7 minute read

Luiz Carlos Iasbeck por Gerson Luiz Scheidweiler Ferreira

Um orientador vigoroso: Luiz Carlos Iasbeck

por Gerson Luiz Scheidweiler Ferreira

Advertisement

Em 2015, um grupo de pesquisa da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, com apoio de outras instituições, lançou o livro O Professor Universitário Entusiasmado – Seis estudos sobre uma espécie em extinção. O estudo incluiu a aplicação de mais de 450 questionários entre estudantes concluintes de cursos de graduação para buscar compreender o perfil dos docentes que carregam valores e possuem práticas que estimulem o processo de aprendizado. Nos questionários, os estudantes indicavam exemplos de professores que se encaixavam nesse quadro. Luiz Carlos Iasbeck – pós-Doutor em Comunicação pela Universidade Católica de Lisboa – foi um deles, por isso o convidamos para responder quais os limites e as possibilidades de um processo de orientação acadêmica.

No atual contexto educacional e tecnológico, qual o papel e a importância do orientador no processo de investigação acadêmica?

O papel do orientador no atual contexto não diverge em nada do papel de orientação em outros contextos educacionais e tecnológicos. O que varia são as formas de atuação. O papel continua sendo orientar, sugerir balizamentos para a investigação, alertar sobre desvios ou atalhos importantes, sugerir leituras, criticar a produção do orientando e ajudar a resolver impasses da pesquisa.

Quais são os limites de uma orientação? Até onde vai a atuação do orientador?

O orientador pode e deve acompanhar o trabalho do orientando, sugerindo melhorias, aprimoramentos. Não pode e não deve exigir dele o que ele não consegue alcançar, apesar de que deve estimular nele a ampliação de seus limites como pesquisador. Não pode interferir no estilo de redação e muito menos escrever para ele trechos do trabalho escrito. Pode participar da pesquisa empírica, em comum acordo, mas não é função do orientador trabalhar para o orientando. Não deve e não pode fazer a revisão dos textos. O orientador precisa receber textos revisados para fazer o seu trabalho. Textos mal redigidos, de leitura difícil, devem ser rejeitados pelo orientador.

Embora não caiba nas funções do orientador ser um terapeuta psicanalítico, muitas vezes precisa saber tolerar a necessidade de o orientando expressar suas angústias em relação ao trabalho.

Não é necessário que mantenha relações de amizade com o orientando. Em alguns casos essa mistura de naturezas de relacionamento chega a ser nociva e até mesmo constrangedora, quando não comprometedora. O relacionamento deve se pautar pelo profissionalismo.

Os horários de orientação devem ser predefinidos e ajustáveis. Eventuais contatos fora dos horários acordados podem e devem ser permitidos, sempre como exceção, nunca como regra.

Como você percebe quando uma orientação foi bemsucedida?

Uma orientação bem-sucedida pode ser mensurada pela apreciação da banca, primeiramente. A satisfação do pesquisador, a obtenção dos resultados almejados, a abertura para novas explorações e sobretudo os reflexos nas práticas cotidianas (a aplicabilidade dos resultados) são fatores de satisfação e, portanto, indícios de uma orientação bem realizada. Entendo que a boa orientação deva ser mais vigorosa do que rigorosa.

Uma orientação que se oriente pelo rigor do método ou pelo acerto estrito às demandas do orientador tende a engessar a criatividade do orientando, sendo, portanto, nociva. Uma orientação que se paute no estímulo à criatividade, na motivação pelas descobertas e inovações, ainda que fuja dos rigores do cânone metodológico, é mais produtiva do que aquela que se conserva estritamente nos limites da cientificidade.

O que é uma orientação que fracassa?

Uma orientação fracassa quando o diálogo entre orientador e orientando é dificultado ou inviabilizado, seja por questões de falta de empatia, desconfiança ou competitividade. Em suma, quando há indisposição mútua para a cooperação.

Outros elementos podem interferir para que uma orientação seja malsucedida, uma delas a imposição do orientador acerca da vertente teórica a seguir pelo orientando. Normalmente os orientadores tendem a sugerir ao orientando aquela linha que ele conhece e na qual é mais seguro. Compreensível, mas nocivo para a pesquisa. Melhor encaminhar o orientando para outro orientador.

Outra atitude nociva é o orientador desdenhar (e inviabilizar) das demais opções metodológicas. Como oriento na linha da Semiótica, uma área vista com menos simpatia por muitos orientadores, é comum receber orientandos “desprezados” por outros orientadores que não admitem essa linha teórica (porque não a conhecem ou conhecem mal) como possibilidade de pesquisa.

