Isabél Zuaa, do Zambujal para Um Animal Amarelo [PT]

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Isabél Zuaa, do Zambujal para Um Animal Amarelo publico.pt/2020/10/15/culturaipsilon/noticia/isabel-zuaa-zambujal-animal-amarelo-1935216 Rui Gaudêncio

Cinema

A actriz portuguesa tem feito carreira sobretudo no Brasil, narra o filme de Felipe Bragança que se estreia esta quinta-feira e lhe valeu um prémio de Melhor Actriz no Festival de Cinema de Gramado, em Rio Grande do Sul.

Foto Isabél Zuaa foi Melhor Actriz no Festival de Cinema de Gramado, em Rio Grande do Sul, no Brasil e Melhor Actriz na categoria de curtas-metragens com "Deserto Estrangeiro"

Isabél Zuaa é Catarina em Um Animal Amarelo, de Felipe Bragança, que se estreia esta quinta-feira no Cinema Ideal, em Lisboa, e no Cinema Trindade, no Porto. É ela quem narra o filme inteiro, apesar de demorar algum tempo a aparecer em carne e osso, no papel de uma “vilã com princípios”, como descreve a actriz, que lidera um grupo de moçambicanos que usam o protagonista, um realizador brasileiro, para poderem vender pedras preciosas. Foi esse papel no filme que fechou a edição deste ano do IndieLisboa que valeu a Zuaa, que nasceu em Lisboa em 1987 e cresceu no Zambujal, Loures, a ver filmes com Eddie Murphy e Whoopi Goldberg e a ver as telenovelas da Globo, o prémio 1/4


de Melhor Actriz no Festival de Cinema de Gramado, em Rio Grande do Sul, no Brasil — no mesmo festival, foi também premiada como Melhor Actriz na categoria de curtasmetragens, graças a Deserto Estrangeiro, de Davi Pretto​. Tem sido sobretudo no Brasil, para onde foi acabar os estudos em 2010 e por lá foi ficando até 2016, quando passou a dividir o tempo entre o Rio de Janeiro e Lisboa, que Zuaa tem feito carreira. Em Portugal tem aparecido sobretudo em teatro, em espectáculos como Moçambique, da mala voadora, que aconteceu quando o colega de elenco (que também já a dirigiu em curtas-metragens) Welket Bungué a convenceu a voltar a Portugal, tendo também trabalhado com Tiago Vieira, ou séries de televisão como Sul. Mas quer trabalhar mais por cá. Por lá, há quem pense que Isabél Zuaa é brasileira. A actriz portuguesa, filha de pai guineense e mãe angolana, cresceu rodeada de várias culturas, a dançar e a cantar em grupos desde os cinco anos, e passou uma parte dos anos 1990 a ensaiar com as amigas e primas canções de Toni Braxton, Whitney Houston ou Tracy Chapman, na possibilidade, que nunca chegou, de os pais as inscreverem no Chuva de Estrelas, o concurso de talentos da SIC. A facilidade de mudar de sotaques tem, conta ao PÚBLICO por telefone, “que ver com o facto de ser filha de africanos e ter nascido em Portugal, ter sido criada com brasileiros e pessoas de fora daqui, apanhar os sotaques e brincar, de achar o sotaque uma coisa boa, não pejorativa, e de cantar”.

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A crescer, queria ser jornalista, cobrir zonas de guerra, sempre de uma perspectiva humanitária. Ficou-se pela representação, onde também consegue abordar um pouco esses temas. Antes de ir para o Brasil, passou pelo Chapitô, onde foi encorajada pela professora brasileira Gina Tochetto a prosseguir para o Conservatório. Lá, aprendeu “a estar à vontade com o meu corpo, as minhas palavras, aprender, conhecer, ver mais filmes e outros filmes e mais espectáculos de teatro”, mesmo explicando que a formação “dá preferência a corpos brancos, principalmente os masculinos”, foi e é “muito amada e respeitada” por lá.

Africanidade no nome No Brasil, deu aulas de dança e começou a apresentar-se a solo, algo que ainda não fez por cá. “Precisava de um país onde pudesse actuar, representar e interpretar logo”, menciona. Fala em espectáculos a solo que apresentou e começou a escrever em nova, e que ainda não mostrou cá, apesar de Aurora Negra, o espectáculo com Cleo Tavares e Nádia Yracema que se estreou no D. Maria II, em Lisboa, em Setembro, ter alguns pontos em comum com eles. De duas curtas-metragens que tinha feito em Portugal foi notada por Marcelo Gomes, que procurava alguém para o filme Joaquim, de 2017. Na altura, ainda não tinha decidido chamar-se “Isabél Zuaa”, e o realizador achou que, também por ela ter cabelo diferente nas duas curtas, era duas pessoas diferentes. “Usava o meu último nome, Martins, e não achava que combinava. Iam achar que uma actriz portuguesa com esse nome era branca”, e ela queria trazer a sua africanidade para o nome, algo que conseguiu juntando os nomes das suas avós, “Isabél” e “Zuaa”. “São os meus nomes e trazem a personalidade toda que tenho destas duas senhoras”, continua. Seguiu-se As Boas Maneiras, de Marco Dutra e Juliana Rojas, um filme de 2017 que é, ao mesmo tempo, um drama social, um musical e um filme de terror com lobisomens. Estes projectos foram dando origem a outros, no cinema, na televisão e nos palcos. Tem, na página de IMDb, vários projectos em pós-produção, anunciados ou por sair. Num desses filmes, O Novelo, de Cláudia Pinheiro, faz de uma mãe que envelhece ao longo do filme. “Quero trazer outros lugares em mim, não ser só a revoltada, a justiceira ou a vilã com princípios”, refere. Faz consultoria em filmes de outras pessoas para os distanciar dos estereótipos das personagens negras — “temos contradições, somos múltiplos e diversos, não faz sentido representarem-nos e representarmos um povo, os corpos não-brancos representam sempre a sua comunidade, os brancos não têm a responsabilidade de representar todos”. Quer continuar a fazer curtas-metragens, um formato de que gosta particularmente, e também realizar, tendo já escrito guiões (fruto do trabalho no Brasil, refere-se a eles como “roteiros") para uma longa e uma série.

@ 2020 PÚBLICO Comunicação Social SA

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