargo para que foi eleita diz que é uma enorme honra fazer o que faz e que procura fazê-lo o melhor possível. A presidente da Câmara de Alcanena gosta de ser alvo de atenções e de manifestações de simpatia e nota que o cavalheirismo também se está a perder. No entanto defende que o reconhecimento do valor das pessoas “não se faz com ‘mimos e atenções’!”. Fernanda Asseiceira confessa que nunca sentiu pena de não ter nascido rapaz e não sente qualquer grande inveja do mundo masculino com uma pequena excepção. “Não é inveja!! Mas destaco o terem menos preocupações com a parte mais “estética” e com o vestuário! Pelo menos a maioria!!”, explica. Tem ideia que as mulheres conseguem ter mais capacidade para pensar e agir de forma mais abrangente e que são mais determinadas nos objectivos que pretendem atingir e aponta como uma característica da maioria dos homens uma certa forma de encararem as doenças. “Um traço comum a quase todos que é partilhado por muitas de nós é que qualquer sintoma de problema de saúde é transmitido de forma “agravada” pelos homens!”, sublinha

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Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE “Uma vez uma amiga encontroume e disse-me que queria que eu lhe fizesse o funeral e que quando esse dia chegasse queria que eu cuidasse dela. Sobretudo queria que lhe pintasse as unhas, coisa que nunca tinha feito, que lhe arranjasse o cabelo e que lhe fizesse a depilação. Queria ir toda arranjada”, conta. ra aprender o máximo possível. Diz que há pormenores que podem fazer toda a diferença, inclusivamente a forma como ela própria se apresenta nos funerais. “Num dos meus primeiros funerais não reparei que tinha as unhas pintadas de vermelho. Passei o tempo todo a tentar esconder as mãos com os punhos da camisa”, confessa.

Isilda Grilo

“Pensava que tinha nascido para ser freira mas acabei por ser agente funerária” Isilda Grilo tem uma agência no Tramagal há cerca de quatro anos Nasceu num convento, na Chamusca, mas nunca teve vocação para freira. Começou a namorar cedo e casou ao 17 anos. Trabalhou no campo e na empresa de construção civil do marido. Quando a crise apertou nas obras, agarrou a oportunidade de ter uma agência funerária no Tramagal. Diz que gosta do trabalho, da terra para onde se mudou e das suas gentes.

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primeiro funeral que Isilda Grilo fez quando começou a trabalhar como agente funerária, foi o de um tio. Conta que as lágrimas lhe escorriam pela cara abaixo mas que venceu o desgosto com a determinação de uma profissional do ramo. Fez questão de lavá-lo, vesti-lo, e tratar de tudo para que nada faltasse naquela despedida. Agora, quatro anos depois de ter começado a trabalhar na funerária que tem o seu nome, diz que ainda se emociona em alguns funerais mas que isso não a faz pensar em mudar de profissão. Isilda Grilo sempre achou que não seria capaz de lidar com mortos mas as voltas da

vida pregaram-lhe uma partida. O primeiro morto que viu foi o seu pai que morreu um ano antes de ela ter a agência. Ele tinha 57 anos e foi um momento muito marcante na sua vida. “Quando o meu pai morreu senti uma grande revolta durante muito tempo. Achava que ele tinha morrido cedo demais e que isso era injusto. Às vezes ia para o cemitério às nove, dez da noite, sentava-me na campa do meu pai e conversava com ele. Seis meses depois da sua morte tive que pedir ajuda médica porque não estava a conseguir lidar com o problema”, desabafa. Felizmente ultrapassou a situação. À frente da Funerária Isilda Grilo desde 2012 afirma que tudo é uma questão de hábito. No entanto, há sempre situações mais difíceis, como o funeral que teve de fazer de um bebé que nasceu morto. “Naqueles momentos não há nada que possamos dizer que conforte os pais”, diz. Uma das primeiras coisas que fez quando começou a trabalhar como agente funerária foi deitar-se num caixão. Gostou de saber que é confortável. Apesar de trabalhar numa profissão que lida de perto com a dor, tenta viver a vida com optimismo e, de um modo geral, acredita que há muitas outras pessoas que tentam fazer o mesmo apesar de todas as difi-

culdades do dia-a-dia e de ninguém saber quando pode chegar a sua hora. Uma vez uma senhora parou à porta da agência funerária e disse-lhe, na brincadeira, que tinha ido ver se lá estava algum aviso a anunciar o seu falecimento. “Eu ri-me e brincámos com aquilo mas umas horas depois ligaram-me a pedir para ir buscar o corpo da senhora porque ela tinha falecido”, lembra. Diz que o caso da senhora não é único.“Uma vez uma amiga encontrou-me e disse-me que queria que eu lhe fizesse o funeral e que quando esse dia chegasse queria que eu cuidasse dela. Sobretudo queria que lhe pintasse as unhas, coisa que nunca tinha feito, que lhe arranjasse o cabelo e que lhe fizesse a depilação. Queria ir toda arranjada”, conta. Quando enveredou pela actividade frequentou diversas acções de formação pa-

“Prefiro o trabalho pesado” Isilda Grilo costuma dizer, a brincar, que nasceu para ser freira porque nasceu num antigo convento perto da ponte da Chamusca mas só por isso uma vez que a vocação nunca despontou. “Na verdade, não dava para freira porque aos 14 anos já namorava em casa”, conta entre risos. Curiosamente não estudou além da quarta classe uma vez que o seu pai achava que as raparigas iam estudar para arranjarem namorado. “A teoria dele não estava certa porque eu não estudei e casei logo aos 17 anos e fui mãe muito nova”. Aos 11 anos foi aprender a costurar e aos 13 anos já trabalhava no campo. “Subia às árvores para fazer podas, cavava e tratava das vinhas”, conta. Depois de casada continuou a trabalhar no campo mas numa altura em que havia falta de pessoal na empresa de construção civil do marido, na Chamusca, mudou para as obras e diz que fazia tudo. “Até carregar sacas de cimento às costas”, conta. Quando a crise atingiu a construção civil surgiu-lhe a oportunidade de ter a funerária e arriscou. “Não me arrependo da decisão. Mudámos para o Tramagal mas fomos bem acolhidos nesta terra. Há pouco tempo estive doente e tive imensas pessoas a levarem-me miminhos a casa. Gosto muito de aqui viver”, afirma. O marido ajuda-a sempre que pode nos funerais e Isilda Grilo diz que trabalhar com o marido nunca foi uma desvantagem. Conseguem separar as coisas e em casa só falam de trabalho quando é mesmo preciso. Têm três filhas. Uma trabalha na empresa do marido, a outra trabalha na filial da funerária, em Constância, e a mais nova ainda estuda

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O MIRANTE | Edição

comemorativa do 29º aniversário

“Reconhecer o valor de uma mulher ainda é uma coisa muito complicada”

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aula Borrego Leonor ocupa o lugar de topo na principal empresa do sector agrícola na região. É persistente, lutadora e competente pois se assim não fosse seria impossível manter a Borrego Leonor & Irmão, S.A. na posição que ocupa. No entanto há alturas em que tem pena de não ter nascido rapaz. “Apesar de vivermos no século XXI, o mundo dos negócios ainda é dos homens, especialmente no sector da distribuição de factores de produção para a agricultura”, explica. Cresceu na empresa que foi fundada pelo seu pai e por um tio no ano do seu nascimento. Desde muito nova que se interessou pelo negócio e foi com naturalidade que abraçou o projecto. No seu dia-a-dia lida principalmente com homens. Para ela não existe um traço comum nem nos homens nem nas mulheres, embora ache que estas têm uma maior capacidade de resistência às adversidades. “Todas as pessoas são diferentes com as suas qualidades e defeitos”, defende, realçando que a diferença reside na forma como as sociedades tratam homens e mulheres com as mesmas capacidades e competências. “A situação da igualdade tem vindo a melhorar ao longo do tempo especialmente nos países nórdicos. No caso português ainda estamos longe, em particular devido à dificuldade em se aceitar o valor que uma mulher tenha, especialmente no mundo dos negócios”, sublinha. Onde as mulheres são seguramente va-

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“Quem deve mandar numa casa é quem nela mais trabalha” Luciana Maria Maia Nelas - Presidente da Casa São Pedro de Alverca

Paula Borrego Leonor - Presidente do CA da Borrego Leonor & Irmão, S.A. É presidente de um conselho de administração de uma empresa que é integralmente constituído por mulheres. E a situação ganha mais relevo porque a Borrego Leonor & Irmão, S.A. é líder no sector da distribuição de factores de produção para a agricultura e a agricultura ainda é coisa de homens. Mas Paula Borrego Leonor não se ilude. Aquela é uma situação de excepção.

2º caderno

A igualdade plena entre homens e mulheres vai acontecer mas vai demorar, pelo menos, mais uma geração. A opinião é de Luciana Nelas que gosta de ser mulher e que se empenha sempre em fazer o melhor para ajudar a construir um mundo melhor e mais justo.

E Paula Borrego Leonor lorizadas é na Borrego Leonor & Irmão S.A., uma empresa cujo conselho de administração é constituído integralmente por mulheres. Sobre o facto de em mais de quarenta anos de democracia em Portugal só ter havido uma mulher a exercer o cargo de primeiro-ministro e por um curto período de tempo (Maria de Lourdes Pintassilgo, de Julho de 1979 a Janeiro de 1980), é bastante crítica. “E se bem me lembro foi um governo de iniciativa presidencial para um governo de gestão, ou seja, não foi candidata eleita. A sociedade portuguesa é muito retrógrada e prefere ter um homem a governar independentemente das suas qualidades e capacidades”. A presidente do conselho de administração da Borrego Leonor & Irmão, S.A. costuma ser alvo de elogios e atenções mas sabe que tais manifestações não são elogios à sua competência. “Honestamente, na maior parte das vezes é cavalheirismo. O reconhecimento do valor de uma mulher é uma coisa muito complicada (sinto isto todos os dias...). Paula Borrego Leonor gosta de ler, de ouvir música, de ir ao cinema e de viajar. Refere Eça de Queiroz, Ernest Hemingway e John Steinbeck nas letras e Madonna, Prince, U2, GNR e Mariza na música. Em casa defende uma gestão repartida do comando mas identifica uma pequena dificuldade. “Ambos os elementos do casal devem mandar, caso contrário a harmonia familiar e o equilíbrio de responsabilidades pode ficar em causa, se bem que as mulheres não gostem de ser contrariadas...”

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mbora cada pessoa seja única, Luciana Nelas, presidente da Casa de São Pedro, instituição de solidariedade social com sede em Alverca do Ribatejo, considera que a teimosia é uma característica comum à maioria dos homens. Quanto às mulheres diz que são mais intuitivas que os homens. Pessoa sensível confessa que há espectáculos que não lhe agradam e dá como exemplo as touradas. “Fui uma vez a uma e só porque era de beneficência mas tive que sair a meio”, conta. Gosta das canções de Cuca Roseta, Raquel Tavares e António Zambujo e dos livros de Carlos Oliveira Santos e Francisco Rodrigues Pereira e já assistiu a jogos do seu Benfica. Luciana Nelas defende a valorização das pessoas pelo seu mérito. Diz que em sua casa faz cerca de oitenta por cento do trabalho que há a fazer e quando lhe perguntam quem deve mandar em casa não hesita na resposta. “Quem nela mais trabalha!”. Considera que foram dados passos gigantescos no sentido do estabelecimento

Luciana Maria Maia Nelas da igualdade entre homens e mulheres mas que não foram suficientes. “Para atingirmos a igualdade plena ainda vai ser precisa mais uma geração. Os mais velhos ainda não têm essa cultura da igualdade”, refere. A presidente da Casa de São Pedro diz que para as mulheres conseguirem cargos de chefia o essencial é elas quererem verdadeiramente e trabalharem afincadamente para isso. Quanto aos cargos políticos faz notar que o afastamento dos cidadãos em geral da política é comum a homens e mulheres mas lamenta que tenha sido necessário estabelecer para as listas de candidatos porque isso significa que a escolha dos partidos não era feita por mérito mas por género. “(...) Há casos em que se não existisse essa obrigação não as colocavam”, constata

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21 | 17 Novembro 2016 PUBLICIDADE

2º caderno

Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE


O MIRANTE | Edição

comemorativa do 29º aniversário

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2º caderno

Foi uma única vez a uma tourada, quando tinha sete anos, e ficou assustada para o resto da vida quando um toiro conseguiu saltar para as bancadas, provocando situações de pânico.

Milena Lopes

“O importante num casal é a cumplicidade e não o trabalho que cada um faz em casa” Milena Lopes é secretária da vereação na Câmara Municipal de Rio Maior Trabalha na Câmara Municipal de Rio Maior, onde a irmã é presidente, mas entrou muito antes de ela ser eleita e trabalhou com os dois anteriores presidentes. Um do PSD e Aliança Democrática e outro do PS. Diz que as mulheres têm uma maior capacidade de organização que os homens.

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ilena Lopes está há 32 anos na Câmara Municipal de Rio Maior, para onde entrou num programa de ocupação de tempos livres. Trabalhou nos gabinetes de apoio aos presidentes Joaquim de Deus (PSD e AD) e Silvino Sequeira (PS) mas com a eleição da irmã, Isaura Morais (PSD), para presidente, passou a ser a secretária dos vereadores. O trabalho na câmara foi o primeiro trabalho remunerado que teve depois de ter acabado os estudos. Curiosamente, o ex-presidente Silvino Sequeira tinha sido

seu professor no secundário. “Quando ele se candidatou à câmara acompanhei todo o seu percurso. Ele era vereador da oposição e eu trabalhava com o então presidente Joaquim Pereira de Deus. No dia a seguir à sua tomada de posse requisitou-me e eu passei a trabalhar com ele. Foram quase 20 anos”, realça, acrescentando que mantém contacto regular com o ex-autarca socialista. “É um ex-presidente de câmara que me merece todo o respeito e consideração e com o qual mantenho uma cordial amizade”, sublinha. A entrada da irmã para presidente foi “relativamente pacífica”, recorda, salientando que “quando mudam os executivos há sempre mudanças mas que com a experiência que tem não há nada que a perturbe significativamente. Apesar disso admite que actualmente há mais trabalho e as situações que enfrenta são diferentes. “Agora é tudo mais imprevisível, mais complexo e mais difícil. É preciso ter uma enorme resistência”, sublinha. Milena considera que as mulheres têm maior capacidade de organização, o que

se reflecte no domínio de diferentes tarefas em simultâneo e numa melhor gestão do tempo. O trabalho que executa é exigente e ocupa-lhe muito tempo mas nada que a atrapalhe.

Apesar de em casa ser ela quem faz a maior parte das tarefas domésticas diz que o marido também dá uma boa ajuda. “Ele faz cerca de trinta por cento, o que é uma boa ajuda. Acho que fazemos uma boa dupla”, afirma. A mãe, que tem 82 anos, também colabora. “É ela que faz a sopa para toda a família”, revela Milena Lopes. O princípio seguido é o de aproveitar ao máximo as aptidões de cada um. Milena Lopes tem 57 anos. É sócia do marido numa empresa de artes gráficas com três décadas de existência. Também tem um negócio familiar que produz e vende sal e flor de sal e tem um restaurante nas Marinhas do Sal de Rio Maior, ao qual dedica parte das suas horas vagas. Tem dois filhos e um neto e acredita que um dia vai ter um prémio dos grandes no Euromilhões. Benfiquista, gosta de assistir a jogos de futebol mais pelo ambiente do que pelo jogo em si. O mesmo não se pode dizer da tauromaquia. Foi uma única vez a uma tourada, quando tinha sete anos, e ficou assustada para o resto da vida quando um toiro conseguiu saltar para as bancadas, provocando situações de pânico. Tem uma grande admiração pela irmã e considera que ela faz parte do paradigma de mudança da sociedade em que as mulheres se estão a afirmar pelo seu valor e competência

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Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE

“Uma mulher inteligente e bem preparada pode chegar a primeiro-ministro” Teresa Ferreira - directora executiva da empresa “Águas de Santarém”

Tem uma visão positiva da sociedade portuguesa em termos de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres. Diz até que é mais fácil a uma mulher optar por educar os filhos em vez de seguir uma carreira profissional do que a um homem. Considera positivo ter um dia-a-dia superpreenchido com solicitações profissionais e familiares.

