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Balneário Camboriú, 11 de junho de 2010
Entrevista
Se não tivermos paisagens, praias limpas e bonitas, ninguém mais vai querer vir para Balneário (Fernando Luiz Diehl, oceanógrafo e consultor ambiental)
Caroline Cezar
n o s s a
g e n t e
Marlise Schneider Cezar lisi@pagina3.com.br
Nome – FERNANDO LUIZ DIEHL. Idade – 50. Natural – Estrela (RS). Em BC – Desde 1988. Estado civil – Casado com Francelise Pantoja. Filhos – Anna, 9 e Theo, 6. Formação – Oceanógrafo. Profissão – Oceanógrafo, empresário, consultor ambiental. É secretário geral da Associação Brasileira de Oceanografia (AOceano) e vice-presidente e secretário geral da Associação Latino-Americana de Pesquisadores de Ciências do Mar. Lazer – Estar com os filhos, trabalho, música, um bom vinho tinto. Comida predileta – Churrasco. Um bom livro – Biografias em geral. Um filme – ‘Momentos inesquecíveis’. Música – Rock clássico, bossa-nova mesclada com jazz. O pior momento – Minha saída da Univali em 2006, foi traumático. O melhor momento – Esse momento ruim me obrigou a ver outras opções que acabaram se transformando no melhor que poderia me acontecer. Planos – Viver bem, continuar exercendo um trabalho sério, com ética e desenvolvendo projetos maiores. Um sonho é fazer um Museu Oceanográfico.
D
esde 1986 o gaúcho Fernando Luiz Diehl virou um ‘catarinense’ por opção e dois anos depois tornou-se um ‘balneocamboriuense’ de coração. Foi durante muitos anos diretor da Faculdade de Oceanografia da Univali e acompanhou sempre de perto o desenvolvimento de Balneário Camboriú, especialmente nas coisas que dizem respeito ao mar, sua especialidade. A praia poluída, o esgoto no mar, o ocupação desordenada, o museu do mar, motivaram dezenas de reportagens ao longo de quase duas décadas. Através da Associação Brasileira de
Oceanografia (AOceano), que presidiu por seis gestões alternadas e da qual hoje é secretário geral, Fernando abriu um outro campo de batalha, a expansão do mercado de trabalho para oceanógrafos, profissão regulamentada há dois anos apenas. Uma luta que ainda continua. Ele é também o vice-presidente e secretário geral da Associação LatinoAmericana de Pesquisadores e Ciências do Mar e comandará a organização da 14ª edição do maior congresso latinoamericano da sua especialidade, ano que vem, em Balneário Camboriú.
Entrevista
Balneário Camboriú, 11 de junho de 2010
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“Taquarinhas tem características naturais que a tornam única no Brasil e talvez no mundo”
Fernando com Francelise e os filhos, Anna e Theo.
Apesar da agenda apertada, Fernando procura estar todo o tempo possível e disponível com os filhos.
JP3 – A Oceanografia apesar de existir há três décadas, ainda é considerada uma ciência emergente. Como a AOceano consegue fazer um congresso do porte do realizando em Rio Grande no mês passado? Fernando – Acho que o evento em Rio Grande foi à parte, fugiu um pouco da característica da série c ong re s sos brasileiros de oceanografia, que é talvez o maior evento das ciências do mar da América Latina e talvez do mundo. Rio Grande trouxe ainda mais gente, porque foi também a comemoração dos 40 anos de curso de graduação. JP3 – Uma das principais lutas da AOceano ainda é o mercado de trabalho.
competência, dizer que é um novo profissional, seja um biólogo, seja um oceanógrafo, seja um ecólogo. Exemplo concreto, é só olhar o edital do concurso do Ministério da Pesca e Aquicultura, eles têm 40 vagas para o cargo de engenheiro, quando você lê a atribuição desse profissional ou o conteúdo programático das provas, você vai ver que pode ser um oceanógrafo, um biólogo, engenheiro de pesca, engenheiro agrícola, mas não engenheiro civil... não engenheiro sanitarista, não engenheiro de minas, não um engenheiro metalúrgico... mas a vaga é para eles!
todo mundo sabia, não que isso acontece hoje, deixar bem claro isso, mas acontecia, que a Cidasc era a empresa dos veterinários, que a Acaresc era a empresa dos agrônomos e técnicos agrícolas, a Cetesb em São Paulo é a empresa dos engenheiros, esses grupos corporativistas quando fazem os concursos públicos, eles impedem que novas p ro f i s s õ e s agreguem.
