GRH Romances Históricos
Tradução/Pesquisa: GRH Revisão Inicial: Samara Revisão Final: Ana Paula G. Formatação: Ana Paula G. Monica McCarty Guardiões das Highlands 3 O Guardião
Comentário da Revisora Ana Paula G. Este ebook não terá o comentário da revisora
inicial, que sofreu um acidente,mas já está bem. Então, vou fazê-lo por ela,na medida do possível.Sam, minha gêmea, muito obrigada pela excelente revisão inicial.Praticamente,não mexi na tua revisão. Sem dúvida, desta série, foi o que mais gostei.Arthur é muito fofo, leal e realmente, o coitado faz de tudo para resistir a heroína, a ponto
de
andar
sempre
‘desconfortável’...huahahaha...A Anna é decidida quando resolve testar a resistência do coitado...e claro, acaba conseguindo derrubar,literalmente, o homem! Tem trechos hot e uma história linda! A autora promete dez livros desta série e já estou curiosa pelo próximo. Adorei! Acho que vocês também vão amar o Arthur!
Guardiões das Highlands Inverno de 1307-1308 Com o rei Robert Bruce: Tor MacLeod, Chefe: líder das hostes e perito em combate com espada. Erik
MacSorley,
Falcão:
navegante
e
nadador. Gregor
MacGregor,
Flecha:
atirador
e
arqueiro. Eoin Maclean, Assalto: estrategista, ataques de pirataria. Ewen Lamont, Caçador: rastreamento e perseguição de homens. Lachlan MacRuairi, Víbora: sigilo, infiltração e resgate. Magnus MacKay, Santo: guia de montanha e forja de armas.
William
Gordon,
Templario:
alquimia
e
explosivos. Robert Boyd, Aríete: força física e combate sem armas. Alex Seton, Dragão: adagas e combate corpo a corpo. Com os ingleses: Arthur Campbell, Guardião: exploração e reconhecimento do terreno.
PREFÁCIO Ano de Nosso Senhor de 1307 A guerra havia mudado, mas Robert Bruce
ainda está longe de poder cantar vitória em sua perseguição ao trono escocês. Com uma Inglaterra desolada pela morte de seu maior adversário, o rei Eduardo I, Bruce concentra seus esforços em derrotar aos inimigos internos. Muitos de seus compatriotas seguem opondo
resistência,
sendo
os
Comyn,
os
MacDowell, o conde de Ross e os MacDougall os mais importantes. Bruce, com a ajuda de sua tropa secreta de guerreiros de elite, conhecida como Guardiões das
Highlands,
continua
sua
estratégia
revolucionária, semeando a destruição entre os inimigos, que será recordada durante gerações inteiras. Submete aos MacDowell em Galloway antes de partir ao norte em direção às Terras Altas. Depois de assegurar tréguas temporárias com Ross e os MacDougall, Bruce ataca aos
Comyn em Inverlochy, Urquhart, Inverness e Nairn. Mas justo quando a vitória parece estar ao alcance de sua mão, o aspirante ao trono contrai uma estranha enfermidade que o deixa às portas da morte. Os inimigos são o frio e a fome, já que seus homens se vêem obrigados a esperar que passe o inverno envoltos na incerteza. No ano anterior, quando tudo parecia perdido e Bruce teve que fugir de seu reino como fugitivo, pôs
suas
esperanças
nos
Guardiões
das
Highlands para que o ajudassem a sobreviver. Agora, para derrotar aos poderosos nobres que se interpõem em seu caminho, necessitará deles mais que nunca.
PRÓLOGO Igreja de St. John’s, Ayr, Escócia, 20 de abril de 1307 Arthur Campbell não estava ali. Ou ao menos se supunha que não devia estar. Tinha informado a Bruce da entrega da prata, que seria na igreja essa noite, pelo norte, o caminho das guarnições do castelo de Bothwell. Tinha completado sua parte da missão. Os homens de Bruce estavam escondidos entre as árvores a pouco menos de cinqüenta metros, esperando que os cavaleiros fizessem sua aparição. Arthur não tinha que estar ali. De fato, nem sequer deveria estar ali. O mais importante era proteger sua identidade. Depois de dois anos pretendendo ser um cavalheiro leal
ao rei Eduardo, tinha posto muito em jogo para arriscar tudo por um mau pressentimento. No caso de que o descobrissem, não teria que preocupar-se unicamente com as explicações que daria aos ingleses. Os homens de Bruce pensariam que era o que claramente parecia ser: o inimigo. Só poucos homens conheciam a verdadeira identidade de Arthur. Sua vida dependia disso. E apesar de tudo, aí estava ele, escondido entre as sombras do arvoredo que cobria a ladeira da colina atrás da igreja, pela simples razão de que não podia tirar da cabeça a sensação de que algo sairia errado. Passou muitos anos confiando nessas intuições para começar a ignorá-las nesse momento. O tangido do sino da igreja perturbou aquela
tumba de escuridão. Completas1. O momento da oração noturna. Tinha chegado a hora. Ficou completamente
quieto,
com
os
sentidos
aguçados, atento a qualquer sinal que delatasse a aproximação dos cavaleiros. Sabia por sua exploração inicial do terreno que os homens de Bruce estavam escondidos nas árvores do caminho que levava a igreja. Isso lhes oferecia uma boa visão de qualquer um que chegasse, dando
também
espaço
suficiente
para
empreender a retirada caso os ocupantes da igreja, que servia como hospital improvisado para os soldados ingleses, tivessem conhecimento do ataque. Terei que admitir que St. John’s não era o lugar ideal para lançar uma ofensiva. Se os soldados ingleses feridos não fossem uma Hora da oração completa. Onde estariam todos juntos, sem exceção e rezariam supostamente o rosário completo. 1
ameaça suficiente, a guarnição de soldados posicionada no castelo de Ayr, a menos de um quilômetro, teria que servir para que os homens de Bruce pensassem melhor. Entretanto, não restava mais remédio além de agir de acordo com a informação que possuíam. Arthur tinha averiguado que a prata mudaria de mãos essa noite na igreja, mas desconhecia que caminho tomariam. Tendo ao menos quatro rotas possíveis para sair da cidade para Bothwell, não podiam estar seguros de qual delas escolheriam os cavaleiros. Mas nesse caso concreto a recompensa que obteriam valeria o risco. A prata, que talvez subisse a cinqüenta libras e que estava destinada ao pagamento da guarnição do castelo de Bothwell, poderia alimentar durante meses aos quatrocentos guerreiros de Bruce ocultos nos
bosques de Galloway. Além disso, capturar aquela prata significaria mais que uma grande ajuda para Bruce, porque também feriria os ingleses em seu orgulho, algo que era justamente a intenção desses ataques surpresa; eram rápidos e violentos assaltos concebidos para que o inimigo permanecesse inquieto, interferir em suas
comunicações,
o
fazer
esquecer
as
vantagens que supunham sua superioridade quanto a dotação, armamento e meios e, sobretudo, semear o terror em seu seio. Em outras palavras, aquilo significava lutar como ele sempre tinha feito: como um highlander. E estava dando resultado. Os covardes ingleses não gostava de viajar em grupos pequenos sem um exército que os protegesse, mas Bruce e seus homens lhes davam tantos quebras-cabeças que o inimigo se via obrigado a
usar táticas furtivas, como tentar introduzir a prata através de diferentes mensageiros e sacerdotes. De repente Arthur ficou imóvel. Pressentia a chegada de alguém, apesar de que não produzira som algum. Olhou em direção ao caminho e o esquadrinhou na escuridão. «Nada.» Nada que assinalasse a chegada dos cavaleiros. Mas tinha os pêlos da nuca arrepiados e todos seus instintos lhe diziam o contrário. Então ouviu. Um suave, mas inconfundível ranger de folhas esmagadas sob pés que se aproximavam pelas costas. «Pelas costas.» Blasfemou.
Os
mensageiros
chegavam
através do atalho da praia e não pelo caminho da vila. Os homens de Bruce os veriam, mas o ataque estaria muito mais perto da igreja do que
queriam. Estavam treinados para enfrentar ao imprevisível, mas aquilo era arriscado, muito arriscado. Desejou com todas suas forças que o sacerdote não decidisse sair a dar uma olhada. Quão último queria nesse momento era carregar a morte de um clérigo. Bastante enegrecida já estava sua alma. Escutou com atenção. Eram dois pares de pisadas que ouvia. Uma era ligeira; a segunda, mais pesada. Rangeu um galho. Logo outro. Estavam se aproximando. Um momento depois, apareceu no caminho que ficava a seus pés, a primeira de duas silhuetas envoltas em capas. Alto e corpulento, aquele homem avançava com esforço pelo serpenteante atalho e afastava os ramos para o soldado que ia atrás. Arthur entreviu o brilho do metal e o colorido tabardo 2 2
Uma vestimenta, normalmente bordada com o brasão, usada sobre a armadura.
que levava debaixo as pesadas capas de lã quando passou junto a ele. Um cavalheiro. Sim, estava claro que se tratava deles. A segunda figura se aproximou um tanto. Era um homem mais baixo e magro que o anterior e de andar muito mais gracioso. Arthur descartou rapidamente este último como ameaça menor e se encaminhou de volta ao primeiro, mas algo fez que se detivesse. Olhou a segunda silhueta com mais atenção. A escuridão e o capuz que ocultava seu rosto faziam imprecisos os detalhes, mas não podia deixar de pensar que algo não enquadrava. Os pés desse soldado não pareciam roçar o caminho que tinha ante si. Levava algo sob o braço. Parecia uma cesta. Veio tudo abaixo. Céu santo. Não era o
mensageiro, a não ser uma moça. Uma moça com o dom da oportunidade. Sua intuição não tinha falhado. Algo mal aconteceria, sem dúvida. Estava claro que se a moça não se separasse do caminho, os homens de Bruce cometeriam o mesmo engano que ele. Atacariam mal a garota e sua cavalheiresca companhia aparecessem diante deles, o qual estava a ponto de acontecer. A moça passou a seu lado, deixando uma leve fragrância de rosas que o deixou na mais absoluta das inquietações. «Volte», pedia-lhe em silêncio. Então ela se deteve e inclinou a cabeça um tanto em sua direção, fazendo Arthur acreditar que talvez tivesse ouvido seu silencioso rogo. Entretanto, fez caso omisso e continuou seu caminho, direto para uma armadilha mortal. Jesus... Um grande desastre. A missão acabava de perder-se. Os homens de Bruce
estavam a ponto de perder o fator surpresa e de matar uma mulher no processo. Não devia intervir. Não podia arriscar-se que o descobrissem. Supunha-se que tinha que permanecer entre as sombras, proceder desde elas. E não misturar-se. Fazer o que fosse necessário para proteger sua identidade: matar ou morrer. Bruce contava com ele. Suas apreciadas qualidades de reconhecimento pelas quais ingressou nas forças de elite conhecidas pelo nome de Guardiões das Highlands jamais fossem
tão
valiosas
como
nesse
preciso
momento. A habilidade que tinha Arthur para ocultar-se entre as sombras e penetrar no mais profundo das linhas inimigas para conseguir informação
sobre
terrenos,
rotas
de
abastecimento, força e posições do contrário parecia mais importante que nunca, agora que
esses ataques surpresas se convertiam no selo da guerra de estratégias de Bruce. Não podia arriscar tudo por uma moça. Por todos os Santos, supunha-se que nem sequer devia estar ali. «Deixem partir.» O coração palpitava com mais força à medida que a moça se aproximava. Ele não se misturava. Permanecia nas sombras. Não era assunto dele. Sob o pesado elmo de metal, o suor se acumulava sobre suas sobrancelhas. Tão somente tinha uma fração de segundo para decidir… «Maldita seja.» Emergiu detrás das árvores. Aquilo era uma autêntica loucura, mas não podia ficar ali quieto enquanto contemplava o encontro de uma garota inocente
com
a
morte.
Talvez
pudesse
interceptá-los antes que os vissem. Talvez. Embora tampouco estivesse seguro da posição
de todos os homens de Bruce. Moveu-se sigilosamente entre as sombras para situar-se atrás dela. Com um rápido movimento, levou a mão até sua boca para impedir que gritasse. Agarrou-a pela cintura com o braço e a apertou com força contra si. Talvez com muita força. Podia sentir cada uma de suas femininas curvas contra seu corpo, particularmente o suave traseiro que apertava entre suas pernas. Rosas. Voltou a sentir o cheiro. Um aroma, mais intenso agora, que lhe fez sentir-se estranhamente embriagado. Aspirou com vontade e percebeu algo mais. Algo quente e gorduroso com um tênue aroma de maçãs. Bolos, pensou. Da cesta. Sua
resistência
despertou
daquele
momentâneo abandono. «Não lhes farei nenhum dano, moça», sussurrou. Mas seu corpo não parecia estar de acordo com ele e se avivava
como as chamas de um incêndio diante das resistências da garota. Um ataque de luxúria inundou através dele. A moça tinha uns quadris pequenos, mas notava sobre seu braço o inconfundível
peso
de
dois
grandes
e
arrebatadores seios. Sua virilha se alagou de calor. Não era capaz de recordar a última vez que estivera com uma mulher. Grande momento para ficar pensando nisso... Sua escolta ouviu movimento. O cavalheiro deu meia-volta. —Milady? Ao ver que Arthur a capturava fez menção de erguer a espada. —Silêncio! —advertiu Arthur com cautela. Falou em voz baixa, para evitar tanto que ninguém mais os escutassem como que a moça o reconhecesse — Só tento lhes ajudar. Têm que
sair daqui. —Afrouxou um pouco a mão com a qual tapava sua boca — A soltarei, mas não grite. Não, a menos que queira que caiam sobre nós. Entende? A moça assentiu, de modo que tirou a mão da boca. Ela se voltou para olhá-lo. À luz da lua que deixava escapar entre as árvores tudo que Arthur via eram uns olhos enormes e arregalados que o olhavam fixamente debaixo do folgado capuz de sua capa. —Que caia sobre nós quem? Quem são vocês? Tinha uma voz doce e suave, com um tom que era suave para que não chegasse ao ouvidos dos homens de Bruce. Assim esperava. Olhou-o dos pés à cabeça. Essa noite, como todas aquelas nas quais estava de serviço,
viajava ligeiro, e só usava uma cota de malha enegrecida e calças com perneiras de couro. Não obstante eram de boa qualidade e, junto com o elmo e as armas, faziam com que fosse óbvio que se tratava de um cavalheiro. —Não é um rebelde — observou ela, confirmando o que já tinham adivinhado seus instintos, que não era amigo de Bruce. —Responda
à
dama
—
disse
seu
acompanhante— ou provará o aço de minha espada. Arthur reprimiu sua vontade de rir. Aquele homem era todo força bruta e se movia com a soltura
de
uma
barcaça
gigantesca.
Mas,
consciente de sua situação, não quis perder o tempo provando ao soldado quão errado estava. Tinha que tirá-los dali tão rápida e sigilosamente como fosse possível.
—Sou um amigo, milady. Um cavalheiro a serviço do rei Eduardo. Ao menos no momento. De repente ficou completamente quieto. Algo tinha mudado. Não era capaz de precisar como sabia. Simplesmente notava uma advertência no mais profundo de seu ser e tinha a sensação de que o ar era diferente. Os homens de Bruce se aproximavam. Tinham-nos descoberto. Amaldiçoou. Aquilo não podia sair bem. Não havia tempo para convencê-la com palavras doces. —Deve partir já — disse com uma voz férrea que não dava capacidade às discussões. Advertiu que um brilho de inquietação se acendia no olhar da moça. Ao que parecia, também ela pressentia o perigo. Mas era muito tarde. Muito tarde para todos.
Deu-lhe um forte empurrão que a fez cair depois da árvore mais próxima, momentos antes que o suave assobio das flechas atravessasse o ar da noite. A flecha dirigida à moça deu contra a árvore que a protegia, fazendo um ruído seco, mas houve outra que sim alcançou seu objetivo. A escolta emitiu um gemido ao tempo que a flecha, perfeitamente lançada, atravessava a cota de malha para atendar-se em suas vísceras. Arthur mal teve tempo para reagir. Voltou-se no último instante, justo para que a flecha que se dirigia a seu coração lhe cravasse no ombro. Apertou os dentes, agarrou a flecha e a partiu. Não acreditava que a ponta se fincara muito fundo,
mas
tampouco
queria
correr
riscos
tentando tirá-la nesse momento. Bruce e seus homens o tinham confuso com um dos mensageiros. Um engano compreensível,
mas que lhe punha na terrível tarefa de combater a seus compatriotas ou trair sua identidade. Também podia fugir. Como não se deram conta de que se tratava de uma moça? Ainda assim, não acabava de acreditar.
Se a abandonava,
morreria. Quase não pôde considerar esse pensamento, já que no seguinte instante se desataram todos os infernos. Os homens de Bruce tinham caído sobre eles e saíam da escuridão como demônios do inferno. A escolta da dama, que ainda cambaleava pela flecha, recebeu um golpe de lança no flanco e uma pancada na cabeça. Desabou com um ruído seco e caiu derrubado ao chão como se tratasse de um carvalho enorme. Arthur ouviu os gritos de espanto atrás dele e se adiantou ao impulso da moça, interpondo-se em seu caminho antes que esta avançasse para
ajudar ao soldado caído. Já não precisava sua ajuda. Mas um dos homens de Bruce percebeu do movimento. O que ocorreu depois não foi mais que uma reação instintiva. Ocorreu muito às pressas para poder explicar-se de outro modo. Uma lança sulcava o ar com intenção de alcançar a
moça
em
cheio.
Arthur
não
pensou,
simplesmente reagiu. Adiantou-se e agarrou ao vôo a lança a poucos centímetros de sua cabeça. Com um rápido movimento a pôs em seu joelho e a
rompeu
em
dois,
atirando
os
restos
estilhaçados ao chão. Ouviu que a moça dava um grito afogado, mas não se atrevia a afastar o olhar do grupo de homens que corriam para ele. —Esconda-se atrás dessa maldita árvore! — gritou com fúria antes de voltar-se a sua esquerda para interceptar um golpe de espada. Ao fazê-lo o homem deixou um flanco
descoberto, mas Arthur não quis aproveitá-lo. Blasfemou enquanto repelia outro golpe. Que diabos devia fazer? Revelar sua identidade? Acreditariam? Podia escapar dali lutando, mas o que aconteceria à moça? Momentos depois alguém lhe economizava a decisão, para o bem ou para mau. A voz de um homem chegou das árvores. —Detenham-se! Os
guerreiros
pareciam
confusos,
mas
responderam imediatamente à ordem do recém aparecido e se detiveram em seco. Segundos depois, uma figura de aspecto familiar saía de entre as sombras. —Que demônios faz aqui, Guardião? Arthur negou com a cabeça sem poder acreditar e saiu ao encontro do guerreiro vestido de negro que surgia detrás das árvores: Gregor
MacGregor. Isso sem dúvida explicava o disparo perfeito que acabava de presenciar. Gregor MacGregor era o melhor arqueiro das Highlands e fazia honra no nome de guerra, Flecha, que Bruce
tinha
escolhido
para
proteger
sua
identidade como membro da Guarda. Não estava muito seguro a respeito se devia agradecer ou não a presença de seu outrora inimigo,
convertido
em
companheiro
nos
Guardiões das Highlands e ao mesmo tempo o mais parecido a um amigo que tinha. Algo que tinha mudado quando obrigaram Arthur a sair dos Guardiões das Highlands fazia mais de um ano e meio. Naquele momento nenhum de seus companheiros conhecia a verdade, nem sequer MacGregor. Quando ouviram que se uniu ao inimigo pensaram que era um traidor. E, embora ao final conhecessem a verdade, sua missão
como espião o mantinha à margem. Uniram seus antebraços, e apesar das dúvidas iniciais, Arthur se encontrou a si mesmo sorrindo sob o elmo. Deus, tinha muita vontade de vê-lo. —Vejo que ninguém danificou ainda esse rosto tão bonito — disse, consciente do muito que
incomodava
ao
MacGregor
que
lhe
recordassem sua boa aparência. MacGregor riu. —Seguem tentando. Alegro-me muito de te ver. Mas o que estás fazendo aqui? Têm sorte de que visse como apanhavam essa lança. Arthur tinha salvado a vida do MacGregor em uma ocasião fazendo isso mesmo. Não era tão difícil como parecia, sempre que fosse capaz de te sobrepor ao medo. A maioria não podia. Mas ele não conhecia o medo.
—Perdão pela flecha — disse MacGregor assinalando seu ombro esquerdo, no que o sangue brotava ao redor da varinha estilhaçada, que
ainda
sobressaía
do
braço
vários
centímetros. —Não é nada — disse Arthur encolhendo-se de ombros. Tinha sofrido feridas piores. —Conhece
esse
traidor,
Capitão?
—
perguntou um dos homens. —Sim — disse MacGregor antes que Arthur pudesse lhe advertir — E não é nenhum traidor. É dos nossos. Maldição.
A
moça.
Esquecera-se
dela.
Qualquer esperança de que não tivesse ouvido o MacGregor ou entendido o significado de suas palavras se desvaneceu assim que sentiu o sobressalto que tinham provocado nela.
Também o ouviu MacGregor, que tirou seu arco, mas Arthur o deteve. —Estão a salvo —disse — Pode sair, moça. —Moça?
—perguntou
MacGregor
para
depois amaldiçoar baixo — Assim que isso é o que acontece… Arthur assentiu. A mulher saiu detrás da árvore. Quando Arthur se adiantou para tomá-la pelo cotovelo ficou tensa, como se seu contato a ofendesse. Sim, tinha ouvido muito claramente. Com tudo aquele caos o capuz tinha caído, descobrindo a uma cabeleira longa e brilhante de cabelos acobreados que caíam por suas costas em
cachos
abundantes
e
espessos.
Sua
insolente beleza parecia tão desconjurada que por um momento o deixou boquiaberto. Mas depois um raio de lua alcançou seu rosto e Arthur
ficou sem respiração por completo. Era preciosa. Uns
olhos
grandes
de
pestanas
enormes
dominavam seu diminuto rosto em forma de coração. Tinha um nariz pequeno e ligeiramente torcido, queixo bicudo e sobrancelhas arqueadas timidamente. Seus lábios lhe faziam uma boca de pinhão rosada de formas perfeitas, e sua pele… sua pele era tão suave e branca como a nata. Tinha o aspecto doce e vulnerável de um animal de pelagem aveludada, como se fosse um coelho ou um gatinho. Aquela inocente fragrância de feminilidade não era absolutamente o que ele esperava. Parecia algo do mais incongruente em meio de uma guerra. Não pôde mais que permanecer em silencio sem sair de seu assombro ao ver que o filho de cadela do MacGregor se adiantava, desprendia-se do elmo e lhe oferecia uma mão
com galanteria. —Minhas desculpas, milady — disse com um sorriso diante da que tinham sucumbido a metade dos corações femininos das Highlands. A outra metade ainda não o tinha conhecido — Esperávamos a outra pessoa. Arthur ouviu o previsível suspiro da moça quando esta contemplou o rosto daquele ao que se conhecia como o homem mais bonito das Terras Altas. Entretanto a garota recuperou a compostura em seguida e, para sua surpresa, comportou-se de maneira muito lúcida. A maioria das mulheres nesse momento balbuciariam. —Obviamente. Ou é que o rei Hood3 declarou a guerra às mulheres? —perguntou, fazendo uso do apelido que os ingleses davam ao rei proscrito —
Ou
talvez
a
simples
sacerdotes?
—
O Rei Robert the Bruce era chamado pelos ingleses e simpatizantes por King Hood, para insultá-lo por usar uma longa capa com capuz. Hood em inglês significa capuz. 3
acrescentou olhando para a igreja. Por ser uma pessoa rodeada de inimigos demonstrava não ter medo algum. Embora essa fina capa forrada de arminho não a tivesse delatado, sabiam que era uma mulher da nobreza simplesmente por seu comportamento orgulhoso. MacGregor fez uma careta. —Tal e como disse, foi um engano. O rei só declara a guerra a aqueles que lhe denegam o que lhe pertence por direito. A moça estalou a boca como amostra de seu desacordo. —Se tivermos acabado com isto, tinha vindo a procurar o sacerdote. —Baixou o olhar a sua escolta abatido — É muito tarde para meu homem, mas talvez possa aliviar em algo aos que aguardam no castelo. Extrema-unção,
observou
Arthur.
Provavelmente para soldados feridos na batalha do Glen Trool da semana anterior. Apesar de ter o rosto coberto pelo elmo seguiu falando em voz baixa para preservar sua pessoa tudo que pudesse. Já tinha exposto o suficiente sua dupla identidade. Não queria brindar a jovem com uma oportunidade
para
poder
identificá-lo.
Provavelmente seria parente de algum de nobres tinham enviado ao Ayr para dar caça ao Bruce. Asseguraria-se de manter-se longe, muito longe do castelo. —Qual é seu nome, milady? E por que viaja com um guardião tão nefasto? A moça o olhou por cima do ombro, enrugando seu minúsculo nariz com expressão severa. Sendo tão chata poderia ter parecido algo ridículo, mas arrumou para manifestar seu desdém de uma maneira surpreendentemente
eficaz. —Ir procurar um sacerdote não costuma ser uma tarefa muito perigosa, como suponho que inclusive um espião será capaz de reconhecer. Arthur lhe franziu o cenho por completo. Assim expressava sua gratidão. Talvez tivesse devido abandoná-la a sua sorte. MacGregor rompeu uma lança em seu favor. —Deves sua vida a este homem, milady. Se ele não tivesse intervindo — disse, e olhou à escolta caída— os dois estariam mortos. Seus olhos se abriram ao conscientizar disso e uns dentes brancos morderam a suave almofada de seu lábio inferior. Arthur sentiu outro inesperado puxão sob o cinto de sua espada. —Sinto muito — disse dirigindo-se a ele em voz baixa — Lhe agradeço isso. A gratidão de uma bela mulher não era algo
que ficasse sem efeito. Sentiu com mais força a pressão que subia por sua virilha, e o tom aveludado de sua voz lhe fez pensar em camas, corpos nus e palavras de prazer sussurradas. —Seu braço… —A moça o olhou com incerteza — É grave a ferida? Antes
que
Arthur
pudesse
formular
a
resposta, ouviu um ruído. Seu olhar se dirigiu das árvores à igreja e percebeu os sinais de movimento. Maldição. O ruído do ataque devia ter alertado aos ocupantes da igreja. —Têm que partir —disse ao MacGregor — Já vêm. MacGregor tinha comprovado de primeira mão as habilidades de Arthur muitas vezes para duvidar dele. Fez gestos a seus homens para que ficassem em marcha e os guerreiros de
Bruce voltaram a esconder-se entre as sombras das árvores. —A próxima vez será — disse MacGregor antes de unir-se a eles. Arthur o olhou nos olhos compreendendo a que se referia. Essa noite não teria prata. Em momentos a igreja seria um vespeiro de homens e estaria iluminada como uma cidade, advertindo do perigo a qualquer que se aproximasse. Bruce não poderia contar com a prata para o provisionamento de seus homens por causa de uma moça. Teriam que confiar no que pudessem caçar
e
roubar
do
campo
até
que
se
apresentasse uma nova oportunidade. —Será melhor que também partas - disse a moça com severidade. Quando viu que duvidava, suavizou um pouco suas palavras — Estarei bem. Vá. E obrigado — acrescentou depois de
uma pausa. Seus olhos se encontraram na escuridão. Apesar de que parecesse todo ridículo, por um momento Arthur se sentiu vulnerável. Mas ela não podia vê-lo. Com o elmo baixado as únicas aberturas do aço eram duas estreitas ranhuras para os olhos e os pequenos condutos para respirar. Mesmo assim, sentiu algo estranho. Se não estivesse castigado, teria dito que era uma conexão. Mas ele não sentia conexão com nenhuma mulher estranha, e muito menos com as inimigas. Maldita seja se não tinha conexão com ninguém. Tinha vontade de dizer algo, o diabo
saberia
o
que,
mas
não
teve
a
oportunidade. As tochas apareceram às portas da igreja. O sacerdote e vários dos soldados ingleses feridos se aproximavam em sua direção. —De nada — disse para voltar-se para entrar
nas sombras, ali onde pertencia. Era um espectro. Um homem que não existia. Justamente como gostava que fosse. Inundou-se na escuridão açoitado pela exclamação de alívio da moça ao ir para os braços do sacerdote. Sabia que podia arrepender-se do acontecido daquela noite. Ao salvar a vida da jovem não tinha sacrificado simplesmente a prata, mas também
sua
identidade.
Mas
não
podia
arrepender-se por isso. Já teria mais prata. Além disso, era pouco provável que seus caminhos voltassem a cruzar-se. Encarregaria-se disso pessoalmente. Seu segredo estava a salvo. No momento. Capítulo 1 Castelo de Dunstaffnage, Argyll, Escócia, 24
de maio de 1308 «Por favor, que esteja morto. Por favor, que tudo tenha acabado.» Anna MacDougall soltou a cesta no chão e se ajoelhou aos pés de seu pai, rezando por ouvir as notícias que poriam ponto final a essa guerra que tinha marcado cada um dos dias de sua existência. Literalmente. Anna nasceu em um dia famoso da história da Escócia: em dezenove de março do ano de Nosso Senhor de mil duzentos e oitenta e seis. No mesmo dia em que o rei Alexander III quis estar junto a sua jovem esposa e, ignorando o conselho de seus homens, cavalgou naquela noite tormentosa até Kinghorn, no Fife, para escorregar pelo caminho em um escarpado que
lhe levaria a morte. A luxúria do rei deixou ao país sem um herdeiro direto ao trono, com um resultado de vinte e dois anos de guerra e de conflitos para determinar quem tinha que levar a coroa. Houve um momento no que se disputavam ao trono quatorze aspirantes. Mas a verdadeira batalha sempre esteve entre os Balliol-Comyn e os the Bruce. Quando Robert Bruce decidiu encarregar do tema pessoalmente e assassinou ao líder de seus competidores, John Comyn o Vermelho, primo do pai de Anna, converteu-se para
sempre
em
inimigo
de
sangue
dos
MacDougall. O desprezo para o Robert Bruce só era comparável com o que lhe inspiravam seus parentes os MacDonald. As ações de Bruce obrigaram aos MacDougall a uma precária aliança com a Inglaterra. Inclusive Eduard
Plantageneta era preferível a ter um Bruce no trono. Assim rezava pela morte de Robert Bruce. Do preciso momento em que chegou a notícia em meio da luta de que Bruce estava no leito de morte afligido de uma misteriosa enfermidade, Anna tinha rezado para que esta o levasse consigo, para que a natureza derrotasse ao inimigo. É obvio aquilo de rezar pela morte de um homem era um pecado horrível. Seria pecado rezar pela morte de qualquer pessoa, inclusive pela de um assassino sanguinário como Robert Bruce.
As
monjas
da
abadia
estariam
escandalizadas. Mas não lhe importava. Não, se aquilo significava o final dessa maldita guerra esquecida de Deus. Uma guerra que já levara a seu irmão junto a sua prometida e que cobrou seu preço
não
só
em
seu
ancião
avô,
Alexander
MacDougall, lorde de Argyll, mas também do filho deste, John MacDougall, lorde de Lorn, o pai de Anna. Seu pai mal pôde recuperar-se de suas recentes dores no peito. Não sabia se agüentaria muito mais. Os últimos triunfos de Bruce não fizeram a não ser piorar seu estado. Era um homem que odiava perder. Custava acreditar que só fizesse um ano de que aquele rei Hood fugisse com alguns partidários e sua causa claramente perdida. E, entretanto, o rei fugitivo estava de volta e conseguia redobrar sua aposta pelo trono da Escócia, em boa parte graças à morte de Eduard I da Inglaterra. Assim, já fosse pecaminoso ou não, Anna rezava pela morte de seu inimigo. Faria com
gosto
a
penitência
por
esses
malvados
pensamentos se aquilo significava proteger a seu pai e a seu clã do homem que queria vê-los mortos. Além disso, tal e como as monjas lhe haviam dito incontáveis vezes antes, jamais estivera destinada para a vida monacal. Cantava muito. Ria muito. E o mais importante, jamais emprestou tanta devoção ao Senhor como sentia por sua família. Anna
estudou
o
rosto
de
seu
pai,
escrutinando-o em busca de alguma reação, no momento que este abria o selo da carta e a lia. Era tal sua ansiedade que nem sequer se incomodou em chamar seu tabelião. Tinha a fortuna de poder encontrar-se com ele a sós em sua câmara depois de que acabasse o conselho com seus homens. Sua mãe, que sempre revoava a seu redor queixando e dando amostras
de sua irritação, tinha saído ao jardim a fiscalizar a coleta de umas ervas para uma nova tintura sugerida pelo sacerdote, que ajudaria a aliviar o encharcamento4 dos pulmões de seu pai. Em seguida percebeu de que não eram boas notícias. Um acesso de ira avermelhou o bonito rosto de seu pai, os olhos brilharam como se tivesse febre e franziu a boca até adotar uma expressão de desgosto. Era um olhar que inspirava terror nos corações dos guerreiros mais curtidos, mas que em Anna só provocava preocupação. Sabia reconhecer ao pai amoroso que havia atrás dessa marruda fachada de guerreiro. Agarrou-se com tanta força ao braço da poltrona com forma de trono de seu pai que cravou o relevo da madeira esculpida na mão. —O que ocorre, pai? O que passou? Ela se referiu antes a dores no peito do pai. Possivelmente se trate de insuficiência cardíaca do ventrículo esquerdo, onde ele não “retira” o sangue do pulmão, daí o termo encharcamento. 4
Seu pai ergueu o olhar para olhá-la. Anna se viu invadida por um acesso de pânico ao ver como se encolerizava. Os ataques de ira de seu pai sempre fossem uma visão aterradora, que rivalizava com o famoso mau gênio angevino dos reis Plantageneta da Inglaterra, mas depois do ataque que tinha sofrido cresceram ainda mais. Foi a ira que lhe causou os dores no braço na ocasião
anterior.
Dores
que
lhe
tinham
paralisado, cortado a respiração e o deixado prostrado no leito durante quase dois meses. Enrugou o pergaminho no interior de seu punho até convertê-lo em uma bola. —Buchan fugiu. Derrotaram os Comyn. Anna teve que piscar. Levou um momento compreender o que seu pai acabava de dizer, já que parecia algo impossível. John Comyn, conde de Buchan, parente de John Comyn lorde de
Badenoch assassinado, era um dos homens mais poderosos de Escócia. —Mas como…? —perguntou — Bruce estava às portas da morte. Seu pai sempre tinha animado a seus filhos a que fizessem perguntas. Deplorava a ignorância, inclusive nas mulheres, e por essa razão tinha insistido em que todas suas filhas se educassem no convento. Mas ao ver sua expressão colérica e a rigidez de seu corpo a Anna quase teve vontade de retirar a pergunta. —Esse
bastardo
se
acerta
para
fazer
milagres inclusive do leito de morte — disse a contra gosto — O povo começa a pensar que é um herói ou algo assim, como se fosse o segundo advento de Arthur e a corte de Camelot. Buchan tinha a esse filho de cadela encurralado perto do Inverurie, mas seus homens fraquejaram
quando viram Bruce encabeçando o exército — disse esmurrando a mesa com o punho e derramando o vinho que continha sua taça — Os Comyn correram como galinhas ao ver que levavam a um doente à batalha. Fugiram de um maldito inválido! Seu rosto avermelhou tanto que as veias da têmpora pareciam a ponto de estourar. O medo inundou o peito de Anna, não porque temesse a ira de seu pai, mas sim pelo perigo que isso supunha para sua saúde. Lutou por reprimir as lágrimas que afloravam em seus olhos, porque seu indômito orgulho entenderia essas lágrimas como um sinal de que o via débil. Ele era um poderoso guerreiro e não um homem necessitado de mímicos. Mas essa guerra impunha sobre ele os certeiros efeitos de um lento veneno. Se pudesse conseguir que seu pai
superasse esse problema com Bruce, tudo sairia bem. Por que não tinha sucumbido o falso rei à enfermidade tal e como se supunha que faria? Se tivesse ocorrido assim, todo aquilo teria acabado. Tinha que acalmá-lo. Em lugar de servir-se de súplicas ou de lágrimas, pegou a mão de seu pai e se esforçou para sorrir. —Será melhor que não permitas que a Mãe lhe ouça falar dessa forma em minha presença. Já sabem que vos culpa de que meu vocabulário não seja o de uma lady —Por um instante pensou que suas palavras não tinham sortido efeito, mas a bruma de ira começou a dissipar-se de seu rosto pouco a pouco. Quando ao final a olhou como se realmente a estivesse vendo, Anna acrescentou de maneira inocente— Talvez deva chamá-la? Seu pai deixou escapar uma forte gargalhada
que se confundiu com a tosse de seus pesados pulmões. —Não te atreva. Obrigará-me a passar pelo gogó outra dessas asquerosas poções. O Senhor sabe que o faz por meu bem, mas poderia levar a perdição a um santo com essa preocupação constante. —Negou com a cabeça e lhe dirigiu um olhar de afeto, dando a entender que era plenamente consciente do que acabava de fazer — Não tem nada que temer, sabe? Sou como um carvalho. Mas é uma moça muito ardilosa, Annie querida — acrescentou entreabrindo os olhos — Te parece mais comigo que nenhum outro. Não é isso o que sempre digo? Anna
se
ficou
tão
contente
como
lhe
marcaram as covinhas —Sim, pai. Este
continuou
como
se
não
tivesse
respondido. —Desde aquele dia em que entrou em minha câmara com o polegar na boca, jogou uma olhada ao mapa da batalha e pôs a nossos homens na posição de ataque perfeita. Anna riu, sem recordar realmente aquele dia, embora tivesse ouvido a história muitas vezes antes. —Pensei que aquelas figuras esculpidas eram brinquedos — disse. —Sim, mas seus instintos eram puros. — John MacDougal suspirou — Mas temo que não seja tão fácil nesta ocasião. Buchan escreve que procurará
refúgio
na
Inglaterra.
Uma
vez
derrotados os Comyn, o usurpador virá por nós. Nós? Anna tragou saliva. O medo se apoderou de seu ser. —Mas e a trégua?
Fazia meses, quando começou sua marcha para o norte, Bruce dedicou seus esforços a lutar contra os homens de Argyll, ameaçando-os por terra e por mar. Seu pai, doente e com menos homens, pactuou uma trégua, tal e como tinha feito o conde de Ross no norte. Anna tinha a esperança de que aquela trégua significasse o fim das batalhas. —Expira no começo de agosto. Cabe esperar que no dia seguinte tenhamos ao inimigo ante nossas portas. Já expulsou aos MacDowell do Galloway, e agora que os Comyn fugiram… Seu pai voltou a expressar seu descontente franzindo o cenho. Ao dar-se conta de que a cólera o atacava de novo Anna lhe recordou: —O conde de Buchan jamais foi um bom general na batalha. Você mesmo o disse muitas vezes. O rei Hood não teria tido tanta sorte
lutando contra ti, que sem dúvida é a razão primitiva pela que aceitou a trégua. Dal Righ está ainda muito fresco em sua memória. Seu pai brincou com o broche de prata maciça que levava no pescoço. Aquele cristal ovalado rodeado de diminutas pérolas era um talismã que lhe recordava o perto que tinham estado de capturar ao rei fugitivo. Tinham ao Bruce literalmente em suas mãos quando o broche se desenganchou durante da resistência. A sombra de um sorriso apareceu ao redor de sua boca, e Anna soube que aquelas palavras tinham sido de seu agrado. —Tem razão, mas nossa vitória anterior não o fará deter-se nesta ocasião. Somos o único que se interpõe em seu caminho à coroa. —Mas o que passará com o conde de Ross? —perguntou — É que não vai lutar a nosso lado?
A boca de John MacDougal adotou um gesto severo. —Não podemos contar com o Ross. Negará a deixar suas terras desprotegida. Mas tentarei lhe persuadir de que devemos unir nossos esforços para derrotar ao rei Hood de uma vez por todas. Não havia recriminação alguma nas palavras de seu pai, mas Anna se sentiu culpada de todos os modos. Persuadir ao Ross teria sido mais fácil se ela tivesse aceitado o matrimônio com seu filho Hugh no ano passado. —Reunirei a meus barões e cavalheiros e me porei em contato com Eduard para lhe pedir ajuda. Não é nem a metade do rei do que foi seu pai, mas talvez a derrota do Comyn lhe faça ver a necessidade de enviar mais homens ao norte. Não
obstante,
sua
voz
não
destilava
esperança alguma. Anna sabia tão bem como
seu pai que não cabia esperar muita ajuda de Eduard II. O novo rei da Inglaterra tinha muitos problemas próprios para preocupar-se com a Escócia. Embora ainda tivesse soldados ingleses aquartelados na maioria dos castelos principais da
Escócia,
especialmente
nos
fronteiriços,
Eduard tinha reclamado a quase todos seus generais, incluído o recém renomado conde de Pembroke, Aymer do Valence. —E se não chegar ajuda? —disse mordendo o lábio. Não era tão parva para perguntar a seu pai se renderia. Preferiria vê-los todos mortos antes que ajoelhados ante Bruce: «Conquistar ou morrer», o lema dos MacDougall estava bem enraizado nele. A pesar do calor que fazia na câmara de seu pai Anna sentiu um calafrio.
—Então terei que derrotar a esse filho de cadela eu sozinho. Já estive a ponto de apanhálo no Dal Righ, a ponto de assassiná-lo com minhas próprias mãos. Desta vez tenho intenção de acabar o trabalho. Para o final do verão a cabeça do Robert Bruce pendurará às portas de meu castelo e os abutres lhe bicarão os olhos — disse e entreabriu os seus com ferocidade. Anna ignorou quão incômoda a fazia sentir. Odiava quando seu pai falava desse modo. Fazia que parecesse um homem cruel e desumano, não o pai carinhoso ao que ela adorava. Ergueu o olhar para olhá-lo, e ao contemplar a firme resolução de sua expressão montês, não o pôs em dúvida nem por um segundo. Seu pai era um dos melhores guerreiros e generais de Escócia. Pode ser que o destino se voltasse contra eles, mas John de Lorn poria fim a isso.
Talvez o fim da guerra estivesse perto, depois de tudo. A incerteza, a morte, a destruição, o engano, tudo acabaria breve. O veneno que estava matando a seu pai se dissolveria. Sua família estaria a salvo. Casaria-se, teria um lar e filhos próprios. Tudo voltaria para a mais feliz das normalidades. Não podia permitir-se ver de outro modo. Mas em algumas ocasiões parecia que tentava deter uma catarata com uma peneira ou nadar contra um redemoinho disposto a arrastá-la com tudo até o fundo: seus pais, suas irmãs e irmãos, suas sobrinhas e sobrinhos pequenos. Não deixaria que aquilo acontecesse. Faria o que fosse necessário para proteger a sua família. —O que posso fazer? Seu pai sorriu e lhe deu um beliscão indulgente na bochecha.
—É uma boa garota, Annie querida. O que diria de fazer uma visita a meu primo, o bispo? — Anna assentiu e se dispôs a levantar-se — E Anna —acrescentou olhando-a com curiosidade ao ver que agarrava a cesta— não se esqueça dos bolos. Já sabe como gosta — disse entre risadas. **** Arredores de Inverurie, Aberdeenshire Embora a lua cheia pendurasse sobre o antigo monumento de pedra, a coluna de fumaça velada das fogueiras próximas dava a sua luz uma bruma espectral. A vitória deixava um sabor acre na língua de Arthur e o fazia sentir uma queimação na garganta. Era perto da meia-noite, mas os ruídos das sublevações e a destruição
desenfreada seguiam alagando o ar noturno. Bruce aprendeu de cor a lição de William Wallace e arrasava tudo a seu passo, sem deixar nada na terra que pudesse ser usado por seus inimigos. Tinham vencido ao Comyn da Escócia, mas a perseguição ao Buchan persistiria por um tempo. Aquele bloco de granito na esplanada parecia apontar ao céu em um ângulo que não podia ser mais que intencionado. Sua intenção era algo que mal podia imaginar. Tinham passado muitos anos e o propósito daqueles blocos de pedra místicos
dos
druidas
tinha
caído
no
esquecimento. Mas como aquelas pedras sempre estavam em lugares isolados, era o ponto perfeito para um encontro. Arthur observava a esplanada oculta depois das sombras do círculo de árvores que rodeava o monumento com uma impaciência pela chegada dos homens pouco
comum nele. Tinha a esperança de que aquilo fosse o fim da mascara. Estava farto de viver na mentira. Depois de anos de fingimento, custavalhe recordar em que lado estava. Seria a primeira vez em quase dois anos e meio, desde dia em que o tinham obrigado a abandonar o treinamento nos Guardiões das Highlands para «unir-se» ao inimigo, que veria o homem pelo qual lutava fosse do campo de batalha. O que dizia que seus dias como espião poderiam ser já contados, era o fato de que o rei se arriscasse a encontrar-se em pessoa com ele. Arthur
tinha
completado
bem
sua
missão,
provendo a informação estratégica prévia à batalha de Inverurie que permitiu ao Bruce e a seus homens derrotar ao conde de Buchan e que este saísse disparado para a Inglaterra com o rabo
entre
as
pernas.
Agora
que
tinham
derrotado aos Comyn, Arthur esperava ocupar seu posto entre o resto dos membros dos Guardiões das Highlands, o melhor do melhor, uma tropa de guerreiros escolhidos pelo próprio Bruce por suas destacadas habilidades em cada uma das artes da guerra. Ficou imóvel, com o olhar fixo em um vão aberto entre as árvores de sua direita. O leve ruído da fuga de um coelho ou um esquilo significava o primeiro som que delatava sua chegada. Estar atento aos detalhes mínimos, as observações mais ínfimas, era o que o fazia diferente do resto. Atravessou a arvoredo em diagonal sem fazer ruído algum e apareceu a suas costas. Uma vez confirmada a identidade dos homens, apresentou-se imitando o uivo de um mocho. Os três homens, obviamente surpreendidos,
deram a volta desembainhando as espadas. Seu irmão Neil foi o primeiro em recuperar-se. —Pelos ossos de Cristo! Inclusive é melhor do que tinha imaginado. Ainda ficam ao menos cinqüenta passos para chegar à esplanada. — voltou-se e sorriu ao homem alto e de aspecto temível que estava junto a ele — Me devem um xelim. Tor MacLeod, o capitão dos Guardiões das Highlands, emitiu um brusco som de desgosto e murmurou entre dentes. Neil fez caso omisso e se adiantou para saudar Arthur, sem ocultar o prazer que lhe procurava vê-lo. —Estas inclusive melhor que antes, irmão. — Quando viu que Arthur o interrogava com o olhar a respeito do MacLeod, Neil o explicou—Apostei um xelim com este bárbaro teimoso aqui presente
que
nos
encontraria
antes
que
chegássemos à esplanada, por mais sigilosos que fôssemos. Fez um entalhe em seu orgulho de aço das Highlands. Arthur teve que reprimir o sorriso. Tor MacLeod era o melhor guerreiro de todas as terras Altas e as ilhas Ocidentais. Seu orgulho não tinha entalhes. Mas estava claro que Arthur tinha impressionado a seu capitão, e também a seu irmão. Neil, seu irmão mais velho, tinha quase vinte e quatro anos e em muitos aspectos era como um pai para ele. Apesar de que Arthur fosse mais alto agora, ele sempre o veria como seu irmão maior. Neil era responsável pelo que Arthur tinha se tornado. De pequeno o tinha recolhido do barro mais vezes das que podia recordar quando seus outros irmãos tentavam fazer dele um guerreiro. Neil foi quem instigou a Arthur para que aguçasse suas habilidades e não
as escondesse quem lhe ensinou a sentir-se orgulhoso das destrezas que incomodavam ao resto de seus familiares. Devia a seu irmão mais do que jamais poderia pagar, mas nunca cessaria em seu empenho por tentar. MacLeod foi o saudar, agarrando-o pelo antebraço da mesma maneira em que o tinha feito seu irmão. —Nunca tive oportunidade de lhes agradecer o que fizestes —disse com uma expressão de estranha
intensidade
intervindo,
minha
—
Se
esposa…
não
tivesse
—Deixou
em
suspense a frase — Estou em dívida contigo. Arthur assentiu. Fazia dois anos, justo antes que Bruce declarasse sua opção à coroa, Arthur evitara a morte da esposa de MacLeod. Estivera no lugar apropriado no momento justo, já que acabavam de «lhe jogar» dos Guardiões.
—Eu ouvi que tenho que te dar parabéns, Chefe — disse Arthur usando o nome de guerra atribuído para proteger sua identidade. O pétreo rosto do capitão dos Guardiões das Highlands se quebrou em um estranho sorriso. —Sim —disse — Tenho uma filha. Beatrix, como sua tia. —Não acredito que a segure em seus braços por muito tempo —disse Neil entre risadas — Tinha medo de derrubá-la. Tor o olhou com cara feia, mas não discutiu. O terceiro homem saiu a seu encontro. Embora fosse mais baixo que os outros dois, mas sua figura era igual de imponente. De largos ombros, com os fortes e marcados músculos de um guerreiro, apesar da enfermidade que tinha causado estragos em sua saúde, levava uma cota de malha completa e um tabardo vermelho
com o brasão de leão rampante5 sob a capa negra. Embora seus traços de corte duro e sua bicuda barba não se viam sob o elmo de aço, Arthur o teria reconhecido simplesmente pela aura majestosa que o rodeava. Ajoelhou-se e inclinou a cabeça ante o rei Robert Bruce. —Senhor. O
rei
respondeu
a
sua
vassalagem
assentindo com a cabeça. —Ponha-se
em
pé,
sir
Arthur.
—ele
aproximou-se para saudá-lo com um apertão de antebraços — Assim poderei agradecer-lhe os serviços 5
que
fez
em
Inverurie.
Sem
sua
Um "leão rampante" é representado em pé ereto de perfil, com as patas dianteiras levantadas. A posição das patas traseiras varia de acordo com os costumes locais: o leão pode estar em ambas as patas traseiras afastadas, ou em apenas sobre uma, com a outra também levantada para o ataque; a palavra rampant é frequentemente omitida, especialmente nos brasões mais antigos, pois esta é a posição mais usual de um quadrúpede carnívoro.
informação não teríamos podido organizar um contra-ataque
tão
imediato.
Tinhas
razão.
Buchan e seus homens estavam mal preparados e caíram ao mínimo empurrão. Arthur examinou o rosto do rei e notou as rugas e a palidez cítrica que o envolviam. MacLeod tinha se colocado junto a ele para oferecer seu apoio sem que este o advertisse, embora a Arthur surpreendesse o feito de ver o rei em pé. Suspeitava que houvesse homens nas cercanias, preparados para levá-lo de volta ao acampamento. —Está bem, meu senhor? Bruce assentiu. —Nossa vitória ante os Comyn foi muito melhor cura que qualquer das tinturas que os sacerdotes melhor.
tenham
preparado.
Estou
muito
—O
rei
insistiu
em
lhe
agradecer
pessoalmente — disse MacLeod com certo tom de recriminação na voz. Mas ao rei não pareceu importar. —Seu irmão e o Chefe são mais protetores que duas velhas caducas. MacLeod conduziu ao rei até uma rocha plaina em que pudesse sentar-se e disse de maneira contumaz: —Esse é meu trabalho. O rei o olhou como se quisesse discutir, mas se deu conta da inutilidade disso e se voltou para Arthur. —Essa é a razão de que estejamos aqui — disse — Tenho um novo trabalho para ti. Por
fim.
O
momento
que
tanto
tinha
esperado. —Queres que volte a me unir aos Guardiões
das Highlands — finalizou por ele. Houve uma pausa incômoda. O rei ficou circunspeto. Obviamente não era isso o que estava a ponto de dizer. —Não.
Ainda
não.
Suas
habilidades
demonstraram ser muito valiosas trabalhando no lado inimigo. Mas nos inteiramos de uma nova oportunidade. «Uma nova oportunidade.» Não voltaria para os Guardiões. Por mais decepcionado que pudesse estar com as notícias do rei, Arthur não o deixou ver. Seria melhor que permanecesse sozinho. De todas as maneiras nunca havia se sentido
cômodo
nos
grupos.
Gostava
da
liberdade de tomar suas próprias decisões. Não ter que dar explicações a ninguém nem prestar contas do que fazia. Como cavalheiro na casa de seu
irmão
Dugald,
podia
entrar
e
sair
virtualmente quando lhe agradasse. Tal e como passava freqüentemente em muitas famílias de Escócia, os Campbell tinham se dividido depois da guerra. Seus irmãos Neil, Donald e Duncan estavam com Bruce, mas seus outros irmãos, Dugald e Gillespie, alistaram-se no exército do conde de Ross e, por conseguinte, da Inglaterra. Essa divisão na família fez muito mais fácil colocá-lo em campo inimigo. —Que tipo de oportunidade? —perguntou. —Infiltrar-se no coração do inimigo. «Infiltrar-se.» Isso significava estar muito perto. Algo que Arthur tentava evitar por todos os meios. Essa era a razão de que não se unira a nenhuma das casas nobres como faziam a maioria dos cavalheiros. —Trabalho melhor sozinho, meu senhor. Do exterior. Onde pudesse mesclar-se sem
passar a um primeiro plano. Onde pudesse passar despercebido. Neil, que lhe conhecia bem, sorriu. —Não acredito que te importe nesta ocasião. Arthur procurou seu irmão com o olhar. A satisfação que viu em seus olhos lhe fez compreender ao que se referia. —Lorn? Aquela singela palavra caiu com a força do martelo de um ferreiro. Neil assentiu e um sorriso plácido sulcou seu rosto. —Esta é a oportunidade que estávamos esperando. MacLeod o explicou. —John de Lorn chamou pras filas seus barões e cavalheiros. Seus irmãos, Arthur, responderão à chamada. Vá com eles. Averigúe o que os MacDougall planejam, quantos homens
têm e quem se unirá a eles. Estão infiltrando mensageiros entre nossos homens e quero que os detenhas. Queremos que permaneçam no maior dos isolamentos até que expire a trégua. Tenho ao Falcão controlando as rotas marinhas, mas necessito a você em terra firme. Terra firme era onde Arthur se movia melhor. Argyll era a pátria dos Campbell. Arthur nasceu em Innis Chonnel, um castelo no meio do lago Awe, e viveu ali até que os MacDougall se apoderaram dele. A emoção percorreu todo seu corpo. Tratavase do momento que estivera esperando fazia muito tempo. Quatorze anos, para ser exatos. Desde dia em que John de Lorn esfaqueara a seu pai traiçoeiramente ante seus próprios olhos. Arthur não o viu vir. Foi a única vez em que falharam seus sentidos.
Inclusive no caso de que Neil não tivesse pedido, embora Bruce não lhe tivesse devotado terras e a promessa de uma rica esposa por combater a seu lado, Arthur teria unido a sua tropa só pela oportunidade de destruir a John de Lorn e aos MacDougall. O sangue se pagava com sangue segundo o espírito highlander. Não pensava em falhar com seu irmão do mesmo modo em que tinha falhado a seu pai. MacLeod interpretou mal seu silêncio como uma objeção e continuou: —Com seu conhecimento do terreno não há ninguém em melhores condições para esta tarefa. Passastes mais de dois anos compondo essa falsa aliança justamente para este tipo de missão. Pode ser que Lorn não se sinta cômodo tendo aos Campbell perto, mas uma vez que Eduardo deu por acabada a luta e tendo-se
reconciliado com seu irmão Dugald faz algum tempo, tem razões mais que suficientes para querer pensar que não são mais que o que parecem ser. —Demônios. Se o próprio tio de Lorn luta no nosso lado — acrescentou Bruce, referindo-se a Duncan MacDougall de Dunollie — As famílias divididas é algo que conheces de sobra. —John de Lorn não sabe o que você viu, irmão —disse Neil com voz fica referindo-se ao momento em que foi testemunha da morte do pai de ambos — Faz o que sempre faz. Mantem a discrição e observa. Para o grandalhão que és faz estupendamente o passar despercebido — disse
esboçando
um
sorriso
carinhoso
ao
recordar que nem sempre teve esse tamanho — Te afastes do caminho de Lorn e atua com cautela. A princípio pode ser que desconfie assim
não lhe dê nunca as costas. Isso ele sabia melhor que ninguém. E não era necessário
que
o
convencessem.
Qualquer
reticência que pudesse ter a meter-se na casa do inimigo se desvaneceu para ouvir o nome de Lorn. —Então? —perguntou Bruce. Arthur o olhou nos olhos e pouco a pouco foi esboçando um sorriso malicioso em seus lábios. —Quanto tenho que esperar para partir? Desfrutaria com cada um dos minutos em que contemplasse a destruição do John de Lorn. Nada se interporia em seu caminho. Capítulo 2 Castelo de Dustaffnage, Lorn, 11 de junho de 1308
Apenas três semanas depois do encontro com o rei junto aos blocos de pedra, Arthur Campbell já estava ali. Na mesma boca do lobo, o refúgio do leão, a guarida do diabo: o castelo de Dunstaffnage, a impressionante fortaleza do clã MacDougall. Reunido no grande salão junto ao resto dos cavalheiros e homens que tinham respondido à chamada, esperando seu turno para aproximarse do estrado, Arthur procurava não pensar na importância do que estava por chegar. Se havia algum momento em que John de Lorn se concentraria em cada uma de suas reações seria sem dúvida aquele. Inspecionou a sala com sua habitual
intensidade,
advertindo
todas
as
possíveis entradas e saídas. Embora tampouco a escapada supusesse uma possibilidade real. Se Lorn averiguasse suas intenções, Arthur teria
sérias dificuldades para sair dali com vida. Mas deixar-se guiar por seu instinto era para ele um costume, e era melhor estar preparado. Para tudo. Ao tomar nota dos detalhes da sala teve que admitir que estava impressionado. O castelo era um dos mais formosos que vira. Construído uns oitenta
anos
atrás,
Dunstaffnage
estava
estrategicamente situado no alto de um pequeno promontório de terra onde se encontravam o fiorde de Lorn com a borda sul do lago Etive, com o que resguardava o acesso ocidental a Escócia pelo mar. Construídos sobre uma base de rochas, seus imponentes muros recobertos de limo se erguiam uns quinze metros sobre a terra, com torres redondas em três de seus cantos. A maior destas, junto ao grande salão, servia como torre da comemoração e albergava as câmaras
particulares do senhor do feudo. O desenho e a arquitetura do castelo refletiam o poder do homem que o tinha construído. Sendo ainda parte do reino da Noruega no momento de sua edificação, o responsável por sua construção, Duncan, filho do Dugald, filho do poderoso Somerled, fosse investido com o título de RI Innse Gall, rei das Ilhas, um título que os MacDougall seguiam tomando muito a sério. Aquele castelo era digno de um rei. O grande salão ocupava a totalidade do primeiro andar desta asa ao redor de trinta metros de longitude e outros dez de amplitude. As vigas de madeira do teto deviam medir ao menos quinze metros no ponto
mais
intrincadamente
alto.
Painéis
esculpidos,
de
madeira
próprios
da
decoração da nave de uma igreja, revestiam o muro de acesso oriental, enquanto que os outros
eram rebocados e embelezados com vistosos estandartes e delicadas tapeçarias. A imensa lareira da maior parede do castelo esquentava as dependências e duas janelas ogivais duplas permitiam uma entrada de luz natural pouco habitual. Na parte principal da sala ocupavam mesas com cavaletes e bancos, enquanto ao fundo do aposento, do outro lado da entrada, ergueu-se um estrado. No centro do grandioso tablado que abrangia todo o espaço havia um trono de madeira colossal. Embora essa poltrona fosse ocupada por Alexander MacDougall, lorde de Argyll, chefe e cabeça do clã dos MacDougall, era o filho de cadela desalmado de sua direita quem ostentava o poder. Alexander MacDougall era um homem velho, ao menos teria setenta anos, conforme parecia a Arthur, e fazia tempo que tinha
delegado sua autoridade a seu filho mais velho e herdeiro, John, lorde de Lorn. Era o mais perto que estivera do assassino de seu pai em anos e lhe surpreendeu o ódio intenso
que
lhe
embargava.
Não
estava
habituado a emoções tão violentas e, não obstante, seu peito se inflamava com esta. Tinha esperado durante tantos anos a que chegasse esse
momento
decepcionante.
que Mas
pensou não
foi.
que E
sim
seria lhe
assombrava a vontade que tinha de materializar sua vingança. Seria tão fácil, parecia tão tentador surpreendê-lo pelas costas com uma adaga… Mas ao contrário que seu inimigo, ele o mataria cara a cara. No campo de batalha. Além disso, matar a Lorn não era parte de sua missão. Ainda. Viu o quanto tinha envelhecido seu inimigo. O cinza se abria entre seus cabelos escuros e as
linhas que marcavam seu rosto eram mais profundas. Arthur tinha ouvido rumores a respeito de que padecia de uma enfermidade e começava a perguntar-se se não seriam certos. Mas aqueles
olhos
eram
os
mesmos.
Frios
e
calculadores. Os olhos de um déspota que não se deteria ante nada para vencer. Arthur se esforçou por afastar o olhar do estrado, temendo que pudesse revelar inconscientemente ou que MacDougall chegasse a sentir a ameaça de algum modo. Tinha que ser precavido. Tinha que atuar com a maior cautela para não revelar nada. Se o descobrissem, sabia que o melhor que podia aspirar era uma morte rápida. O pior seria uma morte lenta. Entretanto aquilo não lhe preocupava de tudo. Seguia tendo uma vintena de cavaleiros e ao menos cinco vezes esse número em fidalgos que
tinham respondido à chamada de Lorn. Não se precaveram de sua presença. Neil estava no certo. Era bom permanecendo em segundo plano, sem chamar a atenção. Embora gostasse de poder dizer o mesmo a respeito de seu irmão. Estremeceu ao presenciar como Dugald soltava uma gargalhada e cruzava o rosto de seu escudeiro com o reverso da mão. O menino começou a sangrar e Arthur se apiedou dele, já que desde pequeno estivera do outro lado dos punhos de seu irmão mais vezes que queria recordar. Mas a compaixão não beneficiaria em nada ao moço. Não, se quisesse chegar a ser um guerreiro. Formava parte de seu treinamento. A intenção
era
fazê-lo
mais
forte.
Ao
final
aprenderia a dominar os impulsos. Deixar de senti-los levaria mais tempo. —Que moça ia fixar se em um vagabundo
como você estando eu por aqui? —disse Dugald entre risadas. O escudeiro se ruborizou por completo e Arthur sentiu mais pena por ele se coubesse. O moço seria desgraçado até que aprendesse a controlar suas emoções. Dugald colocaria o dedo na chaga e lhe tiraria essa debilidade a golpes se era necessário. Igual a acontecia com seu pai, a vida de seu irmão consistia em ser um guerreiro, um guerreiro implacável. Bom, isso e sua afeição às moças. Pode ser que Dugald se comportasse às vezes como um fanfarrão insuportável, mas não o fazia por gosto. Embora não fosse tão alto como Arthur, era de compleição robusta e um guerreiro de características formidáveis. Também o conhecia como o mais bonito dos seis irmãos e sentia prazer em desempenhar esse papel.
—Não esperava que se fixassem em mim — disse o escudeiro com calor no rosto que fazia combinação com a cor de seu cabelo — Simplesmente me perguntava se seria tão formosa como diz o povo. —Quem? —perguntou Arthur. —Pelos ossos de St. Columba, irmãozinho! —Por um momento deu a impressão de que Dugald queria esbofetear também a Arthur, mas este já não era um menino. A devolveria. Embora tivesse
procurado
manter
suas
habilidades
ocultas, a princípio por seu próprio bem e depois para que não lhe obrigassem a usar essas habilidades
contra
seus
compatriotas,
perguntava-se se Dugald teria entendido de que a balança de forças já não se decantava a seu favor. Empurrou-o, mas timidamente — Onde estiveste metido? Em uma cova com o rei Hood?
—Dugald riu com mais força inclusive e atraiu os olhares de várias pessoas em sua direção — As filhas
de
Lorn
são
conhecidas
por
sua
extraordinária beleza. Em particular a do meio, a preciosa lady Mary. A Arthur aquilo não intrigava o mais mínimo. A beleza das mulheres se exageravam com freqüência. E além disso duvidava muito de que alguma delas chegasse à esposa do MacLeod à sola dos sapatos. Só tinha visto a Christina Fraser em uma ocasião, mas lhe pareceu a mulher mais bela sobre a face da terra. Então lhe passou pela cabeça a imagem de outra mulher, cuja beleza estava mais em sua doçura que em um tipo clássico e, se admirando, afastou-a de seus pensamentos. Assombrou-lhe seguir pensando naquela moça da igreja a que tinha visto fazia um ano e só uma vez. Então o rei
ficou feito uma fúria por perder a prata, sobretudo quando soube que se tratava do dobro do que em princípio acreditavam, mas compreendeu a razão pela que Arthur interveio. —Todas elas têm uma falha primitiva — assinalou Arthur. O escudeiro parecia confuso, mas Dugald entendia perfeitamente. A expressão de seu irmão mudou e sua boca se contraiu até endurecer o gesto. Pode ser que seu ambicioso irmão visse a conveniência de alinhar-se junto ao Ross e os ingleses, e por extensão junto aos MacDougall, mas isso não significava que sentisse mais aprecio pelo Lorn do que tinha Arthur. —Sim, nisso tem razão, irmãozinho. —Que falha? —aventurou-se a perguntar o escudeiro.
Arthur pensou que, sabendo o que seguiria a isso, o moço demonstrava ser valente. —Para o que vão olhar mais te conviria que sua falha fosse que estejam todas cegas - disse depois de dar outro bofetão. Passou uma hora da buliçosa conversa de seu irmão até que chegou seu turno. Ao fim, Arthur seguia seus passos para render a espada ante o MacDougall. Como cabeça de família, por quanto tocava ao conde de Ross e a coroa da Inglaterra, já que seus três irmãos maiores fossem declarados rebeldes, Dugald falou por todos eles. Alexander MacDougall levou a cabo as
formalidades,
mas
Arthur
percebeu
do
interesse imediato que suscitaram no Lorn. —Sir Dugald de Torsa… —Lorn deixou em suspense a frase em atitude pensativa — Um dos filhos do Colin Mor. Mas não o mais velho deles.
Seu visceral e impetuoso irmão respondeu com uma surpreendente calma. —Não, meu senhor. Meus três irmãos mais velhos lutam com os rebeldes. —Como Lorn sabia melhor que ninguém — Igual a seu tio — acrescentou Dugald com a dose justa de sarcasmo. O gesto de Lorn se endureceu. Obviamente não gostava que recordassem a esse parente traidor. —Recordo a seu irmão Neil — disse olhandoo fixamente nos olhos — Lutou com bravura na batalha de Rede Ford. Rede Ford. A batalha em que os MacDougall e os Campbell lutaram por suas terras no Loch Awe. A batalha em que seu pai foi eliminado a sangue frio. Pelo Lorn. O muito filho de cadela estava
desafiando-o.
Dugald
sabia.
Arthur
também sabia. Mas este só queria matá-lo por isso, já que era o único que o tinha presenciado. O grande Colin Mor Campbell morreu como um guerreiro no campo de batalha, mas só Arthur viu o modo traiçoeiro em que o assassinaram. Teria sido sua palavra contra a de Lorn. Neil fez o correto ao protegê-lo. Ninguém teria acreditado. —Suponho que fosse muito jovem — disse Lorn em tom despreocupado. —Naqueles dias eu era escudeiro com os MacNab - respondeu Dugald ao tempo que assentia. Lorn
recebeu
a
mensagem.
Bastou
nomeando o laço que unia aos aliados mais importantes e seu clã vizinho. Lorn parecia satisfeito e mesmo Arthur pôde relaxar-se um pouco. Já parecia o mais difícil. Tinham passado o primeiro exame e eram aceitos no rebanho.
Com sorte, essa seria a última vez que Lorn se fixasse nele. Estavam a ponto de partir quando abriu a porta e as risadas alagaram a sala. As risadas de uma garota. Despreocupada e cheia de uma diversão sem complicações. Era um tipo de risada que não ouvia fazia muito tempo e lhe provocou uma estranha sensação de nostalgia. Olhou para trás, mas com a soldadesca que abarrotava a sala não teve maneira de ver de onde procedia. De repente a multidão se abriu como o mar Vermelho e criou um corredor que percorria o centro do aposento. O escandaloso estrépito
das
vozes
dos
homens
se
foi
desvanecendo até converter-se em um silêncio atônito.
Pouco
aproximaram
depois, do
duas
estrado
moças
com
se
passos
apressados. A primeira era uma das mais
formosas criaturas que Arthur já vira, a rival loira da esposa do MacLeod. O véu celeste que a cobria, preso com um diadema de ouro, não conseguia ocultar de todo a alvoroçada profusão de cachos loiro platino que caíam sobre suas costas. Esses traços perfeitos, junto a sua pálida pele e seus olhos de um azul vibrante faziam dela um anjo. Ouviu como seu irmão respirava fundo e murmurava algo que estava entre uma maldição e uma prece. Compreendia esse sentimento perfeitamente. Entretanto, foi a segunda das moças que atraiu sua atenção. Tinha certa auréola de… A moça voltou a rir e olhou para trás, revelando longos cabelos acobreados atrás de seu véu rosado. Fixou-se em seu rosto. Tinha as bochechas rosadas pelo frio e olhos azul marinho
que brilhavam com sua risada. Tinha sentido ele essa felicidade em algum momento de sua vida? Havia sentido essa liberdade? Bastou
um
só
instante
para
que
a
reconhecesse. O coração lhe deteve de repente. «Por Deus bendito. Não podia ser!» Mas se tratava dela. A moça da igreja. Ouviu que Lorn dizia: —Mary, Anna, retornastes! Arthur juraria que a voz daquele filho de cadela insensível denotava uma alegria sincera. As duas garotas correram a seu encontro, mas Arthur só tinha olhos para uma. Esta rodeou ao Lorn com seus braços e lhe plantou um beijo enorme na bochecha. —Pai! —disse emocionada. «Pai.» A Arthur pareceu que lhe cravassem uma adaga nas vísceras. Tinha salvado à filha de
Lorn. Teria rido com gosto diante da amarga ironia do assunto, a não ser porque supunha um desastre irreparável. Se o reconhecesse, sua cabeça estaria pendurando às portas do castelo para quando caísse a noite. Não lhe importava morrer. Mas sim o fracasso. Tentou fazer um sinal a seu irmão para que se retirassem, mas Dugald parecia estar em transe e olhava lady Mary MacDougall como se esta acabasse de descer dos céus. Arthur afastou o olhar das mulheres, mas viu de relance que a segunda das moças ficava confusa ao olhar pela primeira vez ao redor da sala e se conscientizar da quantidade de olhos que as observavam. A jovem mordeu o lábio. Tratava-se de um gesto de um erotismo inocente que poderia ter afetado antes de saber que se tratava da filha de Lorn. Entretanto, quão único provocou
nele foi o impulso de levar a mão à espada; a de aço. —interrompemos
algo
—disse
a
jovem
voltando-se para a outra moça, sua irmã, presumivelmente
—
Vamos,
Mary.
Já
contaremos nossa viagem ao pai mais tarde. Lorn negou com a cabeça. —De maneira nenhuma. Não é necessário. Já quase terminamos com isto. Arthur ia ficando petrificado, com o coração em um punho, à medida que a moça varria a multidão de soldados com o olhar para depois, maldita seja, voltar a ele. Aferrou o punho de sua espada com mais força de maneira instintiva. Um suor frio lhe percorria as costas. Nessa ocasião o elmo não lhe cobria o rosto, de modo que ela sentiu toda a intensidade de seu olhar. Paralisouse ao ver que franzia levemente o sobrecenho.
Durante um longo instante esperou que o desmascarasse, que sua voz pronunciasse as palavras que lhe condenariam à morte… e ao fracasso. Mas a ruga de seu cenho não fez mais que intensificar-se. E então, com um impulso temerário, soube exatamente o que tinha que fazer. Tinha que mostrar segurança. Ergueu o olhar para olhá-la nos olhos, lentamente. Não se moveu. Não respirou. Não piscou quando seus olhares se encontraram sem obstáculos pela primeira vez. Sentiu que se afundava nesses olhos do azul do mar. sentiu-se perdido, embora fosse por um instante. Quando viu que ela se sobressaltava, soube que tudo tinha
acabado.
Entretanto,
a
moça
baixou
rapidamente o olhar e um ligeiro rubor apareceu em suas bochechas. Arthur esteve a ponto de
suspirar, aliviado. Não o tinha reconhecido. Simplesmente
se
envergonhava
de
que
a
tivessem pilhado olhando. Não obstante, seu alívio não durou muito. Pode ser que a garota não o tivesse denunciado como espião, mas sem querer o tinha feito exatamente aquilo que tinha a esperança de evitar: atrair a atenção do pai sobre ele. —Qual dos irmãos é você? —perguntou Lorn, com uns olhos escuros e maliciosos que não perderam um só detalhe daquele intercâmbio. —Meu irmão caçula —respondeu Dugald por ele — Sir Arthur, meu senhor. O que está junto a ele é meu irmão sir Gillespie. Ambos
assentiram,
mas
Lorn
seguia
interessado em Arthur, como um vira-lata ante um osso rodeado de carne. —Sir Arthur… —murmurou, como se tentasse
recordar o nome — Fostes renomado cavalheiro pelo próprio rei. Arthur olhou nos olhos de seu inimigo pela primeira vez, sem revelar um ápice o ódio que corroía seu interior. —Sim, meu senhor. O rei Eduardo me coroou cavalheiro depois da batalha do Methven. —Do Valence, Pembroke, tem-lhe em alta estima. Arthur se inclinou como se aquela adulação fosse agradável, algo que não podia estar mais longe da verdade, já que sabia que os louvores do general provinham do prejuízo causado a seus próprios amigos. Fazia quanto podia por evitar lutar contra os homens de Bruce, mas em ocasiões era inevitável. Para permanecer com vida e preservar sua verdadeira intensidade não tinha mais opção que defender-se, às vezes da
morte. Era uma parte de sua missão em que nunca pensava e que, entretanto, sempre estava aí com ele. Lorn o olhou longa e pausadamente até que por fim desviou o olhar. O seguinte grupo de homens se aproximou e Dugald encabeçou a comitiva de volta. Mas Arthur sentiu o peso dos olhares em suas costas durante todo o trajeto. Pensou que se tratava dos olhares das moças, não de Lorn, mas nem uma nem outra eram benéficas para sua missão. Uma coisa estava clara: tinha que manter-se afastado daquela jovem. Anna MacDougall. Sua boca fez uma careta de desgosto. Não havia melhor arma contra o desejo que saber que a mulher que fazia palpitar seu coração era a filha do homem que tinha assassinado a seu pai.
Capítulo 3 Anna nem sequer olhava por aonde ia. Voltou para castelo com apenas tempo para se banhar e mudar o vestido para a festa, uma festa que tinha sido idéia dela, a modo de boas vindas para os barões, cavalheiros e guerreiros que tinham acudido ao Dunstaffnage à chamada de seu pai. Com uma guerra às portas de casa, uma celebração podia parecer estranha a muitos, como por exemplo, seu irmão Alan, mas Anna sabia quão importante era deixar as penas e a fatalidade de lado, embora fosse por uma só noite. Para recordar pelo que se lutava. Para atuar com normalidade, ou o que em meio da guerra pudesse chamar-se normalidade, ao menos durante um breve instante. Por sorte seu
pai acessou e considerou oportuna a festa. Tinha a suspeita de que também ele estava desejoso de demonstrar a outros que já se recuperara por completo de sua enfermidade. Não obstante, fosse qual fosse a razão, Anna dava amostras de uma
excitação
fosse
do
comum.
Teria
quantidades indecentes de comida e bebida, música, um seannachie6 para congratular à multidão com histórias do clã e bailes. Dança! Fazia tanto tempo que não dançava… Sua irmã e ela tinham passado horas decidindo o que usariam, planejando até o mais mínimo detalhe. E agora chegava tarde. Não é que se arrependesse. O bebê recém-nascido de Beth era adorável e Anna sabia a necessitada ajuda que precisava sua amiga recém viúva. Sentiu um arrebatamento de compaixão por 6
Um bardo entre os Highlanders da Escócia, que preservaram e repetiam a tradições das tribos, também, um genealogista.
aquela menina que não conheceria seu pai. Era desconsolador que houvesse tantos como ela. Uma razão mais pela que não via o momento de que cessasse aquela maldita guerra. Ao ouvir os primeiros acordes da harpa murmurou uma das maldições favoritas de seu pai. Deixou atrás a luz para entrar como um torvelinho na sombria entrada do salão e deu de repente contra um muro. Ou ao menos isso pensou ela, até que o muro estendeu os braços e a segurou quando caía de costas, salvando-a do que presumia que teria sido um duro golpe no traseiro. A surpresa a deixou com a respiração entrecortada, primeiro pelo impacto e depois diante da embriagadora sensação de sentir-se sustentada
pelos
braços
extraordinariamente musculosos. —Estás bem?
musculosos,
Céu santo, que voz! Envolvia-a com tanta firmeza como aqueles braços. Uma voz profunda e com caráter, com o toque justo de aspereza. Era uma voz que ressonaria pelas salas e até as colinas. Seguro que se o pai Gilbert tivesse essa voz
seus
sermões
matutinos
teriam
sido
escutados com maior atenção. —Estou bem — disse um tanto aturdida. Em realidade estava um pouco enjoada. Ergueu o olhar e piscou para limpar as estrelas que tinha ante si e ficou sem respiração de novo. Tratava-se do jovem cavalheiro no que tinha reparado dias antes. Aquele que a tinha pilhado olhando-o: sir Arthur Campbell. Suas bochechas se ruborizaram. Não sabia o que o que chamou a atenção sobre ele na última ocasião, mas voltava a sentir de novo. Era uma pequena aceleração do pulso, um arrebatamento de calor que se
estendia por sua pele, uma nervosa revoada no estômago. Esse homem tinha algo diferente, algo que não era capaz de descrever. Era como se emanasse intensidade do mais profundo de seu ser. Embora não o tivesse notado a princípio, era de uma beleza incontestável. Sua formosura, singela e descrente, não se fazia tão aparente como a de seu irmão, que possuía esse tipo de galhardia tão chamativa que parecia impossível não fixar-se nela. Como aquele Adônis7 que tinha repelido o ataque quando ela reconheceu a seu «salvador», a noite da igreja. Inclusive com aquelas manchas negras no rosto, Anna pensou então que era impossível que jamais tivesse visto um homem tão excepcionalmente bem formado. 7
Adonis era um jovem de grande beleza que nasceu das relações incestuosas que o rei Cíniras de Chipre manteve com a sua filha Mirra. Adônis passou a despertar o amor de Perséfone e Afrodite. Mais tarde as duas deusas passaram a disputar a companhia do menino, e tiveram que submeter-se à sentença de Zeus. Este estipulou que ele passaria um terço do ano com cada uma delas, mas Adônis, que preferia Afrodite, permanecia com ela também o terço restante. Nasce desse mito a ideia do ciclo anual da vegetação, com a semente que permanece sob a terra por quatro meses.
