Entrevista a Pedro Santo, um dos criadores de Bruno Aleixo: este filme é “um Scrooge à maneira do Al

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Entrevista a Pedro Santo, um dos criadores de Bruno Aleixo: este filme é “um Scrooge à maneira do Aleixo”

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O Natal do Bruno Aleixo é o novo filme de Pedro Santo e João Moreira, os criadores de uma das personagens portuguesas mais enigmáticas de sempre da história do entretenimento e humor português. Mesmo com a estreia marcada para dia 22 de dezembro, o Espalha-Factos não podia perder a oportunidade de falar com Pedro Santo sobre a criação e a produção deste filme.

De relembrar que em janeiro de 2020 foi lançado o primeiro filme. O Filme do Bruno Aleixo foi um sucesso no cinema português, ao ponto de a produtora querer logo fazer outro filme da autoria de Santo e Moreira.

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Pedro Cardoso 23 de dezembro de 2022

O que fez querer fazer este filme? De onde é que surgiu a ideia de fazer um “Natal do Bruno Aleixo”?

Olha, a ideia não é muito glamorosa. Nós quando acabou o outro filme, ali na ressaca, aquilo estava a correr bem para o filme que era, era um filme pequeno, tanto o anterior como este. A produtora O Som e a Fúria começou logo a falar na hipótese “epa, agora comecem a pensar já num próximo filme, não necessariamente uma sequela do outro, mas um filme“. E depois também com essas conversas meio iniciais, a hipótese de ser um filme de natal também apareceu relativamente depressa, ao ponto de pôr-se a hipótese de ser para o natal de 2020, ou seja, o outro filme estreou em janeiro de 2020 e em fevereiro estavam a pôr a hipótese de nós fazermos um filme de natal para estrear em dezembro de 2020. Além de ser, a nível de tempo, a produção ser quase impossível, também houve a questão da pandemia, que fechou as salas todas, portanto teria sido bastante urso. Mas a ideia de fazer um filme de natal manteve-se mas apareceu aí, foi aa produtora que nos desafiou para isso.

E depois como foi o processo criativo? Foi parecido com o do filme anterior, foi diferente… Como é que começaram a surgir as ideias?

A fase inicial… Quer dizer, há uma fase que é sempre igual, porque sou eu e o [João] Moreira a escrever e a decidir. Mas neste nós já tínhamos a ideia recalcada, cá para trás, de algures, de eventualmente ver o Aleixo num projeto que fizesse sentido. Ver o Aleixo desenhado por outros ilustradores, e animado também, uma animação diferente. Nós tínhamos tido um bocadinho o genérico do outro filme, que foi feito pelo Rafael Hatadani, que é um ilustrador e animador brasileiro. Ele também faz neste filme, faz o “Natal no Brasil“. Mas apareceu nessa vontade de experimentar uma animação diferente e um traço diferente. Nós desde início também pensámos seguir o arquétipo do Christmas Carol, do Dickens, aquela coisa de uma pessoa que não gosta muito do

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Pedro Santo (esquerda) e João Moreira (direita)

natal. O Scrooge é um gajo execrável. É execrável no natal como é execrável o resto da vida. Depois há ali uma redenção, quando ele é confrontado com natais passados e com o natal futuro. E nós, partindo desse pressuposto, achámos que fazia sentido, é a nossa oportunidade de usar animações diferentes. O Aleixo vai ver uma regressão a natais passados, por alguma razão, isto ao início. Cada natal terá a sua animação, cada natal teve, de facto, uma equipa de animadores diferentes e de ilustradores. Portanto, muito ao início foi… Não te sei dizer… O guião não ficou fechado antes de falarmos com animadores. Houve ali um processo. Houve esta premissa fechada: “vamos seguir então com este Aleixo a regressar a natais passados, seguindo o arquétipo do Dickens“, e a partir daí começámos a falar com animadores. Começámos nós, quer dizer, nós não conhecíamos esse meio. Há uma coprodução com a Cola, que é uma produtora de animação, e de facto que é do Bruno Caetano, e ele conhece o mercado da animação todo, portanto ele é que, com base nas nossas premissas, sabendo o que é o Aleixo e o que nós queríamos, foi arranjando e foi montando as equipas. Portanto, tem ali um mérito inqualificável a esse nível de produção.