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s homens, de uma maneira geral, não são capazes de fazer várias coisas ao mesmo tempo, como as mulheres. A opinião é de Teresa Ferreira, directora executiva da Águas de Santarém que ilustra o que quer dizer com um caso prático do dia a dia. “Por exemplo, nós, no mesmo momento, podemos estar a controlar o banho de uma criança, os TPC’s (Trabalhos Para Casa) da outra, ter o jantar ao lume e ainda responder a um ou dois e-mails. E normalmente corre bem!!! Acho muito difícil os homens conseguirem este feito…. Pelo menos sem nenhum resultado desastroso pelo caminho…”. Aquela vantagem não é no entanto a mais importante. Há uma outra bem mais importante, segundo ela, que é a maternidade. “Não subvalorizo a importância do pai e o amor que estes têm pelos filhos mas ser mãe é único e a maternidade um laço incomparável”, afirma. Sobre o desaparecimento das desigualdades entre homens e mulheres mostra-se optimista. “Foi feito um longo caminho que não está acabado, é certo, mas evoluiu-se muitíssimo nesse sentido. Não sinto que hoje, em sociedades ocidentais como a nossa, persistam diferenças significativas nos direitos e oportunidades. O estigma e preconceitos sobre as mulheres em lugar de topo, se ainda existem, estão a desvanecer-se”, defende. Teresa Ferreira acha que se não há mais mulheres em lugares de chefia isso também resulta da opção de muitas. “É preciso lembrar que há mulheres, pessoalmente conheço algumas, que tomam a opção de se dedicar à família e educação dos filhos e abdicar, ou pelo menos, não investir muito nas suas carreiras profissionais. É opção. Não critico e entendo, embora não seja essa a minha escolha.” E a directora executiva da Águas de Santarém vai mais longe. “Enquanto um homem sente uma enorme pressão social para “sustentar” a família, e seria impensável ficar em casa por opção, essa pressão não é tão evidente no lado das mulheres, que acabam (as que

Teresa Ferreira podem financeiramente, claro) por ter a opção de investir ou não na sua actividade profissional. Há portanto, e muito por via da opção individual de cada um, muitos mais homens a concorrer a lugares de chefia do que mulheres”, conclui. E reflectindo sobre o mundo da política diz que se não há tantas mulheres em lugares de topo a culpa também é delas. “Nos tempos que correm uma mulher competente, inteligente, bem preparada e que realmente tenha essa ambição, poderá perfeitamente vir a ser primeiro-ministro de Portugal”. Teresa Ferreira não inveja nada aos homens e também não se queixa de algumas situações que são consideradas muitas vezes penalizadoras das mulheres. “Há quem diga, e com alguma razão, que as mulheres com filhos e activas profissionalmente têm uma sobrecarga muito maior no dia-a-dia do que os homens. É verdade, mas não sinto que isso seja mau. Os dias são muito ocupados, a agitação permanente, desdobramo-nos para dar a maior atenção e acompanhamento aos nossos filhos e sermos as melhores profissionais. Mas para mim, isso é positivo, preenche-me. Ambas as vertentes me completam”. Sobre a ocupação dos tempos livres diz que a primeira prioridade é estar com as filhas e fazer os programas que lhes agradam e que para além disso gosta de ler, ir ao cinema e conhecer novos sítios. Em termos de música refere os U2 como a banda de eleição e a seguir vários artistas portugueses como Mariza, Xutos & Pontapés, Mafalda Veiga, Luís Represas. Quanto a livros a sua preferência vai para os escritos por mulheres. “(...) Leio Isabel Allende e não perco nenhuma obra da Sveva Casati Modignani cujas personagens principais são sempre mulheres fortes, complexas, confiantes”. Vai pelo menos uma vez por ano ver uma tourada ao vivo porque valoriza “a arte dos cavaleiros e a audácia e valentia dos forcados” e porque a tourada faz parte da cultura da região. Também gosta de futebol e vibra com os grandes jogos do Benfica ou da Selecção Nacional

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“A fiscalidade devia acompanhar a evolução da igualdade de género?”

“Os homens estão culturalmente programados para proteger e mandar”

Interrogada sobre o que não lhe foi perguntado no inquérito de O MIRANTE refere um tema que dava pano para mangas. “Gostava que me perguntassem se a fiscalidade devia acompanhar a evolução da igualdade de género; daria, concerteza, uma excelente discussão”.

A maior parte das declarações de Odete Lourenço Batista para este questionário de O MIRANTE são formais e merecem reflexão como quando fala no número de candidatas mulheres às últimas eleições presidenciais para exemplificar que há cada vez mais mulheres na política. Mas também coloca uma nota de humor ao dizer que uma coisa que inveja nos homens é a rapidez com que se arranjam para sair.

Andrea Firmino, Cartaxo, Advogada e Árbitra em matéria Fiscal no CAAD

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ndrea Firmino diz que sempre foi facto assente que queria aprender e praticar o Direito e que nunca se imaginou a trabalhar numa outra área. Concretizou o seu desejo e é hoje, Advogada e Árbitra em matéria Fiscal no CAAD (Centro de Arbitragem Administrativa). Diariamente, para além de enfrentar os naturais desafios da sua profissão, dá especial atenção à gestão do seu tempo, o que nem sempre é fácil por causa dos imprevistos. Não se lembra de alguma vez ter pensado ser homem. Considera que a maior vantagem das mulheres relativamente aos homens é poderem gerar outra vida. Quanto a traços comuns à maioria dos homens que lhe causem inveja identifica um. “A falta de sensibilidade para alguns assuntos que lhes dá um certo nível de descontracção”. Faz uma ressalva para dizer que a capacidade de gerar outra vida é, por vezes, penalizada no mundo laboral. “A maternidade é, na verdade, também um factor decisivo para o afastamento principalmente pelas entidades patronais que não lidam ainda muito bem com as prioridades das mulheres que são mães!”, refere. A advogada não consegue afirmar que os homens são todos iguais mas cita, com subtileza, quem o consegue fazer. “Concordo com o que escreveu Miguel Esteves Cardoso: ‘Se os homens fossem todos diferentes, as mulheres seriam felizes’!”. Para os que acham que já existe igualdade entre homens e mulheres nas sociedades ocidentais, nomeadamente em Portugal, deixa a sua própria reflexão sobre o assunto: “Não posso deixar de admitir que, ao longo dos anos, tem existido bastantes progressos na igualdade de género (por exemplo, através da introdução de legislação neste domínio, na mudança progressiva de mentalidades, os papéis do nosso “modelo familiar” que já não se encontram totalmente delimitados em função do sexo, etc). É, contudo, evidente que esta igualdade de género ainda não se encontra implementada em todos os sectores da sociedade, quer do ponto de vista laboral, fami-

Andrea Firmino liar, político ou mesmo pessoal”. Onde Andrea Firmino diz encontrar maior desigualdade é na política. “Neste campo a falta da igualdade de género tem sido evidente. Noto, contudo, que já se notam avanços bastante expressivos não só pelas mulheres que actualmente ocupam lugares de destaque na política nacional e até internacional. Dentro das nossas portas, recorde-se esta última campanha para as Presidenciais em que tivemos, inicialmente, quatro candidatas à Presidência da República. Diz que um elemento que tem evitado uma situação muito pior a nível de representação política é a Lei da Paridade. “Não tenho dúvidas que, à data de hoje, se não existissem quotas, o Parlamento português, por exemplo, teria muito menos deputadas a representar o povo português.” Equilíbrio é a palavra que usa para se referir a questões como a divisão das tarefas domésticas ou a coordenação da gestão de um lar. Considera que qualquer homem ou mulher gosta e/ou precisa de consideração e reconhecimento, por isso dar e receber mimos e atenções é um papel da mulher e do homem!”. Relativamente à educação dos filhos defende que não pode ser igual para ambos os sexos. “Tenta-se, mas existem características intrínsecas de cada sexo que se torna impossível levar a educação no mesmo barco”. Tem poucas horas vagas e diz que as que tem são totalmente dedicadas aos filhos e amigos. Já assistiu a touradas e a jogos de futebol ao vivo e diz que gosta embora não sejam as suas “fontes de entretenimento” preferidas. Falando de leituras, Andrea Firmino diz que foi habituada a ler clássicos da literatura, nomeadamente da literatura portuguesa mas que atualmente, gosta bastante da nova vaga de escritores portugueses como Valter Hugo Mãe, Jacinto Lucas Pires e José Luís Peixoto

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Odete Lourenço Batista - Audiologista na Audio Teste – Centro Auditivo Widex

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dete Lourenço Batista tem ideias sobre aquilo que está a impedir que haja mais mulheres em cargos de direcção e chefia. “Portugal ainda tem um percurso a percorrer para se colocar ao nível dos outros países em que a mulher assume cargos de chefia e destaque com desempenhos excelentes e muito sucesso. Ainda existem forças bloqueadoras e estigmas formados na nossa sociedade pouco informada, pouco empenhada e desmotivada”, defende. Assumindo-se como feminista convicta diz que assumir que a mulher é superior ao homem ou vice-versa não é solução para nada, embora não se esqueça de mencionar que a maternidade é algo único e exclusivo das mulheres. Concorda que cada homem é um homem com características pessoais únicas embora considere que possa haver um elemento comum à maioria. “Os homens estão culturalmente programados para proteger e mandar. Preferem saber e mentalizarem-se que mandam, do que saber se mandam efectivamente, sem perceber que afinal também está no código genético de uma mulher deixar-se proteger, ainda que não gostemos que mandem em nós.” Em jeito de brincadeira abre um parêntesis para apontar algo que inveja nos homens. “(...) a facilidade e rapidez com que se arranjam para sair”. Odete Lourenço Batista aponta alguns caminhos para que alguns homens possam melhorar o seu relacionamento com as mulheres. “Muitas vezes o que falta aos homens é o respeito pela mulher e pela sua feminilidade. Um homem sabe proteger uma mulher, ouvi-la, mimá-la, valorizá-la ou dar-lhe um certo desconto quando é preciso mas um homem que é Homem não serve só para nos adorar e nos fazer companhia. Um homem a sério quer ganhar o nosso respeito, a nossa admiração a nossa dedicação, a nossa exclusividade e sabe que tem de lu-

Odete Lourenço Batista tar para isso. Existe dentro dele um instinto que o faz querer ser sempre uma pessoa melhor, por ele, por nós e para nós.” Para ilustrar o facto de se registar uma evolução positiva em termos de igualdade de género menciona a política. “A política tem sido vista como uma área maioritariamente ocupada pelos homens, no entanto, e cada vez mais, aparecem mulheres na liderança, com elevados cargos políticos como, por exemplo, as duas mulheres candidatas à Presidência da República, Maria de Belém e Marisa Matias, o que significa que as mentalidades estão a mudar e que estamos perante uma viragem. De facto, a mulher tem vindo a conquistar o seu lugar na sociedade e neste mundo globalizado. O facto de não permanecer mais tempo deve-se ao seu compromisso e responsabilidades maternas, das quais não abdica!”, refere. Nas horas livres, que são poucas, gosta de viajar, passear no campo ou na praia, ir ao cinema, dançar, cantar, passar um bom serão na conversa e….rir…rir muito porque faz bem ao coração.

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2º caderno

Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE Na aldeia onde viveu era a única rapariga que tinha carta de mota e por isso era muito solicitada pelas outras raparigas para as levar aos locais onde tinham combinado encontrarse com os namorados.

Olga Henriques

Aos doze anos já conduzia, na tropa tirou carta de pesados e é motorista da Rodoviária Olga Henriques, 41 anos, tem a felicidade de fazer aquilo que sempre adorou fazer Há onze anos quando começou a conduzir os autocarros da Rodoviária do Tejo alguns passageiros olhavam para ela com estranheza porque não sabiam que aquela mulher quando esteve na tropa já guiava veículos com o triplo do tamanho. Agora, graças ao seu profissionalismo e simpatia, tem dezenas de amigos em todas as paragens.

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lga Henriques, motorista de autocarro, é uma segunda mãe para as crianças que transporta na carreira da Rodoviária do Tejo, entre Entroncamento e Cafuz, o último lugar do concelho de Vila Nova da Barquinha. O filho de

12 anos é um dos que apanha o autocarro para ir para a escola. A motorista diz que a alegria que sente e a simpatia que tenta transmitir são antídoto para os males da vida, como a perda do marido, vítima de cancro, há cinco anos. Com 41 anos, nascida no Entroncamento, e com uma infância passada em Limeiras, Barquinha, Olga Henriques foi militar durante dez anos na Escola Prática de Engenharia, em Tancos, onde tirou a carta de condução de pesados de passageiros. Foi a primeira mulher condutora nesta unidade do exército, tendo exercido as funções de condutora do comandante e feito muitos quilómetros ao volante de viaturas pesadas, algumas com dimensões superiores às que circulam nas estradas portuguesas. Chegou a conduzir viaturas pesadas com perto de 25 metros de comprimento.

Já com vinte anos de carta de pesados, nunca teve um acidente e diz que não se vê a fazer outra coisa que não seja conduzir autocarros. Entrou para a Rodoviária do Tejo em 2005 e na altura ainda havia passageiros que estranhavam ver uma mulher ao volante. A pouco e pouco soube conquistar a simpatia e o respeito de todos e tem sempre uma palavra para os passageiros que conhece melhor. Aos estudantes nunca se esquece de perguntar como correram as aulas. Olga Henriques é também uma confidente e uma conselheira. Sabe compreender quem com ela desabafa, sabe guardar um segredo e encontra sempre uma palavra de incentivo para cada um. “Às vezes até há jovens que me pedem sugestões sobre a melhor forma de chegarem ao coração de quem gostam. De certa forma são todos “meus meninos” com as devidas dis-

tâncias porque eles também têm os seus pais. Gosto deles mas quando é preciso também lhes faço reparos”, refere. Casou aos 25 anos e foi mãe aos 29. Há cinco anos o marido morreu de cancro. “Foi um grande abalo”, desabafa, recordando que não foi fácil ver-se de repente sozinha com um filho e com horários de trabalho para cumprir. A Rodoviária do Tejo foi sensível à sua situação e ajustou-lhe os horários. A motorista é vista na empresa como uma mulher combativa e que está sempre disponível para ajudar. Por vezes oferece-se para fazer outros serviços. Confessa que a boa disposição que mostra não é forçada. A perda que teve foi difícil mas diz que perante as dificuldades as pessoas arranjam sempre forças e vão buscá-las “onde nem imaginavam que existiam”. Olga Henriques teve uma infância feliz e que foi nessa altura que ganhou o gosto pelos carros e pela condução. O pai era mecânico e desde cedo se habituou a ver carros, realçando que está preparada para conduzir tudo o que tenha rodas. Por vezes sente saudades da tropa, onde diz que aprendeu muito em termos de disciplina, organização e cumprimento de horários, ensinamentos que lhe têm sido muito úteis. Olhando para o percurso militar, diz que foi muito feliz naquela altura mas que nem sempre tinha a noção disso. Na aldeia onde viveu era a única rapariga que tinha carta de mota e por isso era muito solicitada pelas outras raparigas para as levar aos locais onde tinham combinado encontrar-se com os namorados. A motorista que em criança não gostava de Barbies e que aos 12 anos já conduzia o carro da mãe sente que nasceu para fazer aquilo que faz e é aquilo que quer fazer até ao fim da vida

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“Os homens não conseguem fazer “A sensibilidade das três tarefas ao mesmo tempo, mulheres e a sua capacidade para o que é frequente na mulher” se colocarem no lugar do outro” Ana Maria Lima, presidente do conselho de administração da Fundação CEBI

Carla Dias Crispim, Entroncamento, gestora várias lojas MultiÓpticas no Médio Tejo

Começou a exercer cargos de chefia ainda antes dos trinta anos e nunca se sentiu discriminada por ser mulher. No entanto, a presidente da Fundação CEBI (Fundação para o Desenvolvimento Comunitário de Alverca) reconhece que ainda existe muito a fazer para se atingir uma situação de igualdade plena entre homens e mulheres.

