V Seminário Leitura e Escrita na Educação Infantil

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V Seminário Leitura e Escrita na Educação Infantil – 31/10 a 01/11/2016 Liane Araujo

O Seminário teve como objetivo principal apresentar o projeto “Leitura e Escrita na Educação Infantil”, cujo material está pronto (por ora com uma tiragem pequena), bem como informar sobre como se chegou a ele e sobre seu processo de produção. O projeto foi uma iniciativa que reuniu uma equipe composta por professoras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), bem como profissionais da Coordenação Geral de Educação Infantil, que pertence à Secretaria de Educação Básica/Ministério da Educação. Nesse sentido, o Seminário foi uma espécie de “entrega”, de oficialização da finalização dessa etapa de produção do material. O material segue, então, para o MEC, dando-se continuidade às negociações a respeito da viabilização do projeto, que envolve não apenas o material em si mesmo, mas uma formação de professores de Educação Infantil da rede pública, de 120h, com duração de dois semestres. Com as mudanças na política nacional, no entanto, não se sabe ainda qual será o rumo dessas negociações. De início, o intuito da equipe era tornar esse projeto um programa do MEC, política pública nacional de leitura e escrita na Educação Infantil, nos moldes do que é o PNAIC para o ciclo de alfabetização. Segundo a coordenação do projeto, trata-se mais do que um material, mas de um projeto de formação, um projeto de Educação Infantil, de educação para a primeira infância, com foco na leitura e escrita. Nesse sentido, engloba, para além do material em si mesmo, as pesquisas que antecederam à produção do material (apresentadas na mesa redonda do segundo dia de Seminário), e a formação docente que o material pressupõe. O Seminário aconteceu nos dias 31/10 e 01/11, em Belo Horizonte/MG. Embora ligado à Universidade, o evento não ocorreu, como previsto, na FAE (Faculdade de Educação), devido à ocupação da UFMG pelos estudantes em protesto. A programação do Seminário propôs momentos de mesas redondas e momentos de debates, após as mesas. Os participantes ouvintes variaram de professores envolvidos na autoria e na leitura crítica do material, professores universitários em geral, representantes do MEC, representantes de institutos (Instituto C&A, CENPEC, Instituto Natura etc), estudantes da FAE, dentre outros. DIA 31 DE OUTUBRO - SEGUNDA–FEIRA

A MESA DE ABERTURA do evento, no dia 31/11, foi composta pela coordenação do projeto, Mônica Correa Baptista, Patrícia Corsino, Maria Fernanda Nunes e Vanessa Ferraz Almeida Neves; a consultora do projeto, Ângela Rabelo Barreto; uma representante do MEC, Valéria Resende e, em especial, a nova coordenadora da COEDI/SEB/MEC. A presença das representantes do MEC, nesse momento e durante todo o dia de evento, foi posteriormente significada pela coordenação do projeto como um indício positivo da disponibilidade do MEC em dialogar, negociar, discutir formas de viabilizar o projeto, ainda que o desenho inicial de abarcar todos os professores de Educação Infantil do Brasil não se efetive.