“O que Balneário tem de melhor e nenhuma cidade brasileira tem é essa relação da praia, do calçadão com o bar...”
Fernando – Até dois anos atrás a nossa luta era muito difícil, antes da regulamentação da profissão que ocorreu em 2008. Eu via com dificuldade a expansão do mercado. Mas nesse tempo, anos 2000 pra cá, outras questões vieram, como a expansão do petróleo, a retirada da exclusividade da Petrobras, a abertura do mercado de petróleo para as empresas, a ampliação das demandas portuárias, a inserção dos profissionais que até então estavam graduados no mercado, acho que o mercado está em franca expansão. Com a regulamentação, dia 31 de julho de 2008, ficou mais fácil apesar de ainda existirem grupos corporativistas e que delimitam o campo de trabalho, essa é a nossa luta agora, quebrar esses feudos. JP3 – Como eles atuam e como vocês irão combatê-los? Fernando – Tem empresas que têm profissionais que são donos da empresa. Aqui em Santa Catarina, por exemplo,
JP3 – Isso m u d o u após a regulamentação da Oceanografia?
Fer nando – Não que tenha mudado, mas na realidade tem um instrumento hoje que é entrar com mandado de segurança contra alguns concursos públicos, tentar se posicionar contra contra algumas ações corporativistas, mas eu acho que a pessoa que mais abriu isso foi Fernando Henrique Cardoso quando ele criou aqueles famosos cargos genéricos em alguns concursos públicos, como analista ambiental, analista em administração... isso possibilita que todo e qualquer profissional com capacidade técnica entre no mercado... Ele enquanto presidente, deu um novo olhar, ele começou a quebrar os grupos corporativistas. JP3 – Então precisa hoje?
o
que
Fernando – Além da lei, o que precisa hoje é colocar oceanógrafos em alguns pontos estratégicos. A lei veio para nos dar instrumentos.... JP3 - ...mas isso acontece em todas as profissões. Fernando – Todas sofrem, mas eles criaram um sistema cartorial muito eficiente e o inseriram dentro de editais públicos. Como vai quebrar isso? Tem que ir lá dentro, convencer, mostrar
JP3 – Nesse caso, o que aconteceu? Fernando – Nós vamos entrar com um mandado de segurança contra o concurso. JP3 – Isso tem dado bastante trabalho pra vocês... e o resultado, é positivo? Fernando – Tem, alguns mandados de segurança já ganhamos liminar, como por exemplo, da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), não continha vaga para oceanógrafo, só engenheiro ambiental e biólogo, nós entramos e ganhamos; na Cetesb nós ganhamos mas ela não acatou a decisão, entramos com recurso e vamos, talvez, até anular o concurso. Mas tem vários, Companhia Docas do Rio de Janeiro, são muitos, a gente entra e tenta garantir e ampliar o mercado de trabalho. JP3 – Como você vê essa relação da profissão e das questões ambientais, tão discutidas hoje, especialmente nessa semana do meio ambiente... Fernando – Dia 8 de junho é o Dia Mundial dos Oceanos e por isso escolhemos também como Dia do Oceanógrafo. A matriz curricular de um oceanógrafo está fundamentada nas áreas de matemática, física, química, geologia e biologia e uma série de disciplinas complementares, genéricas e
