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ANO LII • N. 307 • ABR/MAI/JUN • 2019
ISSN 2596-2132
INFORMATIVO SÃO VICENTE PROVÍNCIA BRASILEIRA DA CONGREGAÇÃO DA MISSÃO
Campina Verde: 150 anos de Paróquia
SUMÁRIO Palavra do Visitador | pág. 3
Encontro Internacional de Vistadores da CM
EDITORIAL
Pe. Geraldo Eustáquio Mól
CM Global | pág. 4 Notas da Cúria
Pe. Vinícius Augusto Teixeira
Voz da Igreja | pág. 5
Canonização da Irmã Dulce Da redação
Obra em Destaque | pág. 6
150 anos da Paróquia N. S. Da Medalha Milagrosa
Silvan Antônio dos Santos e Dalva Vieira dos Santos (com colab. do Pe. Donizete. Dombroski)
Artigo | pág. 12
No devagar depressa dos tempos… Mauro Sérgio Santos da Silva
Espaço dos Seminaristas | pág. 16
Vocação do missionário vicentino em tempos de intolerância Sem. Leonardo Paredes de Almeida
Pastoral Vocacional | pág. 18
Como fazer uma boa Pastoral Vocacional Pe. Denilson Mathias
Cotidiano Provincial | pág. 20
Nova proposta para o antigo Seminário de Petrópolis
ConTato Assessoria de Comunicação (com colab. do Pe. Emanoel Bedê)
Artigo II | pág. 22
A dimensão política e social do Evangelho Pe. Luiz de Oliveira Campos
Família Vicentina | pág. 26
Santas Missões Populares Vicentinas 2019 Pe. Agnaldo Aparecido de Paula
Entrevista | pág. 28
Pe. Sebastião Mendes Gonçalves Sacha Leite
Notícias da PBCM | pág. 32 Cultura Dicas de filme e livro | Memória da Província pág. 34 Texto pág. 32
Pequeno Museu de Artes e Ofícios Pe. Geraldo Humberto Venuto
EXPEDIENTE Informativo São Vicente - n. 307 | ISSN 2596-2132 | Edição fechada em 30/06/2019 www.pbcm.com.br/informativosv | informativosv@pbcm.com.br| Impresso na Gráfica Print - São Paulo | Tiragem: 300 exemplares | Conselho Editorial: Pe. Geraldo Mól, Ir. Adriano Ferreira, Sacha Leite e Cristina Vellaco | Editoração: Adriano Ferreira | Jornalista Responsável: Sacha Leite MTB:30383/RJ| Revisão: Pe. Lauro Palú e Sacha Leite| Colaboraram nesta edição: Leonardo Paredes de Almeida, Pe. Vinícius Augusto Teixeira, Pe. Denilson Mathias, Pe. Alexandre Nahass Franco, Mauro Sérgio Santos Silva, Pe. Luiz de Oliveira Campos, Pe. Agnaldo Aparecido de Paula, Silvan Antônio dos Santos, Dalva Vieira dos Santos, Pe. Donizete Dombroski. | Os textos publicados são de total responsabilidade de seus respectivos autores. | O Informativo São Vicente é uma publicação trimestral editada pela Província Brasileira da Congregação da Missão - Telefone: (21) 32352900 / Rua Cosme Velho, 241 CEP: 22241-125 Rio de Janeiro - RJ
No final dos anos 90 a comunidade provincial de Campina Verde era uma festa. Em 1999, quando encerrava meu Ensino Médio, como estudante do Seminário São Justino de Jacobis, a comunidade dos coirmãos continha em suas fileiras o padre Evilásio Amaral, animado pároco e professor de Vicentinismo; o padre Sebastião Carvalho, formador de coração enorme; o padre Felix Obrzut, professor de francês e invencível jogador de xadrez; o padre Nilson Grossi, vigário e maior atleticano que já existiu; o padre Dásio Moura, com seu inseparável cajado a pregar as mensagens da Virgem de Medjugorje; o Padre Luiz Rodrigues, professor de sacramentos e capelão do hospital; o irmão Narciso, cujo modo de falar era inconfundível; o padre Guido Branta, mítico ermitão do Monjolinho; o irmão Afonso, professor, hortelão e fidalgo; e o irmão Edmar, rigoroso administrador das fazendas e do tanque dos peixes, de onde, por vezes, ousávamos roubar um ou outro tambaqui. Também habitavam aquele espaço as agregadas Dona Mercês, que conhecia as roupas, nomes e gostos de cada um de nós; e Dona Cecília, generosa doadora de terras e zelosa gestora da cozinha. Some-se a estes um grupo de vinte e cinco seminaristas adolescentes e pronto, festa completa. Ufa, era muita gente! Será que esqueci de alguém? 20 anos depois, apenas dois coirmãos habitam a enorme Casa da Missão. Fico triste ao imaginar o silêncio dos corredores, o vazio do vasto refeitório e a solidão da rica biblioteca. Imagino a experiência de frenquentar aqueles espaços sem ouvir os gritos proféticos do Padre Dásio, o barulho esganiçado do fusca do Pe. Luis, o passo arrastado do Pe. Felix. Passar pela porta de entrada sem sentir o cheiro do Derby fumado pelo irmão Narciso deve ser mais agradável, porém, estranho. Mas nem tudo é silêncio. A missão continua viva. Hoje a comunidade dos coirmãos já não é mais uma festa. Afinal onde antes viviam trinta e cinco, hoje vivem só dois. Porém, o que se nota é um enorme esforço dos Padres Donizete e Evilásio pároco e vigário, para conservarem essa grande obra, manter viva a sua tradição missionária e animar a paróquia. A leitura da seção Obra da Província vai mostrar que a diminuição do número de coirmãos não fez a missão do antigo “Sertão da farinha podre” se arrefecer. Ao contrário, a paróquia chega aos seus 150 anos, com o espírito renovado pela, cada vez mais forte, presença e protagonismo dos leigos. Abençoados sejam o padre Donizete e o padre Evilásio, responsáveis por manter o espírito de uma das casas mais antigas da Província.
Ir. Adriano Ferreira, CM
PA L AV R A D O V I S I T A D 0 R Pe. Geraldo Eustáquio Mól
Encontro Internacional de Visitadores da Congregação da Missão
E já estamos chegando ao final do primeiro semestre de 2019. Ano galopante. Muitos compromissos, encontros, assessorias, obras, reformas, empreendimentos, estudos, pastorais diversas, projetos sociais, Santas Missões Populares... preparação dos 150 anos da Paróquia Nossa Senhora da Medalha Milagrosa, em Campina Verde, preparação para os 200 anos da chegada dos Padres Vicentinos ao Brasil... todos trabalhamos muito. Julho está chegando. Tempo de Santas Missões Populares em Campo Grande – 100 anos da Igreja Nossa Senhora da Conceição do Monteiro, projetos sociais em Serra do Ramalho – BA e Tefé – AM, Ordenação Presbiteral do Hugo, Campina Verde, em 13/07, mais um Retiro para as Filhas da Caridade em Recife... Após 30 e poucas horas de viagem, passando por Dubai, cheguei a Manila, Filipinas, para o Encontro de Visitadores, que nos propõe temas diversos: Formação Inicial e Permanente, Missões Internacionais, Revisão do Guia Prático do Visitador, Coirmãos em dificuldade, Cultura Vocacional etc. Muitos temas para poucos dias de encontro. Manila, um calor intenso, falta água, muitas horas de trabalho diário. Vale a pena. São assuntos inquietantes e é sempre bom ouvir outras experiências. Somos mais de 40 participantes de diversas línguas, uma verdadeira torre de babel. Iniciamos o Encontro com um dia de Retiro Espiritual. O tema sobre o qual fomos convidados a refletir, Padres chamados a ser peritos em humanidade. Terminamos o dia com uma Adoração ao Santíssimo de uma hora em completo silêncio, apenas um diálogo silencioso com Deus sem dire-
to a nenhuma palavra em voz alta. Após a bênção silenciosa, saímos todos em silêncio e assim permanecemos o restante
da tarde e noite. Já no segundo dia, entramos no tema principal que vai ocupar quase a metade do encontro. Formação inicial e permanente, a começar da Pastoral Vocacional até o fim do nosso ministério. A maior parte das assessorias estão sendo feitas por nós mesmos, provinciais. Começamos por colocar em comum nossas experiências em termos de formação inicial e permanente. Eu apresentei o Plano de Formação da Província Brasileira da Congregação da Missão (PFBCM) que tem o seu eixo principal a Espiritualidade Vicentina, com enfoque sistemático e específico no sentido de pertença. Reunidos em comunidade para a missão junto aos pobres por toda a vida. Conforme reza o PFPBCM, “O eixo que norteia todas as dimensões da formação é o EIXO VICENTINO que é a base de todo o processo formativo, dando um rosto próprio a todas as etapas da formação, favorecendo o sentido de pertença, levando a todos nós a uma integração consciente e coerente no corpo da Congregação, nos inserindo de forma integral dentro da Igreja, seguidores de Jesus Cristo, nos possibilitando, a cada dia mais, compreendermos que Jesus Cristo é o centro de nossa vida e a Regra da Missão”. “Embora a vocação e o ministério presbiteral consagrado sejam dons de Deus à sua Igreja, sabemos que a chamada formação inicial e permanente não é algo simples nem automático”.
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CM GLOBAL
Por Pe. Vinícius Augusto Teixeira
Notas da Cúria Audiência concedida pelo Papa aos membros da Cúria Geral No dia 2 de março, o Papa Francisco recebeu no Vaticano o Superior Geral e seu Conselho, bem como os Coirmãos e as Filhas da Caridade que trabalham na Cúria da Congregação da Missão. Dialogando amistosamente, o Santo Padre manifestou sua gratidão por tudo o que a Congregação tem feito pela Igreja, recordando nomes de Missionários que lhe são particularmente caros. Os presentes, por sua vez, descreveram a realidade atual da Congregação no mundo e apresentaram o projeto de enviar em missão ad gentes 1% de seu contingente, ou seja, 30 Missionários. O encontro foi coroado com esta bela definição do Pontífice: “O missionário vicentino é uma pessoa que trabalha incansavelmente, mas sem fazer barulho”. Embaixadores europeus visitam a Cúria Geral No dia 14 de fevereiro, o Superior Geral, Tomaž Mavrič, promoveu uma reunião com Embaixadores Europeus junto ao Vaticano, tendo como finalidade solicitar-lhes adesão e apoio a projetos de promoção humana e evangelização dos pobres. Dez embaixadores se fizeram presentes. Os membros da Cúria também participaram. A reunião começou com um momento de oração. Em seguida, houve uma apresentação global dos trabalhos realizados pela Congregação e pela Família Vicentina em diferentes lugares do mundo. A esta apresentação, seguiu-se um esclarecedor diálogo entre os participantes. Encontro “A proteção dos menores na Igreja” O Superior Geral tomou parte no histórico encontro convocado pelo Papa Francisco para tratar do 4 INFORMATIVO SÃO VICENTE
Foto: cmglobal.org
tema dos abusos sexuais de menores e a proteção das vítimas. Para este evento, foram convocados os presidentes das conferências episcopais e alguns Superiores Gerais. Além de Padre Tomaž Mavric, outros dois membros da Congregação estiveram entre os participantes: Dom Jack Youssef, Vigário Apostólico de Isfahán (Irã), e Dom Markos Gebremedhin, Vigário Apostólico de Jimma Bonga (Etiópia). Solidariedade com o povo venezuelano Através de uma circular, os dirigentes internacionais da Família Vicentina quiseram manifestar sua “preocupação e solidariedade diante da dramática situação que os venezuelanos experimentam neste momento em seu país”. A carta denuncia “a dolorosa situação de injustiça e sofrimento que vive o povo venezuelano, devido à escassez do mais necessário a uma existência digna e produtiva”. Os dirigentes vicentinos asseguram: “Gostaríamos de ajudá-los a sentir-se perto do Deus da Vida, através de nosso abraço compassivo, nossa oração contínua e uma campanha vicentina internacional de ajuda em favor dos mais pobres do país, assim como em favor dos programas que nossa Família tem na Venezuela”. Por fim, conclamam a todos a divulgar a situação, a rezar nesta intenção e a fazer donativos. “Unimo-nos ao desejo e ao apelo que o Papa Francisco fez para uma transformação no país sem derramamento de sangue, na esperança de que isso leve a uma total reconciliação do país e à cura dos tecidos rompidos da sociedade, à promoção de oportunidades para o desenvolvimento humano integral e à reativação dos valores de paz e justiça”.