Após a mesa de abertura, deu-se início à MESA REDONDA intitulada “Leitura e Escrita na Educação Infantil: um tema em debate”, composta pelas professoras/palestrantes Ana Luisa Smolka (UNICAMP), Cecília Goulart (UFF) e Rita Maria Ribes Pereira (UERJ), todas participantes como autoras do material do projeto. A mesa abordou temáticas diversas envolvendo a cultura, a infância e a linguagem, que tangenciam a discussão sobre a leitura e escrita na Educação Infantil. Não se tratou, entretanto, diretamente, dessa discussão. Smolka reafirmou que a ontogênese é uma sociogênese e que, ao lado, do desenvolvimento cultural, o desenvolvimento psíquico entrelaça-se a essa dimensão sociológica, cultural. Enfatizou, assim, que a sociogênese das funções mentais forma-se nas relações sociais. Cecícila Goulart tomou a via da história da língua e da variação linguística para argumentar que essa questão é o nó cego da escola, que deveria ser espaço de discussão dessas variações, já que o Brasil constitui um “mosaico linguístico”. Ressaltou também os dois modos de brincar com a ficção e com a realidade, que é a literatura e a brincadeira de faz de conta, tomando-as como dois aspectos fundamentais nessa discussão sobre leitura e escrita na Educação Infantil: a literatura em sua dimensão de arte e a dimensão criadora da brincadeira simbólica. Lembrou ainda que a brincadeira compõe o que Vygotsky chamou de pré-história da escrita. Rita Ribes, por sua vez, ressaltou ainda mais a dimensão cultural, como lugar de pertencimento da criança. Nesse sentido, sublinhou que os adultos precisam contar às crianças o que a cultura já produziu, bem como o compromisso que temos em oferecer situações de experiências culturais às crianças, com os erros e acertos que disso possam advir. Ou seja, ela ressalta que quando oferecemos coisas às crianças, quando levamos propostas para a sala de aula, estamos fazendo escolhas – escolhas que não são neutras. Valorizamos alguns aspectos, silenciamos sobre outros...E precisamos estar atentos a isso e à cultura das crianças, ao como elas interagem com isso e o que elas produzem com e a partir disso. Após as falas das professoras, abriu-se uma rodada de DEBATE, com a interlocução com a plateia. No geral, foram questões de esclarecimento ou de aprofundamento de alguns aspectos abordados. À tarde, deu-se início à MESA REDONDA intitulada “Alfabetização, leitura e escrita: o que a Educação Infantil tem a ver com isso? Contribuições do projeto Leitura e Escrita na Educação Infantil”, com as falas das coordenadoras do projeto, a professora Mônica Correa Baptista (UFMG) e a professora Patrícia Corsino (UFRJ). Mônica iniciou sua fala estabelecendo a relação entre a identidade dessa etapa da Educação Básica e as concepções de aprendizagem, de educação, de infância, de educação da infância. Ressaltou que algumas questões já estão mais sedimentadas nesse campo da leitura e escrita na Educação Infantil, que já encontram mais consensos, e outras ainda estão sendo discutidas e constituem desafios para quem se debruça sobre esse campo, principalmente no que se refere ao modelo pedagógico. Falou também das representações que existem sobre ler e escrever na Educação Infantil, as expectativas da sociedade quanto à aprendizagem da leitura e escrita, abordando tanto as práticas que procuram adiantar as aprendizagens, já na Educação Infantil, seja por status de inteligência (classe média alta), seja pelo pânico do fracasso (classe menos favorecida), quanto as práticas que afastam a questão da língua escrita nessa etapa da educação. Chamou a atenção para uma indagação que, por vezes, ainda se tem: “se a Educação Infantil não é para preparar para o Ensino Fundamental, para que seria?”.