profissionalizantes, possibilitam formar um profissional mais eclético, versátil e que se relaciona com várias ciências. Em segundo lugar, nós trabalhamos num ambiente muito mais complexo em termos de tridimensionalidade. Se trabalha num oceano, tem 11 mil metros de profundidade, você tem um espaço muito grande, os processos oceanográficos são muito mais complexos do que os processos continentais ou atmosféricos e na Oceanografia você trabalha com o meio marinho, na sua interface com o continente e com o ar, porque as correntes, a movimentação dos oceanos têm íntima relação com a atmosfera, então os processos que estudam a Oceanografia são muito mais complexos do que um geólogo que estuda o continente, por exemplo. JP3 – Hoje se fala muito em mudanças climáticas, as alterações por elas provocadas, a influência no planeta e todas elas passam pelos oceanos... como nós estamos preparados ou nos preparando para enfrentá-las? Fernando – O Brasil em escala mundial não tem muita importância nesse aspecto, porque infelizmente seus pesqui sadores não têm recurso como tem nos EUA, Canadá, França, Japão, Alemanha pra estudar com maisseriedade as mudanças climáticas globais. São processos dos mais importantes, são os oceanos que regem tudo o que acontece no planeta, infelizmente ou felizmente, além do homem, é no oceano que as mudanças acontecem. O Brasil não tem um navio oceanográfico em condições de ir para o
oceano aberto, é um absurdo, mas não tem! O Brasil não tem um navio oceanográfico em condições de fazer geologia marinha em águas profundas. A Petrobras tem, subcontrata a peso de ouro. Agora o meio acadêmico, a ciência brasileira não tem meios flutuantes, navios de pesquisa em condições de fazer oceanografia de alto mar. A oceanografia brasileira é costeira. JP3 – Tão importante quando a teoria é a prática. Nesse caso... Fernando – Claro, mas não tem. Hoje os 13 cursos de graduação em oceanografia do Brasil, só três deles têm navios, mas navios pequenos. Não existe hoje uma estrutura de pesquisa para estudar os oceanos como os países maduros e modernos fazem. Quem tem, agora recentemente a Marinha do Brasil comprou, dois navios, eu diria grandes, que é o Cruzeiro do Sul, navio velho, reformado, e o Maximiano da Fonseca, 0km. Mas são da Marinha do Brasil, podem estar à disposição, mas ainda são pequenos se comparados a outros, o navio oceanográfico Meteor, alemão, tem 150m, os navios russos que são sucatas são de 130, 150m...
“Se alargar a atual avenida, por causa do alargamento da praia, em mais do que meia pista acabou essa relação que falo...”
JP3 – Então o profissional precisa sair do país para buscar esse conhecimento que aqui está atrasado.
Fernando – Tem que sair e muitos saem ou fazem convênio internacional. Por exemplo, a Marinha americana, o Exército americano injetam tanto dinheiro, tantos recursos nas universidades que não tem como eles não se desenvolver.
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Entrevista
Balneário Camboriú, 11 de junho de 2010
Arquivo Pessoal
Fernando falou em nome dos 967 graduados nos 40 anos da FURG
JP3 - Mas isso acontece em todos os cursos... Fernando - Sim, exemplo disso, quando aconteceu a última guerra do Iraque e capturaram o Saddam Hussein, a universidade que eu conheço, eles trabalhavam no mapeamento do solo iraquiano, para fazer os mísseis entrar na janela dos caras. Um míssel é teleguiado porque um cara mapeou o país inteiro, detalhes, ele está andando e pegando o imageamento do solo, ele é um olho. Quem faz isso? As universidades americanas. Fazem por quê? Por dinheiro. Além do que os grandes milionários americanos quando morrem ou antes de morrer, eles doam seus fundos particulares para as universidades... agora pergunta se um Eike Batista faz isso?
uma demanda que precisa ter, alguns falam em uma pequena rua interna para estacionamentos, não sei... O que eu sei é que se alargar a atual avenida, por causa do alargamento da praia, em mais do que meia pista, acabou essa relação que falo... E se essa relação acabar, acabou a cidade! As pessoas vão deixar de vir. Ninguém vem pra Balneário pra ver uma praia de 100m de largura.