VO Z DA I G R E JA Da redação
Canonização da Irmã Dulce Anjo bom da Bahia deixou obras sociais ativas até hoje e uma trajetória inspiradora A baiana Irmã Dulce será declarada santa, no dia 13 de outubro de 2019, após o reconhecimento oficial da Igreja Católica de um segundo milagre obtido pela interceção dela. Irmã Dulce já tinha sido declarada beata pelo papa Bento XVI em 2011, após a Igreja reconhecer um milagre que foi obtido por interceção dela, em Sergipe. No anúncio, a Santa Sé afirma que Dulce é "recordada por sua obras de caridade e de assistência aos pobres e necessitados" e conhecida como "o anjo bom da Bahia". Irmã Dulce começou a acolher pessoas necessitadas em sua casa aos 13 anos de idade, antes mesmo de se tornar freira. Sua casa, no bairro de Nazaré, se transformou num centro de atendimento para doentes e pessoas em situação de rua - e ficou conhecida como "A Portaria de São Francisco”. Segundo as Obras Sociais Irmã Dulce (OSID), ONG criada pela freira em 1959, irmã Dulce se formou professora em 1933, mesmo ano em que entrou para a Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus, na cidade de São Cristóvão, em Sergipe.
na capital baiana. Dois anos mais tarde, fundou o Círculo Operário da Bahia, junto com frei Hildebrando Kruthaup, e, alguns anos depois, inaugurou uma escola pública voltada para operários e seus filhos. Um de seus momentos mais lembrados é quando usou o galinheiro do convento em que vivia, o Convento Santo Antônio, para abrigar 70 doentes. Antes disso, chegou a invadir imóveis desocupados para abrigar os doentes, mas como foi expulsa, acabou levando-os para o convento.
Fundou o Círculo Operário da Bahia Inaugurou uma escola pública voltada para operários e seus filhos Ocupou imóveis abandonados para o abrigo de doentes Atendeu a detentos submetidos a carceragens em condições subumanas Criou espaços educacionais, de acolhida e inclusão social em hospitais
Após assumir o hábito, ela recebeu a tarefa de dar aulas em um colégio religioso em Salvador, para onde voltou. Mas seu interesse estava mesmo em trabalhar com os pobres, segundo a OSID. Em 1935, começou a dar assistência à comunidade de Alagados, onde havia casas pobres de palafitas, e atender aos operários do bairro de Itapagipe,
Anos depois, o local acabou sendo transformando em um hospital. Irmã Dulce também atendia detentos em prisões, conhecidas por suas condições desumanas, e criou um serviço de alimentação de baixo custo, nos anos 1950. Nas décadas seguintes trabalhou para promover a implantação de um centro educacional, um albergue, um pavilhão para deficientes no hospital, entre outros projetos. Conhecida por seu trabalho de caridade, foi apresentada ao papa João Paulo II na sua visita ao Brasil em 1980. Irmã Dulce passou boa parte de seus últimos anos internada com problemas respiratórios, e recebeu uma segunda visita do papa alguns meses antes de morrer, em março de 1992.
A OSID, que criou na década de 1950, é hoje um grande complexo de saúde com atendimento gratuito e recebe cerca de 3,5 milhões de pacientes por ano pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Irmã Dulce será a primeira mulher, nascida no Brasil, a ser beatificada.
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O B R A E M D E S TAQ U E
por Silvan Antônio dos Santos e Dalva Vieira dos Santos Com a colaboração do Pe. João Donizete Dombroski
Paróquia Nossa Senhora da Medalha Milagrosa: 150 anos Um marco importante na evangelização do Triângulo Mineiro
Neste ano jubilar em que a Paróquia Nossa Senhora da Medalha Milagrosa comemora o seu sesquicentenário, torna-se muito oportuno trazer à baila os fatos marcantes que permearam a história do Município de Campina Verde, que teve seu surgimento totalmente ligado à fundação da Paróquia jubilada.
certamente obter deles o perdão de seus pecados, já que, segundo relatos, pesavam sobre si muitos crimes, o casal que já era fugitivo da justiça, era também proprietário de grande latifúndio na região de Campo Belo. João Batista e sua mulher Bárbara, logo que tiveram contato com os Padres da Missão, ficaram tão entusiasmados com a pregação que não É uma história de grandes desafios! Há que se hesitaram em oferecer-lhes suas propriedades para considerar o cenário político, bem como os fatos hisque ali pudessem instalar-se e realizar a obra de tóricos que fizeram parte da realidade da época em evangelização. Em 1826 iniciaram as tratativas, mas a que o Brasil tinha se tornado independente de PorEscritura somente foi oficializada em 29 de Outubro tugal, o trabalho escravo dos negros oriundos da de 1830. Era uma grande área de mais ou menos África e a exploração do sertão; é neste contexto 28.000 alqueires mineiros que correspondiam a que surge esta comunidade que remonta os tempos 135.520 hectares. A partir da formade “Campo Belo da Farinha Podre”, lização, os Padres tomaram posse denominação que recebeu dos bandeirantes e aventureiros, quando Este lugar inóspito, po- da terra, cumprindo fielmente as condições impostas pelos doadores: em viagens para Goiás em busca de voado pelos índios veio “..., ficando a dita corporação obriouro, passavam nesta região transtornar-se mais tarde um gada a erigir capela no lugar da faportando seus mantimentos nos zenda e a ter nela um ou mais salombos dos animais. Como a viagem importante centro de era muito penosa, iam deixando os evangelização, protago- cerdotes para celebrar missa aos domingos e dias santos... e ali estavíveres escondidos no oco das árvonizado pelos Padres Vibelecer o estudo das primeiras letras res, para que fossem aproveitados na viagem de volta. Há relatos de centinos, que vieram dar e de gramática latina para a mocique, em certa ocasião, encontraram conforto espiritual, pro- dade...” (Escritura de Doação).
a farinha toda deteriorada no oco Nascia assim a segunda casa mover o desenvolvimende uma árvore, o que deu origem lazarista em Campo Belo, e os priao nome de “Sertão da Farinha Po- to intelectual através da meiros sacerdotes vieram iniciar o dre”. Este lugar inóspito, povoado Escola de “primeiras Le- plantio de sementes tão promissopelos índios, veio tornar-se mais tar- tras e de gramática latina ras. Padres Jerônimo Gonçalves de de um importante centro de evanMacedo, Antonio Affonso de Morapara instrução da moci- es Torres e José Tomás Moura Sougelização, protagonizado pelos Padade” e ministrar os sa- sa, foram os três pioneiros a iniciar dres Vicentinos, que vieram dar conforto espiritual, promover o desenesta obra missionária que, além de cramentos. volvimento intelectual através da proporcionar aos jovens formação Escola de “primeiras Letras e de científica e religiosa, despertou a fé gramática latina para instrução da do povo através da celebração da mocidade” e ministrar os sacramentos. Eucaristia e demais sacramentos. Há registros que informam que a chegada dos Padres transformou a Foi neste lugar desabitado, que a fé começou a região de Campo Belo em grande centro de evangefincar raízes, por obra e graça da Providência Divina. lização. O trabalho era árduo e os Padres cada vez Após a chegada dos Padres portugueses e a posse mais dedicavam-se incansavelmente ao conforto esno Santuário do Caraça, estes começaram a pregar piritual do povo. Em uma carta escrita ao Superior missões em muitas cidades do interior de Minas GeGeral, em 1845, Padre Jerônimo Macedo menciona rais. Enquanto isso, o Colégio do Caraça já se destao seguinte: “... As igrejas ficavam cheias dia e noite cava pelo ensino eficiente e pela educação de qualie, muitas vezes sem que o pobre povo pensasse em dade. Foi numa destas missões, em Bambuí, que o alimento. Confessávamos homens à noite e as mulheencontro do casal João Batista de Siqueira e Bárbara res de dia, por isso o missionário tinha apenas duas Bueno da Silva com os padres missionários acontehoras de sono. Aconteceu-me ficar, uma vez, >>> ceu. Desejosos de ouvir a pregação dos Padres e, INFORMATIVO SÃO VICENTE 7
Enquanto o trabalho religioso ia sendo realizado, a grande área recebida em doação necessitava de manejo eficiente e trabalho duro para gerar renda e manter o empreendimento. Nesta ocasião, por volta do ano de 1835, no Arraial de Campo Belo, já havia sido construída a primeira igreja, uma capela muito simples, de madeira, coberta com folhas de piaçava, trabalho realizado por Padre Jerônimo Gonçalves de Macedo. Esta igreja, por volta do ano de 1850, veio dar lugar a outra, erigida sob o mesmo orago da primeira de Nossa Senhora Mãe dos Homens, obra também realizada por Padre Jerônimo. Foi ainda erguida uma terceira capela, inaugurada em 1885. Era um belíssimo templo, em estilo barroco, construção sólida que continha duas imponentes torres. A construção desta capela foi realizada por Padre José Vicente Gonçalves de Macedo, sobrinho de Padre Jerônimo, que já havia falecido. Esta capela foi demolida em 1932, por estar danificada pela ação de raios e faíscas, motivando o início da construção da igreja Matriz, inaugurada a 27 de Setembro de 1941, que permanece até os dias atuais, linda e exuberante.
de com a Lei Mineira 1625, de 6 de Novembro de 1869, fora elevada a Paróquia. Era evidente o desenvolvimento do Arraial de Campo Belo, por isso lá residiam as autoridades vinculadas ao Distrito de Monjolinho ou Rio Verde, tais como professores, policiais, escrivão de paz etc. Por este motivo foi transferida a sede da Freguesia de Boa Vista do Rio Verde para o Povoado de Campo Belo, através da Lei Mineira n. 556, de 30 de Agosto de 1911. Mais tarde, em 1923 estabeleceu-se a criação do Distrito de Campina Verde, pertencente ao Município de Prata, que veio a emancipar-se em 17 de dezembro de 1938, tendo como distritos Iturama e São Francisco de Sales. E assim, em 1869, instalou-se a nova Paróquia, cujo Jubileu estamos a celebrar neste corrente ano. Por ocasião da instalação da Paróquia, esta pertencia à Diocese de Goiás, cujo Pastor era Dom Joaquim Gonçalves de Azevedo (Bispo daquela Diocese) que governou de 1864 a 1876.
Foto: Arquivo da PBCM
desde as duas horas da tarde até às sete horas do dia seguinte no confessionário, de onde saí para celebrar”.
Padre José Vicente Gonçalves de Macedo, português, de São Miguel do Monte, foi nomeado primeiro pároco da Paróquia recém constituída, que, à época, era dedicada a Nossa Senhora Mãe dos Homens. Era sobrinho de Padre Jerônimo e veio de Portugal para estudar em Campo Belo. Depois continuou seus estudos no Colégio do Caraça, vindo a ordenar-se Padre na Cidade de Goiás em
Sendo a Congregação da Missão proprietária das Fazendas Campo Pe. Felix Obrzut, grande nome da educação campinaverdemse Belo, Paraíso e Fortaleza, extensa 27/12/1859. área a ser cultivada e a mão de obra disponível extremamente insignificante, dada a grandeza do traO trabalho de evangelização realizado em balho a ser empreendido, Padre Jerônimo resolveu Campina Verde pôde contar com a coragem e decolocar à venda parte destas terras, escolhendo para dicação de muitos padres, que, ao longo de quase compradores famílias capazes de garantir com bons dois séculos, têm se colocado a serviço. Os Padres exemplos a manutenção da fé e dos bons costumes. e as Irmãs Filhas da Caridade participaram ativaCom esta decisão, a comunidade pôde ver construímente e com eficiência do desenvolvimento da das as igrejas que vieram, ao longo do tempo, abricidade e região. Muitos Padres tiveram especial gando a espiritualidade em Campo Belo e o convento onde funcionava o colégio, para onde acorriam os rapazes da região central do país, como estabelecimento único de instrução. Sobre a situação política de Campo Belo, para fins de elucidação, o Sertão da Farinha Podre fazia parte da Diocese de Goiás, sendo o Arraial de Campo Belo pertencente à Freguesia instalada em Monjolinho (Boa Vista do Rio Verde) que, de conformida8 INFORMATIVO SÃO VICENTE
destaque na área da educação, ao cumprir fielmente o desejo dos doadores das terras de que aqui se estabelecesse uma escola de primeiras letras. Vale mencionar Padre Guilherme Van de Sandt, Padre João Anesi, Padre Felix Obrzut, Padre Jorge Cunha e Padre Francisco Benfica Breiner que foi o primeiro Diretor do Instituto Nossa Se-
Foto: Arquivo da PBCM
Na lateral direita da igreja, a antiga Casa da Missão, demolida para dar lugar à nova morada dos coirmãos.
nhora das Graças, quando da implantação do curso ginasial em 1950. As atividades educativas tiveram início rapidamente e a fama da escola espalhou-se tanto que para o Colégio dos Padres muitos jovens acorriam em busca de instrução. De 1842 a 1890, o famoso Colégio do Caraça mudou-se para Campo Belo, para buscar refúgio mais seguro no contexto da revolução da Província de Minas Gerais, passando a ser referência de ensino, de onde saíram jovens bem formados e profissionais de qualidade. A saúde do lugar também recebeu a colaboração dos Padres, uma vez que, com a ajuda e a administração das Irmãs Vicentinas a população pode obter assistência do Hospital São Vicente de Paulo, construído por Padre Januário Ribeiro de Freitas e inaugurado em 3 de Outubro de 1943. Há que se destacar também o trabalho realizado pelas Irmãs em obras sociais como a Creche Divino Pai Eterno, administrada pela inesquecível Irmã Luísa de Marilac. O trabalho dos Padres e Irmãs foi muito frutuoso, o que concorreu para o despertar de santas vocações de moças e rapazes para a vida religiosa. Não poderia deixar de mencionar o brilhante testemunho das famílias dos Padres e Irmãs que nasceram neste Município. Jamais nos esqueceremos dos filhos da terra que entregaram suas vidas pela causa do Evangelho: Dom
Pio de Freitas Silveira, Dom Orlando Chaves, Padre Dásio, Padre José de Freitas Lima, Padre Ézio Rodrigues de Lima, Padre Dario, Padre Sebastião Mendes, Padre Onésio, Padre Geraldo Barbosa, Padre Evilásio, Padre João Carlos, Padre Alexandre, Diácono Hugo Barcelos e o seminarista Adalberto Silva Costa que, num futuro próximo será ordenado. Das Filhas da Caridade nascidas em Campina Verde, podemos destacar as seguintes: Ir. Catarina (Ana Nunes Macedo), Ir. Vicência (Conceição Gomes da Silva), Ir. Luísa (Dalva Machado de Brito), Ir. Suzana (Florinda Queiroz), Ir. Maria José (Inésia Chagas), Ir. Maria (Josefa Souza), Ir. Aparecida (Maria Aparecida Macedo), Ir. Celina (Maria Lacerda de Paula, Ir. Maria (Maria Marques), Ir. Maria Cândida (Maria Rodrigues da Silva) Ir. Germana (Maria Florêncio Campos). Os Padres da Missão também foram responsáveis pelo funcionamento do Seminário São Justino de Jacobis que iniciou suas atividades em 1975 e muito auxiliou na formação dos futuros Padres, bem como veio incentivar sobremaneira o surgimento de vocações. Primeiramente, o seminário esteve sob a orientação do Padre João C. Saraiva e no ano seguinte os seminaristas passaram a residir no antigo prédio do Educandário Sagrada Família, sob a orientação do então Diácono Geraldo Barbosa. >>>
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Não podemos nos esquecer de mencionar também o trabalho desenvolvido pelos Padres desde os primeiros tempos, visando o atendimento dos mais pobres, e buscando promovê-los. Várias iniciativas desta natureza vieram dos tempos antigos: a Vila dos Pobres, o Banco da Providência Padre Guilherme, a assistência pela Sociedade São Vicente de Paulo. Neste trabalho assistencial destacou-se também Irmã Ana Rocha, Filha da Caridade, que empreendeu, com a ajuda de Padre João Saraiva e voluntários da comunidade, um projeto social muito abrangente, financiado pela Misereor, da Igreja da Alemanha que
em Iturama-MG, e estamos com a segunda turma, com o transporte às expensas da Paróquia. Está acontecendo também o Curso de Preparação ao Diaconato Permanente, em Ituiutaba, sede da Diocese, onde estão sendo preparados quatro candidatos. É projeto da Paróquia também enviar catequista para cursar Pós-Graduação em Catequese.
Foto: Arquivo da PBCM
É uma comunidade muito fervorosa que se dedica muito à oração. O Apostolado da Oração, Legião de Maria, os grupos de oração da Renovação Carismática, Rosário dos Homens, Mães de Joelho, grupos de Nossa Senhora de Fátima, Mãe Rainha, etc. representam a Igreja orante da Paróquia. Outras Pastorais e Movimentos dão sustentação à formação, á catequese, ao trabalho social, à realização da grande festa e leilão em honra da Padroeira. São grupos de catequistas, casais do ECC, equipes de Liturgia, Preparação para o Batismo , dentre outros que colocam a mão na massa para transformar a caminhada de muitos, trazendo esperança e a certeza de que Deus caminha conosco. Atualmente, estamos colocando em execução o projeto de iniciação cristã que visa trabalhar com as crianças através da Pre-Catequese, que atende crianças a partir de cinco anos, depois a Catequese Infantil, Coroinhas, PersePe. Guido Branta, incansável missionário desbravando as campinas do Triângulo Mineiro. verança, Acólitos, Preparação para o Sacramento da Crisma, culminando visava atendimento ambulatorial, farmácia, horta com o Projeto Compromisso para jovens. comunitária, cursos de culinária para mulheres e muiHá mais de 10 anos foram criados os Conselhos tas outras atividades de promoção de pessoas carenParoquiais, CPP, CPC e CAEP, que vêm auxiliar na tes. administração da Paróquia, cuja atuação enriquece a A presença dos Padres Vicentinos contagiou os participação e o envolvimento dos leigos nas ativicorações campinaverdenses com a chama da caridadades pastorais. Encontra-se em fase de organização de. O povo que aqui reside é um povo participativo o Conselho Missionário Paroquial – COMIPA, respone muito solidário. A Paróquia mantém através do Dísável pela agenda missionária do município, em conzimo suas necessidades básicas, tais como Formação sonância com as orientações da Diocese. de Agentes Pastorais, material de trabalho, funcionáA Paróquia Nossa Senhora da Medalha Milagrosa rios e tantos outros encargos inerentes à evangelizaconta atualmente, no perímetro urbano, com sete ção. A Paróquia ainda presta apoio ao Lar dos Idosos comunidades e duas capelanias. São elas: Santuário auxiliando na captação de recursos materiais, além da Medalha Milagrosa, Igreja Divino Pai Eterno, Igrede apoiar também o projeto de recuperação do ja São Sebastião, Igreja São José, Capela São Vicente Hospital São Vicente de Paulo. de Paulo, Comunidade Nossa Senhora Aparecida, Com a participação da comunidade é possível à Comunidade Imaculado Coração de Maria e capelas Paróquia investir em formação dos leigos. Já formado Hospital São Vicente de Paulo e Capela Santa mos uma turma no Curso de Teologia para Leigos, 10 INFORMATIVO SÃO VICENTE
De cima para baixo: Santuário Nossa Senhora da Medalha Milagrosa; Salão Comunitário Dom José Carlos Melo; Igreja de São Sebastião; Igreja de São José; Igreja do Divino Pai Eterno; Centro Pastoral João Paulo II. Fotos: PASCOM - Santuário da Medalha Milagrosa
Edwiges no Lar dos Idosos. Na Zona Rural, são 17comunidades, dentre elas cinco assentamentos, um dos grandes desafios da Paróquia. Vários obstáculos dificultam a evangelização destes assentamentos: falta de compromisso, êxodo rural, desemprego, falta de participação, falta de lideranças, e rotatividade dos assentados, além da extensão do município, cuja distância de algumas comunidades exige que os Padres viajem até 180 km para as celebrações. Para enfrentar os desafios da Igreja a caminho, particularmente desta minúscula parcela que está em Campina Verde, é preciso coragem e determinação. Nestes 150 anos de caminhada da Paróquia Nossa Senhora da Medalha Milagrosa, os Padres da Missão se imbuíram do nobre ideal de seu fundador São Vicente de Paulo, desde os idos de 1830, quando aqui chegaram, até os dias de hoje, colocando-se a serviço. Em contrapartida, encontraram a docilidade do povo que se mostrou generoso e agradecido pelas benesses trazidas pela Província da Congregação da Missão. Embora muitos Padres tenham passado por aqui e deixado a marca de seu trabalho e dedicação ao sacerdócio, queremos deixar nosso agradecimento a todos os 24 párocos que dirigiram a Paróquia nestes 150 anos. Representando todos os Ex-Párocos apresentamos ao Padre Donizete Dombroski toda a nossa gratidão e reconhecimento por seu valoroso trabalho à frente desta Paróquia. Merece destaque também, Padre Evilásio Amaral Junior, Vigário Auxiliar e Ecônomo, filho de Campina Verde que muito tem contribuído para o trabalho pastoral. Cada Pároco ou cada Vigário Auxiliar deixou aqui seu tijolinho que, juntando-se a outros, fez erguerse esta sólida construção que é a Igreja. Em particular, esta Paróquia sempre obteve o patrocínio de Nossa Senhora, Mãe de Jesus, primeiro, sob o título de Nossa Senhora Mãe dos Homens, até 1930. A partir de então, Nossa Senhora da Medalha Milagrosa passou a ser a padroeira do Município. Este Santuário a ela dedicado, é para os campinaverdenses um tesouro de incontável valor, pois, é este templo o retrato vivo do trabalho que aqui foi realizado pelos Filhos de São Vicente de Paulo.
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ARTIGO
Por Mauro Sérgio Santos da Silva*
No devagar depressa dos tempos… Um breve memorial sobre o antigo Seminário Menor de Campina Verde
Fevereiro de 1999. Praça São Vicente, número 1, Campina Verde-MG. Não era outro senão este o destino de aproximadamente duas dezenas de fervorosos jovens no afável município mineiro de uma região que outrora atendera pela alcunha de Sertão da Farinha Podre. O prédio do antigo Seminário São Justino de Jacobis compunha - ao lado da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Medalha Milagrosa, da Casa dos Padres e Irmãos Lazaristas e da Fazenda - o complexo arquitetônico que marca, desde o século XIX, a presença da Província Brasileira da Congregação da Missão (PBCM) em Campina Verde-MG. Seus três pisos, constituídos por cômodos espaçosos, contavam com vastos dormitórios, salas de aula, capela, ambientes destinados à recreação, pátios, quadra de esportes, jardins, pomares ...
Em tudo havia uma finalidade pedagógica. A vida era, ela própria, em todos as suas instâncias, um processo educacional. No SSJJ, os coirmãos da PBCM eram, como postulara Padre Lauro acerca do Colégio São Vicente, “ao mesmo tempo Professores, Educadores e Formadores”. No seminal convívio com os Lazaristas, aprendíamos conteúdos conceituais, atitudinais e valorativos.
Oriundos, precipuamente, de Minas Gerais, da Bahia, do Rio de Janeiro e do Distrito Federal, os estudantes provinham, amiúde, de famílias modestas sobremaneira. Na bagagem: porta-retratos, a saudade de casa posta sobre os instantes das estantes dos vastos espaços daquele antigo edifício; poucas e simples mudas de roupas que indicavam seios familiares precariamente abastados; por vezes, um violão velho, livros, CD’s, rosários, espelhos, entre outros. Diferentemente das malas, os corações, esses, sim, aportavam repletos, plenos, sobejamente vibrantes! Tal qual aquele casarão, tudo era grande, inten12 INFORMATIVO SÃO VICENTE
so, vivaz, solene! Dado o ardor daquela hora, indubitavelmente, gozavam de vitalidade e espírito visionário capazes de “fazer a revolução”, “reformar a Igreja”, “mudar o mundo”! Por certo, aquele pequeno universo constituía-se no preâmbulo da conquista do mundo! A experiência era de profundo entusiasmo, do grego, enthousiasmos, que denota algo como ter Deus dentro de si. Experiência, esta, seguramente, análoga à de Pedro, Tiago e João quando em face do Cristo transfigurado subitamente reconheceram: “Mestre, é bom estarmos aqui!” (Mt, 17, 4). Afigurava-se imperativo, é verdade, “descer a montanha”, encarar a prosaica realidade. Entretanto, à ocasião, já se podia participar da magnitude do seguimento. Destarte, o lema que à época constava do Regimento do Seminário São Justino de Jacobis (SSJJ) fazia eco ao brado do discípulo André, dirigido a seu irmão, Simão Pedro: “Encontramos o Messias” (Jo, 1, 41).