Mas, ao ser um rebelde, a atração que sentia se desvaneceu rapidamente. Parecia estranho que voltasse a pensar naquela noite. Era a segunda vez que lhe ocorria na mesma semana. Acreditava ter deixado para trás esse episódio aterrador, que já não olhava a todos os homens com que cruzava como se pudessem ser ele. Esse homem que era de uma vez traidor e salvador. Tinham-no chamado «Guardião». Que tipo de nome era esse? Os guardiães eram homens que percorriam os campos para proteger e instaurar a lei e a ordem, algo que não combinava com um espião. Ou não era assim? Por seu relato e descrição do acontecido naquela noite, seu pai tinha suposto que aqueles dois homens pertenciam à elite secreta de guerreiros fantasmas de Bruce. Aqueles guerreiros, parte bicho-papão e parte
heróis mitológicos, tinham semeado o terror entre os ingleses e seus aliados escoceses. Mas nesse momento não podia pensar mais que no homem que a sustentava. Cheirava divinamente; uma cálida fragrância a sabão, pelo banho que certamente acabava de tomar. Seus cabelos negros ainda estavam molhados, e alguns cachos lhe caíam sobre a frente e o pescoço. Barbeara-se, embora Anna pudesse apreciar a sombra da barba sobre seu queixo cinzelado. Cinzelado o descrevia bem. Era todo ângulos
afiados
e
traços
duros,
uma
masculinidade rasgada que a ela jamais antes tinha parecido atraente. Preferia homens mais refinados, tanto quanto as maneiras como à aparência. Normalmente não se fixava nos guerreiros. Recordavam-lhe muito à guerra. Mas não cabia dúvida de que esse homem o era. Os
músculos
de
seus
braços
lhe
davam
a
compleição de um aríete. Parecia-lhe curioso que não percebera o quão alto e musculoso que era na primeira vez que o tinha visto. Mas a verdade é que cobertos com a cota de malha e a armadura
quase
todos
os
cavalheiros
lhe
pareciam iguais. Anna não era especialmente baixa por ser uma mulher, mas teve que jogar a cabeça para trás para olhá-lo no rosto. Por Deus, tinha que medir virtualmente dois metros! E era quase tão largo de ombros como a entrada ao salão. Seus olhares se cruzaram. Algo a sacudiu por dentro de cima abaixo. Jamais tinha visto olhos de tal cor. Âmbar com traçados dourados, em lugar de marrons, como pensou por um primeiro
momento.
extraordinariamente
Emoldurados longos
e
por
cílios
suaves
que
inspirariam inveja em qualquer mulher.
Anna
se
deu
conta
de
que
a
tinha
reconhecido justo antes de soltá-la. De fato, mais que soltá-la a deixou cair, de uma maneira tão brusca que se salvou de dar com o traseiro no chão pelos cabelos. Tropeçou para trás, moveu os braços como de uma galinha cacarejando e, por sorte, engenhou para manter o equilíbrio. Muito para impressionar com sua agilidade. E não era que sua expressão indicasse que cabia a mínima possibilidade de impressioná-lo, pois jamais um jovem a tinha olhado com tamanha… indiferença, total e absoluta. Menos mal que não era uma jovem vaidosa. Ou ao menos não acreditava ser, embora naquele momento tivesse que admitir que acabara de sentir uma pontada em seu interior. Ao conscientizar-se de que ficou olhando-o como se fosse uma donzela embevecida recém
saída do convento baixou o olhar em seguida. Não podia ter deixado mais claro seu absoluto desinteresse por ela. Por todos os Santos, estivera a ponto de deixá-la cair. Talvez não o tivesse adestrado como cavalheiro na galanteria. Tentou recuperar algo um pouco parecido à compostura, sorriu e disse: —Sinto muito. Não vi que estavam aí de pé. Arthur a olhou com olhar que parecia albergar certa impaciência arrogante. —Isso é óbvio. Anna apagou o sorriso e ficou circunspeta, sem saber o que dizer. Os momentos incômodos eram terra ignota para ela. Ao que parecia, não se tratava de um grande conversador. —Estou atrasada — disse como desculpa. O cavalheiro se retirou para lhe dar caminho. —Então não permitam que lhes retenha por
mais tempo. Embora dissesse em um tom neutro e suas palavras não pareciam incorretas, apreciava-se nelas o caráter distintivo da frieza. «Não lhe caio bem.» Então se sentiu estúpida de repente e saiu correndo. Quem mais lhe dava cair bem ou não? Os guerreiros eram o tipo de homens que menos lhe interessavam. Já tinha tido suficiente guerra de por toda vida. Paz. Tranqüilidade. Um lar feliz e um marido cuja conversa não girasse em torno da guerra e as armas. Crianças. Isso era o que o futuro lhe proporcionaria. Justo antes de inundarse no mar de gente que abarrotava o grande salão se aventurou a voltar o olhar para trás. O cavalheiro desviou o olhar. Mas a estava observando. Arthur contava os minutos para poder partir. Sob circunstâncias normais não era muito dado
aos festins e as celebrações ébrias, mas graças a Anna MacDougall parecia difícil inclusive pretender que estava relaxado e desfrutando. Era ele quem se dedicava a vigiar e observar, não ao contrário.
Não
necessitavam
sentidos
extremamente afinados nem estar olho atento para conscientizar-se de seu olhar. Ele estava sentado no canto do fundo do salão, o mais longe do estrado que era possível, mas igualmente poderia estar ao lado dela, dada a intensidade com que o observava. Interesse feminino e algo que parecia muito mais perigoso que isso: curiosidade.
Algo
que
não
gostava
absolutamente. Por que não deixava de olhá-lo? E, pior ainda, por que estava custando tanto evitar olhá-la em resposta? Era bonita, inclusive formosa. Mas as mulheres formosas não eram algo tão estranho para que sofresse tanto por
ignorá-la. Não tinha problema algum em afastar o olhar de sua irmã Mary, sendo esta uma das criaturas mais belas que tivesse visto. Mas havia algo em Anna MacDougall que atraía as olhadas. Inclusive em um aposento entre centenas de companheiros de clã e numerosas moças jovens e atraentes competindo por chamar a atenção, ela ressaltava como um diamante entre cristais. Não era pela beleza. Ao menos não só por isso. Não a olhavam os homens unicamente, também o faziam as mulheres. Sua risada tinha algo contagioso; seu sorriso, algo terno; seus olhos azul intenso algo cativante em seu brilho, e suas covinhas
eram
deliciosamente
travessas.
Covinhas. Estava claro que tinha que os ter. Que espírito adorável carecia deles? Mas além de uma ou duas olhadas rápidas, esforçou-se
diligentemente
por
evitá-la.
Contenção. Controle. Disciplina. Essas eram as qualidades às que se encomendava. Elas eram as que faziam dele um guerreiro de elite. Entretanto, quando começou o baile seu orgulho recebeu uma estocada. Um só olhar a seus
sorridentes
olhos
e
suas
bochechas
coradas fez que ficasse tão encantado como outros. Era uma moça alegre e vivaz que transbordava vitalidade e força juvenil. Soava a clichê, mas o certo era que levava a alegria escrita no rosto. Para um homem que único conhecia desde que fosse capaz de se sustentar uma espada eram a morte, a destruição e a desolação, um homem que tinha vivido nas sombras durante danos, evitando chamar a atenção em que ela tanto desfrutava, que jamais tinha experimentado tal alegria de viver, a sua era uma luz virtualmente cegante.
Tentou concentrar-se em suas imperfeições. Mas vá, não era capaz de encontrar cabelo em nenhum lugar estranho nem sinais indecorosos que danificassem a imaculada pele. Tinha o nariz um tanto arrebitado. A boca, um pouco larga. O queixo, um tanto bicudo. Mas tudo isso a fazia mais adorável e doce ainda. Apesar de que essa fosse exatamente a primeira impressão que lhe tinha dado, dizia a si mesmo que certamente era malcriada e seria altiva. Ou calculadora e malévola, como seu pai. Acabava de convencerse disso quando a viu tropeçar. Saiu disparado de seu assento antes de se dar conta do que estava fazendo. A moça escorregou com um pé e deu um bom golpe no traseiro. A música se deteve, ao qual seguiu um silêncio de assombro. Pelo olhar de horror do membro do clã que estava junto a ela, Arthur imaginou que tinha sido
o culpado de derrubá-la com seu empurrão. Esperava as lágrimas ou a pirraça furiosa que dirigiria ao culpado de seu desafeto. Mas teve uma decepção. Anna MacDougall se viu ali jogada no chão e caiu na risada. Quando o homem a ajudou a levantar-se, Arthur advertiu que se mofou do horror que transluzia no rosto do jovem membro do clã para tranqüilizá-lo. Não estava mau, para ser uma moça altiva e malcriada. Sentiu a necessidade premente de beber, de modo que levantou sua taça e deu um longo gole na cerveja.
Poderia
olhá-la
durante
horas.
Entretanto, consciente de que jogava com fogo, obrigou-se a olhar para outro lado. Estava mais claro que a água que não gostaria que ela visse como a olhava. Dado de quem se tratava, sua fascinação por essa jovem lhe parecia irritante.
Deveria desprezá-la só por levar esse nome. Pelo amor de Deus, era a filha de Lorn. Não obstante, não tinha sido desprezo o que sentiu pouco antes disso, quando caiu sobre seus braços. Sentiu que lhe punha duro. Excitação. Calor. Com muita vontade de afundarse nessa suavidade. Grudar seu corpo ao dela. Notar todo o peso de seus seios sobre o torso e seus quadris em cima de seu membro. Que sua reação
alcançasse
tal
intensidade
o
tinha
surpreendido tanto que teve que deixá-la cair mais rápido do que era devido. Mas o desejo, embora fosse incomodo, era algo fácil de reprimir. Não significava nada em comparação com o perigo ao que expor o interesse da garota por ele. Levava tempo suficiente fazendo aquilo para saber que quão único podia dar por desconto em cada uma das
missões era que algo sairia mal. Mas defender-se de cuidados não requeridos por parte de uma moça formosa não era o tipo de problemas que tinha antecipado. As experiências de Arthur com as mulheres se reduziam a um tipo de relação mais primária. Embora sua beleza não fosse tão excepcional como a do MacGregor, graças a Deus, Arthur poderia atrair a muitas admiradoras se quisesse. Mas sua atitude não as animavam. E assim era como gostava que fosse. As mulheres eram muito mais perceptivas que os homens, em geral. Normalmente notavam algo diferente nele e seus instintos lhes diziam que se afastassem.
Normalmente.
Mas
com
Anna
MacDougall se via obrigado a tomar medidas mais drásticas. Suas tentativas de desanimá-la, não obstante, não tinham funcionado. A menos que lhe fazer sentir como um imbecil contasse.
Pode ser que o cavalheirismo e a galanteria não saíssem de modo natural, esse era bem o estilo de
seu
irmão,
mas
tampouco
a
rudeza
descarada. A frieza com a que a tinha tratado não era convenientes, por mais que tivesse sido necessário. Sacudiu a cabeça. Que demônios lhe estava passando? Anna MacDougall era a última moça do mundo pela que podia interessar-se. Algumas poucas palavras bruscas não eram nada em comparação com o que tinha ido fazer ali. Todo seu mundo estava a ponto de ser destruído. Embora não é que pudesse supor, pelos sorrisos de júbilo nos rostos das pessoas que o rodeava. Acaso não sabiam que as voltas tinham mudado, que seus aliados mais poderosos, os Comyn e Inglaterra, tinham-nos deixado sozinhos, que Bruce chegaria mal expirasse a trégua? Diabos,
inclusive seu irmão atuava como se nada desse mundo lhe importasse, rindo e brincando junto a seus homens com a mesma intensidade que outros. Mais alto, talvez. —Não gostas da cerveja, sir Arthur? Ao voltar-se encontrou junto a ele ao escudeiro do Dugald sentado no mesmo banco. —Eu gosto bastante — disse torcendo o gesto — Embora certamente não tanto como a meu irmão. O moço sorriu. Aproximou-se um pouco mais e baixou a voz. —Não pude evitar me fixar na dama, senhor. —Arthur não precisava olhar para saber a quem assinalava — esteve lhe observando. Talvez queira convidá-la a dançar? Por desgraça não baixou a voz o suficiente. Ou talvez seu irmão Dugald não estivesse tão
bêbado como ele pensava. Dugald o interrompeu a gritos. —Não perca o tempo, Ned! Meu irmão preferiria dançar com sua própria espada antes que com uma dama jovem sem desposar. Todos riram ao entender a brincadeira procaz. Embora Dugald já tivesse terminado de comer, ainda tinha na mão a faca com punho de haste. Arthur advertiu que o escudeiro ficava nervoso e que abria os olhos exageradamente ao ver que Dugald lançava a faca ao ar para agarrála com uma mão. O menino, inconscientemente, começou a esfregar mãos e foi mais para frente no banco. Arthur compreendia muito bem as reações do escudeiro. Um só olhar a suas próprias mãos, com dezenas de cicatrizes feitas com facas,
davam a resposta a isso. Isso era o que Dugald entendia por jogo. Lançava a faca, ou a adaga, ou a lança, ao ar por um momento, e depois o jogava em alguém sem prévio aviso para que o outro o agarrasse. Supunha-se que melhorava os reflexos e obrigava a estar alerta, consciente e preparado. E o fazia, embora seja certo que com muita dor e sangue. Deus, como tinha temido essa
maldita
faca,
um
sentimento
que
compartilhava com o escudeiro, se é que o rosto lívido e em tensão que o moço tinha não o enganavam. —Não cortejou a uma moça desde que era um escudeiro miúdo como você —continuou Dugald — Como se chamava, irmão? Arthur passou um dedo sobre a borda de sua taça
descuidadamente.
Dugald
provocando, mas não pensava picar.
o
estava
—Catherine. —O que ocorreu, senhor? —perguntou o escudeiro a Arthur enquanto olhava de esguelha ao Dugald, sem perder por completo de sua visão a folha de aço de quinze centímetros. Arthur encolheu os ombros. —Não encaixávamos. Dugald soltou uma gargalhada. —Depois de que a fizesse sair apitando. Por Deus que foi um moço estranho. —Felizmente não se explicou, mas sim voltou a olhar ao escudeiro. Fez um rápido movimento com a mão, insinuando lhe atirando a adaga e rindo ao ver que se assustava — Brigava com menos graça que você, inclusive. Um afeminado, embora não possam acreditar. —Pela forma em que lhe olharam todos, ficou claro que não acreditavam — Adoentado e débil. Não podia levantar a
espada até virtualmente cumprir os doze anos. Ninguém tinha esperanças de convertê-lo em um guerreiro. —Salvo Neil, pensou Arthur. Neil sempre acreditou nele — E olhem agora —disse Dugald — Um guerreiro do qual nosso pai estaria orgulhoso - disse enquanto lançava a adaga ao ar, recolhia-a e a jogava imediatamente para o escudeiro com um destro jogo de mãos. Arthur podia repeli-la, mas o moço estava atento. Com os olhos fixos na resplandecente folha, arrumou para agarrar o cabo e ficar com ela. Dugald deixou escapar uma boa gargalhada. —Ora! Talvez haja esperanças para ti, depois de tudo — disse acompanhado pelas risadas do resto dos homens. Aquele elogio imprevisto a respeito das habilidades
como
guerreiro
de
Arthur
lhe
importava mais do que queria. Dugald e ele
nunca teriam uma relação íntima, mas eram irmãos. «Lutando em lados diferentes», teve que recordar. O escudeiro se afastou deles e outros voltaram para suas bebidas, mas Dugald ficou olhando a seu redor discretamente. Arthur sabia o que — ou melhor, a quem— procurava. A tal lady Mary MacDougall tinha atraído a atenção de seu irmão, algo excepcional fosse quem fosse a mulher. —É uma verdadeira lástima — disse Dugald com dureza. —Sim, irmão — disse Arthur assentindo com a cabeça - é mesmo. As filhas de John de Lorn não foram feitas para eles. Capítulo 4
Anna tinha mais defeitos do que era capaz de reconhecer. Depois da noite passada teria que incluir também vaidade e arrogância a lista, em que já estavam a sua conhecida teimosia: tinha sido ela quem tinha ameaçado simpaticamente a seu pai atando-o à cama se tentasse levantar-se; sua franqueza: supunha-se que as mulheres não deviam ter opinião, nem muito menos expor as mesmas, embora não podia culpá-la por isso, já que era seu pai quem a animava a fazê-lo; além dessa afeição tão imprópria em uma dama de repetir as imprecações favoritas de seu pai e seus irmãos, algo do que não estava disposta a dar exemplos para não acrescentar mais lenha ao fogo de seus pecados. Acabava de descobrir nela uma necessidade de que outros a admirassem que raiava a perversão. Não era arrogante pensar que tinha
que chamar a atenção de todos? É obvio que era. Embora fosse algo muito comum. Não teria que se preocupar que aquele jovem cavalheiro não se dignou a olhá-la. Nenhuma só vez. Em toda a noite. Mas lhe preocupava. Sobretudo porque por sua parte ela não tinha podido deixar de olhá-lo. Ao mesmo tempo em que ria até que lhe doíam
as
machucava
mandíbulas, os
pés,
dançava
comia
até
até
que
que
lhe
arrebentava o estômago e bebia até afogar-se, encontrou-se a si mesmo percorrendo a sala com o olhar em um completo sem sentido, procurando a aquele cavalheiro de escura beleza que tão claro tinha deixado seu desinteresse por ela. Franziu o cenho. E por que não gostava dela? Mostrou-se amável, sorridente e disposta a manter uma conversa. Não tinha verrugas no
nariz, nem pêlo no queixo ou os dentes podres. De fato, haviam-lhe dito muitas vezes, e não só os homens de sua família, que apesar de não ser tão bela como Mary — quem poderia ser?— sua imagem era muito agradável à vista. Daí que tivesse caído na vaidade. Talvez fosse pela inimizade que perdurava entre os velhos feudos dos Campbell e os MacDougall? Naqueles tempos ela era só uma menina
e
mal
conhecia
as
circunstâncias.
Sempre poderia perguntar a seu pai. Não obstante, o que não poderia explicar seria seu desespero por encontrar razões para o aparente desprezo do cavalheiro. Não teria por que lhe importar. Nem sequer o conhecia. E além disso era um guerreiro. Não havia nada de refinação nele. Aquilo em si deveria bastar. O que importava um só homem? Havia uma
multidão de homens que gostava dela. Entre eles Thomas MacNab, um homem culto e amável que acabava de ir buscar uma taça desse vinho doce que adorava, enquanto que ela descansava junto à
janela
aberta,
recuperando-se
daquela
impetuosa dança e de sua abafadiça queda. Gostaria de dizer que normalmente não era tão desajeitada, mas não era certo. Considerava-o mais uma desgraça que um defeito. Apoiou-se no parapeito de pedra, inalando baforadas de ar fresco ao mesmo tempo em que passeava o olhar pelo grande salão. Fazia um mormaço na sala, provocado não pelo fogo dos candelabros mas sim pela vívida energia dos participantes, que revoavam de um lado a outro. Por isso podia deduzir das gargalhadas e os sorrisos nos rostos dos homens e as mulheres, que a festa tinha sido um êxito clamoroso. Exceto
por uma pessoa. Algo que a fazia perder o sorriso. «Não olhe…» Mas é obvio que o fez. Supôs que teria que acrescentar a essa lista uma horrenda falta de autocontrole. Seu olhar se voltou imediatamente para a figura que havia no canto do fundo à direita do aposento. Seguia ali, o qual era surpreendente, já que parecia olhar para a porta como se não pudesse esperar em sair por ela. Segundo sua experiência, os guerreiros sempre estavam ansiosos por partir. Desejosos de chegar ao seguinte campo de batalha. Ao contrário que o resto dos homens a seu redor, sir Arthur não se servia do vinho e da cerveja dos MacDougall. Sua jarra apenas se moveu da mesa que tinha frente a ele. Estava situado em um lugar do que dominava toda a
sala, sentado de costas à parede e com o rosto impassível.
Perguntou-se
se
aquilo
intencional.
Embora
via
completamente
se
seria
relaxado, apoiado contra o muro e sorrindo de vez em quando ao que seus companheiros diziam, advertia seu estado de alerta. Como se estivesse todo o tempo em guarda e sopesando a situação. Era algo tão sutil que a princípio nem sequer reparou nisso. Mas estava ali, na firmeza de seu olhar e a quietude de sua posição. Embora permanecesse junto ao resto do grupo de guerreiros, incluindo os dois irmãos com que estava o primeiro dia, comportava-se mais como observador que como participante ativo na conversa. Parecia abstraído. Afastado. E não podia evitar que aquilo a inquietasse. Não gostava de ver que alguém ficava excluído. Talvez devesse olhar se… antes que pudesse
terminar de formular esse pensamento sentiu que a agarravam por trás e a suspendiam no ar fazendo-a girar. —Não tem com quem dançar, mucosa? — disse o homem zombeteiramente — Deveria dizer a algum de meus homens que te tire pra dançar? Anna riu com vontade, sabendo perfeitamente de quem se tratava, apesar de que fazia muito tempo que não ouvia o tom de graça em sua voz. —Nem
te
ocorra.
Posso
encontrar
um
companheiro sozinha. —Lutou com ele em uma tentativa de libertar-se de seu abraço de urso — me solte, monstrengo. O homem voltou a colocar a com os pés no chão e lhe deu a volta para olhá-la à cara com severidade. —Monstrengo? Deveria mostrar mais respeito
por seu irmão mais velho, pequena. —Disse
monstrengo?
—perguntou
Anna,
batendo suas pestanas com cara de inocência — Queria dizer sir Monstrengo. O homem soltou uma gargalhada e enrugou a comissura de seus olhos, de idêntico azul aos dela. Seu coração se encheu ao ver o sorriso em seu rosto. Não havia visto seu irmão tão feliz desde que sua esposa morrera ao dar a luz a seu terceiro filho, quase um ano. Embora Alan fosse só
dez
anos
envelhecido
mais
durante
velho os
que
últimos
ela,
tinha
meses.
A
profundidade das rugas de seu rosto mostrava o afeto que sentia por sua esposa. Seu cabelo castanho tinha agora entradas e começava a escassear no cocuruto, mas apesar de tudo isso seguia sendo um homem bonito. Sobretudo quando sorria, um pouco raro no sério herdeiro
de Lorn e Argyll. Alan agarrou a Anna pelo nariz entre o polegar e o indicador à maneira em que estava acostumado a fazer quando era uma menina. —Estava certo, sabe? —O que dizia? —perguntou Anna com uma mão na orelha — Há tanto ruído que não te ouço. Alan negou com a cabeça. —Malandrinha… Sabes perfeitamente do que falo.
O
banquete.
Era
justamente
o
que
necessitávamos. Sorriu sem ocultar sua satisfação. Não podia evitar. A opinião de seu irmão significava muito para ela. Sempre tinha sido assim. —Diz a sério? —A sério — respondeu Alan ao mesmo tempo em que assentia. Agachou-se e a beijou no cocuruto. Embora
seu irmão não fosse tão alto como certo cavalheiro jovem ao que acabava de conhecer, era um homem formidável. Media mais de um metro oitenta de altura e tinha a corpulência de seu pai e seu avô. Tanto Ewen como Alastair, seus outros dois irmãos, eram de compleição mais magra. Uma nuvem de tristeza escureceu seus pensamentos. Somhairle estava a meio caminho entre os três. Alto, de largos ombros e com um corpo que era pura fibra, contava com uma figura imponente, a quinta-essência do guerreiro. Algo não muito longe de sir Arthur — por que seguia pensando nele? — Mas Somhairle, o segundo de seus irmãos, tinha morrido lutando junto a Wallace na batalha do Falkirk, fazia quase dez anos apenas. Tinha vinte anos. Esforçou-se
em
afastar
esses
tristes
pensamentos, já que não queria arruinar o excepcional bom humor de Alan. —Onde estão todos esses homens que estiveram pululando a seu redor durante toda a noite? —perguntou seu irmão revelando um exagerado espírito protetor no brilho de seus olhos. —Se havia algum, estou segura de que o terá espantado só por vir aqui - disse Anna erguendo os olhos ao teto. —E assim é como deve ser — repôs Alan com um sorriso de satisfação. Anna pigarreou com afetação. —Thomas MacNab foi procurar para mim uma taça de vinho. Estou segura de que voltará quando você tenha ido. Alan cruzou seus robustos braços sobre o peito e franziu o cenho.
—Esse neném… —disse conseguindo conterse — Qualquer homem que não tenha o valor de enfrentar a um inofensivo irmão… Anna soprou. —Três bestas imponentes, quer dizer. Vi como o fulminavam com o olhar. —…
não
te
merece
—
continuou,
repreendendo-a com o olhar e fazendo como se não o tivesse interrompido — O que você quer é um homem que tombe dragões e que ande de joelhos sobre as brasas do inferno para te proteger. Anna o rodeou com seus braços e o estreitou fortemente.
Alan,
sabendo
que
um
impressionante cavalheiro como sir Hugh Ross lhe
tinha
proposto
matrimônio,
não
podia
compreender que preferisse a um homem tranqüilo e estudioso como Thomas McNab,
alguém que não saberia o que fazer com uma espada, inclusive no caso de que pudesse levar uma. —Acreditava que para isso já tinha ao pai, Alastair, Ewen e você. Alan lhe devolveu o abraço. —Sim, Annie querida, isso já tens— disse sustentando-a pelas costas para olhá-la bem — É que não te interessa nenhum outro à exceção do tutor? Sem pensar, seu olhar foi para o fundo da sala e se fixou um instante em sir Arthur Campbell. Foi suficiente. Seu observador irmão observou isso. —A quem olhava? —A ninguém — se apressou a dizer. Apressou-se muito. Os olhos do irmão se entreabriram ao tempo que jogava uma olhada
na direção a que ela olhava. —Campbell? Maldita fosse por ter a pele tão clara! Sentia perfeitamente como o rubor subia por suas bochechas. Seu irmão parecia surpreso. —Sir Dugald? É um bom guerreiro. Embora talvez
muito
popular
entre
as
moças
—
acrescentou franzindo o cenho. Não pensava corrigi-lo. Não era nada. Sentia certa atração por sir Arthur, isso era tudo. Sua indiferença não tinha servido mais que para cravar um espinho em sua vaidade feminina. —Fique de olho, querida. Se tentar algo contigo… Anna o empurrou para que se fosse. —Já sei a quem tenho que chamar. Por que não vai por ali e vais dançar com Morag? Leva toda a noite te olhando.
Esperava que ele se negasse de forma terminante, assim que lhe surpreendeu ver um brilho especulativo em seus olhos. —Ah, sim? Alan fixou seu olhar na bela e jovem viúva. Não disse nada mais, mas essa momentânea amostra de interesse deu esperanças a Anna para pensar que a existência quase vegetal de seu irmão acabaria por fim. Era um presidiário pelo luto por sua esposa, e embora essa tristeza fosse o testemunho de seu amor por ela, ele ainda seguia vivo. Procurou Thomas entre a multidão e seguiu fazendo-o durante ao menos trinta segundos antes de voltar a dirigir o olhar para o canto. Olhou
bem
a
tempo
para
ver
como
se
aproximavam da mesa dos Campbell três jovens mulheres do clã, curiosamente três mulheres
bonitas, exuberantes e conhecidas como as mais sedutoras do castelo. Anna amassou o suave veludo de suas saias com a ponta dos dedos. Sentiu uma espécie de pontada remotamente parecida com a irritação. Remotamente parecida com a maior das irritações. Saber que se tratava de algo irracional não ajudava em nada. Era normal que as garotas se interessassem por eles. Por que não fariam? Os recém chegados eram cavalheiros, bonitos e, isso Anna sabia, não eram casados.
Uma
combinação
irresistível
para
qualquer jovem sem marido. E tampouco lhe surpreendeu que fossem bem recebidas e as animassem a ficar com eles. Mas quando
uma
das
mulheres,
Christiana,
a
encantadora filha do valete de seu pai, de olhos azuis e cabelo negro azeviche, sentou-se junto a Arthur, todas suas costas ficou em tensão. O
lugar parecia estar mais quente se pudesse. As bochechas lhe ruborizaram e o coração deu um brusco tombo. Dizia a si mesma que aquilo não era de sua incumbência, mas não podia deixar de olhá-lo. Não teria que ter se preocupado. Depois de várias
tentativas
de
sedução
inadvertidas,
incluindo sorrisos coquetes e uma nada sutil inclinação sobre a mesa para que ele pudesse ver com claridade seu amplo decote, Christiana se deu por vencida e dirigiu seus cuidados a outro de seus companheiros. Embora aquilo aliviasse a Anna mais do que se atrevia a admitir, tinha
havido
algo
nessa
interação
que
a
escamava. Era possível que tivesse chegado a uma conclusão errônea? Talvez não tivesse nada a ver com ela. Possivelmente sir Arthur não tinha intenção
de
ser
descortês,
mas
sim
simplesmente era brusco, como acontecia com seu pai. Ou talvez tímido com as mulheres, como seu irmão Ewen? Por mais que queria convencer-se de que essa era a questão, para assim esquecer-se dele, não podia fazê-lo. Ele antes não tinha sido acanhado. Melhor, parecia zangado, inclusive um pouco
furioso.
Como
se
ela
o
estivesse
incomodando. Como um mosquito no verão ou um cachorrinho que te pisa nos calcanhares. Certo, fosse ela quem se chocara contra ele, mas se tratava de um acidente. E estava claro que sua força era suficiente para agüentar o pequeno tranco de uma mulher. Pelo amor de Deus, se parecia capaz de agüentar o embate de uma marreta! Talvez a princípio Anna não fosse consciente de seu tamanho, mas agora sim. Apesar de sua postura relaxada e embora sua
túnica de lã fosse folgada e avultada, esse homem tinha a compleição de uma rocha. Tudo nele eram músculos duros como o aço. Vá, mas se apenas se moveu um centímetro quando arremeteu contra ele. E quando a sustentou em seus braços sentiu tal sensação de segurança e confiança que… Como se nada pudesse lhe fazer dano se esse homem grande e poderoso a tinha junto de si. Até que a soltou, claro. Arthur se afastou um pouco da mesa e se inclinou para dizer algo a seu irmão sir Dugald. Quando viu que caminhava para a porta, o coração de Anna deu um estranho salto. Ia embora.
Ir-se!
Mas
se
ainda
não
tinha
escurecido. A festa duraria horas e horas. Não podia partir. Nem sequer tinha dançado ainda. Anna olhou para sua esquerda, viu Thomas, que mergulhou entre a multidão, e depois voltou a
olhar para o jovem cavalheiro. Antes de se dar conta do que fazia já se dirigia para a porta com determinação. Não ia correndo, mas tampouco caminhando exatamente. Estava só uns passos da entrada onde tropeçara com ele, quando ela chegou. Não parecia contente em vê-la. A expressão hostil de seu rosto fez que a jovem pensasse um momento, mas já não havia volta. Sempre gostara de ser direta com outros, embora normalmente isso não incluísse correr atrás de homens aos que não conhecia, pensou com um rubor de vergonha tardio. Não corria trás dele… exatamente. Era sua obrigação comprovar que todos os convidados passassem bem. Não era certo? E o que é pior, não podia tirar da cabeça o fato de que talvez o tivesse interpretado mal. Anna sorriu, ignorando a expressão de seu
rosto. —Espero não ser eu a causa de que se vá tão cedo. —Se a sobrancelha que acabava de arquear representava algo, poderia dizer que o tinha surpreendido. Anna sorriu provocativamente e se explicou— Temia que tivessem que se ocupar dos hematomas provocados por minha estupidez anterior. Arthur fez uma breve careta com a boca. —Acredito que poderei me recuperar — disse secamente. Senhor, era um demônio ainda mais formoso quando sorria. Sentiu essa mesma estranha revoada no estômago e a aceleração do pulso, só que o tendo tão perto era ainda pior. Toda a vida estivera rodeada de homens altos e musculosos,
mas
jamais
tinha
sido
tão
consciente da virilidade de um homem e de sua
própria feminilidade. Desconcertava-a. Punha-a nervosa.
Deslocava-a.
Fazia
que
sentisse
impulsos desconhecidos para ela. Tinha vontade de aproximar-se mais, de pôr a mão no peito e notar a força que se movia debaixo dele, de olhar seu rosto e memorizar cada um de seus duros traços, cada ruga, cada cicatriz. Era algo tão vergonhoso que parecia ridículo. Já tinha sentido atração por um homem antes, mas aquilo não se parecia absolutamente a nenhuma experiência anterior. Nada a ver com a estima que tinha a Roger, seu ex noivo. Era algo mais profundo. Mais
intenso.
Agarrava-a
por
dentro
e
a
empurrava, atraindo-a para ele. Ela esperava que dissesse algo. Estava claro que não ia facilitar as coisas. —Então espero que não seja pela comida ou o espetáculo.
Negou com a cabeça. —É um banquete estupendo, milady. Desviou o olhar para a porta, dando a entender de maneira pouco sutil que desejava partir. Anna avançou até lhe gradear firmemente o passo. —Não gostas de dançar, sir? Ao ver que arqueava uma sobrancelha Anna se ruborizou, compreendendo quão direta soava a pergunta. Parecia como se quisesse que a convidasse pra dançar. O qual era certo, mas não era próprio de uma dama solicitá-lo tão descaradamente. Embora talvez isso fosse o que ele necessitava. Odiava pensar em alguém que permanecia alheio à diversão. —Às vezes. Ficou duvidando, e por um momento Anna pensou que pediria. Mas seguidamente seu olhar
se pousou em um ponto atrás dela e ficou em tensão. Não teria advertido o brilho de frieza que adotavam seus olhos se não o estivesse observado com atenção. Voltou o olhar para ela, deixando-a passear por seu corpo de cima abaixo. Anna ficou sem fôlego. Jamais ninguém a tinha
apreciado
de
uma
maneira
tão
desavergonhada. Teria sido algo excitante, a não ser porque também estava isento de toda paixão. Era como se ela fosse um cavalo no mercado. E um dos não mais imponentes. —Mas hoje não. O sentido do dito não podia ser mais claro. Não queria dançar com ela. Não era que tivesse interpretado mal nem entendido mal. Não se tratava de que tivesse maneiras de guerreiro rude. A pontada que sentia por esse rechaço era surpreendentemente aguda por tratar-se de
alguém
a
quem
acabava
de
conhecer;
surpreendentemente aguda por tratar-se de um homem que não teria que ter a interessado absolutamente. Aquilo não deveria ser tão horrivelmente difícil. Mas ao estar ali, contemplando como as emoções sulcavam o rosto da moça, tão expressivas como um livro aberto, Arthur sentiu como se o retorcessem em um torniquete ou o abrissem em dois no cavalete de tortura. Não gostava de lhe fazer dano, a nenhuma mulher, corrigiu-se. Mas quando observou de que Lorn os observava, soube que tinha que pôr fim a aquilo. Fosse o que fosse. Não podia acreditar que tivesse chegado a pensar em dançar com a moça. Aquela amabilidade sincera e sua inocente expressão de gatinha causavam seu efeito. Mas o interesse de seu pai o havia devolvido à
realidade de repente. Tinha a esperança de que seu grosseiro olhar servisse de cura contra qualquer ilusão romântica. Tinha feito. Os olhos da moça se abriram e adotaram uma aparência de aflição que o fez sentir como um desastrado que acabara de pisar em sua branca e aveludada cauda (de gatinha). —É obvio — disse Anna em voz baixa e com as bochechas rosadas pela vergonha — Sinto o ter incomodado. Baixou o olhar e deu um passo para trás. Arthur voltou a sentir aquilo… A estranha compulsão que sentiu na noite da igreja. A incapacidade de deixá-la partir. Passou os dedos pelos
cabelos,
tentando
lutar
contra
a
necessidade de acalmar a repentina inquietação que bulia em seu interior. Não pôde conseguir. «Ah, que diabos!», pensou ao tempo que
esticava o braço. —Esperes — disse agarrando-a para que não partisse. Ao sentir o contato ela ficou em tensão, com as bochechas ainda avermelhadas, sem poder olhá-lo. Arthur a soltou. Quando viu que não dizia nada, Anna acabou elevando o queixo e voltando o rosto ligeiramente para ele. Teria desejado que a suave luz das velas ocultasse o tremor de seu queixo. —Sim? —perguntou. Mudaram um olhar e Arthur se amaldiçoou a si mesmo por ser tão estúpido. Que demônios pensava dizer? «Sinto-me adulado, mas jamais funcionaria. Estou aqui para destruir seu pai». Ou talvez: «Tenho medo de dançar contigo porque temo que descubram que sou o espião de Bruce que lhe salvou na igreja».
Ela o olhava com espera. —Tenho que trabalhar — deixou escapar, sentindo-se como um imbecil. Normalmente não lhe escapava nada. E por que demônios dava explicações? Sentia como o observava com seu agudo olhar e tinha a perturbadora suspeita de que era capaz de ver muito mais do que ele desejava. —E nada mais — completou ela. —Fica pouco tempo para o resto — disse encolhendo os ombros. —Não permite aos cavalheiros nem um só dia de entretenimento e diversão? —perguntou Anna com o gesto torcido por um sorriso irônico. Embora a reação dela fosse alegre, a de Arthur não foi. —Não. Ao menos a mim. Não, tendo uma guerra no horizonte.
Ao ver o brilho alarmado que sulcou seus muito
expressivos
olhos
azuis
quase
se
arrependeu de ser tão honesto. Estava claro que a crua realidade da situação de seu pai não era algo no que ela queria pensar. Era possível que fosse tão ingênua ou que vivesse em seu mundo de
fantasia?
celebrações
O e
seu
era
um
banquetes,
mundo
de
instalado
comodamente no seio de sua família, enquanto que além das portas do castelo reinava o caos da guerra? Suas palavras cumpriram com o encargo que se propusera inicialmente. Quando Anna voltou a olhá-lo já não havia nela o mínimo sinal de interesse feminino. Olhava-o como se fosse qualquer outro de quão guerreiros tinha ido a servir a seu pai. Não notou quão diferente era seu olhar até que este desapareceu de seu rosto.
—Sua devoção pelo dever é digna de elogio. Estou segura de que meu pai é muito afortunado ao te ter a seu serviço. Arthur ficou com vontade de rir. Se ela soubesse… Segurança seria quão único não traria para John de Lorn. Não era um cavalheiro. Simplesmente
atuava
como
tal.
Era
um
highlander. O único código pelo que vivia era a vitória. Matar ou morrer. De repente, uma versão maior e mais cheia de sua irmã lady Mary apareceu a seu lado. —Assim aqui está, querida. Procurei-te por toda parte. —O que acontece, mãe? O tom de preocupação na voz de Anna lhe incomodou. Não havia motivos para que se inquietasse. —Os homens estão falando outra vez desse
horrível Robert Bruce. —A ainda formosa mulher retorcia as mãos nervosamente — Seu pai está ficando furioso —continuou com uma voz em que refletia seu medo — Tem que fazer algo. Anna murmurou entre dentes algo que soou parecido a «Pelos ossos de Santo Columba» e Arthur se deu conta de que tinha ouvido bem ao ver que sua mãe franzia o cenho. —Não se preocupe —disse Anna lhe dando um golpezinho na mão de sua mãe — Já me encarrego. Deu a sensação de que Anna se encarregava de cuidar de muitos assuntos. A mãe dirigiu um olhar a Arthur, parecendo se dar conta de que os tinha interrompido, e lhe ofereceu um sorriso a modo de desculpa. —Sinto muito, senhor. Terão que esperar a próxima dança.
Não houve já sinal de rubor algum nas bochechas de Anna quando o olhou de soslaio. —Não há dança —disse com firmeza — Sir Arthur já estava de saída. Embora não havia nada descortês em sua voz, Arthur observou de que acabava de lhe dar permissão para ir. Anna seguiu a sua mãe através da multidão sem voltar a olhá-lo. Observou-a por mais tempo de que era devido, dizendo a si mesmo que teria que estar contente. Isso era o que ele queria. Assim tudo seria melhor. Mas não estava contente absolutamente. Teria dito se não soubesse o que lhe convinha, que o que sentia era arrependimento. Horas depois, Anna batia na porta da câmara de seu pai. Este lhe pediu que entrasse, e ao ver que se tratava dela, despediu-se de sua guarda
luchd-taighe8. Anna esperou a que os homens do clã partissem para entrar. —Querias me ver, pai? John MacDougall, lorde de Lorn, estava sentado a uma grande mesa de madeira e fez gestos para que ocupasse a cadeira que tinha de frente a si. Aquilo foi algo que Anna fez de boa vontade depois do cansaço da festa. Devia ser já perto da meia-noite. O servente pessoal de seu pai a tinha alcançado justo antes que se retirasse a seus aposentos, e apesar de que lhe custava manter os olhos abertos e de que lhe doíam todos os ossos do corpo, não lhe passou pela cabeça negar-se. Uma chamada de seu pai não podia ignorar-se. De modo que vestiu sobre a camisola uma capa forrada de veludo e se O luchd-taighe eram guardas da comitiva pessoal do chefe, ou em termos coloquiais, a sua posse. Sua finalidade era atender o chefe em todos os momentos. Eles eram bem treinados em armas e ações marítimas, bem como perseguições a outros guerreiros. Era uma grande honra ser escolhido como um dos guardas pessoais do chefe e o prestígio de um chefe era derivada a partir do número destes homens luchd-taighe. 8
apressou a apresentar-se em sua câmara, perguntando-se por que queria vê-la à aquelas horas. Era possível que queria adulá-la, como Alan, por seus esforços para que a comemoração saísse bem. —Há algo que eu gostaria que fizesse por mim — disse John de Lorn olhando-a com atenção. Tentou não parecer decepcionada. Seu pai tinha muitas coisas na cabeça, muitas pessoas pelas
quais
preocupar-se
para
pensar
no
banquete. Já sabia que a apreciava; não necessitava que o dissesse. Teria que ter dado conta de que se a chamava a essas horas da noite seria por algo importante. —É obvio —disse sem duvidar um instante — Querem que visite de novo a seu primo, o bispo de Argyll?
Seu pai negou com a cabeça ao tempo que um sorriso malicioso aparecia em seu rosto. —Não, desta vez é outra coisa. —Fez uma pausa e lhe dirigiu um olhar de cumplicidade — Me dei conta antes que falava com um dos novos cavalheiros. Anna mordeu o lábio com incerteza. —Falei com muitos deles. Fiz algo que não devia? Pensei que gostarias que desse boasvindas aos recém chegados. Seu pai dissipou todos seus temores. —Não fez nada mal. Justo antes que sua mãe te mandasse para me distrair com todas essas perguntas… —Franziu o cenho de maneira severa, mas ela simplesmente sorriu, sem incomodar-se por negar. Eram perguntas tolas, mas não pôde pensar em nada além de comida, assim estava curiosa — Vi que falava com um
dos Campbell. Apagou o sorriso. Assim que se tratava desse novo cavalheiro. —Sir Arthur — informou, tentando que não quebrasse sua voz. Mas de repente se sentiu incômoda ao suspeitar o que seu pai quereria que fizesse. Pode ser que não fosse capaz de brandir uma espada ou unir-se a seus irmãos no campo de batalha, mas Anna fazia o que podia por ajudar a pôr fim à guerra por outros meios, incluindo, em alguma ocasião, vigiar aos cavalheiros ou barões os quais ele não confiava. Não se tratava exatamente de espiar. —Que opinião tem dele? Não lhe surpreendeu a pergunta. Seu pai perguntava habitualmente por suas impressões a respeito dos visitantes ou dos novos soldados. A
maioria dos líderes não se dignariam a perguntar a opinião de uma mulher, mas seu pai não era um homem comum. Acreditava no uso de qualquer ferramenta que estivesse ao seu dispor. Pensava que as mulheres eram mais perceptivas que os homens, de modo que se aproveitava dessa qualidade. Anna encolheu os ombros levemente. —Só mudamos algumas palavras. Parecia… —«Brusco.
Frio.
Distante»,
pensou.
Mas
acrescentou—Estar dedicado a suas obrigações. Seu pai assentiu, como se estivesse de acordo nisso. —Sim, é um cavalheiro capaz. Talvez não tão louvável como seu irmão, mas ainda assim um guerreiro consumado. Não houve nada que te chamasse a atenção? Era consciente do escrutínio de seu pai e
lutava por controlar a maré de calor que ameaçava subir a suas bochechas. Tinha lhe chamado a atenção que o cavalheiro era bonito e que seu corpo parecia feito de rochas, mas não pensava mencionar isso. Voltou a pensar na festa. —Parecia preferir manter-se à margem de todos. Os olhos lhe brilharam como se houvesse dito algo que lhe parecia interessante. —A que te refere? —Dava-me conta de que no banquete não parecia falar muito, nem sequer com seus irmãos. Não acredito nem que tenha escudeiro. Mal
bebeu,
não
estava
interessado
em
intimidades com nenhuma das moças nem em dançar, e partiu assim que pôde. Seu pai franziu o cenho.
—Ao que parece fixaste-te muito nele. Nessa ocasião Anna não pôde evitar que o rubor dominasse seu rosto. —É possível —admitiu — Mas não importa. —Mas como, por quê? —Não acredito que goste muito de mim. Seu pai não pôde ocultar que aquilo lhe divertia, o qual, dadas as circunstâncias, lhe pareceu um pouco insensível. —De fato essa é a razão pela que tenhas te chamado. —Porque não gosta de mim? —Não, porque penso que melhor se trata do contrário e me pergunto por que se esforça tanto em esconder. Anna pensou seriamente que seu pai se confundia
em
sua
análise,
mas
não
se
incomodou em discutir. Como à maioria dos pais,
parecia-lhe inconcebível que alguém rechaçasse a uma de suas amadas filhas. —Talvez seja por essas velhas rixas — sugeriu — Seu pai morreu em uma batalha com nosso clã, não é certo? Uma estranha careta sulcou o rosto do John MacDougall antes que fizesse um gesto com a mão para desprezar a idéia. —Sim, faz muitos anos. Em parte poderia ser por isso, mas não acredito de tudo. Há algo nesse moço que me inquieta. Não poderia dizer o que é, mas eu gostaria que o vigiasse. Só por um tempo. Provavelmente seja uma tolice, mas agora que está terminando a trégua não quero me arriscar. Não obstante, tampouco posso me expor a uma ofensa. Os Campbell são guerreiros formidáveis e necessito tantos homens como posso conseguir.
O mundo lhe veio em cima. Seus piores temores
fossem
confirmados.
Depois
da
conversa que tinham mantido horas atrás, quão último Anna queria era ter que vigiar a sir Arthur Campbell. —Pai, deixou-me claro que… —Não deixou claro nada — a interrompeu seu pai — Estás errada em relação aos sentimentos do Campbell para ti. —E logo acrescentou com uma voz mais benévola—: Não te estou pedindo que o seduza, só que o observe. Acreditava que queria ajudar, que podia contar contigo. —E podes — se apressou a dizer, castigada. John de Lorn entreabriu os olhos. —É que ocorreu algo que não está me contando? Ele te tocou? Foi abusado? —Não —insistiu — Lhe contei tudo. É obvio
que farei o que me pedes. Simplesmente sugeria que talvez não seja tão fácil. Qualquer dano que tivesse, empalidecia em comparação com sua promessa de fazer o quanto pudesse para ver o fim da guerra e uma vitória dos MacDougall. Embora isso significasse perseguir um homem que não queria que o perseguissem. Embora significasse que seu orgulho recebesse um severo golpe. Seu pai sorriu. —Eu acredito que será muito mais simples do que imagina. Anna esperava que estivesse no certo, mas lhe dava a impressão de que tudo que concernia a Arthur Campbell não havia nada simples.
Capítulo 5 Arthur quase tinha conseguido. As portas estavam a menos de quinze metros. Um minuto mais e teria saído em busca de mais informação para Bruce. —Sir Arthur! Aquela voz feminina, doce e suave, fez que todos seus músculos ficassem tensos. «Outra vez não.» Calculou a distância até as portas e se perguntou
se
conseguiria
chegar
até
elas
correndo. Já podia ouvir os homens rindo baixo a seu redor quando aparecia a seu lado aquele rosto dolorosamente familiar, e o de doloroso dizia a sério, porque até os dentes lhe doíam. Ela estava sorrindo. Sempre estava sorrindo. Por que demônios tinha que sorrir tanto? E por que esse sorriso tinha que lhe iluminar o rosto
168
por completo, da suave curva de seus rosados lábios até o brilho que titilava em seus olhos azul intenso? Se fosse dado a desvairar como um bardo apaixonado a respeito de alusões poéticas à cor, teria dito que eram como safiras escuras. Mas tinha coisas muito mais importantes que fazer, de modo que eram simplesmente azul intenso. «Safiras…» Teve que olhá-la duas vezes. Deveria manter o olhar fixo em seu rosto, mas cometeu o engano de baixar os olhos e teve que suportar a dor. O insistente impulso que sentia entre as pernas lhe dava violentas sacudidas. Um estado ao que desgraçadamente começava a acostumar-se. Com somente lhe olhar o vestido ficava com vontade de ajoelhar-se e suplicar piedade ao Senhor. É que tentava acabar com ele?
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Provavelmente sim. Cada vez lhe parecia mais difícil ignorar sua sedução e as insinuações cujo descaramento ia aumentando. Primeiro o buscava aqui fosse durante das refeições; logo insistiu em ajudar ao curandeiro quando recebeu um golpe no braço dias antes - se detraíra, maldita seja, ao vê-la pulular pelo jardim, rindo junto a suas irmãs— se apresentava no estábulo à mesma hora em que ele tinha previsto cavalgar pela manhã, e agora aquilo. Seu flamejante corpete amarelo lhe moldava o corpo por todos os lugares em que não deveria. Arthur se perguntava como era possível respirar. Ajustavase tanto a seus seios e a sua fina cintura que parecia vir molhada do lago. Mas o pior de tudo era o baixo que ficava o decote sobre seu busto, sobre seu amplo, prodigiosamente amplo busto que lhe deixava a boca cheia de água.
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Pelos pregos de Cristo, não podia afastar o olhar dessa pele suave e pálida que enchia, não, que se derramava sobre seu corpete. Maduros e exuberantes fossem as duas palavras que lhe vieram à mente. Mas isso nem sequer começava a descrever a perfeição de seus magníficos seios. Teria dado com gosto seu braço esquerdo por vê-los nus. E estava passando mal tentando não pensar no aspecto que teriam. Que gosto tinham, como se balançariam quando… «Por todos os diabos.» Afastou o olhar bruscamente. Sob a armadura seu corpo estava em chamas. De desejo, certo. Mas também por um irracional estalo de cólera. Se essa mulher fosse sua a encerraria em seu quarto durante uma semana inteira por mostrar tal vestido em público. Depois de ter o arrancado a dentadas e depois queimá-lo. Não podia recordar a última
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vez que uma mulher tinha conseguido lhe pôr tão… desconcertado. Anna,
inconsciente
dos
violentos
pensamentos que sacudiam Arthur, ergueu o olhar para olhá-lo com entusiasmo. —Que sorte que tenha te pego a tempo — disse entre ofegos para tentar recuperar o fôlego. Esses ofegos lhe faziam pensar em dar uma queda no feno com ela. Deus, tudo em o fazia pensar nisso… O mais provável é que tivesse saído correndo da torre ao lhe ver sair do estábulo. Não era a primeira vez que o fazia. Errou lhe dando atenção na festa da outra noite. Um equívoco fatídico. Após isso ela não tinha feito mais que redobrar seus esforços. Arthur tinha passado a semana vivendo no limite, sem saber nunca quando apareceria. Parecia que, fosse onde fosse, ali estava ela. Seus irmãos e o
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resto dos homens pensavam que aquilo era para morrer de rir. Ele… nem tanto. Não era tão imune a seus encantos como gostaria. Parecia difícil que não gostasse da moça. Era tão… natural. Como a primeira flor da primavera. Amaldiçoou seus miolos. Que demônios acontecia? Começava a soar como um maldito bardo. —Há algo que eu gostaria de falar contigo, se tiveres um momento. Tentou sorrir, mas lhe chiavam os dentes, de modo que teve a sensação de que saiu uma careta. —Sairei a cavalgar todo o dia. Terá que esperar. Em Anna lhe apagou o sorriso. Arthur respirou fundo e disse a si mesmo que não
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voltaria a deixar-se apanhar por essa sensação. Mas o fez. Sentiu-se como um imbecil. Assim tinha se sentido durante toda semana. Ao que parecia nunca seria fácil essa sensação de pisotear a cauda aveludada de gatinho. —É obvio. Sinto muito - disse Anna piscando com tal inocência que Arthur sentiu como se as garras desse gatinho lhe cravassem no peito — Não queria lhes importunar, só faço porque é importante. —Vamos, Arthur —disse seu irmão incapaz de conter o sorriso — A dama diz que te necessita. Cavalgará conosco outro dia. Provavelmente o que deveria fazer era matar a seu irmão. Dugald o fazia de propósito. Encurralava-o em um canto e fazia impossível a escapada, simplesmente pelo prazer de o ver sofrer. A atitude de seu irmão para as filhas de
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Lorn era mais condescendente do num banquete. Mas ele sabia que Dugald, o muito filho de cadela, também criava de tal modo pelo desfrute que obtinha vendo como Arthur se retorcia por dentro, já que supunha quão incômodo devia sentir-se ao atrair a atenção da moça, algo que nessa altura parecia óbvio. Aquela se estava convertendo na semana mais longa de sua vida. Era preferível passar outra vez pelas duas semanas de adestramento guerreiro de MacLeod, algo não em vão chamado «Inferno», que agüentar outro dia mais desse sofrimento. Os olhos de Anna recuperaram o brilho e um sorriso voltou a aparecer sobre seu rosto. —Estais seguro de que não incomodo nada? —Não lhe deu a oportunidade de mostrar-se em desacordo - Seria fantástico. Aonde iam?
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—Não é nada importante — mentiu Arthur, tentando
conter
a
raiva.
Era
a
primeira
oportunidade que tinha de fiscalizar o terreno da borda norte do lago Etive. Agora teria que encontrar outra desculpa. Não era a primeira vez que a moça se interpunha em sua missão durante da última semana. Tinha conseguido seguir a vários sacerdotes e manter uma estreita vigilância sobre a capela do castelo e o priorado próximo, mas a maior parte do tempo a tinha passado tentando esquivar-se de Anna. Aquilo tinha que acabar. —Que te divirta, irmãozinho —disse Dugald sem preocupar em ocultar o tom jocoso de sua voz — Nos vemos na volta. Arthur contemplou sua partida. Normalmente não
sentia
prazer
em
procurar
formas
mesquinhas de vingança fraterna, mas começava
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a reconsiderar algumas. Desmontou do cavalo e se dispôs a conduzir aos estábulos o rápido e ágil hobelar9 irlandês, um cavalo que tinha dado nome aos cavaleiros hobelar, de armadura leve. Anna o acompanhou gostosamente com um caminhar alegre. Arthur cuidava de manter a distância entre ambos. A moça era dada a lhe tocar o braço enquanto falava, e cada vez que o fazia, ele parecia sair-se de sua própria pele. Era um mecanismo de defesa, mas não se envergonhava disso. A essa altura estava em jogo sua própria sobrevivência. Tinham-no adestrado para fazer parte dos melhores guerreiros de elite de Escócia. Uma máquina secreta e mortal que faria todo o necessário para proteger sua identidade. Podia misturar-se entre as linhas inimigas, mover-se Hobelars eram um tipo de cavalaria ligeira, ou montado de infantaria, durdiante da Idade Média , usado para escaramuças. Eles se originaram no século 13 na Irlanda e, geralmente, montavam os cavalos hobelar, um tipo de cavalo leve e ágil. 9
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sigilosamente pelo campo do adversário, acabar com uma dezena de soldados com uma só mão e matar a um homem sem fazer um só ruído. Mas havia uma coisa que ninguém tinha ensinado a fazer: escapulir de uma moça muito entusiasta. Não entendia. A maioria das mulheres não confiavam nele. Pressentiam algo que não gostavam de tudo. Sentiam o perigo. Mas ela não. Olhava-o como se fosse uma pessoa «normal». Algo que parecia muito perturbador. Mantinha o olhar à frente para não ver como o sol realçava as mechas douradas de seus longos e sedosos cabelos. Ou reparar na suavidade de sua pele. Ou perceber seu incrível aroma. Certamente a muito pícara se banhava com pétalas de rosa. Maldição. Melhor seria que não
imaginasse
banhando-se.
Porque
se
pensasse em como se banhava teria que pensar
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obrigatoriamente em seu corpo nu e o seguinte seriam seus seios. Mas não acabaria aí a coisa. Seu olhar recaiu sobre seu busto, ali onde tinha descansado muitas vezes durante da passada semana.
Sobre essas suaves e cremosas
turgidez a ponto de estalar e sair do corpete. Pensaria em agarrar esses espetaculares seios com suas mãos, levar até a boca e lambê-los. «Por todos os diabos.» Arthur notou que o calor invadia sua virilha e afastou o olhar de repente. —Espero que não vos importe muito não poder cavalgar — se atreveu a dizer Anna, sem dar muita importância. Arthur encolheu os ombros e murmurou algo incompreensível. Ela não pareceu advertir sua falta de entusiasmo. Não saberia precisar se ignorava de propósito seu óbvio desinteresse ou simplesmente era tão feliz e tinha tão bom
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caráter que não notava isso. Arthur
entregou
o
cavalo
a
uma
dos
cavalariços e se voltou para olhá-la. —O que é que querias me falar? Anna enrugou o sobrecenho. —Vocês não gostariam de entrar? Posso fazer que um dos serventes nos traga algo frio para beber. —Aqui
está
bem
—
disse
Arthur
bruscamente. «Mecanismos defensivos», recordou a si mesmo. A essa hora do dia o salão estaria tranqüilo. Um jardim repleto de gente indo de um lugar a outro era um lugar mais seguro. Graças a Deus, MacGregor e MacSorley não estavam ali para vê-lo. De ser assim, teria história para momento. Ao que parecia, sim que tinha uma veia de covardia em seu interior. Teria que contar
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a seu irmão Neil na próxima vez que o visse. Anna franziu os lábios em uma tentativa de recriminação, mas ficou em um exercício pobre que só conseguiu lhe enrugar o nariz. E de uma maneira adorável, maldita seja. —Muito bem —disse sem mostrar muito entusiasmo — Seu irmão mencionou que és bom com a lança. Dugald não sabia nem da missa um terço. Arthur era cauteloso na hora de mostrar suas habilidades, já que não queria que o usassem contra seus amigos. Quando estava com seus inimigos era bom, mas nem tanto para chamar muito a atenção. Quanto a suas qualidades para reconhecer o terreno, tinha-as mostrado muito menos. Dugald ainda gostava de lhe recordar essas artes insuspeitas que fazia quando era um guri. Neil era o único que sabia que não só não
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tinham
desaparecido,
mas
sim
eram
mais
apuradas. —E o que tem que ver minha habilidade com a lança em tudo isto? —disse com uma voz em que se entrevia sua impaciência. —pensei que pudesse me ajudar a organizar as provas de habilidades para as justas de amanhã. Arthur franziu o cenho. —Que justas? —Como este ano não pudemos fazer os Torneios das Highlands, pareceu-me que seria divertido pôr aos homens uma série de provas e desafios. Podem competir uns contra outros em lugar de contra outros clãs. A meu pai parece que é uma idéia estupenda. Arthur ficou olhando-a, atônito. —Isso é o que era tão importante? —Era por
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isso pelo que o privava de montar a cavalo? disse. Por alguns torneios? Diversão? Lutou por controlar seu temperamento, mas notava como ia as mãos. Maldita seja, ele não tinha mau caráter. E entretanto estava apertando os punhos. Essa garotinha vivia em um mundo de fantasia, sem idéia de quão precária era a situação de seu pai — Sabem por que não organizaram os torneios este ano? Anna entrecerrou os olhos, sem perder um ápice do tom condescendente de sua voz. —É obvio que sei. Pela guerra. —E ainda assim idealizas jogos quando os homens tentam preparar-se para a batalha. Arthur advertiu o brilho de seu olhar. Genial. Esperava que estivesse zangada. Pode ser que não queria pensar na guerra, mas tampouco podia ignorá-la. Talvez se desse conta do ridículo
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que era tudo aquilo. Igual era ridículo que ele se fixasse na longitude de suas pestanas ou no delicado arco que formavam suas sobrancelhas. —trata-se de treinamento. Os jogos são somente uma forma de animá-los. A competição cairá bem, e além disso será divertido. —As táticas de batalha não têm nada de divertido — disse Arthur, zangado. —Talvez não — concedeu ela com voz tímida, dando a impressão de ver-se afetada pelo tom em que lhe falava. Então voltou a fazê-lo. Tocou-o. Aquela suave pressão em seu braço fez que cada um dos nervos de Arthur se expandisse como em uma das explosões de William Gordon, o Templario. Seus olhares se cruzaram e percebeu que o compreendia. Mas não queria essa compreensão nem a necessitava. Não era por ele que devia preocupar-se, mas sim por seu
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pai e outros membros do clã — Mas em ocasiões a guerra não se apóia só em táticas de batalha. O que acontece o ânimo dos homens? É que isso não é importante? —Arthur não disse nada. Não é
que
se
mostrasse
em
desacordo,
mas
tampouco estava totalmente de acordo nisso. Advertiu
que
seus
olhos
escrutinavam
a
expressão de seu rosto — Se não queres me ajudar, encontrarei a outro, sem problemas. Apertou a mandíbula, consciente de que deveria negar-se. Permitir que torturasse a qualquer outro pobre idiota. Mas essa idéia gostava menos ainda. Assim que encontrou a si mesmo perguntando entre dentes: —O que queres que faça? O rosto de Anna se iluminou e a força que desprendia foi para ele como um soco no peito. Esteve a ponto de cambalear-se. Enquanto ouvia
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como
sua
excitada
voz
explicava
o
que
necessitava quefizesse, Arthur compreendeu que teria que ter saído correndo quando teve oportunidade de fazê-lo. O dia dos «Torneios» amanheceu com um sol radiante. Um bom presságio para os próprios jogos, como logo se demonstraria. Anna pensou com certo ar de suficiência que tinha acertado. Independentemente do que ele opinasse, aquilo era bom para os homens. No momento os jogos tinham resultado um êxito clamoroso. Não só para fidalgos e cavalheiros, mas também para os residentes no castelo e as pessoas da vila. Centenas de homens do clã seguiram os progressos dos guerreiros nos desafios de força e destreza, animando a seus favoritos, já perdessem ou ganhassem. Pela manhã os espectadores se reuniram
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junto aos estaleiros que albergavam os navios de seu pai para ver as regatas e os concursos de natação na baía que havia depois do castelo. Depois, como prelúdio a um esplêndido banquete ao meio dia, transladaram-se ao barmkin para assistir ao concurso de espadas e arco e flecha, e nesse momento estavam todos agrupados entre as rochas e as áreas gramadas que cobriam o montículo situado logo depois das portas do castelo para presenciar o evento final: tiro com lança. —Aí está seu cavalheiro — disse Mary zombeteiramente enquanto assinalava ao grupo de guerreiros que faziam fila a seus pés. Anna estremeceu. Se Mary havia percebido era porque todos o tinham feito. A bendita inconsciência de sua irmã estava acostumada ser de tal magnitude que desafiava a regra de seu
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pai segundo a qual as mulheres eram mais perceptivas que os homens. —Não
é
meu
cavalheiro
—
disse
sarcasticamente. E com muita veemência, a julgar pelo sorriso de sua irmã mais velha. —Pois dá toda a impressão de que quer que seja. Mas eu te daria um pequeno conselho de irmã mais velha: talvez tenhas que ser um pouco mais… hum, sutil. Anna percebeu que sua irmã tentava conter a risada. Franziu os lábios. Isso já tinha tentado. E não tinha funcionado. Ergueu o queixo, fazendo como que não fizesse a menor idéia do que se referia sua irmã. —Não faço mais que tentar me comportar como uma boa anfitriã. Ser simpática com todos os cavalheiros que responderam à chamada de
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papai. Aquilo fez que suas duas irmãs estalassem em um ataque de risada histérica. —Nossa! Pois espero que não seja igual de simpática com todos eles —disse Juliana — Você viu o vestido que colocastes ontem? —disse erguendo a cabeça para dirigir-se a Mary e evitando a Anna, que estava sentada entre ambas sobre uma manta xadrez escocesa — Pelo menos era de cinco anos atrás. Nem sequer Marion teria entrado — acrescentou, referindo-se a sua sobrinha de doze anos. —A mãe se zangou muito —assentiu Mary com uns olhos que brilhavam maliciosamente — Tinha que ter visto o rosto que pôs quando Anna apareceu para o almoço. Não a tinha visto tão zangada desde que pai ficou doente. Ao menos aquela humilhação serviu para
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algo. Foi maravilhoso comprovar que sua mãe deixava
de
lado
suas
preocupações
para
repreendê-la, embora fosse somente por um momento.
Deus
sabia
que
nada
de
bom
conseguiu, além disso. Pelo interesse que sir Arthur demonstrara no vestido, poderia ter tido posto um saco de estopa. Sabia
que
deveria
envergonhar-se
por
rebaixar-se à mesquinharia de colocar um vestido indecente para chamar sua atenção. Mas em momentos desesperados, era preciso adotar medidas
desesperadas.
E
depois
de
uma
semana de se fazer de tola e de ir trás de um homem que não queria que ninguém fosse atrás dele, Anna tinha chegado ao limite de suas capacidades. Sir Arthur Campbell seguia sendo virtualmente o mesmo mistério da primeira vez que tropeçou com ele. Sabia que se tratava de
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um cavalheiro capaz, concentrado em suas obrigações e que era introspectivo, mas tudo isso já sabia antes. Era impossível desentranhar o que pensava esse homem. Acreditava inclusive que era impossível estar no mesmo aposento que ele. Inventar razões para permanecer a seu lado não fosse nada fácil, e a Anna estava cada vez mais frustrante seus esforços para tê-lo vigiado. Nenhum outro homem tinha dado tantos problemas. Certamente porque nenhum deles tentava evitá-la tanto. Até então, a menos que responder com monossílabos e ser pouco comunicativo fossem razões para suspeita, não tinha descoberto nada digno de desconfiança. Provavelmente era o homem mais difícil com quem tinha tentado conversar. Sir Arthur era o professor das respostas curtas, por não falar de que se
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mostrava tão suscetível e irritável como um urso que acabara de sair da hibernação. Não é que não desse crédito ao que dizia seu pai, mas se essas eram as indicações de seu interesse por ela, não queria nem imaginar como seria quando alguém não lhe interessasse. No dia anterior, entretanto, Anna fez um importante
descobrimento.
Tinha
averiguado
como o fazer falar: zangando-o. Talvez tivesse falhado em seu enfoque da questão a princípio. Entreabriu os olhos para olhar ao enigmático cavalheiro, que nesse momento se transladava junto ao resto dos participantes para o outro lado do campo. Apesar de que não fazia nada suspeito, Anna não podia tirar da cabeça a idéia de que ocultava algo. Não obstante, não descobrira se isso devia a seu orgulho ferido ou aos poderes de sua intuição feminina. O que
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estava claro é que havia algo diferente nele. —Tenho que admitir que estou surpresa por sua simpatia com o cavalheiro —disse Juliana tentando conter a risada depois do longo momento de gargalhadas que acabava de compartilhar com Mary — É visível o quão bonito é, mas normalmente evita aos homens desse tipo. Aos guerreiros, queria dizer sua irmã. Tinha razão. —Seu irmão é muito mais bonito — interpôs Mary com o olhar cravado na impressionante figura de sir Dugald. Anna não estava de acordo, mas não pensava
em dar mais munição
para que
zombassem dela. —E sir Arthur não tem tanta fama entre as mulheres, nem de longe — assinalou Juliana a
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modo de advertência para Mary. Falava por experiência. Fazia anos que ficara viúva, mas seu matrimônio nunca fosse feliz. Seu marido, sir Godfrey de Clare, um barão inglês, culpava-a por sua mútua incapacidade para gerar a um herdeiro e, segundo sua irmã, levantava cada
saia
que
encontrava
para
tentar
demonstrar. Anna desejava que o próximo marido de sua irmã fosse alguém a quem esta pudesse amar. Embora em geral o amor não tivesse nada a ver com
a
maneira
como
se
começavam
os
matrimônios, elas eram mais afortunadas a este respeito que a maioria. Três filhas em idade de desposar eram um tesouro para qualquer nobre que queria aumentar suas terras e reforçar suas alianças, mas seu pai era um homem razoável. Levava em consideração seus desejos na hora
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de lhes encontrar possíveis maridos. Juliana quis casar-se com sir Godfrey, ao menos no princípio. Igual Anna quis casar-se com Roger. Sir Roger de Umfraville era o terceiro filho do irmão mais novo do velho conde de Angus. Conheceram-se vários anos atrás, em certa ocasião em que Anna acompanhou a seu pai ao Parlamento no castelo do Stirling. Aquele jovem e tranqüilo estudante de encantador sorriso e engenhoso senso de humor a agradou desde o começo. Roger, educado em Cambridge, era considerado um homem erudito e um político prometedor. Aborrecia os derramamentos de sangue. Como terceiro filho, deveria permanecer a salvo da guerra, mas quando morreram seus dois irmãos mais velhos, um em Falkirk e o outro por causa de febres, Roger sentiu a necessidade de brandir a espada. Anna ficou de coração
195
partido
quando
uma
ferida
de
aparência
insignificante que tinha sofrido no Methven se infectou e lhe provocou a morte. Mary, ao contrário que suas irmãs, ainda tinha que decidir-se por um marido. Anna suspeitava que se seu pai não fazia nenhuma pressão, porque esperava obter uma valiosa aliança, se possível inglesa, em muda de sua formosa irmã. Uma vez que submetessem ao Bruce, seu pai estaria em posição de buscar maridos para todas elas. O coração lhe encolheu. «Quando a guerra acabar.» —Eu acreditava que pai tinha pensado acertar um matrimônio com sir Thomas ou com algum desses bonitos e formais barões ingleses quando o rei Hood dobre os joelhos — disse sua irmã.
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—Me acredite, Juliana, isto não tem nada que ver com matrimônio. Se nem sequer o conheço! —disse Anna com sinceridade. Atraía-lhe, inclusive se via intrigada por sua indiferença de um modo perverso, mas um guerreiro highlander não era o tipo de marido que ela procurava. Uma vida em paz e tranqüila, um pai que chegasse a conhecer seus filhos, isso era o que ela queria. Mas por que o rosto do Thomas McNab lhe parecia agora tão… efeminado? «Boiola», tinhalhe chamado Alan. Teve que morder o lábio e estar quase de acordo com ele. Tinha a tentação de explicar qual era a verdadeira razão de tudo aquilo, mas seu pai preferia que as tarefas que lhe encomendava ficassem entre eles dois. Certamente para que não chegassem aos ouvidos de sua mãe. Não
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podia estar segura de que se suas irmãs acreditavam as razões que tinha dado ou simplesmente deixavam de se meter com ela porque a prova estava a ponto de começar, mas agradeceu que voltassem seus olhos para o campo que tinham a seus pés. O lugar que ocupavam na borda de uma ladeira lhes oferecia uma perspectiva invejável de toda a palestra. Foi idéia de sir Arthur de que os participantes não só jogassem as lanças a uma variada gama de objetivos, mas sim o fizessem cavalgando em galope e vestindo a armadura. Arthur, fazendo ornamento de seu aspecto seco e de sua praticidade, tinha-a ajudado a organizar os diferentes alvos de maneira rápida e eficiente. Anna tinha a sensação de que, em parte, seus esforços estavam dirigidos a afastá-la de si quanto antes. Albergava a esperança de passar
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todo o dia fazendo aquilo, mas em algumas horas já tinham terminado. Ele arrumou para receber ajuda
de
outros
guerreiros
mercenários,
certamente para evitar estar a sós com ela. Suspirou e voltou de novo seus olhos ao campo
de
tiro.
Um
por
um,
os
homens
cavalgavam suas montarias ao galope pelo atalho e jogavam as lanças em fardos de palha atados a um poste. Se aquilo fossem Torneios das Highlands verdadeiros, a prova consistiria tanto em lançamento como em cruzamento de lanças. Para este último se usavam lanças mais largas e o cavaleiro a colocava sob o braço à maneira das justas. O desafio era mais difícil do que parecia, como mostravam as muitas lanças que não acertaram no alvo ou ficavam quebradas. Mas vários dos participantes eram muito bons, entre
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eles seu irmão Alan. Quando sua lança alcançou com precisão o centro do alvo, Anna cantou vitória junto a suas irmãs. Somente Alexander MacNaughton, o guardião do castelo real de Frechelan no lago Awe, fez tão bem como ele. Sir Arthur pôs seu corcel em posição de saída e
Anna
se
surpreendeu
a
si
mesma
aproximando-se mais a borda das rochas. Igual ao resto dos participantes levava um elmo de aço, a cota de malha e o tabardo bordado com seu brasão combinando com o escudo. Todos os brasões dos Campbell apresentavam o gironeado 10
de oito com pele de marta e zibelina, o qual
consistia basicamente em triângulos alternados entre negros e dourados, mas o seu estava 10
O escudo é dividido em 8 triângulos.
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personalizado com um urso no centro, que sem dúvida fazia referência à palavra gaélica artos, da qual derivava seu nome. Sustentou a lança com a mão esquerda, as rédeas com a direita e começou a avançar. Sendo canhoto estaria em desvantagem, já que ao contrário do resto dos participantes ele teria que jogá-la por cima de seu próprio corpo para alcançar o alvo. O pulso de Anna se acelerou à medida que fazia seu cavalo andar. Entusiasta amazona como era, se deu conta no momento de que Arthur era um formidável cavaleiro. Movia-se com uma soltura excepcional, com força e potência, como se ele e a arreios fossem um. Aproximou-se do objetivo. No momento em que levantou a arma sem duvidar um instante com um suave movimento
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para o fardo de palha, Anna cortou a respiração. Alcançou seu objetivo com um golpe contundente que ficou a escassos centímetros debaixo do centro do alvo. O fôlego de Anna se liberou em um grito de excitação que se uniu aos gritos do resto. Era um lançamento excelente. Não tão bom como o de seu irmão Alan ou o do MacNaughton, mas ainda estava na primeira tentativa. A palestra de competidores ia diminuindo a cada rodada. Não obstante, até a terceira, o resultado seguia sendo o mesmo. Embora soubesse que não havia justificação, Anna se sentiu um tanto decepcionada. Por alguma razão esperava que Arthur ganhasse. Era um desejo estúpido e se apoiava tão somente em uma hipótese. Tinha desempenhado um grande papel ficando terceiro, atrás do MacNaughton e de seu
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irmão. Mas parecia estranho. Parecia perder sempre pela mesma distância cada vez, a uns poucos
centímetros
de
onde
acertavam
MacNaughton ou seu irmão. Os homens tiraram o elmo e entregaram seus arreios aos cavalariços. Sir Arthur parecia ter mais vontade de seguir os passos de seu cavalo para o estábulo que de permanecer ali e aceitar as felicitações da multidão. Anna se apressou a ficar em pé, com vontade de sair correndo e apanhá-lo antes que pudesse fugir. Que tal se insistisse em que os melhores da competição se sentassem essa noite junto a eles à mesa principal para jantar? É possível que isso lhe desgostasse o suficiente para tirar o menos um par de frases. Ficou olhando Mary, que se tomava todo o tempo do mundo para levantar-se da manta.
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—Aonde vai com tanta pressa? —Eu gostaria de felicitar Alan, a ti não? — disse com as bochechas acaloradas. Anna seguiu seu caminho pelo atalho rochoso na borda do desfiladeiro, tentando não olhar para baixo,
ao
mesmo
tempo
que
pedia
silenciosamente à multidão de espectadores que baixassem a colina com mais rapidez. —Está segura de que não é ao jovem Campbell a quem quer felicitar, Annie querida? — provocou-a Juliana vindo atrás — Não olhe agora —sussurrou, apesar de que com a gritaria da multidão era completamente desnecessário— mas acredito que está te olhando. É obvio que Anna olhou. Girou seu ombro esquerdo e baixou o olhar. Ficou sem fôlego. Juliana tinha razão. Olhava-a fixamente. Seus olhos tiveram uma súbita topada que repercutiu
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por todo seu corpo como uma terrível comoção. Era a primeira vez que não a olhava com indiferença. Em realidade, parecia que tivesse medo de algo. Tão ocupada estava olhando-o que não se fixava em seus próprios passos. —Cuidado, Anna! —gritou Mary. Mas já era muito tarde. Tropeçou em uma rocha. Dobrou o tornozelo e perdeu o equilíbrio, algo que mesmo na melhor das circunstâncias não teria sido nada bom. Ao ver-se cair de costas, deu um passo para trás para tentar recompor-se, o qual teria sucesso, a não ser porque estava a bordo de um escarpado e as rochas se desprenderam sob seus pés. —Anna! —gritou Mary uma vez que tentava alcançá-la. «OH, Deus.» Durante um horrível instante, o
205
tempo
pareceu
deter-se
enquanto
ela
permanecia suspensa no ar. Então começou sua queda. Pôde apreciar as horrorizadas caras de suas irmãs dançando por cima dela enquanto a inércia seguia impulsionando-a para trás. Uma sonora rajada de ar sossegou os gritos da multidão e por um momento se produziu um silêncio inquietante, como se estivesse em um estranho túnel. Caiu três metros. Cinco. Não havia tempo para mover o corpo e procurar cair de pé. Anna se preparou para impactar diretamente contra o chão. Mas não o fez. Tentou recuperar o fôlego ao se dar conta de que não estava estirada no chão com todos os ossos quebrados e os membros rasgados. Não, pois ao abrir os olhos se encontrou com o belo rosto de sir Arthur Campbell. Céu santo, tinha conseguido agarrá-la!