“O ganha-pão de todos nós é uma Balneário saudável”
JP3 – Você teve participação ativa na questão do alargamento da faixa de areia, foram dezenas de reuniões, audiências públicas, plebiscito e, no entanto, o projeto nunca saiu do papel. Qual é a sua opinião hoje a respeito? Fernando – O alargamento, se o cidadão de Balneário Camboriú quer e precisa, ele pode acontecer, desde que se obedeça a dois critérios básicos: primeiro, que as características naturais da praia não sejam alteradas, para isso tem que ter o mesmo tipo de sedimento da praia original. Se não for assim, não vamos ter a mesma praia, nem próximo disso, as pessoas poderão rejeitar; segundo ponto, não se pode fazer uma avenida dupla. O que Balneário tem de melhor e nenhuma cidade brasileira tem é a relação da praia, do calçadão com o bar, com a calçada do outro lado. A calçada onde as pessoas caminham, correm, fazem cooper, tomam chimarrão e com a calçada do outro lado, onde as pessoas procuram uma loja, um bar... se essa relação se perder, acabou Balneário Camboriú. JP3 – Aumentar a areia sim, mas não mexer no resto. Fernando – No máximo aumentar um pouco mais a calçada, uma pequena ciclovia, é
JP3 – Na condição de consultor ambiental você sente que as pessoas, os empresários estão realmente mais ligados ou é aquela aparente preocupação e depois, na moita, fazem tudo ao contrário? Fernando – Vou falar de forma genérica... tem que cumprir a lei... é mais ou menos isso, bem simples e direto. Infelizmente terão que vir mais umas duas, três gerações pra ter uma sensibilidade maior. Eu me graduei em 84, em curso da área ambiental, se alguém tinha um pouquinho de sensibilidade ambiental são profissionais formados nessa área. Um advogado até hoje não tem uma disciplina da área ambiental pra ter essa sensibilidade... e ele só vai ter, se pegar o 1º Grau, o 2º Grau, creche, prézinho etc... senão se forma sem nenhuma sensibilidade ambiental. Mesma coisa um engenheiro civil, porque na faculdade não tem essa disciplina...então essa sensibilidade tem que vir do próprio meio... Por isso eu digo, temos que ter mais gerações para ter uma mudança de postura. É claro que existem empresários preocupados com essa área, é lógico...
A solenidade aconteceu durante o maior evento das ciências do mar, recentemente em Rio Grande (RS)
ção e a natureza, tem quem cumpre, mas... nem todos, nem todos... Fernando – Esse setor é difícil, precisa de metro quadrado pra construir e Balneário não tem mais metro quadrado. É difícil, acho que o município tem que buscar um novo conceito. Visitei uma cidade na Espanha, um dos balneários mais famosos, o Marbella, que era muito pior que Balneário, mas eu vi eles tentando recuperar espaços verdes, espaços de lazer, Balneário não tem praça, na realidade tem a praia, um grande calçadão, esse é o nosso espaço. Lá eles começaram a rasgar, abrir praças, trilhas, avenidas verdes. Balneário vai fazer isso? Acho que não. JP3 – A Praia Brava é um exemplo, parecia intocável e quando tudo estiver pronto será uma cidade com problemas, porque não foi preparada, não tem infra-estrutura. Fernando – Fui um dos maiores críticos da Praia Brava onde não permitiam nada. Vamos organizar, planejar, disciplinar o que pode. As administrações passadas, estou falando de Itajaí, não de Balneário, moro na Praia dos Amores e ali tem um padrão, apesar de não gostar do tamanho dos lotes, um absurdo, mas lá está bem rígido, não pode construir prédios, só dois pavimentos e mais um terceiro que foi aberto agora, que é talvez uma demanda, uma necessidade, então Praia dos Amores não entra nisso, mas a Praia Brava que é Itajaí eu sempre criticava, eles tinham que fazer alguma coisa e, infelizmente, o único que teve coragem, fez de uma forma acomunada com o setor da construção civil. Fizeram de uma forma má intencionada. Fizeram um Plano Diretor que permitiu uma abertura, que escrachou, que abriu, que feriu com todo e qualquer princípio ético e moral e ambiental. Essa é a minha opinião sobre a Praia Brava. Sobre Balneá-