Paulatinamente, pois, a solenidade adquiria, sob a ótica vicentina, os contornos da candura evangélica, em atenção às palavras do fundador: “Os que desejam realmente seguir as máximas de Cristo, devem ter em grande conta a simplicidade”. Simplicidade, esta, liturgia, por excelência, da propedêutica ao encanto do serviço aos pobres, propugnada por um conjunto de princípios e práticas educativas. Nesta direção, as referências teóricas do processo formativo no SSJJ, eram consignadas pelo docu-
mento Ratio Formationis e apontavam para uma Pedagogia Libertadora coadunada à Teologia da Libertação com vistas à emancipação e à autonomia, consoante com a realidade social, mormente, dos empobrecidos. Estimulava-se a vivência de uma espiritualidade encarnada que articulasse fé e vida, teoria e prática, religiosidade e realidade, oração e ação. Priorizavase o coletivo. Ressaltava-se a comunidade. Valorizava-se o comedimento e o desprendimento. Nisso consistia o processo de crescimento e amadurecimento cristão e existencial daqueles jovens que, nesta sorte, podiam desenvolver-se “em sabedoria, estatura e graça na presença de Deus e de todas as pessoas” (Lc, 2, 52). No Seminário Menor de Campina Verde, o discernimento vocacional amalgamava-se à iniciação formativa em suas dimensões: vicentina, humana, intelectual, espiritual, apostólica e para a vida comunitária. Estas, por sua vez, materializavam-se nos diferentes aspectos da vida, por meio de práticas e concepções que constituíam uma pedagogia ou, antes, um itinerário formativo. Em tudo havia uma finalidade pedagógica. A vida era, ela própria, em todos as suas instâncias, um processo educacional. No SSJJ, os coirmãos da PBCM eram, como postulara Padre Lauro acerca do Colégio São Vicente, “ao mesmo tempo Professores, Educadores e Formadores”. No seminal convívio com os Lazaristas, aprendíamos conteúdos conceituais, atitudinais e valorativos. Na contramão dos valores da sociedade contemporânea, não havia, ali, espaço para o individua-
lismo e o isolamento. À maneira das comunidades primeiras, colocava-se “em comum todas as coisas” (At, 2, 44). Tudo era essencial e genuinamente comunitário! A organização do tempo e do espaço educava para a vida em comunidade. Os refeitórios e dormitórios, a biblioteca, as salas de estudo e os demais espaços de interação (...) Igualmente coletivos eram os objetos e utensílios de trabalho doméstico. E, sobretudo, comunitárias eram todas as atividades dos estudantes: as orações, os estudos, o trabalho, as refeições, o esporte, o lazer, as ações pastorais e a participação em eventos sociais. Assim, novamente oportunas sobre aquela comunidade juvenil são as palavras exaradas das Sagradas Escrituras: “Diariamente, todos juntos frequentavam o Templo e nas casas partiam o pão, tomando o alimento com alegria e simplicidade de coração. Louvavam a Deus e eram estimados por todo o povo” (At, 2, 46-47). A rotina dos seminaristas emanava do eixo oração-trabalho-estudo. Tal como estabelecido na Ratio Formationis, o trabalho ocupava lugar importante no cotidiano dos estudantes: cuidados com a horta e o jardim, atividades de limpeza, manutenção e conservação da casa. Também as atividades físicas e a prática de esportes eram não apenas regulares, mas obrigatórias, posto que se considerava ser, este, componente significativo da vida comunitária. Dignos de nota, neste âmbito, foram a prática da >>> INFORMATIVO SÃO VICENTE 13
capoeira e o bom e velho futebol. Havia um grupo de estudantes bons de bola! Os alunos cursavam os estudos regulares (escolares, propriamente) e específicos, além de períodos destinados a atividades acadêmicas pessoais nas quais se exigia obsequioso silêncio e concentração. Os estudos regulares (Ensino Fundamental, Ensino Médio) ocorreram, inicialmente, no afamado Colégio dos Padres e, em seguida, na E.E. Nossa Senhora das Graças. Tinham por mote, sobretudo, a preparação para o ingresso no Ensino Superior. Somava-se a esta, uma formação específica realizada no próprio Seminário, composta por reforço escolar, Latim, Francês, Redação, Vicentinismo, Doutrina da Igreja, entre outros. A formação acadêmica reverberava nas atividades culturais. Não havia quem escapasse àquela atmosfera culturalmente estimulante. Lia-se muito. Inúmeros foram os que, à época, forjaram-se músicos. Os estudantes produziam poemas, paródias, peças de teatro, jograis e outras formas artísticas de expressão em atividades internas ou voltadas à comunidade campina-verdense. Ponto alto deste processo dava-se com o Grêmio Cultural Estudantil São Justino de Jacobis: organização responsável pela captação de recursos, promoção de eventos e atividades culturais. Por meio do Grêmio, os alunos eram iniciados na agremiação estudantil, na arte da oratória, do debate e na produção cultural. Eram “infinitamente inventivos” (SV). Na Paróquia Nossa Senhora da Medalha Milagrosa de Campina Verde, os seminaristas atuavam, ainda que de forma incipiente, em diferentes pastorais e movimentos: equipes litúrgicas, corais e grupos de jovens. Contribuíam com as festas dos padroeiros, exerciam liderança nos eventos escolares, ocupavam funções representativas nas instâncias colegiadas da Escola, participavam de torneios esportivos, festividades e eventos sociais da cidade.
No devagar depressa dos tempos, duas décadas nos distam do encerramento das atividades do SSJJ. Nesta feita, podemos afirmar, embora não sem emoção: fizemos história! Contamos os dias, as horas. Contamos com os outros. Cantamos em roda. Encantamos. Encantamo-nos inúmeras vezes: em cantos part-idos, em cantos di-versos. Construímos universos de lutas, desejos e sonhos! Conhecemos olhares que iluminaram curvas e manhãs. Guardamos sorrisos, abraços e palavras; enleios, partilhas, chegadas e partidas; arranjos, encontros, desencontros e despedidas. Aprendemos dos Padres da Missão, "o mais importante e bonito do mundo: que as pessoas (e as coisas) não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas, vão sempre mudando” (Guimarães Rosa). Destarte, partimos ante a pretensão de verdades irrefutáveis; seguimos em frente, quando da revelação de certezas absolutas. Ignoramos os lugares estabelecidos. Reviramos o que antes parecia imutável. Posto que, conforme Paulo Freire, “A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não pode dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria”. Compreendemos o essencial: que tudo muda, que nada permanece o mesmo, que as mesmas águas não nos banham duas vezes (Heráclito); “a realidade pode mudar, o homem pode mudar” (Papa Francisco), que a felicidade não está no porto, mas na viagem (Galeano), no caminho... Aliás, no meio do caminho, houve, sim, pedras! Na verdade, por aquelas paragens, havia inúmeras pedras e rochas e pedregulhos. Mas nós as carregamos. Nós as saltamos. Nós as lançamos para fora do caminho. Construímos pontes lançando mão das pedras contempladas ao longo do caminho. Edificamos outros caminhos. Inventamos, graças às vivências propiciadas pelo SSJJ, um novo jeito de caminhar.
Em sua curta duração, das vocações amadurecidas no Seminário São Justino de Jacobis, muitas não se revelaram consentâneas com a Vida Consagrada. Além de sacerdotes e religiosos, o Seminário de Campina Verde fez germinar o que um dos seus denominara cristãos autênticos, missionários fecundos e cidadãos virtuosos: educadores, professores, militares, escritores, jornalistas, artistas, militantes de movimentos sociais, lideranças comunitárias, sindicais e políticas difundidas por todo o país.
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*Mauro Sérgio dos Santos Silva foi seminarista e presidente do Grêmio Cultural São Justino de Jacobis. Atualmente é professor de Filosofia e doutorando em Educação.
Lista de seminaristas do SSJJ que se tornaram clérigos ou irmãos Nome | Ano de entrada | Destino 1. José Geraldo Sobreira | 1975 | Diocesano 2. Hélio Divino Estival | 1977 | Padre 3. Roberto Hosken | 1977 | Padre 4. Carlos Euzébio Ferreira | 1979 | Padre 5. Vanderlei Bueno Silva | 1980 | Diocesano 6. Edmar Roque Teixeira | 1981| Irmão 7.
Luiz Roberto Lemos do Prado | 1982 | Padre
8. Evilásio Amaral Júnior | 1982 | Padre 9. João Carlos Borges | 1982 | Padre 10. José Carlos Borges | 1982 | Padre Foto: Arquivo Elson Perez
1994
11. Márcio Nicolau da Silva | 1982 | Padre 12. Juarez Carlos Soares | 1983 |Padre 13. Geraldo Bárbaro Melo | 1985 | Diocesano
A tradicional foto na escada Ao modo do que se fazia no antigo Seminário do Caraça, os estudantes do SSJJ se reuniam todos os anos para a tradicional foto na escada. Enquanto os seminaristas caracenses costumavam ser fotografados vestidos, solementente, com suas batinas pretas e hermeticamente alinhados por ordem de tamanho, os estudantes de Campina Verde demonstravam sempre muita descontração na “foto oficial”, conforme os exemplos deste quadro.
14. Ilton de Paula Resende | 1986 | Diocesano 15. Admar Francisco Freitas | 1986 | Irmão 16. Júlio César Oliveira | 1987 | Diocesano 17. Wander Ferreira | 1987 | Padre 18. Paulo Sérgio Ferreira Almeida | 1988 | Diocesano 19. João Donizete Dombroski | 1989 | Padre 20. Valmir Severino de Almada | 1989 | Padre 21. Edson de Oliveira Silva | 1990 | Padre 22. Paulo José Araújo | 1990 |Padre 23. Geraldo Eustáquio Mól Santos | 1991 | Padre 24. Manoel Bonfim da Conceição | 1991 | Padre 25. Eduardo Raimundo dos Santos | 1992 | Padre 26. Francisco Ermelindo Gomes | 1992 | Padre 27. Luiz Rodrigues Veras | 1992 | Padre 28. Vandeir Barbosa Oliveira | 1994 | Padre 29. André Luiz Ferraz | 1997 | Padre 30. Franster Antônio Hyckson | 1997 | Diácono 31. Emanoel Bedê Bertunes | 1997 | Padre 32. Osmar Rufino Dâmaso | 1997 | Padre 33. Tadeu Oliveira Porto | 1997 | Padre
Foto: Arquivo Osmar Dâmaso
34. Deoclides Magalhães Rodrigues | 1998 | Padre 35. Lucas Reis Pereira | 1998 | Diocesano 36. Milton Pereira de Jesus | 1998 | Irmão
1999
37. Adriano Ferreira Silva | 1999 | Irmão 38. Vinícius Augusto Teixeira | 2000 | Padre
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E S PA Ç O D O S S E M I N A R I S TA S
por Sem. Leonardo Paredes de Almeida
A vocação do Missionário Vicentino em tempos de intolerância
Caro leitor, cara leitora, é uma alegria poder nos comunicar com você por meio desta coluna de nosso Informativo. Boa parte do ano já se passou e precisamos lançar um olhar sobre nossa caminhada até aqui, como pessoas e também como missionários vicentinos. Refletir se colocamos em prática as propostas, projetos e atividades e se estão enraizadas na Espiritualidade Vicentina. Neste breve contato, gostaria de refletir com você sobre a nossa vocação em tempos de desigualdade, injustiça e luta social. Sem dúvidas, vivemos em tempos sombrios. Tempos de incertezas, de uma realidade marcada pela desigualdade e injustiça, por discursos de ódio e intolerância. Lutar pela vida se tornou uma realidade quase que heroica e admirável. A intolerância permeia nossa esfera social e ganha força a cada dia. A seguir, elencamos alguns pontos onde encontramos a intolerância bastante presente. Antes, porém, recorramos a traços que nos ajudam a formular o conceito de intolerância, dentre eles está o movimento de ódio ou repulsa. Movido pelo ódio, o indivíduo, por ora, exclui o outro, ignora o posicionamento, por muitas vezes, diverso, gerando consequências negativas e até mortes. Eis algumas faces da intolerância: • Intolerância Religiosa: é a discriminação e preconceito em relação a pessoas que expressam uma religião diferente do outro. • Intolerância Política: é o fato de desrespeitar e oprimir o outro pela opinião diversa dele em relação à escolha político-partidária.
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• Intolerância frente à orientação sexual: é o fato de não aceitar as diferenças em relação à orientação sexual que o outro fez. • Intolerância de raça ou cor: é o fato de discriminar o outro pela cor ou por sua raça, distinguindo-o dos demais na sociedade, inferiorizando. Como Vicentinos podemos nos perguntar: A partir de uma espiritualidade tão rica e tão efetiva, como podemos nos movimentar na contramão para a transformação da sociedade, a fim de que ela seja mais humana, sensível e atenta às necessidades dos irmãos? A partir desta pergunta lançamos um olhar em Vicente de Paulo e em todos aqueles que se puseram a caminho neste jeito de ser Igreja, de ser pessoa, estes fizeram a profunda experiência de encontrar Cristo naquele que sofre. E nesta experiência sobressai o respeito e a misericórdia frente à pluralidade. Muitas vezes nossa humanidade nos impede de uma aproximação afetiva e efetiva junto àqueles que sofrem, dos que são excluídos,
daqueles que recebem olhares carregados de ódio e preconceito, quando nenhuma forma de pobreza nos deve ser estranha. Acreditamos, firmemente, que aquele que bebe da fonte vicentina não pode estar comungando de opiniões que excluem ou se fecham frente as mais variadas formas de pobreza no hoje da vida. E tendemos a reduzir pobreza somente à falta de alimento, roupas ou moradia. Precisamos ampliar o que temos em mente e coração, e perceber que há pobrezas que vão além. Pobrezas que excluem, fecham, oprimem e que podem matar. Todos nós precisamos ser promotores da vida, agentes transformadores, que em meio a uma ideologia da indiferença e exclusão, agem, iluminados pelo espírito de Cristo, superando e ajudando os demais a vencerem todas essas mazelas. Precisamos, como sujeitos da missão e da caridade, desenvolver possibilidades e meios para uma transformação da sociedade. Não podemos nos satisfazer somente com as visitas aos pobres, a dar alimentos, a fazer entrega de roupas e medicamentos, mas ampliar o Anúncio, lançando-nos em um movimento de olhar quem sofre e perceber que além do que podemos ajudar no efetivo da vida, perceber que o outro precisa de nossa atenção, respeito e amor, características que perdem forças em nossos dias. Aqui nos cabe evocar as cenas finais do filme Monsieur Vincent, onde São Vicente se dirige a uma irmã da caridade com as seguintes palavras: “Só por seu amor... pelo seu amor, só... que os
pobres lhe perdoarão pelo pão que você lhes dá”. Peçamos a São Vicente de Paulo que nos ajude com o seu exemplo missionário a seguir em sua espiritualidade com coragem, sensibilidade, respeito, empatia e principalmente amor. Movidos pela caridade, seremos realmente sinais de Jesus Cristo - Evangelizador dos Pobres. Cabe a cada um de nós promovermos o respeito e vivermos as virtudes da humildade, simplicidade, mansidão, mortificação e zelo, de modo que nosso ser missionário seja mais autêntico, efetivo e real junto dos pobres, a quem o Senhor nos confiou servir.
