PAJ2014 Materia Completa Negocios e Carreira Exame o Sonho Acabou

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capa | negócios

o sonho acabou? Um ano atrás, Eike Batista ainda dizia “não abrir mão” de se tornar o homem mais rico do mundo. Com a crise que abala seu império, a ambição vai ter de diminuir

MARCELO CORREA

roberta paduan e maria luíza filgueiras

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o sonho acabou? Um ano atrás, Eike Batista ainda dizia “não abrir mão” de se tornar o homem mais rico do mundo. Com a crise que abala seu império, a ambição vai ter de diminuir

MARCELO CORREA

roberta paduan e maria luíza filgueiras

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eike batista com sua mercedes: crise que comeรงou em junho do ano passado derreteu 90% do valor de mercado de sua maior empresa, a OGX 1 de maio de 2013 | 35


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n 36 | www.exame.com

divulgação

navioplataforma da osx: uma empresa depende da outra, o que complica a crise

enhum empresário em nossa história descreveu uma trajetória tão fulminan­

te quanto o mineiro Eike Batista. Há me­nos de uma década, Eike era conhecido como marido da atriz Luma de Oliveira e filho do ex-presidente da Vale Eliezer Batista. Sa­ bia-se que era rico, tinha alguma celebri­ dade nas colunas sociais do Rio de Janeiro e nada muito mais que isso. Mas algo acon­ teceu e Eike começou a viver, há cerca de sete anos, uma espécie de conto de fadas particular. Foi quando desenvolveu sua nova especialidade: transformar projetos ainda rascunhados no papel em empresas que valiam bilhões — e o país assistiu, um tanto desnorteado, à escalada de sua for­ tuna. Em 2006, quando vendeu ações da mineradora MMX, seu patrimônio era es­ timado em 2 bilhões de reais. Cinco anos e dezenas de projetos depois, Eike não só era — disparado — o homem mais rico do país como prometia se tornar o número 1 do mundo. Num país em que riqueza é motivo de certa vergonha, esse tipo de discurso chocou: sua fortuna se tornou obsessão nacional, tema de conversa de bar, papo de manicure, objeto de estudo, adoração e in­ veja. Embriagado pelo próprio sucesso e

andando sempre sobre a linha tênue que separa a ousadia da fanfarronice e a sagaci­ dade da esperteza, fez um punhado de de­ clarações históricas. “Tenho alguma coisa­ com a natureza. Onde eu furo, eu acho”, disse, ao explicar seu sucesso como explo­ rador de recursos naturais. Ao apresentador americano Charlie Rose, afirmou que seu patrimônio chegaria aos 100 bilhões de dó­ lares em dez anos. Sua mineradora seria uma “mini-Vale”; sua empresa de petróleo, uma “mini-Petrobras”; seu porto, uma “Ro­ terdã nos trópicos”. Sua ascensão parecia não ter fim. Até que teve. Se a ascensão foi impressionante, a que­ da tem sido cruelmente rápida. É raro ver uma espiral como a que, de um ano para cá, tem ameaçado levar ao chão o império er­ guido por Eike na última década. As ações de suas empresas valem hoje uma fração do que valiam pouco tempo atrás. No caso da OGX (a tal mini-Petrobras), a queda foi de aproximadamente 90% em 12 meses. A ação era negociada a 1,61 real no dia 22 de abril e, segundo os analistas do Deutsche Bank, seu preço justo é míseros 80 centa­ vos. É a maior queda da bolsa brasileira no período, seguida de perto pelo desempenho


Entre a euforia e a depressão

Por que o modelo de negócios do grupo EBX seduziu investidores — e agora virou um problema Para tirar os projetos do papel, o grupo teve de se endividar, como ocorre com a maioria das empresas. Mas o volume de dívidas não para de crescer — hoje é de

O grupo montou vários projetos gigantescos ao mesmo tempo. Alguns exemplos:

OGx

mMx A mineradora foi criada, segundo Eike Batista, para ser a “mini-Vale”

2

A petroleira foi concebida para competir com a Petrobras em óleo e em gás

A surpresa

A esta altura, a receita das empresas já deveria aliviar a pressão do endividamento. Mas as obras atrasaram, e a produção não atendeu às expectativas

OSx A empresa de estaleiros foi criada para ser a “Embraer dos mares”