“O Plano Diretor de Itajaí foi feito para atender os interesses da construção civil na Praia Brava”
JP3 – Balneário Camboriú é um exemplo do que o homem é capaz de fazer com o meio ambiente. Existem as leis, mas há uma relação meio capenga, entre a constru-
rio? Não há muito o que fazer, é um modelo anos 60, tem que melhorar, lapidar. Agora Praia Brava era uma reserva técnica de bons restaurantes, bons hotéis, de um bom lugar pra caminhar, de uma bonita casa, um bom prédio de quatro, cinco, seis andares, mas não aquilo que estão fazendo. JP3 – Sem estrutura de ruas, água, esgoto, lixo... coisas que teriam que vir antes. Fernando – O Plano Diretor de Itajaí foi feito para atender os interesses da construção civil na Praia Brava. E ele atendeu naquele momento em que abriu a brecha, deu dois, três, quatro, cinco meses... entrou todo mundo com projeto. Tudo aprovado hoje. Tem uma ação de inconstitucionalidade contra o Plano Diretor que está em julgamento, por parte de uma ação cível pública do Ministério Público, mas não adianta, em uma noite eles conseguiram aprovar todos os projetos. Obviamente que a administração pública municipal estava acomunada com esses interesses, é a minha visão. Alguns bem intencionados e não sabiam o que estavam fazendo, outros talvez mal intencionados, mas volto a dizer, não estou generalizando, têm pessoas que votaram pelo Plano Diretor, que tem coisas boas, mas pra Praia Brava tem equívocos, não deveria ter sido aquilo. A Praia Brava não suporta o número de pessoas que vai ser prevista, não tem como, não vai ter praia para tantas pessoas. Se der uma maré alta no verão, as pessoas vão ficar onde? Em cima da duna? Vão botar o guarda sol nos bares? Não tem como, a praia não comporta. Mas permitiram isso.
começo de um futuro vertical na Interpraias. Fernando – Sempre pensei em Taquarinhas como uma praia única, ela tem características naturais e morfológicas que a tornam única no Brasil e uma das únicas no mundo. Por si só ela mereceria ser um patrimônio natural do Brasil. Se vão botar um empreendimento lá, a princípio eu pensava que era lá em cima, pensava que até poderia estar adequado à paisagem, até pra preservar essas características, pra impedir que viesse um grande loteamento na praia, mas quando vi recentemente... eu não aceitaria aquele empreendimento, particularmente não. Já fui convidado pra fazer licenciamentos similares no Canto do Morcego, faria outros, volto a dizer, prefiro licenciar a coisa certa, tenho empreendimentos que estou licenciando polêmicos, que tem gente que não gosta, mas quanto à Taquarinhas, quando vi a ocupação do empreendimento me assustei, porque ele vai descaracterizar por completo, aquilo que acho que deveria ser preservado. É uma reserva técnica, paisagística que Balneário Camboriú vai precisar para sua sobrevivência econômica vinculada ao turismo no futuro. Se nós não tivermos paisagens em Balneário Camboriú, praias limpas e bonitas ninguém mais vai querer vir para cá. Se tudo for igual a esta paisagem de Balneário hoje, se Taquarinhas ficar assim, se Taquaras, Estaleiro, Estaleirinho for assim, quem vem para Balneário Camboriú? Para quem esses caras da construção civil vão vender? Para quem? Você acha que um apartamento frente pro mar vai custar R$ 3, R$ 4 milhões? De jeito nenhum. Está fora da realidade. Todo mundo sabe que eu compro um apartamento em Balneário com mais dificuldade do que compro hoje na Vieira Souto, no Rio de Janeiro.
“Praia Brava era uma reserva técnica de bons restaurantes, bons hotéis, de um bom lugar pra caminhar...”
JP3 – Na praia de Taquarinhas tem uma discussão sobre a construção de um grande empreendimento. É uma região bem protegida, o Plano Diretor é rígido, mas esta situação pode ser o
Entrevista
“Taquarinhas é uma reserva técnica, paisagística, que Balneário vai precisar para sua sobrevivência” JP3- Então alguma coisa está errada... Fernando - Hoje compro apartamentos mais baratos em Miami do que em Balneário. Hoje a construção civil está ganhando. Quando acabar com nossas belezas naturais esses apartamentos vão cair de valor, esses imóveis vão despencar e ninguém mais vai querer vir pra cá. É isso que é preciso se conscientizar. Precisa uma política séria, porque o ganha pão de todos nós é uma Balneário Camboriú saudável. JP3 – Quando você fala que nossa praia é modelo anos 60 significa que não tem mais muito a fazer na praia central, é isso? Fernando – Não, não, tem muitas coisas para fazer, acho que as administrações, a atual e a futura, têm que pensar nisso, acho que Balneário Camboriú merece ser pensada como cidade. Isso Marbella na Espanha fez. Era uma cidade velha, acabada, o Antonio Banderas tem casa lá, os melhores atores europeus tem casa lá, ela é feia, mas começou a se rejuvenescer, eles recriaram uma cidade, então acho que Balneário Camboriú merece ser recriada. JP3 – Grandes centros como Curitiba, Porto Alegre estão preocupadíssimos em abrir o verde, criando praças e bolsões e parece que aqui nós
estamos no caminho oposto. Fernando – Nós temos uma coisa diferente, nós temos o verde, não dentro da cidade, não temos nem uma praça, mas temos o verde que nos envolve, que está no nosso entorno, tudo isso nós temos, mas o que nos faltam ainda alguns equipamentos, um Teatro Municipal, mais segurança, tirar alguns bares com cara de velho, rejuvenescer a cidade, como Puerto Madero fez na Argentina. Nós ainda temos como preservar o verde que temos, mas não com essa política de ocupação que pode estar se impondo pra Laranjeiras, Taquarinhas, Taquaras, Estaleiro, Estaleirinho... se continuar desse jeito, que a gente vê as pessoas derrubando e derrubando... JP3 – Você disse que construir o Museu Oceanográfico é um sonho, um desafio, nós estivemos bem perto de ter esse museu aqui e deixamos escapar. Ele hoje seria um desses equipamentos turísticos... Fernando – Simples, a administração anterior da Univali não quis. JP3 – A reitoria de Edson Vilella? Fernando – Não, o Edson Vilella até o final de sua gestão, mesmo com dificuldades financeiras, defendeu e nós tocamos o projeto. Quando entra a próxima administração, eu ainda
diretor, eu vi que foi um balde de água fria e disse, esqueça esse projeto. Enquanto diretor, dois anos na administração, fui obrigado a esquecer o projeto. Depois que eu não era mais diretor, eles tentaram renascer o projeto. Fizeram lançamento de uma pedra, queriam dinheiro do Usiminas, R$ 70 milhões, na realidade a partir dali houve incompetência técnica e alguma coisa... chamo de liderança, sem um líder você não constrói nada. Na Univali durante oito anos não houve um líder. Essa é minha posição. Quando não tem um líder, alguém que faça com que haja seguidores de um projeto, de uma proposta, você não constrói nada. Tanto que não se construiu nada nestes oito anos. Pelo contrário, desconstruiu. Agora eu acho que Balneário Camboriú merece um museu oceanográfico, por que não? Pode a administração fazer, é só querer. Os museus modernos hoje trabalham muito mais com tecnologia, não precisa ter grandes coisas naturais, não é mais aquele museu velho, com exposição de arcada, não. Você monta uma coleção de forma até rápida, como se monta uma empresa. JP3 – Onde seria o local ideal para um equipamento desses? Fernando – Sempre olho da praia central pros lados de Laranjeiras, tem um reflorestamento de eucaliptos, é
Falando nisso... O ½ ambiente A reportagem Especial, sobre o meio ambiente, publicada semana passada, assinada pela colega Dani Sisnandes e ilustrada por Ricardo Alves, me deixou apreensiva. As fotos são inconstestáveis, elas não mentem, é a realidade que está diante do nosso nariz, mas as pessoas entrevistadas, que ocupam cargos de responsabilidade ambiental, não me convenceram. Não tem fiscalização ou como se explica um negócio absurdo daquele que vimos essa semana na praia do Estaleirinho e esse pessoal, responsável por isso, quieto, calado. O negócio é muito sério, ou abrimos os olhos agora ou vamos nos complicar muito em breve.
Tucanada Outro dia falei aqui na redação que estava chato esse negócio do Dão e do Fabrício, saindo na mídia, dia sim, dia não, um falando do outro, enfrentando pesquisas on line, medindo forças e espaços pra ver qual sairia candidato...deu no que
deu. Dentro do partido, ficou um mal estar como me disse um tucano da gema! É aquela história de lavar roupa suja em público, o fecho da história surpreendeu, deixou um clima ruim entre os dois pretensos candidatos, que trabalham juntos por assim dizer e entre os partidários pior ainda, porque uma coisa dessas acaba dividindo, uns puxando a corda prá cá, outros prá lá... Mas acho que o Dão não vai sair do partido, tem as ligações de mais de duas décadas com o Pavan, tem o mano Gil...
