4 minute read
Caminho Central Português
por Francisco P. Ribeiro
Na senda dos artigos de opinião anteriores, considerando o histórico de alguns dos caminhos de Santiago realizados, a atual versão conta a vivência durante o Caminho Central, a começar em Ponte de Lima. E que se pode dizer? Magnífico e que recomendo, mesmo.
Advertisement
A região de Ponte de Lima exerce sobre nós um fascínio fabuloso. É lindíssima, as pessoas são excelentes e o caminho de uma beleza sem paralelo. Mas, como tudo na vida, temos o lado bom e o menos bom, ambos completam a vida. Então, estamos a falar de 129 km (uma média de 6 a 7 horas por dia), com uma paisagem lindíssima, fabulosa mesmo, que se transforma em dias divertidos. O caminho foi feito em 2018 e teve início no albergue de peregrinos de Ponte de Lima, junto à Ponte Velha (fica aqui a nota que, quem chega aos albergues sem ser a caminhar, como foi o caso porque seria o início de lá, seremos os últimos a ser atendidos). Éramos um grupo simpático (não fiz o caminho sozinho) composto por dois casais e a organização foi o modelo já referido antes: quando se chega aos sítios, acomodamos e caminha-se para conhecer o locais, na procura da saída do seguinte e conhecer a zona. E assim foi.
O primeiro dia foi até ao albergue de Rubiães (23 km). Confesso que quase não se sente o caminho, tal é a excitação e a novidade. Tudo é diferente, nomeadamente, os cheiros, a humidade e o estímulo, sempre acompanhado pelas fotografias, que eram mais que muitas. E a aldeia de Rubiães é pequena, mas muito mimosa. Detentora de uma igreja romana, a visitar, e café local onde se come lindamente (com botas de peregrinos a fazer de vasos de flores). O dia seguinte foi até Valença do Minho (18 km), o que permitiu pensar em avançar até ao albergue de Tuy (no centro da cidade, com vista para o rio Minho). Há um misto de sensações ao passar a ponte antiga que liga Portugal a Espanha. Já em Tuy, começam as “conquistas” de peregrinos. Juntou-se ao grupo uma mãe e filha, de país de leste, meio perdidas e que nos acompanharam no dia seguinte. O troço do terceiro dia é difícil, até Porriño é doloroso, mas é um reflexo na nossa vida, uns dias bonitos e outros menos, uns dias planos e outros com subidas, enfim. Porríño é uma zona industrial (se bem que fomos pelas montanhas) e decidimos ficar em Redondela (ao todo, 32 km), uma aldeia (Pueblo) com vários albergues municipais e privados. No quarto dia, continuamos a subir, sempre envoltos em nevoeiro místico, até Armenteira (mais 32 km). Durante o caminho, aproveito sempre a hora de abertura das padarias com pão quente para o pequeno almoço (já faltava incluir comida no caminho) e experimentar as iguarias locais como a marmelada, o mel, as bolachas, a fruta, a água da serra, enfim, um outro mundo, mesmo, para quem vem da cidade poluída. Passámos por Pontevedra, com o tradicional, na senda dos carimbos e das claritas numa esplanada, seguindo até à bifurcação para o caminho espiritual (já relatado) e seguindo até Caldas dos Reis (recomendo mesmo guardar uns minutos aqui). Calda dos Reis é uma zona termal onde a nobreza espanhola e família real faziam tratamentos de pele e pulmões. Tem várias fontes, mas uma está no caminho, com uma boca de água quente (vulcânica) e outra de água fria. Aproveitar para descansar aí os pés, e as pernas, é como ir ao céu e regressar. Vale todos os minutos perdidos. Feito o relax, numa região lindíssima, continuamos o caminho até ao albergue municipal de Padrón. Aqui, e mais uma vez, deixo algumas recomendações, em função da época em que se caminha, tendo em conta as melgas (à noite) e as carraças no campo (sacudir as calças e as botas). Acresce que há locais onde se apanham algumas pulgas, considerando que nem todos os peregrinos são tão higiénicos como os ibéricos. Nesse ano, fui atacado por pulgas, o estranho é que mais ninguém ao meu lado o foi. Algo se passou, enfim. Em Padrón, e mais uma vez, recomendo a visita à igreja matriz, junto ao albergue, e ir conhecer a igreja velha onde se encontra o padrão onde encostou o barco do peregrino. Aí, num momento de calma e serenidade, breve, pois logo em frente encontra-se o bar do Dom Pépe, um homem divertidíssimo com fotografias nas paredes dos peregrinos e recordações que lhe enviam. Só por ele, vale a pena este caminho. Dom Pépe ajuda a esquecer que o caminho está a terminar e serve o pequeno almoço muito cedo. No dia seguinte, o caminho é feito em silêncio, pois não queremos terminar, o sentimento é geral, confesso. A chegada a Santiago é saudada do alto, vendo a mesma num vale. Ao chegar, apercebemos a confusão artística de rua, com gaita de foles, e temos as idas à Xunta fazer o certificado, dar a volta dos peregrinos e, para mim, ir à igreja de São Francisco.
Mais um caminho concluído, mas permanecemos no vazio interior. E agora, como vai ser? O que muda?
Fica a partilha, terminando com algumas recomendações e notas para albergues, antes do COVID. Os caminhos futuros, alguns já abertos, serão todos diferentes, mas isso, até os nossos dias. As sugestões são apenas isso, sugestão. Bom caminho.