3

24

O modelo de interdependência, que era para ser um trunfo, virou um problema. Uma empresa do grupo é cliente da outra — quando uma vai bem, todas se favorecem. Mas, se uma vai mal, contamina todo o resto

1

OGx + OSx + LLx + MMx + mpx

(petróleo) (estaleiros) (logística) (mineração) (energia)

2,1

bilhões de reais

5

A geradora de energia mpx utiliza em suas usinas o gás explorado pela OGX. Mas a exploração e a distribuição de gás dependem de capital

A petroleira OGx é a maior cliente da empresa de estaleiros OSX. Mas, com a fraca produção de petróleo, faz poucas encomendas

4

A mineradora MMx contrata energia da geradora MPX. Mas, sem logística para venda, sua produção fica reduzida

Mas, segundo as projeções de negócio dadas pelo próprio grupo, os analistas esperavam uma receita no mínimo

três

vezes maior

A principal companhia, a OGX, deveria produzir

20 000 barris de petróleo por dia desde 2011

Mas neste ano chegou à média de

8 000 barris de petróleo por dia

Ou seja, o grupo gera pouca receita em comparação com sua dívida

(1)

O problema

As cinco principais empresas

somaram receita de

bilhões de reais

4

2

Os estaleiros da OSx ficarão no porto em construção da LLX, mas a demanda por seus serviços está menor do que se estimava

3

O porto da LLx escoará parte da produção da mineradora MMX, mas as obras do porto têm um ano de atraso

As possíveis soluções

As empresas precisam redimensionar os negócios à real capacidade de produção e venda. Para reduzir o endividamento e continuar investindo, terão de buscar sócios

mpx

A empresa de energia deu o primeiro passo para solucionar seu problema. Vendeu parte do capital à alemã E.ON, que se comprometeu a injetar recursos

OGX, MMX, LLX e OSX

A petroleira, a mineradora, a empresa de logística e a de estaleiros procuram novos parceiros para ajudar nos investimentos e tirar o peso das contas da EBX

(1) Dívida bruta das empresas abertas Fontes: analistas, executivos e empresas do grupo EBX

1

A ideia

1 de maio de 2013 | 37


capa | negócios das ações da MMX. Um ano atrás, Eike ainda dizia “não abrir mão” de se tor­ nar o homem mais rico do mundo. Ho­ je, é obrigado a debelar boa­tos de que corre o risco de quebrar. Eike e seus executivos dedicaram os últimos meses a achar formas de aliviar as finanças do grupo EBX, holding que controla suas empresas. Em março, as­ sinou um acordo com o banco BTG Pactual para vender participações nas empresas do grupo a investidores. Ven­ deu ações da elétrica MPX para a ale­ mã E.ON por 1,4 bilhão de reais. No fim de abril, negociava a venda de uma par­ ticipação de 40% de um campo de pe­ tróleo na bacia de Campos para a ma­ laia Petronas por 1 bilhão de dólares. Em paralelo, começou a negociar com o governo planos de “resgate” para o grupo. Ao lado do pai, encontrou-se com a presidente Dilma Rousseff em Brasília e ouviu que seria apoiado, por exemplo, numa eventual parceria entre a OGX e a Petrobras. Uma mal explica­ da tentativa do governo de levar um estaleiro de Singapura para o porto de Eike pegou tão mal que acabou abor­ tada (o Jurong está construindo seu estaleiro no Espírito Santo). Mas, mes­ mo que passe relativamente bem pela crise atual, Eike Batista sairá dela me­ nor do que entrou. Sua participação nas empresas diminuirá, e é muito im­ provável que elas voltem a valer o que valiam um ano atrás. Recentemente, as ações têm tido um desempenho típico daqueles papéis meramente especula­ tivos — que sobem muito e descem mais ainda. No dia 22 de abril, o rumor de que a OGX estava negociando com petroleiras estrangeiras fez a ação su­ bir 18%. Mas recuperar o valor de ou­ trora é outra história. A ação da OGX teria de subir outros 1 000%. O sonho grandiloquente de Eike Batista, portan­ to, está seriamente ameaçado — para dizer o mínimo. A quebra de um banco é, quase sem­ pre, motivada por uma súbita descon­ fiança em relação a seu futuro. Sem credibilidade, banco nenhum para de pé. A crise por que passa Eike Batista tem raízes semelhantes. Suas empresas e sua fortuna existiam porque os inves­ 38 | www.exame.com

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PARA ENTENDER O PROBLEMA Sete perguntas e respostas sobre o grupo EBX, que concentra as empresas de Eike Batista, e o desempenho de suas ações

O grupo corre o risco de quebrar?