Então ela passou a analisar os aspectos que tornam essa discussão sobre o papel da Educação Infantil na apropriação da escrita e da leitura fundamental na atualidade, como a inclusão das crianças de 6 anos no Ensino Fundamental, a obrigatoriedade da Educação Infantil de 4 a 5 anos – interpretado por muitos como a obrigatoriedade da alfabetização – e a meta 5 do PNE de alfabetizar até o final do 3º ano. Abordou, igualmente, nesse sentido, a questão do recorte etário. Denunciando tanto a perspectiva de antecipação e mesmo de preparação para o Ensino Fundamental, que põe a centralidade do trabalho da Educação Infantil nas questões relativas à linguagem escrita, quanto a perspectiva que preconiza que as questões relativas à linguagem escrita são incompatíveis com a Educação Infantil, Mônica reafirmou que há muitas gradações entre essas perspectivas opostas e extremas. Ressaltou que é preciso conhecer as práticas e representações das professoras, quanto a isso, para, de fato, poder pensar junto com elas o papel desse segmento nessa questão. A partir de slides com fotos de sala de aula ou de escritos presentes nas escolas – do contexto da pesquisa que fizeram – mostrou que, na prática, essas perspectivas se mesclam. Observam-se práticas espontaneístas que se mesclam com atividades de preparação para a alfabetização; práticas que se dizem referenciadas nas DCNEI, mas que não têm as brincadeiras e as interações como eixo; poucas práticas realmente adequadas; indiferenças quanto ao que as crianças falam e fazem; perguntas às crianças apenas de checagem de informações; memorização de letras isoladas, cópia, estudo de uma letra por dia, ordenação de letras; centralidade de aspectos formais da escrita e professores que acham que trabalhar a linguagem escrita é apenas trabalhar a escrita alfabética; escritos pela escola com estética infantilizada; literatura sendo usada para ensinar letras, refletir sobre os sons de forma descontextualizada; livros de literatura classificados por critério de temas escolares que supostamente trabalham (ex. índios, cores, números, natureza...)... Observou-se, nessas pesquisas, pouco trabalho com as culturas da infância e a interação entre pares. Patrícia Corsino, por sua vez, enfatizou, justamente, que é necessário outra concepção de linguagem para dar conta de mudar as práticas que envolvem a linguagem oral e escrita na Educação Infantil, e trouxe elementos da concepção dialógica e discursiva de Bakhtin, que fundamenta o projeto, lembrando que essa concepção tem a linguagem como constituinte do sujeito, e que se relaciona às interações e à constituição do pensamento e da consciência. A imersão na cultura escrita, assim, é participação ativa dessa cultura, pertencer a ela, tomar parte no processo interlocutivo. Um ambiente alfabetizador seria, então, isso, e não letras penduradas no mural. O que adianta o abecedário – indaga ela – se isso não faz sentido para as crianças, nessa perspectiva mais ampla? A prática pedagógica, ela diz, faz parte da corrente ininterrupta da comunicação verbal, ouvir e falar faz parte do processo interlocutivo, entretanto, constata-se que, na escola, é frequente haver a assimetria das vozes e até o silenciamento. Defende que não se trata de dar voz às crianças, pois elas já têm voz – a questão é escutar, de fato, as crianças, suas vozes. Trata-se de olhar os sujeitos e seus processos, não de olhar os conteúdos em si mesmos. Patrícia passou a falar, então, do que cabe à Educação Infantil, que seria desenvolver atividades no sentido de ampliar o universo de referências culturais e artísticas das crianças, suas formas de expressão, suas possibilidades narrativas, de criação ficcional e o uso da linguagem para imaginar; promover situações de apropriação de diferentes discursividades da linguagem escrita, de práticas de leitura e escrita e gêneros textuais no interior dessas práticas, suas finalidades, estilos composicionais e estrutura; ampliar o repertório cultural, linguístico e literário, com a tradição oral e