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na Maria Lima, presidente do conselho de administração da Fundação CEBI, diz que nunca se sentiu excluída por ser mulher e que sempre conseguiu conciliar a vida profissional com a vida familiar. Acrescenta que também nunca sentiu que o facto de ser mulher a tivesse prejudicado no acesso a cargos de chefia e dá exemplos disso. “Aos 29 anos estava a chefiar um departamento no Banco e aos 35 assumi a função de directora. Cheguei a ser responsável por 120 pessoas. No Banco tive várias colegas com o mesmo cargo. Desde 1995 que integro a administração da Fundação CEBI. Admito que sejam exemplos felizes”, salienta. Reconhece no entanto que nem todas as mulheres conseguiram fazer um percurso idêntico ao seu apesar de terem qualificações que lhes permitiam fazê-lo. A nível político defende que as mulheres fazem muita falta e tem uma ideia original sobre a importância das quotas impostas por lei, que obrigam à inclusão de uma percentagem de mulheres nas listas de candidatos a cargos políticos. “Os homens precisam da imposição dessas quotas para mudarem a sua forma de pensar”, declara. “Que me recorde, para além da actual presidente do CDS, Dra. Assunção Cristas, apenas houve uma presidente do PSD, Dra. Manuela Ferreira Leite. Penso que a mulher, que habitualmente corre mais riscos que o homem, deve assumir também as suas responsabilidades políticas e disponibilizar-se para liderar os partidos”, defende. Para a presidente do conselho de admi-

Ana Maria Lima nistração da Fundação CEBI a maior vantagem das mulheres em relação aos homens é “o tal 6º sentido de que tanto se fala”. Ana Maria Lima nunca teve pena de não ter nascido rapaz nem nunca pensou no assunto. Sente-se realizada e feliz como mulher e gostou de ter uma filha e uma neta. Reflectindo sobre uma característica comum à maior parte dos homens que os diferencie das mulheres fala da incapacidade de eles executarem vários trabalhos em simultâneo. “Salvo raras excepções, como por exemplo o nosso Presidente da República que consegue escrever sobre temas diferentes simultaneamente com as duas mãos, os homens não conseguem fazer três tarefas ao mesmo tempo, o que é frequente na mulher por força das circunstâncias”. Ana Maria Lima gosta de touradas e lembra que quando trabalhou junto à Praça do Campo Pequeno era frequente tomar a iniciativa de comprar bilhetes para assistir a algumas. Também costuma ver jogos de futebol. Tanto no estádio como através da televisão. Na juventude praticou ténis e sky, tanto aquático como de neve. Desde muito nova que lê e considera a leitura um passatempo e uma necessidade. O livro que mais a marcou foi “O drama de João Barois”, de Roger Martin du Gard. Também gosta de ler livros de Eça de Queiroz, Fernando Pessoa, Sebastião da Gama, Roger Martin du Gard, Isabel Allende e Virgil Gheorghiu, entre muitos outros. Na área da pintura prefere os impressionistas e refere Vieira da Silva, Van Gogh e Monet

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orque é que em Portugal não há mais mulheres em lugares de topo na política? Colocada perante esta pergunta, Carla Dias Crispim, gestora de várias lojas MultiÓpticas na zona do Médio Tejo, começa por dizer que é por razões históricas e de educação mas que a situação está a mudar. Depois acrescenta. “(...)do meu ponto de vista, quem é que quer ir para a política neste momento??? Questiono-me se tivéssemos mais mulheres na Política não estaríamos numa situação melhor…”. E quando fala em mulheres fala naquelas que não fazem qualquer esforço para imitar os homens. “Não gosto do sistema de quotas na política (que obriga a incluir um certo número de mulheres nas listas de candidatos), Prefiro que as mulheres e os homens sejam nomeados pelo seu valor, competência e desempenho, o que já acontece geralmente no sector privado, onde o que conta é o mérito, do que para cumprir uma quota. Estranho quando vejo algumas mulheres masculinizarem-se para aceder ao que é suposto ser o universo masculino”, explica. Carla Dias Crispim nunca sentiu pena de não ter nascido rapaz. Considera que um dos traços comuns à maioria dos homens é serem mais descomplexados que as mulheres mas que estas têm a vantagem de conseguirem ter uma perspectiva mais abrangente do que se passa e de conseguir ver mais partes do todo. “Acho que a maior força das mulheres reside naquilo que durante muito tempo foi considerada a sua maior fraqueza: a sensibilidade, a capacidade de se colocar no lugar do outro, a memória emocional”, explica. Lamenta que ainda não haja igualdade de géneros mas faz questão de frisar que uma coisa é a eliminação das situações de discriminação por questões de sexo e outra são as diferenças que convém preservar. “(...) Penso que é bom preservar algumas diferenças, porque não somos iguais, temos diferenças inerentes à condição de ser Homem ou Mulher que devem ser, não só respeitadas, mas até valorizadas”. O seu escritor preferido é José Saramago e é a ele que recorre quando fala no esforço que deve ser feito, logo na altura da edu-

Carla Dias Crispim

“Cabe-nos a nós, pais, eliminar alguns preconceitos machistas que ainda possam subsistir na sociedade. cação dos filhos, para eliminar de vez o machismo. “Cabe-nos a nós, pais, eliminar alguns preconceitos machistas que ainda possam subsistir na sociedade. Tal como nos cabe educar para o respeito pelo Ser Humano, independentemente do sexo, da cor, da idade, orientação sexual… Numa entrevista, José Saramago afirmou que cabe aos homens oporem-se ao machismo, manifestarem-se contra. Concordo com isso”. Interrogada sobre se algumas atenções dispensadas por homens às mulheres não podem, por vezes, ser formas encapotadas de machismo, diz que isso tem que ser percebido pela mulher que é alvo dessas atenções. “Não tem mal um homem mostrar educação e ser simpático com uma mulher, tal como não tem mal ela sorrir de volta e agradecer. A não ser quando lhe manifeste que esses gestos não são do seu agrado”, defende. Carla Dias Crispim é totalmente contra a ideia de alguém mandar em casa, seja o homem ou a mulher e não considera necessária uma divisão de tarefas domésticas a regra e esquadro. “Nalguns dias o trabalho é dividido meio-meio, noutros dias calha-me 90% e noutros 10%. Felizmente em minha casa não fazemos essa contabilidade. Estamos onde é preciso e quando é preciso e assim é que é justo.”

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Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE


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comemorativa do 29º aniversário

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Um dia desabafou com uma conhecida de Vialonga que conhecia a anterior presidente da câmara, Maria da Luz Rosinha, e foi esta que a convidou para trabalhar no município.

A felicidade também se encontra nas pedras da calçada Cintia Melo tem 51 anos e é calceteira em Vila Franca de Xira Cintia Melo tem orgulho no trabalho que faz todos os dias ao serviço da Câmara de Vila Franca de Xira e fica triste sempre que ouve alguém defender o fim da calçada portuguesa, um dos patrimónios mais identitários do país e da região. É uma mulher respeitada num mundo habitualmente dominado pelos homens.

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mundo precisa de mais mulheres simples, que não estejam só preocupadas com a imagem e as etiquetas. Quem o diz é Cintia da Conceição Matos de Melo, 51 anos, calceteira da Câmara de Vila Franca de Xira. Esta é a história de uma mulher simples e sem vergonhas daquilo que os outros que a rodeiam possam pensar. Não só escolheu abraçar uma profissão praticamente em vias de extinção como é uma mulher numa área de trabalho masculina. Cintia Melo não tem as unhas arranjadas nem a cara tratada com cosméticos topo de gama porque o seu trabalho não é num escritório mas sim a mexer com pedra, terra e cimento, fazendo e mantendo as calçadas onde toda a gente caminha. Faça chuva ou faça sol. É um trabalho duro mas gratificante, assegura. Não há passeio no concelho vilafranquense que não tenha tido a mão de Cintia. E isso orgulha-a, porque ao contrário do que se possa pensar é uma tarefa que envolve criatividade, engenho, paixão e alma. A calceteira é uma pessoa discreta, de sorriso honesto e fácil. Nasceu em Moçambique mas quando a guerra começou a intensificar-se a mãe enviou-a para casa de uns tios em Portugal, na zona de Cas-

cais, quando tinha 10 anos. Com o fim da guerra a mãe também regressou a Portugal e foi-lhe atribuída uma casa em Vialonga, para onde Cintia se mudou posteriormente para nunca mais de lá sair. Sempre estudou e nunca havia trabalhado, até que no final dos anos 80 surgiu uma oportunidade para fazer um curso de calceteiro na Câmara de Lisboa, juntamente com outras cinco mulheres. “Fui por brincadeira, só para ver no que dava mas acabei por me apaixonar por esta arte, adoro desenhar e construir. Tudo neste trabalho me fascina. Entretanto desistiram todas e só resto eu”, refere. Naquele tempo, tal como hoje, trabalho é coisa que não falta para os calceteiros. O problema é que ninguém quer sujar as mãos naquela tarefa. “As empresas iam à câmara procurar calceteiros e nós lá íamos. Fui trabalhar para uma empresa em São Pedro de Sintra chamada CME mas quando faliu tivemos de ir para o desemprego”, lamenta. Foi um período negro na vida desta mulher: o marido morreu com um enfarte e Cintia viu-se num emprego precário com cinco filhos para criar. Um dia desabafou com uma conhecida de Vialonga que conhecia a anterior presidente da câmara, Maria da Luz Rosinha, e foi esta que a convidou para trabalhar no município. “Eu estava numa situação muito difícil, sem marido e a sair de casa às 06h00 e a regressar às 20h00. Não conseguia estar com os meus filhos e a anterior presidente deu-me essa oportunidade. Nunca me esqueci dela. Já cá estou há 18 anos e gosto muito do que faço”, conta a O MIRANTE. “As escolas não se preocupam em ensinar esta profissão” Actualmente é a única calceteira que

Cintia Melo existe no município. Quando está de férias ou falta ao serviço não há ninguém para a substituir. E há sempre solicitações a chegar das juntas de freguesia para que sejam reparadas calçadas. “Durante dois anos nem servente tinha. Era eu que fazia tudo mas agora já tenho um ajudante e o trabalho anda mais depressa. Tenho pena de não ter jovens aqui a quem ensinar o ofício”, desabafa. Quando começou a trabalhar os homens torciam o nariz por ter de lidar di-

rectamente com uma mulher mas ao longo do tempo esse sentimento foi desaparecendo. Hoje, garante Cintia Melo, já recebem as suas ordens com naturalidade. “É muito mau tentar acabar com a calçada portuguesa, isto é uma coisa histórica, faz parte da nossa identidade. Cada vez se usam mais lajetas ou outros materiais, tudo pela lei do mais fácil e isso é muito triste. Há trabalhos lindos de calçada portuguesa”, lembra. “Gostava de ver os netos ou um dos filhos a seguir a profissão”, acrescenta. Aos fins-de-semana é quando se arranja melhor, arruma a casa e cuida dos filhos. Durante a semana também cuida dos netos”, dois, com mais um a chegar. Tem imensos sonhos mas os principais é ser feliz e que a vida corra bem. Diz que as mulheres hoje em dia estão no mesmo patamar dos homens e que não há quase nada que os distinga. “Só mesmo a força para se ter de executar alguns trabalhos”, nota. Afirma que as mulheres são mais arrumadinhas e certinhas nos trabalhos que desenvolvem e mais perfeccionistas. Depois reflecte sobre a vida. “Sou calceteira e sou feliz o ano todo, junto das pessoas que adoro e do trabalho que faço”, conclui Cintia Melo, antes de voltar a pegar no carrinho de mão que tem o seu material de trabalho: martelo, maço, pá, vassoura, picareta, regador, água, cimento e, claro, pedra

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“Está a acabar o tempo em que a mulher tem que trabalhar mais para provar o que vale” Isabel Barroso da Silva - Directora da Escola Superior de Saúde de Santarém Reconhece que vivemos num país que ainda valoriza mais os homens e onde as mulheres têm que trabalhar mais para chegarem a lugares mais visíveis do mundo do trabalho e da política mas Isabel Barroso da Silva diz que essa situação está em vias de extinção.

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afastamento das mulheres competentes de cargos de direcção e chefia pelo simples facto de serem mulheres está cada vez mais a ser uma coisa do passado. A constatação é feita pela Professora Coordenadora e Directora da Escola Superior de Saúde de Santarém. “Acredito que as coordenações e chefias devem ser de acordo com as competências das pessoas e não por serem mulheres ou homens”, afirma Isabel Barroso da Silva. Pela mesma ordem de ideias defende que também o sistema de imposição de quotas de mulheres nas listas de candidatos a cargos políticos desaparecerá com o tempo. Os únicos obstáculos que as mulheres ainda enfrentam para serem tratadas em pé de igualdade são culturais, explica. “Vivemos num país que ainda valoriza mais os homens e onde as mulheres têm que trabalhar mais para chegarem a lugares mais visíveis do mundo do trabalho e da política”. Para a directora da Escola Superior de Saúde de Santarém cada ser humano é singular e único e por isso ela não tem qualquer sentimento de inveja pelo género masculino em particular. “Sempre tive muito orgulho em ser mulher”, diz quando se lhe pergunta se alguma vez teve pena de não ter nas-

Isabel Barroso da Silva cido rapaz. Sobre a educação dos filhos, Isabel Barroso da Silva segue a mesma linha de pensamento. “A educação/ socialização dos filhos é sempre efectuada de acordo com a singularidade de cada um, mas também pela experiência que vamos adquirindo pela nossa próxima experiência. Mas os filhos devem ser educados independentemente do género”. A nível de cada família diz que a questão de género também não é importante. “No contexto familiar sempre trabalhamos em equipa por isso quem está mais disponível é quem faz o que é necessário, privilegiando o que cada um sabe fazer melhor”, explica e quanto às decisões familiares defende que devem ser negociadas. Como ribatejana que é diz que gosta de tudo o que tem a ver com cavalos, toiros e lezíria. Os clássicos portugueses são os seus escritores preferidos e refere Eça de Queirós, Camilo Castelo Branco, Júlio Dinis e Fernando Pessoa. Quanto a música prefere GNR, Xutos & Pontapés, Rui Veloso, Pink Floyd, Queen e U2

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comemorativa do 29º aniversário

“Nasci e cresci no norte do País de Gales e sempre fui tratada com igualdade” Valerie Lynda Randal Picton Santos - Gerente do Centro de Línguas Britannia House

As declarações da gerente e professora de Inglês do Centro de Línguas Britannia House de Torres Novas têm a curiosidade de fornecer informações sobre a igualdade entre homens e mulheres no seu país natal e de desvendarem a sua visão da sociedade portuguesa nesse campo.