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Foto: Arquivo da SAVV
PA S T O R A L V O C A C I O N A L
Por Pe. Denílson Mathias
Como fazer uma boa Pastoral Vocacional Sobre a arte de tocar o coração dos jovens Encontro com jovens da comunidade de Tocoiós, em Francisco Badaró.
Em um de seus últimos vídeos, "Recomendaciones de Papa Francisco para hacer una buena Pastoral Vocacional" (busque este título no youtube), o Papa Francisco nos deu conselhos de como fazer uma boa Pastoral Vocacional. Ele começa falando em “criar uma abertura no coração dos jovens para o chamado de Deus”. A partir desse vídeo, quero compartilhar alguns sentimentos que talvez possam animar a nossa Província na sua Pastoral Vocacional. Começo com o que disse o Santo Padre: “O Senhor continua chamando, somos nós que falhamos (...) não sabemos como preparar o terreno para este chamado”. Na linha do que temos refletido a respeito da Cultura Vocacional, é necessário reconhecer que Deus nunca deixou de chamar. Então, por que a reclamação a respeito das baixas vocacionais? Porque também não reconhecemos que, muitas vezes, não sabemos preparar o terreno para o chamado. O Papa está certo ao dizer isto. Ao pensar em uma mentalidade que perpasse a cultura vocacional, precisamos nos conscientizar de que é preciso preparar o solo onde as vocações são semeadas por Deus. Por isto, é preciso pensar nas várias ferramentas que temos hoje em dia, para criar espaços férteis onde a vocação possa ser semeada. Pergunto-me, abrimos espaço para as juventudes em nossos campos pastorais? Aproximamo-nos dos jovens que nos 18 INFORMATIVO SÃO VICENTE
procuram? Não há como criar abertura no coração dos jovens se a nossa relação com eles é superficial e não gera confiança. A relação com as juventudes é uma das primeiras ferramentas que Deus usa no preparo do solo da abertura e da acolhida, tendo em vista um trabalho vocacional. “Não sabemos acompanhar, não sabemos fazer amadurecer...” É preciso estar atentos às demandas do acompanhamento vocacional, hoje em dia. Ao pensar um mundo de transformações constantes, devemos pensar em novos métodos para o acompanhamento vocacional, que levem o indivíduo à alcançar a maturidade necessária em vista do chamado. É preciso gerar e gerir uma mentalidade que crie espaços propícios para acompanhamentos eficazes, que gerem crescimento pessoal. Um acompanhamento sério nos leva à consciência de que os jovens não chegam prontos aos nossos seminários ou às nossas casas. O acompanhamento vocacional deve considerar as histórias pessoais dos candidatos e deve promover a integração da pessoa, sem jamais fragmentar o seu ser. Portanto, a atenção, o respeito e o cuidado com a história do outro são elementos imprescindíveis na relação acompanhante-acompanhado. O caminho é para ser feito juntos, só assim se alcança a maturidade. Os animadores vocacionais precisam ter paciên-
cia. Diz o Papa Francisco que “algo que é chave no trabalho vocacional é a paciência”, “os jovens de hoje precisam falar, precisam ser escutados”. Uma comunidade vocacionalizada é uma comunidade aberta à escuta do outro. Os jovens que nos procuram querem ser escutados, querem falar. São muitas as dúvidas, os questionamentos e “escutar não é fácil, é uma penitência”, principalmente quando os jovens “trazem sempre a mesma coisa”.
para fazer valer a sua energia e força, buscarão esta “descarga” em aplicativos, em sites, em outros tipos de gratificações, fazendo esvair o sentido de um real caminho vocacional. O Papa Francisco diz que “é belo promover a educação”, “é belo levar uma ajuda”, “é belo levar Jesus”, “é belo celebrar uma missão”, precisamos colocar os nossos jovens neste caminho, o caminho do movimento, que é o caminho próprio de Jesus.
Às vezes, o animador vocacional faz o papel inverso e acaba falando mais do que escuta. A fala é um processo de revelação; a partir dela podemos adentrar com mais profundidade nas motivações que levam um jovem a optar por um caminho de discernimento vocacional. Por isto, é importante escutar sempre; é importante falar menos. Depois de uma escuta atenta, poderemos ponderar com mais segurança a respeito do que foi ouvido e propor caminhos mais seguros para o discernimento. Paciência, em todos os sentidos, paciência na acolhida, paciência na escuta, paciência frente às diferenças, paciência com o tempo do outro, isto edifica o trabalho da Pastoral Vocacional. Pessoas impacientes não servem como bons agentes da animação vocacional e nem para a formação; são pessoas desanimadoras.
Finalmente, “há uma coisa antiga, coisa antiga e que não passa: Jesus nos mandou rezar”. Uma Pastoral Vocacional que passe somente pelo lado técnico do acompanhamento, que vise somente os testes de aptidões e de personalidade, que se centre somente em uma visão de recrutar, não pode gerar coisa boa. Por detrás de todo o trabalho vocacional está a oração, a mística e a espiritualidade. Desde o rezar pelas vocações ao rezar com as vocações, a oração é o sustento para os que animam os vocacionados e para os que são chamados. A oração é capaz de revigorar os ânimos caídos e de restaurar as forças para a jornada. Ela é o modo e o meio pelo qual mantemos um nível de intimidade com Deus, que nos remete sempre ao próximo. A oração refaz o nosso interior e coordena todas as nossas ações. Deste modo, no trabalho da Pastoral Vocacional, a oração, a reza e as experiências na área da espiritualidade são o que favorecem o indivíduo chamado em vista do seu sim a Deus.
“Colocar os jovens no caminho” é um dos desafios para a Pastoral Vocacional. Os jovens têm dificuldades com as coisas estáticas, é preciso mantê-los em movimento. Logicamente, haverá momentos de quietude; mas tentar minar a energia do movimento que é própria da juventude seria um grande pecado. “Os jovens gostam de caminhar”, por isto é preciso colocá-los no caminho. Os jovens que não se movem, que não se mexem, que estão sempre estáticos, correm o risco de buscar outras gratificações, principalmente quando entram para o seminário. Se não têm espaço
Ao seguirmos os conselhos do nosso Papa Francisco, poderemos fazer um trabalho vocacional conjunto, com mais excelência. “Escutar”, “paciência”, “caminho” e “rezar” são elementos que dizem respeito à mentalidade, à sensibilidade e à práxis da cultura vocacional. Peçamos a Deus a graça de desenvolvê-los em nosso apostolado. Encontro com jovens e crianças da SSVP em Belo Horizonte.
Foto: Arquivo da SAVV
C OT I D I A N O P ROV I N C I A L
por ConTato Assessoria de Comunicação Com colaboração do Pe. Emanoel Bedê Bertunes
Passado e futuro se encontram no Antigo Seminário de Petrópolis Casarão será reformado e transformado em moradia compartilhada O Seminário São Vicente de Paulo, localizado à Avenida Barão do Rio Branco, nas proximidades do centro de Petrópolis (RJ), passará a funcionar como um complexo residencial, onde cada morador terá seu espaço privado e uma grande área para ser compartilhada (coliving). Além disso, haverá um espaço de trabalho que também se baseia no compartilhamento de espaço e recursos de escritório (coworking), café, lavanderia, academia de ginástica, restaurante, pátio de trabalho ao ar livre, jardim, salas de reunião e cozinha gourmet. O empreendimento é fruto de uma parceria entre a Província Brasileira da Congregação da Missão e as construtoras Solidum Ltda. e a Engeprat Engenharia e Serviços Ltda. O imóvel foi comprado pela Província Brasileira da Congregação da Missão em 1882, primeiramente com o objetivo de ser uma escola. Mais tarde, na
Imagem: Contato Comunicação
Modelagem digital da obra (projeção)
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primeira metade do século XX, foi construído o prédio anexo, com quatro pavimentos, para ali funcionar o Seminário São Vicente de Paulo. Tornou-se assim um complexo que abrigava padres formadores e seminaristas oriundos de todas as partes do Brasil, para ali fazerem o Seminário Interno (Noviciado), Filosofia e Teologia. Na capela que faz parte do complexo foram ordenados dezenas de missionários lazaristas. Tendo em vista os valores histórico e artístico do imóvel e o alto custo de manutenção e preservação, já que o mesmo é tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac-RJ), a mantenedora passou a procurar parcerias e investidores que se interessassem em empreender algum projeto para dar nova utilidade ao conjunto arquitetônico. “Foi assim que surgiu a parceria entre a Província
DESTAQUES
DO
COLIVING
✤ Aproximação de pessoas e troca de experiências. ✤ Consumo pensado na colaboração. ✤ Projeção compartilhada de residências. ✤ Economia de recursos naturais. ✤ Divisão de decisões e tarefas.
Brasileira da Congregação da Missão (PBCM) e as construtoras petropolitanas Engeprat e Solidum, para desenvolver este belo e audacioso projeto de restauração, preservação e adequação das instalações deste charmoso complexo de estilo francês”, disse o padre Emanoel, salientando que é preciso entender que “o Seminário São Vicente de Paulo não pode ser entendido como um sobrevivente, mas contemporâneo de novos tempos, com novas exigências de ocupação dos espaços para explorar de forma responsável todo o seu potencial”. Em um projeto minuciosamente estudado entre as partes e o arquiteto Carlos Marcolino, nasceu a proposta do residencial, que vem com o intuito de trazer benefícios, não só para os moradores, mas também para a cidade de Petrópolis, preservando seu patrimônio histórico com a recuperação do Seminário, que conta com dois prédios e uma igreja, “além da geração de emprego e renda com a arrecadação de impostos, aumento do número de unidades habitacionais, mobilidade urbana, condições de moradia tipo flat, com possibilidade de aluguel de curto ou longo prazo”, acrescenta Osmar Musse Felix, diretor presidente da Construtora Solidum e sócio do empreendimento ao lado de Luiz Fernando Gomes e Guilherme Gomes de Lima, da Engeprat.