a literatura (em que a linguagem tem outro modo de dizer); ampliar as capacidades leitoras, como leitor ouvinte e leitor autônomo (folhear, ler por imagens, contar a partir do livro); ampliar a compreensão da escrita como forma de enunciação, comunicação e expressão; ampliar as possibilidades de articular a linguagem escrita e as brincadeiras, dramatizações, artes visuais, cinema, dentre outras linguagens; se envolver com a leitura e escrita no contexto de brincadeiras; ampliar seus interesses pela escrita e o desejo de ler e escrever, como ser pertencente à cultura, à cultura escrita. Patrícia ressaltou também, antes de apresentar o material, volume por volume, a formação de professores como uma formação cultural, de ampliação de referências culturais, que articula ciência, arte e vida – conforme o próprio Bakhtin articula. Concebendo a formação como espaço dialógico de troca entre professores e como construção de autoria e autonomia docente, ela ressaltou essa característica do material do projeto. Os cadernos, embora escritos para o professor e não para interlocutores acadêmicos, têm consistência teórica e dá crédito aos autores utilizados como referência, para que os professores possam se aprofundar nos estudos, se quiserem, relacionando mais consistentemente teoria e prática. O material traz, assim, um texto de referência e indicações de desdobramentos que podem provocar os professores a querer saber mais sobre aquela discussão em foco. Após essa enunciação da perspectiva de formação, Patrícia apresentou, então, a estrutura do material: os dez cadernos, sendo um de Apresentação do material e do projeto, oito cadernos temáticos e uma caderno direcionado às famílias, buscando essa parceria família-escola na formação leitora das crianças. No DEBATE, após a mesa redonda, alguns aspectos foram perguntados e discutidos, como o esclarecimento de que o projeto não se resume à disponibilização do material, mas requer uma formação; a possibilidade da continuidade do projeto no MEC; as formas de disponibilização do material (será disponibilizado no site do MEC? Basta os PDFs dos cadernos? Tem chance de virar uma formação EAD?); a possibilidade de interlocução do projeto com os anos iniciais do Ensino Fundamental; a necessidade de que o campo da leitura e escrita tenha um diálogo com o currículo e não apenas uma “hora da leitura e escrita”; os diálogos desse material com a Base Nacional Curricular (Zilma Ramos de Oliveira, que faz parte da construção da Base, estava presente no evento, e foi referida); a discussão acalorada sobre o corte etário ter relação com a pressa em alfabetizar as crianças. Quanto ao material e à formação, sublinhou-se uma vez mais que o material pressupõe uma formação dos professores de Educação Infantil e que não é uma formação simples, pois implica em mudanças de concepção. A formação proposta no material é de 120h. A tiragem inicial do material foi pequena (800), e a equipe está agora na fase de diálogo com o MEC, através da COEDI, para ver os rumos do projeto. Com as mudanças na política nacional, não se sabe ainda qual rumo será dado ao material, embora a equipe pontue a intenção do MEC em pautar essa discussão. De início, o intuito da equipe era que o projeto pudesse se constituir como um programa de formação do MEC, política pública nacional de leitura e escrita na Educação Infantil, nos moldes do que é o PNAIC para o ciclo de alfabetização. Não sendo possível, esperam a posição do MEC quanto às possibilidades de sua viabilização. Certo é que o desejo da equipe é que as Redes se envolvam na formação e não que um ou dois professores levem, individualmente, o projeto para dentro da escola. Nesse sentido, a equipe ainda se mostrou reticente a pensar em alternativas outras – como articulações com certas Redes de certos estados, articulações com Universidades, Institutos, etc. Querem insistir ainda com o