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Mas como? Como era possível que tivesse chegado ali tão rápido? —Estás bem? Assentiu,
já
que
não
podia
pronunciar
nenhuma palavra. Não tinha ficado muda pelo medo à queda, mas sim por outra coisa. Sua voz. O olhar daqueles incríveis olhos. Aquilo não era indiferença. Uma vez quebrada pela primeira vez sua impassível fachada, a consciência de seus sentimentos fez estremecer todo seu corpo. Talvez seu pai não estivesse errado, depois de tudo. Capútulo 6 Arthur respirou profundamente e deixou que seus pulmões se enchessem com aquele ar de aroma tão acre. A liberdade, por mais que
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emprestasse a bosta de vaca, seguia sendo de doce aroma. Levava cinco dias longe do castelo, patrulhando as fronteiras orientais dos domínios de Lorn, em seu caso reconhecendo o terreno de maneira sub-repticiamente, e agora, por cortesia do bom frade, tinha conseguido dois dias mais. Em outras palavras, que desfrutaria de uma semana de liberdade longe daquela feiticeira de olhos azuis e cabelos de cor mel que o tinha atormentado com sua inocente sedução até não suportar mais. Até que Anna caiu, e ele a agarrou, não soube que tinha que partir dali quanto antes. Havia muitas possibilidades de que descobrissem seu plano. Não se falava de outra coisa no castelo. Inclusive aquele feto do demônio de Lorn pensou que fazia uma honra insistindo em que lhes acompanhasse aquela noite sentado à mesa
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dos senhores do castelo. Qualquer um diria que estava comendo as unhas, porque isso era quão único saboreava. Teve que fazer uso de todas suas artes de farsa para mascarar o ódio que sentia durante o longo jantar. Dava a impressão de que aquele filho de cadela desumano tinha uma debilidade: suas filhas. Ao que parecia, inclusive
ao
diabo
havia
coisas
que
lhe
importavam.
Arthur
advertiu
o
medo
que
emanava dos olhos de Lorn ao ouvir o relato do tropeço de Anna na ladeira da colina, mostrando uma gratidão que se via de tudo sincera. Embora Lorn aceitou sua versão dos fatos, Anna MacDougall não fosse tão fácil de enganar. Era consciente de que não tragava essa explicação de «a sorte de estar no lugar apropriado quando ela caiu». Essa moça era muito intuitiva, o qual significava que era
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perigosa. E o último que precisava era que Dugald ou, pior ainda, Lorn começassem a fazer perguntas. Grande
confusão!
aumentando.
Primeiro
resgatado,
a
única
Sua a
má
sorte
moça
mulher
ia
que
tinha
que
podia
desmascará-lo, era a filha do homem ao que pretendia aniquilar. Depois, Deus sabia por que motivos, a garota se enrabichara por ele. E logo para
piorar
escarpado,
tudo, lhe
ela
tropeçava
obrigando
a
em
trair
um
essas
habilidades que poderiam chamar mais a atenção sobre ele ainda e o convertia no último dos heróis dos MacDougall, por não falar da nova fonte de divertimento
oferecida
aos
homens.
Eram
incontáveis as vezes que no transcurso da viagem algum deles subia a uma rocha e fazia como que caía para gritar dramaticamente com
210
uma voz aguda: «me agarre, sir Arthur!». Para morrer de risada. Quase sentia falta do MacSorley. Os «Torneios» em si não resultaram uma perda de tempo tão grande como ele imaginava. A moça estava no certo: a competição fosse boa para avivar o ânimo dos participantes. E mais, tinha
aprendido
bastante
da
respeito
das
habilidades dos soldados inimigos e poderia entregar essa informação a Bruce. Não obstante, consciente de que tinha que ter muita cautela com a moça, ou melhor ainda, afastar-se dela quanto pudesse, aproveitou a primeira ocasião que se apresentou para partir. Se aquilo parecia em uma oportunidade de explorar as terras de Lorn para Bruce, melhor ainda. Precisava centrar-se na missão. Apesar de ser um dos guerreiros de elite melhor treinados
211
do país e de que estava no meio da missão mais importante de sua vida, às vezes parecia estar atuando em uma farsa para jovenzinhas. Jamais antes se vira em tais apuros. Essa era a razão pela qual gostava de trabalhar sozinho. Do exterior. Infiltrar-se parecia muito pessoal. Muito próximo. Aquela rajada de boa sorte continuou quando, de retorno ao castelo junto a seus irmãos e ao resto dos homens que formavam a patrulha, a maior parte dos membros dos MacNab e os MacNaughton, encontraram-se com frei John nas cercanias de Tyndrun. O bom frade vinha do Sant Andrew e percorria Escócia atravessando as terras de Lorn, caminho da ilha de Lismore, uma pequena e estreita ilha junto à costa, que servia como assentamento tradicional ao bispo do Argyll, que, curiosamente, era um MacDougall e
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além parente próximo de Lorn. Como suspeitava de que fazia tempo que os MacDougall passavam informação através das Igrejas, ofereceu-se voluntário para escoltar ao frade até o Oban, bem ao sul do castelo, onde poderia tomar um bote. Arthur insistiu em que, de todos os modos, ele ia nessa mesma direção. O frade cavalgaria atrás dele. Embora viajariam a um passo muito mais lento que o resto, tampouco tinha pressa alguma por voltar. Ao dizer isto, ouviu várias risadinhas a suas costas. Arthur se convenceu mais ainda de que o frade tramava algo ao ver que tentava negar-se. Seria possível que tivesse descoberto a fonte das mensagens de MacDougall? Franziu o cenho. O único ponto ruim foi que no último momento Dugald decidiu unir-se a eles. Provavelmente para lhe torturar até a morte com
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toda esse palavrório do concurso de lanças. —Se tivesse pontuado um pouco mais alto e soltado
o
pulso
como
te
ensinei,
muito
possivelmente teria ganho. Arthur apertou os dentes e manteve o olhar fixo no atalho que tinha ante si. —Fiz o melhor que pude — mentiu, sem saber por que as tentativas do Dugald de melhorar suas destrezas lhe crispavam tanto. Poderia ter superado a qualquer um se quisesse. Mas preservar sua identidade era quão único
importava.
Já
tinha
«perdido»
uma
infinidade de vezes. Não sabia que demônios lhe ocorria ultimamente. Estava mais claro que a água
que
não
lhe
importava
um
nada
impressionar às moças, a nenhuma delas em particular. O orgulho era algo que podia acabar com ele.
214
—E não bastou para que ganhasse — assinalou Dugald, se por acaso tinha esquecido. Não o tinha feito. —A seguinte igreja está cruzando o rio — disse o frade, mudando de tema por sorte. Acabavam de atravessar Ben Cruachan, as montanhas mais altas do Argyll, pelo estreito e íngreme atalho do Brander ou Brannraidh: lugar de emboscada. Um nome muito apropriado, pensou. Ante eles se estendia o relativamente plano gramado da borda sul do lago Etive. —Referem-se a Killespickerill? —perguntou Arthur. Aquela ancestral igreja de Taynuilt dera abrigo ao bispo de Argyll. —Ah, conhecem-na? Arthur
e
Dugald
mudaram
um
olhar.
Obviamente o bom frade não estava familiarizado
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com
a
história
entre
os
Campbell
e
os
MacDougall. —Um pouco — disse, soturnamente. O pequeno povoado de Taynuilt estava situado num lugar chave entre o lago Etive e o rio Awe, que estavam unidos por correntes de águas subterrâneas de cinco quilômetros. Eram terras de Lorn, mas se achavam muito perto das dos Campbell. Quer dizer, das que fossem terras dos Campbell, pensou Arthur apertando os dentes. —Se querem chegar ao Oban ao anoitecer, não deveríamos permanecer aqui muito tempo. Ainda ficam ao menos vinte quilômetros para chegar. Nesse passo demorariam outros dois dias. Parecia que visitavam cada uma das Igrejas entre o Tyndrum e o lago Etive. Não é que Arthur se queixasse. Aquilo o brindava com mais
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oportunidades de inspecionar a zona. Quando Bruce e o resto dos homens partissem rumo oeste para o Dunstaffnage para enfrentar-se ao Lorn, teriam que passar por essas mesmas terras. E essa marcha lenta também atrasaria sua volta ao castelo, o qual lhe vinha como pérolas. Mas acompanhar a esse frade não tinha ajudado
a
descobrir
como
passavam
a
informação os mensageiros através da rede do rei Robert. Pode ser que fossem clérigos, mas, no momento, esse clérigo não parecia ser um mensageiro. Não tinha visto o frade tirar nada da bolsa que tinha atada ao cinto. E tampouco descobriu nada na noite anterior enquanto o frade dormia, momento que Arthur aproveitou para assegurar-se disso. —O irmão Rory faz o melhor caldo das
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Highlands —disse o frade — Não vão querer perder isso. A igreja anterior tinha bolos de carne; a anterior a esta, geléia. Arthur tinha a impressão de que o encargo das paradas em todas aquelas Igrejas era mais provar as especialidades locais que atender às necessidades da fé. Qualquer um diria vendo o figurino daquele clérigo. O homem tinha mais ossos que carne e um temperamento mais dado ao bom saque que a apertar o cinturão. Cruzaram o rio pela ponte do Awe e seguiram pela borda, avançando para o sul bordeando a floresta.
A
paisagem
estava
salpicada
de
singelas casas de pedra cinza que se faziam mais numerosas à medida que se aproximavam da vila. Minutos depois aparecia a velha igreja de pedra, grudada a um pequeno promontório no
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centro da ociosa vila. Havia várias pessoas nos arredores, a maioria delas mulheres, e o ar arrastava arrulhos de risadas e crianças jogando. Ficou petrificado ao ouvir o que parecia uma canção. Uma voz de mulher. Seus sentidos zumbiram como se acabasse de passar uma abelha por trás da cabeça. —Aconteceu algo? O frade, que cavalgava atrás dele, estava o suficiente perto para conscientizar-se de sua reação. Arthur esperou. Passeou o olhar de cima abaixo, mas não havia nada fosse do habitual e tampouco advertiu o inconfundível aroma do perigo. Negou com a cabeça. —Não, nada. Seguiram avançando até o interior do jardim da igreja para chegar ao edifício traseiro onde comia e dormia o sacerdote. Frei John falou a
219
verdade. O caldo do irmão Rory era sem dúvida um de dos melhores que Arthur tinha provado. Depois de tomar duas tigelas, o teria encantado sentar-se em um banco dos do jardim do padre e desfrutar daquela cálida tarde do verão, mas tinham que prosseguir seu caminho. Ao levantarse da mesa voltou a ouvir. Aqueles doces e melódicos tons eram de uma beleza impactante e o enchiam com uma sensação de arroubo próxima a aquela que se sente ao presenciar um prodígio da natureza. Como um pôr-do-sol perfeito. Ou a bruma sobre um lago à alvorada. —Quem canta isso? —perguntou quase com veneração. O irmão Rory o olhou de um modo tão estranho que Arthur despertou de seu estado de transe. Tinha falado sem pensar, longe de confiar em seu excepcional ouvido. O sacerdote prestou
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atenção e pareceu se dar conta do que tinha ouvido. —Ah, a dama que nos visita hoje do castelo. Deve estar cantando ao Duncan. Desde que voltou não há coisa que goste mais que escutar cantar à dama. —Arthur ficou de pedra. Seus sentidos já não zumbiam, mas sim falavam com gritos. Não podia ser. O irmão Rory continuou, alheio às reações de Arthur — Todos esperam suas visitas com impaciência. Traz-nos sempre uma grande alegria —disse com o peito cheio de orgulho — A dama nunca nos esquece, nem a nós nem às pessoas que serviu a seu avô. —Que dama? —perguntou Dugald. —Lady Anna. A mais jovem das filhas de lorde de Lorn. Um anjo vindo do céu, isso é o que é. Melhor, vinda do inferno para atormentar
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Arthur. Dugald deu risada só vendo o rosto que punha. —Parece que a moça conseguiu te encontrar. Arthur não podia acreditar. Não era possível que o tivesse encontrado. Ou talvez sim? O resto dos homens teria retornado no dia anterior. Tirou isso da cabeça. Não, isso era impossível. Uma coincidência. «Uma desafortunada coincidência.» O
irmão
Rory
parecia
confuso
pela
brincadeira de Dugald. —A dama vem a cada duas sexta-feiras. Com a
mesma
pontualidade
que
a
névoa
das
montanhas. Conhecem-na? —Um pouco — disse Arthur antes que Dugald pudesse responder. Apressou-se então até o poste do jardim no que tinham deixado seus cavalos, mais ansioso
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por partir inclusive que antes. Por desgraça, lady Anna escolheu precisamente esse momento para sair do casebre que estava visitando. Saiu no caminho, a menos de cinqüenta metros deles, e se voltou para despedir-se da mulher e os dois crianças pequenos que estavam na porta da casa. O sol se refletiu em seus cabelos lhe dando uma auréola de halos dourados. Arthur sentiu um estranho sobressalto no peito. Tinha pensado nela mais do que gostaria de admitir e que lhe crucificassem se vê-la não proporcionava um breve brilho de… «Diabos.» Era um brilho de felicidade. Como se tivesse sentido falta dela realmente. Mas estava claro que não podia ser. Ela não era mais que uma aporrinhação. Uma aporrinhação adorável. Então olhou em sua direção. Ao notar como se sobressaltava soube que o tinha visto.
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Entretanto ela fez como que não tivesse, deu meia volta e baixou com passos rápidos o caminho que levava ao lago. Longe dele, com o soldado que a protegia seguindo seus passos lealmente. Arthur ficou circunspeto. Não só porque acabara de ignorá-lo. Não, era por sua escolta. Um único soldado. Antes
que desse
tempo de pensar melhor já estava gritando: «Lady Anna!». Inclusive daquela distância advertiu que erguia os ombros até quase tocar orelhas com eles. Por que lhe irritava aquele movimento em particular era algo que não sabia, mas o certo é que lhe irritava. Ignorou a seu estúpido e sorridente irmão, voltou a atar seu cavalo ao poste e foi a seu encontro. Anna pareceu ficar em guarda. Endireitou as costas e agarrou com mais força
a
cesta,
quase
como
se
estivesse
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preparando
para
a
batalha.
«Está
tensa»,
pensou, maldita seja. —Sir Arthur — disse nessa voz baixa sufocada que ele tinha esquecido. «Estupendo», pensou ele — Sir Dugald. Que surpresa — acrescentou ao erguer o olhar além de seu ombro e identificar ao irmão de Arthur. Não soava como uma surpresa agradável. Que diabos ocorria? Já tinha perdido o interesse? Maldita seja, mas isso não era o que ele queria? Deteve-se em frente a ela, talvez um passo mais
perto
do
que
era
devido.
Se
não
conhecesse si mesmo o suficiente, teria dito que tentava intimidá-la. Que usava seu tamanho para lhe bloquear a saída. Mas ele não era nenhum bárbaro. Não fazia esse tipo de coisas. —Onde está o resto de seus homens? — disse com brutalidade.
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Anna franziu o cenho, fazendo aparecer essas conhecidas rugas sobre o nariz. —Que homens? Tentou soar paciente, mas não conseguiu. —Não vejo mais que um guarda em sua escolta — disse saudando com a cabeça ao jovem soldado. —Robbie sempre me acompanha nas sextasfeiras. Criou-se no povoado. O ocasional mau gênio de Arthur voltou a tomar forma pouco a pouco. Robby, apesar de ser alto, não podia ter mais de dezoito anos e parecia óbvia e claramente que não poderia deter alguém que queria fazer mal à dama. Pelas barbas de Satanás, havia uma guerra aflorando! Em que demônios pensava Lorn deixando-a sair por aí como se tal coisa não fosse importante? Voltou-se para seu irmão.
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—Eu acompanharei ao frade até o Oban. Tu voltas para castelo com lady Anna. «Por todos os demônios.» Quando viu seu irmão entreabrir os olhos, se deu conta de que Anna havia conseguido de novo. Uma vez mais conseguia que fizesse algo sem pensar. Acabava de dar uma ordem a seu capitão. Ele não cometia enganos desse calibre. —Eu levarei ao frade — disse Dugald com certa aspereza. — E acompanharás lady Anna. E a dama em questão pareceu conscientizarse da súbita tensão entre os dois irmãos. —Não necessito que ninguém acompanhe a nenhum lugar. Estou perfeitamente segura com o Robby. Arthur se viu de novo esquecido. Dugald tinha marcado o território e não voltaria atrás. Acabava de desafiar sua autoridade e não podia permitir
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uma luta de poderes com seu irmão. Se alguém a acompanhasse, teria que ser ele. Mas aquilo significaria perder a oportunidade de comprovar se o frade era um dos mensageiros de Lorn. O que teria que fazer era deixá-la partir. O mais provável é que não lhe acontecesse nada. O mais
provável…
Os
dias
eram
longos.
Certamente teria luz até que chegasse ao castelo. Certamente. Fechou os punhos para não dar saída para a frustração que se retorcia em seu interior. —Estou seguro de que estão perfeitamente seguros— disse para preservar o orgulho do moço—, mas será uma honra a acompanhar ao castelo, milady. Anna
não
estava
contente
absolutamente.
Depois
de
passar
em
vê-lo,
semanas
evitando-a, aquele homem contraditório decidia
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desempenhar o papel de protetor acérrimo. É obvio que não esquecia o que tinha feito por ela. Quando ao erguer os olhos se encontrou com seus impressionantes olhos dourados e se deu conta de que tinha salvado, de que estivera a embalando entre seus braços… Tinha sido o momento mais romântico de sua vida. O momento mais romântico sem ser um casal. Porque em seguida ele a pôs em pé, disse-lhe que tivesse mais cuidado e a deixou ali com a palavra na boca. Como tinha podido apanhá-la a tempo? Recordava o brilho alarmado de seus olhos. Era quase como se soubesse de antemão que cairia. Algo que é obvio, era ridículo… ou não? Não obstante, Anna aproximou mais a cesta a seu regaço de maneira inconsciente. Aquele homem era muito observador. Teria que pensar
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em algo para se distrair. —Nos acompanhem pois, se insistes — disse dando meia volta e dirigindo seus passos de volta ao caminho. Entretanto, uma mão dele sobre o cotovelo a fez parar em seco. Igual ao que fez por um instante seu coração, justo antes de ficar a pulsar loucamente. Não a agarrava com força, mas podia notar cada um de seus dedos lhe queimando a pele. Ser consciente de seus sentimentos fez que lhe ardesse todo o corpo. Dizia a si mesma que tinha exagerado a intensidade de sua reação ante ele. Mas não era assim. Por que ele? Essa atração que sentia era inexplicável. —Onde está seu cavalo? —perguntou — O castelo está na outra direção. —Não voltarei para castelo ainda. Ainda
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tenho que visitar vários casas na vila. —Logo anoitecerá. Caramba, que cara feia se pôs. —Não anoitecerá até dentro de quatro horas, ao menos — repôs ela desembaraçando-se com cuidado da mão que agarrava seu cotovelo — Tenho tempo de sobra. Antes que pudesse discutir já tinha começado a despedir do irmão Rory, do frade e sir Dugald e descia pelo caminho. O olhar de recriminação de Arthur lhe dizia que o acerto não tinha graça; mesmo assim, permaneceu a seu lado como uma antipática e taciturna sombra. Visitaram mais três lares. O primeiro pertencia a Malcolm, que tinha perdido o braço com o que brandia a espada lutando contra os rebeldes em Glen Trool e estava passando muito mal adaptando-se à vida longe do campo de batalha. Inclusive coberto de
231
cicatrizes e com um braço a menos, Anna sabia que daria o outro com para poder retornar à luta. Não entendia o amor que aqueles homens professavam à guerra e jamais poderia fazê-lo. Estava cansada de cicatrizes, de membros amputados, de esposas sem marido e crianças sem pai. Enrugou o nariz e olhou furtivamente ao homem no canto. Ao que parecia nem todas cicatrizes
lhe
desgostavam.
pareciam
digamos…
Algumas
atraentes.
Ele
delas tinha
cicatrizes. Uma que lhe cruzava o queixo e se acentuava ao apertar os dentes, algo que parecia fazer freqüentemente quando ela estava ao seu redor, e uma pequena marca na bochecha direita.
As
mãos
estavam
repletas.
Provavelmente teria alguma nos braços. E no peito.
232
Um ataque de calor invadiu seu corpo assim que visualizou a imagem de seu largo e poderoso torso. Nu. Pelos pregos de Cristo, o que lhe estava passando? As fantasias, caso elas as tivesse, eram algo muito inapropriado a plena luz do dia enquanto tentava ler para um homem aleijado. Embora não pudesse pôr fim à guerra, faria todo o possível por ajudar, por mais que fosse algo insignificante. Seonaid, a mulher de Malcolm, dizia que bebia menos uisgebeatha depois de que ela lia para ele, de modo que Anna sempre trazia consigo sua apreciada cópia de Tristan11 de Thomas 11
da
Bretanha.
O
velho
guerreiro
Tomás da Inglaterra (ou Tomás da Bretanha) foi um poeta anglo-normando do século XII. Sua única obra conhecida
é o poema Tristan, uma das primeiras versões conhecidas da lenda de Tristão e Isolda. O poema foi escrito entre 1155 e 1170, possivelmente para Leonor de Aquitânia, uma vez que a obra sugere uma relação com a corte de Henrique II Plantageneta. Apenas oito fragmentos da obra sobreviveram aos nossos dias, com um total de 3.300 versos, especialmente da parte final da história . Calcula-se que isso represente cerca de um sexto do poema original. A obra de Tomás é contemporânea de outro grande poema sobre o tema de Tristão e Isolda, escrito por um misterioso escritor chamado Béroul e que também chegou de maneira fragmentária aos nossos dias. Comparada à obra de Béroul, o Tristan de Tomás é considerado mais próximo do refinamento do romance cortês.
233
desfrutava quase tanto como ela da história do amor proibido entre o cavalheiro e a princesa irlandesa. Anna queria ignorar ao homem taciturno encostado na porta, mas sentia o peso de seu olhar. Quando saíram da casa que Arthur disse: —Sabes ler. Anna encolheu os ombros, consciente de que não era algo comum nas Highlands. —Meu pai acreditava que era importante que todos seus filhos recebessem uma educação. — Olhou-o nos olhos, desafiando-o a que se pronunciasse ao respeito — Inclusive as garotas. Olhou-a com atenção, de novo com o cenho franzido, mas não disse nada. A seguinte casa que visitou pertencia ao curador da vila. Afraig já era idoso e já não viajava pela campina com a facilidade de
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antigamente, assim que cada vez que o visitava, Anna lhe levava algumas ervas e plantas que recolhia da floresta junto ao Dunstaffnage. Anna deixou para o final a parada mais importante. Sua recém enviuvada amiga Beth tinha ficado com cinco filhos, entre eles o bebê Catrine, Cate, nascida há apenas três meses, seis
meses
depois
de
que
o
pai
fosse
assassinado pelos homens de Bruce em uma emboscada no castelo do Inverlochy, justo antes que este caísse em mãos dos rebeldes. A morte de seu marido não tinha feito mais que fortalecer a firmeza de Beth. Como Anna, também ela faria tudo o que estivesse em sua mão para derrotar ao rei Hood e pôr fim à guerra. Anna esperava que sir Arthur se aborrecesse com sua conversa e encontrasse algo que fazer, mas ele parecia contentar-se estar sentado à porta e esperar
235
junto
a
Robby,
observando-a
com
esse
penetrante olhar dourado, muito intenso e perspicaz. Era como se soubesse que estava tramando algo. Através de duas pequenas fendas na pedra Anna via os crianças maiores jogando com uma bola. Tinham aberto as portinhas de madeira para deixar que entrasse o ar fresco do verão e ventilasse a comprida construção de um só aposento. De repente o jogo cessou e teve a oportunidade que esperava. Ergueu o olhar sobre a cabeça do bebê que embalava em seus braços e olhou a sir Arthur. —Parece que a bola dos crianças tornou a ficar obstruída no telhado do celeiro. Importariate… —Eu o farei — disse Robby saltando do assento
como
se
esperasse
uma
mínima
236
desculpa para partir. Teve que reprimir um sorriso ante sua impaciência. Talvez tivesse excedido um pouco ao pedir a Beth que descrevesse ao detalhe os últimos problemas digestivos do Cate, incluindo o arco de cores que adornava suas vestimentas. Resultado perfeito. Homem errado. —Suponho que teremos que nos pôr em marcha — disse levantando-se com a intenção de devolver o bebê a Beth. Mas então lhe ocorreu outra idéia. Teve que conter o sorriso que aflorou em seus lábios. Sabia exatamente como o distrairia — Quase esqueci —disse a Beth — trouxe uns bolos. —E também eu tenho uns bolinhos doces para ti — disse Beth entendendo imediatamente. Antes que ele se inteirasse do que pretendia, Anna colocou o bebê dormido sobre seu colo e
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agarrou sua cesta. Pôs tal cara de horror que a jovem teve que esforçar-se ao máximo para não rir. Aquela expressão quase fazia que valesse a pena todos os problemas que lhe tinha causado. Quase. Arthur, por sua parte, tentou lhe devolver Cate imediatamente. —Não sei nada de… —Não há nada que saber —disse Anna com doçura — Mantenha a mão sob sua cabeça dessa forma e a menina estará bem. Entretanto,
ele
tinha
um
aspecto
decididamente angustiado. Com tanto movimento, o bebê começou a agitar-se e emitiu uma série de pequenas queixas e prantos. O temível cavalheiro com aspecto de poder derrotar a todo um exército com uma só mão olhou a Anna pedindo clemência.
238
Embora
aquilo
a
divertisse,
havia
algo
extremamente fascinante na visão daquele alto e musculoso guerreiro embalando à pequenina em seus braços, horrivelmente, mas com um cuidado que fazia que o coração lhe desse um pequeno tombo. Seus olhares se encontraram e algo estranho vãorreu entre eles. Uma consciência animal da atração que crepitava entre ambos. Um reconhecimento de que aquelas bênçãos eram possíveis entre um homem e uma mulher. Como seria o ver sustentando a um filho de ambos? Anna baixou o olhar, envergonhada pela descabelada
direção
que
tomavam
seus
pensamentos. Imaginar ao possível bebê que pudesse ter com um homem que mal conhecia era uma experiência completamente nova para ela.
239
—Balance-a um pouco — disse para animálo, compadecendo-se um pouco dele — Ela gosta. Não demoraremos muito. Dito isto, seguiu a Beth até o outro lado do aposento, onde estava a cozinha. E Cate, Deus benzera ao anjinho, fez sua parte. Seus suaves choros e seus lamentos cada vez mais altos encobriram o rápido intercâmbio entre Anna e Beth. Quando Beth retornou para reclamar a seu bebê, sir Arthur tinha todo o aspecto de alguém a quem tinham arrastado ao inferno amarrado ao carro de Satã. —Bom, não foi tão duro, verdade? —disse Anna enquanto saíam da pequena casa. Arthur entreabriu os olhos em sinal de advertência. Parecia morrer de vontade de estrangulá-la.
Provocar
reações
nele
se
240
demonstrava um pouco prazenteiro. Anna se despediu dos crianças com a promessa de voltar logo. Robby já tinha levado os cavalos, de modo que não demoraram muito em se por no caminho. Sabia que deveria aproveitar a oportunidade para aprender mais dele, mas estava cansada do longo dia passado na vila e, se tinha que ser sincera, não estava de humor para que a rechaçassem. Aquele estranho momento na casa do Beth a fazia sentir… vulnerável. Não queria pensar nele desse modo. Não queria que seu coração fosse dando tombos. Vigiava-o unicamente por seu pai. Não ia trás dele a sério. Durante os primeiros quilômetros cavalgaram em fila indiana, mas assim que a estrada se alargou sir Arthur abandonou a cabeceira e se colocou a seu lado. Surpreendeu-a que fosse ele
241
quem falasse. Iniciar uma conversa? Primeira vez que ocorria. —Por
que
o
fazes?
—
Ela
o
olhou
desconcertada, de modo que Arthur se explicou — ficar rodeada de tais… coisas —acrescentou, esforçando-se por encontrar uma palavra. —Refere-se aos frutos da guerra? —disse Anna de maneira desafiante. Não lhe surpreendia que não soubesse falar daquilo que ele mesmo tinha presenciado. Os guerreiros se concentravam na glória, na honra do campo de batalha, não no que acontecia quando as coisas saíam erradas. As pessoas entrevadas e os crianças sem pai não eram algo no que queria pensar um homem que ia à batalha. Compreendia que fechar a mente à esse tipo de pensamentos era algo necessário, mas isso não significava que fossem menos reais.
242
—Acreditava que milady não gostava e mesmo assim… —disse Arthur encolhendo-se de ombros. —Odeio a guerra —disse Anna com voz áspera — E morro de vontade que acabe, mas isso não significa que evite fazer o que me toca. Isto é o que eu posso fazer. E se um par de canções ou histórias, ou sustentar a um bebê em braços durante um momento para que sua mãe tenha um instante de paz, reporta um pouco de alegria, por breve que seja, farei. Arthur lhe dirigiu um olhar duro e crítico. —Têm um coração muito brando — disse como se isso fosse algo mau — Aquele soldado não merecia seu tempo. Não faz mais que suicidar-se lentamente com a bebida. Advertiu o tom de aversão em sua voz. Ao que parecia, pensava que aquele homem era
243
débil. —Talvez —admitiu Anna — Mas Malcolm lutou por meu pai com honra e lealdade durante danos. É que não merece uns instantes de meu tempo por seu sacrifício? —Lutar é sua obrigação. —Igual esta é a minha. —Milady converteu isso em uma obrigação. Nessa ocasião foi ela quem encolheu os ombros. Arthur voltou a olhá-la com o cenho franzido. —Estais exausta. Anna
pensou
que
talvez
começava
a
acostumar-se a esses olhares de recriminação, porque já somente lhe provocavam risada. —Estou. —O que cochichavam antes com sua amiga? A súbita mudança de tema a pegou com a
244
guarda baixa. Estremeceu-se, mas em seguida se recompôs. —Coisas de mulheres. —Que tipo de coisas de mulheres? Os olhos de Anna brilharam ao tempo que lhe dirigia um olhar avesso. —Estais seguro de que quer saber? —disse a modo de provocação. Arthur voltou o rosto imediatamente. —Talvez não. «Meu deus, está se ruborizando.» Não pensava que aquilo fosse possível. Mas essa diminuta mácula em sua impassível fachada não fazia mais que aumentar seu atrativo. Era algo encantador. Ele era encantador. Não à maneira galante e beija-mão de um cortesão, mas sim de um modo mais sutil. Parecia que acabasse de levantar um pouco o véu para mostrar uma parte
245
de si mesmo que não revelava com freqüência. O que adorava era essa insinuação de sua ingenuidade totalmente inesperada. O nó que se o fazia no peito se esticou ainda mais. Anna era consciente de que estava em um apuro. Sir Arthur despertava sua curiosidade e isso parecia perigoso. Melhor pensar nele como um simples guerreiro, o tipo de homem que ela era capaz de compreender e também de rechaçar. Não queria saber nada de sua vida. Não queria descobrir um lado diferente nele. Não queria ser curiosa. E, sobretudo, não queria estar tão penetrada por ele. Tinha sua vida planejada. Quando acabasse a guerra seu pai lhe buscaria um bom homem com quem casar-se. Teriam uma casa cheia de crianças, com sorte nas Highlands, perto de sua família, e viveriam na mais tranqüila e feliz das
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pazes. Já não teria que preocupar-se mais por que destruíram tudo o que conhecia, tudo o que amava. Estabilidade. Isso era o que queria. Pode ser que a tivesse surpreendido, mas isso não mudava o problema essencial: sir Arthur era um guerreiro. Um homem que parecia ter nascido com uma espada sob o braço e que morreria dessa mesma forma. Ele jamais poderia lhe dar o que ela queria, já que Anna sabia que um homem que olhava sempre à porta como se queria partir acabaria indevidamente passando através dela. Arthur não gostava de nada que começava a descobrir de Anna MacDougall. Era muito mais fácil rechaçá-la como uma princesinha ingênua e cordata que vivia em um mundo de fantasia sem entender nada do que ocorria a seu redor. Mas esse não era o caso absolutamente. Anna sabia
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o que acontecia em torno dela, talvez que melhor que ele mesmo. Como a maioria dos guerreiros, Arthur
tomava
distância
em
relação
às
repercussões da guerra. Não queria pensar a respeito do que acontecia depois. Ver a guerra através de seus olhos… A morte. A devastação. Homens mutilados que aplacavam sua dor com a bebida. Mulheres abandonadas a sua própria sorte. Crianças sem pais. A realidade. Ficou
circunspeto.
Quantas
vezes
teria
passado diante daquela realidade sem vê-la? Quantas vezes tinha cavalgado junto a um castelo ou uma casa em chamas sem pensar nas pessoas que vivia neles? Tinha lutado durante quase toda sua vida, mas, de repente, sentia-se cansado. —Por que não te caio bem?
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A
franqueza
da
pergunta
o
deixou
desarmado, embora talvez não devesse tê-lo feito. Anna não se intimidava ante nada. Aberta e extrovertida,
dizia
o
que
pensava
com
a
confiança que só se outorga uma vida de carinho, amor e ânimos constantes. Essa era uma das coisas mais incomuns, e fascinantes, que ela tinha. Ficou pensando, sem saber o que responder. —Não me cai mal — Pelo rosto que ela pôs, Arthur teria jurado que não acreditava — O que passa é, que como já vos disse, vim aqui para cumprir com meu trabalho. Não tenho tempo para nada mais. —É pelas velhas rixas? Ficou tenso, já que não gostava do rumo que começava a tomar o assunto. Essa não era uma conversa que queria ter com ninguém, e muito
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menos com ela. —A inimizade entre nossas famílias acabou faz anos. —Então tudo isso é coisa do passado? Não estais furioso por suas terras nem pelo castelo do lago Awe? O pulso lhe acelerou de maneira imediata. Estava furioso, mas não com ela. —Essas terras não me pertenceriam, seriam de meu irmão Neil. E as teria perdido depois do Methven. O rei Eduardo nos recompensou pela perda e distinguiu a meus irmãos e a mim por nossa lealdade. —Então é por seu pai? Ficou petrificado. «Por Deus!» Isso de atirar ao pescoço devia ser uma característica inata nos
MacDougall.
Apesar
de
ser
bem
intencionada, suas palavras fizeram sangue.
250
—Meu pai morreu na batalha. —Nas mãos do meu —disse Anna em voz calma — Seria compreensível que me odiasse por isso. Gostaria de ser capaz de fazer. Mas não podia culpar Anna dos pecados de seu pai. —Não vos odeio — Ao contrário. Desejava-a. Mais do que tinha desejado jamais a nenhuma outra mulher — Aquilo é água passada. Arthur notava todo o peso de seu olhar, mas continuou olhando à frente. —Qual é a verdadeira razão pela que estais aqui? —A que te referem? —O que querer? Justiça. Vingança. Palavras que nesse caso significavam exatamente o mesmo. —O que a maior parte dos cavalheiros que
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lutam: terras e recompensa. Em seu caso Bruce se comprometeu a devolver Innis Chonnel a seu irmão e deixou cair a promessa de uma esposa rica para Arthur, a mais rica das Highlands: Christina MacRuairi, senhora das Ilhas. —E nada mais? —Que acabe a guerra. —Então queremos o mesmo. Não sabia quão equivocada estava. O final da guerra para ele seria ver Bruce no trono e aos MacDougall aniquilados. A olhou de esguelha. Era tão formosa que lhe doía o coração vê-la. Mas essa beleza parecia enganosa. Tinha percebido a inocente juventude de seu rosto e a doçura de seu sorriso, mas não a força que residia nela. Conscientizar-se desse engano era desconcertante para um homem que
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se orgulhava de suas capacidades perceptivas e de observação. Seu comportamento durante daquelas duas últimas semanas adotava outro matiz à luz do que tinha visto nesse dia. Talvez não fossem meras fantasias, a não ser um meio de amparo: fazer o que estava em sua mão para preservar um modo de vida que se desabava a seu redor. Apesar de que a admirava, também se compadecia dela. A sua era uma batalha perdida. E inclusive em sua fortaleza, entrevia-se certa fragilidade que o fazia perguntar se não seria também ela consciente disso. O teria encantado poder protegê-la. Um pouco de uma vez irônico e ridículo, dado que ele estava ali para destruir tudo aquilo ao que Anna se aferrava com desespero. Surpreendeu-lhe inquietar-se tanto por isso.
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Gostasse ou não, Anna MacDougall era o inimigo. Capítulo 7 Cavalgaram
em
silencio
durante
vários
quilômetros até que Arthur voltou a falar. —Há um córrego um pouco mais adiante onde podemos dar de beber aos cavalos e comer algo se tiveres fome — disse absorvendo o açucarado aroma da manteiga e o açúcar — O aroma desse pão-doce está despertando meu apetite. Teve a impressão de que Anna empalideceu um tanto, mas talvez fosse que a luz se estava indo. —Rogo-lhe isso, por mim não te detenhas. Os cavalos estarão bem até que…
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Anna se deteve e jogou uma olhada entre as árvores, para a ribeira do regato que tinham ante eles. —O que fazem esses crianças? Arthur ouviu uns latidos histéricos afogados. Imaginou o que tinha no saco que levava um dos crianças no ombro. —Vamos
—disse
—
Já
pararemos
no
seguinte córrego. Anna entreabriu os olhos e logo os abriu de repente ao conscientizar-se do que acontecia. —Não! —gritou ao tempo que cavalgava para os crianças, que já começavam afundar o saco na água — Detenha! Os moços, cujas idades estariam entre os dez e os quinze anos, ergueram o olhar com a boca aberta ao tempo que ela se aproximava. Arthur mal podia imaginar a incredulidade dos crianças
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ao ver aquela ninfa sair da floresta como uma valkiria das cruzadas. —O
que
levas
na
bolsa?
—perguntou
enquanto a olhavam com cara de abobalhados. O maior dos crianças foi o primeiro em reagir. —Não é mais que um vira-lata, milady. O cachorrinho repudiado da ninhada. O agudo grito de desespero que saiu da garganta de Anna provocou uma estranha angústia em Arthur. —Me deixem vê-lo — exigiu. Um dos menores disse: —Não o quererá milady. Sua própria mãe não o quer. Morrerá de fome se não nos desfizermos dele. Anna emitiu outra dessas exclamações e a angústia que Arthur sentia no peito ficou mais aguda. Temia que seria capaz de fazer tudo com
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o intuito de não voltar a ouvir aquele gemido nunca mais. —Mostrem à dama — disse com firmeza. Os crianças começaram a mover os pés com inquietação como se os tivessem pego fazendo algo mau, apesar de que quão único queriam era fazer um favor ao cachorrinho. O maior soltou a bolsa no chão e afrouxou o laço. Afastou a borda do tecido e descobriu ao vira-lata mais adoentado e feio que Arthur tinha visto na vida. —É adorável! —exclamou Anna saltando de suas
arreios
antes
que
Arthur
ou
Robby
pudessem ajudá-la. Os crianças ficaram olhandoa como se estivesse completamente louca. Anna se ajoelhou e tomou entre seus braços aquela patética bolinha de pelo salpicada de cinza e negro — Pobre coisinha! Está apavorado — disse
olhando
a
Arthur
em
busca
de
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compreensão — Olhem como treme o pobre. Arthur percebeu ao momento de que aquele jovem cão de caça tinha os dias contados. Era pequeno e estava tão magrelinho que dava pena vê-lo. Provavelmente sua mãe se negou a alimentá-lo desde dia em que nasceu. —Os moços estão salvando ao cachorrinho de
uma
morte
muito
mais
cruel
—disse
amavelmente — Não sobreviverá. Anna entreabriu os olhos e franziu os lábios, fazendo ornamento de uma teima que Arthur só podia comparar com a sua. —Ficarei com ele. Seu bondoso coração lhe impedia de ver a realidade. —Como lhe dará de comer? Anna ergueu o queixo e o fulminou com o olhar, castigando-o por atrever-se a falar da
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realidade. —Já pensarei em algo. Notou a determinação de sua voz e soube que não teria maneira de dissuadi-la. Ninguém diria que alguém com essa aparência mansa como a de um gatinho pudesse ser tão teimosa. —Não vale a pena, milady —disse um dos crianças — Jamais poderá ser um bom sabujo. Se quiseres um cão, podemos lhes dar um de seus irmãos. O vira-lata se aninhou sob o braço de Anna, como
se
fosse
consciente
de
que
tinha
encontrado a seu salvador. Anna negou com a cabeça e sorriu. —Não quero a nenhum outro. É a este ao que quero. «É a este ao que quero.» Aquelas palavras ressonaram na cabeça de Arthur. Demônios, por
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um momento quase sentiu ciúmes do maldito cão. O moço encolheu os ombros, como se pensasse: «Que mais se pode fazer?». Estava claro que acreditava que a dama estava doida, mas era a neta do senhor das terras, assim não discutiria com ela. Arthur gostaria de pensar o mesmo quando viu com que carinho arrulhava ao cão, sobretudo porque não queria que vivesse a frustração de cuidar do cachorrinho para tentar lhe devolver a vida. Mas não podia. Aquele cachorrinho poderia ter sido ele mesmo, muitos anos atrás. Era estranho inclusive pensar nisso. Jamais pensava no passado. Os sofrimentos de menino o tinham transformado no guerreiro que era na atualidade. Teve que esforçar-se mais. Teve que treinar mais. Teve que aceitar as habilidades que
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o diferenciavam do resto e as aperfeiçoar até as converter em algo extraordinário. Ele tinha forjado seu próprio destino. Talvez não tivesse nascido guerreiro, mas tinha feito de si mesmo um dos melhores. Houve um tempo em que estava tão concentrado nisso que não pensava em nada mais. Mas não foi sempre assim. Arthur observava as preocupações que Anna tomava
por
aquela
patética
criatura
que
sustentava nos braços e sentiu que algo se removia em seu interior. Voltou o olhar de repente, irritado pelo broto de sentimentalismo que a compaixão da moça despertava nele. Recordava-se a si mesmo que ela era o inimigo. Mas inclusive aos seus ouvidos soava como algo gorado. Sir Arthur se encerrou em seu escudo de silêncio e indiferença, mas Anna estava muito
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ocupada tentando acalmar a bola de pelo escuro que se retorcia entre seus braços para se dar conta disso. Bom, talvez se desse conta, mas estava ocupada. O cachorrinho parecia saber que tinha escapado ao perigo e seu aterrorizado tremor se transformou em choramingos de fome. Faltavam alguns quilômetros para chegar ao castelo quando pediu a Arthur que fizessem uma parada no caminho. Tinha que lhe dar algo de comer. Seus patéticos uivos faziam migalhas seu coração. Embora tivesse ao menos meia hora para que o sol se pusesse, no profundo interior do espessa floresta que havia ao leste do castelo de Dunstaffnage já tinha escurecido. Não gostava da floresta de noite, assim naquele momento agradeceu
que
sir
Arthur
insistisse
em
acompanhá-la. Robby e ele se encarregaram dos
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cavalos, enquanto que ela fazia o próprio com sua nova carga. Envolveu ao cachorrinho na manta escocesa que tinha levado se por acaso refrescasse ao cair a tarde e a usou para fazer um pequeno leito onde o filhote repousasse enquanto procurava algo que lhe dar de comer. Tirou uma de suas finas luvas de couro, encheua de água do córrego e o fechou pelo pulso. Gostaria de ter leite, mas no momento o cachorrinho teria que conformar-se com água. Tirou uma agulha de sua cesta e fez um buraco em um dos dedos. Depois de cortar uns pedaços de um dos pãezinhos, voltou-se para o cão. «Hóstias!», balbuciou imitando uma das imprecações favoritas de seu irmão Alan. O pequeno malandrinho escapou. Anna deixou a luva e os pedacinhos de pão sobre a manta e olhou ao sua redor com inquietação.
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Sorriu. Não tinha ido muito longe. Distinguiu sua silhueta não muito longe de uma árvore grande. Chamou-o, mas o cachorrinho fugiu dela, obviamente
atemorizado
ainda.
Pousava-se
sobre as folhas e a terra como se suas patinhas fossem de madeira. Mas estava muito fraco para fazer muitos esforços, de modo que Anna o apanhou ao cabo de poucos minutos. Tomou entre seus braços e o aproximou ao peito. —Olhe que traquinas —disse com voz afetuosa — não vou te fazer mal. É que não quer comer? O cachorrinho lambeu a ponta do nariz como resposta e Anna caiu na risada. —Então será melhor que voltemos — disse olhando a seu redor e precavendo-se de que tinha ido mais longe do que pensava. Acelerou o passo, ansiosa por voltar para
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córrego, procurando não pensar nas sombras que se obscureciam e se tornavam mais ameaçadoras à medida que a floresta se fechava a seu redor. O coração lhe deu um tombo quando sir Arthur apareceu na frente dela de repente. Por Deus bendito! De onde tinha saído? Não tinha feito ruído algum! —Onde
diabos
tinhas
te
metido?
—
perguntou. Anna abriu os olhos surpresa, ainda mais pela linguagem grosseira que pelo brilho que tinha seu olhar. Parecia inquieto. Preocupado. Tudo, menos indiferente. Olhava-a do mesmo modo que quando a tinha salvado de cair pelo precipício. Quase tinha se convencido de que era imaginação dela. —Soltei-o no chão para lhe buscar comida e escapou — disse aproximando-se do cachorrinho
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para lhe dar um beijinho na cabeça. Arthur, para surpresa de Anna, aproximou-se e acariciou o queixo do cachorrinho. A delicadeza que se desprendia daquele gesto chegou ao coração de Anna. Pensou o doce que seriam essas carícias sobre seu próprio corpo e lhe deu tanta
vontade
atordoada.
de
Jamais
comprová-lo antes
que
desejou
ficou
que
a
acariciasse um homem, e entretanto queria sentir o contato dessas mãos grandes e cheias de calos e cicatrizes de guerra sobre sua pele. Sobre seu rosto. Seu pescoço. E… seus seios. Um ligeiro rubor avermelhou suas bochechas. Por todos os Santos! De onde tinha saído isso? Seus olhares se cruzaram, mas ela afastou o olhar imediatamente por medo de que pudesse adivinhar seus licenciosos pensamentos. —A próxima vez, me faça saber aonde vai —
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disse bruscamente. Sua voz tinha um tom comedido e velado que Anna não chegava a compreender — Não é seguro. Deteve-se de repente e ficou paralisado, como se tivesse ouvido algo. Anna permaneceu atenta, mas não ouvia nada. De fato havia uma estranha calma. Agarrou seu braço como por instinto e se aproximou dele. —O que acontece? —Temos que voltar para os cavalos. É pelo cachorrinho. Desembainhou sua espada e protegeu a Anna com seu braço. Apesar do repentino salto de seu coração, sentiu-se segura. Protegida. E algo mais. Sentiu-se próxima a ele. —O que acontece? —disse com inquietação enquanto tentava não ficar atrás — A que referes, com «é pelo cachorrinho»?
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Ele não respondeu, mas sim a puxou para que se apressasse. —Depressa. Já vêm. —Quem vem? —perguntou com uma voz traída pelo medo — Eu não ouço nada. —Os lobos. Anna se estremeceu e olhou a seu redor com pânico. —Eu não vejo… —Apertou o cachorrinho contra seu peito — Não penso abandoná-lo. Arthur a olhou como se fosse um caso perdido. —Já sei. —Mas então amaldiçoou. Empurroua depois de uma árvore grande, arrebatou-lhe o cachorrinho das mãos e usou seu corpo como um escudo para protegê-la — Fica trás de mim — ordenou — Se lhe disser que corra, faça rápido.
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—Não vou a… Arthur a olhou com fúria. —Fará. Farei todo o possível por salvar a seu cão, mas não permitirei que percas a vida por ele. Anna não compreendia nada. Como podia estar tão seguro? Ela não tinha visto nem ouvido nada. Mas então ouviu. Era um ruído de pegadas do mais leve. Correndo. Dirigindo-se para eles. Como pode saber…? A ninhada saiu de entre as árvores com uma rapidez que gelava o coração. Os lobos eram tímidos por natureza e em geral evitavam aos humanos. «É pelo cachorrinho.» A isso se referia. Queriam ao cachorrinho. A princípio pensou que havia ao menos uma dezena deles, mas quando sua mente se esclareceu o suficiente para poder contá-los viu
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que mal eram a metade disso. —E Robby? —perguntou. Sir Arthur negou com a cabeça. —Ordenei-lhe que ficasse com os cavalos. Suspirou, aliviada. Não queria que o jovem guardião
topasse
com
eles
sem
saber
e
provocasse que os lobos os atacassem. Sir Arthur brandia a espada e se girava de um lado a outro. Os lobos grunhiam, com os lombos arrepiados e os olhos postos no cachorrinho que sir Arthur protegia sob seu braço. Era imaginação dela, ou davam a impressão de estar famintos? Pareciam
permanecer
à
expectativa,
examinando sagazmente a seu competidor, tentando averiguar seu ponto débil enquanto esperavam o momento adequado para equilibrarse sobre ele. Embora não podia lhe ver o rosto, Anna sabia que sir Arthur fazia o mesmo que
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eles. O maior dos lobos se adiantou ao resto, como se quisesse atrair sua atenção. E isso era exatamente o que fazia, conforme advertiu Anna. Os outros tinham começado a rodeá-los por trás. Deus, sim que eram preparados. O lobo chefe queria que sir Arthur se movesse em sua direção para que os outros pudessem atacar pelas costas. Mas em vez disso, sir Arthur agarrou ao cachorrinho pelo cangote e o sustentou no alto. —O que fazes? —gritou Anna. —Com sorte, me liberar do líder da manada. Te prepare —advertiu. Ao ver que não respondia, olhou-a. —Anna! Assentiu com urgência, já que não queria distraí-lo. Sir Arthur girou justo no momento em que o lobo maior lançava seu ataque ao ar em
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busca do inquieto cachorrinho. Sir Arthur moveuse mais rápido do que Anna pensava que fosse possível. Nunca antes tinha visto uns reflexos como os seus. levou as mãos à boca para afogar um grito ao mesmo tempo que ele punha o mascote fosse de perigo e rasgava o ar com o outro braço. Anna voltou o olhar ao ver a linha vermelha que cruzou o gogó do lobo. Um segundo mais tarde ouvia o ruído que este fazia ao desabar-se sobre o chão. Uma vez sem líder, o resto da manada parecia bater-se em retirada. Sir Arthur deu vários passos à frente e brandiu sua magnífica espada por cima da cabeça como se fosse nada, apesar de que o cachorrinho só lhe deixava uma mão livre. A direita, advertiu Anna. Nem sequer era sua mão boa. Outro dos lobos se aventurou a adiantar-se com indecisão, mas um duro golpe com o dorso
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da espada serviu como cura para sua valentia. Depois
disso,
os
lobos
fugiram
do
lugar,
desvanecendo-se na escuridão com a mesma rapidez com a que tinham aparecido. Aquilo não durou mais de um minuto, mas tinha sido o minuto mais longo da vida de Anna. Arthur baixou a espada e se voltou para ela. Anna não se deu conta de quem fez o primeiro movimento, mas se viu rodeada por seus braços, empurrada contra o duro escudo de seu peito. Refugiou sua cabeça nele de maneira parecida com como o fazia o cachorrinho em seu outro braço e deixou que percebesse seu medo. —Estais bem? Ergueu o olhar para olhá-lo. Tinha um rosto impassível, e o único sinal de como lhe tinha afetado aquilo eram as batidas de seu coração. Queria dizer que se encontrava bem, que jamais
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se havia sentido mais a salvo, mas sua boca estava tão perto que o único no que podia pensar era na vontade que tinha de que a beijasse, quão necessitada estava de um beijo dele. Era tão bonito, com esse cabelo castanho escuro
ondulado
e
seus
estranhos
olhos
ambarinos. Gostava de seu queixo com aquela covinha e a pequena separação do nariz no lugar em que provavelmente tinham sido quebrado. Mas de onde não podia afastar o olhar era de sua boca, larga e de uma sensualidade impossível de evitar. Era muito suave e tentadora em contraste com o resto do corpo. Era tão forte, tão protetor… Arthur emitiu um ruído cavernoso e gutural ao mesmo tempo em que a apertava mais contra si. Quando seu olhar pousou sobre seus lábios, Anna soube que a beijaria. Então lhe tocou o rosto com uma mão e sentiu a calosidade de
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seus dedos lhe sustentando o queixo. O coração vibrava como as cordas de um harpa, de uma maneira incrivelmente doce. Tal como ela tinha imaginado. Havia algo ardente em seu olhar que provocava
formigamentos
nas
zonas
mais
pudicas de seu corpo. Olhava-lhe a boca como se queria devorá-la. As sensações eram tão fortes, tão evidentes, que quase podia sentir seus lábios sobre os dela. A suave e erótica carícia de sua
boca.
estômago.
Sentia Um
um
estremecimento
embriagador
aroma
no de
especiarias. Estava tão convencida de que a beijaria que quando, em lugar de fazer isso, separou-se dela, tremeram-lhe as pernas. Arthur afastou o olhar por um instante como se estivesse liberando uma batalha invisível e todo seu corpo se contraiu como a corda de um arco a ponto de disparar-se. De repente se voltou
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para ela, desaparecido já todo o desejo de seu olhar, e lhe entregou o cachorrinho. —Temos que retornar. Naquela ocasião sim, lhe doeu sua gélida indiferença. Para Anna, confusa pela intensidade das reações de seu corpo, por sua debilidade, essa capacidade para controlar-se foi como uma bofetada. Pode ser que ele a desejasse, mas não pensava abandonar-se a seus instintos. Desejo. Isso era o que ela sentia. Isso era o que fazia que lhe acelerasse o pulso e seu corpo ardesse quando pensava que ele estava a ponto de beijá-la. E também essa era a razão da decepção que transpassava sua alma naqueles momentos. Anna apertou o cachorrinho contra si e lhe fez carinhos com a cabeça. Ao menos a esse caía bem. Os olhos lhe ardiam, mas se desembaraçou
com
raiva
dessa
sensação.
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Convenceu a si mesma de que a origem dessa emoção estava nos lobos. Sua vulnerabilidade se devia ao ataque,
não que ele a tivesse
rechaçado. Aspirou fundo e procurou recompor seus confusos sentimentos. Também ela estava disposta a fazer como se aquele momento jamais tivesse existido. Uma vez mais, ele tinha saído em sua ajuda e quase se esquecia de agradecer-lhe, Arthur tentava tirá-la dali, mas ela o deteve. —Obrigada — disse. —Não foi nada — repôs ele tirando a importância. Um cavalheiro modesto? Não pensava que existisse tal coisa. Mas talvez tivesse que ter adivinhado
que
ele
seria
assim.
Parecia
empenhado em passar despercebido. —Sei que provavelmente não acreditará, mas
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em geral não estou tão necessitada de que me resgatem. Arthur fez uma careta levantando o lábio. —Esta vez não foi você, a não ser ele — disse assinalando ao cachorrinho que tinha em seus braços. —Ambos fomos afortunados de o ter aqui cuidando de nós. Sois nosso cavalheiro andante de brilhante armadura. Só tentava brincar, mas a expressão de Arthur voltou a tornar-se séria. —Não acredite em contos de fadas, lady Anna. Acabarão desenganando. Não fez cargo da advertência, mas sir Arthur se equivocava. —Estivestes incrível. Jamais vi ninguém reagir com tal rapidez. Era como se...ficou circunspeta. Voltou a recordar o momento do
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ataque. Como sabia que os lobos atacariam? Isso mesmo tinha acontecido no escarpado. Era quase como se soubesse o que aconteceria, como se o pressentisse antes que efetivamente ocorresse. Por Deus bendito… Isso era o que acontecia. Pôs cara de surpresa e cravou o olhar nele. Poderia ser essa a explicação à estranha intensidade
que
percebia
bulindo
sob
a
superfície? Em princípio o atribuiu a seu estado alerta e de observação tenaz, mas teria algo mais que isso? Anna deu um passo atrás e se tampou a boca com a mão. —Sabias. Arthur notou como se lhe apertassem os músculos e ficava em tensão, enquanto que se preparava para o medo, para a aversão que
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seguia às estranhas ocasiões em que alguém vislumbrava suas incomuns habilidades. Inclusive seus próprios pais o olhavam com incrédula expressão no rosto. De pequeno tentava fingir que não era diferente dos outros. Tentava explicar, lhes fazer compreender que não era nenhum inseto estranho, que simplesmente seus sentidos estavam mais agudos e sua consciência mais desenvolvida, e que sua capacidade de observação e percepção era mais afinada. Não podia ver o futuro. Não tinha premonições. Eram mais como pressentimentos. Mas passado um tempo deixou de dar explicações. Parecia mais fácil não ter que lutar com isso. Assim preferia manter-se à margem e não permitir que ninguém se
aproximasse
o
suficiente
para
ter
oportunidade de adivinhar. Era diferente dos outros. Finalmente sabia. Tinha a sorte de contar
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com habilidades extraordinárias. Estar sozinho não era algo que lhe incomodasse. Diabos, preferia que fosse assim. Mas Anna MacDougall não pensava permitir. Tentava resistir, mas ela seguia esticando a corda. E acabava de ver algo que nunca devia ter visto. Apesar de estar preparado para sua reação, aquele passo atrás instintivo lhe doeu. Parecia que lhe ardessem os pulmões. Fez como que não tinha ouvido suas palavras e se encaminhou de novo para onde estavam os cavalos. Que diabos se importava
o que
pensasse? Teria que estar contente de livrar-se dela. —Espere —disse Anna indo atrás dele — por que estais zangado? Arthur não a olhou, mas sim seguiu seu caminho.
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—Não estou zangado — disse com um tom de voz que revelava justo o contrário. —Espere — repetiu, agarrando-o no braço — Quero falar do que acaba de ocorrer. Por que diabos tinha que lhe tocar sempre? Retirou o braço para largar de sua mão, mas cometeu o engano de olhar a sua cara. —Maldita seja, deixem de me olhar deste modo — bramou. Sua veemência a sobressaltou, o qual era bom, porque dissipava a dor. —Como estou olhando? —Como se acabasse de pisotear a esse seu cachorrinho. Anna ergueu o queixo; os olhos brilhavam de uma maneira perigosa. —Terás que me perdoar. Não me dei conta de que sentiam uma aversão tão forte a meu
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toque. Tentarei recordar no futuro. Acaso estava louca? Teria se rido se não estivesse tão furioso. Aversão a seu toque? Teria que ser justo o contrário. O normal seria que saísse fugindo à carreira, não que o tocasse e, é obvio, tampouco que se ofendesse porque retirasse o braço. Que demônios passava com ela? Não atuava do modo em que se supunha que devia atuar. Inclusive Catherine, a mulher que lhe tinha professado amor, negou-se a estar no mesmo aposento que ele quando a empurrou para afastá-la do lugar no que imediatamente depois cairia uma chuva de pedra. Talvez Anna não tivesse descoberto. —Não
queria
o
fazer
sentir
incômodo.
Simplesmente me parece que o que acabam de fazer é extraordinário.
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De acordo, tinha descoberto. Mas estava claro que isso que adivinhava em seu olhar não podia ser admiração. Apertou as mandíbulas. —Desfazer-se de alguns lobos, qualquer poderia tê-lo feito. Estais exagerando um pouco. Vamos, Robby estará se perguntando o que nos ocorreu. Se pensara que com aquelas palavras a faria calar se equivocava. —Não foi só isso e sabeis. Os lobos estavam muito longe para que pudesse ouvi-los. E mesmo assim sabias que vinham. Sentiu-os antes que qualquer pessoa normal… Estremeceu-se. Por mais que levasse vinte anos agüentando aquilo, seguia estremecendose. Isso era o que mais o zangava. Agarrou-a pelo braço e a atraiu para si, pondo sua boca a escassos centímetros da dela. Inclusive zangado
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como estava, sentia esse arrebatador desejo que lhe nublava a mente e revolvia as vísceras. A moça o pressionava a todas direções: sua incansável sedução, seu doce rosto e seu pecaminoso corpo, seu embriagador perfume, suas malditas perguntas; e não sabia o perto que estava de lhe dar o que estava procurando. Ele não seduzia. Não dançava. Não andava com tolices. Se uma mulher se oferecia, tomava. Assim simples e sem complicações. E assim seguiu atuando. —Olhe — disse com firmeza. Vencer a vontade que tinha de possui-la até deixá-la sem sentido fazia que se desprendesse de qualquer sutileza. Atirá-la em cima da árvore que tinha ante si parecia muito apetecível — Não sei que diabos pensam ter visto, mas te equivoca. Ouvi como vinham os lobos e reagi a isso. Não te
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ponhas a imaginar coisas pelo simples feito de que você não ouviu. —Jamais poderia tê-los ouvido —insistiu — Estavam muito longe. —Para ti. Não estais treinada para identificar os sinais. Esse silêncio artificial, o aroma que traz o vento… Mas ela não atendia a suas explicações. Arthur sentiu o peso de seus olhos sobre o rosto e se arrependeu de tê-la tão perto. —O que tenta ocultar? —Nada.
—Arthur
a
soltou
sem
muita
delicadeza. O escrutínio de seu olhar se intensificou e teve que obrigar-se a não fugir. Por Deus bendito, mas se ele não fugia nada. —Parece-me que estais mentindo —disse Anna em voz baixa — Me parece que não te
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relaciona com outros para que não vejam o que eu acabo de ver. E acredito que agora mesmo tenta te separar de mim por essa mesma razão. Arthur ficou feito pedra. Todo seu corpo esfriou, à exceção de um pequeno lugar na parte mais íntima de seu ser. Isso o tinha ardendo. Não queria sua compaixão, maldita seja. Não era um cachorrinho que necessitava que o resgatassem. Reagiu da única forma que sabia. Olhou-a nos olhos. —Não te ocorre que a razão pela que me separo de ti é que não me interessa? Anna ficou sobressaltada, estremecida pela pura e simples crueldade de suas palavras. Piscou várias vezes, e a cada piscada a queimação no peito de Arthur se tornava mais e mais intensa. Mas não pensava em consolá-la. O fazia para seu próprio bem. E mesmo assim, seu
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trêmulo sorriso quase o desarma. —Não, para minha vergonha, não me tinha ocorrido. Vos rogo, desculpe as moléstias que tenha podido te causar. Com a dignidade de uma grande rainha, deu meia volta e se afastou dele. E Arthur, apesar do fogo que o consumia por dentro, permitiu que o fizesse. Capítulo 8 Aquele foi o trajeto mais longo na vida de Anna. Jamais havia se sentido tão humilhada. Mas quando chegaram ao castelo a humilhação se converteu em raiva. Tinha mentido com isso de que não lhe interessava. Tinha percebido em seus olhos quando a tinha segurado. Claro que lhe interessava. Mas, por alguma estranha razão,
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queria que ela pensasse o contrário. Robby se aproximou para ajudá-la a descer do cavalo e Anna, determinada a provar que aquilo não eram imaginação dela, decidiu lhe dar o
cachorrinho
em
lugar
de
aceitar
seu
oferecimento. —Sir
Arthur
—disse
com
uma
doçura
exagerada — Se tiver a gentileza… Ele a olhou com uma expressão imutável, mas começava a decifrar essas expressões imutáveis, de modo que entreviu o receio que se ocultava debaixo dela. Não restava dúvida. Quando tomou sua mão para ajudá-la a descer, Anna se tombou para frente com todo seu peso, obrigando-o a agarrá-la para não deixá-la cair no chão. Por um longo instante seu corpo ficou estendido sobre ele, com os braços
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ao redor de seu pescoço e as mãos acariciando essa espessa juba que era exatamente tão suave e sedosa como parecia. Ficou cheia de vontade de afundar os dedos entre seus cabelos e grudar seu rosto ao dela. Ele emitiu um som brusco ante esse contato: um rugido. Isso é o que era. Um profundo e masculino rugido. E assim que o olhou nos olhos soube que mentia. Sim lhe interessava. E morria de vontade de tê-la, a julgar pelo apertar de sua boca e o nervoso tremor de seu queixo. Tampouco
ela
permanecia
impassível.
Apesar de que mal pudesse surpreender no lugar que acabou, seu corpo se estremeceu e seu coração pulsava com força ante o frio e duro aço de um peito que mais que de carne, parecia feito de pura cota de malha. Quando a cabeça cessou de dar voltas, soltou-se de braços e deixou que
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seu corpo escorregasse sobre ele antes de afastar-se. Estava tão duro e firme como uma rocha, com todos os músculos do corpo rígidos. Anna notava essa tensão, que se desprendia dele como as chamas de um fogo. —Sinto muito ter feito isso —disse com um sorriso de indiferença — Não sei o que me passa. Arthur entreabriu os olhos maliciosamente, mas deu no mesmo. Tinha provado o que queria. Ela sabia, e o que era mais importante, ele sabia. —Tomes cuidado, milady — a advertiu nesse escuro e velado tom de voz que tinha — Não quererá te ferir fazendo alguma tolice. —Todo um detalhe de sua parte que te preocupes. —Esteve a ponto de lhe dar um tapinha na bochecha, mas pensou que isso podia ser colocar o dedo na chaga. Já tinha obtido sua
291
vitória
— Mas
não
é
necessário
que
te
preocupes. Sei perfeitamente o que faço. Tomou seu cão de mãos de Robby e se pôs em marcha para o castelo. Embora estivesse tentada a fazer, não olhou pra trás. Já tinha visto esse olhar assassino muitas vezes para saber que
aspecto
tinha.
Anna
teria
contentado
deixando as coisas assim, com seu orgulho feminino intacto, de não ser porque despertava sua curiosidade. por que estava tão decidido a livrar-se dela? Ocultava algo, ou simplesmente evitava enredar-se? Era como se fosse cruel de propósito na floresta. Como se ela tivesse acionado alguma mola. Só queria lhe agradecer o que
tinha
feito
e
essas
extraordinárias
habilidades que tinha posto em cena, mas ele tinha tomado como se o acusasse de ser um monstro. Anna mordeu o lábio. Seria isso?
292
Preocupava-se como reagiriam outros? Supunha que aquilo era compreensível. As diferenças não eram bem toleradas na sociedade daqueles tempos e provocavam medo e rechaço. esforçouse em deixar claro que não tinha feito nada extraordinário. Mas tinha feito, ou não? pensou voltando a morder o lábio sem estar segura de tudo. Certamente, naquele momento pareceu. Ocorreu tudo muito rápido. Tinha advertido sinais que ela não percebeu ou houve algo mais? Em qualquer caso, não cabia dúvida de que ele não queria
reconhecer
que
aquilo
fosse
extraordinário. Mais tarde explicou a seu pai o que tinha ocorrido em termos parecidos como quando caiu no escarpado, minimizando em grande parte sua versão da história e dando uma explicação para cada coisa. Seu pai a repreendeu por expor sua
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vida por um cão e voltou a expressar sua gratidão a sir Arthur. Anna não compreendia por que este subtraía importância ao acontecido. Suas qualidades poderiam ser de grande ajuda na luta contra os rebeldes. Com suas aguçadas habilidades, Bruce e sua tropa de foragidos teriam muito mais dificuldade na hora de perpetrar
aqueles
ataques
apoiados
na
emboscada. Mas quando comentou que tinha sugerido a seu pai que se aproveitasse de suas destrezas e lhe fizesse rastreador ou, melhor ainda, expedicionário, parecia que o tivesse sugerido limpar o guarda-roupa. Sir Arthur se zangou muitíssimo com ela. Durante os seguintes dias sentiu uma incomum intensidade em seu olhar cada vez que se encontrava com ela. Agora lhe parecia mais fácil vigiar. E isso tinha que agradecer ao Escudeiro. Ao que
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parecia, seu novo cachorrinho tinha pego carinho a seu salvador. Escudeiro, cujo nome procedia das brincadeiras que os homens faziam a sir Arthur dizendo que por fim tinha um, ia direto para ele assim que Anna dava a volta. Já estivesse no jardim praticando junto aos homens, comendo no salão, ou inclusive nos barracões, o cão o encontrava. Se sir Arthur saía a cavalgar, o cão
o
esperava
todo
o
dia
às
portas
choramingando até que retornava. Aquilo não teria sido tão mau se não fosse porque a pobre criatura se excitava tão cada vez que o via que se fazia xixi. A última vez estivera a ponto fazê-lo sobre o pé de sir Arthur. Dizer que o cachorrinho era uma moléstia para ele era dizer muito pouco. O cavalheiro ignorava ao cão, espantava-o e gritava para que se fosse, mas por mais que o rechaçasse o
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cachorrinho não se dava conta. Escudeiro mostrava devoção pelo castigo. Anna entendia o sentimento. Ao que parecia ambos tinham essa mesma debilidade pelos cavalheiros arrumados de traços duros, cabelo castanho ondulado, olhos marrons com nervuras douradas e o queixo com covinha. Atraía-lhe. Talvez sentisse igual ao cachorrinho, que sir Arthur necessitava a alguém junto a ele. Sua distância se percebia como solidão; seu afastamento, como um escudo que estava disposta a atravessar. O que esperava encontrar atrás dele era algo que entretanto não sabia. E à medida que passavam os dias sem causas para a suspeita, as desculpas para rondálo começavam a fraquejar. Mas se não o vigiava por seu pai, por quem o fazia? Essa era a pergunta que se perguntou no caminho do grande salão para o jantar. Seu pai
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estaria já à espera de um relatório e teria que dar-lhe. Não tinha averiguado nada. As maiores ofensas do cavalheiro eram sua propensão a quietude e uma aguda habilidade para ignorar sua pessoa. Sabia que tinha chegado o momento de pôr fim à espionagem. Mas por que se mostrava tão relutdiante da deixá-lo tranqüilo? Sir Arthur não tinha nada a ver com os homens que normalmente a cativavam. Mas não podia negar que lhe atraía, e muito. mais do que jamais lhe tinha atraído ninguém. Quase o suficiente para fazer que se esquecesse de que ele era uma pessoa totalmente errada para ela. Sim, já era hora de dar por finalizado aquilo. Estava a ponto de sair da escada em caracol da torre principal em direção ao corredor que levava a grande salão quando uma bola de cabelo cinza e negra adiantou a toda carreira e
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dando uivos. Anna, a ponto de cair, murmurou uma imprecação muito imprópria de uma dama ao se dar conta de que provavelmente não tinha fechado
bem
a
porta
da
câmara
que
compartilhava com suas irmãs e Escudeiro conseguira escapar uma vez mais. Mas, por sorte, a porta fechada ao final da escada o deteve.
Quando
alcançou
ao
pequeno
endiabrado, este estava esperando-a junto a aquela porta, ladrando e movendo a cauda com excitação. Ao recolhê-lo lambeu o rosto. —Aonde acredita que vai? —perguntou — A ver, me deixe que adivinhe. Sir Arthur? —O cão ladrou como se afirmasse — É um caso perdido, pequenino. Quando aceitará que não o quer a seu redor? —O cão uivou e inclinou a cabeça como se não a tivesse ouvido bem. Anna suspirou e negou com a cabeça. Talvez devesse
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atender ela mesma a esse conselho — Está bem, está bem. Sinto — disse pondo-o no chão e abrindo a porta — Mas logo não diga que não lhe adverti isso. Esperava que o cachorrinho se dirigisse para o grande salão, mas em vez disso foi para o pátio. Voltou a suspirar e seguiu seus passos até o exterior. O frio vento do mar e a bruma que caía atravessaram seu fino vestido de lã, lhe fazendo pensar que deveria ter levado uma capa, apesar de que quando tinha baixado para comer não
tinha
previsto
fazer
nenhum
passeio
vespertino, e que à exceção dos guardas que cobriam os muros, o barmkin estava deserto. Todos deviam estar dentro comendo. Então por que não o fazia também sir Arthur? Escudeiro cruzou pelo centro do pátio onde estava o poço e passou pela frente das cozinhas
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para a asa noroeste. Ao que parecia, o cavalheiro estava nos barracões. O cachorrinho esperou na porta que Anna chegasse. Fosse estava tudo muito tranqüilo. Inquietantemente tranqüilo. E aquele
canto
especialmente
do
pátio
escuro.
em
Ainda
particular,
não
tinham
acendido as tochas da entrada. À medida que se aproximava se avolumava sua apreensão, e perguntou de repente se aquilo seria uma boa idéia. Segui-lo até os barracões à luz do dia era uma coisa e outra diferente fazê-lo de noite. O cachorrinho
também
parecia
tê-lo
pensado
melhor, porque tinha deixado de ladrar e a olhava com expressão vacilante. —Você foste o que nos colocou nisto — murmurou — Já é muito tarde para acovarda-se. Se falava com cão ou o dizia a si mesmo era difícil de decidir. Entreabriu a porta e olhou para o
300
interior. Seus olhos examinaram a escura sala, somente
iluminada
pelas
brasas
meio
consumidas do fogareiro que havia na parede em frente. Escudeiro, ao que parecia tinha vencido seu medo, saiu correndo para o centro do aposento deserto,
adiantando-se a Anna.
Murmurou outra de suas maldições favoritas, tentada de deixá-lo ali, mas em vez disso o seguiu até o interior. A porta se fechou de repente a suas costas lhe fazendo dar um salto do susto. Procurou manter o pulso calmo, sem saber por que tremia como um pudim. —Escudeiro — sussurrou para chamá-lo, embora não visse razão para isso. Não havia ninguém ali. O cachorrinho a ignorou e foi até o outro lado do longo e estreito edifício de madeira, saltando sobre o camastro12 que ela sabia que pertencia a 12
cama bamba, meio velha ou quebrada.
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sir Arthur. Seu pulso se acelerou de novo ao aproximar-se e ver o monte com seus pertences estendido sobre o jergón. Em qualquer lugar que tivesse ido, não pensava demorar muito. mordeu o lábio enquanto considerava. Aquela era a oportunidade que sempre tinha esperado para aprender algo a respeito de sir Arthur Campbell. Pôs a um lado seu sentimento de culpa e se dispôs a revisar as coisas com cuidado, sem saber exatamente o que procurava. Além de sua malha, suas meias com perneiras, várias mudas e um broche de prata que não tinha visto antes, havia pouco mais, e certamente nada de natureza pessoal. Os cavalheiros levavam pouca bagagem; não sabia o que esperava encontrar.
Talvez
algo
que
ajudasse
a
desentranhar o mistério. Escudeiro rebuscava entre sua cota de
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malha, tentando chegar a algo que havia sob o jergón. Não obstante, não teve tempo de investigá-lo, porque nesse mesmo momento Anna ouviu um ruído que a deixou gelada: uma porta que se abria e voltava a fechar-se. Passos. O resplendor de uma vela. Pelos pregos de Cristo, havia retornado! O sentimento de culpa se transformou em pânico. Em vez de ficar ali de pé e dar alguma desculpa plausível para entrar nos barracões, agarrou ao cachorrinho do camastro e olhou a seu redor em busca de algum lugar onde esconder-se. Viu um poste de madeira enorme ao outro lado do aposento e se ocultou atrás dele justo no momento em que o círculo luminoso se fazia visível. Dava a impressão de que tinha detido a respiração. precaveu-se muito tarde de quão estúpido era esconder-se. O cão poderia
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delatá-la em qualquer momento. Mas Escudeiro parecia ter captado seu nervosismo e tinha a cabeça oculta no vão de seu braço. Sir Arthur colocou a vela junto ao camastro e lhe ofereceu um claro olhar do que estava fazendo. Os olhos lhe abriram sem querer ao vêlo atirar à cama a toalha que levava a pescoço. Tinha o cabelo e a camisa molhados. precaveuse, muito tarde, pelo que estava fazendo e da razão
pela
que
seus
pertences
estavam
pulverizadas sobre a cama. Estava tomando um banho. Teve que afogar um gemido de estupor quando o viu puxar a camisa pela barra, passar por cima da cabeça e atirá-la junto à toalha. A boca lhe secou ao tempo que tentava assimilar a massa vibrante de músculos que o cobria de cintura para acima. Céu santo, era um homem formidável!
Ombros
largos,
cintura
esbelta,
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braços grossos e fortes e uma capa de pele sobre outra de músculos que cruzavam seu ventre de lado a lado. Jamais tinha visto com antecedência a uma pessoa que estivesse tão prodigiosamente… bem formada. Qualquer um teria dito, pela perfeição daquele corpo, que se tratava de uma estátua esculpida em pedra. Salvo porque era feito de carne e ossos, carne e ossos tão quentes… Tinha acertado ao pensar que seu corpo conduziria as marcas de sua profissão. As cicatrizes se estendiam livremente por seu ventre e seus braços. As piores pareciam um talho enorme que lhe atravessava o flanco e uma feia marca em forma de estrela que tinha no ombro. Ficou pensando. Uma estranha marca negra aparecia embaixo dessa cicatriz no mesmo braço. Concentrou o olhar em plena escuridão
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em uma tentativa de distinguir o desenho do que parecia uma tatuagem. Embora sabia que as marcas não eram algo fosse do comum entre os guerreiros, nunca antes tinha visto uma de perto, de modo que tinha curiosidade. Talvez muita. inclinou-se para frente e Escudeiro tomou aquilo por um convite. Saltou de seu regaço e correu em direção ao guerreiro meio nu. Quando Arthur descobriu que não estava sozinho ficou furioso. Quando percebeu quem estava ali e de que tinha engenhado para saltar todas suas defesas, ficou lívido. Fazia anos que ninguém não o surpreendia e o fato de que se tratasse de lady Anna piorava as coisas. Parecia uma prova justa do que aquela moça o distraía de suas obrigações. Suas intercessões já o tinham posto em perigo ao lhe fazer chamar muito a atenção. E não tinha nem idéia de no que
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se estava colocando. Era culpa dela que se convertera no explorador de Lorn, pelo amor de Deus! Ignorou ao fastidioso cachorrinho que saltava a seus pés e olhou fixamente para a escuridão para a fazer saber que a tinha descoberto. Pouco depois Anna saía de seu esconderijo depois do poste. —Sir Arthur — disse alegremente, apesar de que o nervoso gesto de espremer saia entre as mãos a delatasse — Que surpresa! Escudeiro e eu saíamos a dar um passeio e… bom, a porta estava aberta, e parece que queria lhe ver. porque entrou aqui antes que pudesse detê-lo e… ficou em silêncio, olhando-o no rosto. Estava tão nervosa que suas bochechas empalideceram antes de ruborizar-se. Até esse momento Arthur
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não se lembrou de que não vestira a camisa. Mas a estúpida mucosa não teve suficiente sentido comum para olhar a outro lado, ou ao menos fazer como que não se dava conta. ficou olhando descaradamente e ele interpretou à perfeição o que estava pensando. «Jesus.» O ar que havia entre ambos começou a esquentar-se. Arthur percebia quão afetada estava, não só pela vergonha, mas sim por algo muito mais poderoso: pura excitação. Anna se agachou para recolher ao cão. —Estais… estais ocupado. Já íamos. —Quieto! —ordenou-lhe à besta infernal antes que pudesse saltar sobre os braços de Anna. Seria melhor que aquele pequeno saco de pulgas descarado não tentasse mijar em cima dele de novo. Tanto Anna como o cão ficaram
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paralisados para ouvir sua voz. E ambos o olhavam com cara de não ter quebrado um prato. Não sabia qual dos dois representava mais problemas.