Então podiam dizer que o Aleixo era como se tivesse transformado no Scrooge. Foi também uma conclusão que tirei ao ver o filme. Quer dizer, a partir do momento em que segues o arquétipo, há uma pessoa que supostamente é confrontada com o facto de não gostar do natal e de querer estragar o natal aos outros, é um bocadinho o Scrooge português, se bem que não é tão mau, tão malévolo como o Scrooge do Dickens. Como outros Scrooges, que já houve para aí cem em operas e assim. Ele é mais soft, é rabugento e implicante e tenta sair sempre por cima, mas não é tão mau assim. Depois também não há uma grande redenção no fim, ele não fica muito diferente. O Scrooge original fica uma pessoa melhor, de facto, completamente composta, e o Aleixo não, não fica assim tão diferente. Fica um bocadinho mais mansinho porque viu os sonhos, os amigos a serem mais amigos entre eles e esse tipo de coisas, ficou mais amigo a esse nível. Mas uma redenção propriamente dita não houve. Portanto, é um Scrooge à maneira do Aleixo. Isto para dizer que o Aleixo, a personalidade do Aleixo acaba por abafar a do Scrooge, no sentido em que não é o Scrooge que toma conta do Aleixo, é o Aleixo que toma conta da personalidade do Scrooge.

De todas estas histórias, tal como disse, destas histórias de natal, no Brasil, na Bairrada, tantas, há assim alguns pontos, assim algumas das histórias que tenha assim alguma ponta de verídico? Por exemplo alguma prima chata como a Isabela, ou assim algo verídico?

Não necessariamente tão marcado como haver de facto uma prima Isabela muito chata e má. Não há, não há assim tão marcado. Mas há coisas sim. O primeiro natal na Bairrada, que é quando o Aleixo está numa idade em que já começa a receber livros, roupa e dinheiro, e está revoltado porque queria brinquedos. Há ali uma idade em que as pessoas por vezes não sabem o que é que é para dar aos garotos, porque eles estão numa idade em que brinquedos já é um bocadinho que já não é, mas ainda são muito novos para roupa e dinheiro. Os garotos ficam revoltados porque queriam brinquedos e começam a receber essas coisas. Isso é verdade. Aconteceu especificamente ao Moreira. Ele lembrava-se da prima estar cheia de brinquedos e ele estar a receber livros. Mas eu também eventualmente me lembrarei dessa fase em que começámos a receber coisas mais de

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crescidinho, o que é chato. Depois há outras coisas mais simples, como parte cénica. Há casas que são casas ou da avó do Moreira, ou das minhas tias, ou da minha avó, porque é mais fácil assim teres uma referência de facto real. E depois há outras coisas como birras entre primos, irmãos, que é uma coisa que acontece sempre, as pessoas andam sempre às turras. Não propriamente uma Isabela, que é o contraponto do Aleixo. É uma pessoa que lhe dá completamente a volta, está sempre dois passos à frente. Mas isso ajuda a explicar porque é que o Aleixo é o que é hoje, porque ele foi confrontado ali em determinada idade a achar que ele era esperto e levou ali um banho de humildade. Há assim pequenos pontos biográficos, muitas vezes pontos de partida, não tão ao ponto de serem recriações de histórias que tenham acontecido mesmo.

E qual foi o maior desafio durante a criação deste filme?