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alerie Lynda Randal Picton Santos - gerente e professora de Inglês no Centro de Línguas Britannia House dá uma explicação interessante sobre o facto de nunca ter tido pena de não ter nascido rapaz, nem nunca ter pensado nisso até O MIRANTE lhe colocar a pergunta. “Nasci no norte do País de Gales (Reino Unido), onde cresci como filha única numa sociedade onde não havia diferença entre rapazes e raparigas nem em casa, na escola, nem sequer na universidade. Sempre senti que tive os mesmos direitos que os rapazes e fui sempre tratada com igualdade. Para ser honesta, o facto de ser mulher foi uma vantagem pois facilitou-me obter excelentes posições como gerente, que ocupei primeiro em Manchester e depois em Toronto, Canadá. Estes cargos consistiam em gerir maioritariamente mulheres, portanto davam preferência a mulheres gerentes”, explica. A igualdade que sempre sentiu existir não elimina as diferenças que nota, em termos gerais, entre homens e mulheres. “Os homens têm mais facilidade em dizer o que pensam e em agirem, mesmo em situações desagradá-

Valerie Lynda Randal Picton Santos veis, sem sentirem remorsos. As mulheres são mais emotivas e têm mais dificuldade em tomarem certas posições, pois têm receio de magoar as pessoas. No entanto têm a capacidade de planear antecipadamente e avaliar bem as vantagens e desvantagens antes de tomarem uma decisão”, defende. Olhando para o que se passa em Portugal, considera que muito tem mudado no capítulo da igualdade de oportunidades mas que continuamos a viver num “mundo de homens”, nomeadamente em áreas como a política. “Penso que apesar de haver várias mulheres

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na política em Portugal e a fazerem um trabalho excelente a política continua a ser uma área de homens e considerada assim pela sociedade portuguesa”. Já sobre o acesso a cargos de direcção e chefia por parte das mulheres portuguesas, Valerie Lynda Randal Picton Santos defende que o problema não tem a ver com qualquer tipo de bloqueio. “Ter uma posição de chefia implica muitos sacrifícios, nomeadamente o tempo para a família que as mulheres valorizam muito. Na minha opinião a maior parte das mulheres em Portugal coloca a família em primeiro lugar em detrimento de uma posição de chefia”. A professora deu também a sua opinião sobre o papel das mulheres no futuro em Portugal. “Penso que as mulheres terão um papel mais preponderante na sociedade portuguesa no futuro. Como professora, noto que as raparigas, futuras mulheres, já têm uma atitude diferente em relação ao seu papel na sociedade e à posição que irão ter no mundo do trabalho. Estou confiante que Portugal terá no futuro uma mulher primeira ministra ou até Presidente da República”. A gerente do Centro de Línguas Britannia House tem como “hobbies” a jardinagem, hidroginástica, passear com os cães no campo, ler, ver televisão, ir ao cinema. Interrogada sobre se alguma vez assistiu a touradas ou jogos de futebol responde afirmativamente. “Sim, várias vezes. Fui a uma tourada pela primeira vez quando tinha 18 anos em Barcelona e adorei toda a arte de tourear e o ambiente na praça de touros. Continuo a ir a corridas frequentemente com a minha família. Quando estava na universidade também fui a vários jogos de futebol em Manchester ver o Manchester United jogar”

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Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE Esteve apenas três anos em Alcanena mas foi o suficiente para criar grandes amizades e ficar no coração de colegas e alunos. Ainda hoje visita Alcanena com frequência

Leonoreta Leitão

“Há poucas mulheres em cargos de Poder porque o mundo ainda é dos homens” Leonoreta Leitão foi directora da Escola Técnica de Alcanena entre 1965 e 1968 Quando, no tempo da ditadura salazarista, foi directora do pólo da Escola Industrial de Torres Novas em Alcanena, Leonoreta Leitão causou alguns sobressaltos entre a comunidade machista e tradicional de então. Cinquenta anos depois muita coisa mudou mas para ela são os homens que continuam a mandar.

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uando chegou a Alcanena, em Outubro de 1965, Leonoreta Leitão causou espanto nos moradores. Era difícil acreditar que a nova directora da Escola de Alcanena era uma mulher com apenas 36 anos. Portugal vivia em ditadura, o papel da mulher na sociedade ainda era maioritariamente o de dona de casa e apesar de já haver mulheres com ocupações profissionais isso acontecia principalmente nas cidades e Alcanena era uma vila do interior. “Só o facto de eu entrar num café sozinha era motivo de conversa. Naquela altura, nas terras mais pequenas, era inconcebível uma mulher ir sozinha a um café. Uma vez houve uma festa e as pessoas estavam sentadas e estava a passar música. Estranhei porque não havia ninguém que dançasse. Tive que ser eu e outro profes-

sor a abrir o baile para que as pessoas começassem a dançar. Era um meio mais fechado”, recorda a primeira directora da secção de Alcanena da Escola Técnica de Torres Novas entre 1965 e 1968. “Acho que as pessoas de Alcanena daquela altura me são gratas pelo facto de ter aceitado o convite para directora da secção. A abertura da secção fez com que os jovens daqui não tivessem que ir estudar para Torres Novas. Foi muito importante porque existiam muitas famílias sem capacidade financeira para ter os filhos a estudar noutras terras”, conta. Esteve apenas três anos em Alcanena mas foi o suficiente para criar grandes amizades e ficar no coração de colegas e alunos. Ainda hoje visita Alcanena com frequência e a presidente da Câmara de Alcanena fez questão que a antiga directora apresentasse o seu livro “Era uma vez uma boina – Memórias de uma Professora do Estado Novo à Democracia” na cidade ribatejana. Também já foi condecorada com a medalha de mérito municipal de Alcanena. “No meu livro tenho um capítulo dedicado aos anos que estive em Alcanena. Gostei muito do tempo que lá passei. Como escrevia um diário durante os anos que lá vivi tenho muita coisa registada daquele tempo”, explica.

Leonoreta Leitão tem 87 anos e também se fazia notar por andar sempre de boina, daí o nome do livro. Começou a usá-las na adolescência depois de ter estado doente, com tuberculose, entre os 15 e os 17 anos. Usava-as para se proteger e nunca mais deixou de as utilizar. Actualmente, tem 14 boinas de várias cores. “No dia do lançamento do livro, em Alcanena, estavam lá muitos antigos alunos e

colegas. Sempre que alguém queria tirar uma fotografia comigo pedia-me para colocar a boina. A estrela que uso na boina deve-se a Che Guevara, homem que sempre admirei”, afirma. Filha e neta de professores, Leonoreta licenciou-se em Filologia Clássica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em 1957. Tinha 19 anos quando decidiu seguir a carreira de professora. Deu aulas de Português e Francês até 1994, altura em que se reformou. Em criança gostava de escrever sobretudo poesia, prazer que foi alimentando durante a vida adulta. Teve quatro namorados mas nunca casou nem teve filhos. Leonoreta Leitão considera que ainda existe um longo caminho a percorrer para que exista igualdade entre homens e mulheres. Teve uma experiência política na Junta de Freguesia de São João de Brito, em Lisboa, ligada ao PCP, participou na campanha eleitoral de Maria de Lourdes Pintassilgo, que foi sua amiga e colega de escola, à presidência da República em 1986 e diz que ainda vai ter que ser percorrido muito caminho para as mulheres se imporem na política. “Continua a ser muito difícil haver mulheres nos lugares de Poder porque o mundo ainda é dos homens, embora actualmente já existam mulheres em lugares de topo mas continua a ser uma minoria”, reflecte. Gosta de touradas e sempre que dá uma corrida na televisão assiste. A sua “aficion” já a levou com amigos a Cáceres [Espanha] para assistir a um tourada ao vivo. Considera, no entanto, que as crianças não devem ver touradas. “Admito que pode ser um espectáculo não recomendável para os mais novos”, afirma

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comemorativa do 29º aniversário

“Ser mãe talvez seja a ligação mais profunda que um ser humano pode ter com outro” Lúcia Botequim Nunes - Empresária Tepsol Ldª Santarém A luta que as mulheres travaram para se imporem no mundo profissional ao mesmo tempo que eram obrigadas a desempenhar todas as funções que tradicionalmente lhes estavam atribuídas acabou por torná-las mais fortes.

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ransformar todos os dias em dias positivos independentemente dos obstáculos que possa encontrar, conseguir merecer o respeito de todos os que a rodeiam, sejam os elementos da sua equipa, clientes, fornecedores, ou parceiros de negócio, são os objectivos diários da empresária Lúcia Botequim Nunes, empresária proprietária da Tepsol - Técnicas de Protecção Solar, em Santarém. Acredita que a actividade que tem já lhe estava destinada. Confessa que o caminho percorrido exigiu trabalho e persistência e diz que tem gosto por criar e desenvolver, característica que é partilhada pelos elementos da sua equipa. Diz que adora ter nascido mulher porque isso permitiu-lhe ser mãe. “É uma experiência completamente transformadora e talvez seja a ligação mais profunda que um ser humano pode ter com outro”, declara. Não é grande adepta de “mimos e atenções” na área profissional. Nem sequer por simples cavalheirismo. “Não ignoro que o termo ‘cavalheirismo’ aqui está impregnado de implicações classistas e sexistas, há quem goste, quem não goste, e quem ignore. No meu ponto de vista num mundo de igualdade e profissionalismo deve haver lugar apenas para atitudes coerentes, de igualdade e profissionais “, defende. Lúcia Botequim Nunes realça o esforço que tem vindo a ser feito pelas mulheres para eliminar a discriminação com base no sexo. “Para se inserirem no mundo profissional competitivo, e serem profissionais competentes e cumpridoras, as mulheres tiveram a necessidade de desenvolver muitas aptidões, mantendo todas as outras que já lhes eram exigidas, assim como ser a dona de casa perfeita, a companheira cúmplice e compreensiva, a mãe extremosa e preocupada, a filha atenta, a nora responsável, a amiga presente, a governanta que organiza o dia-a-dia da família... Enfim, uma lista interminável, onde ainda se espera que a mulher tenha tempo para ser o que é, Mulher, não deixando descurar a imagem, ter atenção aos ponteiros da balança… Afinal todos estes desafios trouxeram uma vantagem e a mulher consegue fazer várias coisas ao mesmo tempo”. Acredita que um dia existirá uma sociedade de pes-

Lúcia Botequim Nunes

Confessa que o caminho percorrido exigiu trabalho e persistência e diz que tem gosto por criar e desenvolver, característica que é partilhada pelos elementos da sua equipa. soas com os mesmos direitos, com capacidade de se respeitarem mutuamente apesar das diferenças. Quanto à política acredita que actualmente já seria bem aceite uma mulher no cargo de primeiro-ministro, coisa impensável há algumas décadas. Respondendo a uma questão sobre quem deve mandar em casa, a proprietária da Tepsol traça um paralelismo com o mundo empresarial. “Numa casa ninguém manda! Os elementos da família entram em consenso para planearem e resolverem juntos as coisas. O lar deve ser um lugar de paz e harmonia. Se fôssemos comparar a família com uma empresa, penso que o casal seriam os sócios maioritários, com o mesmo poder de actuação, cada um respeitando a decisão do outro e cooperando em todos os projectos”. Quanto à educação dos filhos diz que o essencial é a transmissão de valores e princípios de igual forma, de modo a que se tornem seres humanos íntegros e correctos”. Ao mesmo tempo é importante dar-lhes amor e liberdade para serem criativos, resistentes e independentes por conta própria, afinal há coisas que têm de ser aprendidas por eles próprios. No entanto os filhos vão ter necessidades e quereres diferentes das filhas e como pais é crucial adaptarmo-nos às diferenças e de conseguir estar à altura de acompanhar ambos.”, refere

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“As poucas horas livres que tenho sou eu que as imponho a mim mesma” Fernanda Monteiro - Sócia gerente da Construaza - Construções e Projectos, Ldª Ficou desiludida com a derrota de Hillary Clinton nas eleições presidenciais americanas porque acha que as mulheres em geral, pelo facto de poderem gerar uma vida, têm mais sensibilidade e respeito pela humanidade. Diz que em Portugal as mulheres continuam a ser discriminadas no acesso a cargos de responsabilidade.

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rganização é um dos elementos essenciais na vida da sócia gerente da Construaza - Construções e Projectos de Azambuja. “Quando começo a trabalhar verifico primeiro o que é prioritário e começo por essas tarefas. Normalmente existem assuntos que não podemos deixar para o dia seguinte e é a esses que dou atenção em primeiro lugar”, explica Fernanda Monteiro. Mas não é a capacidade de organização aquilo que considera ser a maior vantagem das mulheres em relação aos homens em geral. “A maior vantagem é conseguirmos fazer várias tarefas em simultâneo. Também temos a vantagem de podermos dançar mulheres com mulheres e de podermos chorar em público sem sermos criticadas”, refere com algum humor. Diz que na adolescência as únicas alturas em que lamentava não ter nascido rapaz era quando os pais não a deixavam sair à noite. Agora gosta muito de ser mulher mas reconhece que os homens têm alguns pontos positivos a seu favor, nomeadamen-

As mulheres continuam a ser preteridas nos concursos apesar de terem as mesmas habilitações porque é entendido que a elas lhes cabe dar à luz e tratar dos filhos e da família

Fernanda Monteiro te a pouca massa gorda que têm e o facto de conseguirem mais rapidamente a massa muscular no ginásio. Sobre uma característica comum à maioria dos homens refere a sua determinação sem ponderação. “Quando têm um objectivo lutam até ao fim por ele independentemente das consequências que possam advir nomeadamente para a família, enquanto as mulheres ponderam de maneira diferente podendo por vezes abdicar dos seus ideais”. Fernanda Monteiro diz que as mulheres continuam a ser preteridas nos concur-

sos apesar de terem as mesmas habilitações porque é entendido que a elas lhes cabe dar à luz e tratar dos filhos e da família. Gostava de viver num mundo governado por mulheres porque acha que o facto de as mulheres conceberem a vida têm mais sensibilidade e respeito pela humanidade. A derrota de Hillary Clinton nas eleições presidenciais dos Estados Unidos da América foi para ela uma grande decepção. As poucas horas livres que tem é ela que as impõe a si própria porque se assim não fosse estava ininterruptamente a trabalhar. Nessas alturas gosta de confraternizar com os amigos, ler, viajar e ir ao cinema. A primeira vez que foi a um jogo de futebol, a gestora da Construaza saiu ao intervalo mas em relação a touradas não acontece o mesmo ou não tivesse ela nascido em Coruche, terra de tradições tauromáquicas onde não ir a uma tourada ou a uma largada é que é considerado estranho

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“Eu pensava que era a salvadora do mundo mas com o passar do tempo consegui criar mecanismos de defesa, tal como os meus colegas e isso ajudou-me a ser uma melhor profissional. de em alcançar objectivos porque têm de dividir esforços entre vida profissional e vida familiar e filhos. Felizmente o apoio do meu marido foi facilitador. Tive sorte. Sempre consegui conciliar a vida familiar com a profissional”.

Maria José Lourenço

Há cada vez mais homens a apoiar as esposas que trabalham e isso é positivo Maria José Lourenço é enfermeira no Hospital de Vila Franca de Xira Maria José Lourenço é directora de enfermagem do Hospital de Vila Franca de Xira desde 2011. Tem 58 anos e reformase em Janeiro. Uma excelente ocasião para fazer o balanço de um percurso profissional ao serviço dos outros.