Mas
era
a
moça
quem
lhe
preocupava. Agarrou-a pelo braço e a sacudiu ante si. —Lady Anna o que viestes a fazer aqui na realidade? —Nada, eu… — disse baixando o olhar para o monte de coisas que havia sobre sua cama, declarando assim sua culpabilidade. A Arthur gelou o sangue. Olhou para o lugar onde tinha deixado o mapa e se aliviou ver que ela não o havia tocado. Entretanto, algumas das coisas não estavam em seu lugar. Então caiu na conta. Assim que isso era o que acontecia? Era possível que seu interesse por ele fosse um mero pretexto para lhe espiar? Pelo sangue de Cristo,
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tudo fazia sentido. Lorn tinha usado a sua filha para vigiá-lo. Se não estivesse tão furioso inclusive teria rido diante da ironia. —Estavas me espiando —disse sem mais — É por isso pelo que parece minha sombra desde que cheguei? Seu pai pediu que me vigiassem? Anna tragou a saliva. Um rubor rosado subiu por suas bochechas, mas Arthur não podia saber se era por sentir-se culpado ou insultada. —Não sei do que estais falando. Eu não sou sua sombra. E muito menos o estou espiando. Mentia. Se fosse um homem já estaria morto pelo que tinha feito. Podia lhe partir o pescoço com uma só mão. Deus… Acaso acreditava que aquilo era um jogo? Se em algum momento a verdade chegasse a seu conhecimento, teria que… Devia proteger seu disfarce a toda custo,
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assim melhor seria que se assegurasse de que isso nunca ocorresse. Jamais poderia lhe fazer dano. Aproximou-a mais a si e sentiu como tremia sobre seu corpo. Inclusive através da bruma de ira que o assolava podia sentir o suave e embriagador perfume de sua pele. O desejo o torceu como um torniquete. A moça não tinha nem a menor ideia do perigo ao que enfrentava, e não só porque o estivesse espiando. Ficava completamente a sua mercê. Não sabia o perto que
estava
de
aproveitar-se
da
situação.
Estavam sozinhos. À luz das velas. Tinha o corpo dela grudado a seu torso nu e a cama justo ali, preparada para acolhê-los. Se é que dava para usar a cama. No momento, a parede lhe parecia perfeita. Seus músculos se esticaram. Conter-se era algo que parecia cada vez mais difícil.
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—Então há alguma outra razão pela que a tenha encontrado em minha cama? Os olhos de Anna se abriram completamente. —Não estava em sua cama —replicou com indignação — Não estavas aqui. Escudeiro ansiava
lhe ver e eu simplesmente
tinha
curiosidade — disse elevando o queixo — Talvez se fosses mais aberto, eu seria menos curiosa. Arthur ficou de pedra. Estava realmente a pequena bruxa culpando-o de que ela mesma rebuscasse entre suas coisas? Jamais cessaria de lhe surpreender o manejo magistral da lógica nas mulheres. —E saciastes sua curiosidade? —Não
—
replicou
Anna,
evitando
seu
sarcasmo. Depois pousou o olhar sobre seu braço — Isso que têm aí é uma tatuagem? Que não pronunciasse a imprecação que
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aflorou a seus lábios dava testemunho de quanto podia controlar-se. O leão rampante de seu braço era o único laço exterior que tinha com os Guardiões das Highlands e sua intenção era tanto servir de vínculo entre os guerreiros como um meio de identificação em caso de que surgisse a necessidade. Mantinha-o oculto para evitar perguntas, e procurava banhar-se e mudarse de roupa de baixo quando não havia ninguém ao redor. Quão último precisava era que Anna MacDougall o visse. Mas assim tinha ocorrido. Consciente de que o dano já parecia, disse: —Sim, uma lembrança de meus dias como escudeiro. —É a primeira vez que vejo uma. antes que pudesse examiná-lo mais de perto, e Deus o evitasse, de que pudesse tocá-lo de novo como parecia estar a ponto de fazer, Arthur
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a soltou, inclinou-se para tirar uma camisa do monte de roupa e a passou por cima da cabeça. Cobrir sua nudez deveria ter aliviado um tanto a tensão, mas a inocente moça não teve o sentido comum de ocultar sua decepção, e à Arthur voltou a lhe ferver o sangue. —Não
deverias
estar
aqui
—
disse
bruscamente. —Têm medo de que o agarrem em uma situação comprometida, sir Arthur? Sabia que não fazia mais que provocá-lo, mas não estava de humor para jogos. A moça esperava muito de sua venerabilidade como cavalheiro.
Ele
era
um
highlander,
jogava
segundo suas próprias regras. E nesse preciso momento teve que fazer uso de tudo que tinha para não lhe ensinar uma lição a respeito dos limites de um homem na hora de controlar-se.
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—Tomem cuidado com o que pedes, lady Anna. É possível que o consigas. —A intensidade de seu olhar não deixava lugar a dúvidas sobre a que se referia — Não fui eu quem apareceu em sua câmara sem que ninguém me convidasse. A pequena pulsação de seu pescoço se acelerou e suas bochechas se ruborizaram timidamente. Mas seus olhos, esses preciosos olhos do azul do mar, seguiam desafiando-o. —Não lhe interesso. Recordas? ficou paralisado. Tinha todos os sentidos a flor de pele. Estava a somente um fio de distância de lhe provar que se enganava. Mas houve algo em sua expressão que fez que lhe tremesse o pulso e optasse por uma rápida retirada. —Além disso… foi Escudeiro quem quis vir — disse inclinando-se para acariciar ao cachorrinho, que não cessava de dar voltas sobre seu jergón.
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O
cachorrinho
ladrou
travessamente
e
começou a escavar com sua cabeça sob a manta. «Por todos os demônios.» Aquele maldito cão não estava jogando, pensou Arthur. O que fazia era tentar chegar a uma coisa. —Fosse — disse Arthur para espantar ao problemático vira-lata. Mas já era tarde. Tinha visto. —O que tem aí? —disse Anna ao cão. antes que Arthur pudesse evitar, já estava puxando
o
canto
do
pergaminho
que
o
cachorrinho tinha tirado de debaixo da manta. Amaldiçoou por dentro, com vontade de arrancar de suas mãos, mas se obrigou a fazer como se não passasse nada. Como diabos explicaria que tinha um mapa das terras de seu pai? Melhor seria que pensasse algo rápido. —Parece um desenho — disse Anna, e
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ergueu o olhar — Foi tu que fizestes? —Arthur não disse uma palavra. Ela voltou o olhar ao mapa e passou os dedos pelas linhas de tinta arranjadas pela pluma — É precioso. A admiração de sua voz o afetava mais do que queria. Recordou o quanto gostava sua mãe aqueles desenhos a giz que fazia quando pequeno. Uma vez que começou com seu treinamento já não teve tempo para essas coisas. Logo ela morreu e todo aquilo careceu de importância. Separou-se de sua mente aquelas lembranças. Pelo sangue de Cristo, a mucosa havia conseguido de novo. Em lugar de inventar uma desculpa para salvar sua pele, atuava como essa ferinha do demônio dela, lambia com suas adulações. —Não é nada — disse com desdém. Anna o olhou com aqueles olhos muito
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observadores que viam de muito mais do que ele queria. Sua expressão era implacável e não o delatou absolutamente, mas de algum modo ela sentiu que estava incômodo. Felizmente o interpretou mal. —Não há por que envergonhar-se — disse com um amável sorriso ao tempo que lhe punha uma mão sobre o braço. por que diabos tinha que ser tão doce e lhe sorrir desse modo? Sua vida estava livre de complicações e assim era como gostava que fosse. Não queria sentir-se atraído para ela. Mas era impossível resistir a tanta calidez e gentileza. —me parece uma maravilha. Esse modo em que soubestes captar o ar da campina… Têm um olho artístico para a perspectiva e os detalhes. Arthur sentiu uma pressão no peito e se disse a si mesmo que era alívio. Estava claro que Anna
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pensava que era um esboço e que ele se envergonhava de que soubessem que tinha um passatempo tão impróprio de um guerreiro. Tinha uma sorte enorme de que o mapa estivesse pela metade. Embora essa era a razão de que não estivesse em sua bolsa, onde tinha que estar. Mas se desse a volta… Seria
muito
complicado
encontrar
uma
desculpa para as notas sobre o número de homens, cavalheiros, cavalos, e as provisões de armas. Amaldiçoou sua torpeza por não ocultar o documento antes de ir ao lago. Pensava que não o incomodariam. Mas teria que imaginar. Ao que parecia, não havia lugar algum no que pudesse livrar-se dela. Deu um passo em sua direção com a mão em alto e uma expressão séria. Obviamente não tinha nenhuma vontade de renunciar ao mapa,
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porque ficou duvidando para depois sustentá-lo em alto e voltar a olhá-lo à luz da vela que ele tinha colocado sobre uma mesa junto ao camastro. —O que são essas marcas? O mundo veio em cima de Arthur quando percebeu de que ela acabava de ver as sombras do que tinha escrito por trás. —Deixe estar já, Anna. «me deixe estar.» Anna ergueu o olhar e seus olhos se encontraram diante da trêmula luz da vela. —Não posso. —Suas palavras pareceram surpreendê-la a ela mesma tanto como a ele. Entre suas sobrancelhas se desenharam umas rugas de desconcerto — É que não sente? Arthur não queria ouvir o que lhe dizia, não queria reconhecer aquilo que era impossível. Ela
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era filha de Lorn. Estavam em lados opostos. Maldita seja, ele não sentia nada absolutamente. —Acreditei que tinha deixado muito claro quando voltávamos da vila. —Ouvi o que dizia, mas eu senti algo diferente — respondeu Anna com os olhos brilhantes. Arthur sentiu um arrebatamento de fúria e o lançou contra ela. —O que sentistes era luxúria. —Aproximou-a contra si para que sentisse todo o poder de seu corpo — É isso o que querer, Anna? Ela ficou sem fôlego. Tentou livrar-se de seu abraço, como um passarinho revoando em uma jaula, mas ele não a soltava. Desta vez não. Já o tinha atormentado durante suficiente tempo. Tinha que aprender que aquilo não era nenhum jogo, que suas inferências eram perigosas em
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mais de um sentido. Não era somente o perigo que supunha para sua missão. Era uma dama e o que ele queria conseguir era algo que ela não podia lhe oferecer. —me solte —disse Anna, escrutinando seu rosto com ansiedade — Está me assustando. Arthur pôs a mão sob seu pescoço e acalmou a agitação de seu pulso com o polegar. —Bem. Deus sabia que era ela quem mais o assustava. Instantes depois, Arthur punha sua boca na de Anna e se deixava levar por esse desejo que dava voltas em seu interior como um torvelinho a ponto de desatar-se. Capítulo 9
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Arthur a beijou com todas suas forças, apertando os lábios, com vontade de castigá-la por fazer isso com ele. Por tentá-lo. Distraí-lo. Por ser tão odiosamente doce. Queria lhe dar uma lição. Mas ao primeiro contato com sua boca pareceu que lhe puxavam uma marreta no peito. Bastou um rápido roçar para que o duro impacto dessa sensação aplacasse sua ira. O desejo invadiu seu corpo e o alagou com um intenso desejo. «Jesus.» Tinha sabor de anjos. Esses lábios eram muito suaves. Sua pele cheirava muito bem. E seu cabelo… «Deus, que glorioso cabelo…», pensou enquanto deixava que os sedosos cachos de cabelo passassem entre seus dedos. Era como de outro mundo. Ela era de outro mundo. Um anjo enviado para lhe torturar. Grunhiu de prazer e a soltou um pouco,
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suavizando o beijo ao mesmo tempo que acariciava, lenta e tranqüilamente essa vez. Embalou-a junto a seu peito e beijou seus lábios com doçura, roçando-a, provando-a, saboreando a deliciosa sensação que oferecia aquela boca movendo-se sob a sua. Era algo incrível. Mais doce inclusive do que teria imaginado ou atrevido a fazer. Do primeiro momento em que pôs os olhos em Anna MacDougall a tinha desejado, mas se negava a pensar nisso como algo possível. E não era possível, demônios. Estava mau. Era perigoso. Uma perdição. Não deveria estar fazendo isso. Mas tampouco podia deter-se. Não era mais que um beijo, dizia-se a si mesmo. Algo que já tinha feito incontáveis vezes. Nada que escapasse a seu controle. E entretanto não sentia aquilo como um beijo qualquer.
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«Sentia.» Essa era a diferença. Em geral, não fazia. Para ele um beijo não era mais que um meio para conseguir um propósito, um aplique ao ato principal e não algo que provocasse prazer em si mesmo. Não obstante, beijá-la propiciava prazer, mais agradável de que deveria. Estava claro que acontecia algo estranho. Seu corpo não reagia da maneira devida ante um simples beijo. Estava ardendo. E por que demônios lhe pulsava tão depressa o coração? O desejo era algo controlável. Manejável. Não era a primeira mulher que lhe punha quente, mas não se viu tão consumido pela necessidade nem nos momentos prévios que fez com a primeira concubina em seus tempos de escudeiro. Estava duro feito pedra. Doía-lhe. Jamais na vida estivera tão quente. Ao menos a luxúria era algo compreensível.
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O que não entendia era esse outro sentimento. A sensação que lhe enchia o peito e fazia que seu coração parecesse a ponto de explodir. A sensação de ter uma embriagante necessidade de protegê-la. De resguardá-la, de cuidar dela. O sentimento que dizia que a abraçasse e não a soltasse nunca mais. A intensidade dessas reações deveria ter servido como advertência. Mas estava muito ocupado deleitando-se com as emoções,
aspirando
sua
doce
fragrância,
passando os dedos entre seus sedosos cabelos e saboreando a delicadeza de sua pele para ver a advertência. Tudo em que podia pensar era na mulher que se derretia entre seus braços e que jamais poderia ser dele. Anna pensou por um arrepiante momento que talvez o tivesse levado muito longe. O olhar que percebeu em seus olhos justo antes que a
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beijasse foi aterradora. Apreciou então o reflexo de um homem ao que não tinha visto antes. Não era um cavalheiro distante e controlado, e sim um guerreiro selvagem e indomável. Um homem que parecia muito mais perigoso do que ela pensava. A ferocidade de seu beijo a sobressaltou. Era como se toda essa escura energia concentrada que ela sentia acumulando-se por debaixo explodisse de uma vez em um cruel abraço. Anna percebia a raiva contida no castigo inclemente de sua boca. Aquilo era para assustar, mas inclusive no caso de que ele estivesse furioso e perdesse o controle, sabia que jamais poderia a machucar. O que não sabia era por que estava tão segura. Mas estava. E então, antes que pudesse reagir, antes que pudesse sacudir a comoção do corpo, antes que desse tempo pensar em quão bom era seu sabor,
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algo escuro e distintamente masculino, tudo mudou por completo. Arthur emitiu um gemido e foi como se toda sua raiva desaparecesse. O beijo cuja primeira intenção foi castigar, se convertia em súplica. O abraço que queria esmagar a embalava agora como se de um bebê se tratasse. O que se dispunha a ser uma violação cheia de paixão se transformava em uma devastadora ternura que ela jamais teria sido capaz de imaginar em um guerreiro de tal ferocidade. Era algo perfeito. Ele era perfeito. Cada uma das carícias de sua boca desatava um vendaval de novas sensações. Os breves beijos que mudara com Roger não tinham nada a ver com aquilo. Não a faziam sentir como se estivesse entrando em um forno de lenha. Não produziam comichões em lugares nos que não
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devia nem sequer pensar. Não provocavam um tombo em seu coração nem que tremessem as pernas. E, certamente, não a faziam pensar em romper a camisa em migalhas e estender suas mãos na pele nua que ficaria gravada na memória para sempre. Seu corpo era tão grande e poderoso que seus duros músculos impunham como um muro de granito. Cada centímetro de suas carnes de aço proclamava sua profissão de guerreiro. Mas Anna jamais imaginou que aproximar seu corpo, que o aço fosse tão agradável. Nem quão quente podia ser o peito de um homem. Nem o segura e protegida que poderia sentir-se. Ou a vontade que teria de entranhar-se em seu interior e ficar ali. E isso que fazia com a boca…Deus... Era como um sonho. Seus lábios eram muito
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suaves; seus beijos, muito ternos. Era possível que se tratasse do mesmo homem? Como podia o implacável guerreiro que a olhava com tanta indiferença beijá-la com essa intensidade? Se até seu aroma parecia tirado de um sonho: sabão com um pingo de água salgada do lago. Mas não era um sonho. Jamais tinha vivido um sonho tão estranho. Não sabia o que lhe acontecia. Parecia desvanecer-se. Empapada de calor. Sensível e afetada. Receptiva desde a primeira até a última de suas terminações nervosas. Parecia que seu corpo não lhe pertencia. O prazer tinha tomado o mando e não a deixaria escapar. Não podia pensar em mais nada que no bem que se sentia. Em sua talentosa boca. O sutil roçar desse queixo contra seu queixo. O peso da mão sobre sua cintura. A suave carícia de seus dedos. E cada vez que a provocava com o roce de seus
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lábios a intensidade dessa sensação aumentava. Erguendo-se. Fazendo-a suplicar por algo mais. Algo que Anna não compreendia, mas que necessitava desesperadamente. Arthur tentava tomar-lhe com calma, mas seus gemidos estavam o deixando louco. Embora queria afundar-se dentro dela, tinha ainda mais gana de lhe dar agradar. De modo que no lugar de forçá-la até deixá-la sem sentido, convenceu-a por meio das longas e lentas carícias de sua boca. E ela respondia. Vá se respondia. A princípio de maneira tímida, mas depois se viu persuadida para fazê-lo com mais atrevimento. Passou-lhe as mãos ao redor do pescoço e abriu a boca ao tempo que emitia um entusiasta gemido que lhe chegou diretamente até a virilha. Essa resposta instintiva teve sua réplica em um bramido de pura satisfação masculina que lhe
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atravessou todo o corpo. Não havia nada que quisesse com mais gana que lhe colocar a língua até o fundo, tomar aquilo que lhe oferecia, mas era consciente de sua inocência, assim optou por roçar seus lábios com a ponta da língua por um instante e retirá-la imediatamente. Advertiu a excitação que a embargava, mas não a deixou pensar. Voltou a afundar a língua em sua boca, dessa vez durante mais tempo, para que se acostumasse à sensação. E logo, quando notou que se relaxava em seus braços, fez a ver o que queria. Enlaçou sua língua na dela e foi introduzindo cada vez com mais profundidade em sua boca. Faltou pouco para que sua apaixonada resposta o fizesse em migalhas. O desejo, contido durante tanto tempo, fluía agora com liberdade em uma tormenta torrencial. Notava
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como seus mamilos se endureciam contra seu peito e o atormentavam, incitavam-no. Ao sentir a força suplicante que chegava desde sua virilha, grunhiu e se mergulhou dentro dela. Anna respondia a seus beijos e apertava seu doce corpo contra o dele. O movimento instintivo de quadris com o que roçava seu membro estava a ponto de ser excessivo. A intensidade da sensação era desmesurada. Alterava o sangue. O coração quase saía do peito. As rédeas lhe escorregavam das mãos à medida que o desejo se encarregava delas. Seus beijos ficaram mais selvagens, mas insistentes, mais desumanos. Arthur lhe pôs a mão em um seio e ela emitiu uma exclamação de surpresa que ficou afogada por seus próprios gemidos. Eram cotas de prazer inimagináveis. Tinha sonhado com esses seios durante semanas e agora que os tinha em suas
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mãos…
Eram
incríveis.
Grandes,
suaves,
ocupavam sua palma inteira. Acariciou por cima a dura ponta de seu mamilo, estimulando-a até que ela deixou escapar um suave gemido entre seus lábios e suas costas se arquearam procurando suas mãos. Nua. Queria-a nua. Deus, sim, era um caramelo. Tão disposta… Parecia não contentar-se com nada. Estava descendo em espiral por um túnel de sensações. Transladando-se com rapidez a um lugar sem retorno. Queria que se corresse. Queria acariciá-la com as mãos, saboreá-la com a boca e enchê-la com seu pau. Queria tê-la úmida e morrendo de vontade. Queria fazer Anna ser dominada pela paixão. dizia a si mesmo que no final teria acabado recuperando o sentido, que teria arrumado para
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reencontrar-se com o controle que nunca antes tinha falhado, mas já jamais poderia saber. Foi o cão quem o fez por ele. O cachorrinho começou a uivar, provavelmente decidindo que já o tinham ignorado durante bastante tempo. Aquilo foi suficiente para atravessar a neblina. O impacto com a realidade foi como receber um balde de água fria. Arthur percebeu de repente a loucura que estava cometendo. Deixou de beijá-la e a separou de si com mais força do que pretendia. Anna ficou sobressaltada pela surpresa. Durante
um
instante,
simplesmente
permaneceram olhando o um ao outro à luz das velas com suas pesadas respirações como testemunha maldita do que estavam fazendo. Deus santo. A incredulidade se mesclava com o
cepticismo.
Que
demônios
acabara
de
acontecer? Ele nunca tinha perdido o controle de
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tal modo, jamais. Um beijo, maldita seja. Supunha que não houve mais que isso. Um simples beijo para lhe ensinar uma lição. Não significava nada. Tinha beijado a centenas de mulheres. Não era algo que devesse o perturbar, nada que tivesse que o deixar tão… afetado. E estava, muito mais do que gostaria de admitir. Tocá-la tinha sido um engano. Em que diabos pensava? Não, não tinha parado pra pensar. Estava furioso. Atormentado. viu-se empurrado além de toda razão por suas provocações e sua sedução. Mas por mais que condenasse sua loucura, quando olhava seus inchados lábios e bochechas rosadas o único em que podia pensar era em fazê-lo de novo. E isso o afetava muito mais. O bastante para que não voltasse a acontecer de novo. —foi
suficiente
para
satisfazer
sua
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curiosidade, milady? Anna ficou estupefata. —O que queres dizer com isso? Arthur inspirou longa e profundamente em uma tentativa de acalmar o violento pulsar de seu coração. —Significa que podes agradecer a seu cão em conservar a virtude intacta. —Olhou-a com olhos duros e implacáveis — Mas lhes juro pelo mais sagrado que, se seguirem com seus joguinhos,
na
próxima
vez
não
será
tão
afortunada. Anna se estremeceu como se a tivesse golpeado. —Como podes dizer isso? Como podes me beijar de tal modo e fazer como se não significasse nada? Como se não sentisses… —O que sentia era luxúria. Não cometam o
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engano de pensar que era outra coisa. Ele não faria. Não podia fazê-lo. Deu um passo para trás com os olhos arrasados em lágrimas. Arthur sentia sacudidas e queimação no peito. —por que fazes isso? por que tenta ser cruel de propósito? Os punhos se fecharam diante da quase irreprimível necessidade de consolá-la. Só a estava
protegendo
contra
uma
situação
impossível e o fazia por seu próprio bem, pelo bem de ambos. —Simplesmente lhes estou fazendo uma advertência. acabaram-se os joguinhos. Seja o que seja o que estavam fazendo aqui, acaba-se a partir de já. —Anna ergueu o olhar para olhá-lo sem dizer uma palavra, tentando procurar algo
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em seu rosto que jamais encontraria — Agarre seu cão e vá —acrescentou Arthur com uma estranha dureza na voz. Anna recolheu ao cachorrinho e se foi dali sem dizer mais uma palavra. Enquanto Arthur ficava olhando sua marcha, teve a sensação de que o aposento ficava às escuras. Só ao final de tudo isto se lembrou do mapa. Olhou no chão. Ali estava, a seus pés, no mesmo lugar em que deve ter caído quando tinha escorregado da sua mão, aterrissando pela outro lado. Se tiver dado uma olhadela ao chão, Anna teria visto as notas escritas no verso. Mas, de algum modo, o desastre que conseguia evitar não parecia nada em comparação com aquele outro que não pode evitar. Mal atravessou a soleira, as lágrimas de humilhação e dor transpassaram a couraça de
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orgulho de Anna. Não pensava lhe dar o gosto de presenciar o dano que lhe tinha feito. Desolada, não só pelo beijo, mas sim pelo cruel rechaço que seguiu a este, refugiou-se em sua câmara. não estava em situação de ver ninguém,e era muito afortunada de que todos parecessem estar celebrando o jantar. Comunicou a sua donzela que tinha dor de cabeça e fingiu estar dormindo quando chegaram suas irmãs. A criada deve ter descoberto que Anna mentia assim que a olhou à cara, mas se mostrou leal e seguiu o jogo. O último que gostaria Anna naquele momento era responder a perguntas ou falar a respeito do que tinha passado. Nem sequer queria pensar no que tinha passado. Deus, o que dizia era certo. Terrivelmente certo. Se não tinha feito algo desastroso foi por um fio, ou nesse caso pelos uivos de um
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cachorrinho. Seus beijos. Sua língua. Por Deus bendito, a incrível sensação de ter essas mãos sobre seus seios. Tudo tinha sido muito bom. Não queria que aquilo se detivesse. Tinha sucumbido a um desejo que ia muito além de sua experiência em resistir. O instinto superou à cautela, o prazer dominava à razão e a necessidade primária de unir-se
a
ele
fizeram
que
tudo
o
resto
desaparecesse sob sua esteira. Seu corpo ardia de desejo por ele. acendia-se e clamava por que a tocasse. Pensou com um rubor que a cavidade escondida entre suas pernas
estava
molhada.
Ele
poderia
tê-la
desprovido de sua inocência sem que apenas oferecesse resistência. As lágrimas correram por suas bochechas e um áspero soluço abriu passo através de seu peito. Não, sem que oferecesse
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nenhuma resistência. O coração encolheu diante daquela atroz realidade. Desejava-o. O suficiente para
fazer
precipitado
algo e
inconcebível.
estúpido
que
Um
jamais
tanto poderia
desfazer-se. Mas não foi somente desejo. Ao menos não para ela. Quando Arthur a sustentou entre seus braços e a beijou, Anna se emocionou de uma maneira assustadora. O que sentia por ele era intenso, poderoso… diferente. Mas esse beijo que tanto tinha significado para ela não tinha sido mais que uma cruel forma de lição para ele, um meio para que deixasse de «ser sua sombra». A acusação era tão mais humilhante pelo tanto que havia de verdade nela. Era certo que o estivera perseguindo, e não teria sido tão mau se só o tivesse feito porque o pedia seu pai. Mas depois do que acabara de passar, Anna tinha que
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admitir a realidade: não se tratava simplesmente de um trabalho encomendado. Seu interesse por ele tinha tanto que ver com ela mesma como com seu pai. Talvez mais, inclusive. Sua cruel lição tinha funcionado. Na manhã seguinte, já deixadas para trás as lágrimas, embora não a dor que as provocavam, Anna informou a seu pai do quanto tinha descoberto. Sir Arthur Campbell era exatamente o que aparentava: um ambicioso e capaz cavalheiro concentrado na futura batalha. Deixou de lado qualquer
dúvida
que
albergasse
sobre
a
possibilidade de que ocultasse algo. Satisfeito com suas estimativas, seu pai ordenou que cessasse em seus esforços. A atenção que dirigia ao jovem cavalheiro tinha sido muito comentada e não queria que sir Arthur começasse a suspeitar. Anna não disse que já
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era tarde para isso. ficou em seu aposento pelo resto do dia, aliviada de libertar-se de sua carga. Embora nada gostava mais que estar rodeada por sua família e em
um
salão
resplandecente
repleto
de
partidários do clã, aquele era um dia estranho em que queria estar sozinha. Temia também que seu mau humor fosse óbvio e não queria dar preocupações
desnecessárias
a
sua
bem-
intencionada mãe e a suas irmãs. E mais, depois daquele beijo, sentia-se ainda muito vulnerável para topar com ele de novo. Talvez fosse uma atitude covarde, mas necessitava tempo para repensar. Tinha pensado uma e outra vez no acontecido, e cada vez estava mais convencida de que não tinha trabalhado mau. Era impossível que Arthur Campbell a beijasse de tal modo sem sentir nada
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por ela. Embora ele queria a fazer acreditar que somente se tratava de desejo, no fundo de seu coração Anna sabia que havia algo mais. Entretanto, ele procurava afastar a de seu lado por alguma razão. Sua frieza e aquelas cruéis palavras pareciam calculadas justamente com essa intenção. Mas por que? E o que era mais importante, por que estava tão se desesperada por encontrar um motivo? Porque lhe importava. E, ao que parecia, albergava a estúpida e infantil esperança de que ele não acreditasse realmente no que havia dito, de que também a ele lhe importasse. Aquilo não devia revestir importância alguma. Era uma pessoa completamente equivocada para ela. Um frio e distante guerreiro ao que não importava nada nem ninguém, tão somente a seguinte batalha a liberar. Mas por mais que
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queria colocá-lo nesse saco, o certo era que não cabia nele. Não era nem tão insensível como queria a fazer ver. Tinha notado sua emoção quando a agarrou depois de que tropeçasse no escarpado, e também quando os salvou dos lobos a Escudeiro e a ela. E além disso, a forma em que a tinha beijado não deixava dúvidas a respeito de que era um homem capaz de emoções profundas. Jamais tinha sentido atração alguma pelos guerreiros, mas com
Arthur era justamente o
contrário: nunca lhe atraiu tanto um homem nem seu corpo. Quem teria imaginado que os músculos podiam ser tão… excitantes? Aquele físico forjado para a batalha teria que representar tudo o que ela odiava da guerra e, entretanto, jamais se sentiu mais protegida e segura que em seus braços. E o desenho. Isso foi o mais
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surpreendente de tudo. Que a mesma mão que brandia a espada e a lança com tal capacidade de aniquilação pudesse desenhar com tal mestria e beleza… Arthur Campbell não era um típico guerreiro. Havia algo mais nele. Desde o começo, Anna sentiu que era diferente. Não só porque fosse reservado, mas sim pela estranha intensidade que se concentrava sob sua superfície e o afastava do resto. Talvez essa aura de solidão e tristeza influíra também em sua atração para ele. Inclusive diante de seu irmão e outros homens parecia um estrangeiro satisfeito de ser, um homem que não necessitava a ninguém mais. Mas todo mundo necessita a alguém. Ninguém podia querer, realmente, estar sozinho. Talvez não soubesse que havia outras opções… A sombra dessa possibilidade abriu passo através
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do coração de Anna. Apertou contra seu peito o cachorrinho que jazia enroscado sobre seu regaço e beijou a suave pelagem de sua cabeça. Talvez aquele homem fosse como Escudeiro e necessitasse
que
alguém
lhe
desse
uma
oportunidade. Alguém que lhe oferecesse um pouco de afeto. No dia seguinte Anna já se sentia um pouco melhor. Voltou a sentar-se junto a seu irmão no estrado para tomar o café da manhã. O pulso alterava cada vez que alguém entrava na sala. Estava preparada para vê-lo. Queria comprovar se encontrava bem. Estava segura de que quando seus olhares voltassem a cruzar-se saberia se lhe importava ou não, se sua crueldade não era a não ser uma maneira de mantê-la a distância, como fazia com todos outros. À medida que transcorria a refeição e
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Arthur não aparecia, Anna começou a inquietarse. O indomável bater de seu peito cessou em seco quando entraram os Campbell e o resto de seus
homens.
Infelizmente,
esse
estranho
comportamento não passou desapercebido. —Não está aqui — disse Alan, colocando sua mão sobre a dela. Anna, agarrada por surpresa, afastou o olhar da entrada. —Quem não está aqui? Mas
o
quente
rubor
que
tinha
suas
bochechas a delatava. Alan estreitou sua mão com carinho. —Campbell. Obviamente tinha acertado de qual deles se tratava. Anna engenhou para oferecer um lânguido sorriso, sem incomodar sequer em fingir que não
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sabia do que falava. O interesse que mostrava pelo cavalheiro não passava desapercebido para seu protetor irmão. —Somente
queria
lhe
pedir
um
favor.
Escudeiro vagou toda a manhã como alma penada e me perguntava se sir Arthur poderia levar-lhe com ele quando saísse a cavalgar. O olhar de seu irmão sugeria que não poderia enganá-lo com uma desculpa tão ruim. —Terá que buscar a outro que faça exercício com seu cão de caça por um tempo. Uma sensação de angústia escorregou por seu peito até atendar-se incomodamente em seu estômago. A voz lhe tremeu. —A que te refere? preparou-se para o pior, mas havia uma parte dela que já sabia o que Alan responderia. —Campbell
partiu
junto
a
Ewen
para
350
patrulhar as meridionais entre os castelos do Glassery e de Duntrune. Pai suspeita que os MacDonald estão tramando algo novo. Estará fosse vários dias, pode ser que semanas. «Fosse. Foi embora.» Como podia partir sem dizer uma palavra depois do que tinham compartilhado? Anna sentiu uma angústia no peito que a oprimia tanto que teve a sensação de que arrebentaria da pressão. —Entendo — sussurrou. Era
uma
parva.
convenceu-se
de
que
significava algo especial para ele pela singela razão de que ele era importante para ela. convenceu-se de que talvez fosse diferente apesar de ter visto seu verdadeiro ser. Alan entreabriu os olhos. —ocorreu algo? É que fez algo que não…?
351
—Nada —disse Anna negando com a cabeça irritada — Não aconteceu nada. Nada significativo. Afastou a mão da de seu irmão e se cruzou de braços. Queria fazer uma bola e arrastar-se pelo chão, mas não o faria. Não merecia. —Representa algo para ti, Annie querida? Tem interesse por ele? Pensava que somente fazia um favor a nosso pai. Não estava a par de que Alan conhecesse suas incomuns atividades, mas talvez não teria por que se surpreender tanto. Dada a idade de seu avô e a enfermidade de seu pai, Alan vinha assumindo cada vez mais responsabilidades. Anna se perguntou o que era o que sabia. Supunha que não tudo, porque se fosse assim não estaria tão tranqüilo. —E assim é —assegurou, para depois
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inspirar profundamente e voltar a encher os pulmões de ar — Não significa nada para mim — disse. E dizia a sério. Sua primeira impressão tinha sido a correta: Arthur Campbell era um homem com um pé na porta. Jamais poderia lhe oferecer a estabilidade que ela ansiava. Quão único faria, se ela o permitia, seria lhe partir o coração. Capítulo 10 —Está
uma
porcaria,
Guardião.
Que
demônios está acontecendo com você? Arthur
procurava
não
mostrar
seu
aborrecimento, mas aquele despachado tinha uma habilidade assombrosa para colocar o dedo na chaga. Não acontecia nada, demônios. Nada que não se curasse com uma noite inteira de
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sono. Mas não tinha tido uma noite tranqüila desde que saíra de Dunstaffnage dez dias atrás. Seus sonhos eram invadidos por uma moça de grandes olhos azuis e cabelos loiros. Uma moça cuja expressão ao sair dos barracões ainda o perseguia. Sempre estava transbordante de alegria. Essa foi uma das primeiras coisas que o atraiu desde o começo. Mas ele a tinha entristecido. De fato, seu rosto dizia que a tinha destroçado. Desejava com toda vontade que já não albergasse ternos sentimentos por ele. Isso seria estúpido. «Muito estúpido», disse a si mesmo. Esticou a mandíbula. Estava claro que não só invadia seus sonhos, a não ser todos seus pensamentos. Levava Anna MacDougall no mais profundo. Não podia entender por que não deixava de pensar nela. Tinha fugido, algo que
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sempre fazia quando uma mulher começava a pedir algo mais que momentos de cama, mas dessa vez não dava resultado. Quão único tinha conseguido era ficar com os nervos a flor da pele. Estava seguro de que essa irritante incapacidade para concentrar-se acabaria quando a visse e se assegurasse de que estava bem. Deveria ser capaz de tira-la da cabeça. Concentrar-se em sua tarefa. E não poder fazer o punha furioso. Mas tinha muito claro que não queria explicar nada daquilo a MacSorley. riria dele por toda vida. —Eu também me alegro de lhe ver, Falcão — disse observando
ao gigante das ilhas e
reparando nas rugas de tensão que sulcavam seu rosto sob a fuligem cinza. Os guerreiros dos Guardiões das Highlands, além de levar uma couraça negra e mantas escuras, sujavam pele
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para confundir-se com a noite e assim mover-se sigilosamente através das sombras — Talvez devesse lhes perguntar o mesmo, não? O homem que havia junto ao Falcão Erik MacSorley emitiu uma exclamação aguda, algo que recordava à risada, mas que tinha mais de brincadeira que de diversão. —A mulher o tem pego pelos ovos. Falcão está que salta cada vez que ouve um ruído, acreditando que será o mensageiro. —Lachlan MacRuairi, conhecido pelo nome de guerra de Víbora entre os Guardiões das Highlanders, sacudiu a cabeça expressando seu rechaço — Não há nada mais patético. Falcão esboçou um amplo sorriso. —Minha mulher pode me agarrar pelos ovos tudo o que queira. E já veremos quão tranqüilo está você quando te tocar.
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Uma escura sombra pareceu sulcar o rosto do MacRuairi, um tanto que seu penetrante e inteligente olhar brilhou como o de um gato selvagem no meio da noite. E pensar que as pessoas dizia que Arthur as punha de cabelos em pé… —antes que isso ocorra gelará o inferno. Já tive uma esposa. E prefiro que me arranquem os ovos e me coloquem isso pelo nariz antes que ter outra. De todos os membros dos Guardiões das Highlands, MacRuairi era o único que não caía bem a Arthur e em quem não confiava. Oriundo das Highlands Ocidentais e descendente do poderoso Somerled, rei das Ilhas, tinha o coração negro, muito mau gênio e uma língua viperina. MacRuairi, igual à serpente desalmada da qual recebia seu nome de guerra, também contava
357
com um golpe mortal silencioso. Os sentidos de Arthur se despertaram desde o começo, o advertindo que atuasse com cautela. Mas
não
se
necessitavam
qualidades
extraordinárias para advertir a ira que emanava do MacRauairi, ou melhor dizendo, sua raiva. O que perturbava
Arthur era a escuridão que ia
associada a essa raiva. Uma escuridão que não tinha feito mais que aumentar desde que os ingleses capturassem à esposa do rei, sua filha, sua irmã e a Bela MacDuff estando estas sob sua custódia. Somente pensava em as resgatar. Meses atrás, tinha tentado libertar a Bela da jaula que pendia no mais alto do castelo do Berwick, mas aquilo se mostrara uma tarefa impossível, inclusive
para
os
guerreiros
de
elite
dos
Guardiões das Highlands. Tinham conseguido libertá-la de seu cruel cativeiro fazia pouco
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tempo,
embora
ninguém
sabia
onde
se
encontrava. Entretanto, MacRuairi era um homem útil. Além de brandir com mestria as espadas que tinha cruzadas à costas, era capaz de entrar e sair de qualquer lugar. Sua falta de consciência também parecia valiosa quando era preciso fazer tarefas
desagradáveis.
Para
ganhar
aquela
guerra todos eles teriam que sujar as mãos. as do MacRuairi simplesmente estavam mais sujas que as de outros. Somente MacRuairi estava menos integrado que Arthur nos Guardiões dos Highlands. A maioria dos homens não confiava no hostil ilhéu, e faziam bem. O líder da Guarda, Tor MacLeod, o tolerava e tinha chegado a algum tipo de entendimento com seu antigo inimigo de sangue, mas somente William Gordon e MacSorley
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pareciam lhe apreciar sinceramente. —Nunca
diga
jamais,
primo
—disse
MacSorley — Seu problema foi te casar com a mulher errada. Um destes dias chegará a adequada —acrescentou, para logo fazer uma pausa e o olhar com expressão matreira — Se é que não o tem feito já. Arthur suspeitava que MacSorley se referia a Bela MacDuff, condessa de Buchan, que não tinha
demorado
para
mostrar
quão
mal
combinava com o infame guerreiro e pirata. Arthur pensava que o sentimento era mútuo, mas tampouco levava ali tempo suficiente para saber se MacSorley falava a sério. Mas se ele estivesse em seu lugar, vigiaria bem suas costas durante os seguintes dias. MacRuairi pôs cara de querer matá-lo. —Não tem nem puta idéia do que falas.
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MacSorley simplesmente sorriu. —Vá, que linguagem mais vulgar. Acaso hei tocado sua fibra sensível? Não por uns dias. Arthur vigiaria suas costas durante uma semana inteira. MacRuairi parecia a ponto de lhe saltar ao pescoço. —Estou já até as pelotas de ouvi-lo. É como um padre tentando converter pagãos. Pulveriza seu veneno a respeito das maravilhas do matrimônio em outro lugar. Não me interessa. O amplo sorriso de MacSorley parecia enfurecer ainda mais a seu parente. Arthur não podia acreditar que estivesse ouvindo o petulante cantar as excelências do matrimônio e da «mulher adequada». A arrasadora personalidade de MacSorley e seu atrevido encanto atraíam quase tanto às mulheres como o bonito rosto do MacGregor. Falcão amava às mulheres e as
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mulheres amavam a ele. Era difícil pensar que sentaria cabeça com uma só. Tinha que ser uma excepcional mulher. O enorme viking sempre tinha um bando de mulheres preciosas de corpos exuberantes a seus pés. Arthur, consciente de que MacSorley não pararia de se meter com seu parente até que se atracassem a golpes, mudou de tema. —Para que queriam me ver? Assumo que tem que ser importante para nos arriscar a um encontro como este. O rei tomava grandes precauções para preservar a identidade de Arthur. Os encontros só eram arranjados em caso de necessidade, por meio de mensagens cifradas em algum dos numerosos
monumentos
de
pedra
que
salpicavam a campina, tais como o círculo de menhires13 no que se reuniram aquela noite. O rei 13
Os Saxões chamavam ao grupo das pedras eretas (menhires) «Stonehenge» ou «Hanging Stones» (Pedras Suspensas), enquanto os escritores medievais se referem como «Dança de Gigantes». Inigo Jones, famoso arquiteto do século XVII que fez o primeiro estudo sério
362
Robert
sentia
uma
conexão
pelo
passado
ancestral da Escócia, e aquelas pedras místicas pareciam uma alusão adequada a sua guarda secreta formada pelos melhores guerreiros da Escócia. A maioria das comunicações se fazia através de mensageiros, rara vez se arriscava Arthur a encontrar-se com seus camaradas da Guarda. Depois de infiltrar-se entre os MacDougall, converteu-se em uma tarefa ainda mais difícil. Tinha perdido muita da liberdade de movimentos que desfrutava trabalhando a seu controle. Nessa noite, teve que escapulir do castelo de Duntrune quando tinha anoitecido e esperar com todas suas forças que ninguém notasse sua ausência. MacSorley ficou sério. sobre Stonehenge, considerou-o um Templo romano. Mas William Stukeley, um estudioso de Monumentos e Franco-Maçom do século XVIII, convenceu muita gente de que se tratava de um Templo construído pelos druidas britânicos. Só no século XX os arqueólogos estabeleceram a idade real do Monumento e chegaram a conclusões mais realistas acerca da sua finalidade. A zona de Wiltshire, nos arredores de Stonehenge, é rica em ruínas Pré-Históricas. Woodehenge, Durrington Walls, Cursus e mais de 350 sepulturas são testemunho da intensa atividade comunal dos habitantes, que pastoreavam animais, semeavam trigo e adoravam os seus Deuses na Planície de Salisbury e em torno dela. A construção de Stonehenge teve início cerca de 3500 a. C
363
—Sim. Recebemos notícias semana passada de que vinhas ao sul. Me alegro de que visse a mensagem. Arthur procurava revisar os monumentos com tanta freqüência como podia. Quando viu as três pedras menores distribuídas em um triângulo no centro se deu por informado: era a chave para responder assim que fosse possível. Era a mesma mensagem que ele tinha deixado na cova norte do castelo Dunollie antes de partir para o sul. Ao ter saída para o mar, aquela cova era o lugar mais seguro para uma incursão dos homens de Bruce e estava a somente uns quilômetros de Dunstaffnage. —Dou por certo que se sabiam de onde partira, é que recebestes o meu. MacSorley assentiu. —Surpreendeu-nos muito que partissem de
364
Dunstaffnage. Arthur se esforçou por ocultar suas emoções para que não traísse a bruma de culpa que se estendia por sua consciência. Maldita seja, não é que tivesse esquecido sua missão. Simplesmente tinha que sair dali. —Não foi possível evitar —disse sem dar mais explicações — Lorn tem medo de que Angus Og esteja tramando algo. acompanhei a seu filho Ewen para ver o que podemos averiguar. —Meu primo sempre está tramando algo — disse MacSorley do poderoso chefe MacDonald — Está mobilizando a sua frota para a batalha contra os MacDougall. —Isso mesmo que acreditava. O ataque por mar contra os MacDougall seria tanto ou mais importante que o ataque por terra.
365
Bruce tinha pensado pressionar ao Lorn em ambas direções. Essa era uma das razões pelas quais as habilidades do MacSorley eram tão valiosas. Ele seria o encarregado de dirigir o ataque pelo mar. —Lorn
está
bem
informado
—
disse
MacRuairi. Arthur fez uma careta. —Sim, está. Mas fui incapaz de averiguar como consegue. Não apareceu nenhum clérigo estranho por ali, nem tampouco vi mensageiro algum. MacSorley sorriu. —Por isso é pelo que o temos feito vir. Interceptei um dos mensageiros do Eduardo quando se dirigia para o norte com uma missiva para
Lorn.
É
uma
mensagem
que
Lorn
aguardava, embora não as notícias que ele
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esperava —disse ampliando seu sorriso — O rei Eduardo declinou a petição de Lorn de enviar tropas adicionais ao norte. E graças a meu primo aqui presente, sabemos para onde se dirigia o mensageiro. Arthur não tinha que perguntar como tinha conseguido
que
falasse.
MacRuairi
sempre
conseguia que o fizessem. —Ao priorado do Ardchattan. Arthur estremeceu de emoção. O priorado estava perto de Dunstaffnage, justo no coração de Lorn. Aí a tinham: a oportunidade que estavam esperando. —Assim estão usando clérigos — disse Arthur. Era o que ele suspeitava. —Isso parece —concedeu MacSorley — Quão único têm que fazer é vigiar a igreja e ver quem vai recolher a mensagem. Como cavalheiro
367
de Lorn, sua presença não será comprometedora em caso de que o descubram. Quando poderá escapar ? —Partirei ao amanhecer. —Poderá
explicar
essa
necessidade
repentina de voltar para castelo? —perguntou MacRuairi. —Alguém terá que voltar para informar ao Lorn. Oferecerei-me de voluntário. Arthur ansiava partir imediatamente uma vez que teve clara a missão, mas tomou uns minutos para
comprovar
como
estavam
seus
companheiros da Guarda. MacSorley e MacRuairi eram os únicos membros dos Guardiões das Highlands que estavam no oeste, vigiando as águas. MacKey, Gordon
e
MacGregor
estavam
ao
norte,
mantendo as rotas livres de mensageiros e
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semeando o caos e a destruição em torno de Ross, por isso tinha feito às mulheres, e o resto da equipe permanecia no este junto ao rei. Aríete —Robert Boyd— e seu companheiro, Dragão —Alex Seton— acabavam de retornar de uma missão bem-sucedida ao sudoeste, com sir James Douglass e sir Edward Bruce, o único irmão que ficava ao monarca. O rei Robert tinha perdido rês irmãos em um ano, duas às mãos do MacDowell, o homem que tinham feito sair de Galloway com o rabo entre as pernas. Também Seton tinha perdido a um irmão. —Notaram se Aríete e Dragão estão lutando no mesmo lado? —perguntou Arthur. O fatal emparelhamento entre Seton, um cavalheiro inglês, e Boyd, o homem que odiava tudo que remetia a Inglaterra, foi um dos obstáculos
mais
complicados
durante
os
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primeiros momentos da Guarda. —Estão pior que nunca — disse MacSorley com tal expressividade que a Arthur ficou claro que falava a sério — Dragão mudou depois da morte de seu irmão. Está furioso e a maior parte de sua fúria a dirige contra Aríete. —O sorriso voltou para seu rosto — Mas há boas novas. Acho que não sabe a quem trouxeram com eles, capturado perto do castelo do Caerlaverock em Galloway? —A quem? —perguntou Arthur. —A meu antigo companheiro, sir Thomas Randolph. Arthur amaldiçoou sem ocultar sua surpresa. —E o que fez o rei? A notícia de que seu jovem sobrinho passou para o lado dos ingleses no ano anterior tinha significado um tormento para o rei, que tentava
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reconquistar seu reino. Infelizmente, mudar de lado era algo muito usual. O mesmo rei Robert o tinha feito muitas vezes durante os primeiros anos de guerra, mas a deserção de Randolph chegou num momento especialmente difícil. No momento mais baixo de sua luta. MacSorley negou com a cabeça mostrando seu rechaço. —Perdoou-lhe. Em minha opinião com muita facilidade. Especialmente depois de que o moço teve a coragem de criticar seu tio por lutar como um pirata e não como um cavalheiro. —Ao que parecia, Falcão fracassou em sua tentativa de deixar rastro no guri — disse MacRuairi secamente. —Pode ser —disse MacSorley — Mas terei outra oportunidade. O rei me prometeu mandarme de novo para que o adestre.
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Arthur arqueou uma sobrancelha. —por que me dá a sensação de que o jovem cavalheiro terá seu castigo depois de tudo? MacSorley encolheu os ombros de um modo não muito inocente. —Conseguirei
fazer
desse
moço
um
highlander — disse olhando a Arthur com ironia — Espero que você não tenha esquecido, sir Arthur. Se vê muito elegante com seu traje de cavalheiro. A brincadeira esteve mais perto da verdade do que o esperado. —Que
se
foda,
Falcão.
Queres
que
demonstre isso? MacSorley soltou uma gargalhada. —Pode ser que mais tarde. Minha esposa me arrancará as bolas se vier o mensageiro e não estou ali. E você deveria voltar para castelo de
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Duntrune antes que descubram que partistes. Já tinham se despedido Quando Arthur se recordou. —Pegue — disse tirando o mapa que tinha acabado dias atrás — É para o rei. MacSorley o sustentou no alto à luz da lua para vê-lo melhor. —Demônios, não está nada mal. O rei estará encantado. Necessitará para sua incursão pelo oeste. Mandarei um mensageiro em seguida. Arthur assentiu. —E eu mandarei notícias assim que tenha algo. —Airson an Leòmhann — disse MacSorley. «Pelo leão»: o símbolo do reino de Escócia e o grito de guerra dos Guardiões das Highlands. Arthur repetiu as palavras e se deslizou entre as sombras sem saber quando os veria de novo
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ou se tão sequer teria ocasião de fazê-lo. Na guerra não havia nada seguro. menos de vinte e quatro horas depois já estava em seu posto. De sua posição depois do pasto do outeiro ao leste do priorado tinha uma visão vantajosa tanto da igreja de pedra com planta de cruz como do claustro quadrangular que dava proteção aos monges ao sul. O priorado de Ardchattan, estabelecido por Duncan MacDougall, lorde de Argyll, uns setenta e cinco anos antes, era um dos três monastérios valliscaulianos14 da Escócia. Arthur não sabia muito a respeito dessa estranha ordem monacal, salvo que eram conhecidos por seguir um estrito código. A dez quilômetros de Dunstaffnage, na ribeira norte do lago Etive, Ardchattan era a convocação perfeita para enviar mensagens dali, sobretudo 14
Monges beneditinos bastante severos
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sabendo que o prior pertencia ao clã MacDougall. Tinha sido um dos primeiros lugares nos que se fixara a sua chegada no mês anterior. Mas apesar do ter sob vigilância durante vários dias, Arthur não registrou mais visita para os monges que as de um par de mulheres da vila. Agora, estendida a armadilha, não tinha mais que esperar para conseguir por fim algumas respostas, umas respostas que o fariam estar mais perto de cumprir sua missão para o rei Robert e de ver o John de Lorn pagar pelo que fez a seu pai. Quatorze anos eram muitos, mas ele seguia recordando como se tivesse passado no dia anterior.
Aos
seus
doze
anos
estava
desesperado por impressionar ao homem que era um rei para ele. Ainda se lembrava dos reflexos do sol na cota
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de malha de seu pai, que cobriam a figura do Cailean Mor, o Grande Colin, com uma auréola de luz prateada quando congregava seu guarda para a batalha no barmkin do castelo de Innis Chonnel. Naquela ocasião, seu pai tinha baixado o olhar para olhar a aquele filho ao que tentava ignorar a maior parte do tempo. —É muito pequeno. Quão único conseguirá é que o matem. Arthur estava a ponto de dizer algo em sua defesa, mas Neil o parou em seco fulminando-o com o olhar. —O deixes vir, pai. Já tem idade. Arthur notou o olhar de seu pai sobre ele e procurou não cair sob o peso de seu escrutínio, mas jamais em seus doze anos de vida se havia sentido tão fraco de forças. Pequeno para sua talha. Fracote. Débil. E ainda por cima disso,
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monstruoso. «Não sou um monstro.» Mas isso era o que via nos olhos de seu pai. —Mal pode levantar a espada — disse o pai. A vergonha que refletia sua voz rasgava como uma faca. Arthur sabia o que estava pensando: «Como pode este miúdo mirrado ser sangue de meu sangue?». Um sangue que tinha forjado a alguns dos guerreiros mais ferozes e duros das Highlands. Os Campbell nasciam como guerreiros. Todos menos ele. —Eu me encarrego dele —disse Neil pondo uma mão sobre o ombro — Além disso, pode ser que nos seja de ajuda. Seu pai enrugou o sobrecenho, incomodado por que o recordassem as estranhas habilidades de Arthur, mas assentiu.
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—Simplesmente te assegure de que não se meta no meio. Arthur estava tão emocionado que mal podia controlar-se.
Talvez
aquela
fosse
sua
oportunidade. Pode ser que ao final tivesse ocasião de lhe provar a seu pai que suas habilidades poderiam ser úteis, como Neil havia dito. Mas a coisa não foi como ele esperava. Estava muito excitado. Muito ansioso. Forçava muito e se precipitava muito. E estava muito emocionado. Seus sentidos não respondiam do modo em que normalmente faziam. aproximavam-se das fronteiras entre as terras dos Campbell e os MacDougall, justo depois da borda leste do lago Avich, perto do cordão de Lorn, o velho caminho das colinas de Lorn que usavam os boiadeiros e os peregrinos em direção
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a Iona. Neil e ele cavalgavam na vanguarda junto ao explorador do terreno, antecipando-se a qualquer ataque surpresa do inimigo por aquele estreito caminho. Cruzaram um vau em um pequeno córrego e detiveram a marcha perto do Loch na Sreinge. —Não tem nenhuma intuição ainda? Arthur negou com a cabeça, com o coração pulsando a toda pressa e o suor acumulando-se sobre suas sobrancelhas em sua tentativa de afiar os sentidos. Mas aquela era sua primeira batalha e, desvanecida já a emoção, era presa do medo e da ansiedade. —Não. Então ouviram. Depois deles, a não mais de cinqüenta metros ao outro lado da arborizada ladeira. Gritos de ataque. Neil amaldiçoou e o ordenou ocultar-se atrás
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de uma árvore. —Fique aí. Não te mova até que venha por ti. Para seu próprio horror seus olhos se alagaram em lágrimas, acrescentando mais miséria a seu desprezo por si mesmo. Como tinha podido falhar? Como não tinha percebido sua chegada? Todo aquilo era culpa dele. Tinha uma oportunidade se por
a prova, de mostrar
suas habilidades, e em vez disso deixava em desvantagem à única pessoa que confiava nele. —Sinto muito, Neil. Seu irmão o obsequiou com um sorriso alentador. —Não é tua culpa, moço. Era a primeira vez que saía de campanha. A próxima sairá melhor. A confiança cega de seu irmão nele não fazia a não ser piorar as coisas. Queria ir atrás deles, mas seu pai tinha razão, quão único conseguiria
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seria lhes estorvar. Pareceram transcorrer horas até que o fragor da batalha se desvaneceu e Neil seguia sem voltar. Arthur, temendo que algo ruim tivesse acontecido a seu irmão, não pôde esperar mais. Se arrastou entre as árvores com cuidado e se dirigiu para o campo de batalha. De repente se deteve. Quão sentidos acabavam de lhe trair afloravam de novo. O choque do aço contra o aço parecia rodeálo por toda parte, impossível de distinguir, mas algo lhe disse que tinha que girar para a esquerda. Sentiu um arrebatamento de pânico e começou a correr na direção da que provinham os sons. Arrastava a espada entre as folhas e a terra, e se esforçava por não tropeçar à medida que recortava através das árvores e subia engatinhando uma pequena costa para encontrar refúgio atrás de uma rocha enorme.
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Então os viu. Dois homens, a pouca distância do resto, ocultos pela curva que fazia a ladeira, estavam liberando um feroz combate de espadas na base de uma pequena cascata. tratava-se de seu pai e de um homem ao que somente tinha visto de longe uma vez na vida: seu inimigo, John MacDougall, lorde de Lorn, filho do chefe do clã MacDougall. Arthur
conteve
a
respiração
enquanto
observava como os dois homens, ambos na plenitude
de
sua
maturidade,
mudavam
poderosas cutiladas com suas espadas. Quando já parecia que aquilo não poderia durar muito mais, seu pai ergueu a espada com ambas as mãos por cima da cabeça e a afundou sobre seu oponente. Arthur esteve a ponto de gritar de alivio ao ver que Lorn caía de joelhos pela força do golpe e lhe escapava a espada das mãos.
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gelou o sangue do medo. Sabia que estava a ponto de presenciar sua primeira morte no campo de batalha. Teve vontade de tampar os olhos, mas tirou o chapéu incapaz de olhar a outro lado. Era como se soubesse que ocorreria algo importante. O sol se refletia no elmo de Lorn. Seu pai ergueu a espada, mas em lugar de sentenciálo a morte colocou a afiada ponta sobre o pescoço. Os homens estavam muito longe. A cascata devia ter afogado o som de suas vozes. Era impossível que pudesse ouvi-los. Mas o fazia. —A batalha terminou —disse seu pai — Chamem a seus homens; os Campbell ganharam por hoje. —Arthur jogou um olhar para o outro lado da curva, perto do córrego, e comprovou que seu pai dizia a verdade. O corpo de seu inimigo
jazia
junto
ao
leito
do
regato,
383
avermelhando as águas com seu sangue — Rendei-vos —ordenou seu pai— e lhes perdoarei a vida. Arthur viu o brilho de ódio nos olhos de Lorn incluso depois do elmo com nasal que levava. Tinha a boca torcida pela raiva. Levou-lhe certo tempo, mas ao final assentiu. —Sim. Os Campbell tinham ganho! Arthur estava cheio de orgulho. Seu pai era o melhor guerreiro que jamais tivesse visto. O Grande Colin baixou a espada e começou a afastar-se dali. Arthur sentiu uma intuição, mas seu grito de advertência chegou muito tarde. Seu pai se voltou bem a tempo para que a folha da adaga do John de Lorn se atendesse em seu estômago em lugar das costas. Arthur ficou paralisado, imobilizado pelo horror, enquanto os olhos de seu pai
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encontravam
os
seus
ocultos
depois
do
penhasco. cambaleou-se, caiu de joelhos e a vida foi escapando de seu ser com uma lentidão dilaceradora. Seu pai manteve o olhar fixo em seus olhos todo o tempo e nele Arthur leu um simples rogo: «não venha». Lorn
gritou
e
vários
de
seus
homens
apareceram depois da curva como resposta à chamada. Ao ver o poderoso chefe do clã Campbell caído aos pés de seu líder emitiram um clamoroso grito de vitória. Lorn assinalou para a colina na direção em que se encontrava Arthur. Ele sabia que não podia vê-lo, mas devia ter ouvido o grito com o que alertou a seu pai. Quando começaram a andar em sua direção, Arthur deu meia volta e saiu correndo. Não recordava muito do que aconteceu depois. ficou escondido entre árvores e rochas
385
durante
quase
uma
semana
inteira,
muito
aterrorizado para se mover. Neil dizia que quando ao fim conseguiu retornar ao castelo chegou meio morto. Arthur contou a seu irmão o ocorrido imediatamente, mas então já era muito tarde para rebater a versão dos fatos dos MacDougall. Inclusive no caso de que Arthur pudesse explicar como tinha ouvido os homens naquela
distância,
Neil
sabia
que
não
acreditariam no que contava. Os MacDugall tinham ganho a batalha e Lorn apontava o fato de derrotar ao poderoso chefe dos Campbell. Pouco depois disso Lorn sitiava Innis Chonnel e obrigava aos Campbell à rendição das armas. Desde aquele dia Arthur prometeu fazer justiça a seu pai. prometeu aniquilar ao MacDougall por esse assassinato traiçoeiro. E
prometeu que
jamais se deixaria dominar pelas emoções.
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Quatorze
anos
levava
esperando
seu
momento, trabalhando para converter-se em um dos melhores guerreiros das Highlands, um guerreiro do qual seu pai teria orgulho, e agora teria sua oportunidade. Não podia permitir que nada interferisse nisso. Tinha que permanecer em
guarda.
Seus
sentidos
já
o
tinham
abandonado uma vez e tinha falhado a seu pai. Não pensava permitir que voltasse a ocorrer. Mas no mais profundo desejava… Que caralho importavam seus desejos? Havia certas coisas que nem sequer ele podia mudar. A moça era filha de Lorn. Que lhe fizesse desejar que as coisas fossem diferentes carecia de importância. Recostou as costas em uma árvore próxima. Como ficava uma hora mais ou menos para o ocaso calculou que tinha tempo para relaxar-se.
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Depois do atropelado ritmo de sua marcha para o norte te sentou bem descansar um pouco. Embora suas instruções fossem simplesmente identificar ao mensageiro sem interferir, o qual significava não pôr ao MacDougall sobre aviso e permitir
que
Bruce
interceptasse
próximas
mensagens, tinha que estar preparado para tudo. Mas estava tão tenso como uma mola a ponto de saltar
e
relaxar
parecia
impossível.
Era
consciente de que não era somente a armadilha para o mensageiro o que o deixava duro, a não ser a perspectiva de sua volta ao castelo. Voltaria a vê-la. A angústia que sentia no peito o traía. dizia a si mesmo que se devia somente que desejava assegurar-se de que estava bem e não que queria vê-la. Não que não pudesse deixar de pensar nela. E é obvio nada tinha que ver com
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que a sentisse falta dela. Não podia ser tão estúpido. «Outro mês —se disse — te afastes dela durante um par de semanas mais e tudo terá acabado.» Assim que conhecesse a identidade do mensageiro poderia ver o que descobria a respeito dos planos do MacDougall para a batalha. Mas assim que esta começasse, sua missão estaria cumprida. partiria sem olhar atrás. Tirou um pedaç de carne-seca de vaca e uma torta de aveia ao conscientizar-se de que não tinha comido nada desde de manhã, o comeu e o baixou tomando um pouco de água do córrego com a que tinha encheu seu odre. Depois ficou observando a verde paisagem distraidamente. O coração lhe deu uma violenta sacudida. ficou petrificado por um momento. A fome se apoderou dele com uma avidez tão intensa que o
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deixava sem respiração. Observou como um homem ansioso por um prato de comida como a moça em que estivera pensando toda a semana se materializava ante ele como saída de seus próprios sonhos. Apesar de que ainda estava a uma distância considerável e de que levava um vestido com capuz por cima de seus cabelos dourados, sabia que era ela. Sentia sua cercania até nos ossos. Em seu mesmo sangue. Todos seus nervos ficaram a flor de pele enquanto a observava descer de um pequeno bote e começar a ascensão pelo frondoso atalho que levava do pequeno embarcadouro até o claustro. esforçou-se
por
espionar
uma
pequena
porção de seu rosto diante da evanescente luz do dia. A necessidade de vê-la, de assegurar-se a si mesmo que ela se encontrava bem, quase lhe fez esquecer onde se encontrava. Deu um passo à
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frente sem conscientizar-se do que acabava de fazer. Amaldiçoou e se escondeu depois da árvore antes que alguém o visse ali plantado como um louco cego de amor. Que diabos estava fazendo ela aí? Levava consigo a cesta e, uma vez mais, somente trazia um homem como escolta. A moça tinha uma habilidade singular para estar no lugar errado no momento errado. Justamente igual na igreja do Ayr… ficou estupefato. A verdade apareceu justo ante seus olhos. Não, aquilo não era possível. Mas não acreditava em coincidências. Ou Anna MacDougall tinha uma prodigiosa capacidade para aparecer exatamente ali onde não devia ou o mensageiro era ela. «O mensageiro é ela.» Levava as mensagens na cesta, ocultos sob
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os bolos ou o que fosse que carregasse nela. Arthur recordou quão inquieta se mostrou na vila. Como tinha deixado o bebê enquanto ela se levava a cesta à cozinha. A palidez de seu rosto quando mencionou a fome que estava dando o aroma dos pães-doces. E também ela foi encarregada de recolher a prata no Ayr. Tinha tido a verdade ante seu nariz todo o tempo. Como tinha podido estar tão cego? esticou a mandíbula. Sabia quanto a tinha subestimado. Duas vezes. Porque era bonita, jovem e inocente, porque parecia tão amável e vulnerável, por ser uma moça, jamais se tinha perguntado por sua presença ali aquela noite, nem sequer depois de saber que estivera espiando-o. Diabos, era uma idéia magnífica. Usar mulheres como mensageiras. Agora pensava nas
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mulheres que tinha visto ir e vir das Igrejas. Jamais lhe ocorreu que pudessem fazer outra coisa. penetraram passando diante de sua própria rede. Teria sentido admiração, se não fosse que acabava de conscientizar-se de algo muito importante que o consumia por dentro. O sangue o gelou por completo e um fio de suor escorreu cangote abaixo. Pelos pregos de Cristo, como podia seu pai usar a desse modo? Se não tivesse planejado fazê-lo, poderia matar ao MacDougall somente pelo fato de pô-la em tamanho perigo. Acaso não se dava conta do que poderia lhe acontecer se ele não estivesse naquela noite para salvar a moça de MacGregor e seus homens? Poderiam tê-la matado. O coração parecia sair-se o do peito à medida que ela se aproximava da porta. Apertou os
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punhos, lutando por não arrancar e correr até ela, puxá-la pelo ombro e tirá-la dali no momento. Sentia uma necessidade animal de levá-la a algum lugar seguro no que pudesse encerrá-la e protegê-la. «Não
é
seu
trabalho.
Não
é
tua
responsabilidade. Não é tua.» O suor frio se acumulava em seu cenho. Quando pensava no risco que estava correndo, quase se voltava louco de… Se sobressaltou ao conscientizar-se do que era. Jesus, era medo! Não se sentia assim desde que Dugald tentou o curar de sua aversão aos ratos desarmando-o e encerrando-o em uma escura despensa cheia deles. Anna bateu na porta. Um momento depois respondeu um sacerdote. Apesar de que Arthur mantinha os ouvidos atentos, falavam tão baixo
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que não pôde ouvir o que diziam. Não obstante, pela expressão de desculpa do monge e a negação que fez com a cabeça, deduziu que este dizia a Anna que não havia mensagens. Pareceu que ela encurvava os ombros. Mudaram algumas palavras mais e Anna retornou em seguida ao bote. Arthur
observou
como
partia
e
soube
imediatamente que sua missão acabara de complicar-se muitíssimo mais do que já estava. Por todos os demônios, por que tinha que ser ela? Lutava contra aquilo que tinha que fazer. Mas manter-se afastado de Anna MacDougall já não era uma opção. Pouco importava o que seus instintos o advertissem, sua missão o obrigava a permanecer tão perto dela como fosse possível. Tinha que a par dos planos do MacDougall. Estava a ponto de liberar uma batalha. Mas
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por uma vez em sua vida Arthur duvidou de sua habilidade para sair ileso. Capítulo 11 Anna jogou o capuz para trás ao mesmo tempo que entrava na câmara de seu pai. Soltou a cesta na mesa e se sentou juntou a este e sua mãe ao calor das brasas da lareira. Inclusive no verão, os muros de pedra do castelo faziam dele um lugar frio e com correntes de ar. Sua mãe levantou a cabeça do novo estandarte de seda no qual trabalhava e a olhou, sentida saudades. —De onde vem, Annie querida? É tarde. —Fui levar bolos aos monges do priorado — respondeu Anna inclinando-se para beijar sua mãe.
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Encontrou-se com o olhar de seu pai. A expressão deste se escureceu ao ver respondida sua tácita pergunta com uma leve negação de cabeça. Tossiu antes que sua esposa pudesse fazer mais objeções. Embora Anna soubesse que o fazia e que propósito, aquele áspero e úmido som a preocupava. —Não me falou de uma nova infusão de ervas do pai Gilbert que ajudaria a aliviar o encharcamento de meus pulmões? Sua mãe se sobressaltou, afastou seus bordados e ficou em pé de repente. —Tinha esquecido. Direi ao Cook que o prepare agora mesmo. Assim que a porta se fechou atrás dela seu pai disse: —O rei Eduardo não respondeu? Anna negou com a cabeça.
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—Já deveríamos ter notícias dele. Seu pai se levantou e começou a perambular diante da chaminé, enfurecendo-se mais a cada passo que dava. —Esses asquerosos rufiões de Bruce devem tê-lo interceptado. Parece que a metade de nossas mensagens não chega a seu destino, nem com a ajuda das mulheres — disse apertando a mandíbula — Mas dado que não ouvimos
nada
sobre
o
destacamento
de
soldados, acredito que podemos supor que não enviarão a ninguém. O jovem Eduardo está muito ocupado tentando salvar sua própria guarida para preocupar-se com a nossa. Anna não podia acreditar que depois de tudo o que tinha feito seu pai pelo primeiro rei Eduardo, o novo rei o abandonaria de tal modo. «Que se deita com crianças…»
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Veio a sua mente essa velha história, mas Anna a tirou da cabeça porque em certo sentido lhe parecia desleal. Seu pai não teve outra opção.
O primeiro rei Eduardo
era muito
poderoso. Depois da derrota de Wallace em Falkirk, ou se fazia aliado do rei inglês ou lhe confiscavam as terras. Quando Bruce usurpou a coroa, a aliança se fez mais necessária ainda. Se Bruce e os MacDonald estavam em um lado, os MacDougall não podiam mais que apoiar ao outro: Inglaterra. —Não
deveríamos
tentar
enviar
outra
missiva? —Não temos tempo — espetou seu pai, claramente molesto pelo que percebia como uma pergunta estúpida — Os ingleses se movem com lentidão. Demorariam semanas em chegar tão ao norte carregando toda essa baixela e esses
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móveis para estar cômodos. Inclusive no caso de que Eduardo mudasse de opinião, necessitaria dias para reunir aos homens. O rei Hood estaria aqui junto a sua tropa de assassinos salteadores de caminhos antes que aos ingleses desse tempo de encher seus carros de ninharias. Anna tentava não tomar como algo pessoal a cólera do pai. Tinha todo o direito a perder os nervos. O inimigo estava virtualmente em cima e ninguém vinha em sua ajuda. O conde de Ross, igual ao rei Eduardo, ainda não tinha respondido a sua petição de unir forças. Ia ficando patentemente claro que estariam sozinhos ante Bruce: oitocentos homens contra os três mil com que contava o usurpador conforme o informe. O medo prendia a garganta. Os MacDougall eram ferozes combatentes e Lorn um dos melhores generais de Escócia na batalha, mas
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poderiam superar tal desvantagem? Seu pai estivera
a
ponto
de
derrotar
ao
Bruce
anteriormente, mas então o rei foragido teve que fugir com umas poucas centenas de homens ante suas mais numerosas forças. Nessa ocasião seriam os MacDougall quem estaria em clara inferioridade numérica. «Pouco importa», pensou Anna com integridade. Seu pai ganharia de todos os modos. Somente um MacDougall valia por cinco rebeldes. Mesmo assim, por mais vezes que se dissesse que John de Lorn superaria inclusive a pior das apostas, seu leal coração não podia negar que existia a mais mínima, a ínfima possibilidade de que perdessem. «Perder.» Um calafrio lhe percorreu o corpo. Somente pensar nessa palavra lhe parecia a mais vil das blasfêmias.
Não
podia
permitir
que
isso
401
ocorresse.
As
conseqüências
eram
muito
execráveis para as considerar. Mas tudo aquilo que apreciava, todas suas esperanças de um futuro feliz, parecia pender sobre a ponta de um alfinete, ou, neste caso, de uma espada. O mais leve empurrãozinho faria que tudo se precipitasse no vazio. Os grossos muros do castelo de repente lhe pareciam finas vidraças, dispostas a romper-se em mil pedaços. Sua situação era complicada, inclusive até desesperada. Contudo, havia um modo de conseguir atenuá-la um pouco. O tempo pareceu deter-se. O pavor se apoderava de seu estômago em um tenso nó e o formigamento que isso provocava aumentava à medida que Anna via do que seria obrigada a fazer. A solução espreitava no mais profundo de sua mente desde fazia meses, mas não queria
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considerá-la. Anna se aferrou às abas de sua capa como se fossem uma corda a qual pudesse agarrar-se. —E o que passa com Ross? —perguntou em voz baixa — Ainda fica tempo para que se apresente. Seu pai a olhou com certo desdém. —Sim, mas como digo já, não o fará. Era reprovação o que advertia em seu olhar? Acaso se arrependia de ter dado opção? Anna aspirou profunda e entrecortadamente em uma tentativa de controlar o ritmo frenético de seu pulso. Sua gelada pele se cobriu com uma fina pátina de suor. O peito lhe oprimia tanto que mal podia respirar. Todo seu ser se rebelava contra o que estava a ponto de sugerir. Mas não ficava alternativa. Um marido era um pequeno preço a pagar em comparação com a sobrevivência de
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seu clã. casaria-se até com o mesmo diabo se fosse necessário. —E se lhe desse um motivo para pensar melhor? —Seu pai a olhou nos olhos. Anna soube que tinha adivinhado o que sugeria pelo ar de reflexão que adotou seu olhar, embora talvez isso fosse o que ele esperava dela de um princípio — O que passaria se fizesse um rogo pessoal ao conde? Teve que deter suas palavras. Seus dedos agarravam a lã da capa com tanta força que cortava a circulação. O coração pulsava a um ritmo frenético e martelava em suas têmporas. O estômago se decompôs. «Tudo irá bem. Eu me encarregarei de que funcione. Não é um homem tão temível.» Sir Arthur era alto, musculoso, de uma beleza sombria e, não obstante, nunca ficava nervosa em sua presença. Talvez tivesse
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superado seu medo aos guerreiros. «Sir Arthur.» O coração deu um tombo. A imagem do cavalheiro apareceu ante seus olhos, mas a afastou de sua mente. Não significava nada para ela. Pouco importava que seu coração tivesse querido voar para ele momentaneamente. Embora as coisas fossem diferentes, ele já tinha expressado com uma claridade dolorosa o que sentia por ela: nada. Mas teria que passar toda a vida tentando esquecer aquele beijo. Seu pai esperava que continuasse, mas Anna não era capaz de encontrar as palavras. —O que aconteceria…? —Anna teve que se deter para clarear a garganta — Se a oferta de sir Hugh segue em pé, estou disposta a aceitar sua proposta de matrimônio. Em muda, talvez o conde veja o benefício de unir nossas forças.
405
Seu pai não disse nada durante um momento, mas sim ficou estudando seu rosto com uma intensidade tal que a Anna pareceu estar retorcendo-se em seu interior. —Crê que seguirá
te querendo? Não teve
nenhuma graça que o rechaçasse. Ardiam-lhe as bochechas de vergonha de não ter parado pra pensar nessa possibilidade. Seu pai tinha razão. O jovem cavalheiro, ferido em seu nobre orgulho pelo rechaço, ficou uma fúria. —Não sei, mas merece a pena tentar. Já tinham machucado seu orgulho há pouco. O que importava um pouco mais ou menos? —A sua mãe não gostará da idéia — disse John de Lorn olhando para a porta — Os caminhos podem ser muito perigosos com Bruce e seus homens por aí soltos. Nisso tinha pensado Anna.
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—Não
se
preocupará
se
Alan
me
acompanha. Levaremos uma boa escolta. Seu pai assentiu enquanto acariciava o queixo. —Sim. Seu irmão te manterá a salvo — disse com um sorriso, enquanto ela tentava mascarar seu desengano. Havia uma parte de Anna que esperava que seu pai se negasse. Este se levantou e a beijou no cocuruto — É uma boa garota, Annie querida. Em geral Anna transbordava de alegria quando seu pai lhe dirigia um elogio, mas nessa ocasião teve vontade de chorar. Sua felicidade era um pequeno preço a pagar, mas, mesmo assim, era um preço a pagar. Seu pai a beliscou no queixo para que o olhasse os olhos. Anna piscou diante da cálida e úmida bruma do lar. —Sabe que não lhe pediria isso se tivesse
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uma alternativa. Uma solitária lágrima escorregou por sua bochecha. Tremia-lhe a boca, mas se esforçou por sorrir. —Sei. Naquele momento supunha
que era sua
única esperança. Não importava quão mau parecesse. Faria tudo o que estivesse em sua mão para assegurar a aliança. De todos os modos tampouco havia ninguém que se interessasse por ela. Entretanto, quando Anna abandonou os aposentos de seu pai, todas essas lágrimas que estivera agüentando saíram precipitadas em uma corrente de esperança extinta, uma esperança que nem sequer era consciente de estar albergando. A volta de Arthur ao castelo, sozinho, não foi
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tão difícil de explicar como imaginava. Lorn estava ansioso por ouvir um relatório do que seu filho tinha descoberto a respeito de seus inimigos do oeste. A luta pela supremacia entre os três principais ramos dos descendentes de Somerled, os MacDonald, MacDougall e MacRuairi, levava anos
dominando
a
política
das
Highlands
Ocidentais. Quando morreu o último dos chefes do clã MacRuairi, deixando a sua filha Christina das Ilhas como única herdeira ao trono, estes perderam poder e o terna se reduziu a dois. Lachlan e seus irmãos eram todos filhos bastardos, um título que em seu caso era completamente castigo. A informação de Ewen oferecida por Arthur a respeito
da
mobilização
de
tropas
dos
MacDonald ao longo da costa ocidental não era nada
surpreendente,
mas
mesmo
assim
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provocou um substancial arrebatamento de fúria no Lorn, e também inquietação, apesar de que procurasse ocultá-lo. Embora talvez não tanta como devesse, o qual o fazia perguntar-se o que teria planejado aquele conspirador briguento. E agora, graças a seu descobrimento no priorado, sabia perfeitamente como averiguar. Mas como sua volta ao castelo foi em uma hora tardia, sua reunião com lady Anna teria que esperar até a manhã seguinte. dizia a si mesmo que estava inquieto simplesmente porque teria que encontrar um motivo para algo que seria como uma mudança de parecer repentino: em lugar de evitá-la, inventaria desculpas para estar com ela. Mas tampouco queria dar falsas esperanças à moça. Apesar de ter cometido o engano de beijá-la, e Deus, um enorme engano tinha sido aquele, uma relação entre eles era
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algo impossível. Sabia que não seria fácil. Certamente a moça teria passado toda a semana pensando naquele beijo. Deus sabia que ele mesmo não tinha sido capaz de pensar em outra coisa. Embora já tinha visto ela cruzando o jardim de Ardchattan, quando a viu entrar no grande salão na manhã seguinte seus sentidos se avivaram como se fosse a primeira vez. Tudo parecia estar mais vivo, mais intenso. Jamais antes o tinha afetado tanto a presença de alguém como
fazia
nesse
momento
lady
Anna
MacDougall. encantou-se dela, de cada um dos detalhes, de cada matiz, das mechas de cabelo dourado que escapavam de seu véu azul à altura da fronte e as têmporas até os finos bordados de seda do cotehardy que rodeava sua figura em todos os lugares apropriados.
411
«Não…» Deixou cair o olhar sobre seus seios. Ficou com
a
boca
seca.
Via,
embora
fossem
imaginações dele, o mal esboçado relevo de seus mamilos perolando essa parte do tecido. Assaltaram-lhe as lembranças e uma onda de calor saiu de sua virilha. Pensar no tato daquela exuberante suavidade fez que endurecesse seu pau. Que impressionante tinha sido embalar esse seio, sentir o peso dessas carnes perfeitamente arredondadas sobre a palma de sua mão ao mesmo tempo que seu polegar acariciava o teso broto de seu mamilo. Amaldiçoou para si, subitamente
incomodado
por
aquelas
lembranças, muito viscerais, em conjunto. Estava quente. Excitado. Faminto. Como demônios ia olhar a moça sem lembrar-se das sensações que procurava ter seu
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corpo pego ao dela? Como poderia ver o sensual arco rosado de sua boca sem recordar quão doce sabor, a suavidade daqueles lábios sob os seus, e que o erotismo de suas línguas entrelaçadas o tinha feito entrar em um torvelinho de desejo mais
forte
que
qualquer
outra
coisa
que
houvesse sentido alguma vez? Jamais poderia olhar essa pálida pele suave como a de um bebê, que era como veludo ao tato, sem recordar como a havia tocado. Deus, quão único queria era atirá-la na cama, enrolar suas pernas a sua cintura e afundar até esquecer-se de tudo. Jesus, tinha que deixar de pensar nisso. Tinha que parar de torturar-se com coisas impossíveis. Sempre tinha sido capaz de reprimir seus impulsos, mas com a Anna era diferente. Porque ela era diferente. E não
fazia
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nenhuma graça reconhecê-lo. Arthur se dava conta de como o observava seu irmão, mas não podia afastar o olhar. Seu coração pulsava mais depressa a cada passo que ela dava e cada um de seus nervos ficava em tensão enquanto se preparava para o momento em que ela se inteirasse de sua presença. Mas assim que a teve mais perto percebeu uma estranha pontada. Algo não ia bem. Não sorria. Seus olhos não brilhavam com alegria e travessura. E sua risada, esse leve e efervescente som ao que poderia ouvir durante horas,
permanecia
em
completo
silêncio.
acostumou-se tanto a seu perpétuo bom humor, ao despreocupado encanto com o que parecia iluminar os aposentos, que o vazio deixado por sua ausência obscurecia o grande salão.
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Maldição. teria feito mais dano de que pensava? A culpa o atormentava. Por um instante pensou que passaria junto a ele, mas então notou o peso de seu olhar. ficaram contemplando o um ao outro. A quietude era absoluta. Esperou ver sua reação. Esperava presenciar como a cor subia por suas bochechas, como lhe cortava a respiração e se acelerava o pulso em seu pescoço. Esperava que se delatasse. Mas em vez disso ficou em guarda. Lady Anna levava todos seus pensamentos e sentimentos escritos no rosto. Essa era uma das coisas que Arthur encontrava tão cativantes e irresistíveis dela. A inocência e a emoção infantil que mostrava, sua preciosa vulnerabilidade. Mas essa
expressão,
antes
sempre
acessível,
permanecia oculta.
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Percebeu a frieza de seu olhar por um breve instante dantes que afastasse e passasse por ele. Como se tivesse deixado de existir. Como se ela jamais se derretera em seus braços. Como se o beijo no que não podia deixar de pensar jamais existira para ela. Como se não tivesse estado a ponto de sucumbir sob seu corpo. Sua indiferença lhe corroía o peito como se de um ácido se tratasse. Queimava. Doía. O fazia perder
o
controle
necessidade
por
primitiva
completo, de
cometer
sentir
a
alguma
loucura, como empurrá-la contra a parede e beijá-la até que se rendesse a seus pés uma vez mais. Mas ele era um homem que mantinha o controle. refreava-se. Era diferente. Não tinha necessidades de tal tipo. E entretanto, com um só olhar de frieza, Anna MacDougall conseguia
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tirar dele os impulsos bárbaros que levava no sangue. Ao que parecia tinha conseguido seu objetivo. Seu cruel rechaço sortia efeito. Não deixava de ser irônico que se mostrasse indiferente justo quando ele desejava que não fosse assim. Ou pode ser que nunca tivesse estado interessada nele. Talvez o único que queria fosse vigiá-lo. azedou a expressão e se o flexionaram os músculos, mais molesto por esse pensamento do que gostaria de admitir. Por desgraça, seu irmão se mostrava perceptivo. Dugald simulou um calafrio. —Vá, parece que faz um pouco de frio por aqui. Acredito que a dama
já esqueceu o
capricho, irmãozinho. Com o tanto que tentou, pensei que estaria mais contente — disse, fazendo uma pausa para negar com a cabeça —
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Será possível que ao fim te tenha feito cair uma mulher? Acreditava que isso não aconteceria nunca. Arthur se recostou sobre a parede de pedra que tinha trás de si, aparentando uma indiferença que não sentia. Era certo que gostava dela, mas antes morto que deixar que Dugald conhecesse sua debilidade. —Não é mais que uma moça apetecível. —Mais apetecível ainda porque não pode têla. Arthur encolheu os ombros e deu um longo gole a seu cuirm até esvaziar a taça. —O que eu quero dela não é algo que possa me dar uma inocente jovem da nobreza. Dugald riu e lhe deu uma palmada no braço. —Compartilho
sua
dor,
irmãozinho.
Eu
mesmo estou sentindo um pouco parecido. Sei
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de uma moça com uma boca talentosa que faria bastante por aliviá-lo. Mandarei a ti. Arthur desviou o olhar para o tablado em que se acabava de sentar lady Anna. Tentava pelo menos. Tentava. Mas não lhe interessavam as mulheres de seu irmão. Franziu o cenho em um meia sorriso. —Você compartilhando, irmão? Não parece você
mesmo.
Mas
neste
caso
não
será
necessário. Não acredito que tenha problemas para encontrar alívio. Se quisesse, sabia de algumas mulheres entre as que podia escolher. O problema era que não queria. Ao menos, não com elas. Dugald encolheu os ombros. —Como deseje — disse aproximando-se dele com um amplo sorriso — Mas não sabe o que te perde. Essa moça poderia deixar seca a uma
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vaca com a boca que tem e faz umas coisas com a língua que… A voz do Dugald se confundiu com o ruído de fundo. As perversas habilidades que pudesse representar
a
fulana
do
Dugald
não
lhe
interessavam. Arthur voltou o olhar para o estrado. Ela era quem o interessava, maldita seja. Embora Deus sabia que não deveria ser assim. Mas parecia que Arthur fosse invisível, porque não olhou uma só vez em sua direção. Sua irritação crescia a cada minuto. Aferrava com força a taça de estanho e a enchia uma e outra vez à medida que o ágape avançava. Seu plano para aproximar-se dela seria mais complicado do que pensava, mas acreditava que se livraria dele tão facilmente estava muito equivocada. «Retornou.» Anna se rebelou ante o inoportuno desejo que
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arremetia contra seu peito e se obrigou a não olhar em sua direção. A não pensar nele. Sir Arthur não era para ela. Jamais foi. Seu destino estava
concretizado.
Já
tinha
tomado
sua
decisão. Seu pai e seu clã contavam com ela. Era muito tarde para arrepender-se ou pensar melhor, por mais que vê-lo devolvesse todas essas ingratas emoções de repente em uma pancada. Como não se fixou nele a princípio, quando nesse momento já não podia ver nenhuma outra pessoa? Aquele orgulhoso jovem cavalheiro de escura beleza era o homem mais bonito de toda a sala. E sem dúvida também o mais forte. Suas bochechas se acaloraram. somente olhar sua figura alta e de largos ombros voltavam as lembranças de seu torso nu. Cada um de seus esculturais músculos. Cada uma de suas rígidas
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linhas. Cada um dos gramas de sua musculosa carne. Tentava ignorá-lo, mas sentia o peso de seu olhar enquanto comia. Ou tentava comer, já que tinha a boca completamente seca e a comida lhe parecia insípida e terrosa. Olhava-a com tal intensidade que dava vontade de sair correndo. Algo que fez assim que teve oportunidade. Anna se apressou a sair do grande salão com mais sentimentos dos que podia albergar, correu pela escadas para sua câmara da torre e ficou a pinçar no armário em busca de sua capa de montaria. Precisava sair dali. Um dia. Somente tinha que o evitar durante um dia e depois disso partiria. Tinham previsto partir para o castelo de Auldearn, a fortaleza real do conde de Ross, na manhã seguinte. por que não podia permanecer fosse do castelo até que
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ela partisse? Assim tudo teria sido muito mais fácil. Em seu desespero por escapar, revolvia os montes de objetos de lã e de seda que penduravam de seu armário sem importar a desordem que criava. Onde estaria? Estava a ponto de enfrentar o frio matinal e sair de todos os modos quando percebeu de que provavelmente sua criada já teria posto a capa em sua arca para a viagem. Abriu a tampa de madeira e deixou escapar um suspiro de alívio ao ver que a peça de lã axadrezado de cores cinza, azul e verde estava dobrada em cima de tudo. A jogou rapidamente sobre os ombros, agarrou em braços Escudeiro, temendo que o cachorrinho saísse correndo em busca do cavalheiro pródigo, e voltou a descer a escada como um torvelinho. antes de sair ao barmkin olhou pela fresta da
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porta para assegurar-se de que tinha via livre. Não queria correr nenhum risco de topar com ele. Sabia que aquilo era ridículo. Sir Arthur fazia todo o possível para evitá-la. Mas havia algo na forma em que a tinha olhado durante o café da manhã que chamava à cautela. Cruzou o pátio e se dirigiu para os estábulos. Uma vez na segurança de seu interior soltou ao revoltoso cão no chão e fez que o cavalariço chamasse
Robby enquanto ela preparava os
arreios de seu cavalo. Não tinha nenhum destino em mente, com tal de
sair
do
impressionante
castelo fortificação
era de
suficiente.
A
pedra
os
e
grandiosos muros do barmkin pareciam muito pequenos de repente. Acabada sua tarefa, dispôs-se a recolher ao Escudeiro do chão quando a porta se abriu e o cachorrinho
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prorrompeu em uivos e ganidos ao mesmo tempo que saltava de seus braços disparado como uma flecha. —Merda! —saiu de seus lábios antes que desse tempo a refrear-se. Não precisava olhar para saber quem era. Se a reação de Escudeiro não dizia, assim fazia seu próprio corpo. O ar mudou. A pele lhe ardia. Seus sentidos despertaram. O aposento esquentou imediatamente e o leve aroma de fragrância masculina se filtrava através dos penetrantes e terrestres aromas do estábulo. Fechou os olhos, rezou uma prece que os céus lhe dessem força e ficou em pé lentamente para enfrentar a ele. Seus olhares se encontraram. A repentina excitação que a embargou foi como um látego que a chamasse o ordem. Aquela era uma impressão que parecia não diminuir nunca.
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cortou a respiração, ao mesmo tempo que essa aguda e repentina opressão voltava a lhe envolver o peito e espremê-la. Um irritante acesso de nostalgia se formava em seu interior, mas esmagou com rapidez, sem compaixão. Ele não significava nada para ela. Já não. Não depois do ocorrido nos barracões. A tinha ensinado quão errado era para ela. E mais valia que acreditasse. Controlou suas feições para fazer delas uma máscara impassível, tirando provisão de cada gota de sangue real que corria por suas veias. Era descendente de reis, tataraneta legítima, seis gerações
depois,
do
poderoso
Somerled.
Saudou-o com uma ligeira inclinação da cabeça e disse friamente: —Sir Arthur, vejo que retornastes. Sua tentativa de mostrar-se digna se viu em
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certo modo arruinado pela tremor de sua voz. Uma coisa era fingir que não lhe afetava sua presença em um salão cheio de gente e outra muito diferente fazê-lo em um pequeno estábulo. A sós. Enquanto ele a olhava dessa maneira tão intensa. Com raiva. Tinha o rosto avermelhado por completo, à exceção das comissuras da boca e de sua palpitante têmpora, que para sua desgraça estavam brancas. O coração pulsava a toda pressa. Onde estava Iain? A cavalariço já deveria ter retornado. Arthur pareceu ler sua mente e endureceu o olhar, algo que não fez a não ser enervá-la mais, dado que já era suficiente severo. Não tinha motivos para estar furioso com ela. —O moço não virá. Disse-lhe que a levaria aonde precise ir. Por Deus, isso não! Não queria ir com ele a
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nenhuma parte. Nem sequer queria o ter perto. Anna ergueu o queixo, negando-se a que a intimidasse a sensação de perigo que lhe transmitia. Não tinha feito nada mau. Somente esperava que não se inteirasse de como lhe tremiam as mãos. —Isso não será necessário. Arthur deu um passo à frente e Anna fez esforços em não cambalear-se. Mas o sangue pulsava com força em seu pescoço. E ele viu. O sorriso que se desenhou em seus lábios a fez sentir como um camundongo ante os olhos de um gato. —Temo-me que sim, será. Se saíres do castelo partirei contigo. —Arthur a olhou de tal modo que fez que a Anna fervesse o sangue — Me parece que esquecestes algo. Gaguejou, completamente deslocada pelo
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calor que fluía por suas veias. —O que… o que? —Sua cesta — disse olhando-a nos olhos. Anna ficou gelada, decomposta pela surpresa. Não era possível que soubesse. Quase suspirou de alívio quando ele acrescentou—: Não acredito ter visto sair do castelo sem ela. Muito observador, mais do que convinha. Sir Arthur era perigoso em muitas e diferentes formas. Seu pai iria às nuvens se alguém descobrisse o que ela e algumas das outras mulheres faziam. Anna se recompôs em seguida, irritada por permitir que a angustiasse. —Só tinha intenção de sair a cavalgar. Hoje não visito ninguém da vila. Arthur ficou olhando-a por mais tempo do que devido, e Anna voltou a perguntar-se se saberia algo. Entretanto, nessa ocasião sua expressão
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não traiu seus pensamentos. Uma série de latidos frenéticos fez que Arthur dirigisse sua atenção ao chão, para o cão que saltava sobre sua perna. —Abaixo! —disse em uma voz que não aceitava
discussão.
O
cão
se
sentou
imediatamente e ficou olhando-o com cara de adoração — Seu cachorrinho precisa aprender maneiras. Anna franziu os lábios. —Gosta de ti. «Deus saberá por que motivo.» Tentar tirar um pouco de afeto de Arthur Campbell era como querer
extrair
experiência
água
de
condenada
uma ao
rocha,
fracasso
uma e
a
frustração. Arthur entreabriu os olhos como se Anna houvesse dito isso em voz alta. —Normalmente os animais gozam de bons
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instintos. —Normalmente sim — concedeu, deixando muito claro que ela pensava diferente nesse caso. Aquele brilho perigoso voltou a encher seu olhar. —E o que tem que você, Anna? O que dizem seus instintos? «Corre. te esconda. te afaste dele tanto como possa para que não te faça mais dano.» Olhar essa
mandíbula
afiada
e
recortada,
seus
sensuais e carnudos lábios e esses olhos escuros jateados de âmbar era já suficientemente doloroso. Afastou o olhar, contendo a emoção que ia a sua garganta. —Eu não faço caso a meus instintos. Ao menos já não fazia. Estavam errados.
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Seus instintos a tinham feito acreditar que entre eles havia algo especial. Que talvez ele tivesse necessidade dela. Que se sentia sozinho. E que possivelmente fosse diferente ao que parecia: um ambicioso cavalheiro, um soldado valente que vivia por e para sua espada. Inclusive
nesse
preciso
momento
seus
instintos lhe faziam acreditar que a tensão que bulia entre ambos significava algo, que bastaria que tomasse em seus braços e a beijasse de novo para que tudo voltasse para a normalidade. Mas era muito tarde para isso. —Os instintos só servem para te obrigar a fazer coisas das que logo te arrepende — acrescentou. Arthur esticou o queixo e o músculo de sua mandíbula
começou
a
tremer
de
modo
detestável. aproximou-se mais ainda. Tão perto
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que Anna sentia todo o calor que irradiava. Tão perto que cheirava o especiado aroma de sol que emanava sua pele. Começaram a tremer as pernas. Por Deus, tinha esquecido quão alto era. Parecia que muros se fechassem em volto dela. Custava-lhe
respirar.
Custava-lhe
inclusive
pensar enquanto se abatia sobre ela de tal modo. Usava sua selvagem masculinidade contra ela com a sutileza de um carneiro batendo-se em duelo. —E arrependes de algo, Anna? A enganadora suavidade de sua voz não a enganava absolutamente. Advertia perfeitamente a raiva contida em suas palavras, como se lhe importasse que seu coração tivesse mudado de parecer. por que fazia isso? por que tentava confundi-la? Fosse ele quem havia dito a ela que se afastasse.
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—Que mais dá? E menos agora. Deixara tudo muito claro antes de fugir com meu irmão. Anna tentou flanquear a porta e deixá-lo ali, mas Arthur a deteve com o implacável escudo de seu peito. Pela linha branca que se formou na comissura de sua boca não coube dúvida de que tinha captado a indireta. —Então já acabastes com a espionagem. É isso? Anna o observou atentamente. Nisso era que acreditava?
Bom,
que
mais
dava
o
que
pensasse. Afastou lentamente seu olhar e a dirigiu para a porta. —Sim, isso. Agora se me permitem, eu gostaria de partir. Empurrou seu peito com o dorso da mão, mas era tão firme como um escarpado rochoso. Um escarpado com montões e montões de
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pedras cortantes e afiadas. —Já vos disse que partiria contigo. —Seus serviços já não são necessários. mudei de opinião. Não sairei a cavalgar esta manhã. A maneira que flamejavam seus olhos revelava que não fazia nenhuma graça que o rechaçassem. Bem, pois pior para ele. Ela não o tinha escolhido como seu cavalheiro andante. Então notou que os músculos de suas costas se esticavam e se perguntou se não o teria levado muito longe. Mas Arthur não fez mais que torcer o gesto, representar uma reverência exagerada e afastar do caminho. —Como desejais, milady. Mas se mudares de opinião já sabem onde me encontrar. Anna passou junto a ele como um raio, com o queixo bem alto.
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—Não o farei. Tenho muitas coisas que fazer antes de partir. A mão que pousou sobre seu ombro a fez deter-se de repente. Mas inclusive essa forma rude de tocá-la fazia que seus sentidos se desatassem. —Vais a alguma parte, lady Anna? Tentou desembaraçar-se de seu braço e o fulminou com o olhar ao ver que não a deixava partir. —Não é seu assunto. Um brilho foi a seus olhos ao mesmo tempo em que Arthur se aproximava mais a ela. Anna sentia a energia que vibrava entre ambos e a arrastava consigo. Tinha a boca tão perto… —me digas. Não podia beijá-la, dizia-se Anna presa do pânico. Não podia permitir que a beijasse.
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—Caso-me — disse bruscamente. Capítulo 12 Arthur retirou o braço como se queimasse. «Caso-me.» Suas palavras sentaram como um soco no estômago. Era incapaz de se mover. Cada osso, cada músculo, cada uma de suas terminações nervosas se petrificou. —Com quem? —perguntou com uma voz mortiça, vagamente ameaçador, que não parecia a sua, soava como a do MacRuairi. Anna não queria olhá-lo nos olhos. ficou a retorcer as grossas pregas de lã de sua saia com as mãos. —Com sir Hugh Ross. Uma faca encravada entre suas costelas teria resultado menos doloroso. O filho e herdeiro do
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conde de Ross. Arthur o conhecia, é obvio. O jovem cavalheiro já havia feito um nome por si mesmo.
Era
um
guerreiro
temível,
um
estrategista, dentro e fosse do campo de batalha. O fato de que fosse um bom partido piorava mais. Não compreendia a raiva que consumia seu interior, nem por que se sentia traído. Não lhe pertencia, diabos. Jamais poderia lhe pertencer. Mas isso não o fazia esquecer que apenas quinze dias atrás a tinha tido em seus braços e que estivera a muito pouco de despoja-la de sua inocência. —Ao que parece tiveste uma semana muito ocupada, milady. Não perde tempo. Um quente rubor tingiu suas bochechas. —Ainda não concretizamos os detalhes. Arthur advertiu algo em sua voz que o fez
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entreabrir os olhos enviesadamente. —A que detalhe se refere? Está prometida ou não? Anna ergueu o queixo e ele captou o desafiante brilho de seu olhar apesar do sufoco de seu rosto. —Sir Hugh me propôs matrimônio faz um ano,
pouco
depois
de
que
morreu
meu
prometido. —Acreditava que o tinha rechaçado. —Assim foi. Pensei melhor. Arthur compreendeu do que se tratava tudo aquilo de repente. Ao não contar com a ajuda do rei Eduardo, os MacDougall tinham decidido pedir ao Ross e oferecer a lady Anna como incentivo acrescentado para a aliança. Pouco importava se ela tinha pensado melhor ou era seu pai quem assim tinha decidido. Arthur não podia permitir
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que unissem suas forças. Uma aliança entre Ross e os MacDougall poria em perigo a vitória de Bruce. Seu trabalho, sua obrigação, era deter aquilo. Arthur a olhou com dureza. —E como sabe que sir Hugh se mostrará aberto a sua repentina mudança de pensamento? —Não sei. —Anna lhe dirigiu um olhar penetrante — Mas farei tudo o que possa para persuadi-lo. Não era necessário adivinhar a que se referia. Sua reação foi instantânea. Primitiva. Por um breve instante da ira se apoderou dele e perdeu o controle. Sentiu um vazio na mente. Lady Anna estava
a
escassos
centímetros
de
ver-se
esmagada contra a parede do estábulo com seus lábios selados pelos dele, toda sua virilidade entre as suas pernas e uma língua afundando-se
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no interior de sua boca, ali onde devia estar. Mas inclusive no furor de sua raiva pedia mais a necessidade de protegê-la. Não confiava em si mesmo para tocá-la de tal modo. Anna pôs os olhos como pratos e teve a prudência de dar um passo para trás. Mas ele a seguia cativando com a armadilha de seu penetrante olhar. —Assim tem tudo bem planejado? Assentiu. —Sim. Será melhor para todos. Que tentando
aquilo
soasse
convencer-se
como
se
a
mesmo
si
estivesse não
consolava absolutamente. —Seu plano tem um problema. Anna o olhou, dúbia. —E qual é? —Ross está ao norte. Os caminhos são muito
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perigosos para que te translades. É muito arriscado. Bruce e seus homens ficarão no caminho em qualquer momento. Seu pai não aprovará isso. Lorn era um filho de cadela desalmado, mas parecia amar a sua filha de uma maneira genuína. —Já o tem feito. Uma leva de guardiães me escoltará, junto com meu irmão Alan. Pode ser que o rei Hood seja um patife assassino, mas não faz guerra às mulheres. Arthur lutava por manter sob controle seu gênio. Lorn tinha que estar muito desesperado para aceitar isso. O muito filho de cadela faria o que fosse para ganhar, inclusive pôr em perigo sua filha. —Se se derem conta de que és uma mulher. Na escuridão, não serão tão fácil de distinguir.
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Poderiam a confundir com um mensageiro. Acaso tinha esquecido o que estivera a ponto de lhe ocorrer no Ayr? Jesus, quando pensava no perigo… gelou o sangue. De novo teve vontade de empurrá-la contra a parede do estábulo, dessa vez para procurar que entrasse em razão. Poderiam feri-la. Assassiná-la. —Meu irmão me protegerá. Estou segura de que não passará nada. Arthur sentia uma veia a ponto de estalar na têmpora. Nem uma centena de homens poderiam lhe dar segurança. Seus esforços por controlar fracassariam. —Não seja louca! Não podem ir! É muito perigoso. Mandem um mensageiro, é melhor. Não necessitava mais que ver a posição de seu queixo e a maneira em que entreabria os olhos para saber que tinha cometido um engano.
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Poe tratar-se de uma moça de aparência tão doce mostrava uma teima digna de admiração. —Já está decidido. E você, temo que não tenha nada que dizer a respeito. As mulheres tinham que ser submissas e dóceis, maldita seja. E ali estava ela, cotovelo com cotovelo com ele, sem retroceder um centímetro. Se não estivesse tão furioso isso pareceria admirável. Nessa ocasião, quando Anna deu meia volta e se dirigiu para a porta, Arthur não a deteve. «Nada que dizer a respeito.» Isso veremos. Se ela não entrava em razão, talvez seu pai fizesse. Os homens de Bruce estavam batendo toda a área, assaltando, saqueando, fazendo tudo o que podiam por semear o caos e expandir o medo no coração do inimigo. A guerra não tinha lugar só
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no campo de batalha mas também no interior das mentes. Um grupo de escolta do clã MacDougall seria algo irresistível. Anna teria uma flecha no coração antes que pudessem se dar conta de seu engano. Dizia a si mesmo que era a ameaça que isso supunha para a missão que fazia que se embolotassem todos seus músculos. Evitar esse tipo de aliança, manter isolado ao MacDougall, essa era a razão pela que estava ali. Mas não eram as mensagens nem a aliança em que pensava. Tudo que podia ver era Anna jogada em um atoleiro de sangue. Tinha que fazer que Lorn se afastasse desse estúpido caminho. E se não podia… De nenhuma maneira a deixaria partir sozinha. Se Anna desse um passo fora
desse
castelo,
ali
estaria
ele
para
acompanhá-la, ali onde pudesse a proteger e tê-
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la à vista. E havia uma coisa que tinha muito clara: não cabia nem a mais remota possibilidade de que a deixasse casar-se com Hugh Ross. —Ocorre-te algo, Annie? Parece contrariada. Anna ergueu o olhar para seu irmão Alan, que acabava de aproximar-se para cavalgar a seu lado. Depois de navegar em um birlinn nessa manhã o primeiro lance da viagem, o resto do trajeto fariam a cavalo. A rota marinha desde Dunstaffnage até a vila do Inverlochy através do lago Linnhe tinha levado menos de meia jornada, uma travessia em que teriam empregado vários dias ao fazê-la por terra. Oxalá o resto da viagem fosse igual de simples. Havia três lagos salgados e numerosos rios que percorriam Gleann Mor, o enguiço do Grande Glenn que dividia a Escócia entre o Inverlochy, no nascimento do lago Linnhe, até o Inverness e o fiorde de Moray, mas as rotas
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marinhas
estavam
separadas
por
terreno
suficiente para fazer impraticável a viagem em navio. Em vez disso, cavalgariam os pouco mais de cem quilômetros que tinha que o Inverlochy até Nairn, ao leste do qual se encontrava o castelo do Auldearn. Com sorte demorariam quatro dias para chegar. Anna era consciente de que atrasava sua marcha, apesar de que galopavam em um ritmo muito mais castigador que aquele trote pausado ao que estava habituada. Parecia
irônico
que
estivesse
fazendo
virtualmente a mesma rota que tinha seguido o rei
Hood
no
outono
passado
esperando
acontecer através das Highlands e apoderandose dos quatro castelos principais que balizavam o caminho: os castelos de Inverlochy e Urquhart, pertencentes aos Comyn, e os castelos reais de
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guarnição inglesa em Inverness e Nairn. Dado que esses castelos seguiam ocupados pelos rebeldes, veriam-se obrigados a procurar outra hospedagem que entranhasse menos perigo. Anna suspeitava que se quisessem evitar aos homens de Bruce teria que acostumar-se à paisagem dos bosques. Ao menos assim se livraria daquele sol abrasador por um tempo. Cavalgavam há várias horas e embora o véu protegesse
seu
rosto,
tinha
calor,
estava
pegajosa e, sim, também zangada, como tinha advertido seu irmão. Furiosa, para falar a verdade. O tempo, não obstante, não tinha nada que ver com seu incomum mau humor. Essa honra
reservava
a
um
certo
cavalheiro
intrometido. Negou-se a lhe dirigir o olhar durante todo o dia. Mas isso não significava que não soubesse
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exatamente onde estava: cavalgando na cabeça do grupo, inspecionando o caminho que tinham pela frente em busca de sinais de perigo. «Perigo.» Isso era dizer pouco. O perigo era que ele os tivesse acompanhado na viagem. —Estou bem —assegurou a seu irmão, conseguindo esboçar um sorriso forçado — Tenho calor e estou cansada, mas me encontro bem. Alan
a
olhou
de
esguelha
com
um
desinteresse enganoso. —Acreditava que talvez tivesse algo a ver com o Campbell. Não parecia muito contente quando disse que nos acompanharia. Seu irmão era muito ardiloso. Um traço que faria dele um bom chefe no futuro, mas nada que fosse apreciável para uma irmã que preferia guardar seus pensamentos para si mesma.
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Apesar de seus esforços em não reagir a essas palavras, chiavam-lhe os dentes. —Não deveria ter-se intrometido. Quando seu pai lhe contou que sir Arthur havia tentando dissuadir de que cancelasse a viagem, não podia acreditar. Ao fracassar nisso, pediu
permissão
argumentando
que
para
os
acompanhar
suas
habilidades
como
rastreador ajudariam a garantir sua segurança. E para maior desgraça de Anna seu pai tinha aceitado. De modo que em lugar de ignorá-lo durante uma só jornada, agora teria que suportar sua presença constante durante dias, semanas inclusive.
Acaso
tentava
atormentá-la
de
propósito? Aquilo que tinha que fazer já era difícil sem que ele andasse revoando por aí. —É um cavalheiro, Anna. Um explorador. Informar
sobre
a
posição
do
inimigo
é
450
exatamente seu trabalho. E não posso dizer que não esteja agradecido de que venha conosco. Se for tão bom como diz ser, será muito útil. Anna se dirigiu a Alan com cara de estar horrorizada. —Está de acordo com nosso pai? Alan endureceu o queixo. Jamais criticaria a seu pai de maneira aberta, embora quisesse fazê-lo, como era o caso. —Teria
preferido
que
ficasse
em
Dunstaffnage, embora entenda a razão pela que pai insistia em que viesse. Ross se mostrará mais disposto ante uma solicitude direta —disse com um sorriso — É uma danada, Annie querida, mas uma danadinha encantadora. Anna torceu o lábio. —E você é tão protetor que molestas, mas eu também te adoro.
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Alan se pôs-se a rir e Anna não pôde a não ser unir-se a suas risadas. Sir Arthur voltou a cabeça para ouvir e a pegou despreparada. Seus olhares se cruzaram por um momento antes que lhe desse tempo a afastar o olhar bruscamente. Mas foi suficiente para que sentisse uma boa pontada no peito. por que tinha que ser tão doloroso? Alan não evitou esse intercambio de olhares. Voltou a ficar sério e a olhá-la com intensidade. —Está segura de que isso é tudo o que acontece, Anna? Já sei o que disse, mas me parece que entre sir Arthur e você há algo mais que os trabalhos de vigilância que pai te encomendou. Eu acredito que sente algo por ele. —A pulsação que Anna sentia no peito lhe dizia que seu irmão tinha razão, por mais que gostaria que não fosse certo — Podemos apelar ao Ross
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sem necessidade de um compromisso —disse seu irmão com carinho — Não é necessário que sacrifique sua felicidade para chegar a um pacto. Não pôde evitar emocionar-se. Era tão afortunada de poder contar com um irmão como ele… Sabia que poucos homens a tratariam com tal consideração. A felicidade não era algo a ter em conta no matrimônio entre nobres. O poder, as alianças, a riqueza, isso era o que importava. Mas o amor do que Alan desfrutou em seu matrimônio
tinha
dado
a
seu
irmão
uma
perspectiva única. Apesar de tudo, teriam muitas mais oportunidades de conseguir o apoio de Ross com uma aliança. Alan sabia tão bem quanto ela. Além disso, ajudar a sua família jamais poderia constituir um sacrifício. Arthur tinha expressado com brutal claridade que não havia nada entre eles.
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—Estou segura — disse com firmeza. A firmeza de sua voz ajudou a convencê-lo. Alan seguiu cavalgando junto a ela um momento mais na lembrança de suas anteriores viagens nos excepcionais momentos de paz, mas ao final acabou voltando junto a seus homens. Durante da primeira jornada fizeram grandes progressos e chegaram até o lago Lochy, onde passaram a noite em uma estalagem próxima à borda sul do mesmo. Aquele pequeno edifício de pedra com telhado de palha parecia antigo, e dada sua localização junto a uma ruína, Anna supôs que era. Estava dura e dolorida. Suas pernas, traseiro e costas se ressentiam por cada uma das horas desse longo dia, de modo que agradecia estar debaixo de um teto e em uma cama, por mais rudimentares que fossem. Lavou-se e se compôs
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para comer um pouco de caldo de pescado e pão de centeio antes de cair rendida no camastro junto à Berta, sua criada, que roncava no jergon do lado. A segunda noite, não obstante, não teriam tanta fortuna. Sua cama seria um simples cobertor em uma pequena tenda instalada na floresta ao sul do lago Ness. Fora um dia longo, mais longo ainda graças ao constante fluxo de informes de exploração de sir Arthur. Para evitar cenários suscetíveis de perigo, tais como rotas a campo aberto ou lugares propícios para as emboscadas, havia vezes que se desviavam bastante do caminho. O qual significava que em lugar dos quarenta quilômetros
que
teriam
percorrido,
fizeram
provavelmente uns cinqüenta e cinco através da espessura
dos
bosques
e
as
colinas
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serpenteantes de Lochaber. Aquilo a Anna pareceu de uma precaução exagerada. por agora, não tinha visto nada fora do normal, mais que habitantes da vila, pescadores e algum que outro ocasional grupo de viajantes. Se os homens de Bruce patrulhavam os caminhos, não se tinham feito notar. Talvez esses quilômetros a mais fossem outra forma de tortura idealizada por sir Arthur? Como se não fosse suficiente sua presença. As pernas de Anna, pouco acostumadas a passar dias cavalgando, tremeram ao se ajoelhar à borda do rio para lavar as mãos. Colocou a cabeça na corrente com a esperança de sacudir o cansaço, mas o frio golpe de água não a refrescava o suficiente. Quando tentou levantarse, coisa que fez com muita dificuldade, teve que resmungar ao conscientizar-se da objeção de
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seus ossos e articulações, que rangiam como se tratasse do corpo de uma anciã. Tomou seu tempo para saborear o momento de solidão, sem nenhuma pressa por voltar para acampamento. Embora o resto do grupo estivesse a poucos metros dela, o denso tanto de árvores parecia absorver todo o som. de vez em quando chegava até ela o murmúrio apagado de suas vozes, mas além disso tudo permanecia em uma calma excepcional,
o
que
representava
o
maior
momento de paz que tinha desde sua chegada ao barmkin no dia anterior pela manhã, quando encontrou a sir Arthur Campbell preparado para sair com eles. Aqueles dois dias tentando forçarse a não olhá-lo tinham cobrado sua cota. Era pior do que temia. Apesar de que o ignorasse e evitasse seus olhos cada vez que ele olhava em sua direção, cada um de seus movimentos lhe
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afetava de maneira dolorosa. O desassossego, que parecia lhe queimar o peito até furá-lo, era cada vez maior. Mais duro. Enfurecia-se com suas emoções, deixando-a nua e exposta. Não sabia por quanto mais poderia suportar. Por que tinha que estar ali? Suspirou com aborrecimento e deu as costas à tranqüilizadora correnteza que corria sobre as rochas. Berta faria que seu irmão fosse procurála como um louco se não retornasse no par de minutos que tinha prometido. Além disso, estava ficando de noite. Mal tinha dado uns passos em direção a floresta quando um homem saiu dentre as sombras e lhe fechou o passo. O pulso acelerou, presa do pânico. Esteve a ponto de dar a voz de alarme, mas seu gritou ficou sufocado ao reconhecê-lo. Fechou a boca de repente, mas
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seu pulso seguia igual de acelerado. —Não faça isso! —espetou ao mesmo tempo em que erguia o olhar para o belo rosto de sir Arthur — Me destes um susto de morte. Não tinha feito um só ruído. Como um homem tão corpulento podia mover-se com tal sigilo era algo que escapava a sua compreensão. —Melhor —respondeu ele — Não deveria estar aqui sozinha. —Não estava sozinha —disse Anna com um sorriso forçado — tinha você me espiando. Anna sentiu um prazer enorme ao ver que esticava a mandíbula. Era horrível por sua parte que lhe agradasse tanto, mas tentar tirar algum tipo de reação daquele homem parecia um lucro absoluto. Sir Arthur lhe dirigiu um olhar pausado e penetrante. —Algo do qual estou certo que conhece todos
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os segredos. Agora tocava a ela endurecer o gesto. Havia muita proximidade. Embora seu irmão e o resto dos homens estivessem a um grito de distância, aquilo supunha uma intimidade com ele muito maior da que ela queria. Qualquer tipo de intimidade com ele podia ser perigosa. Isso a fazia recordar coisas. Como o sabor especial de seus beijos. Ou o modo em que os grossos músculos de seu torso se esticavam à luz das velas. Ou a maneira em que as mechas onduladas de seu cabelo molhado caíam sobre seu pescoço. Ou seu aroma. «Aroma de sabão e a virilidade», pensou Anna enquanto aspirava. Arthur não se barbeou, e a barba incipiente lhe dava um aspecto esfarrapado e perigoso que, maldito fosse, o fazia ainda mais atraente. Ao comprovar que apesar de todo o ocorrido
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ainda conseguia lhe afetar do mesmo modo, Anna ficou furiosa e tratou de afastá-lo de seu caminho. Um exercício de futilidade como jamais houve algum. —Não há motivos para preocupar-se. Ele a agarrou seu braço para detê-la, como se a impenetrável barreira de seu torso não fosse suficiente. —A
próxima
acampamento,
vez
não
o
que
te
façam
afastes sem
do
guarda,
preferivelmente eu ou seu irmão. Suas bochechas se ruborizaram, zangada com o tom e sua atitude prepotente. Sir Arthur Campbell, cavalheiro ao serviço de seu pai, transpassava os limites. —Não têm direito a me dar ordens. A última vez que olhei não fostes tu, a não ser meu irmão, quem estava ao mando.
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Seus olhos brilharam ao mesmo em tempo que ele a agarrava pelo braço com mais força. Falava em voz baixa e sua boca… Anna ficou sem fôlego. Também sua boca estava baixa, a uma altura perigosa, tão perto da sua que doía. Se ficasse nas pontas dos pés, era possível inclusive que chegasse a tocá-la. Deus, que vontade tinha de fazê-lo. Estava desesperada por fazê-lo. Uma onda de calor invadiu todo seu corpo, concentrando-se nos seios e no encontro das coxas. Os mamilos se puseram eretos; morriam de vontade por roçar-se com seu duro peito. Aquela
traição
de
seu
corpo
parecia
humilhante. Ele não tinha nenhum direito a fazêla sentir assim. Não depois de a rechaçar de maneira tão cruel. Não depois de que partisse e deixasse claro que era tal e como o tinha
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imaginado em princípio. por que não podia deixála em paz simplesmente? —Não me desafiem nisto, Anna. Se quiserem que consiga a cumplicidade de seu irmão, farei. Quão único tentava era evitar a vergonha de que te tratem como a uma criança, mas farei tudo o que esteja em minha mão para te manter a salvo. Houve algo em sua voz que fez que lhe deu calafrios. —O que acontece? Estão os rebeldes perto daqui? Viu algo? Uma sombra cruzou o olhar de Arthur. Negou com a cabeça. —por agora não. —Mas têm um pressentimento. Arthur a olhou com total desconfiança, como se pensasse que tentava enganá-lo para que admitisse
que
ela
tinha
razão
quanto
às
463
habilidades
que
tinha
mostrado
com
antecedência. Parecia disposto a negá-lo, mas logo encolheu os ombros e lhe soltou o braço. —Sim, sinto o perigo. E também vocês deveriam senti-lo. Não cometam o engano de pensar que não estão aí simplesmente porque não os tenhamos visto. Assentiu, assombrada pelo que parecia uma preocupação sincera. —Farei como me pede. Ambos sabiam que não era uma petição, mas Arthur parecia estar satisfeito com sua aprovação e não quis discutir a semântica. Anna era consciente de que devia sair dali quanto antes, mas houve algo que a fez perguntar: —Por que estas aqui, sir Arthur? Por que insistiram em se unir a nosso grupo?
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Ele
afastou
o
olhar.
A
pergunta
lhe
incomodava. Muito. Franziu o cenho. —Pensei que poderia ser de ajuda a seu irmão. —E eu pensei que não gostavas de fazer reconhecimento do terreno. Sua boca se torceu em um irônico e enigmático sorriso. —Não é tão mau como temia. Anna observou seus traços com atenção, mas não estava muito segura do que procurava. —E essa é a única razão? Para ajudar a meu irmão? Arthur baixou o olhar para olhá-la nos olhos. A intensidade de seu olhar a penetrou com a sutileza de um raio. Era consciente do tic que pulsava sob seu queixo. estava-se controlando,
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mas do que? —Dado
que
não
atenderam
a
minhas
advertências, não ficou outra opção que vir e me assegurar de que chegassem a seu destino a salvo. Entregue a salvo às mãos de outro homem. —Estou segura de que sir Hugh apreciará seus serviços. Arthur ficou tenso e os olhos lhe brilharam com um fogo descontrolado. Por um momento Anna pensou que a empurraria contra a árvore e a beijaria. Mas não o fez. Em vez disso apertou os punhos e ficou olhando-a com raiva. Dizia a si mesma que não era decepção o que sentia. Isso dizia a si mesma. Mas não acreditava. —Não me provoque, Anna. Mas o tempo das advertências já tinha passado para ela.
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—Que não lhes provoque? Como poderia o provocar se não vos afeta? Deixou muito claro naquela noite nos barracões. Fosse tu quem disse que me separasse de seu caminho e não ao contrário, recordam? —Recordo. A suavidade de sua voz lhe disse que não era isso tudo o que recordava. A pele começou a lhe arder e parecia sair dela. As lembranças crepitavam entre eles como um sopro de ar sobre brasas, acendendo-se, dispostos a prender-se fogo. Anna estava sumida na frustração. Não podia entender por que fazia aquilo. —É que mudastes de opinião? Em outro momento Arthur teria admirado aquele desafio. A franqueza e a naturalidade de Anna eram o que faziam dela uma mulher única. Mas nesse momento não. Não queria pensar em
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se tinha mudado de opinião. Estava lhe custando muito, Deus e ajuda simplesmente não lhe pôr as mãos em cima. por que não podia ser tímida e retraída? Aí sim se sentiria seguro. Sabia que atuava como um idiota, mas esses dois dias junto a ela, vendo-a voltar o rosto para evitar seu olhar, atuando como se ele não fosse mais que uma espada mercenária, fazia que chegasse ao limite de seu autocontrole. Não poderia agüentar vê-la outra noite rondando pelo acampamento rindo e divertindo-se com os homens com uns sorrisos que brilhavam quando olhava em sua direção. Gostava de estar à margem, maldita seja. Mas de seu posto nos limites do acampamento, longe da camaradagem da fogueira, encontravase suspirando pela calidez desses sorrisos. Por um pouco dessa risada. um pouco dessa luz.
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Sua intenção era que ela reconhecesse sua presença. Mas tudo que tinha conseguido era revolver
coisas
que
não
precisavam
ser
revolvidas. Tais como o assustador desejo de empurrá-la contra a árvore e abusar dela. Quase podia sentir como seus braços lhe rodeavam o pescoço e suas pernas envolviam seus quadris, em tanto que ele se afundava em seu interior, lenta e profundamente. Quase via seu pequeno e suave corpo estirando-se contra o seu, todas essas sedutoras curvas fundindo-se sobre ele, a excitante turgidez de seus mamilos lhe roçando o peito… Demônios! Teve
que
agitar-se
para
recuperar
a
compostura. Mas o inchaço que ocultavam seus calções era duro e implacável. Aquilo não tinha que ser tão endiabradamente difícil.
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«Te concentre. Faz seu trabalho. Mantem o bastante perto para vigiá-la, mas sem tocar. Não deixe que se aproxime muito.» Havia muitas pessoas dependendo dele. Tinha que estar ciente do que realmente importava. Assegurar-se de que Bruce chegasse ao trono e derrotar seus adversários. Como John de Lorn. Essa era a oportunidade de ver como seu inimigo pagava pelo que tinha feito a seu pai. Justiça. Sangue
Vingança.
por
sangue.
Endireitar
o
Essa
toda
fora
errado. sua
motivação desde que tinha uso de razão. Tinha dedicado sua vida a tentar consagrar-se como o melhor guerreiro com um só objetivo em mente: destruir a Lorn. Essa fria determinação era sua companheira há quatorze anos. A firme resolução de
levar
uma
missão
até
suas
últimas
conseqüências, custasse o que custasse. Essa
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era a única coisa que tinham em comum todos os membros da Guarda Highlanders, apesar de suas grandes diferenças de personalidade, do irreprimível bom humor do MacSorley e a impulsividade do Seton até o mau gênio do MacRuairi. Mas nunca antes tinha tido tantos problemas para aferrar-se a isso. Arthur deu um passo atrás com a intenção de dissipar a bruma de desejo que o atendia. Mas seu corpo bulia de desejos insatisfeitos. Uns desejos que cada vez lhe parecia mais difícil ignorar. Andar por aí com o membro duro pego ao ventre não era algo que fizesse muito para remediar seu mau humor. E sua mão tampouco parecia um grande alívio. Ao ver que ele não respondia, Anna disse: —E bem? Tinha mudado de opinião? Negou com a
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cabeça. —Não. Nada tinha mudado. Seguia sendo a filha do homem ao que tinha ido aniquilar. Quão único o futuro lhes proporcionaria seria a traição. Não tinha intenção de piorar as coisas. Anna não deu amostras de que sua resposta a decepcionasse. Melhor parecia algo que esperava. —Então por que fazem isto? por que atua como se o importasse com quem contraio matrimônio? Não me quer mas tampouco quer que alguém me tenha, é isso? Arthur murmurou uma imprecação ao mesmo tempo em que passava as mãos pelos cabelos. —Não é isso. De fato, era exatamente isso. Anna tinha dado justo no prego. Estava ciumento, maldita
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seja. Embora não tivesse nenhum direito a estar. Embora fosse ele quem a desalentasse. Embora não houvesse nenhuma possibilidade de que estivessem juntos. Pensar em que ela se casaria com outro homem fazia que caísse em ataques de ciúmes juvenis. Anna o olhou nos olhos. —Então expliquem - me disse isso em voz baixa — O que é o que sentem por mim? «Jesus.» Essa era a última coisa em que queria pensar. Somente ela seria capaz de tal pergunta. Anna MacDougall não tinha nenhum pingo de acanhamento ou de desânimo. Era direta. Sem rodeios. Despretensiosa. Deus, era uma mulher incrível. Nem todo o treinamento do mundo podia o fazer parar de mover os pés nervosamente. Não se sentia tão encurralado desde aquela vez em
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que seus irmãos o fizeram retroceder até a saliência de um escarpado e o provocaram para que se defendesse de seus golpes de espada. —É complicado — disse, saindo-se pela tangente. Os olhos dela não deixavam de escrutinar seu rosto em busca de algo que não havia neles. —Complicado não me vale. —Anna baixou o olhar
—
Não
quero
que
esteja
aqui
—
acrescentou com uma voz tão rígida como a posição de seus ombros. Tampouco ele queria estar ali, mas não ficava mais opção que fazê-lo. Anna voltou a erguer os olhos para olhá-lo. Já não havia calidez nessas profundidades azul brilhante — O rogo isso, me deixem em paz, simplesmente. O suave rogo dessa voz apelava a sua consciência, mas ardia no peito de igual forma.
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Anna deu meia volta e se afastou dali com o porte majestoso de uma rainha. Desejaria poder fazê-lo, pelo bem de ambos. Mas sua missão vinha em primeiro. Algumas semanas
mais.
Poderia
agüentar
algumas
semanas mais. Tinha resistido desafios muito mais perigosos. Tudo que tinha que fazer era escorar suas defesas, fechar as comportas e preparar-se para o assédio final. Capítulo 13 Arthur partia na vanguarda, inspecionando o terreno com dois dos homens de MacDougall, quando percebeu de que algo não ia bem. Uma mudança no ar. Um calafrio que percorria a nuca. A súbita sensação que ativava todas suas terminações nervosas para lhe advertir: «Perigo».
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Tinham completado a terceira jornada da viagem virtualmente em sua totalidade. O trajeto a cavalo pela ribeira oeste do lago Ness foi mais longo do esperado, não por tentar evitar aos homens de Bruce, a não ser devido a uma ponte impraticável de Invermoriston. Teriam tentado cruzar as turbulentas águas em caso de não levar consigo Anna, mas em vez disso tiveram que
desviar-se
outros
oito
quilômetros
do
caminho para chegar ao seguinte vau. assim, aproximaram-se do extremo sul dos bosques do Clunemore mais tarde que o que ele esperava. De ali virariam para o este, abandonando o caminho para afastar-se todo o possível do castelo Urquhart, ocupado pelos rebeldes. O plano era acampar a última noite à beira do lago Meiklie, o qual queria dizer que o dia seguinte seria
mais
exaustivo
ainda,
já
que
a
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relativamente plaina estrada daria lugar às colinas. Apesar de que Arthur trabalhava melhor sozinho, Alan MacDougall insistiu em que lhe acompanhassem dois de seus homens se por acaso se encontrava com dificuldades. Ao não poder explicar ao irmão de Anna que esses homens representariam mais problemas que ajuda sem trair suas habilidades, Arthur teve que acessar a contra gosto. À primeira sensação de perigo ergueu uma mão para que os homens se detivessem. Desceu do cavalo, ajoelhou-se e pôs uma palma plaina contra o chão. A leve reverberação confirmou o que seus sentidos já lhe tinham advertido. Richard, o maior dos dois guerreiros e explorador
habitual
do
MacDougall,
ficou
circunspeto.
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—O que há? Arthur baixou a voz. —Voltem e digam a seu senhor que saiam do caminho imediatamente. Alex, que era aprendiz de explorador, olhou-o com estranheza sob o aço de seu nasal. Ao contrário de Arthur, Alan e o punhado de cavalheiros que usavam elmo, cota de malha pesada e peitilho, os homens do clã dos MacDougall levavam armadura mais leve e o cotun de couro acolchoado que preferiam os highlanders. Essa indumentária de guerra fazia mais fácil o movimento. Não era a primeira vez que Arthur tinha vontade de desfazer-se de seu pomposo traje de cavalheiro e mandar a passeio a mascarada. O mais jovem dos homens olhou a seu redor. —Por quê?
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Arthur franziu os lábios. Ficou em pé e voltou rapidamente para seus arreios. —Há um grupo numeroso de cavaleiros que se dirigem justo para nós. Richard o olhou como se estivesse louco. —Eu não ouço nada. Aqueles
idiotas
acabariam
fazendo
que
matassem a todos. Sem tempo para sutilezas, Arthur agarrou ao maior por seu grosso cangote, ergueu-o um par de centímetros dos arreios e aproximou seu rosto a dele. —Façam o que digo, maldita seja. Dentro de alguns minutos será muito tarde. Querem que matem a dama por sua estupidez? O
homem
negou
com
a
cabeça,
impressionado com a transformação que sofria o cavalheiro. Quando começou a boquejar para recuperar o fôlego Arthur o soltou de um
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empurrão. —Eu os rodearei pelas costas e tentarei distraí-los. —Com sorte, disse, poderia desviá-los para o norte — Digam a sir Alan que saia do caminho imediatamente, que se dirija para o este e
cavalguem
tão
rápido
como
podem.
Abandonem as carretas se for necessário. Encontraremo-nos no lago assim que me seja possível. Subitamente,
Richard
moveu
sua
grosa
cabeça para o norte. Um leve som de pegadas de cavalos batia em sua direção. Voltou-se para Arthur com um olhar que albergava tanto temor como suspeita. Inconscientemente, deu meia volta com seu cavalo. —Pelos ossos de Cristo, têm razão! Ouço-os. Arthur não tinha tempo de preocupar-se com a inquietação do outro.
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—Irei contigo - disse Alex. —Não — repôs Arthur em um tom de voz que evitava qualquer discussão — Vou sozinho. Assim
seria
mais
fácil
evitar
que
os
capturassem. Além disso, sempre cabia a possibilidade
de
que
conhecesse
alguém.
Supunha-se que MacGregor, Gordon e MacKay estavam no norte. —Partam! —disse. Os homens fizeram o que lhes pedia sem mais discussão. Arthur tampouco perdeu mais tempo. Cavalo e homem se introduziram entre as árvores em sua carreira por alcançar aos cavaleiros pelas costas antes que aparecessem ante o grupo do MacDougall. Era consciente de que apesar de estar advertidos, demorariam certo tempo em conduzi-los até um lugar seguro. Anna era uma
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boa amazona, mas não podia dizê-lo mesmo de sua criada. As carretas aumentaram seu ritmo ainda mais. Se algo sabia das mulheres era que não gostavam nada de abandonar seus finos trajes e sapatos. Ao menos Anna não tinha insistido
em
levar
com
eles
ao
maldito
cachorrinho. Arthur estava já cansado de limpar os pés. Arthur
ziguezagueou
entre
as
árvores,
usando o som dos cavalos como guia, e cavalgou em paralelo aos homens alguns poucos e preciosos minutos até que se dirigiu para eles. Agora vinha a parte delicada: aproximar-se o suficiente para chamar sua atenção, mas nem tanto para que o capturassem. Amaldiçoou para si ao ver pela primeira vez ao grupo de cavaleiros através de um vão entre as árvores. Tinham todo o aspecto de uma leva de guerreiros. Havia mais
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dos que gostaria, ao menos uma vintena de homens armados até os dentes com mantas de cores escuras, vestimenta de guerra e escudos obscurecidos com breu, um modo de camuflar-se na noite próprio dos Guardiões das Highlands que adotaram mais tarde muitos dos guerreiros de Bruce. Normalmente não pensaria duas vezes ante um exército tão formidável. Estava adestrado para lutar contra coisas piores. Mas esses homens conheciam o terreno e ele não. Teriam vantagem. Um giro mal dado e acabaria em suas garras. Mesmo assim ele contava com vantagens que eles não tinham: sentidos afiados como facas, velocidade, uma força e um treinamento superiores e a habilidade de desaparecer entre as sombras. Distinguiu ante ele uma ruptura na linha de
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árvores. Aí o tinha. Apertou os dentes, baixou a cabeça e saiu como um raio para o claro. Fingiu surpreender-se
por
sua
abruptamente
para
a
presença esquerda,
e
girou
como
se
quisesse evitar ser visto. Um grito o alertou do cumprimento de seu objetivo. Não se atreveu a diminuir a marcha e olhar para trás para ver se tinham mordido o anzol. Uma fração de segundo de atraso podia significar a diferença entre escapar ou ser capturado. Mas, momentos depois ouviu o ensurdecedor som das pegadas de cavalo atrás dele e sorriu. A caça tinha começado. Anna tentava não pensar em quão tarde era. Mas à medida que a escuridão descia e que a lua se erguia no céu lhe custava mais acreditar que se encontrava bem. Esse medo que permanecia em espera ante o tumulto de seus próprios
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esforços para escapar aos soldados inimigos retornou com toda sua força assim que estiveram a salvo. E a coisa piorava com cada hora que passava sem a volta de Arthur. Que lhe atormentasse tudo o que quisesse, isso não importava. Mas que voltasse são e salvo. Ajustou a capa nos ombros e disse que não devia preocupar-se. Chegar até eles de novo tomaria seu tempo atrás da animada perseguição em que Arthur os embarcaria. «Mas tanto tempo?» mordeu o lábio em uma tentativa de mitigar a crescente sensação de pânico. «Ele não se deixaria apanhar.» Entretanto, eles eram um monte de homens e ele só um. «Não pode estar morto.» Se fosse assim saberia. O coração lhe deu um tombo. Não era isso certo? —Milady, a sopa está deliciosa. Tome —disse Berta sustentando a colher ante ela — Provem.
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Embora seja só um pouco - acrescentou, como se Anna fosse uma menina de cinco anos que se negava a comer nabos. Mas Anna seguia sem gostar dos nabos. Negou com a cabeça e se esforçou em sorrir a sua preocupada criada. —Não tenho fome. A anciã pôs cara de estar admirada, fazendo que as rugas de seus olhos cor mel se esparramassem por seu rosto. O aspecto de Berta, com sua apenas um e cinqüenta de estatura e tão magra como um palito, não é que fosse formidável. Mas naquele caso seu rosto era de decepção. Podia ser tão teimosa e áspera como uma mula velha. —Têm que comer algo. Conseguirá te pôr doente. Já estava. Doente de preocupação. Somente
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de pensar em comida lhe dava vontade de vomitar. Conteve o acesso de bílis que lhe chegou à garganta. —Comerei —mentiu Anna — dentro de um momento. Berta lhe deu um tapinha na mão, que descansava sobre o musgoso tronco que as separava. Reuniram-se em torno do fogo junto ao resto
da
escolta,
mas
o
acampamento
permanecia em uma quietude incomum e os homens estavam desanimados. Todos eram conscientes de que tinham escapado por pouco e não era ela a única que se perguntava o que teria ocorrido com o cavalheiro que os pôs sobre aviso. —Que morras de fome não fará que volte antes. Os
pensamentos
de
Anna
eram
mais
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transparentes do que acreditava, mas estava muito preocupada para fingir que não sabia do que lhe falava Berta. —Acredite que terá ocorrido algo? Berta apertou sua mão e negou com a cabeça tristemente. —Não sei pequena minha. Não sei. O coração de Anna sofreu uma violenta sacudida. A perspectiva tinha que ser terrível para que Berta não se esforçasse por mentir sequer. Voltaram a ficar em silêncio. Anna olhava as chamas da fogueira sem vê-la enquanto Berta acabava sua sopa. Então Anna ouviu um ramo que rangia atrás dela e se levantou de um salto. Voltou o rosto com o coração na boca, esperando ver um cavalheiro vestido com cota de malha sobre seu cavalo. Assim foi e por um segundo pensou que
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seria Arthur. Mas seu coração topou com uma decepção. Tratava-se simplesmente de seu irmão Alan, que desmontou do cavalo e atou as rédeas a uma árvore próxima. A expressão sombria que mudou seu rosto à medida que se aproximava a encheu de pavor. —Tem descoberto algo? —perguntou. —Não —repôs seu irmão negando com a cabeça — Nem rastro dele. —Acredita que… —Anna não se atreveu a terminar a frase. Alan a olhou com atenção. —Já deveria ter retornado. A verdade doía como um murro nas vísceras. Lágrimas de angústia afloraram em seus olhos. Acabava de brotar a primeira delas quando ouviu um assobio que atravessava a noite. —É o sentinela noturno - disse Alan antes
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que Anna tivesse tempo de perguntar — Alguém se aproxima. O alarme deu origem a uma pequena comoção. Anna foi primeira em saltar de seu assento de repente, mas isso mesmo foi o que fizeram o resto dos homens. O primeiro que ouviu antes de vê-lo foram os gritos provocados pela emoção e o alívio. Momentos depois, Arthur penetrava no círculo de luz que provia o acampamento e o coração de Anna dava tombos no
interior
de
seu
peito.
Inspecionou
ao
cavalheiro em busca de sinais de ferida, mas além do cansaço que refletia seu bonito rosto e da sujeira e o pó de sua cota de malha se via em perfeitas condições. Completamente ileso. A emoção a embargava com tal força que deu um passo adiante sem poder controlar-se. Lutou por dominar o impulso de ir atrás dele, de correr
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a seus braços, de rodeá-lo com os seus e chorar toda sua angústia na suja e poeirenta cota de malha que revestia seu peito. Não tinha direito a fazê-lo.
Nem
fundamentos.
Não
estavam
prometidos, nem se cortejavam sequer. Não eram nada um para o outro. Logo ela pertenceria a outro homem. Então Arthur a viu. Por um estúpido momento ela se convenceu de que a estava procurando. Seus olhos se encontraram com uma força letal que repercutia em seu peito e o golpeava com os ecos da nostalgia. Se naquele momento ele houvesse virado o rosto, ignorando-a com frieza, provavelmente Anna teria confrontado seu futuro com uma resolução firme no coração. Mas em vez disso Arthur percebeu seu desespero e assentiu levemente. «Estou bem.»
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Era pouco, mas ao menos era algo, e servia como
reconhecimento
de
que
existia
uma
conexão entre ambos. Entre eles dois havia algo especial. Não podia negá-lo por mais tempo. Importava-lhe. Arthur a olhou por última vez e seguiu adiante para encontrar-se com o Alan. As
emoções
de
Anna
estavam
descontroladas. Afetava-lhe muito que acabava de ocorrer para concentrar-se em nada, assim escutou pela metade o relatório que fazia a seu irmão. Eram os homens de Bruce. Um grupo numeroso de guerreiros. O número chamou tanto a atenção que ficou sem fôlego. Vinte e cinco homens. O normal seria que Arthur estivesse morto.
Primeiro
os
tinha
desviado
vários
quilômetros do castelo do Urquhart e depois se dirigiu para o este. Entretanto, os malfeitores
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tinham dado provas de ser bons cães de presa, e Arthur se viu obrigado a voltar a pé para o acampamento. Anna suspeitava que estivesse deixando muitas coisas no tinteiro. Alan lhe agradeceu os serviços prestados a todos e o ameaçou a que se sentasse enquanto pedia comida e bebida para ele. Seu irmão falou com Arthur um momento mais antes de lhe deixar comer, mas em voz baixa, de modo que ela não pôde escutar nada. Anna bicou um pedaço de carne-seca de vitela e torta de aveia e ficou rondando por ali, como fizera a maioria dos homens. Entretanto, à medida que caía a noite, algo começou a lhe preocupar. O acampamento se animou com sua volta, e parecia óbvio que todos se alegravam de que não o tivessem capturado, mas a celebração não era a esperada e isso a desconcertava. Além disso, acontecia
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algo anormal. Ninguém tinha aproximado, além de seu irmão. Em lugar dos tapinhas nas costas, as brincadeiras pesadas e os brinde que seriam de praxe, pareceu-lhe que mais de um o olhava com cara estranha. Arthur não parecia conscientizar-se. Acabou com sua comida, terminou o odre de cerveja que lhe tinham levado e se retirou de novo à solidão dos bosques. Anna o observou partir e sentiu uma premente necessidade de fazer algo. Olhou aos homens do clã que tinha ao redor. O que lhes passava? Por que atuavam de tal modo? Chegou um ponto no que já não pôde agüentar-se mais, desculpou-se e foi procurar seu irmão. Alan estava falando com alguns de seus homens, mas ao vê-la chegar os ordenou que se retirassem. —Acreditei que estaria aliviada.
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Evitou fazer como que não entendia do que falava. —Estou. —E então a que vem a ser esse rosto, pequena? —Por que atuam os homens desse modo? Por que não lhe dão obrigado? Por que o evitam? —Está segura que não é justamente o contrário, irmã? —repôs Alan esboçando um sorriso irônico — Campbell não é precisamente conhecido por sua sociabilidade. Gosta de estar sozinho. —Seu irmão tinha razão, mas nessa ocasião não se tratava só disso. Os soldados se mostravam
incômodos,
quase
temerosos.
Quando o fez saber, Alan suspirou e negou com a cabeça — Ocorreu algo hoje quando nossos homens batiam o terreno. Richard me contou isso e provavelmente também contou ao resto.
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Conforme parece, Campbell ouviu os cavaleiros antes o bastante, antes que houvesse sinal alguma deles. Richard disse que era coisa de bruxaria. Todo o prazer que Anna pudesse sentir ao ver confirmadas suas próprias suspeitas em relação ao ocorrido com os lobos, empalideceu em comparação com a fúria que atormentava seu interior. Suas bochechas se ruborizaram de indignação. —Isso é ridículo. É que não se dão conta de que
salvou
a
todos?
Teriam
que
estar
agradecidos e não tratá-lo como a um cão. —Estou de acordo. Mas já sabe quão supersticiosos podem ser os highlanders. —Isso não é desculpa. —Não, não é. Falarei com o Richard e tentarei acabar com isso.
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Anna saltou de seu assento de repente. —Faz ou falarei com ele eu mesma. Não penso permitir que rechacem sir Arthur por nos ajudar. Pelas chagas de Cristo, Alan! Sem essa bruxaria, é possível que agora estivéssemos todos mortos. Alan a olhou com atenção, e o que viu nela pareceu
lhe
preocupar.
Ficou
pensativo,
assentindo simplesmente com a cabeça, em lugar de criticar por usar essa linguagem vulgar. Anna partiu dali com o propósito de encontrar Arthur, mas seu irmão adivinhou seu destino, porque gritou: —Amanhã
pela
tarde
chegaremos
a
Auldearn, Anna. Ela se voltou e lhe dirigiu um olhar inquisitivo, perguntando-se a que viria aquilo. —Sim.
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—Se tiver intenção de ir a sério com o compromisso de casar-se, talvez fosse melhor que o deixasse tranqüilo. Duvidou ao ouvir a verdade em palavras de seu próprio irmão. Mas não podia fazê-lo. As ações desse homem tinham despertado todos seus instintos de amparo. Tinha que agradecerlhe embora os outros não fizessem. Encontrou-o à beira do lago, sentado em uma rocha plaina, depois de ter tomado um banho. Tinha o cabelo molhado e vestia uma simples regata de linho com uma túnica e as perneiras de couro. Estava inclinado sobre seu peitilho, aplicando azeite com um trapo, e sua expressão, vista de perfil, era mais sombria que nunca. Embora parecesse óbvio que a tinha ouvido chegar, Arthur não deu a volta. Uma vez que esteve mais perto, Anna distinguiu o que limpava
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e o mundo lhe veio em cima. «Sangue.» Apressou-se para ele sem pensar, ajoelhouse e pôs uma mão no braço. —Está ferido. Quando ergueu o olhar para olhá-la, a lua iluminou seu rosto. —Não é meu - disse. Uma sensação de alívio se expandiu por todo seu ser. Suspirou profundamente. Embora seu rosto permanecesse impassível, percebeu uma estranha emoção em sua voz. Virtualmente soava como se estivesse arrependido. Como se a morte de um de seus inimigos fosse algo que o perturbasse. Talvez para os guerreiros matar não fosse tão fácil como ela imaginava. Em qualquer caso não para ele. Isso o fazia mais humano em certo
sentido.
Mais
vulnerável.
Sir
Arthur
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Campbell vulnerável? Esse pensamento a teria feito rir sozinho algumas semanas antes. —Não tinha outra alternativa - disse Anna com ternura. Arthur lhe manteve o olhar por um momento e depois dirigiu para a mão que tocava seu braço. Anna sentiu imediatamente a intimidade dessa cálida e rígida pele que apertava com seus dedos e se apressou a retirá-la. Mas isso não conteve a necessidade de aninhar-se junto a ele e repousar a bochecha contra o amplo escudo protetor de seu peito. Arthur voltou para a tarefa de tirar as manchas incrustadas entre as pequenas peças de metal. Anna se sentou junto a ele em uma rocha mais baixa e o observou em silencio durante vários minutos. —Por que está aqui, Anna?
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—Queria lhes agradecer o que fez hoje. Arthur encolheu levemente de ombros, sem levantar o olhar de sua tarefa. —Não fiz mais que meu trabalho. Para isso estou aqui. Anna mordeu o lábio ao recordar o quão furiosa que a pôs sua intromissão e o cepticismo com o que acolheu suas razões para lhes acompanhar. —Ao que parecia tinham razão —admitiu — Lhes agradeço que nos tenham acompanhado na viagem. Todos o agradecemos - disse franzindo o gesto com irritação — Embora alguns tenham uma estranha forma de demonstrá-lo. Os ombros de Arthur se esticaram quase imperceptivelmente. —O que é o que dizem? —Que sentiram aos cavaleiros antes que
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fosse possível fazê-lo. Arthur arqueou uma sobrancelha, divertido com sua tentativa de suavizar o golpe. —Seguro que disseram algo mais que isso. As superstições de seus companheiros de clã ruborizaram as bochechas de Anna. —É certo, verdade? É como aquilo que aconteceu os lobos e quando tropecei no escarpado. Podem ver as coisas antes que aconteçam. Anna lhe suplicou com os olhos que não mentisse. Outra vez não. Ele ficou calado durante tanto tempo que pensou que não lhe responderia. —Não é de tudo assim —disse finalmente — É mais como um pressentimento. Meus sentidos estão mais afinados do normal. Isso é tudo. —Afinados?
—repetiu
ela
—
São
extraordinários. —Seu louvor não pareceu a não
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ser o incomodar mais — Não entendo como o resto dos homens não é capaz de compreendêlo. Salvaram a todos. —Deixem estar, Anna. Não tem importância disse olhando-a com gesto severo. Parecia falar a sério, algo que mais que atenuar suas faculdades as ressaltava. —Como podem dizer isso? É que não vos molesta? Teriam que lhes agradecer o que têm feito e elogiar suas extraordinárias habilidades, em lugar de atuar como crianças que tivessem medo de encontrar um trasgo na cama ou fantasmas dentro do armário. A indignação que Anna sentia pelo trato que lhe dispensavam não encontrava a avaliação esperada. Uma vez mais pareceu que essa conversa lhe incomodava. Arthur a olhou com dureza.
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—Não é algo que me incomode e tampouco necessito que façam as coisas mais difíceis advogando por minha causa. Não quero que mencionem nada a respeito do que acreditaram ver. Deixem passar e cairá no esquecimento. Insistam e piorarão. Falava da experiência. Anna teve que apertar os lábios para não discutir. Aquilo não estava bem e a injustiça que suportava fazia aflorar todo seu instinto de amparo. Incomodava-o. Tinha que ser, por mais que se mostrasse despreocupado. Que estivesse tão acostumado a essa sutil crueldade das pessoas e que a desse por certa fazia disso um pouco mais duro. Encolhia-lhe o coração. Quantas vezes o teriam rechaçado ou repudiado para que se convertesse em uma pessoa tão insensível e
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indiferente? Seria isso o que o afastava de outros?
Todo
seu
distanciamento
e
individualismo lhe pareceram de repente uma máscara para sua solidão. Levava tanto tempo só que tinha chegado a convencer-se de que gostava. Seu coração se compadecia dele. Era tão afortunada de ter a sua família… Odiava pensar que uma pessoa pudesse estar sozinha. —Anna? —disse ele procurando seus olhos à luz da lua. Teria adivinhado a direção que tomavam seus pensamentos? — me prometa que não dirá nada. Anna pôs cara feia, mas assentiu. Ele se levantou para passar o apertado peitilho pela cabeça se vestiu com um tabardo limpo e trabalhou em excesso na sujeição de suas numerosas armas. Observar como se vestia era um ato que transbordava intimidade, mas a Anna
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não envergonhava fazê-lo. Ao contrário, parecia natural. Como se pudesse passar todos os dias de sua vida vendo como ele se preparava para a guerra. Aquele pensamento teria que tê-la horrorizado, mas, em vez disso, viu-se invadida por uma intensa sensação de desejo, de saudade por algo que lhe escapava das mãos. Fazia que se expusesse seu futuro e pensasse que talvez ele não fosse o homem errado, a não ser exatamente o adequado para ela. Um guerreiro estável. Isso parecia algo contraditório. Mas talvez fosse ela quem se equivocava de cabo a rabo. —O que fará quando acabar a guerra? — perguntou. Perguntava-se se não teria pensado em fazer algo com seus desenhos, talvez. Ou estaria simplesmente esperando a seguinte guerra para
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lutar nela? A pergunta o pegou despreparado. Arthur estava atendo-se a espada e a deixou pela metade. O certo era que não tinha dedicado muito tempo a pensar. Fazia muitos anos que a guerra consumia sua vida. Lutar era para quão único servia. Primeiro junto a seu irmão Neil e logo
como
membro
dos
Guardiões
das
Highlands. Era um soldado profissional. Um dos melhores do mundo. Era o único que sabia fazer. Mas era isso o que ele queria? O teria escolhido ao ter a oportunidade? Uma vez que houvesse justiça para seu pai, que Bruce tivesse o trono assegurado, uma vez cumpridos os objetivos… o que faria então? Terras e uma rica esposa seriam sua recompensa. Isso teria que bastar. Mas ao olhar a aquela mulher que o acabava de defender tão
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fervorosamente,
que
o
via
como
alguém
extraordinário em lugar de horripilante, que tinha um coração que não lhe cabia no peito, perguntava-se se realmente seria suficiente com isso. Ao olhar essa carinha arrebitada, banhada pela luz da lua entre tênues sombras, sentiu uma estranha angústia. Saber que era algo impossível não lhe impedia de seguir desejando-a. Mas já tinha mostrado muito de si mesmo. Estava tão acostumado
a
mentir
a
respeito
de
suas
habilidades que lhe parecia estranho ouvir a verdade em voz alta. Estranho, mas também consolador.
Manteve-se
afastado
do
resto
durante tanto tempo que esquecia o que era ter conexão com alguém. Estava completamente louco. Sua única desculpa era que o tinha pego em um momento de debilidade. O sangue que
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limpava de seu peitilho era a dos dois homens que se viu obrigado a matar para defender-se. «Protege sua identidade custe o que custar. Protege a missão.» Deus, às vezes odiava o que tinha que fazer. Acabou de ajustar o armamento antes de responder. —Eu diria que isso dependerá do resultado. Inclusive nesse lusco-fusco percebeu que o rosto de Anna empalidecia, mas se recuperou com rapidez. —Não há mais que um resultado possível. Não conhece meu pai. Não perderá. —Arthur ficou tenso. Sabia isso melhor que ninguém. Essa era a razão pela que estava ali — O rei Hood e os rebeldes serão submetidos e levados diante da justiça. Apesar de que soasse como o melhor e mais
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leal dos soldados do clã MacDougall, podia perceber a fragilidade que se escondia atrás daquela bravata. Anna seguia aferrando-se a ilusões que começavam a apresentar fissuras. Mas
estava
claro
que
era
consciente
do
desesperado de sua situação, ou não estariam ali nesse momento. —E mesmo assim acode ao Ross para lhe permutar por tropas adicionais. Anna endireitou as costas de repente. Seus olhos
brilhavam
com
intensidade
ante
o
resplendor da lua. —Não se trata exatamente disso. Sim, se tratava disso. E seu trabalho era assegurar-se de que não ocorresse. Não queria ser cruel, mas ela precisava confrontar a realidade. O pêndulo se afastava dos MacDougall. Bruce estava ganhando a
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guerra. —E o que passará se fracassar, Anna? O que acontecerá Ross não está de acordo em mandar mais homens? Então o que? —Meu
pai
pensará
algo.
—Soava
tão
desesperada que, sem se dar conta, esteve a ponto de aproximar-se até ela para consolá-la — por que falas de tal modo? —perguntou — Falas como um rebelde. Por que está aqui então, se não acredita em nossa vitória? Amaldiçoou para si. Tinha razão. E logo descobriria quanta. Encolheu-lhe o estômago ao pensar em como a afetaria descobrir a verdade. Gostaria de poder suavizar o impacto de algum modo. —Essa é justamente a razão pela que estou aqui, Anna. Por acreditar em uma causa. Por acreditar que ganhará o lado adequado. Mas as
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coisas não passam sempre do modo em que alguém pensa. Não quero lhe ver sofrer. — Deteve suas palavras e voltou para a questão original — Para quando a guerra acabe me prometeram terras e outras recompensas. Isso deveria bastar para me manter ocupado. Anna inclinou um tanto a cabeça e umas linhas
brancas
diminutas
povoaram
seu
Que
de
sobrecenho. —Outras
recompensas?
tipo
recompensas? —Embora não lhe respondeu, a resposta pareceu ir a sua cabeça de repente. Sobressaltou-se
ao
cair
na
conta
e
sua
expressão de estranheza desvelou mais do que queria — Uma esposa? Eles prometeram uma esposa?
—Arthur
assentiu
levemente,
reconhecendo — Quem? Uma das maiores herdeiras das Highlands
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ocidentais,
a
segunda
irmã
de
Lachlan
MacRuairi, lady Christina, senhora das Ilhas. —Não sei —mentiu Arthur — Quando acabar a guerra me encontrarão uma esposa adequada. Não era a primeira vez que desejava ser capaz algo precipitado, como tomá-la entre seus braços e lhe fazer promessas que jamais poderia cumprir. —Já vejo —disse ela com voz diminuída — E por que não me contaram isso? Ele a olhou com atenção. —Como fizeram todos? Anna estremeceu. Ao que parecia, tinha esquecido para onde se dirigiam. Mas ele não o tinha feito. A cada passo que os aproximava do Auldearn e Ross, Arthur sentia crescer a inquietação em seu interior. Sabia que tinha que fazer algo para evitar essa aliança, pela missão,
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conforme dizia a si mesmo. Mas o que? Talvez
não
absolutamente. simplesmente
tivesse Era
se
que
fazer
nada
possível
que
Ross
retomar
as
negasse
a
conversações sobre o compromisso. Mas com somente olhar a doce cara de Anna, Arthur foi consciente de que estava sonhando. Sir Hugh ficaria com ela com os olhos fechados. Apertou a mandíbula e lhe estendeu a mão. —Vamos, temos que retornar. Faz-se tarde e temos um longo dia pela frente. Quando Anna deslizou uma mão sobre a dele uma onda de calor invadiu todo seu ser. sentiase... satisfeito. Como se não houvesse nada mais natural que ter essa pequena mão entre as suas. Todos seus instintos clamavam por agarrá-la e não deixá-la escapar. Mas em vez disso, permitiu que seus dedos
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se desenlaçassem. Caminharam em silencio até o acampamento. Já se haviam dito suficiente. Talvez muito. Capítulo 14 —Algo errado com sua comida? A voz de sir Hugh tirou a Anna de seus pensamentos. Quanto tempo levava olhando sua tigela como uma boba e tirando o miolo ao pão pouco a pouco, sem dizer uma palavra? Tentou cobrir sua falta de tato com um sorriso ao mesmo tempo em que a vergonha se revelava em suas bochechas em forma de rubor. —Não, está deliciosa. —Para dar fé disso meteu um pedaço de vitela na boca e fingiu deleitar-se. Uma vez o teve mastigado pediu desculpas — Temo que ainda esteja cansada
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pela viagem e não sou uma boa companhia. Fazia duas noites que tinham chegado ao Auldearn. O último dia de marcha foi exaustivo, mas felizmente sem incidentes. Esperava em seu foro interno outra oportunidade para falar com sir Arthur antes que chegassem, e teve que levar uma decepção. Não era que ele a tivesse evitado, mas tampouco a tinha procurado. Algo mudou aquela noite no lago, ao menos para a Anna. Arthur lhe tinha devotado uma parte de
seu
ser
que
parecia
não
revelar
freqüentemente, uma parte dele que talvez a necessitasse. E o mais importante: não a tinha espantado. E por que não o tinha feito? Tudo teria resultado mais simples. Anna lutou por reprimir a cálida inflamação que ia a seus olhos e sua garganta enquanto a miséria se apoderava dela. Isso era o que lhe faltava, ficar a chorar em
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meio da comida como se fosse uma criada meio louca e doente de amor. Seguro que assim impressionaria sir Hugh. Embora fosse jovem, apenas vinte e três anos, sir Hugh Ross era um homem cuja grandeza, superioridade e decidido atrativo se refletiam no perfil de seu perfeitamente torneado nariz até a ponta de seu afiado e curto queixo. Mas o orgulhoso cavalheiro parecia muito maior. Virtualmente parecia controlar-se em demasia, com tanta serenidade e tanto controle sobre si mesmo e essa arrogância de príncipe, algo que tampouco estava muito longe da verdade, dado a fila que ostentava entre a nobreza escocesa. Rígido, sem senso de humor, com esse aspecto frio e desumano tão próprio dos homens de sua época. Sir
Hugh
lhe
dirigiu
um
sorriso
de
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compreensão que não melhorou em modo algum a severidade de seu semblante. —É obvio, depois de cavalgar para tal passo e estar a ponto de ter uma topada com um grupo de rebeldes, é algo previsível. —Seu rosto adotou um aspecto sombrio — Teria que esfolar ao Bruce com suas próprias esporas por ser líder desse
bando
de
piratas
desalmados
—
acrescentou, voltando seu acerado olhar sobre ela — Foram muito afortunados de receber aviso a tempo de escapar —disse puxando a barba enquanto a observava. Anna não podia afastar os olhos de suas grandes e ossudas mãos, umas mãos que poderiam esmagar ou assassinar com a facilidade como que as suas rompiam um galhinho — Foi sir Arthur Campbell, não é certo? O irmão do rebelde Neil Campbell. Anna assentiu, incomodada com seu próprio
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acanhamento. O nervosismo que sentia na presença de sir Hugh, o qual foi a primeira causa de que rechaçasse o compromisso, não fazia mais que agravar-se desde sua chegada. Sorrir e responder
a
suas
educadas
tentativas
de
conversa se convertia uma batalha. Observava-a como se pudesse ler seus pensamentos. Teria se delatado? Ela tinha tomado cuidado nem olhando na direção sir Arthur desde que chegaram. Ao menos acreditava não tê-lo feito. Mas estava mais que segura de que ele sim a estivera observando. O qual, provavelmente, explicava parte de sua inquietação. Seduzir a um homem sob o fulminante olhar de outro não era tarefa fácil. Mas tinha que fazer. Embora não gostasse da idéia. E a idéia não gostava absolutamente. Os dias passados encarregaram de deixar claro. Temia pensar muito no que sentia por Arthur por
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medo que descobririam. —Tivemos muita sorte — comentou ao conscientizar de que sir Hugh esperava que dissesse algo. Anna não sabia o que lhe acontecia. Jamais teve esse tipo de problemas na conversa com ninguém. Procurava controlar o tremor de suas mãos, mas lhe inquietava tanto a intensidade de seu olhar que atirou o pedaço de pão que tinha na mão. Caiu sobre a mesa, junto a sua taça e ao tentar recolhê-lo ao mesmo tempo em que Hugh Ross suas mãos se tocaram. Antes que desse tempo a retirar a sua, sir Hugh a cobriu com seus dedos. Seu pulso se acelerou até embarcá-la em uma sensação próxima ao pânico. Seu coração revoava em seu interior como se tratasse de um passarinho enjaulado. —Está nervosa - disse lhe soltando a mão e
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lhe devolvendo o pão. Ardiam-lhe as bochechas. —Não têm nada que temer, lady Anna — disse visivelmente divertido — Sou bastante inofensivo. —Ela deve ter posto cara de não acreditar absolutamente, pois ele acrescentou—: Bom, pode ser que não completamente. Essa inesperada amostra de humor a fez sorrir e pela primeira vez sentiu que começava a relaxar. Olhou-o do meio lado, protegida sob suas largas pestanas. — Bom, milorde, é que sua pessoa é... certamente imponente. —Tomarei como um elogio, embora não acredito que fosse essa sua intenção —disse entre risadas, para depois aproximar-se mais a ela e sussurrar—: O que parece se me esforço por ser imponente com todos menos contigo?
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Contigo serei o mais inofensivo. Será nosso segredo. Anna, incapaz de resistir a seu encanto, sorriu até que lhe marcaram as covinhas. Sir Hugh Ross encantador? Jamais teria acreditado. Acaso o mal-humorado nobre ocultava mais do que Anna conhecia? —Acredito que disso eu gostaria, milorde — disse sentindo que voltava para ela um pingo de seu atrevimento — Talvez ajudasse que sorrisse mais - acrescentou erguendo os olhos para olhálo. Sim, quando sorria não parecia intimidar tanto. Sir Hugh esboçou então um amplo sorriso e procurou seus olhos com o olhar. —Pois então o farei - replicou. Fez uma pausa em seu discurso e Anna observou como
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se entretinha em riscar o relevo do pé da taça, interrompendo-se de um modo quase sensual que a devolveu a seu estado de inquietação — Estou muito contente de que tenham decidido viajar até o norte, lady Anna. Cada
vez
estava
mais
tinta.
Não
lhe
escapava o significado de suas palavras. Estava disposto a renovar as conversações em torno do compromisso. Sabia que devia sentir-se aliviada. Para isso tinha ido até ali. Poderia ajudar a salvar a sua família. Então por que notava como se uma estaca se atendasse em seu peito? Assentiu
com
indolência,
incapaz
de
encontrar-se com seu olhar de repente, temendo que revelasse muito. O peito lhe angustiava ao conscientizar de que o laço de seu futuro cada vez se atava com mais força. Seus sentimentos pessoais não importavam. Deveria contentar-se
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sabendo que tinha posto seu grãozinho de areia para ajudar à família. Isso seria recompensa suficiente, verdade? Ross se voltou e fez gestos a uma criada que passava para que enchesse suas taças. Anna voltou o olhar inconscientemente para Arthur. Sabia onde estava sem necessidade de olhá-lo. Parecia atravessar toda a sala com o calor de sua ira. Seus olhares se encontraram durante um instante, mas foi tempo suficiente para que a força de sua ira ressonasse como o rugido de um ferreiro na forja. Em geral, continha tanto suas emoções que Anna se perguntava se realmente existiriam. Mas isso acabou. Jamais o tinha visto tão feroz e selvagem. Parecia um homem cuja contenção pendia de um fino fio. Voltou-se, sobressaltada pela emoção que a embargava. Infelizmente não voltou o olhar com
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suficiente rapidez e sir Hugh apreciou parte do intercâmbio. Notou como ficava em guarda e entreabria os olhos olhando sir Arthur. —Campbell não parece muito feliz com nosso acerto. Eu não gosto da forma em que vos olha disse voltando o olhar para ela e arqueando uma sobrancelha de tal modo que parecia algo menos casual — Há algo que deveria saber lady Anna? Amaldiçoou
Arthur por sua imprudência.
Arruinaria tudo. E para que? Já tinha tido oportunidades mais que suficientes para mostrar seus sentimentos, se é que albergava alguns. E agora não ficava opção. Seu pai contava com ela. Mesmo assim duvidava. Essa seria sua última oportunidade para voltar atrás. Seu coração puxava em uma direção, e o dever e sua família puxavam a outra. Anna recordou a conversa
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mantida com sir Arthur. O ouvir falar de perder a guerra
a
tinha
feito
tremer.
Inspirou
profundamente e se desembaraçou de todas as dúvidas.
Seus
sentimentos
pessoais
não
importavam. Tinha que fazê-lo. Quando Bruce chegasse, teriam muitas mais possibilidades com Ross e seus homens ao seu lado. Negou com a cabeça. —Não, não há nada que deveria saber. A certeza de sua voz pareceu convencer sir Hugh. Assentiu. —Bem —disse lhe estendendo a mão — Venham, há algo que eu gostaria de mostrar e acredito que há certas coisas que deveríamos discutir. Anna ignorou a dor que lhe oprimia o coração e sorriu, embora tremulamente. Sem nenhum olhar mais, deu a mão ao Ross e lhe permitiu que
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a tirasse do grande salão com seu futuro já mais que decidido. Isso era o que se sentia quando as pessoas perdiam o controle. Isso era o que se sentia quando alguém queria algo com tanta vontade que mataria por consegui-lo. Não pelo bem ou o mal, nem por estar no campo de batalha, mas sim pela pura satisfação de ver outro homem atravessado pela ponta de seu aço. Arthur queria matar Hugh Ross. Dava-lhe vontade de matá-lo somente pela forma em que olhava a Anna. Pelos pensamentos luxuriosos que seguro percorriam a mente daquele filho de cadela. Arthur não acreditava ser capaz de conter-se no caso de que o olhar do Ross se detivesse de novo sobre seus seios. Atiraria uma lança no seu sobrecenho do outro lado do aposento.
Poderia
fazê-lo
com
os
olhos
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fechados. Ficar afastado durante os últimos dois dias obrigado a contemplar como outro homem cortejava a essa mulher que, supostamente, não significava nada para ele era como uma lenta e agonizante descida à loucura. Arthur liberava uma
batalha
perdida.
Suas
tentativas
de
permanecer indiferente, de centrar-se na missão, não
funcionavam.
Todos
esses
anos
de
treinamentos e experiência na batalha não o tinham preparado para aquilo. Ver Anna e Hugh Ross juntos estava lhe fazendo em pedaços. Mas essa noite foi a gota que encheu o copo. Quando viu Ross lhe acariciar a mão, Arthur esteve a ponto de sair da ali feito uma fúria e lhe partir todos os dentes num murro. Ao diabo com o subterfúgio. Estavam rindo, maldita seja. Rindo. Queria convencer-se de que ela não seria capaz de passar por isso. Não seria porque Anna
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não
se
mostrou
cavalheiro
durante
precavida os
a
últimos
respeito
ao
dois
dias,
precisamente. Mas Arthur tinha subestimado sua resolução, e também o encanto de sir Hugh. Quando se aproximou para lhe sussurrar ao ouvido teve que apertar os punhos. Não foi até que baixou o olhar e percebeu a palidez de seus nódulos que se deu conta de quão forte tinha a taça obstinada. Foi toda uma sorte que fosse de madeira; de outro modo, a teria destroçado. Amaldiçoou consciente de que devia fazer algo. Tinha que pensar em sua missão. Sir Hugh não perdia tempo, e não é que pudesse culpá-lo. Se Arthur não fazia nada para impedir aquela aliança, seria muito tarde. Bebeu o conteúdo da taça. O uisge-beatha de cor ambarina fez que ardesse
a
garganta,
mas
não
acalmou
absolutamente a intranqüilidade que bulia em seu
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interior. —Que diabos te passa, Campbell? Parece que queira matar a alguém - disse Alan MacDougall olhando de soslaio ao estrado. Sabia perfeitamente a quem queria matar Arthur. Aproximou-se para Acredito
que
nosso
falar — Tome cuidado. anfitrião
advertiu
seu
interesse por minha irmã. Arthur economizou a vergonha de negá-lo. Alan MacDougall podia ser filho de um déspota desumano, mas não era nenhum idiota. —E viestes para ordenar que me retire do conflito? O guerreiro mais velho, muito experiente para delatar-se pela expressão de seu rosto, olhou-o com impassibilidade. —Queres que o faça? Arthur contraiu a mandíbula e apertou os
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dentes. —Deveria — disse em um estranho momento de franqueza. Não faria mais que arruinar sua vida. Se ele fosse seu irmão, ordenaria que o mandassem ao inferno diretamente e logo iria ele mesmo atrás. Mas se Alan pensou que havia algo estranho em sua resposta certamente não o exteriorizou. Em vez disso, sorriu com ironia. —Parece-me que é muito tarde para isso. Arthur afastou o olhar de sir Hugh e de Anna o
tempo
suficiente
para
olhar
ao
Alan
enviesadamente. Não tinha idéia do que Alan acreditava saber, mas se equivocava. Ou não? Diabos, já não sabia. Sua missão. Ciúmes. Sua intensa atração pela moça. Tudo isso se mesclava criando um caos absoluto. Voltou a beber de um gole o conteúdo da taça.
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Alan observou como o fazia com uma expressão divertida. —Acreditava que não bebia uísque. —Não bebo - disse Arthur, e fez gestos à criada para que lhe enchesse a taça. Alan atenção
estivera
observando-o
da
pensava.
que
com
Aquilo
o
mais teria
preocupado a não ser porque algo lhe fez voltar sua atenção para o estrado. Todos seus músculos ficaram rígidos quando viu que Anna deslizava sua mão sobre a do Ross. A ira percorria todo seu corpo ao mesmo tempo em que aquele homem se inclinava para falar brevemente com seu pai momentos antes de acompanhá-la ao exterior do salão. Justo antes que Hugh passasse pela porta olhou para Arthur. O tom malicioso de seu olhar fez que lhe gelasse o sangue. Uma sensação estranhamente próxima
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ao pânico subia por seu peito, algo ridículo por completo. Era um guerreiro de elite. Distante. Controlado. Pode ser que seu coração pulsasse muito depressa e que não pensasse com claridade, mas era indisputável que aquilo não podia ser pânico. Mas onde demônios acreditava que ia? Ross, esse filho de puta lascivo, estava obviamente ansioso pelo compromisso. Quem sabia do que seria capaz para assegurá-lo? Acaso Anna não notava do que aconteceria quanto estivessem a sós? A mente de Arthur voltou para os barracões imediatamente. «Por todos os diabos.» Conseguiu
resistir
durante
uns
trinta
segundos até que já não pôde agüentar mais. Levantou-se para partir, mas Alan o deteve movendo sua perna pela borda da mesa e lhe
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fechando o passo. Não era nenhum acidente. A princípio Arthur acreditava que queria detê-lo, mas para sua surpresa o guerreiro retirou a perna lentamente e lhe deixou passar, não sem antes fazer uma advertência. —Se fizer mal a minha irmã, Campbell, terei que te matar. Apesar de que falasse com tanta calma como se informasse o tempo, Arthur era consciente de que dizia muito sério. Que diabos, se Alan não fosse seu inimigo e o filho de um déspota, pode ser que inclusive lhe caísse bem. Arthur o olhou nos olhos e assentiu, com a suspeita de que Alan MacDougall não seria capaz de manter sua promessa. Pôr fim ao compromisso e deter a aliança, fazendo dano a Anna no processo, converteu-se em algo inevitável. Anna esperava que sir Hugh a levasse fosse
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para passear pelo barmkin, mas em vez disso a fez
entrar
pelo
corredor
até
a
torre
da
comemoração. O castelo real do Auldearn fora construído uns cem anos antes por encargo do Guillermo o Leão. Sua torre da comemoração e o grande salão contíguo se erguiam no alto de um enorme Castro circular rodeado por um cerca de madeira. O muro de pedra que rodeava o pátio de armas que havia debaixo proporcionava um nível mais de defesa. O corredor iluminado pelas tochas parecia silencioso em comparação com o bulício do grande salão. Anna se inquietou ao ser consciente de que não havia ninguém mais ao redor. Embora os últimos raios de sol ainda reverberassem sobre o horizonte, a torre de pedra estava já às escuras. Tampouco a luz cintilante das tochas alinhadas nos muros lhe dava mais tranqüilidade.
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—A...aonde
vamos?
—
perguntou
envergonhada pelo tremor de sua voz. Sir Hugh lhe dirigiu um enigmático sorriso que fez que Anna se perguntasse se saberia a impressão que causava nela. —Já quase chegamos. Deteve-se frente à porta da câmara particular do
conde.
Uma
vez
aberta,
Anna
aliviou
comprovar que a estadia estava bem iluminada pelo castiçal de ferro circular que pendia do teto. Infelizmente, Hugh a levou até outra porta que havia cruzando a sala, com o que Anna percebeu de que aquele não era seu destino final. O segundo aposento estava às escuras. Anna ficou na câmara até que sir Hugh acendeu umas velas. Então ficou sobressaltada. Anna se esqueceu de seu nervosismo. Apressou-se a entrar no minúsculo aposento, não
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muito maior que uma despensa, e olhou com surpresa a seu redor. O centro da sala estava presidido por uma mesa e um banco, mas o que enchia seu assombro era o que havia sobre as paredes. Prateleiras e mais prateleiras cheias de grossas folhas de couro, alguns deles recobertos de ouro e outros com jóias incrustadas. Um tesouro oculto. Mais livros dos que tinha visto em sua vida em um só espaço. Sir Hugh observou em que modo a maravilha e a incredulidade transformavam seu rosto. —Pensei que isto poderia lhes interessar. Anna deu uma palmada de puro prazer; seus dedos estavam impacientem por explorar os títulos. Por Deus bendito, se pareciam quatro volumes do Chrétien do Troyes! —É magnífico — disse voltando-se para ele — Como sabias?
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Hugh Ross encolheu de ombros. —Em
certa
ocasião
mencionaram
que
desfrutava da leitura. Anna inclinou a cabeça e o olhou. Uma vez mais sentia como se o tivesse julgado mal. —E se lembrou? Sir Hugh não respondeu, mas a olhou de tal forma que um formigamento de inquietação lhe percorreu as costas. Desejava-a. De repente aquele
minúsculo
aposento
pareceu
uma
armadilha a Anna. Olhou para a porta, mas já fosse intencionadamente ou não, ele se tinha colocado frente a ela lhe cortando o passo. —por que me trouxestes aqui? —perguntou. Sir Hugh deu um passo adiante e seus olhos brilharam
de
maneira
perigosa
entre
as
penumbras. Pegou-a pelo queixo e a obrigou a olhar em sua direção. O pulso lhe acelerou de
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pânico. Talvez fosse uns cinco centímetros mais baixo que sir Arthur, mas em certo modo seu tamanho lhe parecia ameaçador. Anna teve que reunir todo o valor com o que contava para não sair correndo. —Queria lhes mostrar o que terá quando fores minha esposa. Esta sala estará a sua disposição.
Será
uma
das
damas
mais
importantes do reino. Para isso viestes, lady Anna. Não é assim? Para reatar as conversações sobre nosso compromisso. —Sim - sussurrou ela, tentando controlar o tremor de sua voz. Hugh
cravou
o
olhar
em
seus
olhos,
desafiando-a. —É isso o que quer realmente? O coração lhe pulsava com fúria. Teve que obrigar-se a assentir.
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—Sim. —Então prove — pediu. Ela piscou de maneira inquisitiva — me beije. Anna abriu os olhos de par em par pela surpresa. Lutava por saber o que dizer. Mas, pelo amor de Deus, não podia. E ele sabia. Endureceu o olhar. —Está
jogando
comigo,
lady
Anna?
Asseguro-lhes que não tenho nenhum desejo de ser o corno de outro homem. Recorde que são vocês quem acudis a mim nesta ocasião. —Sir Hugh lhe pôs um dedo no lábio inferior e Anna conteve o fôlego, paralisada pelo medo — Decida o que quer antes de fazer algo que não possa ser desfeito. Uma vez estejamos comprometidos, asseguro-lhes que não tolerarei tais tolices. As bochechas de Anna se avermelharam,
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envergonhada por quão certas eram suas acusações. Sacudiu o medo tentando recordar por que tinha ido até ali, tentando recordar quão importante era conseguir essa aliança para ela. Não podiam deixar escapar essa oportunidade. Por que se comportava como uma estúpida? Somente se tratava de um beijo. —milorde, o temporal… Ao ver que lhe soltava o queixo, Anna suspirou mostrando maior alívio do que devido. —Temos que retornar ao salão - disse Ross fria e secamente — Seu irmão se estará perguntando aonde a levei. Anna assentiu, sentindo sua impotência, consciente do que devia fazer, mas incapaz de pronunciar as palavras. Que o diabo levasse Arthur Campbell pelo que estava fazendo com ela! Por confundi-la. Ela estava preparada para
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levá-lo a cabo antes que ele voltasse a aparecer. —Se não lhes importar, meu senhor, estou cansada e preferiria me retirar a meus aposentos. Sir Hugh assentiu. —Não há pressa. Querem tomar um livro emprestado,
talvez?
—Olhou-o
nos
olhos,
consciente de que tentava tentá-la — Podemos falar sobre isso manhã. Hugh Ross deu meia volta para partir, mas algo o fez mudar de idéia. Antes que ela pudesse conscientizar do que se dispunha a fazer, já a tinha atraído para si e a estava beijando. Anna ficou paralisada, muito surpreendida para resistir. Seus
lábios
consonância
com
eram sua
frios
e
pessoa.
duros,
em
Acertou
a
distinguir um leve aroma a vinho, mas antes que pudesse descobrir algo mais já tinha acabado tudo. Sir Hugh baixou o olhar e sorriu ao ver o
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rosto de surpresa que Anna tinha posto. —Têm toda a noite para decidir. Mas se quiserem que o compromisso siga adiante, espero que me dêem uma resposta amanhã. Uma que seja algo mais entusiasta que esta. Ross não se fazia uma idéia do perto que estava da morte. Arthur apertava a adaga em sua mão, tentando controlar a sede de sangue que percorria suas artérias com cada um dos músculos. Tudo que tinha que fazer era dar um par de passos, sair de seu esconderijo depois das sombras do vão da porta e afundar sua folha no mais profundo das vísceras daquele filho de cadela. Tinha-a beijado. Tinha-a tomado entre seus braços e tinha grudado sua boca a dela. Algo se rompeu em seu interior. Todos seus instintos lhe diziam que tinha que sair dali e matar ao homem
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que se atrevia a tocar aquilo que lhe pertencia. Mas algo deteve sua mão no último momento. Matar ao Ross poria fim a sua missão. Veria-se obrigado a fugir, acabando assim com sua oportunidade de destruir ao Lorn. Teve que aferrar-se ao mínimo de controle que ficava para não mover-se, mas deixou que Ross saísse do aposento. Deixou-lhe viver. Por essa vez. Entretanto, Anna não escaparia a sua ira tão facilmente. Asseguraria-se de que não houvesse mais que uma resposta à manhã seguinte. O compromisso que ela tinha planejado estava a ponto de chegar a um final irrevogável. Anna seguiu os passos do Ross apenas se desvaneceram suas pegadas. Assim que chegou à porta, Arthur saiu de entre as sombras e lhe fechou o avanço. Ela ficou sem fôlego. Todo o medo que
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pudesse sentir logo desapareceu para dar passo ao brilho de ira que incendiava seu olhar. —Como te atreve a me espiar? —exclamou. Tentou afastá-lo de seu caminho, mas ele imobilizou seus pulsos com uma mão — Deixeme partir. Não tem nenhum direito. Voltou a colocá-la no aposento e fechou a porta atrás dele. —Tenho todo o direito —disse Arthur com fúria — Não se casará com ele. Advertiu o rubor de suas bochechas à luz das velas. Seu busto, esses incríveis seios, tão grandes que não podia deixar de sonhar com eles, enchiam-se com uma indignação justificada. Anna ergueu o doce rosto com seu adorável e teimoso queixo para ele. —Sim o farei. Não
gostava
desse
tom
absolutamente.
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Nenhum pingo. Entreabriu os olhos. —Nem sequer podia lhe beijar - disse aproximando-se mais a ela e aspirando a sensual calidez de sua fúria — Como pensa que será então deitar-se com ele? A indignação de Anna se traduziu em um áspero gemido. A Arthur não cabia a menor duvida de que lhe teria parecido uma adaga entre as costelas se tivesse uma. Mas sua língua era igual de efetiva estripando-o. —Suponho que chegarei a me acostumar. É possível que inclusive desfrute. Sir Hugh é um homem muito arrumado. E parece bastante decidido, não acredita? —disse lhe provocando com o olhar, desafiando-o, voltando-o louco — Se parecer em algo a esse beijo imagino que chegarei a desfrutar muito disso. Agarrou-a pelo braço.
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—Pare — disse agitando-a ante si — Pare. Parecia estar a ponto de explodir. Suas provocadoras palavras exaltavam ao máximo aqueles sentimentos contidos durante tanto tempo. Uns sentimentos que Arthur não queria reconhecer. Uns sentimentos que não podia permitir que aflorassem. A cabeça lhe dava voltas. Queimava-lhe o peito. Deus, doía demais. Tinha que fazê-la parar. —Por quê? —perguntou Anna aproximandose mais a ele. Arthur sentiu seus mamilos lhe roçando o peito e teve que sacudir-se realmente, pois todo o controle com o que contava seu corpo pendia de um fio. O calor o puxava para um vórtice de luxúria e desejo. Queria esmagá-la contra si. Beijá-la. Possuí-la até deixá-la sem sentido. Fazê-la gritar seu nome e nenhum mais que o seu — Por que teria que parar? É a
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verdade. Sir Hugh me deseja muito como um homem que vê o que quer e não se detém ante nada até que o consegue. Era consciente de que não fazia mais que provocá-lo, mas não lhe importava. Arthur sabia perfeitamente o que queria, maldita seja. A ela. Renegou, consciente de que a batalha estava perdida. Tomou entre seus braços e pregou sua boca a dela, cedendo a esses poderosos impulsos que liberavam uma guerra em seu interior. Beijou-a como jamais antes tinha beijado a mulher alguma. Beijou-a com toda a paixão que acumulava desde que a visse pela primeira vez. Beijou-a para que não seguisse falando. Beijou-a para apagar as odiosas imagens com as que tinham enchido sua cabeça. Beijou-a de modo tal que não pudesse voltar a pensar em outro homem em sua vida.
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Não obstante, uma vez que Anna se fundiu ante ele em uma rendição silenciosa e abriu sua doce e pequena boca para recebê-lo com um suspiro e um gemido, Arthur não pensou mais em missões, alianças, clãs inimigos ou vingança. Não. Tudo assim que pensava era em fazê-la sua. Capítulo 15 Anna sabia que se precipitava e que estava provocando-o, mas não lhe importava. A ira não lhe deixava ver mais que sua necessidade de arremeter contra ele. Odiava-o por intrometer-se, por fazê-la duvidar, por interferir em seus planos. Não queria outra coisa que proteger a sua família e manter a salvo às pessoas que amava. E quando tinha a oportunidade de conseguir, Arthur Campbell se interpunha em seu caminho.
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Confundia-a.
Desorientava-a.
Fazia
que
tomasse carinho e logo a separava de seu lado. Em um momento a salvava e a protegia e ao seguinte a ignorava. Era um ingrato, um homem que se mantinha à margem e dava a impressão de não necessitar a ninguém. Mas também era um homem que estava sozinho, alguém afastado por seus próprios dons, obrigado a viver um tanto afastado de outros. Queria-a? Necessitava-a? Em qualquer dos casos teria que decidir-se. O
tempo
se
esgotava
para
ambos.
Era
consciente de que estava ciumento, consciente de que tinha visto o beijo que lhe deu sir Hugh, consciente de que lutava por manter o controle. Assim o provocou. Desejava-o com tanta vontade... A essa distância o único em que podia pensar era em
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seu
doce
aroma.
E
em
que
o
aspecto
desalinhado que lhe dava a escura sombra de sua barba o fazia mais arrumado ainda. No alto que era. A enmembrodura de seu peito. O suave que se viam seus lábios embora estivessem brancos de ira. Em que o daria tudo por que tomasse entre seus braços e não a abandonasse nunca. A dor rasgava seu peito como uma faca. Por que não a queria? Por que se reprimia? Isso foi o que a levou a provocá-lo de maneira temerária, desesperada, com intenção de lhe ferir tanto como ele a feria. E se era mentira? E o que lhe gelava o sangue com somente imaginar-se na cama com outro homem? Desfrutar? Mal podia deixar de tremer de medo em presença de sir Hugh. Então ele se desmoronou e Anna obteve sua recompensa. Encontrou-se em seus braços, com
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a boca de Arthur pegada à sua, beijando-a com toda essa paixão e emoção com que ela tinha sonhado. Ele a devorava com a boca e a língua, enquanto ela gemia e se entregava mais e mais a seu beijo, morrendo por sentir cada dobra de sua pele. Deslizava suas enormes mãos sobre ela de modo possessivo. Passou-a por suas costas e depois sobre os quadris, até que desceram para agarrar seu traseiro. Então rugiu de agrado sobre sua boca e a beijou com mais força ao mesmo tempo em que a acoplava firmemente contra seu corpo. As sensações se desatavam em seu interior em um ataque de calor resplandecente. OH, Deus, aquilo era perfeito. Seu peito contra o dele, os quadris colados e a dura confirmação do desejo masculino introduzindo-se entre suas pernas de uma maneira íntima. Era
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consciente de que o tamanho e o tato teriam que assombrá-la, mas o único que sentia era a excitação, uma excitação que fazia lhe acelerar o coração, sua pele se ruborizasse e sentisse comichões por todo o corpo. Estavam cobertos um com o outro, mas aquilo não bastava. A cada delicioso roce de sua língua, a cada possessiva carícia de suas mãos, crescia a inquietação no interior de Anna. Respondeu
a
seu
atrevimento
com
mais
atrevimento. Agarrava com firmeza os duros músculos de seus braços, seus ombros e suas costas. Queria sentir cada centímetro de seu corpo sob os dedos, modelar seus músculos com as palmas de suas mãos. Conter toda sua força baixo elas. Aquilo a fazia sentir… embriagada de desejo. Era a primeira vez na vida que tinha uma
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experiência de tal calibre. Seu corpo parecia ressuscitar. Reagia aos estímulos de maneira natural, como se soubesse o que estava fazendo. Tudo ocorria muito rápido para pensar. O desejo a tinha feito sua presa e não parecia disposto a soltá-la. Aproximava-a de seu corpo cada vez com mais urgência, esfregando sua virilidade contra a mais feminina de suas partes. A fazia sentir estranha, com comichões, quente, ofegante. Mas não era suficiente. Ávida de fricção, sedenta por encontrar uma conexão mais profunda, descrevia círculos com seus quadris e se esfregava com essa grosa coluna de carne com mais força. Arthur percorreu seu pescoço com a boca e a devorou com seus beijos. Sua barba de dois dias fazia sulcos em sua pele em chamas. O aposento jogava fumaça e ardia de paixão. Agarrou-a pela
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cintura e deslizou as mãos até seus seios. Anna ofegou e se pegou quanto pôde a seu membro viril ao mesmo tempo em que arqueava as costas procurando suas mãos. Arthur murmurou algo parecido a uma imprecação e roçou seus turgentes e ofegantes mamilos com os polegares enquanto sua boca se dava de presente com a tenra pele que aparecia por cima do corpete. Estava
muito
quente.
Sentia-se
débil.
Lânguida e pesada. Parecia que suas pernas não contassem
com
forças
para
sustentá-la.
Desabou-se sobre Arthur, que a puxou de novo sobre a mesa para acalmá-la, e talvez também para acalmar a si mesmo. Aquele cavalheiro, que mostrava um controle tão férreo sobre si, parecia sofrer apuros igual aos selvagens e frenéticos dela. Os escuros e sedosos cabelos de Arthur se
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derramaram sobre seu peito. Anna, incapaz de resistir, passou os dedos entre essas suaves ondas e o apertou contra si com força e ternura. A umidade de sua boca transpassava o tecido do vestido para chegar até seu mamilo ao mesmo tempo em que acariciava seus seios e os rodeava com suas mãos. Mas não era suficiente. Então sua língua pareceu perceber essa frustração e entrou sob o corpete. Um gritou escapou dos lábios de Anna ante tamanha perversão, ante o delicioso prazer que sentia. Aquela boca estava muito quente. Passou-lhe a língua de um lado a outro, até que pensou que já não poderia resistir mais. Retorceu-se contra ele suplicando para que desatasse a voragem que se formava em seu interior. Por fim lhe deu um puxão do vestido até
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quase romper o tecido e o abriu para liberar seus seios. O frio ar soprou sobre sua pele e provocou formigamentos ali onde a tinha beijado. —Jesus — exclamou Arthur, como se aquilo doesse — É incrivelmente bela. Provavelmente ouvir sua voz teria quebrado seu estado de transe, mas Arthur cobriu seu ofegante mamilo com a boca e começou a chupá-lo antes que Anna pudesse acolher-se a esse momento de iluminação. Essa doce e aguda sensação a fez gritar. Era um prazer tão agudo que se aproximava muito à dor. Atendia-a com os dentes, dava-lhe linguadinhas e sugava sua cálida boca cada vez com mais intensidade. O calor se estendeu entre suas pernas em uma corrente de umidade. Sentia comichões em suas suaves carnes inflamadas. Tinha-a aprisionada contra a mesa com as
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pernas abertas. Montou uma delas sobre seu quadril ao mesmo tempo em que se inclinava para lhe beijar o seio. Os ferozes pulsar do coração de Arthur troavam contra seu peito, seus músculos se esticavam da excitação e a cobriam com todo o peso de seu corpo. E Anna estava quente. Tão quente que queimava. Excitada até o ponto de não retorno. Arthur deslizou a mão sob o vestido até fazer contato
com
a
pele.
Suavizou
o
impacto
acariciando o mamilo pausadamente entre seus dentes. Então voltou a cobrir sua boca com beijos, e suas mãos… Céu santo estava colocando
as
mãos
entre
suas
coxas!
Envergonhada, tentou fechar as pernas. Mas ele não o permitiria. Sua boca a distraía com os longos e pausados movimentos de sua língua, ao mesmo tempo em que ele entrava em sua
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umidade com os dedos. O corpo de Anna tremeu ao
sentir
dissolveram
o
contato. em
uma
Seus onda
protestos de
se
alívio
estremecedor. Aquilo dava muito prazer. Um prazer surpreendente. —Jesus, é tão doce... Deixou de beijá-la e Anna se perguntou se teria feito algo indevido, até que percebeu de que era ele quem estava passando mal, tentando conter-se, como se lutasse por controlar-se. Como se tocá-la o tivesse despojado de suas últimas reservas de contenção. Como se muito em breve não pudesse controlar-se. Ficou olhando-a nos olhos ao mesmo tempo em que introduzia seu dedo nela com um pequeno e firme empurrãozinho. Aquele era o momento erótico mais perverso de sua vida. Tomou fôlego em uma tentativa de estabilizar as sensações,
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mas estas se precipitavam sobre ela em rápidas ondas que não davam trégua alguma. Acaricioua. Primeiro com círculos pequenos e suaves, depois com mais força, mais rápido, com impulsos profundos e frenéticos que pareciam decalques dos beijos que acabava de lhe dar. A sensação que se formava em seu interior era muito intensa. Muito poderosa para ser contida.
Esticava-se
e
recuava
em
um
endiabrado redemoinho de necessidade. Seu rosto era uma máscara de dor. O suor se acumulava sobre suas sobrancelhas. Arthur a olhava nos olhos de modo escuro e penetrante, agarrando-a de tal forma que o coração lhe estalava de felicidade. Anna por fim via a verdade em seus olhos, o que intuía desde o começo. Essa conexão que havia entre eles era especial. E também ele a sentia.
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Não sabia o que lhe estava acontecendo, mas era perfeito. Cada uma de suas carícias a levava
até
limites
que
era
incapaz
de
compreender. Retorcia-se de frustração. Seu corpo inteiro clamava por… —Te relaxe, amor —sussurrou Arthur — Quero te fazer voar. O som aveludado de sua voz abriu caminho através dos últimos vestígios de sua repressão de criada. Ficou sem respiração até que pareceu que seu corpo se faria em pedaços devido ao intenso prazer que procuravam os agudos espasmos e teve que libertar todo o ar em um gemido estremecedor. Era o momento mais maravilhoso de sua vida, mas à medida que olhava o escuro interior desses olhos com bolinhas douradas, soube que não era suficiente. Tinha satisfeito sua paixão, mas seu coração
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ainda palpitava pela necessidade de realizar-se. Queria uma conexão mais profunda. Queria senti-lo em seu interior. Queria ter tudo dele. Para sempre. «Quero-te.» É obvio. Estava tão claro, era tão certo, que se perguntava como poderia ter sido de outra maneira. Guerreiro. Cavalheiro. Isso pouco importava. Porque em seu coração, Anna sabia que tinha encontrado ao homem com quem estava destinada a compartilhar sua vida. Arthur já não podia esperar mais. A pressão se acumulava na base de sua coluna como um punho quente e conectava com a vibrante ponta de um membro que pedia alívio, que a tocasse, que atendesse a seus agudos gritos e ofegos de prazer e sentisse como seu corpo se derretia e se estremecia ao rodeá-la com a mão. Apertou os dentes tentando refrear-se, consciente de que
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estava a ponto de gozar como não o tinha feito antes na vida. Jesus, cabelos
que
beleza
dourados
dispersavam
atrás
mais
como
o
de
sua
embriagadora: mel
que
se
cabeça
e
resplandeciam diante da luz das velas; olhos aturdidos e inflamados pela paixão; seios de formas perfeitas, grande e suave, que saía de seu corpete mostrando um pequeno e arrepiado mamilo avermelhado por suas dentadas. Tinha o aspecto de uma fêmea no cio que clamava ao céu para que a montassem. «E esta fêmea é minha. Toda minha.». «Jesus», repetiu para si a meio caminho entre a prece e a imprecação. Jamais antes havia se sentido de tal modo. O desejo o consumia. —Arthur —choramingou ela — Lhes rogo isso.
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O brutal desespero de sua voz foi o último fio de que precisava atirar. Não podia esperar mais para introduzir-se nela. Virtualmente rompeu a fivela e as ligaduras de suas meias e calções para liberar seu inchado membro. Mas tirar o membro de seu confinamento para que lhe desse ar não servia de grande alívio. A única coisa que lhe serviria para aplacar a dor nesse momento era estar dentro dela. Levantou uma de suas flexíveis e sedosas pernas de formas perfeitas, passou-a por trás de seu quadril e se colocou diante daquela abertura cálida e deliciosamente úmida. A próxima vez se tomaria seu tempo em saboreá-la, lhe colocar a língua e fazer que se gozasse sobre sua boca. Não deixou de olhá-la em nenhum momento. Não se atrevia a afastar o olhar dela por medo de que se perdesse a poderosa conexão que se
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produziu entre ambos. Teria que ter sentido ao menos a sombra de uma dúvida, ter a sensação de que aquilo que fazia estava mal. A honra era importante para ele, apesar de que o código de cavalaria não o fosse. Mas não sentia nada disso. O único em que pensava era que não podia perdê-la, que tinha que fazê-la sua, e se era capaz de fazer isso, todo o resto sairia bem. Quando a sensível cabeça de seu membro se encontrou com o úmido calor de seu ninho, Arthur exalou um profundo som gutural de puro prazer. Esfregou-se contra sua suave umidade e se deteve ali, consciente de que uma vez dentro seria muito tarde. Tinha o corpo em chamas e todos os músculos em tensão, preparados para fazer entrada. Notava-se o pulso nas veias. Nas orelhas. Até nos ossos. Parecia-lhe ter a pele tensa e ardendo.
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«Empurrar.» Deus, que vontade tinha de empurrar.
Jamais
preencher,
de
teve
tanta
meter-se
vontade
de
profundamente
em
nenhuma mulher. Sabia que seria algo incrível. Seu corpo se ajustaria a ele como uma luva quente e o espremeria com puxões largos e duros até lhe fazer cair profundamente na mais absoluta das inconsciências. Queria ver como se movia sob seu corpo impulsionado pelo poder de seus embates, como levantava os quadris para acompanhar cada uma de suas profundas investidas. Queria ver como seu membro entrava e saía dela. Apertou
os
dentes,
sentindo
uma
necessidade de afundar-se nela virtualmente irrefreável. Mas não podia a machucar. Assim que se obrigou a ir devagar. Estimulou-a com sua grossa ereção para que se acostumasse ao
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tamanho e a força de seu membro e esfregou a ponta com sua umidade para facilitar a entrada. E coberta de maravilha. A pressão se acumulava na base de sua coluna e puxava cada vez com mais força. Não pôde agüentá-lo mais. Começou a empurrar. Ela gritou, surpreendida. «Jesus.» Apertou os dentes. O suor se acumulava sobre suas sobrancelhas. O sangue palpitava
em
suas
veias.
Tentador.
Tão
incrivelmente tentador... Tinha que tomar-lhe com calma e com cautela. Deus estava louco por gozar. Ficava muito pouco… Um leve som penetrou aquela bruma. Arthur sentiu um premonitório calafrio na nuca e ficou paralisado. O ar tinha mudado. Separouse dela amaldiçoando enquanto todo seu ser estalava em protestos.
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—Te cubra - disse, e lhe deu um puxão no vestido ao mesmo tempo em que tentava atar os calções torpemente. Mas era muito tarde, ou muito cedo, se atendia à frustração que ardia em seu testículo nesse preciso instante. A porta se abriu de repente. Sir Hugh Ross estava atrás dela, com seu acerado olhar atento a cada detalhe do que acontecia no interior. Apesar de que se trabalharam em excesso em vestir-se rapidamente, nada podia dissimular o que estavam fazendo. Anna seguia recostada sobre a mesa com as bochechas acesas e os olhos aturdidos, Arthur seguia entre suas pernas e a sala se achava impregnada com o quente e pesado ambiente que corresponde à almiscarada fragrância do emparelhamento, ou em seu caso do emparelhamento frustrado.
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Anna ficou sem respiração. O horror apagou as marcas de prazer que ruborizavam seu rosto. Arthur se colocou frente a ela instintivamente, tentando afastar a de seu olhar, como se o escudo de seu corpo pudesse protegê-la do veneno que destilava o outro homem. O silêncio sepulcral, somente salpicado pelo crepitar das chamas, estendeu-se
além
do
incômodo.
Sir
Hugh
permanecia ali petrificado, com uma quietude exagerada, como se estivesse aguardando para equilibrar-se sobre eles. Arthur o observava como um falcão, esperando a primeiro sinal de movimento. Diabos, como gostaria que o fizesse. —Ouvi um grito e me perguntei se lhe tinham feito mal - disse ao fim sir Hugh com o gesto torcido
pelo
asco
e
umas
palavras
que
transpiravam contenção — Mas suponho que não
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necessitavam resgate. A exclamação angustiada de Anna lhe partiu o coração. Arthur, consciente de que tinha que protegê-la da ira de sir Hugh, deu a volta e tomou pelos ombros. —Vá
para
seus
aposentos
-
disse
bruscamente. Anna quis discuti-lo, mas ele a deteve — Falaremos mais tarde que isso. Agora mesmo preciso falar com sir Hugh. Permita que me encarregue disto. Olhou-a nos olhos. A via confusa, horrorizada e atemorizada há um tempo, disposta a romper a chorar de um momento a outro. A Arthur custava respirar. Era como se lhe retorcessem o coração com uma faca. Ele tinha provocado isso. Era culpa dele. Sacudiu-a com cuidado, tentando fazer que se centrasse. —Entendeste, Anna? —Então ela o olhou
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com um rosto tão perdido que lhe deu vontade de voltar a acolhê-la em seus braços — Tudo irá bem — prometeu, consciente de que aquilo não era certo. Como poderia ir bem aquilo? Não só estava mentindo, mas sim, além disso, acabava de destruir toda possibilidade de aliança com o Ross e sabia quanto significava isso para ela. Anna amava a sua família. Falhar seria algo que… a faria pedaços. Anna assentiu e a confiança cega que emanava seu olhar lhe fez sentir todo o peso da vergonha em seu interior. Era um completo filho de puta. Um filho de puta desalmado. Jamais poderia perdoar-se pelo que estava lhe fazendo. Anna não merecia. O que merecia era estar a salvo e protegida, ter um lar feliz, um marido que a amasse e seis ou sete crianças puxando suas
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saias. Ele nunca poderia lhe dar isso. Abandonála e lhe romper o coração, isso era quão único faria. Pode ser que não a tivesse despojado de sua virgindade, mas sua inocência desapareceria igualmente quando descobrisse a verdade sobre ele. Lá onde fazia um momento reinava o desejo não ficava mais que pena e dor. Sir Hugh não se moveu de sua posição à entrada, mas assim que Arthur acompanhou Anna à saída, Hugh Ross se pôs a um lado para deixá-la passar. Arthur, sentindo-se esquecido na salinha, seguiu-a até o aposento principal. Não era muito maior, mas ao menos ali teria espaço para manobrar se fosse necessário. Sir Hugh parecia disposto a brigar e ele tinha tanta vontade ou mais de lhe dar guerra. Justo antes de sair Anna, olhou-o com incerteza. —Vá - disse com doçura, tentando acalmar
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seus temores. Então seu olhar reparou em sir Hugh e seu rosto se contraiu. O cavalheiro não se dignaria a olhá-la, mas cada uma dos nobres e orgulhosas dobras de sua pele irradiavam animal adversão. Arthur franziu os lábios, com uma vontade tremendas de matar a aquele homem por ferir seus sentimentos. Anna não tinha culpa de nada. Tudo era coisa dela. «Jesus.» Conscientizar-se disso foi como um soco. Tinha-o feito a propósito? Fosse essa sua intenção desde o começo? O que queria era acabar com qualquer opção de aliança. Não, mas não desse modo. Nunca quis levá-lo a tal extremo. Embora sim que tinha superestimado sua capacidade de controle e menosprezado a intensidade de seus desejos por ela. Era o único culpado de meter-se nesse esfregado. Fora ele quem tinha transpassado os
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limites, algo que não reportaria mais que dor para ambos. —Deveria te matar — disse Ross assim que se fechou a porta. O cavalheiro tentava intimidá-lo, mas Arthur aceitou o desafio. —E por que não o faz? O olhar do Ross se endureceu. —Porque então teria que explicar os motivos. A certeza de sua voz fez que Arthur sorrisse. Tinham mais ou menos a mesma idade e eram bastante
semelhantes
quanto
à
altura
e
músculos. Mas não quanto à destreza. Arthur não seria quem iria morrer. Sir Hugh, não obstante, não tinha nem idéia disso. Então por que…? A razão foi a ele de repente. —E não quer que ninguém saiba que a moça o humilhou pela segunda vez. Primeiro ao
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rechaçar sua oferta e logo ao agarrá-la com outro homem ante seu nariz. A verdade da acusação causou seu efeito no rosto do Ross, que avermelhou de ira, criando um marcado contraste com os sulcos brancos de seus lábios franzidos. —Desfloraste-a? Arthur apertou a mandíbula. Aquilo não era assunto seu absolutamente. Encheu de vontade de mentir, de reclamá-la para si, mas disse a verdade, já que queria salvar o que pudesse da reputação de Anna. —Não. Os olhos do Sir Hugh se mostravam frios. —Mas o teria feito de não o tivesse interrompido. Arthur encolheu os ombros, como se aquilo não fosse de sua incumbência. Ross deu um
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passo para ele com a mão na espada. —Maldito filho de cadela! É um cavalheiro. É que
não
têm
honra?
Era
uma
mulher
comprometida. Arthur se moveu com rapidez. Pôs em prática uma manobra que tinha aprendido com Boyd e deixou o braço do Ross fosse de combate, obrigando-o a soltar a espada. Depois lhe retorceu esse mesmo braço pelas costas e o imobilizou fazendo contrapeso com seu próprio corpo. —Não. Não estava comprometida. Ross tentou escapar por ato reflito, mas seus movimentos só serviam para que Arthur lhe retorcesse mais o braço e lhe infligisse mais sofrimento. —Estava a ponto de comprometer-se —disse entre dentes com uma voz cheia de dor — O
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matarei por isso! Solte-me! —Não
até
que
cheguemos
a
um
entendimento a respeito do ocorrido aqui. Não quero que isto afete à moça. Não é culpa dela. Ross teve a inteligência de optar por discutilo, mas Arthur percebia a raiva em seus olhos. Retorceu-lhe
o
braço
com
mais
força,
provocando que o furioso guerreiro gritasse. —Por que voltou? —perguntou Arthur. —Ouvi um grito… —Uma merda - cortou Arthur. A não ser que possuísse sentidos tão finos como os seus, era impossível que tivesse ouvido algo. Ross lhe dirigiu um olhar assassino. De sua sobrancelha caíam gotas de suor dolorido. —Vi como a observava e que ela tentava não o olhar por todos os meios. Sabia que nos seguiria.
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Arthur amaldiçoou. —O que era isto então, uma prova de fogo? —Não pensava permitir que tirassem o sarro. Não me casarei com uma mulher apaixonada por outro homem. Por muita vontade que tenha de fo… Retorceu-lhe mais o braço. —Não —disse — Não o diga. Arthur, consciente do perto que estava de lhe partir o braço, optou por afastá-lo de seu lado de um forte empurrão. Ross tinha razão respeito a algo: quanto menos tivessem que explicar, melhor. Sir Hugh soltou ar e se massageou a parte superior do braço e o ombro. Mas havia algo em seu olhar que a Arthur fazia perguntar-se se o tinha posto a prova de novo. Se esse grosseiro comentário do Ross teria a intenção de provocar uma reação. Se for assim, tinha
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funcionado. —Importa-te - disse Arthur, precavendo-se disto, na verdade era algo mais que uma aliança política para ti. Ross não respondeu com palavras nem por meio da expressão de seu rosto, mas Arthur sabia que tinha acertado. Diabos, quase dava pena aquele pobre filho de cadela. —Mas sabe o que é que a trouxe até aqui? Uma vez recuperada as sensações em seu braço, Ross voltou a olhá-lo com desconfiança. —Sim. Para conseguir apoio na luta contra Bruce. Esperava conseguir sua mão sem ter que recorrer a isso. Arthur ficou olhando-o e o compreendeu tudo ao fim. —Seu pai não tinha intenção de enviar homens com ou sem compromisso, não é certo?
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—Não era preciso que Ross respondesse. «Por todos os demônios.» Arthur tinha vontade de matá-lo ali mesmo — E a deixaram pensar que…? Ross encolheu os ombros. Maldito patife. Demônios, de não ser Anna a quem manipulava, Arthur teria admirado sua determinação. —Partiremos
assim
que
tenhamos
tudo
preparado. Depois de que informe Anna e sir Alan do que acaba de me contar. O outro homem se mofou. —E por que diabos eu ia fazer tal coisa? Arthur deu um passo para ele com atitude ameaçadora. Em honra de Ross terá que dizer que não se moveu. Mas Arthur advertiu a inquietação em seus olhos. —Porque não quero vê-la mais afetada do
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que já está. E apesar do que tenha passado aqui, não acredito que vocês queira isso tampouco. Ficaram olhando durante um momento até que Ross assentiu. Arthur se dispôs a partir. —Campbell. —Arthur deu a volta e viu que Ross seguia agarrando o ombro machucado — Onde aprendeu a fazer isso? Arthur torceu a boca com dissimulação. —Faça o que combinamos dito e talvez te conte isso algum dia. Anna limpou as mãos em suas saias e procurou acalmar a náusea que ameaçava subindo por seu estômago ao mesmo tempo em que observava a quantidade de homens que se congregava no salão para tomar o café da manhã.
Encontrou-se
inconscientemente
procurando Arthur, como se ver seu rosto pudesse lhe dar essa coragem que tanto
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necessitava. Ao não encontrá-lo sentado junto aos homens de seu irmão, disse que não havia por que preocupar-se. Ainda era cedo. A noite anterior Arthur tinha enviado a uma criada para lhe dizer que já estava tudo arrumado e que não tinha que preocupar-se. «Não tenho que me preocupar.» Como se tal coisa fosse possível depois do que tinha acontecido. Pode ser que sua considerada mensagem não servisse para aliviar sua noite sem descanso, mas o apreciou igualmente. Ao menos se economizava o temor de que um dos dois estivesse morto ou em alguma masmorra desconhecida. Respirou profundamente, obrigou-se a erguer o peito e erguer o queixo e entrou no salão. As pernas mal podiam sustentar do tanto que tremiam e seu coração batia contra a caixa
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torácica como as asas de um pássaro. Todos seus instintos clamavam por que fugisse, mas obrigou a seus pés a seguir adiante. Sangue de reis corria por suas veias. Era uma MacDougall, não uma covarde. Apesar de que não quisesse mais que ocultar-se em sua câmara, fazer um novelo com seu corpo e pretender que nada disso tinha ocorrido o certo era que sim tinha ocorrido. Como mínimo devia uma desculpa a sir Hugh. Quando pensava no que tinha feito… Revolvia-lhe o estômago. A vergonha a alagava. Não por sucumbir aos encantos de Arthur, já que não se envergonhava da paixão que existia entre eles, mas sim por falhar a sua família e aproveitar-se horrivelmente de sir Hugh no processo. Ele não se merecia aquilo. O orgulhoso cavalheiro não tinha feito mais que
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tratá-la com carinho. Não era culpa dela que estivesse apaixonada por outro homem. «Apaixonada.» Inclusive sopesando a enorme gravidade do que tinha feito, um pequeno raio de felicidade aparecia por trás das nuvens de desesperança.
Amava-o.
E
também
ela
significava algo para ele. Tinha que ser assim. Mas esse pequeno lapso de alegria em seu coração só servia para fazê-la sentir mais culpada. Ao encontrar o amor tinha falhado a sua família. Como poderia chegar a perdoar-se? Tinha arruinado tudo. Seu pai e seu clã completo ficavam sozinhos ante o Robert Bruce. Depois do que sir Hugh havia presenciado na noite anterior não teria aliança. Acenderam-lhe as bochechas ao recordar, ao considerar o que devia pensar aquele homem dela. «Puta. Rameira.»
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Quase esperava ouvir vaias ao atravessar o salão para chegar até o assento do estrado junto ao homem ao que tinha ofendido. Mas sua entrada não causou nenhum comentário fora do habitual. O conde e a condessa a receberam com gentilezas usuais, igual fez seu filho quando tomou assento junto a ele. Embora cada bocado que dava piorasse o enjôo que lhe punha o estômago de reverso, tinha que obrigar-se a comer. À medida que avançava a comida, sua ansiedade não fazia mais que aumentar. O breve intervalo de bom humor que entreviu em sir Hugh no dia anterior tinha
desaparecido,
algo
não
muito
surpreendente. Estava sentado junto a ela completamente rígido, muito orgulhoso e imbuído do
código
de
cavalaria
para
ignorá-la
completamente, mas muito perto de fazê-lo.
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Agradeceu a presença da irmã do Hugh do outro lado da mesa e do ajudante do Ross a seu lado, que rompiam os incômodos momentos de silêncio. Anna era consciente de que tinha que dizer algo, mas não sabia como tirar o tema em um entorno tão público. Seguia esperando que chegasse o momento oportuno quando sir Hugh se levantou da mesa e se desculpou para ausentar-se. —Espere! —exclamou Anna, advertindo que vários olhos se voltavam em sua direção e que talvez tivesse falado muito alto. Sir Hugh baixou o olhar para olhá-la e lhe dedicou toda sua atenção pela primeira vez. Anna
procurava
não
morrer
de
vergonha
enquanto ele esperava a que se pronunciasse. —Eu… — disse o primeiro que veio à cabeça,
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desejando tê-lo feito antes, quando outros não prestavam atenção ao que dizia de maneira tão óbvia — Faz uma manhã estupenda. Se não estiver muito ocupado, pensei que poderiam me mostrar
os
arredores
do
castelo,
como
prometera. Não lhe tinha feito tal promessa e se o fizesse saber, deixando clara sua pretensão de ficar a sós com ele, teria recebido o que merecia. Sir Hugh a olhou nos olhos e Anna por um momento pensou que se negaria a fazê-lo, mas ao que parecia
puderam
mais
suas
sensibilidades
cavalheirescas. Fez uma reverência e lhe tendeu a mão. —Será todo um prazer, milady. Tal
e
significativas
como horas
acompanhasse
ao
tinha
feito
antes, sair
do
poucas,
mas
permitiu
que
a
salão.
Se
o
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incomodava as falações de curiosidade que lhes seguiram não o mostrou em nenhum momento. Nessa ocasião, ao chegar ao final do corredor, conduziu-a ao exterior, ao pátio de armas. Havia um monte de gente daqui para lá: soldados praticando e protegendo as entradas, serventes atendendo a suas obrigações e um fluxo contínuo de homens passando através das portas do castelo, mas ninguém lhes prestava muita atenção. —Há algo em particular que deseje ver? — perguntou ele. Para ouvir a secura de sua voz o olhou de esguelha sob o véu de suas pestanas. Ele sabia que se tratava de uma desculpa, e das más. Anna negou com a cabeça. —Sinto muito. Tinha que falar contigo —disse detendo-se para olhá-lo bem nos olhos — Devo
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me desculpar pelo ocorrido na noite passada. — Ao ver que franzia mais o cenho lhe falharam os nervos. Mas tinha que fazê-lo. Machucava a mão de apertar tanto os punhos. Não era capaz de falar disso com calma, de maneira que explodiu e soltou — Não posso oferecer mais desculpa pra dizer quanto sinto. Sir Hugh ficou olhando-a nos olhos durante um momento e logo assentiu. Anna pensou que daria
a
volta
e
a
deixaria
ali,
mas
surpreendentemente a levou até um lugar afastado da fortificação de onde podiam ver muros longínquos e a cidade do Nairn ao fundo. Fazia vento e teve que acomodar atrás da orelha uma mecha de cabelo rebelde. Mas depois dessa noite de escuridão o resplendor do sol sobre seu rosto era rejuvenescedor. —Ama-o?
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Anna ficou petrificada. Não sabia o que esperava que dissesse, mas certamente isso não. Sir Hugh não parecia um homem que outorgasse muito valor nem desse muito crédito ao amor romântico. Parecia muito prático e frio para tudo isso. Mas merecia saber a verdade. —Sim - disse em voz baixa. —Mas teriam casado comigo para conseguir mais homens para seu pai? Tal e como disse, de repente parecia que aquilo estivesse mal. Embora o matrimônio e a obrigação fossem parceiros, era o amor o que importava menos. —Sim
-
disse
Anna,
sentindo
que
o
desespero de sua situação cavalgava sobre seu peito. Apelou a seus sentimentos para que a compreendesse — Não entende? A única maneira de lutar contra os rebeldes é unir forças.
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Se nossos clãs se unirem poderemos derrotar ao usurpador. Somente nos arriscamos à derrota. Por sua reação não pareceu que suas palavras tivessem influência alguma nele. A expressão de seu rosto permanecia severa e implacável. Era estranho. Agora que já não havia esperança de um compromisso entre ambos, todo o medo e o nervosismo de Anna pareciam desaparecer. —Não pode absolver de toda culpa, lady Anna. —Ela o olhou inquisitivamente, protegendo os olhos do sol para lhe ver melhor. Sua boca se torceu em uma estranha careta — Meu pai não tinha intenção alguma de enviar homens ao Lorn. Ficou sem respiração pela surpresa. —Mas o compromisso... Permitiram que acreditasse que… — Hugh Ross encolheu os ombros como se não lhe importasse nada. Um
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arrebatamento de cólera penetrou através do sentimento de culpa de Anna — E quando me pensava contar isso? —Teria-na informado com tempo suficiente. —Depois
de
que
anunciássemos
nosso
compromisso? Ele se enfrentou à acusação de seus olhos sem alterar-se. —Talvez. —Mas por quê? Pareceu interpretar mal sua pergunta a propósito. —Não temos homens de sobra. Bruce virá também por nós e quando o fizer… —disse com palavras que se levava o vento — O rei Robert é muito
poderoso.
Nossos
aliados
nos
abandonaram. Os Comyn, os MacDowell, os ingleses. Meu pai tem muito que perder.
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Sir Hugh ficou com o olhar perdido além dos muros, para o pequeno reino que se estendia a seus pés. Tratava-se de um movimento revelador e teve que conter o fôlego ante o que significava. Muito que perder. Seu pai não pensava arriscar. —Não —disse Anna dando um passo atrás — Não podem! Seu pai não pode render-se. Bruce o assassinará pelo que fez a sua esposa e a sua filha. Falava sem pensar, e estava claro que o que fez seu pai quando violou o santuário e entregou às mulheres de Bruce aos ingleses não era algo que sir Hugh quisesse que o recordassem. Pela primeira vez, Anna viu algo um pouco parecido à vergonha em suas orgulhosas feições. —Bruce prometeu perdoar a todos nobres que estavam contra ele que se renderem. —E acreditam na palavra de um traidor? De
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verdade confiam em que o rei Hood perdoará a seu pai e aos sediciosos de Ross e Moray? Apenas se consumaram os fogos da perseguição ao Buchan. Não
discutiu
com
ela.
Mas
apertava
fortemente a mandíbula quando disse: —O que outra opção fica? As voltas mudaram a favor de Bruce. O povo pensa que é um herói, um guerreiro que derrotou aos ingleses. Renderse pode ser a única maneira de sobreviver. Meu pai está disposto a morrer se isso significar a continuidade do clã. A cabeça de Anna dava voltas. Jamais, nem em
suas
mais
escuras
expectativas,
teria
imaginado
que
Ross
renderia.
que
se
O
significaria isso para seu clã? Faria seu pai o mesmo? Não, seu pai jamais se renderia. E pela primeira vez Anna se precaveu de quão caro
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poderia lhes custar. Preocupada com o que sir Hugh acabava de lhe confiar, Anna não encontrava muito consolo em saber que sua conduta não era reprovável. —Obrigado por me contar isso. Ele a olhou com atenção. —O que fará? —Lutar - respondeu. Embora fosse sozinhos. Que mais podiam fazer? —Casará com o Campbell? Anna se ruborizou. Depois do que tinha passado a noite anterior era algo natural assumir que… Mas não tinham tido oportunidade de discutir seu futuro. Ele pareceu compreender seu silêncio. —Conhecem-no muito bem? O tom de advertência de sua voz despertou
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aquela vozinha de sua consciência que trabalhou em excesso em sossegar. —Sir Arthur chegou ao Dunstaffnage faz um mês junto a seu irmão em resposta à chamada que fez meu pai aos cavalheiros e mercenários. Aquilo pareceu lhe confirmar algo. —Há algo estranho nele. Algo que não se enquadra. Não é quem parece ser. Anna saltou em sua defesa imediatamente, pensando que sir Hugh se fixou nas incomuns habilidades de Arthur. —É muito reservado —disse — custa a comunicar-se. Sir Hugh a olhou inquisitivamente, como se quisesse acrescentar algo, mas em vez disso simplesmente
assentiu.
Foi
um
alívio
que
dissesse que se encarregaria de explicar tudo a seus pais e seus irmãos sem fazer menção
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alguma à situação comprometedora em que a tinha encontrado, acordando dizer que não combinavam um para o outro. Para quando a acompanhou de novo até a torre Anna se sentia muito mais relaxada. Uma vez mitigada parte da culpa, permitiu-se viver um pouco da felicidade que supunha descobrir que o homem ao que amava tinha sentimentos por ela. Não podia esperar para lhe ver e falar com ele. Surpreendentemente, dadas as intimidades que tinham compartilhado, não estava envergonhada. Inclusive nesse momento, depois de todo o acontecido, parecia o correto. Estava a ponto de subir o primeiro dos degraus que fossem do pátio à torre quando olhou à esquerda e viu que sir Arthur saía dos barracões. O coração lhe deu um tombo. Sorriu e deu um passo para ele de maneira instintiva, mas
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logo se deteve de repente. Levava a armadura e estava claro que se preparava para praticar, mas podia entrever seu rosto o suficiente sob a viseira do elmo. Não era que esperasse que corresse pelo pátio a seu encontro, ao menos não com sir Hugh ainda a seu lado. Mas um olhar de carinho seria bom. Algo em comparação com esse rosto de arrependimento, sim, inclusive de vergonha, que escurecia seus bonitos traços. A alegria que fez saltar seu coração se consumiu e o devolveu ao chão de repente das alturas. Advertiu como sir Hugh ficava em guarda ao conscientizar do que ela tinha visto. Arthur
desviou
o
olhar
para
o
outro
cavalheiro. Podia sentir a animosidade acesa entre ambos. Foi Arthur quem se retirou primeiro. Saudou-os com uma inclinação da cabeça e se
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dirigiu a reunir-se com o resto dos guerreiros. Anna dizia a si mesma que não devia estar decepcionada, que não tinha que exagerar sua reação. Já falariam mais tarde. Em particular. Provavelmente o que adivinhava em seus olhos não era mais que imaginações. Mas as seguintes palavras de sir Hugh lhe disseram o contrário. —Se a coisa não for como espera, lady Anna, eu estarei aqui. Um homem com quem podia contar. Rezava por que Arthur também o fosse.
Capítulo 16
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Demoraram mais do que Arthur pensava em sair do castelo de Auldearn. Alan MacDougall se encerrou em sua câmara com o conde, seu conselheiro e sir Hugh durante três dias mais, no que Arthur assumiu como uma tentativa de persuadir ao Ross para unir forças, apesar da ausência
de
compromisso.
Felizmente,
os
esforços do Alan foram úteis. Dado que não tinham lhe contado os detalhes, Arthur não pôde estar seguro das razões do conde, mas o rechaço era um bom augúrio para o rei Robert. Passaria
a
informação
assim
que
tivesse
oportunidade de fazê-lo. Não acreditava que eles tivessem irradiado nenhuma mensagem, mas revisaria os pertences do Alan e de Anna para assegurar-se disso, assim que tivesse ocasião. Saíram de Auldearn ao amanhecer, fazendo o mesmo trajeto de na semana anterior em sentido
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contrário e forçando o ritmo o primeiro dia para chegar a salvo mais à frente do castelo. Os homens, contagiados do humor de seu senhor e sua dama, pareciam perceber que as coisas não tinham ido como esperavam e a nuvem do fracasso se abatia sobre as cabeças dos viajantes.
Levava
uma
predisposição
algo
sombria, por não dizer decididamente malhumorada. Arthur sabia que teria que sentir-se aliviado e satisfeito de ter completado sua missão. Ross e Lorn
não
MacDougall
uniriam serviria
forças. como
O
fracasso
dos
incentivo
para
aproximar de Bruce um passado mais para a vitória e a Arthur um passado mais para a destruição de seu inimigo. Assegurar-se de que John de Lorn pagava pelo que lhe tinha feito a seu pai era o que mais ansiava no mundo. Não
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era certo? Assim devia ser, maldita seja. Mas temia que aquilo lhe custasse muito mais do que pensou em um primeiro momento. Coberto atrás de seu elmo podia ceder à tentação de olhá-la. De novo essa sensação, molesta e penetrante. Não era só consciência o que o remoia, a não ser algo mais. A dor que aguilhoava seu peito quando a olhava era virtualmente
insuportável.
Mas
não
fazê-lo
parecia mais doloroso ainda. Anna cavalgava na frente dele, junto a seu irmão e a criada, com o que somente oferecia seu perfil ao voltar-se. Arthur não precisava olhála para saber que o silêncio a respeito do ocorrido entre ambos lhe doía. E muito. Deus Santo, o que tinha feito? E o que era mais importante, que demônios faria a respeito? Agora que estavam longe do castelo já não podia evitar
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o tema nem evitá-la por muito mais tempo. Sabia o que devia fazer. Não precisava ser um cavalheiro para conscientizar de que depois do perto que estivera de lhe arrebatar a virgindade, a escassos centímetros literalmente, deveria a pedir em matrimônio. Não havia dúvida de que era o que ela esperava. E o que cabia esperar. Isso faria um homem com honra. Mas esses escassos centímetros lhe serviam de suficiente desculpa para não fazê-lo. A batalha que livrava em seu interior era cada vez mais cruel. Todos seus instintos exigiam que se aproximasse dela, que cedesse aos sentimentos e, por que não falar, maldição, às emoções que brigavam em seu interior. Mas a outra parte de seu ser, a racional, puxava-o para evitar maiores males. Embora ele mesmo quisesse esquecer-se disso em algumas ocasiões, o certo era que a
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enganava. E estava claro como a água que não podia lhe dizer a verdade. Seu dever e sua lealdade pertenciam ao Bruce. Nenhum dos sentimentos
que
albergasse
poderia
mudar
aquilo. Estavam em lados opostos de uma rixa a ponto de desatar-se. Ao final ela descobriria sua filiação verdadeira e se inteiraria de que a única razão que o tinha levado ao Dunstaffnage fosse espiar e propiciar a destruição de sua família. Sabia que pedi-la em matrimônio só serviria para que a traição final tivesse conseqüências muito piores. Era
uma
situação
impossível
e
tinha
consciência de tê-la criado ele mesmo. Teria que ter-se afastado dela, mas suas boas intenções ficaram transbordadas por seu sorriso, vitalidade, doçura e amabilidade. Quando olhava o interior desses grandes olhos azuis começava a ter
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saudades de algo que nem sequer sabia que queria. Gostava de estar sozinho, maldita seja! Parecia mais fácil e muitíssimo menos chato. Entretanto Anna o fazia ansiar algo que ele não poderia permitir-se oferecer, à vista do que estava por chegar. E fazê-la sofrer desse modo, não ser capaz de fazer algo para mudar, partialhe a alma. Cada vez lhe custava mais concentrar-se em suas tarefas. Embora não se voltasse para olhá-lo, Arthur sabia que ela era tão consciente de sua presença como ele mesmo. Advertiu a maneira em que seus ombros ficavam tensos quando situou seu cavalo atrás deles. Richard e Alex partiam em cabeça explorando o terreno, de modo que Arthur ficou ao fim para assegurar-se de que ninguém os seguia. Aproximava-se o final da primeira jornada da viagem e tinham que proceder com
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especial cautela agora que se aproximavam do castelo do Urquhart, lugar em que tinham aparecido os homens de Bruce quando foram para o castelo do Ross. Novamente, teriam que fazer uma boa volta para o oeste do caminho para evitar as patrulhas da fortaleza «inimiga». —Pegue milady —ouviu que dizia sua criada — Lady Euphemia pediu ao cozinheiro que as prepare especialmente para ti em vista que gostas. A anciã tentou enrolá-la com os doces, mas Anna negou com a cabeça em uma pobre tentativa de sorriso que lhe cravou outra pontada no coração. —Não, obrigado, não tenho fome. A criada se zangou, franziu os lábios e mastigou a delícia de amêndoas sem entusiasmo algum. Mal teve acabado de mastigar quando
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voltou para a carga e tirou de sua bolsa o que parecia um pequeno bolo de carne. —O que me dizem de um pastezinho de cevada com cordeiro? —disse, cheirando-o teatralmente — Cheira divinamente. E ainda está quente. Anna voltou a negar com a cabeça. —Coma se quiser. Eu comerei quando nos detivermos. A criada murmurou para si. —Tem que comer algo, milady - urgiu entre murmúrios, ao mesmo tempo em que fulminava Arthur com o olhar. Este apertou a mandíbula, adivinhando a quem culpava a criada pela falta de apetite de sua senhora. —Comerei - disse Anna para apaziguá-la. Chamou a seu irmão, que cavalgava um pouco
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mais adiante — Quando pararemos para passar a noite, irmão? —Logo, espero - respondeu Alan olhando a seu redor e fazendo gestos a Arthur ao ver que tinha retornado. Este se armou de valor e fez como lhe pediu, levantando o visor de seu elmo ao passar entre o punhado de cavaleiros que lhes separavam — Viu algo suspeito? Arthur negou com a cabeça. —Por agora não. Estaremos seguros quando voltarem Richard e Alex, mas se não ter nada extraordinário, poderemos nos deter o anoitecer como tínhamos previsto. —Não
voltaremos
para
lago
em
que
acampamos a vez anterior? Era ela quem falava. Arthur voltou o olhar lentamente, incapaz de evitá-la por mais tempo. Mas
não
estava
preparado
para
o
calor
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abrasador que lhe atravessaria ao encontrar-se com seu olhar. Ele, que apenas se movia quando uma flecha se afundava no mais profundo de seu ombro, quando uma espada lhe abria as vísceras nem nas numerosas ocasiões em que não tinha apanhado a adaga de seu irmão com suficiente presteza, sobressaltou-se ao ver a tristeza e a pergunta sem formular de seus olhos. Parecia
fatigada,
de
uma
fragilidade
insofrível. Umas pequenas linhas sulcavam as comissuras de seus olhos e sua pele estava muito mais pálida do normal. Apertou os dentes, lutando contra a desesperada necessidade que sentia de dar o que ela queria. «Peça-a em matrimônio.» Maldição, não podia fazê-lo. Não faria a não ser piorar as coisas. —Não, milady —respondeu sem alterar a voz
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— Será mais seguro que não voltemos sobre nossos
passos.
Acamparemos
em
lugares
diferentes cada noite. Há uma cascata na floresta dos pagamentos do Dhivach, ao sudeste do castelo, onde começa a ravina. Faremos pernoite ali. Anna
assentiu
com
cara
de
querer
acrescentar algo, mas consciente de que não estavam sozinhos. —Falta muito? —Cinco ou seis quilômetros. Deveríamos chegar antes do anoitecer. —Eu… — Anna deixou a frase pela metade. Não obstante, o modo em que o olhava era desencorajador — Obrigado. Quando Arthur se decidiu a afastar o olhar se surpreendeu comprovar que um dos homens do Alan se situava atrás dele. Ficou circunspeto,
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mas estava muito imerso em sua própria confusão para atender à advertência. Ao que parecia um das arcas de Anna não estava bem presa e caiu do carro. Arthur agradeceu a interrupção quando viu que Anna e sua criada fossem ao fim da fila para assegurarse de não perder nada. Mas era consciente de que não poderia postergar a inevitável discussão por muito mais tempo. Isso ficou assegurado certamente pelas palavras de Alan antes de partir para ver o Richard e Alex. —Não sei que diabos passou em Auldearn, Campbell, mas minha irmã está triste. —O cavalheiro cravou o olhar em Arthur com uns gélidos
olhos
azuis
que
não
mostravam
compaixão alguma. Depois de tudo, era filho de seu pai — Arrume ou me encarregarei eu de fazê-lo.
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Arthur franziu o cenho até adotar uma expressão sombria. Não se incomodou em pretender que não sabia ao que se referia. A ameaça não lhe inquietava. O que lhe inquietava era que não podia fazer o que o irmão de Anna lhe pedia. Nada poderia arrumá-lo. —Por que está me evitando? Arthur, assombrado, ficou em pé de repente, fazendo
saltar
a
armadilha
que
estava
preparando. Tinha o surpreendido. Algo que Anna
apostava
que
não
ocorria
muito
freqüentemente. Talvez essa confusão que ela percebeu em seus olhos não foi imaginação. Olhava-a com uma saudade mal reprimida, mas algo o fazia conter-se. O desengano que sentiu na primeira manhã não fazia mais que piorar a cada dia que passava. Ainda não tinha ido a seu encontro, por
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não falar de oferta de matrimônio alguma. Anna queria
convencer-se
de
que
simplesmente
esperava para falar com seu pai, mas isso não explicava por que fugia dela. —Está me seguindo outra vez, Anna? Se tentava distrair ficando à defensiva, não funcionaria. —Não sei como poderia dizer que te sigo quando o acampamento está a poucos passos daqui - disse assinalando os arranjos e cordas — Vi que tirava a armadilha da bolsa e supus que não iria muito longe. Inspecionou suas feições, meio escondida entre as sombras. Ao menos ficava uma hora de luz solar, mas sob o espesso manto das árvores da floresta parecia quase noite fechada. Anna deu um passo para ele e estreitou o vão que os separava. Arthur franziu o cenho e todo seu
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corpo ficou rígido. Anna percebeu de que lhe moviam
as
aletas
do
nariz,
como
se
o
incomodasse tê-la tão perto. As lágrimas foram a seus olhos. Por que se comportava desse modo? Acaso era tão desagradável? —Ides responder-me? —disse com uma voz quebrada pela emoção e a incerteza dos últimos dias. Queria pôr a mão sobre o peito para tranqüilizar-se, mas temia que ele retrocedesse e isso a fizesse pedaços — Acaso não mereço uma explicação? Arthur suspirou e se separou dela com o pretexto de passar os dedos entre os cabelos. Embora ainda levasse posta a armadura, tirou o elmo e seu cabelo castanho escuro caía em suaves ondas sobre a borda da cota de malha. —Sim, moça. Merece uma explicação. Tinha intenção
de
falar
contigo
uma
vez
que
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tivéssemos comido. Não sabia se acreditava, mas o deixou continuar. Ela já havia dito suficiente. Era a ele a quem correspondia falar. —O que ocorreu foi - Formoso? Incrível? Perfeito? pensou Anna—… desafortunado. —A Anna parou o coração. Não era a palavra que esperava
—
Me
envergonho
de
meu
comportamento —disse Arthur com palavras que pareciam próprias do cavalheiro mais contido da corte — Jamais devia permitir que chegasse tão longe. Anna o deteve em seco, incapaz de resistir por
mais
tempo
o
tom
distante
e
o
arrependimento de sua voz. —Por que fala assim? Por que atua como se não
significasse
nada?
—Arthur
esticou
a
mandíbula mais ainda. A palpitação de seus
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batimentos no pescoço não pressagiava nada bom. Tentou afastar-se de Anna, mas ela o agarrou pelo braço. O peito lhe ardia — Significou algo, Arthur? —Este a olhou nos olhos com uma intensidade que queimava. Anna aspirou profunda e entrecortadamente através de sua oprimida garganta — Para mim sim. —Anna… - Parecia estar liberando algum tipo de guerra interior. Anna notava a rigidez de seus músculos
sob
seus
próprios
dedos.
Seu
poderoso corpo parecia irradiar tensão — por que põem as coisas tão difíceis? —Eu? És tu quem põe as coisas difíceis. É uma pergunta muito simples. Ou significou algo para ti ou não significou nada. Manteve o olhar, negando-se a lhe permitir partir sem que respondesse algo. Arthur tinha o rosto
desfigurado,
como
se
o
estivesse
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torturando. —Não entendes. —Têm razão. Não entendo. Poderia explicar isso? - Somos completamente inadequados um para o outro. —Não posso. —Olhou-a com dureza — É que não vê que jamais funcionaria? «Meu Deus!» Pareceu engasgar-se com seu próprio
coração
quando
percebeu
o
que
acontecia. «Não pensa me propor matrimônio.» Como era possível que tivesse interpretado tão mal a situação? Não! Não o tinha feito. Havia algo mais que lhe escapava. —Por que não? —Somos completamente inadequados um para o outro. A família é tudo para ti. E para mim? Meus pais morreram quando era um
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pirralho. Meus irmãos levam anos lutando em lados distintos. Não sei nada a respeito de família. —Eu posso lhes ensinar… —Não quero que me ensinem - repôs isso Arthur, cortando-a com raiva — Eu gosto de estar sozinho. E você… —disse com um gesto da mão — Tenho certeza que não estivestes sozinha nem um dia em sua vida. Merece estar rodeada de família e amigos, com um marido que lhe adore e um monte de crianças puxando suas saias. Não me diga que não quer isso, porque sei que é isso o que quer. Era certo que queria isso, mas com ele. —Não quer ter crianças? Sua boca empalideceu como se a pergunta, pensar nisso tão sequer, fosse doloroso. —Não entende a situação.
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—Eu? Paraste a pensar que talvez não se trate de que gosta de estar sozinho, mas sim de que alguma vez estivera com as pessoas adequadas? —disse fazendo uma pausa para que o considerasse. Compreendia as razões que lhe levavam a solidão, mas suspeitava que seria diferente em caso de ter uma família que o amasse, que o aceitasse — Se sentires algo por mim, o resto não tem importância. —O rosto de Arthur se mostrava duro como o granito, mas ela seguiu pressionando — Sente algo por mim, Arthur? Manteve
o
olhar,
desafiando-o
a
que
mentisse. E Arthur parecia querer fazer, mas ao final o admitiu. —Sim. Mas isso não importa. Sentia algo por ela. Não tinha errado. Negou com a cabeça.
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—Isso é tudo o que importa. —Não insista, Anna. Acredite-me quando digo que não funcionaria. Jamais poderia lhes dar o que necessita. Nunca poderia te fazer feliz. A frustração e a raiva buliram em seu interior. —Como te atreve a presumir que conhece minha mente melhor que eu? Eu sei exatamente o que quero. Depois do que passou como não pode compreender que é o único homem que pode me fazer feliz? Não te dá conta de que te amo? Sua declaração de amor foi tão inesperada para ela como parecia ser para ele. Fechou a boca de repente, mas era muito tarde. Suas palavras
seguiam
ressonando
no
repentino
silêncio. Arthur ficou completamente quieto, com uma expressão não muito diferente de quem tivesse recebido uma flechada no peito. Não se
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podia dizer que fosse a reação que ela esperava. Não esperava que respondesse a sua declaração de amor. Em realidade não. Não nesse momento, ao menos. Mas tampouco esperava encontrar-se com o silêncio. Um silêncio que lhe rompia o coração lenta e cruelmente. «Amo-te» As palavras zumbiam em seus ouvidos. Como um palpite. Uma chamada. Tentava-o,
caramba,
tentava-o.
Arthur
permaneceu quieto como uma pedra, sem permitir o luxo de acreditar. Não podia fazer. Porque
se
o
fizesse,
era
possível
que
encontrasse a felicidade. Uma felicidade maior da que tinha desfrutado na vida. Não dizia a sério. Estava confusa. Anna MacDougall entregava seu coração a todos. Isso era parte do que a fazia tão irresistível. Negou com a cabeça, como se tentasse convencer a si
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mesmo. —Não sabes o que diz. Não podem me amar. Nem sequer me conhece. —Como podem dizer isso? Pois claro que lhes conheço. —Há coisas sobre mim que se soubessem… Não podia dizer nada mais. Já havia dito muito.
Suas
habilidades
perceptivas
eram
excepcionais. Anna franziu os lábios e ele reconheceu o brilho teimoso de seu olhar. —Acreditava que já tínhamos passado por isso. Suas faculdades são um dom, e se demonstraram extraordinariamente úteis em mais de uma ocasião. —Ele não falava de suas habilidades, mas sim do fato de ser um espião ao serviço de Bruce. O fato de que não havia pessoa no mundo a quem odiasse mais que ao pai de Anna e que tinha esperado quatorze anos
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para destruí-lo. Mas dificilmente poderia lhe contar a verdade — Sei tudo aquilo que importa sobre você - continuou — Sei que prefere observar e escutar a falar. Que não gosta de chamar a atenção e prefere estar em um segundo plano. Sei que conta com habilidades valiosas que prefere ocultar porque acredita que o faz diferente. Sei que está convencido de que é diferente e por isso não necessita a ninguém, de modo que procura espantar aos outros antes que se aproximem de ti. Sei que passou a maior parte de sua vida no campo de batalha, mas que pode dirigir a pluma de maneira tão efetiva quanto uma espada. —deteve-se o tempo preciso para tomar fôlego. Ele teria que tê-la cortado, mas estava muito indisposto para falar — Sei que é inteligente e que têm um caráter tão forte como seu corpo. Sei que quando estou contigo me
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sinto segura. Que faz ver que nada lhes importa, mas que me defenderia com sua própria vida. Sei que um homem que sustenta em seus braços a um bebê e que mostra paciência com um cachorrinho que não tem feito mais em dar problemas tem um coração bondoso. —Anna baixou a voz até deixá-la quase em um sussurro, dissipada já toda sua ira — Sei que desde a primeira vez que me beijou senti que jamais teria outro homem para mim. Que quando ergo o olhar para olhar, vejo o rosto que quero ver durante o resto de minha vida. —Seus olhos, que brilhavam com lágrimas não derramadas, encontraram-se com os dele — Sei que é leal e honrado e que te importo, mas que há algo que o faz se conter. «Jesus.» Era como se lhe desse um soco. Ninguém antes lhe havia dito nada parecido. O fazia sentir-se humilde. Comovia-lhe. Dava-lhe
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um medo de morte. Tinha visto muito de sua pessoa. Não significava só um perigo para sua missão, mas também para ele em formas que jamais tinha imaginado. Endureceu a mandíbula e o coração. —Vê o que quer ver, Anna, não a realidade. —A guerra. Seu pai. Ele. Estava cega diante das faltas daqueles aos que professava amor — Mas as garotinhas que acreditam nos contos de fadas acabam desenganadas. —Não faça isso —sussurrou Anna — Não tente me espantar. Isso era o que fazia. O que sempre fazia. E embora pela primeira vez não desejasse fazer, era o que tinha que fazer. Pelo próprio bem de Anna. Agarrou-a pelo braço com intenção de sacudi-la e fazê-la entrar em razão, mas foi um engano. Tocá-la não fez mais que avivar o fogo
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de suas emoções até quase lhe fazer perder o controle. —Então não atue apoiada em contos infantis. Estamos em meio de uma maldita guerra. Bruce está a ponto de cair com todo seu exército sobre sua cabeça e mesmo assim quer planejar seu futuro. Não há futuro, Anna. Somente existe o dia de hoje. Diabos, quem sabe se terá um lar daqui a um mês. Sobressaltou-se como se a tivesse golpeado. —Acredita que não sou consciente disso? — Anna sossegou um soluço na garganta. Seus preciosos olhos azuis se nublaram com lágrimas, atiçando o fogo que consumia seu peito — por que pensa que acudi ao Ross? Sei perfeitamente o que está em jogo. Mas não pude fazer. Não podia fazer por causa de ti. —Seu pai jamais devia ter te pedido isso -
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repôs. A expressão de assombro de Anna fez que Arthur desejasse poder retirar o dito. Tinha a perspectiva de uma menina para seu pai, a do cavalheiro perfeito que não podia fazer nada mal. Outra dessas ilusões que ele ajudaria a destruir. —Não me pediu isso. Foi minha idéia. Fala de guerra e de incerteza, mas posso lhes dizer uma coisa
certa.
Se
não
arriscar,
se
seguir
espantando as pessoas de seu lado, assegurará sua solidão. É isso o que quer? Apertava a mandíbula com tanta força que lhe doíam os dentes. —Sim. «Maldita seja.» —Muito bem. Porque isso é exatamente o que conseguirá - disse ela; as lágrimas rodavam por suas bochechas — Não sei por que faz isto,
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Arthur Campbell, mas é um covarde. Um acesso de raiva subiu por seu corpo. Não era um covarde. Somente tentava fazer o correto. Mas não lhe deixava fazer. Não fazia mais que pressioná-lo
para
voltá-lo
louco
com
uns
sentimentos que não lhe pertenciam. Não podia pensar bem. Não queria mais que tomá-la entre seus braços e beijá-la até que cessasse o martelar que sentia na cabeça, e no coração. Possivelmente isso tivesse feito se pudesse, mas não teve a oportunidade. —Que diabos está acontecendo aqui? Arthur voltou com a cabeça ainda lhe dando voltas, ao mesmo tempo em que Alan aparecia no claro. Amaldiçoou. Estava tão absorto em Anna que não ouviu o mínimo ruído. Que demônios ocorria? Estava fosse de controle. Tinha que tomar as rédeas de suas emoções.
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Seus sentidos estavam mesclados e confusos. Distraía-se muito. Estava tão confuso... Somente uma vez antes havia sentido de tal modo: o dia em que morreu seu pai. Estava perdendo os papéis. Tanto que não se preparou para o que vinha depois. —Deixe-a
em
paz
-
vociferou
Alan,
arrancando-a de seus braços ao mesmo tempo em que lançava o primeiro murro direto a sua mandíbula. A cabeça de Arthur se propulsou para trás ao receber o golpe em cheio. Uma explosão de dor se apoderou dele. Ficou cego por um resplendor branco. Anna gritou aterrada. —Alan, por favor! Não é o que parece! Mas seu irmão não a escutava. Como prova
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de sua eficiência com ambos os punhos, alcançou Arthur do outro lado com outro golpe. Depois no ventre. Logo no flanco. —Vos disse que o arrumasse maldita seja. Não que a fizesse chorar. Que demônios lhe têm feito? Arthur não tentava defender-se. Não porque não pudesse. Era evidente que MacDougall tinha um braço como o martelo de um ferreiro, mas Arthur tinha aprendido suficientes truques do melhor lutador corpo a corpo das Highlands e era capaz de tombá-lo em poucos segundos. Não se defendia porque merecia o castigo. Diabos, merecia muito mais pelo que estava a ponto de fazer. —Para! Para! —choramingou Anna com uma voz a borda da histeria — Está lhe fazendo mal. Alan o arrastou pelo pescoço e o empurrou
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com força contra uma árvore. —O
que
lhe
têm
feito?
—perguntou
fulminando a sua irmã com o olhar — Será melhor que um dos dois me diga que demônios passa aqui. —Nenhum deles respondeu. Alan olhava alternadamente a um e outro com o rosto aceso pela raiva — Não me tomem por um maldito idiota! Não pensem que acreditei nem por um momento que Ross decidiu dar para trás de repente! —disse olhando a Anna enquanto seguia apertando fortemente o pescoço de Arthur com a mão — O que passou em Auldearn? É que este filho de cadela te tocou, Anna? —perguntou lhe apertando o pescoço — Te tocou? —insistiu empurrando com mais força — O fez? Arthur sentia que o nó se esticava em torno de sua garganta e não era pela mão do MacDougall. Não. Sabia que teria que responder
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pelo que esteve a ponto de acontecer em Auldearn. — O solte! —Alan advertiu o pânico na voz de Anna. Ela tentava lhe puxar o braço, mas sem obter resultado — Sim, mas não é o que pensa. De fato, devia ser exatamente como o pensava. —Maldito
velhaco
do
demônio!
—disse
MacDougall estampando a cabeça de Arthur de novo contra a árvore — O matarei por isso. Arthur não duvidava de suas intenções. Nem tampouco de sua capacidade para fazer. Mas não podia permitir. Estava a ponto de libertar-se quando ouviu um pequeno zumbido seguido por um suave vaio. «Flecha.» Seus sentidos se abriram em uma explosão de clarividência. Olhou por cima do ombro do
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MacDougall e viu a ponta de ferro sulcando o ar, apenas a um segundo de impactar no cangote do MacDougall. Arthur não pensou. Simplesmente reagiu.
Golpeou
para
cima
o
braço
do
MacDougall com o antebraço em um perfeito movimento para libertar seu pescoço das garras dele e atrás disto enroscou sua perna ao redor do tornozelo para desequilibrá-lo. MacDougall caiu ao chão justo antes que a flecha impactasse na árvore com um som seco ao que logo seguiram os dilaceradores gritos de ataque. Ouviu a exclamação de terror de Anna, mas não podia voltar para acalmá-la. O primeiro dos homens acabava de emergir de entre as árvores com a espada em alto. De novo a reação de Arthur foi instantânea. Jogou mão ao punho de sua adaga, extraiu-a de sua capa e a lançou. O atacante emitiu um gemido quando a folha deu
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com os poucos centímetros desprotegidos da pele de seu pescoço. Cambaleou-se e caiu ao chão. Para quando o seguinte dos homens saltou sobre eles MacDougall já tinha tido tempo para entender o que acontecia e se pôs em pé. Desembainhou a espada, girou sobre si mesmo e a ergueu bem a tempo para repelir uma cutilada que lhe teria arrancado a cabeça. «Anna.» Arthur desviou o olhar do assalto que estava por chegar justo o tempo suficiente para assegurar-se de que ela estava bem. Encontrou-a resguardada depois da árvore, com os olhos cheios de terror. O coração lhe acelerou ao conscientizar-se de quão vulnerável era e logo se paralisou quando se deu conta de quão vulnerável isso fazia a ele mesmo. Não podia permitir que lhe acontecesse nada. Tinha que
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protegê-la. Mataria a todos se fosse preciso. Seus
olhares
se
encontraram
só
por
um
segundo. Mas a forma em que se olharam foi de uma intensidade inegável e brutal. —Permaneçam abaixados - disse com voz pausada, a pesar do fluxo de sangue que corria por suas veias. Arthur se situou frente a Anna, cotovelo com cotovelo com o MacDougall, quem seguia lutando com seu oponente, e recebeu com sua espada a avalanche de atacantes que saíam de entre as árvores. Uma vintena de homens. Talvez mais. Não teve que esperar muito para encontrar-se com o primeiro deles. Pela primeira vez em quase dois anos, desde que se visse obrigado a abandonar os Guardiões das Highlands para infiltrar-se em campo inimigo, Arthur se deixou ir e lutou com toda a destreza e o frenesi que tão
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cuidadosamente mantinha ocultos. Tombou ao primeiro
dos
homens
com
um
virulento
movimento de espada, girou-se e aproveitou a inércia para derrubar ao seguinte. Foram por ele com mais virulência. Mas não importava. Era como uma máquina de guerra que arrasava tudo o que saía a seu caminho. Três. Quatro. O ruído do metal sobre o metal atravessava o sombrio ar noturno, mesclando-se com os gemidos e os gritos da batalha. Esses sons
tinham
alertado
aos
homens
do
acampamento, que felizmente estava a poucos metros dali, e os soldados do MacDougall começaram a aparecer na pequena clareira, já envolto em uma escuridão absoluta. Mas os atacantes esperavam a chegada dos reforços. Em realidade o tinham planejado e aguardavam o momento. Saltavam das árvores à medida que
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eles abriam caminho por baixo e caíam sobre os despreparados homens do clã MacDougall. —Vamos!
—disse
Arthur
tentando
lhes
advertir — Disperse. Se não se dispersavam os fariam pedaços com a facilidade que se cortam arenques de um barril. Mas essa foi toda a advertência que pôde fazer
antes
que
os
seguintes
adversários
distraíram sua atenção. Tinha a dois homens sobre ele. Dois homens com nasais, mantos obscurecidos e as características manchas de cinza negra nos rostos. O pavor se instalou em seu estômago com o peso de uma pedra. Os atacantes eram homens de Bruce. Pois claro que eram. Viu os corpos pulverizados no chão ante ele, homens que ele tinha matado, e veio um acesso de bílis à garganta. Jesus, no
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que estava pensando? Nem sequer pensava. O instinto de amparo para a Anna ultrapassava todo o resto. Mas era pior do que imaginava. Enquanto tentava incapacitar aos dois homens que lhe atacavam sem chegar a matá-los, um terceiro homem se uniu à refrega. Um homem que brandia duas espadas. Movia-se como um raio e foi a Arthur com uma ferocidade sem igual inclusive entre seus companheiros de elite dos Guardiões das Highlands. Arthur se encontrou cara a cara na escuridão com LachlanMacRuairi e amaldiçoou para si. Capítulo 17 Ocorreu momento
tudo tentava
muito evitar
depressa. que
Em
seu
um
irmão
assassinasse ao homem que amava e no
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seguinte estavam sendo atacados. Dizer que a situação era perigosa era pouco. De seu posto escondida entre as árvores, Anna se obrigava a respirar levianamente entre o estrepitoso pulsar de seu coração e observava com horror como aqueles homens caíam sobre eles como uma praga de gafanhotos. Pareciam que fossem centenas de inimigos contra só dois guerreiros. Arthur parou os pés ao primeiro com tal superioridade que lhe pareceu algo bizarro. Mas então chegou o seguinte. E outro mais. Ficou olhando cheia de assombro como despachava sem esforço algum a todos quantos saíam a seu encontro. Sua destreza era tão extraordinária, mostrava tal superioridade, que parecia estar vendo outro homem. Tinha o espiado suficientes vezes enquanto praticava para reconhecer a diferença. Fazia que seu irmão, conhecido como
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um dos cavalheiros mais destros das Highlands parecesse um escudeiro. Arthur era mais rápido. Mais ágil quanto à técnica e movimentos. E o que era mais significativo, mais forte. Podia sentir como reverberava a terra com a força de seus golpes.
Quando
um
de
seus
oponentes
conseguia acertar com uma cutilada, o braço de Arthur apenas se movia ao bloqueá-lo e absorvia a força do impacto como se fosse nada. Seu braço… Os olhos lhe puseram como pratos. Era o braço direito. Não entendia. Arthur era canhoto. Ao menos supunha que era, mas nesse momento, em somente observá-lo, sabia que estivera fingindo. Por que ocultaria algo assim? E por que não o tinha visto alguma vez antes lutar desse modo? Podia compreender os motivos para ocultar seus incomuns aguçados sentidos, mas não havia
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nada inapropriado em ter destreza no manejo da espada. Deus, poderia ser um dos cavalheiros mais venerados do reino se quisesse. Então por que não queria ser? Mas essas perguntas se esfumaram de sua cabeça assim que viu a nova horda de atacantes que vinham de cima das árvores. Não cabia dúvida de que ao ver os corpos caídos de seus compatriotas tinham identificado a ameaça e se reuniam em torno de Arthur. Anna
reprimiu
o
grito
de
advertência,
consciente de que não faria mais que lhe distrair. Mas tinha o coração em um punho. Dois homens. E um terceiro não muito longe deles. De repente algo pareceu mudar em Arthur. Em lugar de frios e desumanos golpes mortais brandia a espada com menos intenção. Era quase como se seu objetivo tivesse mudado e
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não desejasse matá-los a não ser simplesmente repelir o ataque. Mas não tinha nenhum sentido. Tirou esse pensamento da cabeça. O que passava era que aqueles guerreiros estavam melhor treinados. E era certo. Parecia difícil ver algo na penumbra.
Levavam
roupagens
escuras
e
pareciam ter se sujado de fuligem a pele com algo… Gelou-lhe o sangue ao recordar o ataque do ano anterior. Aqueles homens também levavam a pele suja. Seria possível que se tratasse dos espectros do exército fantasma de velhacos formado
por
Bruce,
o
homem
que
tinha
instaurado o horror tanto nos corações da Escócia como da Inglaterra? Seus piores temores se viram confirmados quando um terceiro homem desceu sobre Arthur
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como um cão do inferno. Em lugar do longo espadão
de
duas
mãos
highlanders,
este
brandia
que
usavam
duas
os
espadas
menores. Uma em cada mão. Mas eram suas vestimentas as que a fizeram tremer com um terror que subia por todos seus ossos. Igual ao resto dos atacantes, levava um nasal escurecido e tinha sujado de fuligem sua pele com barro ou cinzas, mas o que a fez estremecer diante da lembrança era o resto de sua indumentária. Vestido de negro da cabeça aos pés, em lugar de cota de malha levava um peitilho de guerra de couro tachonado com peças de metal, perneiras de couro e uma manta envolta de maneira estranha. Justo como o homem que a tinha atacado no ano anterior, aquele rebelde de beleza absurda. Esse homem era um deles. Anna sabia. O
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medo se transformou em pânico. Os conhecia por
suas
extraordinárias
habilidades,
por
combater como demônios possuídos. «OH, Meu Deus, Arthur!» Sua respiração ficou detida na parte alta de seu peito ao ver que o atacante voava até ele com as espadas em alto a cada lado de sua cabeça. O tempo pareceu ir mais devagar. Arthur, ainda ocupando-se de um dos outros dois adversários, não poderia defender-se. Gelou-lhe o coração. O sangue. Arthur ia morrer. Anna abriu a boca para gritar, mas no último momento Arthur golpeou a um dos homens que lhe atacavam com o punho de sua espada e pôde ergue-la a tempo para bloquear as duas folhas antes que lhe cruzasse o pescoço. O assaltante demoníaco e ele se encontraram cara a cara com as espadas engastadas sobre suas cabeças.
O
agressor
tinha
o
impulso
de
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vantagem já que caía das alturas, mas conseguiu repeli-lo fazendo uso de ambas as mãos. Embora Arthur lhe desse as costas, conseguiu distinguir o rosto de sua oponente graças à luz oferecida por um raio de lua. Tinha os olhos mais horripilantes que Anna jamais tivesse visto. Estremeceu. Pareciam brilhar na escuridão. Com essas escuras feições retorcidas pela raiva parecia um diabo recém saído do inferno, Lúcifer em pessoa. Uma difusa lembrança foi a sua memória. Deus santo! Era possível que…? Anna abriu os olhos sem acreditar de tudo. Parecia-se com Lachlan MacRuairi, o marido de sua falecida tia Juliana. Fazia anos que não o via, mas conforme tinha ouvido estava com os rebeldes. Sua tia Juliana, da qual sua irmã tinha recebido o nome, era muito mais jovem que seu pai, quase vinte anos. MacRuairi provavelmente tinha a mesma idade
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que seu irmão Alan. Ao aproximar-se de Arthur a expressão de seu rosto mudou. Não se teria notado se não tivesse observado com tanta atenção. Surpresa? Reconhecimento? O homem que parecia seu tio deu um passo atrás. Ou era imaginações delas? Estava escuro e não era fácil estar segura. Ambos seguiram trocando golpes, mas a intensidade e a ferocidade tinham desaparecido.
Comparado
com
o
anterior,
parecia mais um treinamento que uma batalha em que se empregassem a fundo. Anna olhava através da escuridão tentado compreender o que ocorria. Então, viu pela extremidade do olho que seu irmão tropeçava para trás, com a espada no chão e ambas as mãos sobre a cabeça, cambaleando-se… Anna lançou um grito, incapaz de dominar-se por mais tempo. Teria deslocado em sua ajuda,
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mas Arthur se atrasou até sua posição para lhe impedir o passo. —Fique atrás, maldita seja! Fique atrás! Observou com impotência como o agressor com o que lutava seu irmão erguia a espada para acabar com ele. Seu horripilante grito atravessou a noite como uma adaga. Arthur pareceu vacilar, mas somente por um instante. De alguma forma arrumou para rebater um golpe do homem que se parecia com seu tio e dar meia volta a tempo para bloquear a estocada dirigida contra seu irmão. O braço do atacante, ao não estar preparado para essa defesa, veio-se abaixo e com ele seu corpo, que foi cair justo sobre a espada de Arthur. O homem, surpreso, abriu os olhos antes de fechá-los para sempre. Inclusive no meio desse horrível pesadelo a
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truculenta imagem fora muito para ela. Voltou o olhar entre soluços. Momentos depois, um agudo assobio cerceava o ar da noite. Olhou para o tumulto e se surpreendeu ao ver que os atacantes
se
retiravam.
Ao
que
parecia
MacRuairi, ou um homem que se parecia muito a ele, tinha dado a ordem de retirada. A clareira fora invadida pelos homens de seu irmão. Correu ao encontro do Alan antes inclusive de que o último dos rebeldes saísse da floresta. Tinha conseguido ficar em pé, mas ainda parecia cambalear-se. —Oh, Deus, Alan! Está bem? Inclusive na escuridão advertiu que lhe custava muito enfocar o olhar pela maneira em que a olhava. Sacudiu a cabeça como se pudesse assim dissipar a nebulosa. —Um golpe no cocuruto —disse — Estarei
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bem. Não há por que chorar. —Tomou-a pelo queixo e lhe dirigiu um sorriso carinhoso. Anna assentiu e limpou as lágrimas com o dorso da mão, sem se dar conta sequer de que estava chorando. Voltou de maneira instintiva e o buscou. Arthur estava a poucos metros dela, observando-a. Anna tinha vontade de correr a seu encontro, de deitar-se em seus braços, enterrar a cabeça em seu peito e romper a chorar. Ele se encarregaria de sossegar o horror. Mas seu irmão estava ali mesmo. E o rosto de Arthur se via muito sombrio. —Está ilesa? —perguntou. Anna
assentiu
enquanto
o
examinava,
detendo-se na mandíbula e as bochechas, arroxeadas pelos golpes de seu irmão. —E você? Arthur assentiu também como resposta.
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Alan
permanecia
junto
a
sua
irmã
completamente rígido. Depois caminhou em direção de Arthur, e Anna ficou paralisada temendo o que estava a ponto de fazer. Detevese a poucos passos dele. Ambos os homens ficaram olhando-se no silêncio da escuridão até que ao final Alan disse: —Parece ser que estou em dívida contigo, não uma, a não ser duas vezes. —Arthur ficou impassível e logo encolheu os ombros levemente — Eu não gosto de ver minha irmã zangada — acrescentou Alan. Anna assumiu que aquilo era uma desculpa. —A mim tampouco - disse Arthur. Alan o examinou por um momento e depois assentiu como se tivesse chegado a algum tipo de decisão. —Lutastes bem - disse mudando o tema, mas
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não a intensidade de seu escrutínio. Ao que parecia não era ela quão única tinha advertido a melhora de suas habilidades. —O ardor da batalha - explicou Arthur. Esteve a ponto de mencionar sua mudança de mão, mas algo a deteve. Se seu irmão também percebeu disso, não o desvelou. Mas seguia observando-o com atenção. —Sim, há alguns homens que funciona assim. —Anna não pôde saber pelo tom de sua voz se Alan acreditava realmente a explicação de Arthur.
Ao
ver
que
este
não
respondia,
acrescentou—: Os rebeldes estão mais bem treinados do que pensava. —Não eram rebeldes qualquer, irmão - disse Anna. Ambos a olharam, mas foi Alan quem fez a pergunta.
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—A que te refere? —Acredito que um deles era parte da Guarda fantasma de Bruce, mas pode ser que não fosse o único. Anna explicou a similitude de vestimenta com o homem que dirigia o ataque do ano anterior à igreja. Alan cofiou a barba. —Tem sentido. Acredito que poderia estar certa. —Há mais. Não posso estar segura, mas acredito que reconheci a um deles. O das duas espadas. —O que? —Ambos os homens reagiram. Seu irmão com entusiasmo e Arthur com… algo diferente a isso. —Nosso tio, que era nosso tio. Alan amaldiçoou. —MacRuairi?
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Anna assentiu. O rosto do Alan adotou um gesto severo. —O nosso pai não gostará nada. —Anna não sabia de onde provinha a inimizade de seu pai com o que fosse seu tio político, mas sim que o ódio corria furiosamente por ambas as partes. Alan soltou uma gargalhada — Embora talvez devesse. Que Bruce fique em seu bando com esse filho de cadela oportunista e traiçoeiro. Lachlan MacRuairi somente professa lealdade a si mesmo. Se for esse o tipo de homem que recrutou para sua tropa de fantasmas, não temos nada do que nos preocupar. Arthur permanecia em um estranho silêncio. Anna tinha vontade de lhe perguntar a respeito do ocorrido entre o que acreditava seu tio e ele, mas, do mesmo modo que anteriormente, algo a fez conter-se. Em vez disso perguntou:
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—O que é o que o fez fugir? Seu irmão ficou circunspeto. —Não estou seguro. Tinha a cabeça tonta. Não vi virtualmente nada. —Seus homens fizeram aparição —explicou Arthur — Estavam em minoria numérica. —Não tinha parecido assim, mas estava muito pendente de seu irmão para emprestar atenção ao resto da batalha — Deveriam voltar para acampamento — disse. —Sim —concedeu Alan — Um de meus homens te levará, Anna. Nós temos que nos encarregar de… «Os mortos», completou ela mesma. O horror do ataque, o horror daquilo ao que tinham escapado por pouco, golpeou-a então com toda sua força. As comportas se abriram e emergiram todas as emoções que estivera
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contendo atrás delas, ameaçando transbordando em muitas lágrimas. Voltou-se, advertindo que Arthur se pôs a seu lado. Este, alheio à presença do Alan, esticou o braço para lhe pôr depois da orelha uma mecha de cabelo rebelde. Seus dedos passaram roçando a bochecha e se detiveram ali. A ternura que havia nesse gesto fez que a Anna saltasse em lágrimas. Ergueu o olhar para ele. Advertiu o rosto de preocupação atrás de sua expressão séria. Sua sólida presença,
sua
força
a
desarmavam
completamente. Se tomasse entre seus braços se romperia em pedaços. Arthur, que adivinhava que isso poderia ocorrer, não o fez. —Tudo sairá bem —disse com delicadeza — Faça o que diz seu irmão. —Mas… Cortou seus protestos com uma negação da
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cabeça e expressão firme. Deveu adivinhar que ela tinha perguntas que fazer. —Agora não - disse olhando em direção aos caídos — Depois. Anna manteve os olhos no rosto de Arthur, procurando não seguir a direção de seu olhar. Já havia visto suficiente sangue para o resto de seus
dias.
As
lembranças
dessa
noite
a
perseguiriam. Era uma reação compreensível. Anna era uma mulher e não alguém acostumado ao sangue e ao furor do campo de batalha. Arthur, entretanto, sim estava. Ou ao menos deveria estar. Mas havia algo em sua expressão, na tensão de sua mandíbula, a brancura da boca, a crueldade de seus olhos, que indicava que aquilo lhe afetava profundamente. Anna seguia os passos dos dois homens de seu irmão que a precediam com a suspeita de que ela não seria a
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única a que perseguiriam as lembranças daquela noite. A questão era por que. Arthur não pôde conciliar o sonho. Quase esperava
que
MacRuairi
se
deslizasse
na
escuridão e lhe rachasse a garganta ou cravasse uma adaga nas costas pelo que tinha acontecido. Não seria a primeira vez. Não tinha ganhado o apelido de Víbora unicamente por sua venenosa personalidade, mas também por seu ataque silencioso e mortífero. Entretanto, Arthur não podia culpá-lo. Tal e como tinha feito quase toda a noite, olhava o monte de corpos que tinham deixado apinhados a um lado da clareira, postos ali para que os «atacantes» os recolhessem. Nove homens de Bruce assassinados. Mais da metade pela ponta de sua espada. Equivocou-se. Muito. Em muitos aspectos para poder contá-los.
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Suficiente mal era que seus sentidos tivessem falhado, que não tivesse advertido os sinais do ataque, mas, além disso, parecia ter esquecido de
que
lado
estava.
Levava
tanto
tempo
entrincheirado em campo inimigo que começava a acreditar em suas próprias mentiras. «Cristo.» Fechou os olhos em uma tentativa de aplacar seus pensamentos. Viu-se obrigado a matar a seus próprios homens antes, mas nunca desse modo. Aquilo não era simplesmente defender-se.
Tornou-se
um
louco
fazendo.
Estava tão concentrado em proteger Anna e matar a qualquer que supusera uma ameaça para ela que não tinha reparado em nada mais que isso. Nem sequer se deteve quando percebeu o que ocorria. Tinha salvado a vida do MacDougall
em
troca
de
um
de
seus
compatriotas. Não podia tirar da cabeça o rosto
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que
tinha
posto
MacRuairi
quando
Arthur
atravessou ao homem que estava a ponto de acabar com o MacDougall. Pouco importava que sua intenção não fosse matá-lo. Não teria que ter intervindo. O pranto dilacerador de Anna não era desculpa, ao menos não uma desculpa que importasse para os de sua irmandade. Levantou-se de seu solitário posto junto à árvore quando começaram a vislumbrar os primeiros raios do amanhecer através da floresta. Não acudiriam. Nem MacRuairi, nem tampouco Gordon, MacGregor e MacKay, a menos que tivesse errado ao identificar aos outros três membros dos Guardiões das Highlands quando se batiam em retirada. Tampouco esperava que o fizessem, embora gostasse de ter a oportunidade de explicar-se ante eles. Não se arriscariam de novo a revelar a identidade de Arthur. Para isso
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bastava a si mesmo. Era consciente do perto que estivera de arruinar sua cobertura e de pôr toda sua missão em perigo. Anna, tal e como provavam suas perguntas, era muito observadora, inclusive sendo presa do pânico. E não era a única. Também Alan suspeitava da súbita melhora de suas habilidades como combatente e de quão rápido tinham fugido os atacantes. No momento os tinha contentado, mas sabia que ela tinha mais pergunta e não se atrevia tão sequer a pensar o que mais teria advertido. Reconhecer ao MacRuairi já era mal por si só, mas relacioná-lo com os Guardiões das Highlands era um completo desastre. Manter suas identidades em segredo não era só um aplique à mística e ao medo que rodeavam a aquela guarda «fantasma», mas sim também
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ajudava a mantê-los a salvo. Se seus inimigos tinham conhecimento de suas identidades, além de pôr preço a suas cabeças, temia a segurança de suas famílias. Essa era a razão pela que tinham decidido usar nomes de guerra quando estavam em uma missão. Quando Bruce se inteirasse de que tinham desmascarado
ao
MacRuairi,
teria
graves
conseqüências. Não teria que ter ocorrido, maldita seja. A raiva e a culpa invadiam seu interior sem piedade. Arthur teria pressentido o ataque se não tivesse tão envolto com Anna e deixar-se dominar pela emoção. Aqueles homens não estariam mortos e tampouco teria posto a ela em perigo. Deus, poderiam tê-la matado. E tudo por não ser capaz de controlar suas emoções e implicar-se muito. Voltou para acampamento justo no momento
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em que começavam a despertar os homens que não estavam de guarda. Olhou para a tenda de Anna e viu que as portinholas forradas de linho permaneciam fechadas. «Bem. Que durma.» Merecia. Tinha ido vê-la com freqüência no transcurso da noite para assegurar-se de que estava bem. Sabia o muito que a tinha afetado o ataque,
mas
combatia
com
seus
próprios
demônios, de modo que por mais que fosse ele quem devia fazer, não estava em condições de consolá-la. Não obstante, uma vez que teve retornado de encarregar-se dos cavalos, viu a portinhola aberta. Ao inspecionar o acampamento e não encontrá-la ficou circunspeto. Mas pouco depois teve oportunidade de espiá-la enquanto falava com seu irmão, que estava ocupado com alguns de seus homens. A exasperação que refletia seu semblante era tão corrente que
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suspirou aliviado, até sem querer reconhecer quanto se preocupou. Quando
seu
olhar
reparou
nele,
Anna
titubeou, mas em seguida começou a avançar pelo terreno semeado de musgo e folhas em sua direção. Arthur percebeu de que levava um pedaço de pano nas mãos. Deteve-se frente a ele, inclinando seu pálido rosto para olhá-lo. Arthur sentiu uma angústia no peito. Ao que parecia, o sono também fora esquivo. —Já que a regra que pusestes e meu irmão está ocupado, terá que me acompanhar. Arthur a olhou de modo inquisitivo. —Não
me
fizeram
prometer
que
não
abandonaria o campo sem sua companhia ou a de meu irmão? Franziu o cenho até converter-se no primeiro sorriso que tinham parecido em anos.
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—Sim. —Preciso ir ao córrego me lavar. O córrego ficava perfeitamente à vista do acampamento, mas Arthur não discutiu ao conscientizar de quanto a teria afetado o ataque. Fez uma reverência zombadora com um gesto exagerado da mão. —Depois de ti. Anna não parecia ter muita vontade de falar, algo que vinha a calhar. Esperou junto a uma árvore, fazendo como que não olhava, enquanto ela se encarregava de suas abluções matinais. Depois de arrumar o cabelo com um pente úmido e lavar os dentes com pós de um frasco que esfregou sobre um pequeno pedaço de tecido branco, mergulhou outro trapo branco na água. Tinha levado com ela uma pastilha de sabão, a qual esfregou sobre o tecido para depois
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proceder a lavar o rosto, o colo, as mãos e os braços. Era uma das imagens mais sensuais que jamais tivesse presenciado. Quando meteu o trapo entre os seios já não pôde mais. Voltou-se, furioso por que um pouco tão mundano pudesse o excitar. Mas com esse sol caindo entre as árvores, que se refletia em seus cabelos dourados e os regatos de água que se derramavam em cascata por seu rosto e seu colo a via formosa, doce e verdadeiramente cativante. Um raio de luz na escuridão. E tudo que Arthur podia pensar era o perto que estivera do céu e a vontade insensata que tinha de tocá-la de novo. Deus, é que não tinha aprendido nada do ocorrido na noite anterior? Concentrou-se no que lhes rodeava com uma intensidade quase exagerada, aguçando seus sentidos para algo que se saísse do ordinário. Entretanto voltou o
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olhar atrás. Anna tinha terminado e caminhava para ele com o sol a contraluz pelas costas. Arthur teve que conter a respiração. Mas isso não evitou que o apanhasse o subjugador aroma de sua doce e feminina fragrância: pele recém lavada com um toque de pétalas de rosa. —O que acontece? —perguntou Anna. —Nada - disse com tensão. —Parece como se lhe doesse algo - disse olhando-o nos olhos — Lhe dói o rosto? — perguntou tomando o arroxeado queixo na mão. Cada um dos músculos de Arthur ficou em guarda ante o contato — Quebrou algo o idiota de meu irmão? —Jesus, que mãos mais suaves. Seus dedos aveludados acariciavam o duro contorno da tensa mandíbula de Arthur — Olhem quantos
hematomas.
Isso
deve
doer
—
acrescentou, levando o dedo até sua boca —
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Têm o lábio partido. Sim, doía. Aquele gesto de sensualidade inocente fazia correr o sangue até a virilha de Arthur e a incendiava de calor. Teve que obrigarse a não lhe chupar o dedo. Não tinha nem idéia do que estava fazendo. Nem do que estava custando resistir a tocá-la. Anna o olhou com uma preocupação que se refletia em seus olhos. —Dói muito? —O rosto não. —Arthur lhe dirigiu um olhar lascivo que dizia exatamente onde estava a origem de sua dor. Parecia que fosse estalar. As bochechas de Anna se ruborizaram levemente. Se por acaso aquilo não fosse suficiente, começou a mordiscar esse suave lábio inferior que tinha. —Oh, não me dava conta de que…
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—Deveríamos voltar. Seu irmão queria sair cedo. Anna assentiu e Arthur teve a impressão de que lhe dava um calafrio. —Não me entristecerá partir daqui. Arthur não pôde conter-se. Tomou pelo queixo e cravou o olhar em seus grandes olhos azuis. —Está bem? Anna tentou sorrir, mas lhe tremeu a boca. —Não, mas arrumarei isso. Arthur lhe soltou o queixo e sua boca adotou um gesto severo. —O que ocorreu a noite passada não voltará a repetir-se. Os delicados arcos das sobrancelhas de Anna se franziram. —Como pode estar tão seguro?
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—Porque não permitirei. Anna o examinou com o olhar e abriu os olhos de repente ao compreendê-lo. —Por Deus bendito, por isso está zangado. Culpa-se do ocorrido. Mas isso é ridículo. Jamais poderia ter sabido que… —Sim, sim deveria saber. Se não tivesse tão distraído, não teria ocorrido. —Então a culpa é minha? —É obvio que não. —Não é perfeito, Arthur. Sois humano. Comete enganos. —Ele não respondeu. Tinha a mandíbula tão apertada que lhe doíam os dentes - é o que pensa? —perguntou Anna com ternura — Não falharam seus sentidos alguma vez antes? «Uma vez», pensou Arthur, afastando a lembrança de sua memória.
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—Temos que retornar. Começou a afastar-se dela, mas Anna o agarrou pelo braço para detê-lo. —Não ides contar isso? —Não há nada que contar. —Tem algo que ver com seu pai? —ficou olhando-a, aniquilado. Como demônios tinha chegado a suspeitar? Anna advertiu sua surpresa — Quando falou de sua morte, deu-me a sensação de que não contava tudo. Não tinha contado nem a metade do que aconteceu. Como por exemplo a participação do pai de Anna na tergiversação dos fatos. Anna esperava uma resposta. Ele não era muito dado a falar sobre seu passado, mas a expressão do rosto dela disse que aquilo lhe parecia algo muito importante. —Não há muito que contar. Tratava-se de
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minha primeira batalha. Meu pai me levou com eles para me pôr a prova. Estava tão preocupado por lhe impressionar que não detectei os sinais do ataque. —Mas isso não era a pior parte, pensou Arthur — Vi como morria. O rosto de Anna se encheu de comiseração. —Deus, sinto muito. Deve ter sido horrível. Mas não era mais que um menino. Não podia fazer nada para ajudar. —Teria que o ter avisado. —Se não estivesse tão afetado, tão assustado, teria visto os sinais, refletiu Arthur. Então, igual à noite anterior, a emoção se havia interposto em seu caminho — Estava distraído. Mal teve tempo de franzir o sobrecenho antes que
os
olhos
de
Anna
se
iluminassem
repentinamente de compreensão. —Amava-o.
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Arthur encolheu os ombros, incomodado com o tema. —Isso não serve de muito. —Inclusive Aquiles tinha um ponto débil, Arthur. —Ele a olhou com cara de estar admirado. Do que estava falando? — É difícil manter-se afastado e à expectativa com as pessoas às que alguém quer —disse Anna lhe oferecendo um sorriso de simpatia — Não podem te culpar por amar às pessoas. —Mas fazia. Do que servia suas tão apregoadas habilidades se não podia proteger a aqueles que amava? — Obrigado por me contar isso — Por que voltava a sentir que a tinha deixado ver muito de si? —Não
desejava
que
te
preocupasse
pensando em outro ataque surpresa. —Não me preocupo —disse Anna — Confio
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em você. Arthur sentiu uns ardores no peito que o consumiam por dentro. Queria a advertir que não fizesse, lhe dizer que não merecia, que o único que faria seria a machucar, que ela dava seu coração com muita facilidade, com os olhos fechados. Mas em vez disso assentiu e puseram rumo para o acampamento. Arthur subiu a costa com ela, e quando estiveram nas imediações, Anna o olhou de soslaio. —Pareceu como se meu tio o reconhecesse. A observação o colheu com a guarda completamente baixa. Algo para o qual parecia ter um talento especial. Arthur deu um passo um tanto vacilante. Não muito, mas temia que se desse conta. —Está segura de que era seu tio? Não via bem. Eu estava muito mais perto e não pude
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reconhecer aquele rosto oculta depois do nasal. Anna
enrugou
o
nariz,
um
movimento
adorável que chocava profundamente com a ameaça que representava para ele. —Faz alguns anos que não o vejo, mas estou bastante segura de que era ele. Seus olhos são inesquecíveis — disse com um calafrio. Se tentava distrair de sua pergunta, não ia funcionar — Mas pareceu o reconhecer. —Ah, sim? —disse Arthur encolhendo os ombros — Pode ser que nos tenhamos cruzado alguma vez. Ela ficou um momento sem dizer uma palavra, mas infelizmente não pensava deixar o assunto correr. —Então não o conhece? Arthur lutou contra a ativação instintiva de seus alarmes.
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—Pessoalmente não. —Parecia aborrecido de lhe ver. O rápido pulsar do pulso de Arthur contradizia sua calma exterior. Era perigosamente perceptiva e andava muito perto da verdade. —Aborrecido?
Por
isso
sei,
Lachlan
MacRuairi é um filho de…—disse, detendo-se ao recordar
quem tinha por audiência — É um
homem perverso com um caráter de cão. Provavelmente estava furioso por que matasse a tantos de seus homens. Anna pareceu aceitar a explicação. Mas a seguinte pergunta lhe deixou claro que ainda não estava satisfeita. —Por que se retiraram? Arthur amaldiçoou para si. As vozes de alarme se acendiam com mais força. —Como já vos disse, os homens de seu
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irmão chegaram até nós. Estavam em minoria. Ficou circunspeta. —Não me pareceu isso. Parecia que estavam ganhando. Arthur se obrigou a forçar um sorriso irônico. —Seu irmão estava em perigo —lhe recordou — Eu diria que estava distraída. Anna ergueu o olhar para olhá-lo e lhe dedicou um meio sorriso. —Pode ser que tenham razão. Estava concentrada em meu irmão. Ainda tenho que lhes agradecer o que fizeram. —Uma sombra sulcou seu rosto — Se não tivessem detido a esse homem… —Não pensem mais nisso, Anna. Já passou. Assentiu e voltou a olhar de relance. —De todos os modos, agradeço-lhe. E também Alan o faz, apesar de que tenha uma
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estranha forma de demonstrá-lo. MacDougall não ocultava seu interesse por eles. Arthur sentiu o peso de seu olhar durante todo o tempo. Ao encontrar-se com seus olhos, soube que a discussão a respeito do ocorrido no dia anterior ainda não tinha acabado. —Tem direito a estar furioso, Anna. O que fiz esteve mau. Tudo que posso fazer é prometer que jamais voltará a acontecer. A maneira em que sua respiração ficou sobressaltada foi como uma punhalada no peito. Parecia emocionada. Desconcertada. Como se esperasse algo diferente. —Mas… —Aguardam-nos — disse Arthur, e assinalou ao moço que preparava seus cavalos para que não seguisse falando. Não poderia suportar outra conversa como a do dia anterior — É hora de
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partir. Essas palavras fossem dirigidas tanto a ela como a si mesmo. Ponto cego. Ponto débil. Não importa
como
o
tivesse
chamado.
Seus
sentimentos no que respeitava a Anna se converteram em um lastro. Tinha permitido que ela se aproximasse muito, e sua missão e sua coberta pendiam de um fio. A conta atrás tinha começado. Capítulo 18 Dois dias sem acontecimentos depois, Anna atravessava
as
portas
do
castelo
de
Dunstaffnage ao lombo de seu cavalo. Um dos guardiães se adiantou, de modo que lhes esperavam. Pelo semblante de ira mal contida de seu pai advertiu que estava a par do fracasso de
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sua viagem. Anna sonhava desfrutando de uma noite de sonho reparador antes de confrontar as perguntas de seu senhor, mas sua tardia chegada não serve para atrasar o relatório. Alan e ela quase não tiveram tempo de lavar as mãos e fazer uma frugal refeição leve antes que os apresentassem nas dependências do senhor do castelo. John de Lorn permanecia de pé em meio da sala, com as mãos à costas e os membros importantes de seu meinie atrás dele e ambos os lados.
A
expressão
de
duelo
que
todos
compartilhavam sem exceção fez pensar a Anna que entrava em um túmulo funerário. Dado que nenhum deles tomou assento, ela e Alan tiveram que suportar o desconforto de estar de pé. Suas sensações não distavam muito das do menino ao que chamam para que responda de uma
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travessura atroz com resultados nefastos. Apenas teve fechado a porta quando seu pai começou a falar. A atacar, em realidade. —Ross rechaçou a oferta. Não se tratava de uma pergunta. Ao notar o tom de acusação de sua voz, Anna teve vontade de explicar-se, mas não tocava a ela fazer. Alan respondeu por ambos. —Sim. A resposta do Ross a uma aliança foi quão mesma na ocasião anterior. Disse que Bruce partiria também contra ele e que não podia prescindir de nenhum de seus homens. —Mas que passou com o compromisso? Não lhe fez mudar de idéia? Anna sentiu o peso dos olhares de todos os homens
sobre
ela
e
suas
bochechas
se
ruborizaram. Mantinha o olhar baixo para que seu pai
não
visse
quão
envergonhada
estava.
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Independentemente de que supusera alguma mudança ou não, tinha fracassado na tarefa que lhe tinha encomendado. —Não há compromisso —explicou Alan — Estiveram de acordo em que não encaixam um com o outro. Anna desejava que ninguém mais detectasse como Alan acabava de medir suas palavras. —Quer dizer que não te perdoou por rechaçálo na primeira vez? —perguntou o pai a Anna diretamente. Ela se aventurou a olhá-lo e a contemplar seu rosto de raiva. O coração lhe encolheu. Não era bom para ele que se zangasse tanto. Quis lhe dizer algo a esse respeito, mas sabia que se lhe tratasse como a um inválido ante seus homens, ficaria mais furioso ainda. Não sabia o que dizer. Não queria mentir, mas tampouco podia contar
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toda a verdade. —Eu… — disse, tropeçando com suas próprias palavras. —Bem — repôs seu pai com impaciência—, acreditava que foste o persuadir. As bochechas ardiam da vergonha. —Tentei, mas temo que ele… percebeu que meus sentimentos estavam comprometidos com outra causa. —O que quer dizer isso de «comprometidos com outra causa»? —Seu pai entreabriu os olhos, que a atravessavam como flechas. Sabia que havia algo que não lhe estava contando — Campbell —disse impassível em resposta a sua própria pergunta. Amaldiçoou para si com um olhar implacável — E como poderia perceber isso? O que fez? Jamais tinha visto seu pai tão furioso com ela.
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Era a primeira vez que sua raiva a atemorizava. Que o merecesse não era algo que aplacasse seus devastadores efeitos. O que poderia ter dito? Felizmente, Alan teve piedade dela. —O compromisso não teria mudado nada. Ross já tinha seus planos feitos. Temo que ainda não ouvistes a pior parte. —Anna temia o pior em relação à reação de seu pai. Tinha medo de que aquilo o levasse a um novo ataque de apoplexia. Ao que parecia, Alan decidiu que era melhor não dosar a verdade, a não ser soltar a de uma só e desagradável vez — Ross está pensando em render-se. Seu pai não disse uma palavra. Mas Anna contemplava como sua fúria crescia como uma crista de espuma no horizonte que se dirigisse para a costa a toda velocidade até converter-se em uma temível onda que ameaçava rompendo.
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John de Lorn apertava os punhos com força, seu rosto estava vermelho como um tomate, as veias lhe palpitavam nas sobrancelhas e seus olhos ardiam como se fossem as portas do inferno. Anna deu um passo em sua direção, mas Alan a deteve com uma mão e negou com a cabeça em sinal de advertência. Quando seu pai acabou por bem pronunciarse foi para proferir uma enxurrada de insultos que teriam posto a sua mãe de joelhos durante semanas inteiras em penitencia por sua alma blasfema. Perambulou, iracundo pela pequena câmara como um leão enjaulado. Inclusive seus homens lhe deixaram espaço suficiente para que desse rédea solta a sua irritação. —Ross é um tolo do demônio! —explorou com fúria — Bruce jamais lhe perdoará o que fez às mulheres. Pelo amor de Deus! Pendurou em
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jaulas a sua irmã e à condessa. Se se render, estará
assinando
sua
própria
ordem
de
execução. —Deteve suas palavras o justo para dar um murro sobre a mesa — Como pode pensar em prostrar-se ante esse assassino traiçoeiro? Cortou a meu parente em pedaços diante de um altar. Anna não se atreveu a assinalar que a santidade da igreja não era algo que parecesse importar muito ao Ross. Depois de tudo, ele mesmo violou o santuário para capturar às mulheres de Bruce. —O povo está com Bruce —disse Alan para acalmar a seu pai — despertou um ardor patriótico no campo que não se via desde Wallace. Acreditam que é um salvador, o segundo advento do rei Artur, que os liberou do jugo da tirania inglesa. Ross pensa em sua gente
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e no futuro de seu clã. Pensa no que é melhor para a Escócia. Anna tentou ocultar sua surpresa. Felizmente seu pai estava muito furioso para ouvir o que Alan havia dito realmente. Mas embora seu pai não o tivesse feito, ela sim tinha ouvido o tom de reprimenda na voz de seu irmão. Pensaria Alan igual a Ross? Acreditava também ele que Bruce era a melhor opção para Escócia? Por Deus bendito,
o
que
aconteceria
seu
pai
se
equivocava? Anna não podia acreditar que fosse ela quem albergasse esse pensamento desleal. Mas os MacDougall, em seus dias ferventes patriotas, tinham dado seu apoio aos ingleses para não ver Bruce sentar-se no trono. Era isso o melhor para Escócia? —Morrerei antes de ver esse assassino no
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trono — disse seu pai, consumida já a raiva de seus olhos, frios como o gelo. Anna sentiu certo alívio para ouvir os murmúrios unânimes de seus homens que concordavam vigorosamente com essa idéia. Seu pai sabia o que fazia. Era um dos homens mais poderosos de Escócia. Tinha suas falhas, claro, que grande homem não os tinha? Mas ele faria que superassem aquilo. Uma vez informado sobre a parte mais importante da viagem, Alan procedeu a lhe contar a seu pai o resto, dando conta brevemente do problema acontecido pelo caminho. Seu pai escutava,
cada
vez
mais
preocupado,
empalidecendo visivelmente para ouvir como seu herdeiro escapava por pouco à morte, duas vezes. Entreabriu os olhos enviesadamente quando Alan o informou das suspeitas de Anna a
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respeito da implicação do MacRuairi e depois transbordou de emoção ao conscientizar-se da conexão que tinha com a guarda fantasma de Bruce. —Bom trabalho — disse a Anna, quem sorriu radiantemente pela adulação. Alan deu a versão de Arthur de sua retirada, mas seu pai também pareceu ter problemas em compreendê-lo. Ao final, adiantou-se e a agarrou da mão. —Não sofreste nenhum dano, filha? Anna negou com a cabeça e ele a acolheu entre
seus
grandes
e
robustos
braços,
esquecendo aparentemente sua ira. Por um momento, Anna voltou a sentir-se como uma menina e a necessidade de chorar todas suas penas sobre sua túnica de finos bordados se apoderou dela. Arthur seguia inimizado com ela.
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O ataque não tinha mudado nada. Por acaso o tinha piorado. Tinha a esperança de que depois de seu bate-papo ele tivesse mudado de parecer. Arthur sentia algo por ela, mas havia um motivo que o fazia conter-se. Esses dois dias de caminho
não
perspectivas.
lhe
Anna
tinham não
podia
dado
novas
livrar-se
da
sensação de que havia algo estranho no ataque. E tampouco podia tirar da cabeça a inquietação que lhe provocava suspeitar que ele ocultava algo. Seu pai se voltou para trás para olhá-la. —Está cansada. Já ouvirei o resto da história pela manhã. Assentiu, aliviada de que o pior já tivesse passado. Ao menos isso é o que pensava. —E, Alan — disse John de Lorn a seu filho—, faz que Campbell e seu irmão se reúnam
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conosco.
Parece
que
sir
Arthur
tem
que
responder por muitas coisas — acrescentou dirigindo um olhar a Anna que a fez estremecer da cabeça aos pés. Arthur estava preparado para a citação quando esta chegou. Não esperava, entretanto, que se incluísse nela a seu irmão. —Que diabos tem feito? —perguntou Dugald com suspeita à medida que atravessavam o barmkin em direção à torre da comemoração — por que tem Lorn tanta vontade de ver-te? Arthur e seu irmão subiram a escada compassando sua marcha com o tinido de seus peitilhos e suas armas. —Suponho que tem perguntas que fazer em relação aos homens que nos atacaram. —E o que sabe você deles? —Nada — disse Arthur ao mesmo tempo que
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abria a enorme porta de madeira que dava entrada à torre. —O que tenho eu que ver em tudo isto? Arthur olhou ao Dugald. A expressão de seu irmão era um reflexo da impaciência que ambos sentiam. Ao Dugald gostava tão pouco como a ele que o chamassem a presença de Lorn. Apesar de que seu irmão e ele lutassem em diferentes lados da guerra, ainda podiam coincidir em seu ódio para o John de Lorn. —Que me crucifiquem se sei — disse Arthur incomodado por essa incerteza. Um guarda bateu na porta para anunciar sua chegada. Quando
lhes
acrescentou—:
fizeram Mas
passar,
estamos
a
voltou-se
e
ponto
de
averiguá-lo. Examinou com rapidez aos ocupantes da sala: Lorn, sentado como um rei em uma poltrona
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que melhor parecia um trono com uma expressão impossível de discernir; Alan MacDougall de pé junto ao muro, com cara de não saber muito bem o que ocorria; e Anna sentada em um banco em frente
ao
fogo
com
aspecto
de
estar
extremamente inquieta. À exceção do único guarda que os tinha admitido para deixá-los depois às ordens de Lorn, não havia nenhum outro membro presente de seu meinie. Tratasse do que se tratasse, era um assunto pessoal. A pontada de inquietação que Arthur sentia se converteu em uma punhalada em toda regra. Lorn, imperioso filho de cadela, não os convidou
a
sentar-se,
de
modo
que
permaneceram de pé frente a ele. O ódio cego que atendia a alma de Arthur cada vez que se encontrava rosto o rosto com o homem que tinha assassinado seu pai não diminuía. Contraiu suas
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feições de modo que não revelassem emoção alguma, mas o fogo que queimava seu peito e a necessidade de afundar uma adaga no negro coração de Lorn eram algo mais difícil de reprimir. —Desejava nos ver, milorde — disse Dugald com um tom que não mostrava deferência alguma. Lorn tomou seu tempo em deixar a pluma a um lado e logo se recostou na poltrona para olhálos. Tamborilou com os dedos sobre a mesa. Quando respondeu, não foi ao Dugald, a não ser a Arthur: —Ouvi que tiveram uma viagem cheia de peripécias. Algo no tom de sua voz fez que soassem os sinos de alarme no mais profundo da cabeça de Arthur. Teve que controlar-se para não olhar a
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Anna. O que lhe teria contado? —Sim —disse — Tivemos a sorte de escapar à primeira orda de velhacos, mas não à segunda. Fizemo-nos fugir bem a tempo. Lorn o escrutinou com tal parada que lhe puseram todos os nervos de ponta. —Isso eu ouvi. Meu filho não teve mais que louvores para suas habilidades na batalha. Conforme afirma, jamais viu nada igual. —Dugald se voltou bruscamente para Arthur com o rosto circunspeta — Tenho que admitir que me surpreendeu ouvir a descrição do enfrentamento —acrescentou Lorn com um sorriso. Mas seu olhar não tinha nada de divertido. Era frio e calculador — Me pergunto por que jamais antes tínhamos visto isso em você. Lorn desviou seu olhar para o Dugald, avaliando sua reação. Infelizmente, a expressão
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do irmão de Arthur não fez a não ser admirar mais. —Sir Alan é mais que generoso com suas adulações, meu senhor. Alan deu um passo à frente, em claro desacordo com a forma de perguntar de seu pai. —Sir Arthur foi chave na hora de derrotar aos rebeldes, pai, e ao salvar minha vida. Temos uma dívida de gratidão com ele. —Sim, é obvio —disse Lorn — Estou muito agradecido. Mas me pergunto… — Fez uma pausa e tamborilou com um dedo sobre a mesa — pergunto-me se poderiam jogar um pouco de luz sobre o resto do ataque. —É obvio — disse Arthur. Mas não gostava absolutamente dos roteiros que tomava aquele assunto. Lorn era um filho de cadela arrevesado. Gostava de ter aos o rodeavam em um punho.
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Acaso suspeitava algo? Quem podia saber. —Minha filha acredita ter identificado a quem fosse meu irmão político, Lachlan MacRuairi, como um desses rufiões, e também pensa que pode ser um dos guerreiros secretos dos que tanto ouvimos falar. —Cruzei-me com esse homem uma ou duas vezes, mas não o conheço tão bem para afirmar nenhuma coisa nem a outra. Se lady Anna tiver dúvidas, temo que eu não posso ajudar a resolver. Arthur caminhava pela corda frouxa. Uma negação terminante poderia chamar suspeita, mas queria manter a semente da dúvida plantada na mente de Lorn, cujos traços se endureceram, fazendo patente o ódio que professava pelo que fosse seu cunhado. —MacRuairi é uma serpente traiçoeira, um
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assassino desumano que venderia a sua mãe por uma peça de prata, mas há uma coisa que jamais faria, e é se dar por vencido. Jamais o vi retirarse em uma batalha. Bàs roimh Gèill. «Morrer antes que renderse» formava parte do credo dos Guardiões das Highlands, mas parecia funesto que essa frase desse ao Lorn algo no que fincar o dente. A corda frouxa pela que Arthur caminhava-se fazia mais instável por momentos. Deu de ombros sem comprometer-se. —Então é possível que não fosse ele? Lorn voltou a dirigir o olhar a sua filha, quem o olhou nos olhos antes de responder: —Não posso estar segura, pai. Estava muito escuro. Somente percebi seu rosto com claridade por um instante… e fazia anos que não o via. Arthur sentiu uma opressão no peito. Tentava
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protegê-lo. Teria notado Lorn também disso? —Havia algo que quisessem de mim, meu senhor? —perguntou Dugald cada vez mais impaciente. Em outras palavras: que demônios fazia ele ali? Uma pergunta que também interessava Arthur. —Estou chegando a esse ponto. Lorn voltou a tamborilar sobre a mesa, e Arthur começou a imaginar-se que agarrava sua maça de guerra e punha fim a essa aporrinhação de uma vez por todas. —Não estou seguro de que firmaram tanto do propósito que tinha a viagem ao norte para ver o Ross — disse ao Dugald — Era pra retomar as conversações para o compromisso de matrimônio entre minha filha e sir Hugh Ross, com a esperança de que uma aliança entre nós
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animaria ao conde a enviar tropas de apoio na guerra contra Bruce. Infelizmente, as coisas não fossem como tínhamos planejado. Dugald fulminou de relance
Arthur com o
olhar. —Ah, não? —Não. —O olhar de Lorn voltou a recair sobre ele — Ao que parecia, sir Hugh percebeu que
os
afetos
de
minha
filha
estavam
comprometidos com outra causa. Sabes algo disso, sir Arthur? Arthur viu pela extremidade do olho como Anna empalidecia e apertava as mãos com força sobre seu regaço. Que diabos havia dito? Os dentes lhe chiavam. Sentia-se esquecido no aposento e sem espaço para mover-se. —Sim. —Pensei que talvez fosse assim —disse
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Lorn. O brilho de raiva de seu olhar disse a Arthur que
provavelmente
adivinhava
parte
do
acontecido. Esperou tensos, preparando-se para o pior. O nó cada vez se apertava mais. Lorn se voltou para o Dugald. As razões pelas quais seu irmão estava ali tinham ficado claras — Diante dos dados e
recentes acontecimentos, eu
gostaria de propor uma aliança diferente. Uma que faria mais sólidos os laços entre nossas famílias e mostraria minha gratidão para sir Arthur pelo serviço que tem feito a meu filho, assim como também asseguraria a felicidade de minha filha. —Cada um dos músculos do corpo de Arthur ficou tensos enquanto esperava o que estava por chegar. Perguntava-se se ela teria algo ver com isso, mas os olhos de Anna não mostravam mais que surpresa quando seu pai disse—: Eu gostaria de propor um compromisso
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de bodas entre sir Arthur e minha filha. Dugald soltou uma gargalhada. —Um compromisso? A boca de Lorn adotou um gesto severo. —Acredito que isso é o que disse. Podemos falar sobre os detalhes mais tarde, mas tenham por seguro que o dote de minha filha é mais que generoso. Inclui certo castelo que acredito pode ser de interesse para ti. Tanto Arthur como seu irmão ficaram de pedra. Foi Dugald quem acabou por perguntar: —Innis Chonnel? Um sorriso retorcido se desenhou na boca de Lorn. —Sim. Arthur não podia acreditar. A fortaleza dos Campbell
do
lago
Awe
que
tinham
sido
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arrebatado a seu clã fazia anos, devolvida por casar-se com a mulher que queria mais que a tudo no mundo. Um autêntico pacto com o diabo. Por um momento, ficou duvidando, muito mais tentado do que gostaria de admitir. Mudar de bando era algo habitual naquela guerra. Mas ele não podia fazer. Inclusive no caso de que condescendesse a aliar-se com o homem que tinha assassinado a seu pai, havia muitas pessoas que contava com ele: Neil, o rei Robert, MacLeod e o resto dos membros dos Guardiões das Highlands. E tampouco podia ignorar sua própria consciência. Acreditava no que estavam fazendo. A devolução do castelo dos Campbell, embora fosse ao irmão mais novo, bastou para convencer ao Dugald, que se voltou para Arthur. —Eu não tenho objeção. Arthur?
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Todos os olhos se voltaram para ele, mas somente era consciente de dois pares: os de Anna, que lhe observavam com o coração neles, e os de Lorn, que o contemplavam com a suspeita refletida. Até no caso de que não tivesse intenção de levar a cabo, Arthur sabia que devia aceitá-lo para dissipar todo receio. Aquele compromisso era uma prova de lealdade. Tratava-se tanto de assegurar a felicidade de Anna como de provar sua aliança. Sua consciência liberava uma batalha com sua noção do dever, mas não durou muito. Não tinha outra opção. As espadas estavam em alto. Não podia pensar em quanto o odiaria Anna quando averiguasse a verdade. —Será uma honra tomar lady Anna como esposa. Talvez o pior fosse que, em realidade, dizia a
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sério.
Capítulo 19 Anna tinha tudo o que queria. Por que se sentia então tão miserável? Tinha passado uma semana desde dia em que seu pai anunciasse por surpresa o compromisso em sua câmara. Uma vez reposta da comoção, casar-se com o homem que amava… era algo que a deixava em um estado de euforia. Nada poderia fazê-la mais feliz. Exceto, talvez, a notícia de que Bruce decidisse que a coroa não lhe pertencia e desaparecesse nas ilhas Ocidentais como tinha feito anteriormente. Mas faltava muito ainda para
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que se cumprisse esse sonho. Enquanto ela estava mais que entusiasmada, Arthur dava a impressão de ter que suportar uma pesada carga. Desde aquele dia se comportava com uma correção irrepreensível, cortês durante as refeições e também nas poucas ocasiões em que se cruzavam os caminhos de ambos. Inclusive permitia que Escudeiro o seguisse em qualquer parte sem queixar-se. A simples vista era o perfeito prometido, mas esse era o problema, que somente era a simples vista. Sua formalidade, esse distanciamento progressivo, reduzia sua felicidade ao mínimo. Cada vez que dizia: «Tivestes bom dia hoje, lady Anna?» ou: «Gostaria de outra taça de vinho, lady Anna?», provocava uma ferida diminuta em seu coração. Não podia entendê-lo. Segundo ele mesmo admitia, lhe importava. Então por que não se
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dava conta de que aquilo seria perfeito para ambos? À medida que passavam os dias custava mais convencer-se de que isso era o que ele queria. Afastava-se dela por muitos momentos. Algo lhe pesava. Estava uma semana mais perto do final da trégua, já que os idos de março se aproximavam com presteza, mas sua crescente ansiedade se deixava ver em todo momento e não parecia que fosse por causa da batalha em floração. Gostaria que confiasse nela, mas rechaçava qualquer intento de diálogo, embora tampouco contavam com muitas oportunidades. Além dos breves intercâmbios das refeições, a única vez que tinha procurado sua companhia fosse poucos dias atrás, quando insistiu em acompanhá-la ao priorado do Ardchattan. Não esperava nenhuma missiva, assim não tinha
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nada que lhe ocultar. Talvez seu pai não pusesse já objeção alguma a que contasse a Arthur qual era seu papel na transmissão das mensagens. O compromisso parecia eliminar todas as suspeitas que ficassem em relação aos Campbell. À medida que se aproximava a guerra e que se intensificavam as preparações para a batalha, os Campbell passavam mais tempo junto a John de Lorn e de Alan, algo que Anna queria identificar como um sinal do degelo dessa geleira que significavam as velhas rixas. Suspirou e passeou o olhar ao redor do aposento, enquanto sua criada terminava de lhe arrumar o cabelo. Era o sexto dia de agosto, um dia mais perto do fim da trégua. Ao olhar pela janela de sua câmara na torre viu um birlinn deitando a baía, o maior porto de ancoragem do castelo. Era um acontecimento habitual, algo que
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não teria chamado sua atenção a não ser pela rapidez a que se deslocava. O reluzente navio de madeira mal tinha chegado à borda quando seus ocupantes saltaram pela amurada e correram para as portas da fortaleza. O coração lhe deu um tombo, consciente de que algo estava passando. Sem incomodar em por o véu, baixou a escada da torre correndo e se apresentou no pátio de armas ao mesmo tempo que seu pai recebia ao contingente de homens do birlinn: os MacNab. —Que novas trazem? —perguntou seu pai. O
rosto
do
capitão
dos
MacNab
era
desolador. —O rei Hood, milorde. Está a caminho. Anna ficou sem fôlego, seu sangue congelado pelo medo. Chegava o momento, o dia que tanto tinha temido e desejado ao mesmo tempo. A
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batalha que poderia significar o fim da guerra. O castelo era um tumulto. Os guerreiros, agrupados, pareciam comovidos pela excitação, ansiosos pela oportunidade de destruir ao inimigo. Não obstante, as poucas mulheres que rondavam por ali tinham umas reações muito diferentes: preocupação e medo, exatamente o mesmo que sentia Anna. Seu olhar procurou Arthur
de
maneira
instintiva.
Também
lhe
afetavam as notícias. Observava-a com uma intensidade ardente que não via nele desde o ataque da floresta. Ficaram-se olhando uns instantes até que Arthur voltou o olhar para os MacNab. O pai de Anna fez passar aos recém chegados ao grande salão. Anna os seguiu, ansiosa
por
saber
tanto
como
pudesse.
Infelizmente, os MacNab não tinham muita mais
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informação. Um de seus rastreadores lhes alertou de que Bruce tinha saído do castelo do conde de Garioch em Inverurie com tropas de ao menos três mil homens e se dirigia para o oeste. Três mil homens contra os oitocentos de seu pai! Não obstante, não sabiam se tinham intenção de dirigir-se primeiro ao Ross ou ao Lorn. Bruce não perdia tempo. Estaria preparado para atacar assim que expirasse a trégua. Por Deus
bendito,
aqueles
bárbaros
estariam
chamando a suas portas para a semana próxima. Sua mãe e suas irmãs se apressaram a baixar ao salão para ouvir a comoção. Ao encontrar-se
com
ela
depois
da
multidão,
perguntaram-se pelo que acontecia. Anna as pôs em dia rapidamente e viu seu próprio medo refletido na inquietação de seus rostos. Era um dia que todos esperavam, mas então quando
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começavam a dobrar os sinos. —Tão logo? —disse sua mãe, presa do medo — Mas se apenas acaba de se recuperar. —Não lhe acontecerá nada, mãe — repôs Anna, tentando convencer-se também a si mesmo. Mas não era seu pai o único que preocupava a Anna. O que aconteceria…? Não, não podia pensar nisso. Arthur retornaria. Tudo estariam logo de volta. Não obstante, a incerteza não se desvanecia. A arbitrariedade da guerra, isso era precisamente o que Anna sempre tinha desejado evitar. Por que tinha que apaixonar-se por um cavalheiro? A reunião durou um momento mais. Ao entrar no salão perdeu a pista de Arthur e seus irmãos, mas assim que o bate-papo derivou para uma missão de reconhecimento, viu-o adiantar-se
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para a mesa de cavalete do estrado no que seu pai estava sentado junto a alguns de seus homens e o capitão MacNab. Quando Anna adivinhou o que estava a ponto de fazer lhe gelou o coração. Quis chamá-lo, lhe dizer que não o fizesse, mas era consciente de que isso era impossível, e Arthur fez justamente o que ela pensava. —Eu irei, milorde — disse. John de Lorn olhou para ele e assentiu, obviamente agradecido de que se apresentasse como voluntário. Alan também se ofereceu a ir, mas seu pai se negou, alegando que o necessitariam no castelo. Ao final, decidiu-se que seu
irmão
Ewen
lideraria
o
grupo
de
reconhecimento, que também incluía os irmãos de Arthur. Não perderam tempo. Em pouco menos de
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uma hora já estavam reunidos no barmkin para partir. Anna ficou ali de pé junto a sua mãe, sentindo-se como se estivesse dando voltas em um redemoinho sem nada ao que agarrar-se. Observava com o coração em um punho como Arthur se preparava para a marcha. Este acabou de assegurar seus pertences ao cavalo, tomou as rédeas e se situou ao pé do animal, disposto a montar. A Anna deu um tombo o coração. Acaso pretendia partir sem lhe dizer adeus? Se essa era sua intenção, deveu mudar de idéia. Deu as rédeas a um dos cavalariços e se voltou para dirigir-se para ela. Tinha a mandíbula tão tensa como os ombros, como se temesse enfrentar-se
com
algo
desagradável.
«Eu»,
pensou Anna, sentindo uma pontada no peito. —Lady Anna — disse Arthur com uma leve inclinação da cabeça.
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A mãe e as irmãs deram a volta sem muita sutileza protegendo-os quanto podiam do resto da multidão para lhes dar um pouco de privacidade. Mas Anna seguia sendo plenamente consciente de que não estavam sozinhos. —Têm que partir? Odiou a si mesma por perguntar, mas não pôde evitá-lo. Sabia que esse era seu trabalho, mas não queria que partisse. Sempre seria assim? —Sim. Houve uma pausa tão larga que pareceu definitiva. —Quanto tempo estará fora? Seus olhos brilharam de um modo estranho, mas o brilho desapareceu antes que Anna pudesse reconhecer sua origem. —Depende do rápido que se aproxime o
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exército. Um par de dias, talvez mais. Ela ficou olhando seu bonito rosto, tentando memorizar as duras linhas de seus traços, as cicatrizes, o estranho dourado ambarino de seus olhos. —Tomará cuidado? Era uma pergunta estúpida, mas tinha que fazer de todas formas. Um simulacro de sorriso apareceu nas comissuras da boca de Arthur. —Sim. Manteve-lhe o olhar durante um instante mais, como se também ele tentasse retê-la na memória. Ela nunca tinha visto tal expressão de desconsolo em seu rosto. Um calafrio de pavor percorreu sua nuca. «É a guerra — disse — Está centrado na batalha que tem diante de si.» Arthur tomou sua mão e a levou aos lábios fazendo que a estampagem cálida de seus lábios
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irradiasse por toda sua pele. —Adeus, lady Anna. Algo no tom de sua voz lhe rasgou o coração. Quando ele se voltou para partir, Anna ficou com vontade desesperada para voltar a chamá-lo. «O tipo de homem que está sempre olhando para a porta…» Não. Convenceu a si mesma de que se comportava como uma parva. Não a estava abandonando. Simplesmente estaria fora uns dias. Mas por que lhe parecia que aquela despedida era para sempre? Então, como se não pudesse conter-se, Arthur deu meia volta, agarrou-a pelo queixo e baixou a cabeça para beijá-la. Seus lábios acariciaram os de Anna em um suave e terno beijo que fez vibrar seu coração. Aquele beijo tinha
sabor
de
nostalgia.
A
dor.
E
a
arrependimento. Mas sobre todas as coisas, tinha
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sabor de despedida. Anna queria prolongá-lo, queria que durasse mais, mas antes que lhe desse tempo a reagir, o beijo tinha acabado. Arthur lhe soltou o queixo, manteve o olhar por um segundo agonizante e partiu. Não voltou a olhar atrás. Nenhuma só vez. Ela ficou olhando sua partida, aniquilada, sem saber muito bem o que tinha ocorrido. Permaneceu tocando os lábios em uma tentativa de apreender o calor e seu sabor por tanto tempo como fosse possível. Mas antes que o último dos homens saísse pelas portas do castelo esse calor já era história. Arthur procurava uma saída e ao fim a tinha encontrado. A viagem de exploração em volta do Este lhe dava a oportunidade de fazer algo que meses atrás parecia impossível: retirar-se da missão. Tinha que fazer algo. Não podia ficar ali e deixar que a situação piorasse. Os dias
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seguintes a seu compromisso tinham sido insuportáveis. Fingir acabaria com ele. Anna estava tão feliz, tão encantada de casar-se com o homem que a trairia… Cada sorriso indeciso, cada olhar em busca de um consolo que ele não podia lhe oferecer, era como uma gota de ácido que remoia sua consciência. Não era capaz de fazer isso. Embora significasse sacrificar sua missão. O irônico era que não podia ter escolhido maneira
mais
efetiva
de
infiltrar-se
nos
MacDougall que um compromisso com a filha do senhor das terras. O compromisso, unido ao feito de salvar a vida de Alan, deu-lhe acesso ao centro nevrálgico do poder: o conselho de nobres. Dizia a si mesmo que não sacrificava sua missão.
