A cultura da escola e a formação docente

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A CULTURA DA ESCOLA: UM ITEM TRANSVERSAL NA FORMAÇÃO DOCENTE “Se modificar o professor envolve modificar a pessoa que ele é, precisamos saber como as pessoas se modificam. Nenhum de nós é uma ilha; não nos desenvolvemos em isolamento. Nosso desenvolvimento dá-se através de nossas relações, em especial aquelas que estabelecemos com pessoas importantes para nós. (...) Se em nossos locais de trabalho há pessoas que são importantes para nós e estão entre aquelas por quem temos consideração, elas terão uma enorme capacidade para, positiva ou negativamente, influenciar a espécie de pessoas e, por conseguinte, a espécie de professores que nos tornamos.” (FULLAN, 2000)

As questões que este artigo pretende focar em relação aos programas de formação são: Que tipo de comunidades de trabalho são mais adequadas ao desenvolvimento profissional? Em que tipo de cultura o professor precisa estar inserido para que tenha disposição para aprender? Que tipo de relações devem ser estabelecidas para que o professor se sinta motivado e seguro? Quando perguntamos que tipo de comunidade de trabalho favorece o desenvolvimento do profissional reflexivo e que tipos de relações devem prevalecer, logo pensamos na questão do “isolamento” do professor em seu ambiente de trabalho. De certa forma, esta é uma característica predominante nas escolas há muito tempo. Fatores como a falta de tempo, a sobrecarga de trabalho e até mesmo a forma como as escolas estão organizadas espacialmente, interferem negativamente para perpetuar esta situação. Neste sentido, uma força poderosa que alavanca as mudanças é justamente quando há uma tomada de consciência da necessidade de superação deste estado e um esforço para que esta prática deixe de ser solitária e passe a ser solidária. Fullan utiliza uma expressão interessante para definir o movimento de transformação que tem ocorrido nas escolas, denominado de “pensamento de grupo”. O estabelecimento desta nova atitude pressupõe conversas freqüentes entre os professores sobre a prática de ensino e a criação de uma linguagem comum; observarem-se mutuamente enquanto ensinam, planejar, avaliar, estudar, pesquisar e preparar juntos diferentes materiais. Esta é uma questão complexa, pois envolve uma mudança pessoal por parte dos professores, uma vez que é preciso sair do isolamento e aventurar-se para a experiência coletiva; e para as instituições, visto que é preciso rever padrões e reorganizar rotinas previamente estabelecidas, a fim de se conquistar este ambiente coletivo. Neste contexto, as ações formativas, quer sejam desenvolvidas por formadores externos, ou pelos profissionais da própria escola, se constituem em elementos favoráveis, pois pressupõem a

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formalização destes encontros, o intercâmbio e a colaboração entre professores e demais profissionais e fortalecem o próprio movimento de mudança, que lhes são peculiares. “O principal benefício da colaboração é sua capacidade de reduzir a sensação de impotência dos professores e aumentar sua sensação de eficiência.” ( Ashton & Webb. 1986. in. Fullan.2000)

A construção de uma cultura colaborativa e solidária é muito complexa. É um processo longo, que envolve lutas de força, de poder, dentro e fora da escola, já que esta é um produto da sociedade. Há também, contudo, muitos fatores favoráveis para que esta mudança ocorra. Em muitas situações, o clima institucional interfere tanto na produtividade do trabalho, que este movimento emerge dos próprios professores, que buscam uma qualidade melhor nas suas relações profissionais.

Segundo Fullan

“ensinar sempre será um trabalho exaustivo; os professores estão envolvidos em centenas de interações, em circunstâncias potencialmente geradoras de tensão. A todo o momento você tem um contato bastante íntimo, dia-a-dia, com um grande número de crianças e jovens, em uma sociedade bastante complexa; tudo isso é um desafio mesmo para os professores mais dinâmicos. Há, no entanto, dois tipos de exaustão. Uma delas decorre de batalhas solitárias e de esforços não-valorizados, de perda de referenciais e de sentimentos corrosivos de desesperança, levando o professor a acreditar em sua incapacidade em fazer diferença. O outro tipo é aquele cansaço que é parte do trabalho duro, que significa ser um elemento de uma equipe, um reconhecimento cada vez maior de que você está engajado em uma luta cujo esforço é válido e um reconhecimento de que aquilo que você faz acarreta uma diferença fundamental ao colega desencorajado ou ao aluno revoltado.” Assim, concluímos que a cultura instaurada na escola faz muita diferença quando pensamos no profissional comprometido com sua qualificação.