prédios, principalmente do bloco B, que necessita de mais cuidados. Ao todo, o empreendimento abrigará 149 unidades com metragem que varia entre 16,19 m² e 46,56 m², com possibilidade de modular para aumentar o tamanho. “Serão flats, todos suítes com banheiro completo e alguns com uma copa. Nosso foco está nas pessoas com a cabeça voltada para essa tendência que surgiu em Londres e que vem se espalhando rapidamente pelo mundo, que é viver o compartilhamento. Também pensamos nos estudantes e empresários que passam a semana aqui e residem em outra cidade, e nos turistas e pessoas que tenham curiosidade de viver ou passar um tempo dentro da história”, explica Osmar. A previsão é de que a obra seja iniciada em outubro deste ano, assim que a parte legal estiver concluída. Para os interessados, será elaborado um esquema de financiamento próprio das incorporadoras com prazo longo. De acordo com o cronograma, a previsão é de 24 meses de obra para o bloco A e de 36 meses para o bloco B. Os imóveis custarão a partir de R$ 158 mil. “A obra preserva todo o conjunto arquitetônico deste prédio histórico e as interferências serão as menores possíveis, já que entendemos se tratar de uma preciosidade”, conclui o diretor da Solidum, Osmar Musse Felix. Interior do Antigo Seminário de Petrópolis
Eles consideram que o grande desafio em termos de obra é a adequação de um plano viável às construções existentes, com novas instalações e banheiros em áreas com piso de madeira e a restauração dos dois
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ARTIGO II
Por Pe. Luiz de Olivera Campos
A Dimensão política e social do Evangelho São Basílio - São Gregório De Nissa - São João Crisóstomo - Santo Ambrósio
Introduzindo: O Brasil vive hoje tempos de crise contra os pobres e a esperança. Na verdade são muitas as crises no tecido histórico, com mudanças nefastas na vida concreta do povo brasileiro. Há uma crise política das elites que governam sem respeitar valores e justiça. Há uma crise econômica, que privilegia os bancos, os latifundiários, o império financeiro, arrasando os pequenos produtores e explorando as classes trabalhadoras. Há uma crise institucional de um Estado que se fez surdo à democracia e à participação. Há uma crise ética em que corruptos e corruptores parecem mancomunados contra a nação. Faz muito barulho, mas ao final de tantos julgamentos, operações, comissões sindicantes, tudo acaba em pizza, e os roubos dos grandes permanecem impunes... Interesses daninhos contra as minorias demonstram diariamente que a justiça e a verdade não são normas obedecidas por parlamentares, governos ou até mesmo empresas. É o vale tudo do capitalismo que torna tudo mercadoria e no qual a vida humana é descartada como lixo. Assistimos à vitória das políticas excludentes e discursos imorais pelas redes de televisão contra camponeses, movimentos sociais e os protagonistas da cidadania. O povo vai sendo transformado em inimigo e quando vai às ruas para protestar é bombardeado pela polícia paga com seus impostos. Paradoxo total. Impunidade e cegueira moral. E muitas pessoas seguem caladas e cúmplices deste descalabro ético. A força dos poderosos parece triunfante e esmagadora. Não há espaço para a verdade. Precisamos recuperar a força política e social da mensagem de Cristo. Assumir a dimensão estrutural do seguimento de Jesus, ao lado dos empobrecidos. Será preciso recuar
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no tempo e buscar as luzes nos cinco primeiros séculos. Lá está a palavra que vale ouro e será valiosa em tempos de penumbras e mentiras das elites dominantes. É preciso voltar a ler as obras dos Padres da Igreja, particularmente de Santo Inácio de Antioquia (35 107) no século II até São Leão Magno (400 - 461) no século V. Esses doutores e teólogos acreditavam que as classes opulentas tinham como missão humana e cristã, guardar a vida dos pobres, provendo as suas necessidades, pois todos somos filhos da única família de Deus. Quem possui mais do que o necessário prejudica e nega a vida aos pobres e ofende ao Criador. É sempre possível dizer que o avarento é um ladrão, pois toma dos fracos o que lhes pertence. O antigo ditado latino já dizia: “Radix omnium malorum, avaritia”: A raiz de todos os males é a avareza. Enquanto não enfrentarmos essa maldade estrutural o povo seguirá o calvário da exploração. Basílio, o bispo pele e osso (331 - 379). Entre estes gigantes da Patrologia antiga, apesar da fragilidade física, encontramos o maior defensor das causas sociais no Império Romano. Seu nome é Basí-
lio de Cesaréia (331 - 379) o Bispo social conhecido como, Basílio Magno, das terras da Capadócia. Feito Bispo, com quarenta anos era magro, enfraquecido por jejuns e vigílias e quase não tinha mais carne nem sangue. Era sábio, clarividente, firme e compassivo, como se pede de um Bispo. Ele seria o meio termo entre a violência de Atanásio de Alexandria (295 373) e a astúcia de Cirilo de Alexandria (375 - 444). Ele sabia que os ricos são muitas vezes piedosos, mas raramente caridosos. Não só falava mas agia. Transformou o bairro mais miserável da cidade em um local de ação caritativa. Lá fez construir um albergue, um abrigo para idosos, um hospital com área reservada para doenças contagiosas, alojamento para empregados e operários e uma Igreja. Em suma, uma cidade operária, com sopa popular para os mais pobres. Sua fama o fez ganhar o apelido de “grande defensor dos pobres”. Sugeriu aos Bispos da região que fizessem o mesmo em suas cidades. Visitava o povo nas montanhas, com tato e sem dureza. Acolheu os pobres, os camponeses, as viúvas... Compareceu diante do tribunal civil para defender os fracos e foi salvo da morte pelos próprios pobres. Eis um trecho de sua homilia contra a riqueza: “que se nos apresenta atualíssimo: a quem estou fazendo mal? Pergunta o avarento guardando para mim o que me pertence? Mais quais são, dize-me os bens que te pertencem? De onde os tiraste? Os ricos são assim: decretam-se senhores dos bens comuns que açambarcaram, alegando ser os primeiros ocupantes. Se cada um conservasse apenas o que se requer para suas necessidades correntes e deixasse o supérfluo para os indigentes, a riqueza e a pobreza seriam abolidas. Quem é o avarento? Uma pessoa que não se contenta com o necessário. Quem é o ladrão? Uma pessoa que tira de alguém aquilo que lhe pertence. Ao faminto pertence o pão que guardas. Ao homem nu o manto que guardas, até nos teus cofres. Ao que anda descalço, o calçado que apodrece em tua casa. Ao miserável o dinheiro que guardas escondido. É assim que vives oprimindo tanta gente que poderias ajudar”.
Gregório, o bispo tímido (335 - 395) Outro Padre foi São Gregório de Nissa (335 395). Homem lacônico, introvertido e com grande senso de observação. Tinha horror à hipocrisia religiosa que afetava a tantos clérigos contemporâneos. Sendo uma pessoa reservada, foi um dos espíritos mais vigorosos de seu tempo. Foi uma personalidade de ação e de governo, mas simultaneamente um místico e homem da retórica. Era irmão de Basílio. Autodidata, possuía um estilo duro e desprovido de cor... Foi um pilar do monarquismo oriental... Consagrado Bispo em 372, foi acusado e deposto pelo Imperador Valente (328 378), mas depois chamado pelo povo para sua sede episcopal. Tomou parte no Segundo Concílio Ecumênico de Constantinopla (553). Foi o grande defensor da comunhão das Igrejas, enfrentando o cisma ariano. Sua preocupação prática e compassiva revelase em um pequeno texto que coloca os pobres como amigos prediletos de Deus. “Os pobres são os ecônomos de nossas esperanças, os guardiões do Reino celeste que abrem as portas aos justos e as fecham diante dos egoístas e maus. Acusadores terríveis, advogados poderosos, embora seu testemunho seja silencioso. A prosperidade de uma só casa na cidade poderia salvar uma multidão de pobres, contanto que não se interpusesse o obstáculo da avareza e do egoísmo do patrão”. >>>
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Crisóstomo, o bispo boca de ouro (307 - 407) Um terceiro exemplo de cuidado com os pobres e denúncia das estruturas de exploração do seu tempo, é São João Crisóstomo (307 - 407) o chamado boca de ouro. Nascido em Antioquia, terceira maior cidade do Império, faleceu em Comana, na fronteira com a Armênia, às margens do Mar Negro, durante o terceiro desterro punitivo e cruel. Era homem de baixa estatura, rosto magro, testa enrugada, cabeça calva, voz fraca. Pai e doutor da Igreja, arcebispo de Constantinopla, não tinha senso político. Era intransigente e nunca se dava bem com o poder e os poderosos. Foi um bispo distante dos palácios e das elites e orador nato, de uma pureza única, com estilo vivo e imagens abundantes. Alguns de seus sermões duravam duas horas. Como bispo, só repreendia para corrigir e converter. Amava o povo simples e sabia que por ele era amado. Nunca pactuou com os ricos nem com o luxo. Também como bispo começou a reforma por si mesmo: saía da casa episcopal de luxo acumulado pelo seu predecessor. Instituiu hospitais e asilos. Empreendeu evangelização entre os camponeses. Um de seus gravíssimos pecados foi ser antissemita. Duramente perseguido pela Imperatriz Eudôxia (404) mãe do Imperador Teodózio e de Teófilo, patriarca de Alexandria. Foi um grande reformador da Igreja e passou a ser perseguido pelas damas da corte. Em 398 nomearam-no Bispo de Constantinopla, contra sua vontade, ja que desejava continuar como monge. Sofreu três exílios humilhantes, durante os nove anos de seu patriarcado. Não usava alegorias, mas falava de forma clara e aplicação prática e ética. Todos os seus sermões trazem consequências e lições de caráter social. Ele, comumente, difere do lirismo de Gregório de Nanzianzo e da organização impecável de 24 INFORMATIVO SÃO VICENTE
Basílio Magno, mas supera a todos em perspicácia de sua psicologia e na emoção de sua palavra. Sua pregação jamais envelheceu. É um exemplo de bispo que não pactuou nem se vendeu ao poder, ao dinheiro e ao palácio. Soube e quis tomar o partido dos pobres. Escutemo-lo, pregando: “Tornemos útil o que é supérfluo. Deus vos deu um teto para vos abrigardes da chuva, não para forrá-los de ouro, enquanto pobre morre de fome. Deus vos deu vestimentas para vos cobrirdes com elas, não para bordá-las luxuosamente, enquanto Cristo morre de frio. Deus vos deu uma casa não para morardes nela sozinho, mas para receberdes o próximo. Deus vos deu a terra, não para esbanjardes a maior parte do seu lucro, com cortesãos e dançarinas, com comerciantes e tocadores de flauta e cítara, mas poderdes consolar os que têm fome e sede. Não existe nenhum pobre que por necessidade cometa tantos crimes como os ricos. Qual o rico que não cobiça cada dia os bens dos outros? Qual o potentado que não pretende expulsar o infeliz de seu pequeno terreno? Não nasceu senão um Acab. Mas o que é pior. Acab nasce todos os dias e jamais desaparece deste mundo. Ambrósio, o bispo pai dos pobres (339 - 397) Os nomes até agora citados são originários do mundo grego. Devemos agora citar alguém do mundo latino. É essencial recordar Ambrósio de Milão (339 397). Sucessor de um bispo herético e ariano, Ambrósio nasceu em Treveres quando o pai dirigia a prefeitura pretoriana para as Gálias. A mãe era uma cristã exemplar, tal qual a mãe de Crisóstomo ou a de Basílio. Feito governador civil de Milão, cuidou da sucessão que corria risco de luta corporal entre arianos e ortodoxos. Do meio da multidão ouviu-se a voz de
uma criança que gritava: “Ambrósio bispo! Ambrósio bispo!” E o povo aclamou unânime: e aquele que nem batizado era, foi feito o bispo da cidade. Excelente exemplo para que hoje também o povo participasse da escolha de seus bispos nas dioceses. Ambrósio transformou-se de bom governador civil em excelente pastor e pai de seu povo amado. Santo Agostinho de Hipona (354 - 430) seu discípulo no futuro dizia que o mestre vivia assediado de grande multidão de pobres, a ponto de se ter grande dificuldade de chegar até ele. Bispo lúcido, consagrado ao ministério da palavra, foi também o Bispo da Escritura Sagrada. Foi também um apóstolo das causas sociais, com rigor de um jurista e a severidade de um moralista. Acusava o mal do dinheiro e os excessos da propriedade que não deve possuir a primazia, em uma sociedade justa e humana era mais audaz que o próprio Basílio Magno. Sabia distinguir a ação da Igreja daquela do Estado. Ambrósio transformou-se de aristocrata romano em pai dos pobres, no decadente século IV. A fé cristã humanizou-o. Os pobres converteramno em verdadeiro seguidor da mensagem de Jesus. A graça de Deus fez dele um pastor à disposição total
dos pobres e dos refugiados. Fez-se bispo completo: doutor, pastor, médico, diretor de consciências, defensor da justiça, advogado dos pobres, missionário, unindo o ser e a ação. É de sua autoria este comentário: “Os pássaros se associam aos pássaros, o gado se reúne ao gado, os peixes aos peixes. Ó homem, tu somente expulsas teus semelhantes, enquanto recolhes e cuidas de animais selvagens. Constróis habitáculos para as feras e destróis os frágeis barracos dos homens pobres. Levas água até o meio de tuas propriedade, para que não faltem ali para a sede dos animais, mas estendeis as fronteiras para repelir teus vizinhos.” Concluindo: Retornar aos Padres da antiguidade é como beber das águas cristalinas da Palavra de Jesus. Não há melhores guias para o futuro do que escutar vozes lúcidas do passado. As épocas de cada um destes santos padres não são idênticas. Entretanto algo os unifica: o amor aos pobres e o fiel seguimento de Jesus. Ao enxugar as lágrimas dos pobres, descobrem o rosto de Deus. Só haverá conversão política e uma vida nova no Brasil se escutarmos as vozes dos crucificados de hoje e proclamarmos uma mensagem de paz e justiça social. Devemos alimentar-nos com os textos dos Padres de ontem. Unir os verbos esperar e apressar. Encarnar a justiça e o amor evangélicos para superar a cumplicidade e inércia de tantos cristãos, presos em sacristias e discursos ideológicos. Um novo Brasil poderá vir à luz se cada cidadão e cada cristão realizassem uma tríplice conversão prática: ● Agir e transformar suas vidas pelas mãos, na dimensão econômica do amor. ● Agir e transformar suas vidas pelos pés, na dimensão política da esperança. ● Agir e transformar suas vidas pelos olhos, na dimensão teológica da fé. “Em lugar de sofrer e fazer sofrer começar a criar juntos, a manejar e compartilhar, tornando presente o homem novo. Se a fé consiste em reconhecer o homem novo, consiste também em decifrar sua ação na história. “Tornemo-nos esses novos humanos de que o Brasil tanto precisa. Ouçamos os Padres. Sejamos mudança que queremos ver no mundo.” (Fernando Altemeyer) INFORMATIVO SÃO VICENTE 25
FAMÍLIA VICENTINA
por Pe. Agnaldo Aparecido de Paula
14º Encontro da Família Vicentina-RJ Reunidos no CSVP, cerca 700 membros Famvin celebraram a a alegria de compartilharem o carisma vicentino
Diz o salmista “vejam como é bom e agradável morar entre irmãos, viver todos unidos” (Sl 133,1). Fraternidade, descontração e grande alegria é como podemos descrever o clima reinante entre os participantes do 14º Encontro Anual da Família Vicentina, regional do Rio de Janeiro, ocorrido no dia 19 de maio, no Colégio São Vicente de Paulo (CSVP), Cosme Velho, Rio de Janeiro. É do conhecimento dos leitores do Informativo São Vicente, que a Família Vicentina (FV) é constituída pelo conjunto de congregações, organismos, movimentos, associações, grupos e pessoas que, de forma direta ou indireta, prolongam no tempo o carisma vicentino, sejam eles fundados diretamente por São Vicente de Paulo, ou encontrem nele a fonte de sua inspiração e dedicação ao serviço dos pobres. A região do Rio de Janeiro é agraciada com a presença de oito dos mais de 20 Ramos da FV existentes no Brasil. São eles: Associação Internacional de Caridades (AIC), Congregação da Missão (CM), Companhia das Filhas da Caridade (FC), Instituto das Irmãs de São Vicente de Paulo Serva dos Pobres de Gysegem (ISVPG), Juventude Mariana Vicentina (JMV), Associação da Medalha Milagrosa (AMM), So-
ciedade de São Vicente de Paulo (SSVP) e Associação dos Missionários Leigos Vicentinos (MISEVI). A FV recebeu de Deus e de São Vicente um precioso dom para o serviço aos Pobres, na Igreja e na Sociedade. No entanto, muitos Ramos encaminham sua vida e ação dentro dos limites e fronteiras dos próprios grupos. Muito presos ao seu modo de ver e agir, às suas práticas, costumes e obras, conhecendo pouco uns aos outros e apresentando alguma dificuldade para empreender uma ação de parceria e cooperação. Diante desta realidade vem sendo fortalecida a seguinte convicção: na medida em que os Ramos se conhecerem melhor e estreitarem os laços de amizade e cooperação, descobrirão o enorme potencial existente na FV. É bom lembrar a recomendação de São Vicente de Paulo aos seus companheiros “para que haja e sempre se conserve entre nós inteiramente a caridade fraterna e a santa união, todos se terão mutuamente grande respeito, convivendo entre si à maneira de íntimos amigos” (RC VIII,2). Buscando estratégias que contribuíssem para efetivar a convicção e a recomendação de São Vicente, em 2005, uma Equipe constituída pelo Pe. Geraldo E. Mól Santos (CM), Maria Neide da Silva (CSVP) e Padres da CM acolhem os participantes do Encontro antes da Celebração Eucarística.