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aria José Lourenço, directora de enfermagem do Hospital de Vila Franca de Xira desde 2011, tem 58 anos e vai reformar-se em Janeiro. Diz-se em paz consigo própria e satisfeita por ter ajudado a tratar e a aliviar o sofrimento de centenas e centenas de pessoas. É profissional de uma profissão predominantemente feminina mas para ela, mais do que o género, o que conta é a competência e a dedicação. Nasceu em Seda, distrito de Portalegre, e orgulha-se de ser alentejana mas viveu quase toda a sua vida em Alverca, no concelho de Vila Franca de Xira, para onde os seus pais migraram para poder trabalhar. “Naquele tempo houve um êxodo muito grande. As pessoas fugiram do trabalho rural e os meus pais sempre quiseram dar, a mim e ao meu irmão, uma vida melhor. A minha mãe é uma pessoa muito à frente do seu tempo. Quando os outros pais colocavam os filhos a trabalhar ela só dizia que queria que me formasse e que eu não tinha vindo para Alverca para trabalhar mas para estudar”, recorda. Estudou em Vila Franca de Xira até ingressar em Ciências de Enfermagem naquela que é hoje a Escola Superior de Enfermagem, em Lisboa, onde decorreu esta conversa. Diz que mais importante do que ter desejado ser enfermeira foi descobrir que tinha verdadeira vocação para cui-

dar dos outros. “Quando estou a entrevistar candidatos pergunto-lhes sempre porque decidiram ir para enfermagem. Gosto de perceber as motivações de cada um. Eu decidi isso quando ainda não tinha 17 anos e esta profissão é parte de mim. Na altura os meus pais queriam que eu fosse para medicina e o meu padrinho até se ofereceu para me pagar os estudos porque não tínhamos grandes posses. Eu insisti na minha decisão e ainda bem. Gosto muito de ser enfermeira e fiz a opção certa”. Diz que aquilo que a define enquanto profissional é a proximidade com as pessoas. Com todas as pessoas e não apenas com os doentes ou os colegas de trabalho. “Apesar de agora estar num cargo de liderança gosto de andar no terreno. Digo a brincar que gasto muitos sapatos por querer acompanhar tudo. O trabalho tem de ser de pro-

ximidade. Temos perto de 400 enfermeiros e quase 300 auxiliares dentro da área assistencial de enfermagem”, explica. A maior parte do pessoal que dirige é do sexo feminino mas acredita que também não iria ter problemas se assim não fosse. Pelo menos nos tempos actuais. “Se olharmos para o histórico da enfermagem percebemos que a enfermagem era sobretudo praticada por mulheres e de uma forma muito rígida, as primeiras enfermeiras nem podiam casar por causa dos turnos. Como não podiam dar apoio familiar isso chocava com a ideia da mulher tradicional que dedicava todo o seu tempo à lida da casa e a tratar do marido e dos filhos. Ainda bem que houve uma grande evolução a esse nível”, diz. E acrescenta: “Nunca senti que por ser mulher estava a ter dificuldade em alcançar algo. As mulheres têm mais dificulda-

Os enfermeiros não são máquinas e também sofrem Maria José Lourenço diz que os enfermeiros não são insensíveis à dor e ao sofrimento dos doentes, embora mantenham uma postura de algum distanciamento para que o seu trabalho não seja afectado. Conta que no início da carreira sofreu bastante. “Eu pensava que era a salvadora do mundo mas com o passar do tempo consegui criar mecanismos de defesa, tal como os meus colegas e isso ajudou-me a ser uma melhor profissional. “Quando começamos no curso e fazemos estágio e somos confrontados com uma situação mais complexa somos capazes de desmaiar. Basta um cheiro mais intenso, por exemplo, numa sala de pensos ou a morte de um doente. Pessoalmente uma situação que me custou a gerir foi quando houve o acidente de comboio da Póvoa de Santa Iria [a 5 de Maio de 1986, de que resultaram 14 mortos e 18 feridos]. Ter de lidar com a ansiedade das famílias e com todo o ambiente que se gerou foi complicado. Sabermos quem tinha falecido e não podermos comunicar isso aos familiares que os procuravam, porque havia canais próprios para dar essas informações, chocou-me muito”, recorda. Tem três filhos e duas netas. Colabora mensalmente com verbas para o projecto SOS Bebé de Setúbal e, apesar de não fazer voluntariado, diz que está sempre disponível para os que necessitam dela. Gosta de viver em Alverca mas confessa que sente alguma tristeza por ver a cidade cada vez mais descaracterizada. Tira-a do sério a mentira; a desonestidade e a incompetência. Faz um balanço positivo da sua carreira e admite que conseguiu marcar positivamente a vida de quem precisou. “Não fui perfeita mas fui melhorando ao longo do meu percurso e sempre me esforcei por fazer o meu melhor”, conclui

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“Há um traço comum aos grandes homens que é terem por trás de si uma grande mulher” Helena Fidalgo - Técnica de Óptica e gerente da Óptica Vanessa em Almeirim Na perspectiva de Helena Fidalgo, gerente da Óptica Vanessa em Almeirim, a mulher está em vantagem em relação ao homem porque tem capacidade de dar à luz. Além disso, as mulheres têm tendência a ser mais organizadas que os homens.

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ão tem inveja dos homens nem nunca lamentou ter nascido mulher. Considera que o facto de as mulheres poderem gerar filhos é o mais valioso bem que possuem. Helena Fidalgo, gerente da Óptica Vanessa em Almeirim, está de bem consigo e com a vida e gosta do que faz, embora a actividade que tem não tenha sido o concretizar de um qualquer sonho mas apenas uma oportunidade que lhe surgiu e que ela agarrou com determinação e vontade. Defende que em casa devem mandar as mulheres por serem, regra geral, mais organizadas, embora reconheça que também há homens com essa qualidade. O marido ajuda-a nas tarefas domésticas, nomeadamente cozinhando, mas a maior parte do trabalho é feito por ela, dentro do princípio que cada um deve fazer aquilo para que tem mais jeito. A empresária reconhece que em Portugal

Helena Fidalgo não há igualdade entre homens e mulheres porque há escolhas que ainda não são feitas apenas pelo mérito e pelas qualificações. Apesar disso diz que tem havido grandes progressos e que já é possível encontrar mulheres muito competentes em posições de liderança. Com alguma ironia diz que o traço comum à maioria dos grandes homens é terem por detrás de si uma grande mulher.Nas horas vagas Helena Fidalgo faz desporto, nomeadamente atletismo, bicicleta e actividades de ar livre. Gosta de tauromaquia e já assistiu a várias touradas e é fã do guitarrista Custódio Castelo, natural do concelho de Almeirim. É uma entusiástica leitora dos livros do escritor Paulo Coelho

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comemorativa do 29º aniversário

“No ramo imobiliário é normal serem as mulheres a darem o sim final nos negócios” Sílvia Sousa - gerente imobiliária Century 21 - Casas do Gótico

Pode haver sectores onde as mulheres tenham dificuldade em atingir lugares de direcção e chefia mas no ramo do imobiliário são mais elas que eles a mandar. Pelo menos é essa a percepção da gestora da Century 21 - Casas do Gótico.

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pesar de considerar que as mudanças sociais em Portugal são difíceis, atribuindo esse facto ao envelhecimento da população e ao seu conservadorismo, Sílvia Sousa, gerente da imobiliária, Century 21 - Casas do Gótico, nota que há cada vez mais mulheres em lugares de chefia em empresas e instituições. Segundo ela, tal facto não tem correspondência a nível da política porque não há muitas mulheres a interessarem-se por uma carreira política e porque os eleitores mais jovens não vão votar. “No sector privado os cargos de chefia estão atribuídos na maioria, a mulheres. Na minha actividade, ramo imobiliário, somos mais mulheres que homens nesses cargos. No meu caso em particular nunca senti que o facto de ser mulher impedisse ou fosse um impasse no desempenho das minhas funções como gerente da empresa. Se ainda há algum problema em nomear mulheres competentes para lugares de chefia é no sector público”, diz. Comparando de uma forma genérica mulheres com homens diz que elas levam vantagem porque conseguem fazer várias coisas ao mesmo tempo enquanto que os homens só se conseguem focar numa coisa de cada vez. E além disso, refere, as mulheres têm um sexto sentido. “Também poderia acrescentar o facto de as mulheres serem mais decididas e

Sílvia Sousa determinadas, tendo em conta que no ramo do imobiliário, geralmente, quem dá o ok para a compra são elas”, afirma. Sílvia Sousa diz que o único tempo livre que tem, normalmente aos domingos, é passado com a família. Nos dias de semana está totalmente concentrada no objectivo de tornar a Century 21 - Casas do Gótico uma referência no mercado imobiliário no Ribatejo através de uma equipa motivada e empenhada em prestar um serviço de excelência aos clientes. Quanto a leituras o que lê mais são livros técnicos relacionados com a sua actividade

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Sensação de Batimento Cardiaco Anormal

Vitor Paulo Martins Médico Cardiologista e Arritmologista Diretor Clínico da Clinica do Coração Santarém www.clinicadocoracaosantarem.pt O nosso coração acelera normalmente perante estímulos externos (uma emoção, um momento de stress, um esforço físico) mas também numa situação de febre, de dor intensa ou presença de doença física. Não será normal sentir o coração acelerado (taquicardia) em repouso, ter batimentos irregulares ou sentir batimentos intercalados mais fortes, sem razão aparente. Nem sempre, mas por vezes, estes sintomas se associam a tonturas, sensação de desmaio, cansaço exagerado ou dor no peito.

Estas situações que denominamos de arritmias ou taquidisrritmias, têm uma causa que poderá ser intrínseca ao coração (doença cardíaca) ou extrínseca relacionada com perturbação noutro órgão ou sistema. Interessa nessas situações entender a causa, porque só assim se resolverá a situação. Depois teremos que estabelecer as implicações, que em linguagem médica denominamos por prognóstico, que traduz a gravidade do processo. A fibrilhação auricular é a arritmia mais prevalente na população (mais de 2% da população portuguesa) e se não for equacionada e tratada pode levar ao acidentes vascular cerebral (AVC). Temos hoje fármacos anticoagulantes de nova

geração e fácil uso, sem necessidade de controles laboratoriais periódicos, antiarrítmicos qua controlam a frequência cardíaca mas também técnicas de ablação que poderão ser curativas. A presença de batimentos cardíacos mais fortes pode indicar a presença de extrassístoles ventriculares ou auriculares que poderão traduzir doença do músculo cardíaco, doença do sistema eléctrico cardíaco, doença das artérias coronárias ou apenas uma situação de hipertensão não controlada, um efeito medicamentoso indesejado, uma doença endócrina, etc. A nossa pulsação deve ser regular, entre os 60 e 100 batimentos por minuto. O algoritmo diagnóstico passa pela clinica, pela observação e por alguns exames laboratoriais mas também por exames cardiológicos, como o electrocardiograma de repouso, electrocardiograma das 24 ou 48 horas, detectores de eventos externos, detectores de eventos implantáveis, exames de imagem com o ecocardiograma, estudos do sono (exclusão do Síndrome de Apneia do Sono) e muitos outros exames de acordo com cada caso particular. É exemplo, o caso de atletas participantes em desportos de elevada intensidade que após um simples electrocardiograma são impedidos transitoriamente ou permanentemente para prática desportiva pela presença de arritmias potencialmente perigosas, sobretudo em idades mais avançadas mas também em idades jovens. Uma perda da consciência transitória antecedida de palpitações rápidas, se for provocada por uma taquicardia ventricular poderá degenerar numa arritmia mais grave, chamada fibrilhação ventricular, levando á morte em poucos minutos (Morte Súbita). A única maneira de a evitar, será perceber que esta situação existiu, que a recidiva poderá ser fatal e por isso teremos que tratar o substrato mas também implantar um cardioversor desfibrilhador implantável (CDI). A Sociedade Europeia de Cardiologia recomen-

divulgação

da que deve ser feita a palpação do pulso pelo próprio, periodicamente, em todos os grupos etários independentemente de ter ou não ter sintomas. Estar assintomático não implica obrigatoriamente a ausência de perturbações do ritmo. Feito o diagnóstico importa retirar os “triggers”, aliviar a sintomatologia normalizando o ritmo cardíaco e melhorar o prognóstico. Medidas gerais, como a abstenção tabágica, redução salina e da cafeína e outros excitantes, complementada por inicio ou modificação da terapêutica farmacológica (se necessária), poderão resolver a situação. A autovigilância e o seguimento médico irão permitir a verificação do restabelecimento da normalidade. O nosso coração é um relógio com parâmetros rigorosos, muito sensível a alterações da nossa fisiologia. A sua desregulação pode conduzir a modificações fisiopatológicas em todos os órgãos. Podemos antecipar esta trajetória, se estivermos atentos ao nosso relógio intrínseco. O seu médico cardiologista poderá realizar essa avaliação através de um algoritmo diagnóstico e terapêutico. No entanto o primeiro passo terá sempre que ser dado pelo próprio. A nossa felicidade e a nossa produtividade depende da percepção do nosso bem estar. Deste modo verifique a regularidade e o número de pulsações por minuto pela palpação do pulso radial. Consulte o seu médico na presença ou na suspeita de alterações. A prevenção é o melhor atitude para obviar a doença.

Rua Pedro de Santarém, 48- 1º Dto 2000-223 Santarém

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“Boas leis não mudam mentalidades e já me mandaram ir para casa coser meias” Anabela Freitas - Presidente da Câmara Municipal de Tomar

Portugal não precisa de mais leis sobre igualdade entre mulheres e homens porque já tem das melhores leis do mundo. Do que precisa é de promover a mudança de mentalidades. Para dar um exemplo de que isso não se faz por decreto, Anabela Freitas conta que na campanha eleitoral de 2013 alguém a mandou para casa coser meias. Uma opinião não partilhada pela maioria dos eleitores que a elegeu presidente.

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presidente da Câmara Municipal de Tomar gosta de ser mulher e não se lembra de alguma vez ter desejado ter nascido rapaz. “Tenho muito orgulho em ser mulher. Há algo que só uma mulher pode experienciar, a maternidade, e isso é algo único”, afirma. Acrescenta que o facto de ser mulher nunca a impediu alguma vez de lutar e perseguir os seus sonhos, embora saiba que por vezes teve que lutar mais do que se fosse homem. Sobre os homens em geral, e salvaguardando o facto de cada um ter a sua própria personalidade, Anabela Freitas diz que lhes reconhece uma capacidade de “desligar” mais rapidamente que as mulheres. E acrescenta outra característica masculina. “Acho que existe um traço comum, fruto talvez da educação que é a necessidade de protagonismo”. Quanto às mulheres, em termos gerais, diz que têm mais capacidade de escutar os outros e de se colocarem no seu lugar, embora reconheça que também há homens capazes do mesmo. A autarca lamenta que em termos de igualdade ainda estejamos um pouco atrasados. “Em termos legislativos Portugal tem das leis mais avançadas da Europa e até do mundo mas a mudança de comportamentos não se processa por decreto. Na prática ainda há um desfasamento entre a

Anabela Freitas lei e a realidade, fruto do isolamento que Portugal teve durante os anos de ditadura, do sistema de ensino, que apesar de hoje em dia já alertar para essa questão, durante muitos anos o que passava nos próprios manuais escolares era que o homem tinha uma posição pública e a mulher uma posição mais privada”, pormenoriza. No entanto reconhece que há casos em que são as mulheres que não aceitam cargos de responsabilidade. “O facto das mulheres continuarem tão afastadas de cargos de direcção e chefia deve-se, em alguns casos, à dificuldade em atingir esses lugares e noutros à vontade própria, porque apesar da distribuição das tarefas e do cuidar dos filhos já estar mais repartido, o grosso do trabalho ainda recai sobre elas”, opina. Quando lhe perguntámos o que é que mudava no país político em favor das mulheres respondeu: “Não se deve mudar em favor das mulheres mas deve-se mudar em favor da construção de uma sociedade onde estes temas façam parte do nosso passado e história”. Anabela Freitas aproveita as poucas horas vagas que tem para ler, nomeadamente policiais, e cozinhar, sobretudo doces. E diz que não passa sem ouvir música, mesmo quando está a trabalhar. Em termos musicais confessa-se muito eclética. Tanto ouve musica clássica, nomeadamente Vivaldi e Bach, por exemplo, como AC/DC, dependendo do seu estado de espírito

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Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE Apesar de hoje existirem mulheres a chegar a cargos de chefia ainda há civis que pensam que as mulheres não trabalham tão bem. As irmãs bombeiras do Sardoal contestam essa visão e lembram que já há piquetes feitos só com recurso a mulheres.

Teresa e Maria de Fátima Marques

“Fomos para os bombeiros numa altura em que ainda não era habitual haver lá mulheres” Teresa e Maria de Fátima Marques são bombeiras nos Municipais do Sardoal O pai de Teresa e Maria de Fátima, Augusto Marques (já falecido) era bombeiro na corporação dos municipais do Sardoal e dizia que aquele trabalho era para homens. Estava enganado e foram as filhas que lhe mostraram isso. E são elas que apesar da admiração pelo pai elegem a mãe como a heroína da família. “Nós íamos ajudar os outros mas era ela que tratava de nós”.