Pouco provável. Uma saída para levantar recursos é vender empresas, como a companhia de energia elétrica MPX e a mineradora CCX. Além disso, o BNDES e grandes bancos privados, que emprestaram bilhões de reais ao grupo, só perderiam dinheiro com a quebra. Ou seja, têm interesse em colaborar.

E o melhor cenário?

O grupo conseguir levantar capital com a venda de ativos ou de participações (ajudado pelo banco BTG Pactual, com quem fez parceria em março) e rolar a dívida até conseguir aumentar a geração de caixa das empresas

2

Por que as ações caíram tanto?

O grupo não conseguir obter novos empréstimos para rolar suas dívidas, e o caixa das empresas ser usado para quitar dívidas.

Porque as empresas perderam credibilidade ao não entregar os resultados prometidos. A produção da petroleira OGX, o principal negócio, está 60% abaixo do previsto. Além disso, o endividamento é grande e a geração de caixa das companhias abertas é negativa.

Qual é o pior cenário para a EBX?

Fontes: analistas de mercado, executivos e ex-executivos do grupo EBX e Dealogic


Eike vai ser o homem mais rico do Brasil de novo? É pouco provável. As ações de suas principais empresas, a OGX e a mineradora MMX, estão mais de 90% abaixo do pico histórico. Além disso, é possível que ele tenha de usar parte do patrimônio para capitalizar algumas de suas companhias.

Quem ganhou dinheiro com Eike? Bancos de investimento (que receberam, ao todo, 510 milhões de reais com as aberturas de capital), investidores que souberam apostar na alta e na queda das ações (caso de fundos do banco Opportunity, que lucraram 40 milhões de reais em dois dias em 2012) e conselheiros e executivos do grupo, que receberam bônus milionários.

Quem perdeu? Investidores que compraram ações de empresas do grupo na abertura de capital ou perto do pico histórico e não as venderam.

tidores tinham fé na capacidade de execução do empresário e de sua equi­ pe. Quando essa confiança deixou de existir, tudo veio abaixo. Cada uma das fantásticas promessas de Eike foi ver­ gando sob o peso da realidade. Em 2006, ele anunciou que a MMX produ­ ziria 37 milhões de toneladas de miné­ rio de ferro por ano até 2011. Hoje, produz 7,4 milhões. A OGX extrairia 20 000 barris de petróleo por dia tam­ bém em 2011. Estamos em 2013 e o ritmo de extração não chega à metade disso. Não é à toa que o inferno astral do grupo de Eike começou no dia 26 de junho do ano passado, quando a OGX informou ao mercado que seu segundo poço de petróleo produtivo na bacia de Campos teria vazão de 5 000 barris de óleo ao dia, não os 20 000 es­ timados inicialmente. O mercado fi­ nanceiro sempre encarou Eike com um

em torno do qual o resto havia sido construído. A interligação entre os ne­ gócios do grupo, que tanto ajudou na hora de multiplicar o dinheiro de Eike e seus acionistas, torna a crise atual ainda mais difícil de resolver. O esta­ leiro OSX, por exemplo, foi criado pa­ ra fornecer plataformas de produção para a OGX. Até maio do ano passado (antes do fatídico 26 de junho, portan­ to), a demanda projetada até 2022 era de 48 plataformas. Um negócio e tan­ to, caso a petroleira não tivesse reve­ lado uma produção inicial pífia. Hoje, a OSX é dona de três navios-platafor­ ma — um em operação, dois em cons­ trução, além de uma plataforma com­ plementar, que opera acoplada a um dos navios. A empresa ainda precisa tomar emprestados 200 milhões de dólares para finalizar a construção da terceira plataforma e dar garantias ao