Foto: Ir. Adriano Ferreira
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des patrocinados pelo Grêmio Estudantil do CSVP, todos seguiram para uma das mais de 25 oficinas, oferecidas em diversas áreas: artesanato, canto coral, dança, formação de lideranças, maquiagem básica e para festas, fantoches, contação de histórias, habilidades para pais e mães de crianças e adolescentes, Mindfulness (meditação em movimento e atenção plena), relaxamento e conscientização corporal, educação financeira, grafitti, introdução ao teatro e outras. Finalizamos o Encontro invocando as bênçãos de Ramos da FamVin presentes na celebração.
Foto: Ir. Adriano Ferreira
José do Carmo da Silva (SSVP), assume o compromisso de realizar o 1º Encontro dos Ramos da FV atuantes no Rio de Janeiro. O evento surgiu timidamente, com a participação de 70 pessoas. No entanto, a adesão foi tamanha que rapidamente chegou a centenas de participantes. E como foi o 14º Encontro? A partir das 7 horas da manhã, aproximadamente 700 pessoas, entre convidados e voluntários, dos diversos Ramos da FV, foram chegando. Vieram de diversas regiões do Rio de Janeiro e de cidades vizinhas: Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Petrópolis, Maricá, Niterói e Japeri. A calorosa acolhida de irmãos e irmãs que se querem bem se estendeu pelo café partilhado, regado a sorrisos, abraços e muita conversa para ser colocada em dia. Os membros da FV devotam um profundo amor à Eucaristia, fonte e ápice da vida cristã (LG, 11). Deste modo, a celebração da Santa Missa é um dos momentos mais valorizados, contando com animada e piedosa participação de todos. Preparada e animada com zelo por membros da FV e da Comunidade do Colégio São Vicente, a celebração foi presidida pelo Pe. Denílson Matias da Silva e concelebrada pelos Padres Luís Rodrigues Veras, José Valdo dos Santos e Agnaldo Aparecido de Paula. É preciso destacar que, mesmo em dia de festa e confraternização, o espírito vicentino não deixa de agir naqueles que vocacionou. Em solidariedade com a Campanha “Aliança da FV com os Sem Teto”, a coleta realizada no ofertório foi destinada à construção de uma casa emergencial para uma família em situação de vulnerabilidade, projeto dos alunos do CSVP em parceria com a ONG Teto. Os Encontros da FV-RJ dedicam tempo para a reflexão e a partilha de um tema escolhido para cada ano. “A Família Vicentina e o desafio de construir uma Cultura Vocacional Vicentina” foi o tema deste ano. Escolhido em consonância com proposta apresentada pelo Conselho Executivo Internacional da Família Vicentina. Divididos em 18 grupos, os participantes do 14º Encontro, discutiram e partilharam suas experiências sobre o tema, subsidiados por materiais preparados pelo Pe. Eli Chaves dos Santos e Pe. Agnaldo. Após o almoço, graciosamente oferecido pela PBCM e acompanhado de animado sorteio de brin-
Deus e oferecendo uns aos outros, aquele caloroso abraço fraterno, que não é de despedida, mas de um até o 15º Encontro. Podemos afirmar que o sucesso dos Encontros da FV-RJ tem como única explicação o zelo (cuidado), expressão do amor, na preparação de tudo que é feito. “O zelo consiste em um desejo puro de tornar-se agradável a Deus e útil ao próximo. Zelo por estender o Reino de Deus, zelo por trabalhar na salvação do próximo. Existe algo no mundo de mais perfeito? Se o amor de Deus é um fogo, o zelo é sua chama; se é um sol, o zelo é o raio. O zelo é o que há de mais puro no amor de Deus” (SVP XII, 313). Este evento é uma humilde contribuição para que sejam concretizados os nobres objetivos da FV: fortalecer os laços de fraternidade e amizade, favorecer a partilha de experiências de vida e de serviço aos pobres e estimular a cooperação entre os diversos Ramos.
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E N T R E V I S TA
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Foto: Sacha Leite
Por Sacha Leite
Pe. Sebastião Mendes: Um missionário incansável a serviço dos pobres Uma caminhada de paciência, coragem e silêncio
Com 86 anos de vida, prestes a completar 60 anos de presbiterato, Pe. Sebastião Mendes Gonçalves, natural de Campina Verde (MG), atualmente habita o Complexo Dom Viçoso, em Belo Horizonte (MG). Mesmo com as articulações das pernas prejudicadas por contratempos enfrentados em 30 anos de missões nacionais e internacionais, Pe. Sebastião Mendes não desanima. Ele mantém acesa a chama de sua vocação que transparece nesta entrevista para o Informativo São Vicente. Nesta breve conversa o padre presenteia o leitor expondo trechos marcantes de uma vida sacerdotal que se assemelha a um roteiro de cinema. Boa leitura!
Como o senhor chegou à missão africana? Em 8/8/88 escrevi uma carta ao visitador provincial da época pedindo para ir para lá. Os padres portugueses haviam sido expulsos. Daí me convidaram para ir para lá. Os revolucionários queriam um governo novo que fosse independente e que não fosse comunista. Disseram que se houvesse tiroteio, era para deitarmos no chão. Não me submeti. De que maneira se apresentava o contexto de guerra? Teve muito tiroteio, em muitas casas. Roubavam de tudo, até comida. Eu achei que iria morrer naquele dia mesmo. Tanto tiroteio, tanta bomba. Mais de 30 pessoas foram mortas e tiveram os corpos expostos em praça pública. Uma irmã de caridade soube que um aluno dela estava entre as vítimas. Os guerrilheiros eram moçambicanos com ideias de oposição ao comunismo. Após a independência tomou o poder um governo contra a Igreja. Tomaram tudo… Tive sorte porque consegui me entender com o prefeito de Chokwé. Recuperei a casa paroquial. Falei para ele que não estava contente com a situação porque estava pagando aluguel e eles estavam em nossa casa. Um belo dia recebi uma carta reclamando sobre o pagamento do aluguel, uma carta de cobrança. Entreguei para o prefeito. Quando cobraram novamente, falei: está com o prefeito. Ele disse que agora o assunto é com ele.
Conte-nos sobre a emboscada que o surpreendeu nesta Missão. Nos quatro primeiros anos que fiquei em Moçambique, havia uma guerra interna, uma luta para derrubar o governo, de ideias comunistas. Um dia, com duas irmãs, em uma quinta-feira, entramos em um carro, para celebrar uma missa. Mas havia uma bomba lá dentro, era uma emboscada. Os estilhaços provocaram sangramento e o sangue protegeu a minha perna da queimadura, mesmo assim minha articulação ficou prejudicada. Em que momento o senhor começou a construir casas populares? Meu primeiro trabalho na região foi realizar uma reforma da casa paroquial. Cerquei a casa toda por fora. Fazia de tudo, de pedreiro a carpinteiro, tinha que consertar tudo. Então comecei a fazer casas para os pobres. Havia uma senhora que vivia debaixo de uma árvore. Eles consideram os velhos feiticeiros, uma questão cultural. Construí uma casa para ela e avisei ao filho que retiraria a casa, de pau-a-pique, e a levaria para outro pobre morar, assim que ela morresse. Dito e feito, ela faleceu quatro meses depois e repassamos a outro pobre. Devo ter construído umas 60 casas nessa cidade. Passei a morar na capital, para ser diretor das Irmãs, Filhas da Caridade. Fiz algumas capelas cobertas com chapa de zinco. Mas consegui arrumar a catequese e recuperar o Carmelo. Tempos depois as >>>
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Foto: Agencia AFP - Portugal
Em 2018, enchentes devastaram Chokwe, Moçambique, local onde trabalhou o Pe. Mendes.
irmãs o transformaram em hospital. Na sua opinião, qual foi o ponto forte da Missão na África? O ponto alto da missão africana, para mim, foi o meu contato com os pobres. O pessoal vinha do mato, ocupava aquelas casas. Elas plantavam couve na banheira. Estive em uma paróquia, durante quatro anos, onde não tive cozinheira, faxineira nem lavadeira. Eu fazia de tudo. O meu contato com eles fez com que a missa paroquial permanecesse sempre lotada. Fiquei lá 24 anos. Vim para cá de férias para comemorar meus 50 anos de padre. Minha estada em Moçambique, sem dúvida, teve como ponto forte o contato com os pobres. O senhor chegou a lecionar? Se sim, como foi esta experiência? Fui para o Paraná. Fomos mandados para o Caraça, fiz o segundo ano lá. Depois de ordenado, minha primeira missão foi dar aula, embora eu não tivesse vocação para isso. Dei aula primeiro no Caraça (1961) Depois em Irati (1962) Depois em Fortaleza (1963). Depois o bispo concordou com a nossa saída. 1964: Campina Verde. Lecionei três anos e disse ao visitador: eu desisto. Gostava muito do meu trabalho social. Fundei o banco da providência por lá. Em que contexto se deu o acidente no sertão baiano, que lhe rendeu uma queda? 30 INFORMATIVO SÃO VICENTE
Em 2016 o visitador provincial, Pe. Geraldo Barbosa, falou para eu escolher para onde eu queria ir. Escolhi Carinhanha, no Sertão da Bahia, por ser uma região muito pobre. Fui consertar o telhado, porque o vento estava derrubando as telhas. Senti uma tontura e caí a cinco metros de altura. Bati a cabeça no cimento. Fiquei um mês sem “guardar” nada, sem entender o que estava acontecendo. De que maneira se caracterizou a sua administração, no Caraça? Ninguém queria o Caraça. Fui para lá quatro anos após o incêndio. 20 quartos cheios de entulho, livros fora de lugar. Fui arrumando tudo e aumentando as hospedagens. Através do Rondon Pacheco (governador de Minas Gerais entre 1971 e 1975) conseguimos asfalto. Depois ameaçaram tirar as máquinas, mas conseguimos manter o asfaltamento. Os turistas invadiram, na década de 1970, para fazer camping. Como está a sua saúde e qual a sua visão de futuro? Está um pouco difícil de andar, me locomover. Parece que a panturrilha desistiu de funcionar. Preciso usar bengala para ir aos lugares, por isso costumo andar pouco. Mesmo assim, gostaria de ficar bom da cabeça e assumir uma paróquia, uma nova missão. Este é o sonho que ainda gostaria de realizar, se Deus permitir.