O processo de orientação de pesquisas em Comunicação, na sua opinião, possui diferenças se comparado com outras áreas do conhecimento?

Comunicação é uma área multidisciplinar, um lugar de convergência de diversos saberes. Por isso mesmo é a área que deve reger essa conversa entre diferentes disciplinas. Essa talvez seja uma das principais diferenças a acentuar. Como área de concentração de diferentes saberes, ela deve contemplar epistemologias diferenciadas e muitas vezes paradoxais, até mesmo contraditórias. Isso provoca discussões e debates muito produtivos, impossíveis de surgir em cada área positivamente considerada. Devemos estimular esse tipo de debate e motivar os alunos a buscarem conhecimentos em áreas afins ou correlatas, ainda que divergentes e antagônicas.

Que diferenças você identifica entre o processo de orientação de um estudante de graduação e de um estudante de pós-graduação?

O estudante de graduação ainda é um aluno que assiste aulas e busca aprender com o professor. O estudante de pós-graduação é um investigador, que se serve dos subsídios das aulas para promover sua pesquisa. Isso significa que o aluno de Pós precisa de autonomia e

independência para trabalhar, ao passo que o aluno de graduação precisa de uma assistência mais estreita e pedagógica.

Ambos, porém, precisam entender que não estão trabalhando para o orientador mas para a ciência, desprendendo-se do vício “infantilóide” de trabalhar para alguém que o supervisiona ou que avalia seu trabalho. Trabalhar para avançar o conhecimento é a meta de pessoas que pesquisam com maturidade e profissionalismo.

Evidentemente, alguns orientadores não gostam disso porque assim temem perder o poder de ascendência sobre seus orientandos. Talvez por isso estimulem a obediência e o cumprimento rigoroso de suas orientações. Isso é péssimo para a formação de um pesquisador, mas às vezes providencial para as necessidades pessoais de poder do orientador.

Saber lidar com a autonomia do orientando, inclusive estimulando-a sempre, é uma das principais virtudes do orientador, no meu modo de ver. É assim que acredito e é assim que trabalho.

Como funciona sua dinâmica de orientação de trabalhos acadêmicos?

Como disse, trabalho estimulando a autonomia e a independência do orientando. Muitos não gostam, preferem um orientador paternalista e autoritário. Geralmente não aceito esse último tipo de orientando. E quando sou obrigado a aceitar, não cumpro as expectativas deles.

Marco um primeiro encontro, no qual coloco as linhas gerais da orientação, discutimos o objeto de pesquisa e as possibilidades de abordagem.

A seguir, peço que o orientando esboce um sumário tentativo da dissertação, ou seja, que sonhe com um índice do trabalho finalizado: os capítulos, itens, subitens etc. Um exercício livre, de futurologia e de imaginação. É com base nessa “viagem” do orientando que vamos começar a dar forma à organização da pesquisa.

A partir daí estabelecemos alguns prazos e novos encontros. Caso o orientando não compareça ou não cumpra o acordado, eu não o procuro nem cobro. A responsabilidade pelo cumprimento do acordo e pelas consequências do não cumprimento é dele. Faz parte do princípio da autonomia e da liberdade, combinado no primeiro encontro. Gosto também de estipular o tempo gasto na orientação presencial. Geralmente 90 minutos, no máximo.

Que sugestões você daria para aprimorar a relação entre um orientador e seu orientando no processo de investigação científica?

Minhas sugestões de atitudes para o orientador são as seguintes: empodere ao máximo o orientando; evite atitudes paternalistas; busque profissionalismo nas relações, evitando intimidades; privilegie o vigor ao rigor; valorize os pontos positivos do orientando; não revise seus textos; exija que seja entregue texto escrito após cada fase cumprida, pois geralmente há muita conversa e pouca escrita; não exija o comparecimento do orientando, é ele quem precisa se interessar e buscar sua orientação, faz parte da “pedagogia” do adulto; nunca deixe um con-

tato sem resposta; exija níveis de superação, mas combine antes esses níveis com o estudante; não alimente no orientando sonhos megalômanos, pois o TCC ou a dissertação será sempre inferior ao que ambos gostariam que fosse; não force a barra para que alunos de graduação façam pesquisa acadêmica, pois a maioria não nasceu para isso e pode morrer por isso; estimule alunos de graduação que gostam de pesquisa e que se envolvem em Iniciação Científica.

This article is from: