HOMILIA DO PE. VALDIR NA MISSA DE ABERTURA DO XIII CAPÍTULO PROVINCIAL O trecho da 2ª Carta a Timóteo, da liturgia da festa do bem-aventurado Timóteo Giaccardo, reúne alguns versículos do primeiro capítulo e outros do segundo, porém, que fazem parte de um mesmo contexto (que, na verdade, percorre toda a Carta) no qual o apóstolo Paulo pede a Timóteo para não se envergonhar do evangelho e nem dele mesmo, que se encontra na prisão, numa situação de profunda solidão, prestes a enfrentar o martírio. Inicialmente Paulo convida Timóteo (a quem considera como um filho!) a reavivar (reacender) o dom de Deus que está nele...” (2Tm 1,6), que é o lema do nosso Capítulo (e que o foi do último Capítulo geral), e prossegue: “Deus não nos deu um espírito de medo, mas um espírito de força, de amor e de sabedoria.” (2Tm 1,7). Paulo tem consciência de que recebeu um dom e que o dom recebido precisa ser reavivado constantemente. Se não for reavivado, tende a desaparecer ou, pelo menos, acaba derrotado pelo medo. A seguir, propriamente no trecho que ouvimos, Paulo pede que Timóteo fortifique-se sempre na graça que está em Jesus Cristo e que “participe dos sofrimentos como bom soldado de Cristo”. Ou seja, mostra que o seguidor de Jesus Cristo é alguém que faz uma opção e que, confiante na graça, a leva até as últimas consequências, chegando, muitas vezes, a participar até do seu destino doloroso, se necessário (bem como da ressurreição!). Evidentemente, o sofrimento para Paulo tem sentido se este se dá em comunhão com o sofrimento e a paixão de Cristo. É sinônimo de solidariedade com Cristo; tem a ver com o “sofrer por uma causa”: “Fui constituído anunciador do Evangelho, apóstolo e mestre. Esta é a causa dos males que estou sofrendo. Todavia, sei em quem coloquei minha fé...” (2Tm 1,11-12). Evangelho, para Paulo, é o projeto de vida que vem de Deus e que se materializa em Jesus: “Esse é o meu Evangelho, e por causa do qual eu sofro, a ponto de estar acorrentado como um malfeitor. Mas a palavra de Deus não está algemada” (2Tm 2, 8-9). Podemos dizer que “reavivar o dom recebido”, “fortificar-se na graça” e “participar dos sofrimentos por causa do Evangelho” supõe uma comunhão profunda com o Mestre, que nasce de uma atitude de fé e que se expressa na realidade concreta. E em que consiste esta comunhão senão em “permanecer no amor” de que fala Jesus no Evangelho de João: “Permaneçam no meu amor.” De fato, a missão do discípulo (assim como o foi para Paulo, Timóteo...) não nasce da obediência a uma lei, mas do dom livre que participa com alegria da tarefa comum, que é experienciar e testemunhar o amor de Deus que quer vida: “Se vocês obedecem aos meus mandamentos, permanecereis no meu amor... ”Essa é a condição para o discípulo produzir frutos: permanecer!
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Esses aspectos que destacamos, tanto da primeira leitura como do Evangelho, servem, me parece, para iluminar o nosso Capítulo provincial, que estamos iniciando. De fato, um Capítulo é sempre tempo de (individualmente, em comunidade e como província) reavivar o dom recebido (seja o pessoal, seja o institucional), fortificar-nos na graça que está em Jesus Cristo (reconhecendo as abundantes riquezas de graça recebidas em nossa história, não obstante nossas fragilidades!), e renovar o nosso compromisso com o Evangelho até as últimas consequências (sofrimento!). E tudo isso tem sentido se, antes, “permanecemos” em Cristo, um permanecer que gera “comunhão” e que nasce da “comunicação” (o nosso carisma!). E o que é a comunicação, no seu sentido pleno, se não, “criar comunhão”? De fato, comunicar não é só transmitir ou passar informação. A comunicação como “difusão” apareceu principalmente com a invenção da imprensa e dos meios de comunicação eletrônicos e digitais. Tudo isso é importante, especialmente para nós paulinos, se levamos em conta o nosso apostolado, especialmente, com a imprensa e os audiovisuais, e algumas iniciativas no campo digital. Aqui, nos referimos à comunicação no seu sentido mais profundo, que se dá entre duas ou mais pessoas, imprescindível para a melhoria de nossa qualidade de vida e para o êxito de nosso apostolado. A comunicação, nesse sentido, é um processo que supõe, na sua origem, a “escuta”. Somente escutando podemos, de fato, nos comunicar de verdade a ponto de gerar comunhão. Que bom se fizermos, no Capítulo, a experiência da “escuta” no seu sentido amplo: Escutar o que o Espírito tem a nos dizer, escutar o que o outro tem a falar, escutar o carisma paulino, escutar as transformações que estão ocorrendo no campo da comunicação especialmente com o advento das tecnologias digitais, escutar a Igreja (o “Ano da Fé”, o sínodo sobre a Nova Evangelização, o documento de Aparecida, as diretrizes da ação evangelizadora da Igreja no Brasil, etc...), escutar o povo de Deus nas suas diversas realidades, escutar os pobres e os excluídos, enfim, escutar todas as realidades que tem a ver com nossa vida e missão. Evidentemente: escutar e dar respostas! As respostas serão acertadas à medida que dermos tempo para “escutar”. Celebramos, hoje, a festa do bem-aventurado Timóteo Giaccardo e algumas de suas biografias o caracterizam como “obediente”. Lembremos que a palavra “obediência” está ligada à “escuta”. De fato, ao falar de obediência e obedecer o hebraico bíblico utiliza o verbo shama, escutar. Não existe nesta língua uma raiz própria, específica, que signifique obedecer. Isso não deve estranhar porque em português obedecer provém de obedire que deriva de audire, ouvir. No grego bíblico não é diferente: o verbo hypakouo, obedecer tem em sua composição o verbo akouo, escutar, ouvir. Afirmar que Giaccardo foi “obediente”, nesse sentido, significa que foi um homem de escuta, de modo especial, escuta do Espírito que falava por meio da vida e das obras de Alberione, do qual foi um fiel discípulo. Pela intercessão de Maria, Rainha dos Apóstolos, de são Paulo e dos bemaventurados Alberione e Giaccardo, Cristo Mestre nos ajude a celebrar este Capítulo 2
exercitando a escuta e, dessa escuta, possa nascer um projeto para os próximos quatro anos que nos permita dar respostas concretas aos desafios do nosso apostolado, da vida comunitária e espiritual, da animação vocacional e formação, da administração e serviço da autoridade e da nossa relação com a Família Paulina. E que também os nossos santos intercedam pelo novo governo provincial que terá a missão de animar a província. Reacendendo o dom recebido, na comunhão e participação, às vésperas da celebração dos cem anos de fundação de nossa Congregação e do início da Família Paulina, possamos escutar o presente, em todas as suas dimensões e, com realismo, ser são Paulo, vivo, hoje, lançando-nos para o futuro, com fé e esperança. Pe. Valdir José de Castro Provincial
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