Retorno ao Brasil* Uma carta aqui me trouxe, pois nela fiz um pedido, para que, se possível fosse, eu pudesse ser atendido…
Moçambique era o destino e recebi permissão; do mestre, seguindo ensino, conheci a situação… A situação de guerra, de quatro anos sofridos, fez-me conhecer a terra de meus irmãos mui queridos… Queridos, mas na pobreza de projetos sociais mas gozando da riqueza de dons espirituais… Nesses vinte e quatro anos, de mudanças e ofícios, da missão segui os planos, sem medir os sacrifícios… Gaza, Maputo e Tete absorveram os meus dias; mas, a mim, não me compete deles fazer avalia… Sair vivo duma emboscada, de Deus, para mim foi sinal de que não estava acabada a tarefa inicial… Mais vinte anos de luta, com reclamação das pernas, minha alma, então, desfruta das certezas sempre eternas…
E agradeço a Deus essa oportunidade de rever os atos meus, em favor da caridade… Agora quero aceitar, e, humildemente, acatar outra carta a me chamar, para ao Brasil regressar… Idade e falta de saúde e os anos decorridos são tudo que se alude pra reforçar os pedidos Consola-me poder ver, nos padres moçambicanos, jovens que eu vi crescer, nesse decorrer dos anos… Catequeses semanais, trabalhos da caridade, encontros vocacionais, foram oportunidade… Semente de vocação não cresce em duro chão precisa de adubação na fé e oração… Se uma carta me trouxe, agora outra me chama; que meu zelo não se afrouxe, diante do pobre que clama… * Poema publicado pelo Pe. Sebastião Mendes, no livro Poemas Missionários (2017)
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N OTÍCIAS DA PBCM
CPF em Serra do Ramalho Entre os dias 14 e 20 de julho nossos voluntários do CPF (Projeto Construindo e Preparando o Futuro) vão estar em Serra do Ramalho-BA para o segundo módulo do CPF com a Rede Municipal de Ensino. Vamos trabalhar conteúdos específicos e gestão. O Projeto está ganhando corpo e ficando cada vez mais eficiente. Muito obrigado aos nossos voluntários. Encontro das CEBs em Tefé De 10 a 16 de julho teremos voluntários viajando para Tefé-AM. Vão participar do Encontro das Comunidades Eclesiais de Base em preparação para o Sínodo da Amazônia, e, em seguida, visitar as secretarias de Educação, Ação Social, CIMI etc. Que Tefé nos aguarde.
Transferência para a Espanha Nosso Provincial recebeu, em Manila, nas Filipinas, notícias do Padre Vinícius que foi transferido para a Espanha, como membro da equipe SIEV (estudos de vicentinismo) através do Provincial de Espanha. Conforme relatado, o Pe. Vinícius está bem e se adaptando aos novos trabalhos e realidade local. Ordenação Presbiteral “Para que deis muito fruto, permaneceis no meu amor” (Jo 15,8-9) No dia 13 de julho, em Campina Verde-MG, será ordenado Presbítero o diácono Hugo Silva Barcelos, CM. A celebração será presidida por Dom Irineu Andreassa, OFM, Bispo de Ituiutaba.
Centro de Convivência em Brumal Uma nova Casa da PBCM vai surgir. Um Projeto para celebrar os 200 anos da chegada dos Padres Vicentinos, “Evangelizadores dos Pobres”, ao Brasil – Caraça. Brumal, Distrito de Santa Bárbara. Será um Centro de Convivência e Casa para redução de danos para dependentes químicos. A casa vai ser aberta às comunidades para encontros e outras atividades. Uma equipe do CPF já vem reunindo faz um bom tempo. Nossa próxima reunião será em agosto/2019.
Herança Vicentina no Centro de Formação Internacional Os Padres Weliton (Toni) e Gentil estão de viagem marcada para Paris. Em agosto, eles participarão do CIF (Centro Internacional de Formação) Herança Vicentina. Que eles aproveitem o conteúdo e a viagem. Faz bem sair um pouco da rotina. Livro Comemorativo Já está em fase de elaboração o livro que contará, de forma didática, a história da PBCM, que completará 200 anos em 2020. O texto histórico foi escrito pelo padre Eli Chaves, e o prefácio será do Pe. Lauro Palú. Nosso departamento de comunicação está trabalhando junto ao Arquivo Provincial no processo de digitalização das imagens que ilustrarão o livro e que mais tarde servirão também para o documentário alusivo aos 200 anos.
Encontro de Superiores, Ecônomos e Coordenadores de Obras 23 coirmãos da Província reuniram-se no Complexo Dom Viçoso, em Belo Horizonte (MG), entre os dias 10 e 13 de junho. O objetivo do encontro esteve em tratar de assuntos relacionados à governança, empreendedorismo, contabilidade e administração, com assessoria do Instituto Axis. Também foram tratados assuntos de ordem prática da PBCM, além da palestra do Ir. Adriano Ferreira, sobre o uso consciente das Redes Sociais.
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Foto: Pe. Denílson Mathias
Foto: Nélio Nunes
Entre os dias 7 e 9 de junho o Instituto São Vicente, em Belo Horizonte (MG), sediou o Simpósio Provincial de Comunicadores Vicentinos, organizado pelo Departamento de Comunicação Social da PBCM e que teve como tema, “Novas tecnologias, rede sociais e impressos: aprendendo a trabalhar em rede”. Estiveram presentes mais de 45 representantes de casas e obras da Província, dos estados de Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Distrito Federal. Além dos voluntários das PASCOM e profissionais de Comunicação contratados pela Província. Participaram também, representantes de ramos outros ramos Família Vicentina, como as Filhas da Caridade (Província de Belo Horizonte), e a Sociedade São Vicente de Paulo (CMBH e TV Ozanam). A CMPS também este conosco, por meio da participação do Pe. Gilberto Rodrigues, que apresentou o recém-reformado Informativo da Província do Sul e algumas peças audiovisuais alusivas ao jubileu de 50 anos da Província.
Durante o Simpósio foram realizadas partilhas sobre o trabalho de Comunicação desenvolvido nas paróquias, debates sobre mídias sociais para Igrejas, mídia impressa católica, oficinas, momentos de espiritualidade, exibição do filme “Narradores de Javé”, com comentários do Pe. Alexandre Nahass Franco e aula do Pe. Getulio Mota Grossi sobre as especificidades de São Vicente, como comunicador. Tratouse de uma imersão de três dias, em que cada participante teve a oportunidade de se atualizar, conhecer as práticas de Comunicação de parceiros potenciais, facilitando a possibilidade de surgimento de novas parcerias, consolidando o início de uma rede de Comunicadores Vicentinos. Ao final do evento, 31 participantes preencheram pesquisa e avaliaram esta primeira edição do encontro como boa a excelente: “saio daqui com a bagagem cheia, pronta para aplicar”, descreveu uma das participantes.
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C U LT U R A Dica de Filme: O Carteiro e o Poeta Direção: Michael Radford Lançamento: 1994
A emoção em “O Carteiro e o Poeta”, dirigido por Michael Radford, já nasce nos primeiros momentos, com uma linda trilha sonora, que consegue transmitir um profundo sentimento de nostalgia, como se a sociedade estivesse gritando por ajuda. A música deste longa metragem sinaliza a necessidade de um retorno a valores já tidos como antiquados e dispensáveis em nossa sociedade.
O homem humilde, vivido por Massimo Troisi, emocionalmente inseguro, tenta estabelecer contato com o pai, um pescador embrutecido pela vida, porém, o velho não escuta suas desajeitadas palavras, preocupado mais com o mecânico saciar de sua fome. Ao conhecer o poeta Pablo Neruda, vivido por Philippe Noiret, em um cinejornal, o homem toca brevemente aquele mundo desconhecido, totalmente diferente de sua simples comunidade pesqueira.
A escuridão da sala de cinema potencializa a mágica desse primeiro encontro, posicionando o homem, em sua pequenez, diante do gigante visitante estrangeiro na tela. Ele tenta conseguir um emprego como carteiro. A sua insegurança é tanta, que, sem pensar duas vezes, ele adentra o local com a bicicleta, como que tentando garantir sua contratação, antes de precisar abrir a boca. Vale notar a postura dele ao avisar ao empregador sua fragilidade intelectual, afirmando que sabe, de forma lenta, ler e escrever, uma mentira que ele é incapaz de disfarçar, quando reage de forma defensiva ao escutar que irá trabalhar apenas para uma pessoa, já que todos na região são analfabetos.
Em sua visão, Neruda é o poeta amado pelas mulheres. A remuneração é pouca, o trabalho é cansativo, devido ao número expressivo de cartas que ele carregará. O carteiro descobre até que o poeta é um comunista, conotação política que não entende, mas nada disso importa para o carteiro, que, com um emprego,
passa a existir novamente para seu pai. Ele é aconselhado a trocar o mínimo de palavras possível com o estrangeiro, sendo submisso e prestativo, evitando incomodar.
O efeito desse encontro do carteiro com o poeta, torna-se um evento transformador na vida dos dois, uma amizade nascida da improbabilidade, fortalecida com o amor pela palavra escrita. O carteiro deseja contar para o pai sua felicidade, mas, com sua sensibilidade que está sendo apurada, percebe que o velho bronco não irá compreender sua conquista, ou compartilhar seu orgulho, então, triste, ele silencia. A cultura, único elemento que verdadeiramente modifica o homem, já havia começado a libertá-lo daquela realidade simplória.
O Carteiro e Poeta nos questiona que, a partir da amizade, até que ponto a poesia transforma a realidade de nossas vidas e do mundo? Inseridos num mundo cada vez mais técnico, burocrático, fast-food, a poesia é tratada como algo muito distante da realidade, coisa de lunáticos, de pessoas que buscam o escapismo por meio de traços com letras carregados de significados. Mas a verdade é que a poesia exerce um poder transformador nas pessoas. É válido lembrar que poesia, ao contrário do que se cristalizou no imaginário coletivo, não trata apenas sobre o amor, o belo, o sublime. Esta é uma visão reducionista. A poesia contextualizada num universo maior, o da Literatura, das Artes e da vida, não é um elemento fora da realidade, ao contrário, reflete-a, analisa-a, condensa-a, questiona-a. E ninguém é a mesma pessoa, não compreende o mundo da mesma forma após se deparar com grandes obras. A arte, em síntese, não é perfumaria, mas também instrumento de compreensão social, em sentido amplo. O Carteiro e o Poeta sabe bem traduzir isto!
Pe. Alexandre Nahass Franco
Dica de Livro: Aporofobia - el rechazo al pobre Autor: Adelia Cortina Editora: Ediciones Paidós
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Em suma, a obra tem como premissa o fato de que a sociedade atual desenvolveu uma verdadeira ojeriza para com os pobres. Adélia Cortina defende que, por uma mera questão política ou pela falta de uma percepção plena, talvez por limites de linguagem, a nossa sociedade, muitas vezes, define como “xenofobia” ou “racismo” a rejeição a imigrantes e refugiados, termo que, na maioria dos casos, é inadequado para expressar esta realidade específica. Ou seja, trata-se de um discurso social repleto de ódio, mas que não é totalmente identificável com a xenofobia ou com o racismo, e mas sim à uma aversão ao status de pobreza e ao que ela representa. Estrangeiros com poder aquisitivo alto não produzem rejeição, ao contrário, já que se espera que eles contribuam com renda, e por tal motivo são recebidos com entusiasmo. No mundo de hoje, aqueles que parecem não oferecer nada de bom, sejam eles migrantes ou refugiados políticos, são os pobres. Adela Cortina explica a predisposição que os seres humanos têm para essa fobia e propõe maneiras de superá-la, como o investimento em educação, a eliminação das desigualdades econômicas e a promoção de uma democracia que leve a sério a igualdade e promova uma sincera cordialidade entre as nações. Os direitos para publicação da edição em português da obra em questão foram adquiridos pela editora Contracorrente. A data de lançamento da versão brasileira ainda não foi divulgada. Acompanhe a página da editora nas redes sociais para informar-se sobre este e outros lançamentos.
Memória da Província
Nesta edição do “Memória da Província”, destacamos este curiosíssimo texto, publicado na antiga revista Ecos da Província (n. 1-1941), que conta um pouco sobre como estava a missão de Campina Verde nos primórdios dos anos 1940. Na foto que acompanha o texto, a antiga igreja derrubada em 1937, para dar lugar à matriz atual que seria inaugurada em 27 setembro de 1941.
Antiga igreja barroca de Campina Verde.
Foto: Arquivo da PBCM
TEXTO
Pequeno Museu de Artes e Ofícios* Eu vivo de engendrar palavras conceber ideias, projetar fonemas. Eu sou um simples arquiteto de poemas. Eu vivo de cortar palavras recortar ideias, tornear fonemas. Eu sou um simples carpinteiro de poemas. Eu vivo de entalhar palavras esculpir ideias, cinzelar fonemas. Eu sou um simples estatutário de poemas. Eu vivo de encantar palavras seduzir ideias, embruxar fonemas. Eu sou um simples feiticeiro de poemas. Eu vivo de lavrar palavras extrair ideias, batear fonemas. Eu sou um simples garimpeiro de poemas. Eu vivo de amanhar palavras semear ideias, cultivar fonemas. Eu sou um simples jardineiro de poemas. Eu vivo de singrar palavras navegar ideias, velejar fonemas. Eu sou um simples marinheiro de poemas. *Humberto Venuto. Coletânea RE-VIS-ITA, 2009.
INFORMATIVO SÃO VICENTE Sugestões e contribuições: informativosv@pbcm.com.br