“Todos brigavam para dar boas notícias para ele”, diz um ex-funcionário. realistas e céticos eram escanteados misto de ganância e medo: embora o risco fosse alto, era possível ganhar muito dinheiro investindo nas ações de suas empresas. Após a decepção da OGX, o pêndulo oscilou para o lado do medo — e não voltou mais. No dia 27 de junho, as ações da companhia caí­ ram 25% e, nos meses seguintes, outros 70%. A OGX, que chegou a valer 75 bi­ lhões de reais dois anos atrás, hoje va­ le 5 bilhões. E o resto foi-se junto. É bem verdade que, para Eike, o oca­ so da OGX significa mais que o esto­ pim de uma crise de confiança. A em­ presa de petróleo era, afinal, a maior e mais promissora das companhias da EBX. Internamente, Eike e seus exe­ cutivos sonhavam com o dia em que a OGX valeria 100 bilhões de dólares. No auge, a petroleira respondia por 80% do valor de mercado das empresas do grupo. Além disso, aquele era o eixo

BNDES para liberar 600 milhões para a plataforma auxiliar. Mas está difícil. Recentemente, a OSX tentou captar 265 milhões de dólares, mas não con­ seguiu. Eike busca há meses resolver o problema vendendo o estaleiro para a Sete Brasil, empresa que produz pla­ taformas para a Petrobras. Até agora, a negociação não foi adiante. Excesso de otimismo

Executivos, ex-funcionários e amigos de Eike são unânimes ao afirmar que o empresário está sendo vítima de seu próprio excesso de otimismo — traço de seu caráter que transformou a EBX em terreno árido para executivos realistas. “O pessoal que foi trabalhar com ele tinha vindo de estatais, nunca ganhara dinheiro na vida. Todos brigavam para saber quem daria as melhores notícias para Eike”, diz um executivo do grupo. 1 de maio de 2013 | 39


capa | negócios Quem destoava acabava escanteado ou demitido. No caso da OGX, Paulo Men­ donça, geólogo vindo da Petrobras, ga­ nhou status de braço direito de Eike ao defender até o último momento as pro­ jeções mais ambiciosas — mesmo quan­ do o ceticismo dentro do grupo crescia. Mendonça acabou demitido após a de­ bacle do dia 26 de junho. Para os execu­ tivos do grupo, havia grandes incentivos para manter o clima artificialmente po­ sitivo nos anos de sucesso na bolsa: co­ mo sua remuneração era fortemente atrelada ao desempenho das empresas na bolsa, houve quem ganhasse dezenas de milhões de reais com a venda de ações. Com a crise, a busca por bodes expiatórios começou, e diversos execu­ tivos deixaram o grupo. Ao excesso de otimismo, aliou-se ou­ tra característica de Eike Batista — se beirava a genialidade na hora de vender um projeto, enchia-se de tédio na hora de executá-lo. Esse era um luxo que ele não podia se dar. Criar uma minerado­ ra como a MMX já seria trabalho sufi­ ciente. Mas, encantado com sua infali­ bilidade, Eike, em pouco tempo, tam­ bém era dono de petroleira, estaleiro, portos, uma empresa de entretenimen­ to e outra de energia térmica, um hotel de luxo, prédios, um restaurante, um time de vôlei, uma fábrica de chips, uma exploradora de carvão na Colôm­ bia e uma mineradora de ouro, entre outros. Segundo executivos próximos, essa multiplicação de projetos fez com que Eike não olhasse de perto nenhum deles e cometesse alguns erros de ges­ tão tidos como banais mesmo nas joias da coroa. Ele não tinha na OGX, por exemplo, especialistas em desenvolvi­ mento de produção, apenas em explo­ ração — ou seja, a empresa estava cheia de gente supostamente boa para achar petróleo, mas não havia quem fosse ta­ rimbado para dizer se valia a pena ou não tirá-lo de lá. Essa área é crucial, pois não basta achar petróleo — depen­ dendo do tipo, da quantidade e das di­ ficuldades de produção, a extração pode se tornar cara a ponto de não va­ ler a pena levar o projeto em frente. Na Petrobras, a equipe de exploração tra­ balha separadamente da equipe de de­ 40 | www.exame.com

O porto sudeste, no estado do rio: muitos projetos complexos ao mesmo tempo

Um raio x do grupo X

Quais são as empresas que derrubam o desempenho do conglomerado de Eike Batista, aquelas que ajudam a aliviar a barra — e as que são, por enquanto, apenas passatempo

as empresas que ajudam mpx

Empresa de energia elétrica e exploração de gás natural

Valor de mercado

5,2

bilhões de reais

Por que ajuda: Tem contratos de venda de energia a preço fixo, o que lhe garante receita por até 20 anos. E tem uma sócia para dividir os investimentos — a alemã E.ON

mmx Mineradora que tem capacidade para produzir hoje 11 milhões de toneladas de minério de ferro por ano (3,4% da Vale) Valor de mercado

1,7

Por que ajuda: Tem contrato de cinco anos para transportar minério de ferro da Usiminas. É dona do Superporto Sudeste, avaliado em cerca de 5 bilhões de reais

bilhão de reais

LLx

Companhia de logística que controla o gigantesco porto do Açu, no Rio de Janeiro

Valor de mercado

1,4 bilhão de reais

Por que ajuda: A demanda por novos portos é grande no Brasil. Empresas como a Petrobras e a finlandesa Wartsila já disseram que querem usar o espaço e os serviços do Açu


plataforma da ogx: a petroleira está no centro da crise do grupo de Eike Batista

jogo do rjx, time de vôlei de eike: excesso de empresas criadas tirou o foco do empresário

as empresas que atrapalham Empresa de petróleo e gás que tem 32 blocos no Brasil e na Colômbia

Valor de mercado

4,3

bilhões de reais

OsX

1,2 bilhão de reais

520

milhões de reais

auX

Por que atrapalha: 75% desses pedidos são da OGX e responderão por dois terços da receita da companhia. Precisa de investimentos para construir as encomendas

Por que atrapalha: Foi criada para o cenário de carvão a 110 dólares por tonelada — que hoje custa cerca de 75 dólares. Eike quer vender uma fatia de 30%, mas não chegou a um acordo

Mineração de ouro com reserva quatro vezes maior que a do Banco Central do Brasil

Valor de mercado

3

bilhões de reais

Empresa de entretenimento. Organiza campeonatos, administra estádios e licencia jogadores como Neymar

AVX Táxi-Aéreo REX Incorporadora. Foi criada em 2008, quando Eike comprou o tradicional hotel Glória para restauração

SIX Fábrica de chips em construção em Minas Gerais. Demanda investimento de 1 bilhão de reais

RJX

Mineradora de carvão que tem projetos na Colômbia

Valor de mercado

IMX

Empresa de táxi-aéreo. Presta serviços ao grupo EBX

Estaleiro e construtora de navios-plataforma, com carteira de 12 pedidos

Valor de mercado

ccX

Por que atrapalha: A dívida, de 8 bilhões de reais, é maior que o valor de todos os ativos, segundo o Deutsche Bank. Sua produção está 60% abaixo do previsto

Por que atrapalha: A empresa foi comprada para gerar lucros com a venda de participação majoritária ou uma oferta de ações — mas até agora a EBX controla a companhia

Time de vôlei masculino campeão brasileiro em 2013

Mr.Lam Restaurante chinês de sucesso. Todos os cozinheiros vieram de Hong Kong. Mas só tem uma unidade

Pink Fleet Navio que faz passeio turístico na baía de Guanabara. Não deu certo. Eike pode doá-lo à Marinha

brix Bolsa de negociação de contratos de energia no chamado mercado livre. Criada em 2011

NRX Empresa de catering. Seus clientes são EBX e MMX 1 de maio de 2013 | 41

FOTOS: divulgação; Dhavid Normando/Futura Press

OGX

O que é distração


capa | negócios senvolvimento de produção, porque uma precisa questionar a outra. Na opi­ nião dos principais especialistas do setor, a OGX cometeu um erro estraté­ gico: colocou as duas áreas sob a dire­ ção de Paulo Mendonça e, no afã de encontrar petróleo, saiu furando poços ao custo de 4 bilhões de reais. “Só em um bloco a OGX perfurou 34 poços. Outras empresas não chegam a dez perfurações”, diz Marcus Sequeira, analista do Deutsche Bank. complexidade

Para tornar as coisas um pouco mais difíceis, alguns dos projetos de Eike são de uma complexidade atroz. O Com­ plexo do Açu, no norte do estado do Rio de Janeiro, foi projetado para reunir o maior porto do país, um estaleiro e um complexo industrial numa área de 90 000 metros quadrados, equivalente a uma Manhattan e meia. No projeto, o porto deve embarcar e desembarcar 350 milhões de toneladas de carga por ano quando estiver em pleno funcio­ namento, em 2020 (o porto de Santos, o maior do país hoje, recebe cerca de 90 milhões ao ano). Juntos, dois termi­ nais poderão receber 47 embarcações simultaneamente, entre elas os maiores navios de minério em operação no mundo (hoje, eles só podem atracar num terminal da Vale no Maranhão). Tais dimensões tornariam o Açu o oi­ tavo maior porto do mundo. É claro que, num projeto dessa mag­ nitude, os desafios abundam. A ideia original era viabilizar o porto com um mineroduto da MMX, mas ainda falta muito para a obra ficar pronta. Para colocar o complexo em funcionamen­ to é preciso construir uma enorme infraestrutura — desde linha de trans­ missão de energia até estação de trata­ mento de esgoto —, que se soma a inú­ meras obras que correm ao mesmo tempo. O projeto da ponte que dá aces­ so ao cais precisou ser modificado quando os órgãos ambientais descobri­ ram na área uma espécie de lagarto em extinção. A ponte teve de ser ampliada de 2,5 para 3 quilômetros. Os 500 me­ tros adicionais foram construídos em terra, de modo que a ponte pudesse 42 | www.exame.com

Foi bom mas nao durou eiKE e O BRASIL DE LULA surfaram a mesma onda: o boom de commodities causado pela expansão chinesa. Para ambos, a euforia passou

N

o ápice de sua glória, Eike Batista chegou a acreditar — e a alardear — que estava próximo de ocupar o topo do mun­ do. Seria apenas questão de tempo, não muito, até galgar a posição de homem mais rico do planeta, dei­ xando para trás nomes como War­ ren Buffett, Bill Gates e o número 1, Carlos Slim. Sobre o mexicano, exaltando uma velha rixa particular entre latino-americanos, Eike dizia que a única dúvida era se a ultrapas­ sagem se daria pela direita ou pela esquerda. Ele não estava sozinho na megalomania. Era um tempo em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva “era o cara” nas palavras de

subindo como um foguete repre­ sentava uma nova visão do país­ sempre visto como um gigante adormecido em berço esplêndido. O Brasil, é certo, fez avanços impor­ tantes ao deixar para trás o passado instável. Criamos uma nova classe média. Mas vai ficando claro que, em larga medida, o Brasil e Eike fo­ ram temporariamente beneficiados pelo que foi chamado de superciclo das commodities: um prolongado aumento da demanda mundial de itens que vão de soja a minério de ferro, passando por petróleo e gás. A enorme bolha de consumo, infla­ da pela voracidade da expansão chinesa, elevou os preços e fez for­

A NOVA FASE EXIGE ALGO DE QUE O BRASIL ANDA CARENTE: CAPACIDADE DE GESTÃO E DE EXECUÇÃO DOS PROJETOS Barack Obama, cuja Chicago havia perdido para o Rio de Janeiro a dis­ puta para se tornar a cidade-sede dos Jogos Olímpicos de 2016. Até a criteriosa revista inglesa The Economist entrou na euforia e apostou que o Brasil havia dado uma arran­ cada para ser, de fato, uma nova potência global, com uma economia solidamente instalada num posto acima do ocupado pelo Reino Uni­ do. A imagem do Cristo Redentor

tunas entre fornecedores no mundo emergente. Provavelmente, nenhum outro empresário no planeta surfou tão bem essa onda quanto Eike. Ele aproveitou a fase de bonança como um vendedor serial de projetos de empreendimentos ligados às com­ modities nas bolsas de valores. O Brasil pós-crise global ainda man­ teve o mundo admirado com sua rápida recuperação e um cresci­ mento calcado no explosivo consu­


CHARLES DHARAPAK/AFP photo Ricardo Stuckert/Getty Images

NO TOPO DO MUNDO: no auge da euforia, o Rio de Janeiro levou a Olimpíada 2016 e Lula dava conselho a Barack Obama

mo interno impulsionado por cré­ dito e renda. Depois, o fôlego come­ çou a faltar. Com os preços das commodities em queda, a onda re­ fluiu e o nome do jogo mudou para algo menos inebriante: execução e entrega. Em outras palavras, gestão. O brilho brasileiro transmutou-se em insegurança dos investidores e desconfiança em relação ao futuro — certamente um novo exagero, mas é preciso reconhecer que com

motivos concretos: velhos proble­ mas estruturais sem solução e um ambiente que só fica mais compli­ cado para quem quer empreender. Eike escorregou, enquanto o mexi­ cano Slim se mantém no posto de maior bilionário do mundo. Não deixa de ser uma boa metáfora do momento atual, em que o México se consagra como a novidade a encan­ tar os investidores. Que o exemplo sirva, agora, para o Brasil se ligar.

passar por cima da área de restinga em que o lagarto vive (a obra foi finalizada em 2011). Atualmente, metade da linha de transmissão de energia que vai de São João da Barra a Campos está pron­ ta. Um dos maiores desafios da obra tem sido a abertura do canal para a en­ trada de navios. Ele terá 6,5 quilôme­ tros de comprimento por 300 metros de largura — numa região de mar aber­ to. Empresas como a montadora japo­ nesa Nissan e as siderúrgicas Ternium e Wisco pretendiam se instalar no Açu, mas os projetos não foram para a fren­ te. Outras como GE e Wärtsilä já assi­ naram contrato. Para tornar o comple­ xo viável, Eike negocia agora uma parceria com a Petrobras, que usaria o Açu como base para a exploração do pré-sal — o que é lido como uma forma de apoio do governo ao empresário. Em sua ciclotimia característica, o mercado financeiro tende a exagerar tanto no otimismo quanto no pessimis­ mo. Isso vale para o câmbio, para o pre­ ço de ações e também para Eike Batista. Na ascensão, seus defeitos foram igno­ rados. Agora, na queda, ignoram-se as qualidades do grupo criado por ele. Apesar dos tropeços recentes e das bar­ beiragens em diversas empresas, nin­ guém discute que alguns de seus proje­ tos têm muito valor. A elétrica MPX, por exemplo, já gera 9% da energia tér­ 1 de maio de 2013 | 43


capa | negócios mica do país, número que deve subir para 15% até o fim do ano — e, além de já ganhar dinheiro, não precisa de fi­ nanciamento para concluir seu plano de negócios atual. Assim como todas as outras empresas fundadas por Eike, a MPX saiu do zero. A mineradora MMX, se não se transformou na mini-Vale pro­ metida, é dona de um dos ativos de lo­ gística mais valiosos do país, o porto do Sudeste. Vizinho aos portos de Vale e CSN na baía de Sepetiba, no Rio, o por­ to deverá ficar pronto em 2013 e ajuda­ rá a escoar o minério do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais. Como os por­ tos de Vale e CSN estão lotados, as mi­ nas da região, entre elas a própria MMX, não têm como escoar sua produção. o futuro

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Vincent Thian/ap photo

Mohamed bin Zayed Al Nahyan, do mubadala: o fundo de Abu Dhabi é um dos sócios do grupo de Eike Batista

DANÇA DAS CADEIRAS

A rotatividade dos executivos nas empresas da EBX mostra a dificuldade de acertar o rumo dos negócios. Nos últimos três anos, o grupo trocou

22 9 9

Entre eles, estavam executivos, como

diretores

Paulo Mendonça

(ex-presidente da OGX)

GUILHERME escalhão (ex-presidente da MMX)

presidentes

conselheiros(1)

Eduardo Eugenio Gouveia (ex-vice-presidente da EBX)

Roger Downey

(ex-presidente da MMX)

(1) Não considera trocas em fim de mandato ou entrada de executivos em assentos desocupados Fontes: CVM e empresas

Marco Teixeira/Ag.O Globo; Julio Bittencourt/Folhapress; Lisa Wiltse/Getty Images; Aline Massuca/Valor

A crise atual pode levar Eike a que­ brar? Dificilmente. Primeiro porque é difícil imaginar uma situação em que os bancos endureçam tanto com suas empresas a ponto de fazê-las passar por um aperto tão grande. Para usar a definição tão em voga nos Estados Uni­ dos, Eike é “too big to fail”, ou “grande demais para quebrar”. Itaú e Bradesco, os maiores credores privados da EBX, têm cerca de 5 bilhões de reais cada um emprestados para Eike (boa parte desse dinheiro vem de repasses do ­BNDES. Nesses casos, o risco do em­ préstimo fica com o banco privado). Entre seus sócios estão grupos gigan­ tescos, como o fundo soberano Muba­ dala, de Abu Dhabi, e a multinacional General Electric. A situa­ção de curto prazo não é tão assustadora quanto parece. A OGX tem 1,7 bilhão de dóla­ res em caixa, o suficiente para termi­ nar 2013. Além disso, Eike se compro­ meteu a fazer um aporte de 1 bilhão de dólares caso a empresa precise de cai­ xa — o que pode ser necessário, já que as dívidas da empresa têm limite esta­ belecido no contrato com credores de 4 bilhões de dólares, e os investimen­ tos ainda são altos. O maior problema, no entanto, está na falta de perspectiva de futuro que a atual crise gera. Eike precisa de muito dinheiro para colocar de pé cada um de seus projetos. Apenas a OGX precisará de 22 bilhões de reais


MARCELO CORREA

graça foster, presidente da petrobras: negociação em andamento para que a estatal opere no porto de Eike

para segurar a equipe da petroleira ogx, eike está tendo de aumentar os salários de executivos em 54% até 2020. Dada a desconfiança reinan­ te e a pilha de promessas não cumpri­ das, ninguém consegue imaginar de onde ele vai tirar tanto dinheiro. Em abril, o BNDES liberou 935 milhões de reais para a conclusão do porto do Su­ deste. Mas não há banco estatal que aguente financiar tudo. É por isso que o plano do banco BTG Pactual é fazer o que está sendo cha­ mado de “liquidação organizada” dos ativos de Eike. Não é surpresa que o que há de melhor esteja passando à frente na fila. A venda de uma partici­ pação de 24,5% na MPX por 1,4 bilhão de reais foi a primeira. Segundo exe­

cutivos ligados ao grupo, estuda-se a venda de participações em outras sete empresas. O próprio André Esteves, presidente do BTG, disse em entrevis­ ta ao jornal O Estado de S. Paulo que Eike deverá, ao final do processo de reestruturação coordenado pelo ban­ co, ficar com participações acionárias muito menores — dos 60% a 70% atuais para entre 20% e 30%, disse. É impos­ sível saber qual será seu patrimônio nesse novo cenário. Mas é seguro dizer que os tempos em que ele ameaçava ultrapassar Carlos Slim (atual­homem mais rico do mundo) “pela direita ou pela esquerda” ficaram para trás.

O processo coordenado pelo BTG tem como outro objetivo simplificar a estrutura do grupo e diminuir o núme­ ro de empresas. O Hotel Glória é o pri­ meiro da lista de venda. As empresas de carvão e ouro também serão oferecidas. “É consenso que ele tem de vender ou fechar essas empresas, que tomam tem­ po e tiram seu foco do que é realmente importante”, diz um conselheiro de uma das maiores empresas da EBX. A crise do último ano está cobrando seu preço de Eike. Executivos da EBX dizem que o empresário, deprimido, não tem ido todos os dias à sede do grupo, no edifício Serrador, no centro do Rio de Janeiro. “A sensação é que ele está à espera de uma grande rees­ truturação”, diz um funcionário de Eike. Os executivos, que temem estar sendo monitorados, evitam falar sobre a situação das empresas ao celular. A crise está mudando também a forma de remuneração das empresas do gru­ po, tradicionalmente vinculada ao de­ sempenho dos papéis. Como pouca gente acredita numa virada grandiosa, Eike está tendo de aumentar o paga­ mento em dinheiro para segurar a equipe. A OGX propôs aumentar em 54% o salário dos executivos. “Está todo mundo procurando emprego”, diz um alto funcionário do grupo. O problema das revoluções, escreveu Joaquim Nabuco, é que sem revolucio­ nários não é possível fazê-las e com revolucionários não é possível gover­ nar. A frase resume bem o desafio pes­ soal que Eike Batista terá de enfrentar daqui para a frente. Será que ele, tão acostumado ao papel de criador de projetos grandiosos, terá as habilida­ des necessárias para administrar o en­ colhimento de seu império? Ninguém simbolizou tão bem quanto ele o Brasil dos anos de euforia, queridinho dos investidores, o país que crescia sem fazer sacrifícios, do presidente da Re­ pública que dava lições de capitalismo aos americanos. Hoje, aquele país pa­ rece perdido num passado distante. Talvez a queda de Eike Batista também seja uma metáfora destes novos tem­ pos. Para ele e para o Brasil, é hora de falar menos e entregar mais. n 1 de maio de 2013 | 45


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