MEC, sob o argumento de esgotar as possibilidades lá primeiro, e de que as crianças, seja lá sob que governo forem, são as mesmas...e merecem essa disposição à negociação. No segundo momento da tarde, após intervalo, deu-se início à MESA REDONDA intitulada “Pesquisa Leitura e Escrita na Educação Infantil – Práticas Educativas” e “Pesquisa Leitura e Escrita na Educação Infantil: Estado do Conhecimento (1973-2013)”, com as outras duas coordenadoras do Projeto, Maria Fernanda Nunes (UNIRIO) e Vanessa Ferraz Almeida Neves (UFMG). Essa mesa teve como foco a apresentação de duas pesquisas que culminaram com o material ora apresentado, uma com foco nas práticas educativas, outra com foco na produção acadêmica. De início, Vanessa apresentou-se a “Pesquisa Leitura e Escrita na Educação Infantil: Estado do Conhecimento (1973-2013)”, que objetivou trazer o estado do conhecimento quanto à produção acadêmica no campo da leitura e escrita na Educação Infantil, mapeando os estudos sobre concepções, práticas e tendências do campo. O levantamento foi controlado por diversos critérios, em bancos de dados científicos, no recorte, justificado, de 1973 a 2013. A pesquisa nos bancos acadêmicos trouxe alguns dados quantitativos que permitiram algumas interpretações ou indagações qualitativas, quanto ao interesse crescente pelo tema. Uma segunda fase da pesquisa, para aprofundar ainda mais, seria a leitura dos resumos dos 397 documentos registrados nesses 40 anos, com foco no tema (a partir dos critérios adotados). Discutiu-se, aí, que outros critérios poderiam aumentar esse número, como a ampliação das bases pesquisadas e das Universidades consideradas – considerou-se apenas as mais conceituadas nos critérios da CAPES. A segunda pesquisa apresentada, “Pesquisa Leitura e Escrita na Educação Infantil – Práticas Educativas”, foi, dessa vez, sobre práticas nas escolas. Essa pesquisa, inicialmente abarcando as “boas práticas”, terminou por registrar também as práticas não muito adequadas. Por meio de fotos de várias situações de escrita ou de escritos nas escolas e salas de grupos de Educação Infantil, Maria Fernanda apresentou as linhas gerais da pesquisa. Vários questionamentos sobre práticas referentes à linguagem escrita – desde questões mais amplas de leitura literária, até questões mais específicas, como a oportunidade de brincar com a língua e os jogos de linguagem (rimas, aliterações) – deram origem a entrevistas com professores e roteiros de observação nas instituições de Educação Infantil. O objetivo dessa mesa redonda foi mostrar um pouco das pesquisas atreladas a esse projeto, pois o projeto, além de culminar em um material, que requer uma formação, também envolve pesquisas acadêmicas. O DEBATE, após a mesa, foi de esclarecimentos sobre as metodologias de pesquisa, sobre os critérios para o levantamento nos bancos de dados – questões mais da academia mesmo. DIA 01 DE NOVEMBRO - TERÇA–FEIRA