Os meus desafios em cinema são sempres os mesmos, que são os imperativos de tempo e orçamento. E neste caso em concreto foi o facto de estarmos a fazer tudo à distância. O outro filme teve uma fase de cinema, de cinema mais clássico, de rodagem, de estarmos uma equipa num sítio a rodar, e aqui foi tudo feito à distância. Às vezes pode ser exaustivo estar muitas vezes a rever as coisas. Quando se faz um filme, vê-se o filme e fica-se farto do filme. Vê-se o filme demasiadas vezes e pronto. Neste caso nós íamos vendo as coisas sempre em casa, que ainda torna o processo mais cansativo, às vezes. A esse nível teve que ser assim, porque estávamos todos em pandemia ou em pós-pandemia, com os confinamentos teve que ser assim à distância, mas essa parte foi a dificuldade maior. Porque às vezes é difícil explicares exatamente o que queres em determinada cena, porque é que determinada cena tem que ser diferente à distância por escrito, mesmo por Zoom e assim. A distância acabou por ser complicado. Por outro lado, teve aa vantagem inacreditável de podermos ter várias equipas a trabalharem em simultâneo. As animações sendo diferentes, não tínhamos que esperar que a equipa acabasse de fazer uma animação e depois ia fazer a outra. Isso atrasaria o processo, iria ser muito demoroso. Tendo assim as equipas em simultâneo e com os seus timings, cada um fazia as suas coisas. Equipas organizadas também, isso foi bom. Mas foi mais a distância a dificuldade. Não tanto dificuldades a nível de meter o Aleixo neste universo, meter os bonecos neste universo, todo o nosso universo neste outro universo, as dificuldades nunca foram dessa maneira. Era mais a própria distância.

Qual é a grande expectativa para dia 22, o dia da grande estreia?

A gente espera sempre que corra bem, mas a verdade é que não sei como estão os filmes no cinema, como é que estão as dinâmicas de idas às salas nesta fase. Pessoalmente, eu não sabia que havia uma massa de pessoas que vai ao cinema no dia 25 à tarde, 26 ou assim. Há muita gente que vai e não sabia disso. Agora, se vão ver o nosso? Não sei, nós temos o Avatar, não é?

O que é que é o Avatar ao lado do Bruno Aleixo? [risos]

É, mas o Avatar pode estar cheio, e aí está ali o Aleixo à mão de semear, o que é uma vantagem. Também é bonecos, pode ser que a gente também conquiste algum público que vá no vazio. A esperança é sempre boa, mas isto depende. Estamos a falar de uma coisa que não controlamos, que é a vontade das pessoas de ir ao cinema. Nós achamos que o

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filme é mais… Eu não diria fácil, mas diria que vai ser mais confortável para quem não conheça o Aleixo. Este arquétipo, este tipo de filme, como são os baseados no Conto de Natal, já foram feitos tantas vezes que são um tipo de filme de natal. Depois uma pessoa terá esse identificação e esse conforto, enquanto o outro tinha muito mais preferencial a nível de estilos de cinema, e apesar de serem referências muito básicas, eram o que os bonecos faziam. Podia ser assim um bocado mais complicado de uma pessoa que não conhece o universo do Aleixo baixar ali logo a defesa. Este talvez tenha vantagem a esse nível. Talvez seja mais familiar também, como os filmes de natal gostam de ser. As perspetivas são boas, agora, o que vai acontecer já são outros quinhentos. Nós gostávamos que corresse bem.

E esperemos bem que sim. Para terminar, há assim alguns projetos já em mente? Até como tinha falado que a produtora foi tão rápida a propor um filme a seguir ao outro. O que é que podemos esperar?

Quando se faz um filme… Nós já fizemos dois, já podemos usar essa expressão. Quando se faz um filme, não pensas em mais nada. Não queres pensar sequer na possibilidade de haver outra coisa, seja filme ou não. Em boa verdade, o que aconteceu da outra vez foi que também estávamos na mesma e vieram logo nos propor outra hipótese, portanto não sabemos. Mas para já não. Quando fechas um filme e ele está em vias de estrear, não se pensa. Não pensamos no terceiro filme nem coisa que se pareça. Mas também há um ano e pouco não pensávamos num segundo filme, e ele aí está. Portanto, está tudo em aberto, não sabemos, ninguém sabe. Isto é tudo ao calha, na grande verdade. Isto é tudo aleatório, não cá método nenhum.

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