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asceram entre sirenes de ambulâncias e de carros de ataque a incêndios. O pai era bombeiro na Corporação dos Municipais do Sardoal e Teresa e Maria de Fátima Marques seguiram-lhe o exemplo. Entraram num mundo que era, e ainda é, maioritariamente masculino mas mostraram ser mulheres de força com grande força de vontade para ajudar o próximo. Fizeram o seu percurso profissional nos bombeiros e agora estão reformadas mas continuam a ser bombeiras, embora voluntárias. Muitas foram as vezes em que Maria de Fátima Marques e Teresa Marques Duarte viram o seu pai sair de casa a correr para os bombeiros. Ambas nasceram no Sardoal

e em pequenas já tomavam contacto com a realidade dos incêndios florestais. “Lembro-me de ter havido um grande fogo na Quinta do Côro e de eu estar na janela a ver. Fiquei com aquela imagem e com aquela preocupação na cabeça”, conta Maria de Fátima, de 51 anos. “Não havia rádios ou telemóveis e quando havia um incêndio as mulheres iam para o Pelourinho, na Praça da República, esperar por notícias trazidas por quem voltava ao quartel e levar comida para quem estava de serviço”, lembra Teresa Marques, agora com 58 anos. A primeira a entrar para os bombeiros foi a mais nova. Maria de Fátima devia ter um fascínio por fardas porque primeiro tentou entrar para a Banda Filarmónica. Não conseguiu porque o pai achava que o maestro tinha mau feitio e quis protegê-la. Como na altura não podia ir para a tropa optou por ir

para os bombeiros. O pai achava que era trabalho para homens mas não conseguiu demovê-la. “Eu tinha 14 anos mas era forte e dizia sempre que conseguia fazer tudo. Sempre gostei de trabalhos manuais e que exigiam destreza física”, conta. A irmã, Teresa Marques, entrou para os bombeiros pelos seus dotes de cozinheira. “Os bombeiros também têm que se alimentar”, sublinha. Em casa, a mãe, Maria Natália, é que “aguentava” com o marido e as filhas a correrem para os bombeiros. Teresa Marques ajudou a combater “meia dúzia de incêndios”, mas acabou por trabalhar na central de comunicações durante todo o seu tempo de bombeira municipal. Maria de Fátima era uma operacional. Ia para o terreno. “Cheguei a ir de calças de ganga e de sandálias para um incêndio”, revela entre risos. As duas irmãs entraram como voluntá-

rias. Antes de passarem ao quadro de efectivos trabalharam em fábricas e no campo. Nem sempre os patrões achavam graça a ter que dispensar trabalhadores para serviços de urgência nos bombeiros. “Por vezes quando voltávamos dos incêndios ouvíamos raspanetes”, contam. Quando concorriam para subir de escalão havia provas físicas, o que nunca as atemorizou. “Éramos mais novas e tínhamos mais força e como gostávamos de ser bombeiras estávamos motivadas e nunca tivemos problemas”, explica Teresa Marques. As duas dizem que nunca se sentiram discriminadas. E acreditam que foi pelo entusiasmo, entrega e paixão pelos bombeiros que isso aconteceu. Mas para provar o que valiam tinham que cerrar os dentes e pôr o coração ao largo, como se costuma dizer. “Uma vez estava numa estrada e o meu colega foi para cima do veículo apagar o fogo com o canhão e eu fiquei cá em baixo com a mangueira a proteger o carro. Como estava sozinha vi-me aflita para aguentar o peso e a pressão da água mas não dei parte de fraca”, conta Maria de Fátima. Apesar de hoje existirem mulheres a chegar a cargos de chefia ainda há civis que pensam que as mulheres não trabalham tão bem. As irmãs bombeiras do Sardoal contestam essa visão e lembram que já há piquetes feitos só com recurso a mulheres. Teresa Marques gosta do contacto com as pessoas e de as acalmar e viveu situações de grande intensidade. “Uma vez um carro caiu para uma ribanceira e tive que ficar na estrada a segurar os familiares que apareceram e a dar-lhes apoio psicológico. Ainda por cima foi uma amiga minha que morreu no acidente. Não é fácil”, admite. O pai, Augusto Marques, já faleceu mas a presença da família nos bombeiros do Sardoal está assegurada pelo filho de Teresa Marques. As filhas gémeas de Maria de Fátima não lhe seguem o exemplo. Ela percebe-as. “Passaram muito tempo sem nós e por muitas aflições”, explica e deixa um elogio à sua mãe. “Ela é que é uma verdadeira heroína nisto tudo porque tomou conta de nós todos, marido, filhas e netos. Tocava a sirene, nós íamos acudir aos outros e ele acudia-nos a nós”, remata Teresa Marques

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“A maior parte das mulheres só não está em cargos de chefia por opção” Maria Salomé Rafael - Empresária e Presidente da Nersant - Associação Empresarial da Região de Santarém

Maria Salomé Rafael

A presidente da Nersant considera que em Portugal tem havido progressos no capítulo da igualdade de género e que nesta altura muitas mulheres só não estão a desempenhar cargos de chefia por condicionamentos de índole pessoal ou familiar ou por simples opção.

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presidente da direcção da Nersant - Associação Empresarial da Região de Santarém não tem inveja de ninguém e por isso não inveja nenhuma característica que considera comum à generalidade dos homens. Mas isso não a impede de afirmar que, e citamos; “A maioria dos homens têm em comum o encanto e a sedução”. Habituada a ser alvo de atenções e elogios defende que nem sempre os mesmos são motivados pelo reconhecimento do seu valor enquanto empresária ou dirigente associativa. “Penso que os homens foram educados para terem uma atenção muito própria para com as mulheres, por isso acho que na maior parte das situações se trata de um acto de cavalheirismo”, esclarece. Salomé Rafael confessa que durante a adolescência houve alturas em que teve pena de não ter nascido rapaz. “Foi por volta dos meus 14, 15 anos. Queria sair com as minhas amigas, ir ao café e ao cinema e a minha mãe não me deixava porque não era habitual as raparigas naquela altura terem esse tipo de liberdade. Questionei-me muitas vezes se, por acaso, tivesse nascido rapaz não teria a vida um pouco mais facilitada”. Actualmente, mulher realizada e respeitada diz sobre as mulheres em geral que as principais diferenças em relação aos homens são “(...) a sensibilidade, a persistência, a capacidade de executarem e coordenarem várias actividades em simultâneo, o que lhes dá alguma vantagem sobre os homens.”. Considera que em Portugal tem havido progressos no capítulo da igualdade de género e defende que as melhorias vão continuar. “A igualdade de género tem vindo a melhorar devido à evolução da própria sociedade ocidental onde nos encontramos. No entanto, persistem algumas situações discriminatórias que cabe a todos nós denunciar”, diz.

Acrescenta que por vezes percebe que as mulheres só não estão em determinados cargos de direcção e chefia porque não querem. “Tenho verificado que as mulheres têm demonstrado muita disponibilidade para participarem na vida política. No entanto, no que diz respeito a outras actividades que as obrigam a uma disponibilidade diferenciada, nota-se que há menos participação. Não porque haja alguma atitude discriminatória por parte dos homens, mas porque são opções tomadas pelas mulheres, em função da sua vida familiar, pes-

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soal”, defende. Empresária na área da educação e formação profissional, Salomé Rafael acredita que a sua actividade não foi fruto do acaso. “Acredito que sou empresária por tradição familiar. Penso que essa herança familiar teve alguma influência nas opções que tomei”, confessa. Quanto ao facto de ser dirigente de uma das maiores associações empresariais do país reconhece que o cargo lhe ocupa muito tempo mas diz que “tudo se consegue com equilíbrio e bom senso”. Nas horas vagas gosta de estar com a família, viajar, ler, ir ao cinema e ter tempo para contemplar o que lhe dá alguma tranquilidade. Sobre touradas e futebol diz o que tem a dizer sem subterfúgios. “Já fui a uma tourada e confesso que não gostei. Até achei as pegas muito interessantes, mas o

17 Novembro 2016 | 40 resto não me despertou interesse. Quanto ao futebol, já assisti a vários jogos até porque o meu marido era jogador de futebol.” A presidente da Nersant gosta de música clássica e menciona Bach, Beethoven e Liszt e de cantores clássicos como Frank Sinatra, Jacques Brel, Ella Fitzgerald. Num outro registo diz ouvir com agrado Pink Floyd, Queen e Vinicius de Moraes e os portugueses Carlos do Carmo, Amália, Rui Veloso, Simone e Jorge Palma. Os seus escritores preferidos são Gabriel García Márquez, Umberto Eco, Milan Kundera e José Luís Borges. Também gosta de Vergílio Ferreira, Alçada Baptista, Aquilino Ribeiro e Augustina Bessa Luís e da poesia de Sophia de Mello Breyner Andresen e Alexandre O’Neill

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A paixão pela música começou a ganhar forma quando aos 18 anos foi estudar Medicina para o Porto, sua cidade natal. Foi nessa altura que entrou para o Orfeão Universitário do Porto, onde conheceu o maestro Mário Mateus, que foi o seu primeiro professor de canto. Foi com a ajuda dele que conseguiu uma bolsa da Gulbenkian.

A arte de conciliar a paixão pela medicina com a paixão pelo canto Hélia Castro é médica em Almeirim e vive em Santarém Hélia Castro é médica a tempo inteiro e cantora lírica quando tem tempo livre. As duas actividades sempre a atraíram desde a infância e ela conseguiu concretizar as duas paixões, embora mais uma que outra. A Medicina dá-lhe segurança económica. O canto dá-lhe outro tipo de satisfação. Actualmente participa no concurso de talentos da RTP “The Voice of Portugal”. Vive em Santarém há quase uma década e meia e gosta muito da qualidade de vida da região mas não gosta de touradas.

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m criança brincava aos festivais da canção com a irmã e uma prima. Imitava as “Doce”, a primeira “girls band” portuguesa dos anos 80 do século XX, e cantava êxitos da época. Também costumava cantar no quintal da avó, empoleirada numa laranjeira. Apesar de já mostrar queda para a música, Hélia Castro não pensava ser cantora mas sim médica. Conseguiu concretizar o sonho sem nunca deixar de cantar. E até já chegou a pensar deixar medicina para se dedicar em exclusividade ao canto lírico. A médica vive em Santarém e exerce ac-

tualmente no Centro de Saúde de Almeirim. Em Sangalhos, distrito de Aveiro, onde cresceu, morava em frente ao hospital. Diz que terá sido aí que cimentou o seu desejo de ser o que é hoje em termos profissionais. “Era um hospital pequeno, comparado com as dimensões dos actuais, que servia as gentes da terra. Ali tudo era familiar e todos se conheciam. Faziam-se lá partos e várias cirurgias. O que mais gostava naquele hospital era da limpeza e brancura da sala de espera, das fardas impecáveis das enfermeiras, do cheiro a éter da sala de tratamentos, das histórias que ouvia sobre doentes. Funcionava tudo com muita ordem e respeito. Às vezes, o enfermeiro, o senhor Manuel Augusto, deixava-me assistir a algumas suturas e pensos e eu sentia-me uma doutora de verdade”, recorda. Em som de fundo da sua vida estava sempre a música. Aos 12 anos começou a ter aulas particulares de piano. Gostava de ouvir músi-

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Hélia Castro

ca clássica, nomeadamente ópera e começou a descobrir as suas capacidades vocais. A paixão pela música começou a ganhar forma quando aos 18 anos foi estudar Medicina para o Porto, sua cidade natal. Foi nessa altura que entrou para o Orfeão Universitário do Porto, onde conheceu o maestro Mário Mateus, que foi o seu primeiro professor de canto. Foi com a ajuda dele que conseguiu uma bolsa da Gulbenkian. “Os meus pais não viram com bons olhos a ideia de me estarem a pagar os estudos de Medicina e, de repente, terem de pagar também o curso de canto. Tiveram medo que eu me perdesse e não fizesse coisa nenhuma”, refere. Mas não havia razão para receios. Em 1991, posta perante a opção de prosseguir os estudos superiores de música na recém-criada Escola Superior de Música e de Artes do Espectáculo do Porto, condição que lhe permitia continuar a receber a bolsa da Gulbenkian, ou continuar a estudar Medicina, escolheu a medicina e licenciou-se em 1994.

No entanto foi mantendo as aulas de canto e completando as principais disciplinas do Conservatório. A sua ligação a Santarém começa quando o marido aceitou um emprego em Lisboa. Em vez de irem morar para a capital decidiram ficar a viver no Ribatejo. “O meu marido tem família em Santarém e sabíamos que aqui teríamos mais qualidade de vida”, refere. Apesar de viver no Ribatejo há 14 anos, Hélia Castro nunca foi a uma tourada e é contra aquele espectáculo. “Desagrada-me profundamente que as pessoas se possam divertir a maltratar os animais. Acho bárbaro e primitivo”, desabafa com frontalidade. Antes de Almeirim, Hélia Castro deu consultas na Extensão de Saúde de Alcanede (Santarém); no serviço de urgência do Hospital Distrital de Santarém; na Clínica de Hemodiálise Ribadial; no Lar de Idosos e de Acamados da Santa Casa da Misericórdia de Santarém; e na Unidade de Cuidados Continuados da Misericórdia de Santarém. A médica não inveja nada nos homens e embora considere que cada homem é um homem diz que sente existir uma característica mais marcadamente masculina que é um certo egoísmo. Nos ambientes que frequenta nunca se sentiu discriminada por ser mulher mas tem a percepção de que há muita gente que faz ou tenta fazer essa discriminação. “Quem o faz sofre de insegurança, pois tem que rebaixar o outro para se sentir superior. Todos somos diferentes, cada qual com o seu valor, independentemente do sexo”, defende. É contra o actual sistema de quotas na política. Em sua casa as tarefas são repartidas por todos. “Na casa do meu pai havia a seguinte regra: enquanto houvesse trabalho para fazer, todos ajudavam e no fim descansávamos todos. É esta a regra que tento manter na minha casa. O meu marido cozinha, lava, vai às compras e limpa a casa, sempre que é preciso. Eu se calhar até estou em vantagem porque não sei consertar os electrodomésticos e é ele que trata desses assuntos”

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“Como dirigente associativa ganhei outra sensibilidade a nível humano”

“O machismo ainda é um traço comum a uma grande maioria de homens”

Dora Coutinho - Coordenadora da Arcas - Associação Recreativa e Cultural Amigos de Samora

Nunca desejou ter nascido homem, nem sequer quando está atarefada a limpar o pó ou a fazer outras tarefas domésticas mais desgastantes. Acha interessante o facto de os homens só se conseguirem focar num trabalho de cada vez mas a única coisa que lhes inveja é não terem que fazer depilação.

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uando chegam a qualquer organização as mulheres têm que trabalhar mais que os homens para provar o que valem e para conquistarem o respeito de quem lá está. Esta situação foi confirmada por Dora Coutinho quando assumiu o cargo de coordenadora da Arcas (Associação Recreativa e Cultural Amigos de Samora). “No inicio pode ter havido alguma preocupação ou até mesmo desconfiança porque era a primeira mulher à frente daquela associação. Isso aconteceu nomeadamente nas festas de Samora Correia onde lidamos com situações por norma mais direccionadas para os homens. Mas com o passar do tempo tudo se resolveu. Eu, que já respeitava quem estava na associação, sinto que também sou respeitada”, explica. Como dirigente associativa, Dora Coutinho diz que dá mas que também tem recebido imenso. “Isto muda a nossa vida e a nossa forma de pensar e de ver o que nos rodeia. Ganhamos outra sensibilidade, quer a nível humano quer cultural. Lidamos com uma série de situações que nos obrigam a ver a sociedade com outros olhos”. Embora cada homem tenha as suas características próprias, a dirigente associativa diz que há algumas características comuns à maioria. “São mais minuciosos no seu trabalho. Fazem as coisas com mais pormenor e mais pensadas, talvez por-

Agente Principal Lúcia Simões - PSP Santarém

Quem quiser um exemplo do que é falar a direito, sem “rodriguinhos” nem “papas na língua”, leia o que segue. Declarações pão, pão, queijo, queijo de uma mulher que não gosta de “paninhos quentes” nem de conversa mole.