No dia 01/11, o evento começou com o bate-papo com a ilustradora Graça Lima, também autora de livros de literatura infantil e responsável pelo design gráfico do material do projeto – que contou igualmente com ilustrações de Mariana Massarani e Roger Melo. O bate-papo, mediado pela professora Celia Abicalil Belmiro (UFMG), intitulou-se “Leitura, escrita e formação de professoras da Educação Infantil: o que os ilustradores têm a dizer sobre isso”. A conversa versou sobre vários assuntos, com a participação da plateia, mas o foco foi na ilustração como arte, sua relação com a narrativa, o texto verbal, o diálogo texto/ilustração, o grau de liberdade do ilustrador ao ilustrar narrativas literárias, as diferenças entre ilustrar livros infantis – em que há mais liberdade criadora do ilustrador para dar sua versão da história contada verbalmente – e ilustrar um material como esse – em que o ilustrador precisa estar a serviço de um discurso. Graça falou também do processo de


produção e da relação com os outros dois ilustradores. Abordando a questão do uso da literatura para discutir temas ou analisar a língua, discutiu-se também tanto sobre o pólo “matar a literatura, sua a dimensão artística e estética” quanto o pólo “sacralizar a literatura”. Após esse bate-papo, em apoio ao projeto e empenhados em gerar encaminhamentos para que o mesmo possa se efetivar, representantes de Fóruns de Educação Infantil fizeram circular um documento com proposições a respeito do projeto, e pediram a palavra, tendo como interlocutores a equipe coordenadora do Projeto, a plateia e a representante da COEDI/SEB/MEC, ainda presente no Seminário. Segue anexo (abaixo) foto do documento. Em seguida deu-se início à Arena de discussão: “Com a palavra as autoras, as leitoras críticas e as Pesquisadoras”, uma conversa com os profissionais que participaram da elaboração dos textos que integram a Coleção Leitura e Escrita na Educação Infantil, e os profissionais que realizaram as leituras críticas dos mesmos. O processo de produção e de revisão crítica foi explicitado, sublinhando-se a demanda de que o texto não fosse acadêmico, que o interlocutor fosse o professor da Educação Infantil, que o texto dialogasse com a prática. Cada autor contribuiu, além do texto teórico, com sugestões para a formação e indicações de aprofundamento teórico e de material. Outro cuidado que ressaltaram foi o de não tornar o material uma prescrição e de ter dois leitores críticos para cada texto – um leitor acadêmico e um leitor ligado à prática. Ressaltou-se, nesse momento, novamente, que o material tem a necessidade, mesmo assim, de uma mediação – ou seja, da formação a ele atrelada. O material, inclusive, se estrutura pelas unidades da formação, cada uma dividida em elementos estruturantes comuns, que apontam para essa formação. O caderno de Apresentação traz os objetivos, estrutura e metodologia (em linhas gerais) do curso, bem como sugestões de modalidades de atividades individuais e coletivas de formação (como registros, grupos de estudo ou leitora), informando ainda sobre carga horária, avaliação e certificação. Não vi, nessa Apresentação, muito definida a estrutura da formação – se um modelo em rede, em pirâmide, com a Universidade como formadora de formadores, ou se outro modelo, ou se está em aberto para ser definido em um momento posterior. O material fala apenas em momentos de estudos individuais e coletivos e em momentos presenciais de formação – mas não o modelo dessa formação, a natureza dos formadores e o funcionamento dos encontros. À tarde, na Mesa Redonda “Projeto Leitura e Escrita na Educação Infantil: uma proposta para a formação de professoras da Educação Infantil”, o modelo de formação e o material foram apresentados por Ângela Barreto, consultora do Projeto Leitura e Escrita na Educação Infantil, com a participação de coordenadores de programas de formação continuada de professoras da Educação Infantil. Além de apresentar várias políticas e programas de formação, especialmente as que contam com redes de formação em parceria com as Universidades (como o Proinfantil, Especializações e Aperfeiçoamentos em Educação Infantil), que têm, segundo ela, oferta limitada e processos morosos, apresentou também o PNAIC e PNAIC Ensino médio como alternativas interessantes de formato de formação, por terem oferta universal, atribuições pactuadas, material didático próprio, bolsas para cursistas. Esse era o modelo que queriam, as condições que almejavam também para a Educação Infantil, mas agora precisam ver o que será possível. O Projeto caminhou ao lado de uma possível proposta de Pacto na Educação Infantil. Ângela passou, então, a apresentar, de forma mais detalhada (embora corrida, devido ao horário e aos atrasos), o material, que, como já dito, compõe-se de um caderno de Apresentação, de um


encarte voltado para a família, e de oito cadernos temáticos. Cada caderno traz três unidades, cada uma com um texto de referência, de um ou vários autores. Ou seja, o curso compõe-se de 24 unidades, 3 por caderno (ver anexo foto do descritivo das unidades de cada caderno). Os temas dos cadernos são: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8.

Ser docente na educação infantil: entre o ensinar e o aprender Ser criança na educação infantil: infância e linguagem Linguagem oral e linguagem escrita na educação infantil: práticas e interações Bebês como leitores e autores Crianças como leitoras e autoras Currículo e linguagem na educação infantil Livros infantis: acervos, espaços e mediações Diálogo com as famílias: a leitura dentro e fora da escola

Cada um desses cadernos tem uma estrutura comum, já relacionada à formação (estrutura das unidades):       

Iniciando o diálogo (introduz o tema e os objetivos do cursista ao final da unidade) Corpo do texto/Unidade (texto teórico que desenvolve as ideias e conceitos) Compartilhando experiências (atividades desenvolvidas por professores em contextos educativos concretos, ilustrando os princípios abordados na unidade) Reflexão e ação (propostas de atividade para reflexão sobre a temática e indicações de situações práticas que podem ser desenvolvidas com as crianças) Aprofundando o tema (indicações de textos impressos, filmes ou vídeos que complementam os estudos e devem ser lidos ou assistidos pelo cursista, com questionamentos a serem respondidos) Ampliando o diálogo (Sugestões de outros textos como leitura complementar, bem como filmes e vídeos. Inclui sinopses ou ficha técnica dessas referências) Referências (Referências completas dos documentos citados no texto)