Um dos maiores desafios de um programa de formação é exatamente instaurar na escola o que Rosenholtz denomina de “escolas em movimento” ou “enriquecidas em termos de aprendizagem”. Estas são escolas onde predomina esta cultura da cooperação, pois mesmo os professores mais experientes acreditam que ensinar é difícil e, portanto, jamais podem parar de aprender a ensinar. Nestas escolas, as relações de poder são mais horizontais, pelo menos no que se refere à tomada de decisões, que deixam de ter uma conotação de imposição e passam a ser consideradas como ajustes necessários ao desenvolvimento do trabalho coletivo. Desta forma, o professor passa a

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ter uma visão mais ampla da escola e das questões que extrapolam os limites da sala de aula. Isso envolve a ampliação e valorização do processo de liderança compartilhada, em que as questões da instituição são discutidas e analisadas coletivamente, em que os professores passam a participar das decisões e das reflexões que orientam os “caminhos” da instituição. Esta atitude não significa uma ameaça aos diferentes papéis desempenhados pelas pessoas, mas uma redefinição da forma como as decisões são tomadas e os problemas são resolvidos.

Portanto, os Programas de Formação de Professores devem ter como meta “transversal” a instauração ou fortalecimento desta cultura na escola, a fim de que se torne cada vez mais um espaço propício para a aprendizagem. Para isso, é necessário compreender a cultura que foi construída em cada instituição, seus valores, formas de funcionamento e, numa relação de parceria, modelada pelas atividades do programa e pelas ações do formador, “provocar” reflexões que repercutam positivamente neste modelo de escola como “uma instituição que aprende”. Uma das grandes contribuições deste modelo de formação para a instauração de uma cultura mais democrática e que propicia a aprendizagem é justamente a possibilidade de reconhecer que o profissional de educação é um eterno aprendiz, que os saberes são transitórios e por isso são transformados, assim como a própria sociedade. Como parte da sociedade, a escola também se movimenta para enfrentar os desafios inerentes a todo processo de mudança. “A formação é um elemento de desenvolvimento pessoal e profissional do professor, mas ela também faz parte do investimento da instituição escolar em seu capital humano. Passar de uma concepção individual da formação para a de um investimento institucional significa conciliar imperativos individuais e projetos de grupo; significa considerar a formação como um co-investimento no âmbito do desenvolvimento do projeto do estabelecimento.” (PERRENOUD, 2001)

Isto pode ser feito nos encontros com a equipe de professores, coordenação e direção, na reflexão sobre os papéis dos demais funcionários da escola, na elaboração compartilhada de documentos curriculares, na criação de centros de estudo, na construção de um vínculo de confiança entre os profissionais e os formadores, enfim, nas relações interpessoais, que extrapolam a dimensão profissional e valorizam o professor como uma pessoa integral. “A formação do professor deve ser pensada levando-se em consideração a importância que esta atividade tem do ponto de vista da formação dos seres humanos.” Alícia Fernández

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Mônica Samia é Coordenadora da Linha de Formação de Educadores e Tecnologias Educacionais da Avante – Educação e Mobilização Social/ONG, em Salvador. E-mail: monicasamia@avante.org.br

RREEFFEERRÊÊNNCCIIAASS BBIIBBLLIIO OGGRRÁÁFFIICCAASS BRASIL.MEC. Secretaria de Educação Fundamental. Referenciais para formação de professores. Brasília: Sec. Ed. Fund. 1999 . FULLAN, Michael & HARGREAVES, Andy. A escola como uma organização aprendente. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. PERRENOUD, Philippe. 10 novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. _ . Formando professores profissionais. Porto Alegre: Artes Médicas, 2001. _ . A prática reflexiva no ofício de professor: profissionalização e razão pedagógica . Porto Alegre: Artes Médicas, 2002.

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