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Dora Coutinho que se focam num assunto de cada vez, enquanto nós mulheres tratamos de mil assuntos ao mesmo tempo”, pormenoriza. A capacidade de concentração num só assunto não parece fasciná-la porque nunca desejou ter nascido rapaz. “Adoro ser mulher, ter o prazer de ser mãe, sentir o pulsar do nosso filho dentro de nós é algo que é maravilhoso. Só por aqui já era impossível ter querido nascer rapaz. Nem mesmo quando aspiro a casa ou limpo o pó”, defende. No entanto há algo que inveja nos homens. “Não terem de fazer a depilação!!!” Quanto à igualdade de direitos considera que ainda vem longe e que as prejudicadas são as mulheres. “O género masculino fechou durante muito tempo a porta ao género feminino na ascensão a altos cargos de chefia, por medo, por preconceito. No seu pensamento o lugar da mulher, embora com inteligência e capacidades, teria que se dividir com as tarefas femininas, ou seja, sobrava-lhe menos tempo para cargos de chefia e a mulher deixava-se intimidar e também não arriscava. Hoje em dia, felizmente, que a sociedade está a mudar mas ainda há muita estrada para percorrer”. Nas horas livres Dora Coutinho gosta de passear com a família, caminhar e dançar. É uma defensora da cultura taurina e adepta do Sporting a nível futebolístico. Isabel Allende e Gabriel Garcia Marques são os seus escritores preferidos. Em termos musicais menciona David Bowie

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úcia Simões nunca teve pena de ter nascido rapaz e gosta de ser mulher. Sabe que cada homem é um homem mas acha que todos têm algo em comum e di-lo com todas as letras. “O traço comum é serem machistas, liberdades só para eles”. Sobre a igualdade entre homens e mulheres diz que nunca poderá existir porque homens são homens e mulheres são mulheres mas há coisas que podem ser diferentes. “A mulher em muitos casos ainda é vista como o ser mais fraco e, na minha opinião, nunca podemos ser iguais aos homens mas acho que em alguns assuntos a mulher é muito mais competente e dedicada” Sublinha ainda que na sua opinião as mulheres são mais protegidas a nível geral. Quanto à presença de mulheres na política diz que agora há mais que antigamente porque a sociedade deixou de considerar a política como algo só para homens e além disso as mulheres também deixaram de estar apenas concentradas na maternidade. Considera os “mimos” e as atenções que lhe são dispensadas como manifestações de cavalheirismo e acha que o cavalheirismo fica bem a qualquer homem. Em casa é ela que faz todas as tarefas domésticas. Interrogada sobre quem deve mandar em casa diz que é quem souber mandar. Considera que as mulheres em geral não pre-

Lúcia Simões cisam do sistema de quotas para entrarem na política e que não há qualquer razão para serem impedidas de ocupar lugares de chefia nas empresas ou nas organizações, desde que tenham competência e qualificações. Nunca foi a uma tourada e espera nunca ter de ir mas gosta muito de ir ao futebol. Costuma fazer passeios de jeep (todo o terreno) e sente-se bem a conviver à volta da mesa com amigos. Da sua lista de artistas constam nomes como Rita Guerra, The Doors, Paul Simon, Pink Floyd, Linkin Park,The Queens, entre outros. Gosta da poesia de Luís de Camões que, como é sabido, não se resume a Os Lusíadas

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“Nunca gostei de ficar para trás nem a brincar e os vestidinhos atrasavam-me” Cristina Santos - directora financeira da empresa municipal “Viver Santarém” Entre as respostas politicamente correctas e aquilo que pensa realmente diz que não hesitou. Diz que gosta de ver touradas embora sinta que não deveria gostar e que quando se trata de mandar em casa nem sempre impera o sistema democrático.

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ristina Santos é frontalmente contra a lei que obriga os partidos políticos a incluírem um terço de mulheres nas listas de candidatos. “Acho um princípio discriminatório perigoso para as mulheres pela ambiguidade que gera. Permite sempre a dúvida se a mulher está numa determinada posição por mérito próprio ou por aritmética e a simples possibilidade de existência desta dúvida não é aceitável para nenhuma mulher. Uma leitura atenta e séria da nossa Constituição teria resolvido a questão formal”, defende. Ainda sobre as mulheres e a política, a directora financeira da Viver Santarém diz que actualmente se não há mais mulheres na política é por opção delas. “Nos dias de hoje não há nenhuma razão que justifique este facto, excepto por desinteresse das próprias mulheres no desempenho das funções porque terão outras prioridades e objectivos de vida que não as motivam à disputa dos lugares”. Embora queira acreditar que já existe igualdade entre homens e mulheres em Portugal percebe que uma coisa é o seu desejo e outra a realidade e cita a recente divulgação de um estudo que indica que o valor dos salários das mulheres no nos-

Cristina Santos so país é, em média e para as mesmas tarefas, inferior ao dos homens. A única altura em que sentiu pena de não ser rapaz foi em criança. “Subir às árvores, andar de bicicleta ou jogar à bola de vestidinho fazia-me ficar para trás e nessas alturas senti que se fosse um rapaz ninguém me vestiria vestidinhos! Nunca gostei de ficar para trás, nem a brincar”. Actualmente já não tem qualquer inveja dos homens e até se sente uma privilegiada por ter nascido mulher. “A maior vantagem das mulheres em relação aos homens é o privilégio de podermos ser mães. Aparte a biologia, não reconhe-

“A maior vantagem das mulheres em relação aos homens é o privilégio de podermos ser mães. ço mais nenhuma característica que possa ser uma vantagem exclusivamente feminina”. Cristina Santos gosta de touradas à portuguesa e já assistiu a algumas e põe para trás das costas qualquer vontade que exista de ser “politicamente correcta”. “Reconheço que poderá ser um espectáculo controverso, até para mim é, mas a minha emoção numa boa lide a cavalo ou numa boa pega faz-me esquecer a controvérsia e aprecio o momento”, afirma. E também foge à resposta “politicamente correcta” quando interrogada sobre quem deve mandar em casa. “A resposta politicamente correcta seria que ninguém deve mandar e que deve existir partilha e equidade nas decisões mas na prática sabemos que existem momentos em que é necessário alguém assumir a liderança. Na minha casa gosto de pensar que sou eu que mando porque sou a mãe e é minha a maior fatia da responsabilidade, mas reconheço que nem sempre é assim. A maior parte das decisões são tomadas ou por acordo com os meus dois filhos adultos que vivem comigo ou porque um de nós persuade os outros dois”, explica. Termina as declarações para o inquérito com uma pitada de humor dizendo que estava à espera que O MIRANTE lhe perguntasse se sabia os números do próximo sorteio do Euromilhões com jackpot e que gostaria de responder afirmativamente

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comemorativa do 29º aniversário

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A maioria das pessoas analisa-se pouco. Não olha para dentro de si e não reconhece os seus defeitos. Não tem capacidade de pedir desculpa porque vive numa atitude de arrogância, procurando ser o centro das atenções.

Maria Castelo Morais

“É possível construir uma sociedade melhor dando um pouco mais de nós próprios” Maria Castelo Morais é arquitecta na Câmara de Coruche e faz voluntariado Tem uma energia contagiante e fervilha de ideias. Trabalha na Câmara Municipal de Coruche, cuida da família e faz voluntariado nas paróquias do concelho e no mosteiro do Couço. Diz que o facto de ser mulher nunca a inibiu nem lhe causou prejuízo. Lamenta que muitos trabalhadores se sintam desmotivados por não receberem a recompensa devida pelo que fazem.

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ada um pode fazer de cada momento da sua vida uma oportunidade de tornar o mundo melhor. É com base nesta convicção que Maria Castelo Morais, arquitecta, de 54 anos, a trabalhar na Câmara Municipal de Coruche dedica grande parte dos seus tempos livres ao voluntariado nas paróquias da Igreja Católica, naquele concelho. Maria Castelo Morais acredita que é possível melhorar o mundo se cada um der um pouco de si. “Actualmente a maioria das pessoas analisa-se pouco. Não olha para dentro de si e não reconhece os seus defeitos. Não tem capacidade de pedir desculpa porque vive numa atitude de arrogância, procurando ser o centro das atenções. Isso está a destruir a nossa sociedade. É por isso que temos que ser humildes e ter a capacidade de perceber que o mundo é composto das diferentes capacidades de cada um de nós”. A arquitecta tem quatro filhos, de 11, 18, 25 e 28 anos e acumula o trabalho na câmara com a vida familiar e o voluntariado. O marido faleceu há cinco anos vítima de um cancro no cérebro. Após o seu

desaparecimento Maria Castelo Morais encontrou apoio na comunidade católica de Coruche. No âmbito do seu trabalho de voluntariado um dos locais que visita com regularidade é o Mosteiro de Nossa Senhora do Rosário, no Couço. onde contacta com as oito monjas que ali vivem em clausura. Tomou conhecimento do local através de uma amiga que a convidou a ir lá assistir a uma missa. Maria Castelo Morais ficou tão encantada com o silêncio do local que nunca mais deixou de o visitar. O trabalho de voluntariado nas paróquias inclui a limpeza e a decoração das igrejas, preparando-as para as celebrações. Dá também algum apoio na Oficina de Artes de Coruche, onde a filha tem aulas de ballet. Actualmente está também empenhada num projecto que visa colocar um milhão

de portugueses a rezar pela paz e pela reconciliação, no âmbito do centenário das aparições de Fátima. “O objectivo do projecto é ensinar as pessoas a rezar em comunidade. Propusemos às irmãs fazer “Dezenas”, peças semelhantes a terços com dez Avé Marias e um Pai Nosso. Queremos que as pessoas rezem e que conheçam cada um dos mistérios do rosário. As imagens que vêm na “Dezena” correspondem ao respectivo mistério. Temos muitos voluntários envolvidos neste projecto, que é muito ambicioso”, explica. Maria Castelo Morais diz que o que mais detesta é a mentira. Também se irrita com a injustiça. “Fico revoltada quando, por exemplo, faço o meu trabalho o melhor que sei e posso e alguém o critica sem o conhecer. Sem saber o que está ali feito. Fico revoltada com esses juízos su-

perficiais. E o pior é quando eles são publicados. Uma coisa que detesto é o Facebook porque há comentários que são dispensáveis. Entristece-me e horroriza-me o que costumo ver e ler. É mau demais”, desabafa. A mãe da arquitecta era de Coruche e o pai de Montemor. Parte da sua infância foi passada em Vendas Novas. Teve formação num colégio salesiano até aos 15 anos, frequentou o liceu em Setúbal e entrou na faculdade de Belas Artes para tirar arquitectura. “Sempre gostei muito de pensar o espaço onde vivo. De pensar o espaço urbano comunitário e de desenhar. Gosto de criar espaços comunitários. Sempre foi a minha grande vertente. De início a minha mãe não concordou com a minha escolha e manteve-se reticente. Mais tarde acabou por apoiar-me mas foi difícil convencê-la”, recorda. Trabalhou num ateliêr em Lisboa, deu aulas de geometria descritiva, educação visual e desenho e depois do pai falecer herdou uma propriedade em Coruche, acabando por se mudar para lá. Começou a trabalhar na câmara municipal há 25 anos e é hoje chefe de divisão de espaços públicos, ambiente e energia. “Sou uma mulher que nunca páro”, diz. Maria Castelo Morais diz que actualmente é difícil motivar as pessoas porque muitas estão descontentes com a sua situação laboral. “Elas sabem que estamos a trabalhar para a comunidade. Entendem isso mas têm sido muito penalizadas em termos de progressão na carreira e em termos de salários”, refere. O facto de ser mulher nunca foi motivo para ser discriminada pelos superiores ou afrontada pelos subordinados. “Quem está a chefiar tem que ser competente. Não interessa se é homem ou mulher. Não tem a ver com o sexo. Tem a ver com a pessoa em si e as suas capacidades. Para mim haver o Dia Internacional da Mulher só por si é uma discriminação. Sendo iguais não devíamos de ter dia da mulher. Quanto muito podíamos celebrar o dia da pessoa, tal como festejamos o Dia do Trabalhador, por exemplo”

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“Oiço com a mesma atenção as críticas positivas e as críticas negativas” Vera Rufino - Secretária da Junta de Azinhaga e administrativa numa empresa privada

Lutar pelos direitos das mulheres e pela sua igualdade em termos salariais e de oportunidades é lutar por uma sociedade mais justa e equilibrada. É lutar pelo bem de todos.

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igualdade entre homens e mulheres em Portugal existe mas como em muitos outros casos existe apenas na lei. Na prática ainda estamos longe de isso acontecer. A opinião é de Vera Rufino, secretária da Junta de Freguesia de Azinhaga (Golegã) e assistente administrativa na empresa Manuel de Castro Tavares Veiga, é complementada quando se lhe pergunta o que fazer em favor das mulheres. Para ela a defesa da igualdade de género passa por uma equiparação efectiva dos direitos e deveres de todos. Melhorando a situação das mulheres a todos os níveis - laboral, remuneratório, social, entre outros -, o país estaria a construir uma sociedade mais justa e solidária. É contra a lei da paridade que obriga os partidos a incluir uma percentagem de mulheres na lista de candidatos porque considera que as mulheres merecem ser reconhecidas pelas suas qualidades e não por imposição legal e quando se lhe pergunta a razão para as mulheres continuarem a ser preteridas para cargos de chefia responde com frontalidade. “Se não beneficiassem tanto os homens talvez as mulheres chegassem a esses cargos”. Quando aceitou integrar uma lista para

Vera Rufino

A defesa da igualdade de género passa por uma equiparação efectiva dos direitos e deveres de todos. as eleições na Azinhaga ouviu elogios e críticas. Em relação às últimas diz que também as ouviu com atenção mas que o que valeu foi a sua escolha feita de uma forma livre. Vera Rufino não encontra um traço comum à maioria dos homens. Para ela são todos diferentes. Em relação às mulheres, embora também ache que cada uma tem a sua própria personalidade, considera que têm uma característica comum que é a intuição. Gosta das canções de Rui Veloso e adora os livros de Nicholas Sparks. “São muito cativantes, prendem-me de tal forma que não descanso enquanto não chego ao fim”, confessa. “Tem algum receio das touradas e na primeira a que assistiu o coração parece que lhe ia saltar do peito mas diz que é um espectáculo de que gosta. Tal como de largadas de toiuros por sentir que fazem parte das suas raízes ribtejanas

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comemorativa do 29º aniversário

“Se numa selecção é perguntado a uma mulher se pensa ter filhos isso é discriminação” Filipa Martinho - Delegada da Administração do ISLA Santarém

Considera-se uma líder, não só por ser determinada, persistente e auto-confiante mas porque já deu provas suficientes para lhe ser confiada a liderança de uma instituição de ensino como o ISLA Santarém.

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ilipa Martinho é Mestre em Psicologia e Pós-Graduada em Gestão, Doutoranda em gestão e Delegada da Administração do Isla Santarém. Considera-se uma líder e diz que o facto de estar à frente da escola é fruto de vários anos de dedicação e trabalho. Gosta de planear os seus dias e gosta sobretudo de não se afastar daquilo que planeou. O facto de ser uma mulher realizada e cujas competências e qualidades são reconhecidas não a faz esquecer que essa não é a regra. “Infelizmente, considero que ainda não existe igualdade entre homens e mulheres. Por exemplo, é visível em coisas básicas como a forma como as mulheres são discriminadas no recrutamento e selecção para as empresas quando são feitas questões do tipo: ‘Pensa ter filhos?’. Deste modo acho que ainda há um grande trabalho a fazer na mudança de mentalidades”, defende.