DEBATE: O debate após a mesa concentrou-se, novamente, nos questionamentos quanto à viabilização do projeto, sua continuidade, suas possibilidades de chegar aos professores da Educação Infantil, efetivamente, e indagações sobre o que o MEC fará com isso, já que será difícil assumi-lo integralmente. O MEC irá comprometer-se com a impressão e distribuição para as prefeituras cuidarem das formações? Elas têm como? Algum envolvimento das Universidades? Formação em plataforma EAD? Essas perguntas envolvem, porém, muitas questões...o envolvimento das Universidades, por exemplo, extrapola a questão do formato em pirâmide e a validação acadêmica da formação, envolvendo também a questão da descentralização de recursos. Enfim, são muitos aspectos. A questão da EAD também foi discutida, pois o material não foi elaborado com essa perspectiva, teria que ser outro material, pensado desde o início nesses termos, próprio para essa modalidade de formação. As indagações do debate, recorrentes durante todo o evento, mostram que essa expectativa quanto à viabilidade do projeto é o nó que mobiliza e angustia a todos. A equipe do projeto voltou a sinalizar que antes de qualquer discussão sobre os rumos do projeto, querem negociar a possibilidade de o MEC se responsabilizar pela formação, já que, mesmo entendendo que a situação não está favorável, o desejo é de universalização dessa formação. E, para isso, é com o MEC que precisam negociar – o MEC financiou a produção, agora esses rumos precisam ser discutidos lá. Sabem que é uma negociação difícil, diante do momento político e da crise do país, mas têm a intenção de continuar nessa interlocução via COEDI. Alguns participantes ficaram indignados, pois achavam que o propósito do Seminário era justamente pensar alternativas, viabilizar


diferentes formatos e processos alternativos de formação, já que os rumos do governo não são muito favoráveis a essa continuidade do projeto. Alguns, mais radicais, questionaram isso de precisar do aval do MEC. Outros, mais ponderados, se colocaram a favor de fazer resistência para fazer os governos assumirem a formação. Uma comissão foi formada, com diversos profissionais que se voluntariaram, para compor uma relatoria com essas questões que surgiram durante o evento, além de levantar pontos propositivos, tendo um papel reivindicatório junto ao MEC. Aos mais radicais que se questionaram se queremos trabalhar com o governo que aí está, Mônica Baptista foi firme, encerrando a discussão dizendo que as crianças desse governo são as mesmas do anterior e do seguinte, e que precisamos lutar com as armas que temos – e nas fissuras podem surgir possibilidades. Com essa fala, foi dado o encerramento do Seminário. Trago, por fim, algumas poucas impressões minhas. Não falo aqui do lugar de quem foi pelo Paralapracá, com essa visão, mas como alguém dessa área de linguagem e de formação. Quanto ao material: Apesar do contato breve e sem leitura mais ampla, deu para perceber que a qualidade do material é inquestionável. A meu ver, traz uma perspectiva cultural, dialógica e discursiva consistente e necessária. Entretanto, embora os temas e os textos pareçam muito bons e tenha sido sublinhado que o material subtende uma formação, a densidade teórica dos textos em relação à carga horária de formação me pareceu um fator a ser analisado. Apenas folheamos o material, então não posso dizer ao certo, mas deu a impressão de que seria necessário um trabalho importante de transposição do formador ao professor e dos professores às crianças, já que o próprio material não traz essa conversa mais direta com o professor. Lembrando do material do Paralapracá, há uma diferença grande nisso de que o material, nesse caso, fala diretamente com o professor e traz uma abordagem formativa muito relacionada à prática. Lógico que há vantagens em ter um aprofundamento teórico, isso é rico também. Mas pensando na formação do professor, me pareceu que demanda um degrau intermediário que, talvez, tenha que ficar a cargo do formador, já que o próprio material não se organiza dessa forma. Do mesmo modo, não pude ter certeza de que para tal densidade, a carga horária do curso seja suficiente. Quanto à concepção de leitura e escrita na Educação Infantil De modo geral, pelo que consegui perceber folheando o material, e também conhecendo muitos dos autores que o produziu, ele traz concepções bem fundamentadas e contemporâneas de linguagem, de aprendizagem e de formação, estando afinado, no geral, com a minha forma de ver a questão. Nada a dizer sobre os posicionamentos quanto à leitura e escrita como práticas socioculturais que dizem respeito às crianças pequenas, quanto ao papel da Educação Infantil na inserção das crianças na cultura escrita e na apropriação da língua escrita, bem como quanto ao lugar da leitura literária na formação leitora das crianças. Entretanto, pelas falas no evento e por uma visada bem geral nos cadernos, observo ainda que há certa hesitação, certo engasgo, em relação aos aspectos relativos à reflexão fonológica, vistos ainda com reservas, sob uma aura de trabalho sistemático e mais mecânico, escolarizado. Pareceu-me faltar, ainda, nesse sentido, uma perspectiva de reflexão fonológica articulada à brincadeira com a