Balneário Camboriú, 11 de junho de 2010
aquele o local para o museu. Um oceanário ali está pronto. Acho que Balneário Camboriú é o melhor local ou então Florianópolis, naquela região de Paulo Lopes, junto à BR-101, tem uma vista pro mar ou até mesmo aqui em Itapema, são locais aprazíveis. JP3 – Quando se fala em alargamento muitas pessoas têm medo que pode acontecer, algo parecido com Armação, Barra da Lagoa, mar avançando, destruindo... o pessoal associa muito essa coisa de buscar o que é do mar e depois ele vem pegar de volta... Fernando – Inclusive desmarquei nossa entrevista naquela segunda-feira, porque o pessoal da Fatma pediu para eu fazer uma vistoria técnica naquelas praias. O que aconteceu lá é um processo natural, muitas vezes associado com a mão do homem. Esses eventos oceanográficos acontecem em escala de tempo. Essa escala pode ser em um dia, um mês, um ano, um século, um milênio, essa questão é preciso entender. E ele se repete e quando se repete, dá aquele baque. Obviamente que a mão do homem ajuda a acelerar estes processos. Ou a gente tem que evitar que esses processos sejam uma consequência da mão do homem e quando são eventos naturais, tem que se proteger. O engor-
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damento da praia é um método racional e menos impactante possível para proteger uma praia dessas. Eu não acho que Balneário Camboriú precise engordamento pra isso. Se tiver um engordamento de praia artificial, vou proteger mais a minha praia. Vamos fazer um colchão protetor. A areia da praia tem que ser tirada de algum lugar. Que se obedeça critérios. O projeto estava em andamento, não aconteceu, mas acho que esta administração está tocando a idéia, seria uma solução para mitigar os efeitos da erosão. Mas tem que ter critérios técnicos. Antes o projeto não foi seguido porque não se tinha uma areia correta pra fazer o engordamento. Se não tem essa areia certa, não tem engordamento de praia. JP3 – Gostaria de colocar mais alguma coisa?
“Acho que Balneário Camboriú merece ser recriada”
Fernando – Só dizer que ano que vem vamos trazer o maior congresso latino-americano de ciências do mar, a 14ª edição, entre setembro e novembro de 2011, em Balneário Camboriú. Em 2007 ele aconteceu em Florianópolis com 2600 participantes, em 2009 foi para Cuba com 1100 inscritos e ano que vem será em Balneário. Acredito que 800 estrangeiros mais uns dois mil brasileiros deverão estar aqui na cidade.00
Marlise S. Cezar
lisi@pagina3.com.br
Do álbum
Ricardo Alves
A igrejinha “Nós hoje conhecemos a história daquela igrejinha, foi ali que começou a comunidade luterana de Balneário Camboriú. Daqui a 50 anos, quem vai saber disso? Estamos perdendo, porque essa história é de Balneário Camboriú também, mas aqui não se dá muito valor ao passado, só o que interessa é o futuro”. A afirmação é de um luterano que viu a igrejinha da Rua 2300 nascer e está preocupado com o seu destino.
Estamos nos acostumando com depredações, cortes de árvores, devastações, não estamos cuidando do nosso meio ambiente. Quando olhei essa foto fiquei chocada com o cenário e ela faz parte do nosso cotidiano, do nosso dia-a-dia, todos ou quase todos nós passamos por essa ‘paisagem’ com freqüência, quando vamos ao shopping, à rodoviária, ao fórum, ao Ivo Silveira etc...Aí alguém falou: mas aquele morro vai sair mesmo, está previsto, por causa do binário etc e tal. Não importa, o que eu quero dizer, através dessa foto, é que a gente não vê mais o que está acontecendo nas nossas barbas...tornou-se habitual, comum, olhamos mas não vemos...é isso. E isso é mais do que sério, é alarmante quando falamos em preservar o meio ambiente. Ou não?