Filipa Martinho Determinada, persistente e auto-confiante, qualidades que considera fundamentais para conseguir ser líder, Filipa Martinho considera que é a personalidade de cada um que acaba por influênciar as suas escolhas e o seu percurso de vida embora também seja fundamental a educação que se recebe. A delegada da administração do ISLA Santarém diz que o facto de haver poucas mulheres em cargos políticos importantes tem a ver com a forma como são vistas pela sociedade em geral. “(...) As mulheres ainda não são vistas socialmente com capacidades para cargos de poder político, fruto da forte discriminação que ainda existe na socie-

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dade portuguesa”, diz. Embora cada mulher e cada homem sejam únicos, arrisca dizer que, de um modo geral, os homens têm tendência a ser mais racionais e as mulheres mais criativas, organizadas e versáteis. Quando recebe “mimos e atenções” parte do princípio que isso é sinónimo de consideração e reconhecimento, pois a capacidade de trabalho deve ser avaliada independentemente do género. Em casa defende que deve existir alguém que lidere as actividades/tarefas e que as mesmas devem ser executadas por todos mas não dá muita importância à percentagem de trabalho realizada por cada um dos elementos da família. “Penso que não podemos falar em percentagem, mas sim em tipos de actividades que são tendencial-

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mente realizadas por mim enquanto mulher”, explica. Gosta de ler, ouvir música e viajar. Os seus escritores preferidos são José Rodrigues dos Santos “numa vertente de ficção, permite-nos, com as suas obras, sair um pouco da realidade do dia-a-dia” e Daniel Sampaio. “Numa vertente profissional, como psicóloga de formação, considero que é um profissional de reconhecido mérito no nosso país”, realça. Na área da música destaca U2, Bryan Adams, Ana Carolina e Ana Moura, embora oiça outros géneros musicais de acordo com o seu estado de espírito no momento.

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Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE “Não é impossível conciliar a vida profissional com a maternidade. É exigente. Claro que agora é mais fácil do que quando eram mais pequenos”, diz, garantindo que não existem truques. “Vou gerindo o dia-a-dia de acordo com as prioridades”, assume. mação. Temos uma base de dados muito bem estruturada e uma grande experiência e isso é uma mais valia”, explica.

Dulce Silva

O tempo dá para fazermos tudo aquilo de que gostamos desde que seja bem gerido Dulce Silva é responsável pelo Departamento de Qualidade da Central de Cervejas Dulce Silva é uma mulher de gestos calmos, voz doce e sorriso genuíno. Os colegas reconhecem-lhe uma grande capacidade de gerir o seu tempo. Responsável pelo Departamento de Qualidade da Central de Cervejas, em Vialonga, concelho de Vila Franca de Xira, dirige uma equipa de 16 pessoas, é mãe de três adolescentes e ainda encontra tempo para costurar, fazer caminhadas e voluntariado.

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á vinte e dois anos recebeu um telefonema da Central de Cervejas a convidá-la para fazer um estágio. Aceitou, gostou e agora dirige o Departamento de Qualidade de uma grande empresa que emprega 800 trabalhadores, em Vialonga, Vila Franca de Xira, quarenta por cento dos quais são oriundos da região. A empresa faz parte do Grupo Heineken e, além da Cerveja Sagres, produzem também a Água do Luso e a Heineken, entre outros produtos. “Sou de Beja e por ‘culpa’ de uma professora de Química, apaixonei-me pela disciplina, apesar de também gostar muito

de Matemática”, começa por dizer. Nem 18 anos tinha quando chegou à capital para tirar a licenciatura em Engenharia Química, no Instituto Superior Técnico. Um colega deu o contacto de Dulce Silva ao responsável pelos estágios da Central de Cervejas e foi como cumprir uma profecia: “Recordo-me que durante o curso fizemos uma visita a esta empresa e eu pensei que seria muito interessante um dia vir a trabalhar aqui”. Acertou na “mouche”. Morou durante algum tempo em Loures, após o casamento, mas actualmente reside em Lisboa. “Em dias sem trânsito, em dez ou quinze minutos estou no trabalho”, revela. Gosta de chegar cedo, “por volta das oito da manhã”, para começar a planificar o seu dia. Aliás, “planeamento” é um dos segredos do seu sucesso, quer na vida profissional como familiar. “Vejo os e-mails e faço o ponto da situação antes de começar a rotina do dia”. Consegue “sair” do trabalho às seis da tarde, apesar de, com a Internet, acabar por estar “sempre disponível”. “Não é impossível conciliar a vida profissional com a maternidade. É exigente. Claro que agora é mais fácil do que quando eram mais pequenos”, diz, garantindo que não existem truques. “Vou gerindo o dia-a-dia de acordo com as prioridades”, assume.

Com a Teresa, a filha mais velha, de 19 anos, partilha a paixão pelo Benfica: “Sofro um bocadinho com o futebol, vou comemorar sempre as vitórias e o prognóstico para este ano é que vamos ganhar o Campeonato, claro”, diz a sorrir. O Tiago, de 16 anos, e o Tomás, de 13, estão do lado do pai e são do Sporting. Nada que Dulce Silva não consiga gerir, afinal porque, diz com humor: “O Benfica é sempre o melhor”. Na porta de um dos armários do seu gabinete, tem colada uma fotografia ao lado da filha, ambas com o cachecol encarnado das águias. Além do trabalho na Central de Cervejas, Dulce é também auditora do laboratório da Heineken, o que lhe confere mais responsabilidade mas também lhe proporciona uma experiência que considera valiosa. “Pertencer a um grande grupo permite que tenhamos acesso a muita infor-

“Gosto muito de estar no terreno” Como a Qualidade abrange todas as áreas da empresa, Dulce Silva acaba por estar em contacto com a maior parte dos trabalhadores da Central de Cervejas, que é justamente aquilo que mais aprecia no seu trabalho: “Gosto muito de estar no terreno, aprende-se muito”, revela. As amizades fazem-se também no refeitório, onde almoça na companhia dos colegas de laboratório ou “com quem lá esteja”, uma vez que o “ambiente é muito bom”. No distrito de Santarém a cidade que mais lhe agrada é Tomar. Também gosta de certas zonas em que a natureza se exibe em grandeza e é uma adepta da gastronomia da região. Aos fins-de-semana descontrai quando faz caminhadas com a família, vai almoçar fora ou simplesmente passeia. Embora Dulce Silva não o tenha referido, O MIRANTE sabe que outra das suas ocupações é de carácter social. A responsável pelo Departamento de Qualidade da Central de Cervejas faz voluntariado na Refood – uma associação que recolhe alimentos para pessoas carenciadas. Parece difícil conciliar tanta coisa. Para o fazer diz que o essencial é a vontade. “Digo sempre isto e tento transmiti-lo aos meus filhos: devemos lutar por aquilo que gostamos, independentemente do esforço que isso envolva”. “Sou eu que faço a minha própria roupa” Há dez anos uma amiga convidou-a para experimentar a costura. “Começámos por fazer umas toalhas de praia e agora já conseguimos fazer outras coisas”. Têm até uma página no Facebook, que Dulce Silva não quis revelar. Aos sábados de manhã frequenta um curso de costura e já fez casacos, calças e camisas. “Agora sou eu que faço a minha própria roupa”, revela

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Edição comemorativa do 29º aniversário | O MIRANTE Para a jovem árbitra “as mulheres são mais organizadas, mais profissionais e mais delicadas”.

O machismo está vivo e infelizmente vai demorar muito tempo até desaparecer

Rita Marques

Rita Marques, jovem árbitra de Tomar vai acompanhar final da Taça de Portugal Tem 16 anos, é de Tomar e é árbitra de futebol. Foi escolhida para acompanhar a equipa de arbitragem que vai dirigir a final da Taça de Portugal desta época. A sua experiência de vida, tanto no desporto como no seu dia-a-dia leva-a a concluir que o machismo está vivo e que ainda vai passar muito tempo até haver igualdade entre homens e mulheres.

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s homens árbitros sabem bem o que é serem insultados, enxovalhados e até agredidos fisicamente. Ana Rita Marques, uma jovem estudante de Tomar que é árbitra de futebol, sabia disso quando decidiu ter a actividade que tem nas horas vagas mas não hesitou. Confessa que a última vez que sentiu as pernas a tremer nem sequer foi num jogo mas quando foi escolhida para acompanhar a equipa de arbitragem que vai dirigir a final da Taça de Por-

tugal deste ano. Estudante do 11º ano na área de Humanidades e ainda sem saber o curso que irá escolher quando for para a universidade, diz que se sente especial por ser mulher e considera que muitos homens ainda revelam características machistas, olhando para as mulheres como seres inferiores, embora já não tanto como antigamente. Ana Rita Marques sente esse tipo de comportamento em alguns jogos de futebol em que integra a equipa de arbitragem. “És muita boa!”; “Quero o teu facebook”; “Vamos beber um copo?”; “O que eu fazia contigo...”, são algumas das expressões mais suaves, refere. O pai de Ana Rita Marques não aprecia muito o facto de ela andar no mundo do futebol. Antigo dirigente de um clube acha que aquilo não é para mulheres. “O meu pai não gosta de estar na bancada e ver a filha dentro do campo a ouvir certas bocas, é complicado para ele”, explica. A primeira vez que Ana Rita Marques entrou num campo foi como fiscal de linha num jogo de juvenis na Chamusca. O pai

estava presente e durante todo o jogo teve atrás de si um velhote que ia dizendo coisas como: “Esta árbitra tem um grande rabinho. É muito gira. Não me importava nada de dar umas voltinhas com ela”. Ana Rita Marques não gosta mas não desmoraliza. Confessa que só fica desanimada e com vontade de desistir quando algum jogo lhe corre muito mal. O pior tem sido “a falta de balneários femininos”, explica. Normalmente nunca vai uma equipa de arbitragem totalmente feminina e então têm que estar à espera que os árbitros tomem banho para depois poderem ficar à vontade. A jovem também se quei-

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xa dos equipamentos fornecidos pela associação. “Normalmente são sempre XXL e como temos o corpo mais fininho, quando nos equipamos parece que estamos dentro de uns balões”. O namorado de Ana Rita Marques também é árbitro mas as conversas entre eles raramente são sobre arbitragem. “Preferimos falar de coisas românticas”, diz. As discussões são raras e nunca terminaram com amostragem de cartões, nem sequer amarelos. Para a jovem árbitra “as mulheres são mais organizadas, mais profissionais e mais delicadas”. Segundo ela, a explicação para não haver mais mulheres no poder ou em cargos de chefia reside no facto de a sociedade ainda pensar que os homens têm mais capacidades para liderar. Ana Rita Marques diz que ainda falta muito tempo para existir uma verdadeira igualdade entre mulheres e homens, mesmo nos países ocidentais. Quanto a mandar em casa, ao trabalho doméstico ou à educação dos filhos tem ideias próprias. “Quem deve mandar em casa devem ser os dois como acontece em casa dos meus pais.” E é também o exemplo dos pais que dá para a repartição das tarefas domésticas. “Muitas vezes é o meu pai que faz o jantar, mete a roupa a lavar e a secar. É por isso que eu digo que ele é o melhor pai do mundo”. Quanto à educação dos filhos acha que há uma tentação muito grande dos pais serem mais protectores com as raparigas porque sabem que os homens muitas vezes são pouco delicados com as mulheres. Nos tempos livres Ana Rita Marques gosta de ouvir música, de estar com os amigos e, como não podia deixar de ser, de ver jogos de futebol

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“A igualdade consiste em tratar de igual forma o que é igual e de diferente forma o que é diferente” Irina Lopes Pinto - Comandante do Destacamento de Torres Novas da GNR Quem comanda o Destacamento de Torres Novas da GNR é uma mulher. Perguntarlhe algo sobre igualdade de oportunidades entre homens e mulheres merece uma resposta à altura que está resumida na frase que dá título a este texto.

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rina Pinto nunca sentiu pena de não ser rapaz nem acha que tal facto por si só fosse vantajoso ou desvantajoso para si. Também não encontra nenhum traço comum nos homens ou alguma particularidade que dê qualquer tipo de vantagem às mulheres, seja em termos sociais ou profissionais. Para a oficial da Guarda Nacional Republicana, em Portugal existe uma efectiva igualdade entre homens e mulheres. “Sim, acho que há igualdade entre homens e mulheres. Refiro isto porque a igualdade consiste em tratar de igual forma o que é igual, e de diferente forma o que é diferente, dentro da medida dessa

Irina Lopes Pinto diferença”, explica. Comentando o facto de não haver muitas mulheres em lugares de destaque na política diz que isso só acontece porque não há mulheres interessadas em candidatar-se a eles. “Segundo a minha percepção, a carreira política não tem sido a escolha preferencial das mulheres”, refere. Não considera que “mimos” ou atenções sejam uma forma de ser elogiada por algo positivo que tenha feito. “Na vi-

da profissional, receber mimos e atenções nunca poderá ser forma de manifestar o reconhecimento do valor de uma mulher ou homem. Há outras formas de o fazer que tanto se aplicam a mulheres como a homens”. Habituada a comandar diz que em casa de cada família não deve haver comandantes. “As pessoas que coabitem numa mesma casa têm de funcionar em equipa”, sintetiza. Quanto à divisão das tarefas domésticas defende que não seja feita matematicamente mas com bom senso. “Em casa faço o que a minha disponibilidade me permitir fazer e o mesmo acontece com as pessoas que coabitam comigo”. Irina Pinto confessa que nunca assistiu a uma tourada ou a um jogo de futebol

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ao vivo. Nas horas vagas dedica-se à confecção de bolos decorados e às artes. “No campo da pintura gosto em particular do movimento do impressionismo e do pintor Claude Monet devido à técnica utilizada e resultado final das obras. No campo da literatura, como nunca parei de estudar, só tenho lido livros técnicos da área do Direito”, declara

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Misericórdia de Santarém constrói futuro sustentado!

A caminho da apresentação à Assembleia da Irmandade do Plano de Atividades e Orçamento para 2017, podemos afirmar que o futuro foi cuidadosamente pensado e planeado para que a Misericórdia de Santarém continue na senda da intervenção de qualidade que a carateriza. Ao longo dos anos, todos nos habituámos a olhar para esta Instituição penta secular com a atenção de quem espera uma resposta adequada e consentânea com a satisfação das necessidades das Pessoas que a procuram, por isso a responsabilidade acrescida na construção de um futuro seguro, que interpela Todos os que trabalham, colaboram e gerem esta Casa. O tempo que vivemos é de mudança, tal como em 1500, ano da fundação da Misericórdia, hoje continuamos a visar ser uma instituição de referência pela qualidade a nível local mas também nacional e transnacional é por esta razão que se mantem a aposta no trabalho em parcerias europeias que a partir de 2016 se alargaram a outros continentes, caso do Projeto EDU-ACTION, em que para além de Portugal representado pela Santa Casa da Misericórdia de Santarém, participam a Itália, a Bolívia, a Hungria, a Índia e o Senegal, todos em conjunto para aprender e divulgar metodologias trabalho que permitam diminuir o abandono escolar precoce, para alem de podermos divulgar a nossa Instituição, a nossa cidade os nossos parceiros e ainda o nosso País. Crescemos, mas sobretudo desenvolvemo-nos, fruto do trabalho de muitos e do apoio da Comunidade que se mantem solidária para com os projetos que abraçamos, caso da Feira de Outono realizada no dia 28 de outubro, nos Claustros do Convento de Nossa Senhora do Sitio e cujo objetivo foi o de melhorar as instalações do Centro de Atendimento e Acolhimento Social. Queremos manter o que de melhor fazemos, trabalhar para e com as Pessoas por isso a importância de estarmos atentos ao real envolvente, continuar a aposta na Formação Profissional, com o selo de certificação da DGERT partilhando o que fazemos com os nossos parceiros cujo reconhecimento nos desafia à melhoria contínua. O reconhecimento do valor do trabalho desenvolvido remete-nos para o nosso Plano de Atividades, para o compromisso deste com o futuro e a sua sustentabilidade. A Misericórdia de Santarém apresenta-se perante a Comunidade com a humildade que se traduz num processo de aprendizagem contínua e de resposta pronta mas sustentada face aos princípios e valores que a regulam. Aguardamos por 2017, certos de que as dificuldades não nos paralisam, antes desafiam-nos a fazer melhor em cada dia!

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