linguagem, com os textos poético-musicais da tradição oral, a poesia, numa visão cultural e articulada ao brincar. Reconhecem que a aprendizagem da notação escrita também passa por esse aspectos – que é um aspecto, não O aspecto, lógico – mas ainda vendo essas questões mais linguísticas, e fonológicas em particular, como algo a ser respondido pelo professor quando a criança indaga, uma intervenção pontual, no contexto das práticas dialógicas, não como uma ação planejada e sistemática para todas as crianças (posição expressa por Patrícia Corsino). Penso ser necessário aí uma discussão sobre os processos epilinguísticos que podem estar em jogo nas situações de brincadeira com a linguagem – algo que é frequente e inerente à cultura lúdica infantil e às práticas de oralidade, mas que também se relaciona com a dimensão sonora da língua e com as apropriações da notação escrita. Penso ser importante o professor tomar consciência disso, saber os aspectos que estão em jogo nesse brincar com a língua. Podemos nos apropriar dos conhecimentos da psicologia cognitiva da leitura, quanto à reflexão fonológica, e ressignificá-los no âmbito de uma perspectiva discursivas, sociointeracionista, construtivista, ou o que seja, pela via da cultura – da cultura lúdica infantil. Assim, desde os bem pequenos, esses aspectos podem estar ali presentes, apenas por favorecermos às crianças brincadeiras com a linguagem, brincadeiras cantadas, parlendas, etc, nas quais a atividade epilinguística se apresenta, até as aproximações das atividades metalinguísticas mais elaboradas, aos 5 anos, por exemplo, quando já podem observar e produzir palavras que rimam com seus nomes próprios, observar na escrita o pedaço que se assemelha oralmente, comparar palavras faladas pelo tamanho etc, em situações lúdicas, letradas e sem ferir os princípios da Educação Infantil. Não olhei o material integralmente e com calma, mas vi esses gêneros orais serem abordados como cultura lúdica e prática de oralidade – especialmente no caderno sobre bebês, com os acalantos. Mas não vi menção a esses gêneros favorecerem apropriações da dimensão sonora da língua que, querendo ou não, propiciam a apropriação da notação escrita. É como eu penso. Posiciono-me aqui desse lugar de quem defende isso. Talvez uma diferença em relação à concepção deles. Não sei. Preciso ver os cadernos com calma para afirmar com certeza. Mas quis registrar. Acho que há melindres em relação a essa questão, como ainda há também pouca firmeza em relação à escrita em geral. A leitura está mais consolidada. Penso, nesse caso, que o conceito de eventos de letramento ajuda muito a refletir sobre as situações de leitura e escrita na Educação Infantil – inclusive nos contextos de interações e brincadeiras. Mas o que vi foi certa evitação, também, a usar o termo letramento. Não sei no material, mas nas falas. Enfim, por ora essas foram as minhas impressões que, como eu disse, queria registrar para vocês. Depois de ler o material, certamente, terei outras tantas a acrescentar. Agradeço, novamente, o convite para participar do Seminário e pela confiança também. Lica Ver anexos abaixo


Anexos:

Figura 1 - Carta dos Fóruns de Educação Infantil

Figura 2 - Descritivo dos Cadernos e suas Unidades


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