Fazia
suficiente
identificando
às
mulheres como as transmissoras de mensagens, passando informação sobre a preparação e
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efetivos do MacDougall e entregando um mapa do terreno, assim como evitando uma aliança com o Ross, embora isso não ocorresse exatamente
da
maneira
em
que
o
tinha
planejado. Estavam nas vésperas da batalha. O rei Robert entenderia. Tinham passado três dias de sua desastrosa partida e caía a madrugada. Nunca acreditou que lhe custaria tanto despedir-se dela. Mas partir de seu lado, sabendo que possivelmente não a veria de novo, fez-lhe perder toda determinação. Não deveria tê-la beijado, mas ao olhar seus olhos e ver esse rosto de medo e preocupação, não pôde resistir. Era consciente de que jamais voltaria a ter essa sensação de conexão absoluta e precisava desfrutar dela uma vez mais. Arthur olhou a retaguarda para assegurar-se de que ninguém o tinha seguido e atou o cavalo a
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uma árvore. Encontrava-se a menos de dois quilômetros do lugar onde os homens de Bruce tinham acampado a noite anterior. Faria o resto do trajeto a pé. Era provável que a essa hora da madrugada os sentinelas disparassem contra tudo que se aproximasse do acampamento sem fazer perguntas e o cavalo o delataria. Seus sentidos
se
aproximava
aguçavam do
à
medida
acampamento
que
se
do
rei,
antecipando-se a qualquer sinal que delatasse a presença da Guarda que o circundava. Arriscavase muito chegando sem prévio aviso, mas não havia alternativa. Não tinha tido tempo de combinar um encontro ou enviar uma mensagem a guarda, e a partida de reconhecimento dos MacDougall se preparava para retornar ao castelo de Dunstaffnage ao dia seguinte com o relatório.
Ofereceu-se
voluntário
para
fazer
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patrulha de noite, consciente de que essa seria sua única oportunidade. Sabia que Chefe teria a um dos membros dos Guardiões das Highlands fazendo turno de vigilância, como cada noite, assim tentaria contatar primeiro com algum de seus companheiros. De repente sentiu um comichão na nuca. Deteve-se o notar a estranha mudança de ar que percebia cada vez que alguém se aproximava. Escondeu-se entre a escuridão da noite e esperou, sabendo de que antes de ver quem se aproximasse o ouviria chegar. Mas passados uns minutos percebeu de que algo não funcionava. Ou o homem se deslocou ou suas habilidades voltavam a falhar. De novo. Mas quando conseguiu ver a figura que emergia depois de uma árvore a pouco mais de
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cinco metros de distância percebeu de que havia uma terceira resposta: o sigilo daquele homem igualava
suas
capacidades
perceptivas.
«Maldição.» Não era isso o que necessitava. Emitiu o uivo que iria identificá-lo como presença amistosa. Não obstante, suspeitava que o homem que se aproximava podia ter uma opinião diferente a respeito. MacRuairi ficou imóvel e apesar da contrasenha apontou com seu arco na direção da que provinha sua voz. —Quem vem? —Guardião - respondeu Arthur levantando o visor de aço de seu elmo e saindo de trás da árvore que o resguardava. Inclusive na escuridão, apreciou o brilho diabólico nos olhos entreabertos do MacRuairi, que deslocou o braço para a esquerda para lhe
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apontar
entre
as
sobrancelhas.
MacRuairi
possuía uma habilidade extraordinária para ver na escuridão, algo fatal de lembrar-se justo nesse momento. —Ides fazer uso da arma? —disse Arthur. —Ainda não decidi. Uma morte não me parece muito comparada com nove. Poderia alegar que pensei que era um traidor, o qual não estaria muito longe da verdade. Arthur engoliu a grosseira réplica que foi a seus lábios. Saber que merecia o menosprezo daquele homem, mas não facilitava o fato de ouvi-lo. Ignorou a flecha que lhe apontava e seguiu adiante. —Acha que não me arrependo do que aconteceu? —Arrepende-te? Pois te asseguro que não saberia o que te dizer. Parecia desfrutar lutando
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junto a Alan MacDougall, por não mencionar que salvou sua puta vida. Apenas os separavam alguns metros, mas MacRuairi não teria errado o tiro nem a centenas de metros de distância. —Responderei ante o rei e não ante você, Víbora. Tenho que falar com ele. —Está dormindo. Arthur apertou os dentes e os punhos. Brigar com o MacRuairi não solucionaria nada, mas não tinha tempo para tolices. —Pois então terá que despertá-lo. E também a meu irmão. Ao final, MacRuairi optou por baixar o arco. —Espero por seu bem que tragas boas notícias - disse, fulminando-o com o olhar — E será melhor que tudo aquilo valha a pena. Tinha valido a pena? Arthur não teve tempo
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de pensar nesses termos naquele momento. Não teve tempo de fazer esse tipo de análise. Estava muito ocupado em defender-se e proteger a Anna. Menos de quinze minutos depois o fizeram passar à tenda do rei. Se Bruce estava dormindo, não havia nada em seu rosto que indicasse que acabava de despertar. Levava seus escuros cabelos penteados, tinha os olhos tão limpos e chicoteados como sempre, além de ir vestido com as perneiras e uma sobreveste negra de finos bordados. Estava sentado sobre uma arca. A ausência de mobiliário concordava com a ligeireza e a rapidez com as que se deslocava o exército. Ao rei Eduardo nem sequer teria passado pela cabeça fazer campanha sem carregar em seus carros seu equipamento doméstico e sua baixela.
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Mas detrás de viver como um foragido durante um ano aquartelado entre o povo, Robert Bruce havia se acostumado a contentar-se com muito menos. A sua esquerda tinha ao Neil, ao qual se via um tanto mais desalinhado, e à direita ao Tor MacLeod, líder dos Guardiões das Highlands. Tanto a expressão deste como a do próprio rei eram desalentadoras. A pergunta que Arthur adivinhou no olhar de seu irmão cortava como uma faca. Seria possível que questionasse sua lealdade? —Que
diabos
ocorreu,
Guardião?
—
perguntou o rei. Arthur narrou da maneira mais sucinta possível
os
eventos
que
levaram
a
sua
inesperada viagem ao norte, o compromisso de bodas previsto entre a filha de Lorn e sir Hugh
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Ross, as esperanças de unir forças de Lorn e a intenção de Arthur de evitar que a aliança se levasse a cabo. —Conseguiram-no? —perguntou Bruce. Arthur manteve uma expressão neutra. —Sim, majestade. O rei assentiu, agradado. Nenhum dos pressente pareceu perguntar a respeito de como o tinha conseguido. Arthur continuou explicando como tinha obtido que a patrulha se desviasse do grupo dos MacDougall em seu caminho ao norte e afirmou que se viu obrigado a defender-se para proteger sua identidade. —Assim foi você? —disse MacLeod — Nossos homens do castelo do Urquhart estavam muito
zangados
porque
um
só
homem
conseguisse escapar deles. —Não de tudo. Oxalá tivesse podido, mas me
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encurralaram em um escarpado. Não podia lhes contar quem era. Ninguém disse uma palavra. Todos sabiam tão bem como ele que essas situações eram inevitáveis para preservar sua identidade, mas a nenhum deles gostava. Depois Arthur passou a explicar a forma em que
MacRuairi
surpreendido
e
seus
quando
homens
o
tinham
voltavam
para
o
Dunstaffnage. Neil arqueou as sobrancelhas. —Não os ouviu chegar? Arthur negou com a cabeça sem dar mais explicações. Referiu a princípio, simplesmente reagiu ao ataque e que depois, ao se dar conta de quem eram, passou a manobras defensivas. Quando chegou à parte em que salvou a vida do Alan MacDougall não ofereceu mais desculpa
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que a verdade. Somente tentava deter o golpe, matar ao guerreiro fora um acidente. Neil fez a pergunta que sem dúvida rondava as cabeças de todos eles. —Mas por que teria que lhe salvar a vida? Proteger ao herdeiro de Lorn não era parte de sua missão. Assassinar a ele seria quase tão bom como assassinar ao próprio Lorn. Arthur olhou a seu irmão nos olhos sem fugir a verdade. —Não tentava protegê-lo. —É pela moça —disse MacLeod, juntando todas as peças — Sente algo por ela. Arthur se voltou para seu capitão. Não o negou. —Sim. —A filha de Lorn! —exclamou Neil sem poder ocultar sua indignação — Maldição, irmão. No
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que estava pensando? Arthur não tinha uma resposta para isso. Não havia. —O que estais dizendo, Guardião? —disse o rei com olhos negros tão duros como o ébano — Uma moça o tem feito esquecer em que lado está? —Minha lealdade está contigo, meu senhor disse Arthur com firmeza. Mas o dardo envenenado do rei ardia. Neil ficou olhando-o fixamente. —Mudaste
de
ideia
respeito
ao
Lorn?
Esquece-se do que fez a nosso pai? Arthur endureceu a expressão de seu rosto. —É obvio que não. Mas minha vontade de ver a destruição do John de Lorn não se faz extensiva a sua filha. Por isso estou aqui. Preciso sair do castelo de Dunstaffnage.
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A sala ficou em um silêncio sepulcral. Arthur notava que o olhar fixo de seu irmão queimava, mas não se atrevia a olhar em sua direção. Tinha falhado. Tinha falhado ao homem que era como um pai para ele. Não queria ver a decepção em seu rosto. —Está em uma situação comprometida? — perguntou o rei — Há perigo de que o descubram? Arthur negou com a cabeça. —A moça sabe que oculto algo, mas não acredito que suspeite de nada. —Então é a moça a causa de que desejes abandonar a missão antes de cumpri-la? —A coisa se complicou. Consciente de quão insuficiente parecia isso, inclusive para si mesmo, explicou que Lorn lhe tinha interrogado sobre o ataque e acrescentou
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que ao acreditar que o ancião suspeitava algo, viu-se obrigado a aceitar o compromisso. —Mas isso são notícias fantásticas - disse o rei, contente pela primeira vez desde que Arthur entrasse na tenda — chegastes mais perto de Lorn do que jamais acreditei possível. Sinto muito que a moça esteja implicada, mas não sofrerá verdadeiro dano. O coração de uma jovem sara com facilidade. Para falar a verdade, o rei, conhecido por seu êxito com as moças, tinha muita mais experiência que ele, mas nesse caso Arthur não acreditava que acertasse. Anna amava com muita bravura. Estava muito cega pelo amor. —Não posso permitir que abandone — finalizou o rei — Ainda não. Não tendo a batalha tão perto. Necessito-te dentro para que me digas o que é o que se propõem. A informação que nos
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transmite é muito valiosa. A vitória está muito perto para deixá-la escapar no último momento. John de Lorn é um demônio com o coração podre, mas não por isso subestimo suas táticas de guerra nem sua capacidade para a surpresa. Arthur sabia que o rei não atenderia a razões. Robert Bruce estava desejando desforrar-se. Lorn o tinha vencido antes e essa vez não permitiria que nada se interpusesse em seu caminho. O coração de uma mulher era um pequeno preço a pagar. —Atacaremos o castelo na madrugada do dia dezesseis —disse MacLeod, dando a impressão de advertir sua frustração — Só serão alguns dias mais. Mas ele não conhecia Anna MacDougall. Arthur teria preferido enfrentar-se às endiabradas máquinas de guerra do primeiro rei Eduardo que
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tentar resistir diante de Anna durante «somente uns dias mais». Capítulo 20 —Retornaram! Anna correu até a janela de seus aposentos ao perceber a excitação na voz da Mary. Examinou com fruição as figuras com armadura que atravessavam as portas do castelo e quando por fim reconheceu a familiar envergadura de seus ombros exalou profundamente, como se tivesse
passado
respiração.
Havia
quatro
dias
retornado.
contendo Não
a
a
tinha
abandonado. Dizia a si mesma que era uma loucura pensar que ele fosse capaz de tal coisa. Entretanto, não queria admitir quanto tinha chegado a preocupar-se.
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Anna afastou seu trabalho de bordado e saiu correndo do aposento seguindo os passos de sua irmã, que parecia tão emocionada como ela pela volta da partida de reconhecimento. Franziu o cenho. Acaso para sua irmã Mary importava mais o irmão de Arthur do que admitia? Chegaram ao salão justo no momento em que faziam entrar o grupo à câmara de seu pai para dar parte de seu avanço.
Fazia
um
momento
que
tinham
terminado a refeição leve, mas Mary e ela pediram que preparassem algo de comer e beber enquanto aguardavam os homens. Depois de uma espera que lhes pareceu interminável, estes saíram da câmara de seu pai e entraram no salão. O primeiro a fazer foi seu irmão, depois sir Dugald e logo, ao fim, Arthur. Embora estivesse coberto de pó e sujeira, com um rosto maltratado pelo sol, barba de quatro dias e aroma de
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estrebaria reaquecida, a Anna jamais pareceu mais maravilhoso. Se não fosse pela multidão de homens do clã que se agrupava a seu redor no salão, teria saltado a seus braços. Afastaram-se um momento enquanto os serventes preparavam as mesas. Desta vez não poderia evitá-la. —Está bem? —perguntou Anna sem acreditar em seus olhos. O olhar de Arthur se suavizou ao perceber sua preocupação. —Sim, moça. Estou bem. Necessito um bom banho, mas, além disso, estou perfeitamente são. —Alegra-me ouvi-lo — disse mordendo o lábio e olhando-o com vacilação —... Senti tua falta. Arthur se estremeceu e uma pulsação fez tremer seu queixo.
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—Anna… Ela engoliu em seco e sentiu que de repente lhe quebrava a voz. —Pensastes em mim? —Tinha muito em que pensar. —Mas depois, ao ver o rosto que punha, arrependeu-se — Sim, moça. Pensei em você. Teria ficado contente com isso, a não ser pelo que tanto que custou admiti-lo. As mesas de cavalete estavam já preparadas e os serventes começavam a por pratos com comida. O resto dos homens desfilava para os assentos. E ali foi aonde olhou Arthur do lugar em que estava, junto à câmara de seu pai. Parecia ansioso por reunirse com eles. Anna não podia enganar-se por mais tempo. —Não
desejas
este
compromisso.
—A
verdade ardia. Anna ficou olhando-o fixamente,
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atormentada pela própria dor de seu peito — É que…? —Mal podia pronunciar as palavras. Tinha comentado que lhe ofereceriam uma esposa como recompensa — É que esperava te casar com outra? Arthur a olhou com dureza. —Do que estais falando? Já vos disse que não havia nenhuma outra. —Então é simplesmente que não me quer. Parecia que algo o atormentasse. —Anna… —Arthur pigarreou — Agora não é o momento. Apesar de que estivessem rodeados de gente,
Anna
não
pôde
reprimir
toda
sua
frustração. —Nunca é o momento. Ou está fora, ou encerrado em alguma reunião ou ocupado praticando. Quando, rogo a Deus que diga, é o
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momento? Arthur, visivelmente frustrado, alisou com uma mão seus cabelos encrespados pelo elmo, que lhe caíam em suaves ondas por cima das orelhas. Anna esteve a ponto de acomodar as mechas atrás delas, mas se deteve a tempo. —Não sei, mas agora mesmo quão único quero é comer algo, tirar toda esta porcaria de cima e dormir algo mais que umas poucas horas. Devia estar exausto. Por um momento Anna se sentiu culpada, mas não durou muito. Não pensava permitir que seguisse lhe dando voltas. —Então amanhã. Falaremos amanhã - disse, olhando-o com firmeza — Em particular. Talvez, mais que atormentado, estivesse assustado. Não pensava que fosse capaz disso, mas ao que parecia estar a sós com a Anna conseguia algo do que não eram capaz dezenas
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de guerreiros armados. Não sabia se era pra rir ou chorar. —Não posso. Supõe-se que sairemos de guarda. —Quando retornarem. —Parecia louco por encontrar outra desculpa, mas Anna o impediu — Já sei que está ocupado preparando a batalha, mas é que não mereço uns minutos de seu tempo? Arthur lhe sustentou o olhar durante alguns momentos. —Sim, moça. Claro que o merece. —Bem. Então vá comer — disse assinalando uma das mesas — Seus irmãos te esperam. Arthur assentiu levemente e foi reunir se com sua família enquanto Anna dava meia volta e encontrava a sua irmã Mary mais perto do esperado. Observava-a com uma expressão de
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comiseração no rosto. —Não
passa
nada
—disse
Anna,
envergonhada pelo que pudesse ter ouvido — Está cansado. Isso é tudo. Mary a agarrou sua mão e a apertou. —Tome cuidado, Annie querida. Há homens que não querem ser amados. Ficou circunspeta. —Isso não é certo, Mary. Todo mundo quer ser amado. Um sorriso de melancolia escureceu a boca perfeita de sua irmã. —Amas muito, irmãzinha. Mas há gente que não quer esse tipo de cercania. Há gente que prefere que lhes deixem em paz. Embora Anna não quisesse acreditar nas palavras de sua irmã, perseguiram-na durante todo o dia enquanto esperava a oportunidade
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para falar com ele. Arthur saiu a cavalgar pela manhã cedo, retornou a tempo para a refeição do meio-dia e depois participou junto com seus irmãos e o resto dos homens no treinamento vespertino que faziam no pátio. Os exercícios se intensificavam cada vez mais já que se aproximava a batalha. Aproveitavam a luz dos longos dias de verão e não acabavam até as oito da tarde. O jantar era frugal,
como
também
eram
as
preces
vespertinas. Anna se viu tentada de o seguir ao ver que se dirigia para o lago, mas sua mãe a reclamou para que a ajudasse a dirimir uma disputa nas contas do lar, e uma vez que acabou, ele já estava de volta e se encerrou em uma reunião junto aos cavalheiros de alta fila e os guerreiros da meinie de seu pai no que se converteu em um conselho de guerra noturno.
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Anna o esperou em uma pequena saleta situada no vão da escada, consciente de que Arthur teria que passar por ali a caminho dos barracões. Normalmente somente ia a aquele lugar para ler algum livro, mas estar oculto do olhar por uns cortinados de veludo parecia algo mais particular que lhe esperar no salão, repleto de homens que dormiam. Tinha levado consigo uma vela para ler, mas à medida que caía a noite seus olhos se cansaram demais, de modo que a pôs a um lado. Devia ser meia-noite quando os homens começaram a sair dos aposentos de seu pai. Arthur foi um dos últimos, mas Anna finalmente viu como entrava pelo corredor junto a seus irmãos. Quando se aproximou de sua posição, ela afastou os cortinados e desceu a escadinha para dirigir-se a ele. Para ouvir o comentário de seu irmão, Arthur a buscou com o olhar com uma
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expressão mais resolvida que surpreendida e foi a seu encontro, enquanto seus irmãos abriam a porta que conduzia ao barmkin. —Não deveria ter permanecido acordada disse. —Esqueceu que acordamos nos ver hoje? — repôs ela com o cenho franzido. —Não. —Suspirou — Não esqueci. Apareceram mais homens no corredor. —Venha — lhe disse Anna, protegendo-se em uma pequena cova que usavam para armazenar o vinho do senhor do castelo, aonde ninguém lhes incomodaria. Assim que abriu a porta sucumbiu ao rico e frutífero aroma, que se intensificou ao fechar a estadia. Colocou a vela sobre um dos tonéis e se voltou para olhá-lo. Tratava-se de uma despensa pequena encravada na parede. Um espaço
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íntimo, muito íntimo. Anna se ruborizou ao conscientizar-se disso. Arthur permanecia ali à luz trêmula das velas como um convidado de pedra, com uma expressão rígida e forçada. Ficou surpresa ao ver que apertava os punhos. —Isto não é uma boa idéia — disse ele com voz quebrada. —Por que não? Arthur a olhou com severidade. —Não recorda o que aconteceu a última vez que estivemos encerrados em um aposento pequeno? Anna se ruborizou. Era difícil não recordar à perfeição estando tão perto dele. O calor que desprendia seu corpo a envolvia e sua pele se arrepiava ao recordar as intimidades que tinham compartilhado. Mas não era para isso que o tinha levado ali.
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—Só demoraremos uns minutos. Preciso saber… — Ergueu o olhar para examinar seu arrumado e tenso rosto — Quero que me diga se deseja este compromisso ou não. A franqueza de Anna já não surpreendia a Arthur. —Anna… — disse tentando lhe distrair — É complicado. —Isso já disse antes. O que ocultas, Arthur? O que há aí que não quer me contar? —Há coisas — disse contendo-se e olhandoa com aspereza — Não sou o homem que pensam. —Sei exatamente o tipo de homem que é. —Não sabe tudo. Anna reconheceu o tom de advertência. —Então me conte isso - Ao ver que não respondia, acrescentou—: Sei o que é o
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importante. E sei que te quero. Aquelas palavras pareceram lhe doer. Arthur se aproximou para acariciar a bochecha com uma expressão de tristeza que lhe rompeu o coração. —Pode ser que pense isso agora, mas logo mudará de opinião. Seu tom paternalista e essas advertências crípticas a punham fora de si. —Não o farei — disse Anna com veemência, apertando os punhos para aplacar a vontade que tinha de gritar ou de romper a chorar. Respirou profundamente para acalmar-se e continuou—: É algo muito simples, Arthur: quer se casar comigo, sim ou não? —O que eu quero não vem ao caso. Estou pensando em você, Anna. Pode ser que agora mesmo não te pareça isso, mas acredite quando
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lhes digo que o faço por seu próprio bem. Não quero te fazer dano. Tudo pode mudar durante nos próximos dias. A guerra mudará tudo. Tinha razão. Parecia que todos seus sonhos pendessem de um fio. A guerra estava a ponto de cair sobre eles e tudo o que conheciam mudaria em um abrir e fechar de olhos. A espada de
Damocles
pendia
sobre
o
poder
dos
MacDougall nas Highlands. Mas havia algo ao que Anna podia acolher. —Isso não mudará meus sentimentos por você. São os seus os que estão em julgamento. Não respondestes a minha pergunta — disse depois de uma pausa. Arthur amaldiçoou e se afastou da porta uns passos, numa tentativa de perambular que não encontrava espaço suficiente. Quase roçava o teto com a cabeça. Parecia um leão à espreita
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em uma jaula muito pequena. Estava em um estado de rigidez absoluta, irradiando tensão por cada um de seus poros. Ao final deu a volta e a tomou pelo braço com expressão furiosa. —Sim, maldita seja. Quero me casar contigo. A escura nuvem que se pousou sobre ela se dissipou. Não era a declaração de amor mais romântica que tivesse ouvido, mas isso bastava. Seu corpo se encheu de calidez, e sorriu. —Então o resto não importa — disse aproximando-se
mais
a
ele
e
procurando
instintivamente a conexão entre ambos corpos. Arthur se estremeceu ao notar o contato, mas nessa ocasião Anna não procurou mais razões. Queria-a. Muito. Apesar de que fizesse quanto podia por resistir a isso. A tensão se desprendia de seu corpo reverberando como a pele de um tambor. Seus olhos se pousavam sobre seus
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lábios com um olhar obscurecido pelo desejo, mas mesmo assim seguia lutando contra isso. —O que acontecerá não voltará, Anna? Então o que? Gelou o sangue. Por isso atuava daquele modo? Tentava prepará-la em caso de que morresse no campo de batalha? Não suportava pensar nisso, mas sabia que existia essa possibilidade. Ele podia morrer. Atraiu-o mais para si, aferrando-se aos fortes músculos de seu braço como se jamais pensasse deixá-lo partir. Deus não podia ser tão cruel para afastá-lo dela. Mas e se o fizesse? , pensou com o coração encolhido. Ela sabia o que queria. Não estava na sua mão controlar o que aconteceria no futuro, mas sim que podia controlar o presente. Talvez sim o tivesse levado a esse lugar com uma segunda
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intenção. Arthur era consciente de que aquilo era má idéia, mas tal e como tinha comprovado mais vezes das que queria recordar, era um perfeito tolo no que se referia a Anna MacDougall. O sangue corria cálido por suas veias e uma pátina de suor se acumulava sobre suas sobrancelhas. O intenso aroma do vinho, o almiscarado cheiro de terra do pequeno aposento e a leve fragrância floral de sua pele o embriagavam de desejo. Estavam muito perto um do outro, e sua necessidade era muito urgente. As imagens do quanto desejava fazer amor com ela davam voltas em sua cabeça deixando-o meio louco. Estavam a sós, maldita seja. Era muito perigoso. Mas se Arthur pensava que a desanimaria lhe falando de um futuro incerto, tinha errado em seus cálculos.
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—Não quero pensar na guerra nem no que acontecerá amanhã. Somente quero pensar no presente. Se hoje fosse o último dia que ficássemos juntos, o que é o que queria? «A você.» Sentiu a pulsação. Queria o que lhe oferecia mais que tudo no mundo. Eram suas palavras. Sua certeza. O fazia sonhar. Arthur queria acreditar que havia um futuro possível. Queria acreditar, embora fosse por um instante, que Anna podia ser dele. Seu coração bateu como um tambor quando ficou nas pontas dos pés para lhe beijar. Em sua luta por não
equilibrar-se
sobre
ela,
Arthur
deixou
escapar um gemido. Sabia que assim que o fizesse não teria forma de parar. Tinha uma boca cálida e suave, muito doce. Tinha sabor de mel e cheirava como… Deus, cheirava como um jardim recém regado sob o sol estival.
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Anna lhe acariciou o queixo com os lábios. Depois, o pescoço. Arthur começou a tremer. Não poderia agüentar aquilo durante muito mais tempo. Via-se incapaz de resistir. Rezava para que a tortura acabasse, mas em vez disso piorou. Anna apertou seus quadris contra ele e se esfregou contra a parte de seu corpo que desejava mais o contato, a parte de seu corpo que estava dura e palpitava, e que era impossível de controlar. —Aquele
dia
estivemos
tão
perto
—
sussurrou junto ao pescoço de Arthur com um quente fôlego que provocou calafrios em sua pele em chamas— que quero saber como segue. — Uma gota de suor apareceu por sua têmpora. O frio aposento se esquentou em questão de segundos. Anna lhe rodeou o pescoço com seus braços e se grudou a ele. Buscou-o com o olhar
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— me ensinem Arthur. Essa petição desavergonhada rompeu o último fio de que pendiam as reservas de Arthur. Soltou um grunhido, empurrou-a contra a porta, prendendo suas mãos por trás da cabeça, e a beijou. Não, devorou-a com seus beijos. Se deu um festim com sua boca fazendo uso dos lábios e a língua, beijando-a como se jamais pudesse saciar-se. Ela respondeu a seu ardor com mais ardor, engastando sua língua a dele, imitando seus eróticos movimentos. O crepitar na cabeça de Arthur era cada vez mais sonoro. Seu corpo estava cada vez mais tenso. Mas não era suficiente. Tombou-se sobre ela, fez que seus corpos se acoplassem e começou a mover-se, primeiro com delicadeza e depois com mais insistência, à medida que Anna se retorcia e
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gemia com inocente frustração. Tinha vontade de lhe levantar as saias e afundar-se dentro dela, ver como se desfazia quando ele se aferrava nela mais forte e mais profundo. Uma e outra vez. Reclamando-a para si. Mas estava tão receptiva, sentia o prazer de uma forma tão pura, que em seu interior cresceu uma onda de ternura que lhe fez afastar-se. Anna ficou piscando com uns olhos incrédulos que nadavam em paixão e a boca meio aberta, com os
lábios
inchados
por
seus
beijos,
mal
separados. —Rogo-lhes isso, não… —Chist! —disse Arthur sossegando seus protestos com um doce beijo — Não vou parar. Era muito tarde para isso. Era um homem, não um santo vindo do céu. Tinha muita vontade de possuí-la e ela o tinha levado muito longe. Já
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teria
tempo
para
as
recriminações.
Nesse
momento, Anna era dele. Mas não a teria contra uma porta como se fosse um animal no cio. Soltou o broche dos Campbell que levava para ajustar a manta e a estendeu sobre o chão de pedra. Depois se sentou sobre ela e lhe estendeu a mão. Anna não duvidou. Aceitou sua mão e permitiu que a recostasse a seu lado com um sorriso que lhe partiu o coração. Havia justo o espaço suficiente para esticar-se entre os tonéis de vinho. Arthur acariciou seus cabelos e a atraiu para si para beijá-la com toda a paixão e a emoção que se concentravam em seu interior. Beijou-a como se fosse tudo para ele, e Anna se deixou levar pela doce posse daquele beijo. Se aninhou a seu lado e se sentiu cálida, amparada e protegida acima de tudo que acontecia fora do
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círculo mágico de seu abraço. Sentia… «Paz.» Em seus braços sentia essa paz e alegria que sempre lhe eram esquivas. Voltou a passar os dedos entre seus cabelos e lhe sustentou o pescoço com sua grande e calosa mão, descrevendo suaves círculos em sua nuca com o polegar. Poderia passar a vida beijando-o, estendida junto a ele, amoldando-se a seu corpo, sentindo a rígida força de seus músculos contra ela. Seu calor era como uma vagem protetora que os rodeava. As longas e pausadas carícias de sua língua faziam que se derretesse de paixão. Era perfeito. Mas quando essas longas e pausadas carícias pediram mais, quando seus beijos se fizeram mais intensos e profundos, quando começou a apertá-la com mais força e Anna percebeu a dura coluna de aço que pressionava
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seu ventre, se deu conta de que aqueles beijos não eram suficiente. Sentiu essa estranha sensação formando-se de novo em seu interior. O despertar. Os indícios. A energia incansável que pulsava entre suas pernas e fazia que ansiasse esse contato até o desespero. Mas nessa ocasião estava a par do que aconteceria depois. Recordava a mão de Arthur entre suas pernas, seus dedos dentro dela, os agudos espasmos do momento de liberação. Recordava perfeitamente a avultada cabeça redonda de sua virilidade golpeando em seu interior de maneira íntima. Gemeu e moveu os quadris em círculo contra ele, ansiando o alívio que somente a fricção podia lhe oferecer. Tinha o corpo em chamas, e os mamilos cada vez mais eretos e sensíveis à medida que se roçavam contra seu peito. Tentou
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atraí-lo mais para si, passando as mãos pela larga envergadura de seus ombros, pelos duros músculos de seus braços e suas costas. Apesar de que sob o tecido escocês Arthur só levasse a regata, as meias e os braies, aquelas finas capas de tecido se converteram em uma barreira incômoda. Anna queria tocá-lo. Queria sentir o calor de sua pele vibrando sob a pressão de seus dedos. Certamente
ele
se
deu
conta
de
sua
frustração. Afastou sua boca da dela, tirou o cinturão e passou a regata por cima da cabeça, jogando-a
ao
chão.
Seu
torso
era
tão
impressionante como recordava. Ombros largos, braços musculosos e um ventre plano sulcado por linhas rígidas de puro metal cobertos por uma pele ligeiramente bronzeada sublinhada por cicatrizes de diferentes tamanhos. A pior delas
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era uma em forma de estrela que luzia junto a seu ombro, o tipo de marca que deixa uma flecha ao cravar-se. E agora via com claridade a marca do braço: o leão rampante, símbolo do reino da Escócia. Não podia afastar o olhar dele. Por Deus bendito que era um homem formoso. —Moça, se segue me olhando deste modo, isto se acabará em um abrir e fechar de olhos. A rouquidão de sua voz fez que Anna se estremecesse de desejo da cabeça aos pés. Ruborizou-se. —Eu gosto de te contemplar. —O olhar de Arthur se obscureceu — É magnífico. Anna, incapaz de esperar um segundo somente mais, acariciou seu seio com as palmas das mãos e essa sensação faiscante a fez gemer. Arthur, por sua parte, proferiu um profundo som gutural e a voltou a tomar em
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braços. Nessa ocasião não havia volta atrás. Anna cheirava seu desejo e sentia a necessidade que se desprendia dos eróticos arremessos de sua língua. Tudo ocorria muito depressa, mas cada momento se gravava a fogo em sua memória. Queria recordar tudo. O modo em que a saboreava. A maneira em que sua boca descansava sobre a sua. O áspero roçar de seu queixo sobre sua pele. O calor que desprendia seu corpo. O poder daqueles músculos que se esticavam sob suas mãos. O feroz rugir dos batimentos do coração contra seu coração. Queria recordar todas as sensações. Cada um dos aromas. Cada roce. Estava tão excitada e sensível que sentia a pele quente e avermelhada. Apenas se deu conta de como suas mãos desatavam os nós de sua sobreveste sem mangas e a tiravam pelos
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ombros. Então se encontrou com que cobria seio e o massageava através do fino tecido de linho de sua regata, ao mesmo tempo em que levava a língua até seu pescoço. Arthur roçou a tensa protuberância de seu mamilo com o polegar, descrevendo círculos, acariciando-o, beliscandoo brandamente entre os dedos. As mãos de Anna percorriam avidamente suas costas, aferravam-se a seus ombros e lhe arranhavam a pele a cada uma de suas provocadoras carícias. Gemeu da vontade que tinha de romper o tecido e notar o contato direto de seus dedos, sua boca. E seus desejos se fizeram realidade. Primeiro o vestido e depois a regata passaram sobre suas pernas até chegar à cintura e logo por cima da cabeça. Se não fosse pela forma com que ele a olhava pode ser que nem sequer percebesse.
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Arthur ergueu a cabeça e passeou o olhar por sua nudez, o que fez que ela se ruborizasse e procurasse cobrir-se, mas ele não pensava permitir-lhe Agarrou-a pelos pulsos e negou com a cabeça. —Não —disse de maneira brusca com uma voz rouca que destilava violência —É preciosa. —exclamou Arthur, ficando do meio lado e acariciando seu braço como se fosse tão delicada que pudesse rompê-la com somente tocá-la. Acariciou seus seios com o olhar, fazendo que ficassem mais arrepiados ainda. Passou um dedo pela ponta e depois por sua abrupta curva — Jesus! —disse com a respiração entrecortada — Seus seios são de outro mundo. Arthur soltou um gemido e se inclinou para agarrá-los e levar-lhe à boca. Beijou primeiro um de seus espectadores ápices e logo o outro,
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deixando-a tremendo de vontade. Quando ao fim a capturou com seus lábios e mergulhou um mamilo em sua boca, Anna gemeu de prazer. Arthur jamais tinha visto nada tão formoso. Era consciente
de
que
deveria
conter-se
para
saborear sua suave pele de pêssego em toda sua imensidão, mas com somente vê-la estivera a ponto de chegar ao limite. Parecia um anjo, esbelta e delicada do mais alto de sua cabeça até as diminutas impigens de seus pés. Se não fosse por esses seios, teria pensado que estava morto e tinha chegado ao céu. Porque seus seios eram puro pecado. Uma fantasia masculina feita realidade. Grandes, mas não em demasia, redondos e erguidos, com a rigidez da juventude; sua suave e cremosa carne estava coroada por mamilos de cor framboesa que faziam a boca água. E tinha gosto disso…
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Gemeu
de
prazer
e
voltou
saborear,
rodeando sua cálida e ereta ponta com a língua. Sabor de doces desejos carnais e escuros prazeres melosos. Queria ir devagar, prolongar cada momento de prazer, mas sua necessidade era muito ardente, muito desesperada, e fora evitada durante muito tempo. Pôs a mão entre as pernas e a explorou com os dedos. Tinha uma ereção de cavalo, mas notar quão molhada estava, saber que estava úmida para ele, fez que lhe pusesse mais duro ainda. Lambeu seus seios e a acariciou com os dedos até que seus quadris começaram a ir contra sua mão e sua respiração entrecortada se voltou irregular. Quando soube que Anna estava a ponto de gozar, liberou-se dos braies e as meias com rapidez e se colocou entre suas pernas.
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Seus olhares se encontraram. Gostaria de dizer que pensou duas vezes, mas não era certo. Tudo que podia pensar era na necessidade de fazê-la sua, que não podia deixála escapar. Em que em seus olhos via a aceitação e o amor que jamais pensou que seriam para ele. Um amor que Deus sabia que ele não merecia, mas que desejava mais que nenhuma outra coisa no mundo. —Por favor — soluçou Anna. Esse era o convite que Arthur necessitava. Levantou-lhe uma de suas pernas para colocá-la em cima de seu próprio quadril, ao mesmo tempo em que apertava os dentes para reprimir a vontade que tinha de investir com todas suas forças e se dispunha a facilitar entrada. Embora talvez a palavra «facilitar» não fosse a adequada. Ela era estreita e ele era grande. Enorme.
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O
suor
se
acumulou
sobre
suas
sobrancelhas. Apertada. Deus, estava tão incrivelmente apertada… Apertou todos os músculos diante da insistência que crescia em sua virilha. Seus testículos se esticavam ao mesmo tempo em que a pressão subia pela base de sua coluna. O corpo de Anna lutava contra aquela invasão, mas ele
não
pensava
permitir
uma
negativa.
Empurrou um pouquinho mais, fazendo que ela se estremecesse e emitisse um gemido de angústia. O sangue bulia por suas veias. Parecia estar a ponto de explodir, mas se conteve para dar-lhe tempo
a
preparar-se
antes
de
enterrar-se
completamente entre suas pernas. «Jesus. Que não empurre mais.» —Não… não estou segura de que isto vá
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funcionar —disse Anna com inquietação — E se… e se for pequena demais pra ti? A risada abriu passo entre o sofrimento através do peito de Arthur. Já explicaria os pormenores do assunto mais tarde. —Confie em mim, amor. Acoplaremo-nos um ao outro perfeitamente. —Mas o certo é que era a primeira vez que estava com uma virgem — Pode ser que doa e seja incômodo a princípio — disse olhando-a nos olhos — De acordo? Anna assentiu, mas a viu um pouco menos segura que antes. Não deixou de olhá-la nos olhos um só momento, oferecendo seu apoio tácito à medida que se afundava mais e mais nela,
com
cada
um
de
seus
dolorosos
centímetros, um após o outro. A sensação de ter seu corpo rodeando seu pau e apertando-lhe tanto era quase mais do que
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podia agüentar. Sabia do muito que gostaria, fazia desonestos esforços para lutar contra a urgência
de
investir.
Esse
calor
estreito,
aveludado e úmido envolvendo-o, espremendo-o. Todos os músculos de seu corpo ficavam rígidos de tensão no tanto que tentava conter-se e fazer as coisas com calma. Sentia-se maravilhado. Mas tinha que fazer que fosse perfeito para ela, paciência era a palavra chave. «Já falta pouco…» «Agora.» O ponto de não retorno. Olhou-a nos olhos, sentiu como seu peito se contraía e deu o empurrão final. Anna gemeu e os olhos se puseram enormes como pratos da dor, mas não gritou. Ao ver o aspecto estóico de seu rosto teve vontade de rir. —Já verás como depois é melhor, amor,
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prometo-lhe isso. Tentem só relaxar. Ela o olhou como se fosse louco. —Não acredito que isso seja possível. Mas então Arthur a beijou e Anna comprovou quão errada estava... Quando
a
penetrou,
Anna
sentiu
uma
pontada de dor e lhe deu vontade de gritar com todas suas forças. Mas se dava conta do que ele sofria, de modo que se reprimiu, consciente de quanto se esforçava por não a machucar. Não era culpa dela que a providência o provesse com um pouco tão… descomunal. Aquilo devia fazer que tudo fosse bastante incômodo… «Um momento.» Estava-a distraindo com seus beijos, mas por um instante teria jurado que acabava de sentir um… Aí o tinha de novo. Uma espetada. Uma espetada prazenteira. Muito prazenteira. Uma espetada que, de fato, parecia
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incrivelmente agradável. Seu corpo havia se amoldado a ele e a dor desaparecia. Agora sim a notava, quente e dura, enchendo-a de uma forma que jamais teria imaginado. E então Arthur começou a mover-se. A princípio devagar, inundando-se nela e saindo com investidas pausadas e delicadas. Anna gemia ao notar a maneira em que seus arremessos reverberavam por todo seu corpo. Sentia-se como se Arthur a reclamasse para si, como se a possuísse na mais primitiva das formas. Era uma sensação incrível. Tinha que mover-se com ele, erguer os quadris para coordenar-se com suas investidas e que a enchesse até o mais profundo. Com mais força. E depois mais rápido. Agarrou-se a seus ombros e o atraiu mais para si, desejando sentir todo seu peso sobre ela. Seus corpos pareciam estar fundidos
um
no
outro.
Pele
contra
pele.
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Tremendamente sensual. Um peso dilacerador. A paixão a capturava com seu trêmulo abraço. As sensações ardiam em seu interior. Tomavam forma. Esperavam o momento. Concentravam-se na mais feminina de suas partes. E também ele o sentia. Era como aço sob seus dedos, músculos tensos e acesos, preparados para explodir. Mas o que mais a excitava era a expressão de seus olhos. Intensa. Penetrante. Obscurecida não só pelo desejo mas também pela emoção. Nessas profundidades de âmbar dourado via refletido o amor que consumia seu próprio coração. Amava-a. Pode ser que ele não percebera ainda, mas ela sim o fazia. Mantinha-a pega a si, sem deixá-la ir, enquanto se afundava nela uma vez mais, inundando-se tanto como era possível, e ficava aí. Algo poderoso e mágico passou entre eles.
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Uma
conexão
como
jamais
antes
tinha
imaginado. À medida que a sensação se formava, a respiração de Anna ficou apanhada no mais alto de seu peito. Por um instante todo pareceu deter-se. Seu corpo se mantinha ao bordo do êxtase, fazendo equilíbrio no precipício celestial. Deixou escapar um guincho quando o primeiro dos espasmos de liberação fez que perdesse o controle e ficasse fosse de si, tremendo de prazer. —Isso, amor. Venha para mim. —Arthur começou a mover-se de novo, atravessando-a com uma despreocupação selvagem — Oh, Deus. Eu gosto muito. Não posso… Penetrou-a uma última vez com um profundo gemido de satisfação que parecia rasgar-se de sua própria alma. Seu corpo ficou rígido e logo se estremeceu ao notar que seu desafogo coincidia
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com a maré ascendente dela. Arthur tinha uma expressão fera e formosa, de uma paixão primitiva. Deixou-se cair sobre a Anna com os ecos da última sensação, ainda com seus corpos unidos. Tudo que ela ouvia era o som de suas respirações pesadas e o violento pulsar de seus corações. Desejava ficar assim para sempre, mas Arthur em seguida se afastou e rompeu a conexão. O ar frio passou sobre seu úmido e ruborizado corpo, lhe deixando a pele arrepiada. Anna era consciente de sua nudez, mas estava muito exausta para mover-se. Suas pernas pareciam de gelatina. Mas tampouco havia razão para envergonhar-se. Arthur não lhe emprestava atenção. Ficou olhando ao teto, ainda com a respiração entrecortada, mas em um silêncio que não pressagiava nada bom. Não lhe tocava dizer
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algo? Mordeu o lábio, perguntando-se que seria o que pensava. Tinha parecido maravilhoso… «Mas o que acontecerá se o decepcionei?», pensou sentindo uma pontada de dor. Ao fim Arthur voltou a cabeça para olhá-la e aproximou sua mão para lhe afastar os cabelos do rosto com delicadeza. Ao ver seu estado de incerteza lhe dirigiu um sorriso de menino que se instalou em seu coração para não partir jamais. Anna sabia que nunca poderia esquecer a expressão de seu rosto nesse momento. —Sinto muito. Não sei o que dizer. Nunca antes… nunca antes havia sentido algo como isto. Ela
esboçou
um
amplo
sorriso
como
resposta, incapaz de ocultar sua alegria. —Sério? Não tenho nada com que comparar, mas me pareceu algo maravilhoso.
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—Sim, foi maravilhoso. —Arthur se inclinou sobre ela e a beijou com ternura. Mas quando ela ergueu o olhar para olhá-lo de novo seu olhar se turvou — Jamais me arrependerei do que acaba de ocorrer, Anna. Mas por seu próprio bem eu gostaria que não tivesse acontecido. Anna
sentiu
o
inconfundível
tom
de
advertência e pareceu que lhe cravava um espinho no coração, mas o evitou. Não queria que nada escurecesse esse momento. Se aninhou sob seu braço e apoiou a cabeça sobre seu ombro, abrigando-se com seu corpo de maneira instintiva. —Eu me alegro de que tenha acontecido — disse ela. Agora estavam unidos no mais profundo e nada poderia separá-los. Arthur baixou o olhar para aquela delicada
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mulher nua que se aninhava em seus braços e lhe parou o coração. O que acabavam de compartilhar não tinha comparação com nada que
tivesse
compartilhado
experimentado cama
com
antes.
um
Tinha
número
de
mulheres mais que razoável, mas para ele fornicar sempre tinha consistido em saciar sua luxúria. Encarregava-se do prazer da mulher e do seu com um só objetivo na cabeça: desafogar. Uma vez que estava completo, não havia mais que fazer. Não se atrasava. E estava claro como a água que tampouco queria rodear a mulher com seus braços e desejar ficar assim para sempre. Comparado com o que tinha acontecido com a Anna, o resto parecia quase mecânico, como
se
tivesse
passado
por
todos
os
movimentos simplesmente para conseguir o prêmio. Mas com ela o prêmio era a experiência
777
em si mesmo. O prazer estava na exploração, no descobrimento e nos detalhes. Estava no modo em que ela reagia a suas carícias, a maneira em que arqueava suas costas, a pressão que exerciam seus quadris e os pequenos gemidos que saíam de seus lábios. Estava na expressão de seus olhos quando a penetrava, o rubor que lhe tingia suas bochechas quando se aproximava do orgasmo e o modo em que sua cabeça se inclinava para trás e sua boca se abria quando finalmente chegava. Não
fora
capaz
de
afastar
o
olhar.
Normalmente evitava o contato visual, mas com a Anna procurava essa conexão. Queria desfrutar dessa cercania. Descansou o queixo sobre seu cocuruto, saboreando
a
sedosa
suavidade
de
seus
cabelos. Era tão doce e formosa… além de
778
endiabradamente
confiada.
Isso
fazia
que
despertasse todo seu instinto de amparo. E algo mais. Algo quente, terno e poderoso. Algo que jamais pensou que pudesse ser para ele. Acreditava ser diferente. Pensava que não necessitava a ninguém, que estava bem sozinho. Mas se enganava. Não era absolutamente diferente. Necessitava-a. Queria-a. Amava-a com um ardor que lhe parecia surpreendente. Talvez pudesse encontrar alguma forma de explicar-se. De
implorar
seu
perdão.
Talvez
houvesse
esperança… «Ah, que diabos!» Um nó lhe contraiu as vísceras à medida que voltava para a realidade. A quem pretendia enganar? Anna jamais o perdoaria. Como poderia fazer, quando ele tinha a missão de destruir tudo aquilo que ela amava? Amava-a,
mas
isso
não
mudava
nada
779
absolutamente. Somente serviria para que o que estava por chegar fosse mais doloroso. Quando acabasse de cumprir seu encargo, não teriam nada que fazer o um com o outro. Amava-a, mas sua lealdade estava com Bruce. Tinha uma missão que cumprir, não só pelo rei, mas também por seu pai. Em um tempo diferente, em um mundo no que não houvesse guerra nem velhas rixas poderiam ter tido uma oportunidade. Mas não nesse mundo. Não nesse tempo. E mesmo assim gostaria de… Deus, quanto gostaria que tudo fosse diferente. Anna ergueu o olhar e o olhou sob suas longas pestanas. —Estou segura de que não somos o primeiro casal comprometido que antecipa sua noite de bodas. O sentimento de culpa se fez mais profundo.
780
Esse era o problema: não teria noite de bodas. Não a teria quando ela descobrisse a verdade. Era um bastardo. Um bastardo infame. No que estava
pensando?
Em
realidade,
sabia
perfeitamente. Pensava que a queria mais que a tudo no mundo e que tinha que fazer o que fosse por
conservá-la.
Consciente
ou
inconscientemente, queria unir-se a ela de uma forma que não pudesse ser desfeita. Nem sequer pelo engano ou a traição. Uma aposta desesperada. Egoísta. Perversa. Somente serviria para que Anna tivesse mais razão para odiá-lo. Mas já fora e não poderia trocá-lo por mais que quisesse. —Não —disse Arthur — Não somos os primeiros, mas dadas as circunstâncias teríamos que ter esperado. —Atraiu-a fazia sim com uma voz tão feroz como seu abraço. Era um filho de
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cadela egoísta, mas jurou que quando aquela maldita
guerra
acabasse
se
daria
uma
oportunidade. Lutaria por ela, por eles, se o permitisse — Voltarei para ti, Anna. Voltarei se é que me segue querendo. Ela o olhou com um sorriso nos lábios, cândida e inocente. Muito confiada. —Pois claro que seguirei te querendo. Nada poderá mudar isso. Queria
acreditar
no
que
dizia.
Queria
acreditar mais que tudo no mundo. Mas logo suas palavras seriam postas a prova. Capítulo 21 —O que se passa, Anna? Está muito calada esta manhã. É que não dormiste bem? Anna
olhou
a
sua
irmã
com
receio,
782
perguntando-se se suspeitaria algo. Era difícil falar. Luzia uma expressão serena no rosto, uma expressão que se adequava ao sermão matinal ao que acabavam de atender. Anna não tinha nem a menor ideia a respeito do que conversava. Estava muito ocupada em rememorar cada um dos segundos da cena que tinha tido lugar a noite anterior. Não cabia dúvida de que pensar tais coisas em uma capela tinha que ser terrivelmente pecaminoso, mas já tinha suficiente pelo que fazer penitência, de modo que se figurou que o dano acrescentado a sua alma não pioraria a situação. A recuperação dessas lembranças a fez sorrir. Estava claro que regozijar-se no pecado era inclusive mais pecaminoso ainda, mas o certo é que era feliz. Amava Arthur e ele a amava. Na noite passada o demonstrara. Não retornou à
783
câmara que compartilhava junto a suas irmãs até que já era bastante tarde. Ou cedo. Depende de como se olhasse. Ficou aninhada entre seus braços tanto quanto se atreveu a fazer, mas ao final esteve obrigada a retornar a seu aposento. Essas horas passadas entre os braços de Arthur significavam um dos momentos mais contentes de sua vida. Sob o protetor arco de seu abraço a guerra, o caos e a incerteza do mundo atual não existiam. À fria luz do dia, entretanto, tudo voltava a ser de outro modo. Cumpria-se o décimo segundo dia de agosto. Faltavam três para que expirasse a trégua. Dizia a si mesma que era a guerra o que a inquietava. Dizia a si mesma que a razão de que Arthur se mostrasse tão taciturno ou de que suas
palavras
adquirissem
o
matiz
da
advertência era a própria guerra. Pensando em
784
tudo o que estava por chegar durante nos próximos dias, a perda de sua virgindade antes das bodas deveria ser o que menos lhe preocupasse. Mas por que lhe tinha falado da possibilidade de não retornar? Teria que pôr fim a aquilo. —Não me passa nada —disse Anna com firmeza — dormi bem. Na realidade, as quatro ou cinco horas de sonho de que dispôs dormiu placidamente. —Pois deve ser um livro magnífico. Nessa ocasião o tom de voz seco de sua irmã não deixava lugar a dúvidas. —Pois sim — respondeu Anna sem poder evitar ruborizar-se. Embora freqüentemente lia até entrada a madrugada em alguma das câmaras entre muros do castelo para evitar incomodar a suas irmãs,
785
era óbvio que Mary tinha adivinhado a verdade. Seguiam de perto ao resto da família, que atravessava o pátio da capela em direção ao grande salão para romper o jejum. Não obstante, a maioria dos homens já estava no pátio de armas praticando. O ruído metálico das espadas, e a cacofonia das vozes ficava maior à medida que
se
aproximavam.
Anna
examinou
instintivamente as figuras sob as armaduras em busca dele.» O coração lhe deu um tombo só de vê-lo. Arthur estava do outro lado dos estábulos, de costas a Anna. Ali era onde preparavam as balas de palha, assim que se figurou que estaria praticando com a lança. Perto dele estava seu irmão Dugald, mas ao contrário deste, ele sim estava acompanhado. Impulsionava um dado pra frente e para trás e dava voltas no ar sob o atento olhar de três jovens e de bonitas criadas que lhe
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observavam como se fosse um mago, assentindo a tudo o que lhes dizia. Tentava ensinar a agarrar a lança uma jovem que tinha de frente a si, mas seus enormes seios se interpunham entre seus braços. Aqueles dois irmãos não podiam ser mais diferentes. Dugald era um fanfarrão ruidoso, o tipo de homem que somente estava contente quando era o centro da reunião e tinha ao redor o máximo de mulheres possíveis. Arthur era mais tranqüilo.
Mais
reto.
Um
homem
que
se
contentava estando em segundo plano. Mary ergueu o olhar ao céu ao contemplar seu exibicionismo e se afastou dali subindo a escada em direção ao grande salão. Anna se apressou a seguir seus passos sem poder evitar olhar atrás uma vez mais. Sir Dugald ria por algo que havia dito uma das garotas. Anna não ouviu
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o que lhe respondeu, mas teria jurado que era algo do tipo: «Olhe isto». Ergueu a lança sobre sua cabeça como se fosse jogá-la ao mesmo tempo que gritava a Arthur: —Arthur, agarra-a! Antes que Anna se inteirasse do que estava a ponto de fazer, antes inclusive de que o grito pudesse tomar forma em sua garganta, a lança já estava no ar, projetada em direção a Arthur. Estavam tão perto um do outro que quase não teve tempo de olhar em resposta às palavras do Dugald quando já tinha o dardo sobre ele. Apanhou-o no ar no último instante, com uma só mão. O levou ao joelho com um rápido movimento, rompeu-o em pedaços e devolveu as lascas a seu irmão com o rosto escurecido pela cólera.
788
Isso recordava algo a Anna. Uma brisa gelada banhou sua pele. Não tinha visto nada igual mais que uma vez em sua vida. Seu rosto empalideceu no momento. Sossegou com uma mão a exclamação de surpresa e ficou petrificada contra o muro da entrada com o coração
em
um
punho.
Tinha
acontecido
exatamente quão mesmo a noite da floresta do Ayr. Essa noite em que a mandaram a recolher a prata para seu pai e se encontrou com uma emboscada. O cavalheiro que a resgatou tinha feito exatamente o mesmo. «O espião.» «Não, não pode ser», disse-se Anna, invadida por um ataque de terror que lhe percorria as costas. Tinha que ser uma coincidência. Mas as lembranças se retorciam em sua cabeça e a confundiam. Estava escuro. Não pôde ver seu rosto. Ele falava em voz baixa para mascarar sua
789
voz. Mas o tamanho, a altura e a compleição encaixavam perfeitamente. Não, não, aquilo não podia ser. Anna se tampou as orelhas e fechou os olhos. Não desejava vê-lo. Não queria pensar em todas as razões que davam pé a essa possibilidade. Em suas ocultas advertências. A sensação de que ocultava algo. Suas tentativas iniciais de evitá-la. O olhar de reconhecimento em seu tio Lachlan MacRuairi. Lhe contraiu o estômago. A cicatriz. Deus, a cicatriz não. Mas a marca de flecha em forma de estrela de seu braço se ajustava à ferida do cavalheiro que a tinha resgatado. A bílis subiu até sua garganta. Mary se conscientizou de que Anna não ia atrás dela e baixou a escada correndo até a entrada em que sua irmã permanecia como uma estátua pega ao muro.
790
—O que te passa, Annie? Parece que viu um fantasma. Assim era. Deus santo, assim era. Anna moveu a cabeça, negando-se a aceitá-lo. Tudo a seu redor começou a dar voltas. —Não… não me encontro muito bem. Subiu a escada para sua câmara sem mediar mais palavras e quase não teve tempo de tirar o urinol de debaixo da cama quando já estava esvaziando
os
magros
conteúdos
de
seu
estômago e purgando de passagem seu coração nele. Arthur olhou em redor do grande salão caminho da câmara de Lorn para o conselho de guerra
da
noite.
Ficou
circunspeto
ao
conscientizar-se de sua ausência. Onde diabos teria
se
metido?
A
leve
sensação
de
preocupação que lhe assaltou essa manhã ao
791
não
ver
Anna
tinha
piorado
com
o
desenvolvimento da jornada. Alan lhe disse que Anna não se encontrava bem. Uma dor de estômago, mas dado o ocorrido a noite anterior, Arthur
não
acreditava.
Estaria
zangada?
Arrependia-se do que tinha passado entre eles? A culpa o remoia por dentro. O que teria feito? Obrigou-se
a
afastar
Anna
de
seus
pensamentos e a concentrar-se na tarefa que tinha ante si. Não sobrava muito tempo. O rei Robert atacaria em quatro dias, e Arthur ainda não tinha conseguido nenhuma informação de utilidade. Entrou no aposento seguindo ao Dugald, que estava de um humor de cão como jamais antes tinha visto, e se sentou à mesa com o resto dos cavalheiros de alta fila e os membros da meinie de
Lorn.
Minutos
depois
de
que
se
792
congregassem os homens, fez sua entrada Lorn. Mas nessa ocasião não chegava sozinho. Seu pai, o convalescente Alexander MacDougall, ia com ele. O pulso de Arthur se acelerou. Se MacDougall estava ali, provavelmente se trataria de algo importante. O lorde de Argyll tomou assento na poltrona trono que normalmente ocupava seu filho e deixou ao Lorn uma poltrona menor junto a seu posto. Uma vez que se fez silêncio na sala, Lorn tirou um pergaminho dobrado de sua bolsa e o pôs sobre a mesa. Arthur ficou petrificado ao reconhecê-lo
imediatamente.
Reprimiu
uma
maldição obscena. «O mapa.» Ou para ser mais exato, seu mapa. O mapa que tinha desenhado para o rei, que tinha entregue ao mensageiro. Devem ter interceptado antes que chegasse ao Bruce. «Maldição.» Desejou ter-se lembrado de
793
mencioná-lo na última vez que se reuniu com eles. Os homens se aproximaram para ver o de perto. —O que é? —perguntou um deles. Lorn adotou uma expressão severa. —Um mapa dos arredores de Dunstaffnage — disse, fazendo-o passar — E o número de homens e os fornecimentos a nossa disposição. Houve várias falações de irritação quando alguns dos homens notaram o que significava. Dugald se aproximou mais e examinou o mapa com tal intensidade que a Arthur lhe arrepiaram os cabelos da nuca. Não havia nada delator no documento. A escritura era minúscula e quanto aos desenhos… Dugald nunca tinha emprestado muita atenção aos «ganchos de ferro» de Arthur mais que para rir deles. Não tinha nada que
794
temer. Mas mesmo assim, o interesse que tomava seu irmão parecia inquietante. —De onde saiu? —perguntou Dugald. —O tiraram de um mensageiro do inimigo que meus homens interceptaram faz várias semanas —respondeu Lorn — Mas pela exatidão dos números, suspeito que há um traidor entre nós. —Os murmúrios de indignação e raiva zumbiram por toda a sala e Arthur se uniu a eles — Infelizmente o mensageiro não foi capaz de identificá-lo. —Como pode estar seguro, milorde? — perguntou Arthur. Um sorriso de cumplicidade curvou a boca de Lorn. —Estou. O qual queria dizer que tinham torturado ao mensageiro.
795
Lorn examinou os rostos dos homens que lhe rodeavam, o círculo interno de seu mando. —Mantenham os olhos abertos em busca de algo
que
se
saia
da
normalidade.
Quero
encontrar a esse homem — disse esmagando o mapa com a palma da mão — Mas este mapa demonstrou sua utilidade. Tenho um plano para ganhar a partida do usurpador em seu próprio jogo. Arthur
ficou
quieto,
tentando
conter
a
emoção. Talvez ao final pudesse conseguir um pouco de informação para o rei. —A que te refere? —perguntou Alan. —Refiro-me a que faremos que suas próprias táticas se voltem em contrário. Bruce conseguiu vitórias frente a força muito mais poderosos lutando
segundo
seus
próprios
meios:
escolhendo o lugar e o terreno adequados para o
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ataque, atirando golpes duros e rápidos desde seus esconderijos, usando o mesmo tipo de estratégias
que
usaram
nossos
ancestrais
durante séculos, táticas de guerra highlander. E que me crucifiquem se permitir que alguém das Terras Baixas ganhe em meu próprio terreno — disse, fazendo ato seguido uma pausa para que o resto fizesse coro sua aprovação — Não ficaremos aqui esperando ao assédio do castelo como ele acredita. Atacaremos nós primeiro. Todos começaram a falar ao mesmo tempo. Arthur se obrigou a não unir-se à refrega porque queria ouvir o resto. Mas sabia que aquilo era algo grande, monumental de fato. Lorn tinha razão: o rei não esperaria que os atacassem. Não
quando
tinham
uma
fortaleza
como
Dunstaffnage para cobrir-se. Lorn impôs silêncio na sala com um movimento da mão.
797
—Esperem que conte o resto para fazer perguntas. —Colocou o mapa mais adiante para que os homens que tinha frente a ele pudessem vê-lo — Bruce e seus homens vêm do este pela estrada do Tyndrum. —Apontou a um canto do mapa, fazendo que a pele de Arthur se arrepiasse ao pressentir algo importante. Lorn moveu o dedo seguindo o caminho e se deteve no caminho de Brander. Arthur sentiu o estômago apertar — Para chegar até Dunstaffnage terão que cruzar estas montanhas. No estreito e longo caminho de Brander, ali será onde ataquemos. Poremos a nossos homens aqui, aqui e aqui — disse assinalando três cúpulas por cima das quais não se via nada, devido aos meandros do caminho. Arthur reprimiu uma imprecação ao mesmo tempo em que o resto da sala prorrompia em
798
uma onda de excitação. Era o lugar perfeito ao que levar a cabo um ataque surpresa. Os MacDougall surpreenderiam ao Bruce de acima, descendo sobre o exército em marcha em uma abertura estreita de onde o rei não poderia tirar vantagem de sua superioridade numérica. —Quando? —perguntou Dugald erguendo a voz. —Nossos
informe
assinalam
que
Bruce
chegará ao Brander na madrugada do dia quatorze. «Filho de cadela traiçoeiro.» A sala ficou em silêncio. —Mas a trégua não expira até o dia quinze — disse Alan com cautela. Lorn entreabriu os olhos. —É o usurpador quem escolheu ignorar o código da batalha, não eu. Bruce parte sobre
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nossas terras. É ele quem rompe a trégua. —Um raciocínio à própria conveniência como jamais se viu antes. Mas ninguém na sala se atreveu a discutir — Alan —continuou Lorn—, partirá com o grosso das forças amanhã e estarão na posição ao cair a noite, somente para nos assegurar. A Arthur não surpreendeu saber que Alan estaria ao mando. Essas abruptas ravinas e o irregular
terreno
seriam
difíceis
de
sulcar
inclusive para os guerreiros mais jovens. —Defenderão vocês o castelo, milorde? — perguntou. Lorn o fulminou com o olhar. —Meu pai guardará o castelo —corrigiu — Eu farei cargo de uma frota de galeões e comandarei o ataque daqui — disse assinalando o lugar no que o rio Awe entrava no lago do mesmo nome — Assim, quando o tivermos surpreendido de
800
cima, seguiremos atacando do fronte. Golpeando ao Bruce de duas direções. Era um plano excelente. Não só se tratava de uma localização perfeita para lançar o ataque, mas sim ao atacar primeiro, e antes que a trégua expirasse, teriam o fator surpresa a seu favor. Essa intervenção provocou uma inundação de perguntas, mas Arthur já estava concentrado na tarefa que tinha. Tinha que advertir ao rei o antes possível sem que Lorn se inteirasse de que seu plano corria perigo. Teria que arriscar-se a enviar a mensagem nessa mesma noite. Depois, na excitação e o caos que precederiam ao ataque, teria a possibilidade de escapulir-se. «para sempre.» Encolheu-lhe o estômago. Tinha ante si o momento que tanto tinha temido e sabia que era inevitável. O momento de dizer adeus. O
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momento em que se supunha que devia voltar para as sombras e desaparecer sem dizer uma palavra. Isso era o que ele fazia. O que sempre soube que teria que fazer. Simplesmente não esperava que fosse tão tremendamente duro. Parecia covarde partir sem uma explicação. Deixar que Anna descobrisse a verdade por si mesma. Gostaria de prepará-la, lhe dizer que a amava e que nunca quis a machucar. De dizer o que sentia, que seguiria sendo dela sempre que ela quisesse. Mas não podia. Partiria para dia seguinte sendo um homem e quando retornasse o faria sendo outro. Anna o odiaria por isso. Embora duvidava muito de que coubesse uma mínima possibilidade de que estivessem juntos, Arthur jurou que quando terminasse todo a buscaria para tentar explicar-lhe Sempre que ela quisesse
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escutá-lo. «Não pode ser certo. Não é possível.» Anna se negava a acreditar. Mas tampouco podia afastar de si a dúvida que se instalou como um parasita em suas vísceras e não queria partir. A desculpa de sua enfermidade não era falsa. As dúvidas se retorciam e remoíam seu interior, debilitando-a. Passava o dia inteiro no refúgio de seus aposentos tentando convencer-se de que aquilo não era possível, de que ele não a enganaria de tal modo. Mas ficavam muitas perguntas no ar. Umas perguntas que não podiam esperar até o dia seguinte. Para então poderia
ser
muito
tarde.
Mary
e
Juliana
acabavam de retornar à câmara fazia pouco para lhe informar de que os homens já dispunham os preparativos prévios à guerra. «Guerra.» O medo acendeu seu peito, e a necessidade de encontrá-
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lo se tornou desesperada. Tinha o vestido enrugado e cheio de pelos de Escudeiro depois de ter passado todo o dia tombada na cama, mas não perdeu o tempo em trocar-se. Jogou água no rosto, enxaguou a boca, passou uma escova por seu emaranhado cabelo e se encaminhou às dependências de seu pai para pedir a suas irmãs que desse uma olhada no cachorrinho. Defraudou encontrar a porta aberta,
já
que
esperava
que
os
homens
continuassem no conselho de guerra. Não obstante
entrou,
atraída
pelas
vozes
que
procediam do interior. Seu pai, que estava de pé junto a Alan, observando um pergaminho estendido sobre a mesa, ergueu o olhar ao vê-la entrar na sala. —Ah, Anna. Encontra-te melhor? —Sim, pai, muito melhor — respondeu ela,
804
tentando não mostrar a decepção que supunha descobrir que se achavam ali somente eles dois. Certamente Arthur já teria se retirado aos barracões para dormir. O que podia fazer ela, então? Que desculpa inventaria para ir em ao seu encontro essas horas? —Necessita algo? —perguntou Alan, notando a preocupação de seu rosto. Quando seu irmão baixou o olhar, Anna se deu conta de que estava retorcendo as abas do vestido. —Parece desgostada por algo Não podia chegar a fazer uma idéia. «Oh, Deus. Teria que contar Anna sentiu um vazio no estômago ao conscientizar-se de que deveria compartilhar suas suspeitas com ambos. Mas
não
podia.
Não
até
que
estivesse
completamente segura. Seu pai… doía admitir
805
que a ira de seu pai nem sempre era racional. Não podia estar segura do que faria. Mas tinha que contar tudo. —É pela guerra. Mary me disse que os homens se preparam para partir amanhã. —Não há razão para preocupar-se, Anna. Sua mãe, suas irmãs e você estarão a salvo aqui. —Não acredito que seja isso o que lhe preocupa, pai — disse Alan com um sorriso forçado. Estava certo. Anna empreendeu a retirada, ansiosa por encontrar Arthur. —Não
queria
lhes
incomodar
—
disse
olhando o pergaminho sobre a mesa — É óbvio que estão ocupados, deixarei-os que… — acrescentou, detendo-se de repente com uma exclamação de surpresa. Cravou o olhar no pergaminho e caiu na
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conta de que o reconhecia, apesar de que nesse momento já estava acabado e tinha um aspecto diferente. Já não parecia um rascunho. Parecia um mapa. «Um mapa.» O que significava aquilo? Se Arthur estava fazendo um mapa para seu pai, por que não lhe havia dito nada? «Tentava ocultá-lo.» Anna deu vários passos à frente presa de um pavor inexplicável. Tentou dissimular o tremor de sua voz: —Interessante mapa. —Tinha a garganta muito seca, de modo que, mais que falar, pigarreava — De onde o tirastes? —Nossos homens o interceptaram de um mensageiro inimigo —respondeu Alan, passando os dedos por seus finos traços — A verdade é que é muito bom. Magnificamente detalhado. Anna não ouviu mais que as palavras
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«mensageiro
inimigo».
Empalideceu
ao
momento; seus piores temores, aparentemente, confirmaram-se. «É um espião.» —Sabe algo a respeito, filha? Anna voltou o olhar para seu pai. Abriu a boca
para
pronunciar
as
palavras
que
condenariam Arthur, mas ficaram congeladas em sua boca. Não podia. Não podia fazer. Não antes de lhe oferecer uma oportunidade para explicarse. —Nada — se apressou a dizer baixando os olhos, incapaz de lhe sustentar o olhar. Alan
a
observava
com
expressão
de
estranheza. —Está segura de que não te encontra mal, Annie? Não tem bom aspecto. Não se encontrava muito bem. Tinha enjôos.
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Como se o aposento girasse a seu redor ou as tábuas do chão se desprendessem a seus pés. Cambaleou e deu um passo para recuperar o equilíbrio. —Eu… eu acredito que será melhor que volte para meu aposento. Alan foi para ela com o desassossego marcado no rosto. —Acompanho-te. —Não.
—Anna
negou
com
a
cabeça
energicamente, reprimindo umas lágrimas que lhe ardiam nos olhos — Não é necessário. Estou bem. Sigam com o que estão fazendo. Anna saiu antes que seu irmão pudesse oporse. Apressou-se a chegar ao barmkin consumida em uma sensação de sufoco. Abriu a porta da torre da comemoração e se sentiu reconfortada pelo
golpe
de
ar
frio
da
noite.
Inspirou
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profundamente,
enchendo
os
pulmões
e
procurando estabilizar sua acelerada respiração. Aferrou-se ao corrimão de madeira que coroava a escada como se fosse um cabo de salvamento, deixando que o ar fresco e o tranqüilizador dossel da
negra
e
fechada
noite
acalmasse
a
precipitação de seu coração, de seu fôlego e, sobretudo, de sua cabeça. Vários dos homens que vigiavam o barmkin ficaram olhando-a, mas Anna estava muito desgostada para preocuparse
com
isso.
Desgostada?
Não,
aturdida.
Destroçada. Horrorizada. Sua cabeça ainda dava voltas, incapaz de acreditar. Tentava decidir o que devia fazer, se percorria o pátio, chamava nas portas dos barracões e perguntava por ele, mandando ao diabo toda correção, quando as portas se abriram e saiu um grupo de soldados vestindo armadura
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completa. O coração lhe deu um tombo ao conscientizar-se de que um deles era Arthur. Dirigiam-se para os estábulos. Estava partindo. «Partindo.» Agarrou-se ao corrimão com força até que a madeira se estilhaçou em suas mãos. Ficou olhando com o peito ardendo de dor e uma parte de si ainda recusava a acreditar. Arthur pareceu advertir o calor de seu olhar e deixou pela metade o que estava fazendo para erguer os olhos. Seus olhos se encontraram entre a luz mortiça que proviam as tochas. Arthur disse algo a um dos homens, separou-se do grupo e caminhou
em
sua
direção.
Anna
inspirou
profunda e entrecortadamente e se dispôs a baixar a escada para encontrar-se com ele ao final desta. Seu coração se deteve o ver seu rosto. Como podia lhe olhar com tal cara de
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preocupação e planejar traí-la ao mesmo tempo? —O que passou? —perguntou — Fiquei preocupado ao não te ver antes. Ele se aproximou dela, mas Anna se revolveu. Não podia permitir que a tocasse. Somente serviria para confundi-la mais ainda. —Preciso falar contigo. A rigidez de sua voz despertou os temores de Arthur. Dirigiu seu olhar para os estábulos, onde os homens tinham desaparecido. —Não
tenho
muito
tempo.
Estão
me
esperando. —Parte… sem dizer adeus? O pequeno tremor que apareceu em seu queixo o delatava. Sinal de que se sentia culpado. —Não é mais que a ronda noturna. Estarei de volta em umas horas.
812
—Está seguro? Não me advertiu de que talvez não retornaria? Arthur examinou com atenção seu rosto e pareceu
conscientizar-se
de
que
algo
ia
realmente mal. Consciente dos homens que patrulhavam a seu redor, a tomou pelo braço e a levou para o jardim que havia na parte posterior à torre, onde ninguém poderia ouvi-los. Agarrou-a pelos ombros para virá-la para si e a olhou com expressão severa. —A que se deve todo isto, Anna? Anna ergueu o queixo, odiando que a tratasse como se fosse uma menina pesada. —Sei. —O que é o que sabe? Um soluço apareceu em seu peito, mas conseguiu controlá-lo. As palavras saíram como um torvelinho.
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—Sei a verdade. Sei por que está aqui. Sei que me salvou no Ayr. Sei que trabalham para eles — disse Anna, quase cuspindo essa última palavra, incapaz de pronunciá-la. Ele trabalhava para o inimigo mortal de sua família. Ficou imóvel, suas feições tinham sido adestradas para a impassibilidade. A Anna caiu a alma aos pés. Essa falta total de reação lhe condenava mais que uma negação. —Está transtornada —disse Arthur com calma — Não sabe o que está dizendo. —Como te atreves! —exclamou Anna com voz tremente e uma emoção que ardia em seu peito até converter-se em um acesso de raiva — Não te atreva a mentir! Vi esta manhã agarrar a lança ao vôo e rompê-la com o joelho. Somente vi isso uma vez em minha vida. Não recorda
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como saíram a me resgatar aquela noite? Um espião dos rebeldes que se fazia passar por cavalheiro? Recebeu uma flechada no ombro por isso. —Tinha vontade de lhe arrancar a armadura e lhe obrigar a que o reconhecesse — Tem uma cicatriz exatamente no mesmo lugar. —Fez uma pausa para que o negasse, quase esperando que lhe desse uma explicação, mas o silêncio enchia o ar estagnado entre ambos — Vi o mapa, Arthur. O mapa que permitiu que eu acreditasse que era um desenho. O tiraram de um mensageiro inimigo — continuou, desafiando-o ainda com o olhar — Talvez devesse chamar a meu pai e que ele seja quem diga. Arthur
franziu
os
lábios
até
que
embranqueceram. Agarrou-a pelo cotovelo e a aproximou mais a si. —Baixe a voz —advertiu — Poderiam me
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matar somente por me acusar disso. Anna se serenou, aplacando um tanto sua ira, consciente de que o que dizia era certo. Arthur a dirigiu para um banco de pedra e a fez sentar-se. —Não se mova. —Aonde vai? —perguntou Anna, irritada por receber ordens dele. —Dizer-lhes que me atrasarei — respondeu Arthur, olhando-a com expressão severa. Capítulo 22 «Pense! Maldita seja, pense!» Arthur levou um tempo para informar aos homens de seu atraso enquanto tentava acalmar a violenta corrente de sangue que afluía por suas veias. Mas todos seus instintos primários de sobrevivência tinham despertado em uníssono
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em resposta ao perigo. O pior tinha acontecido. Tinham-no descoberto. Anna tinha adivinhado a verdade. Amaldiçoou ao idiota de seu irmão por lhe jogar aquela lança, que além de que estivera a ponto de lhe atravessar a cabeça, e também a si mesmo por ser tão pouco cuidadoso com o mapa. Sua missão acabava de ir-se ao vinagre, e, a menos que pudesse encontrar uma maneira de justificá-lo, tudo indicava que não viveria para ver o seguinte pôr-do-sol. Não podia pensar no que significaria seu fracasso para Bruce. Se não os avisasse, iriam diretos para a armadilha. Uma vitória dos MacDougall poderia fazer que a guerra mudasse de novo. Apesar de não advertir nenhum perigo ao sair dos estábulos, Arthur não tirava as mãos de suas armas,
quase
esperando
encontrar-se
aos
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soldados de Lorn aguardando. Mas Anna não tinha avisado a seu pai. Ainda não, ao menos. Esperava-lhe no banco no que ele a tinha deixado. Respirou algo mais tranqüilo em seu caminho de volta ao cruzar o pátio, embora ainda não tinha claro o que lhe diria. Não era só sua integridade e a missão o que estava em jogo. Se ainda ficava a esperança de uma vida em comum para ambos, seria nesse momento quando teria que conseguir que Anna entendesse suas razões. Ela não o olhou quando se aproximou, mas sim ficou contemplando a escuridão em silêncio, com um rosto que era uma pálida máscara de angústia. Sentou-se junto a ela com uma sensação de impotência absoluta. Queria tomá-la em seus braços e lhe dizer que tudo sairia bem, mas sabia que não era certo. Tinha-a traído.
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Pouco importa que não pode evitar. —Não é o que pensa — disse brandamente. —Não pode fazer uma mínima idéia do que penso. —A voz de Anna estava carregada de emoção. Quando se voltou para ele, com seus grandes olhos azuis alagados de lágrimas não derramadas, Arthur sentiu uma pontada no coração que lhe fez estremecer — Diga que não é certo, Arthur. Diga que tudo é um engano. Diga que não é o que acredito que é. Deveria. O que significava uma mentira mais em cima de tantas outras? Podia tentar negá-lo. Talvez chegasse a convencê-la. Mas duvidava muito. Ela sabia. Via-o em seus olhos. E se lhe mentisse
nesse
momento,
jamais
teria
a
possibilidade de que o compreendesse. Se queria que eles tivessem uma oportunidade como casal, teria que lhe contar a verdade.
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Olhou-a nos olhos. —Jamais quis lhe fazer dano. Anna emitiu um som, um gemido de dor que parecia provir de um animal ferido, um gatinho de pele aveludada apanhado em uma armadilha para ursos. Não pôde evitar. Aproximou-se dela para acalmá-la, mas Anna deu um coice. —Como é capaz de dizer tal coisa? Utilizasteme. Mentiu em tudo o que era importante. —As lágrimas brotaram das comissuras de seus olhos e caíram em corrente por suas bochechas — Houve algo real? Ou fazer que me afeiçoasse de ti também era parte do plano? —O que passou entre nós foi real, Anna. Nunca foste parte do plano. Jamais deveram fazer parte disso. Isto não tem nada que ver contigo. —Então com o que tem que a ver? Com o
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Robert Bruce? Com as velhas rixas? Com seu pai? —Arthur apertou os punhos e pigarreou — Assim é por seu pai… Culpa ao meu de sua morte —disse, retirando-se dele — Não é mais que um horrível e retorcido feito de vingança. Quer a destruição de minha família porque seu pai morreu na batalha, não é isso? O que é o que planeja, assassinar a meu pai para vingar a morte do seu? —ficou paralisada pelo horror — meu Deus, isso é o que planeja fazer. Arthur apertava com força os dentes. Dito por ela, soava como algo infame. Simples. Mas era tudo menos isso. Anna, cega pelo amor que tinha a sua família, estava incapacitada para ver o que acontecia a seu redor. Odiava ter que ser ele quem lhe abrisse os olhos, mas não restava outra alternativa. —É seu pai quem acabará com o clã e não
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eu, Anna. Robert Bruce fez o que ninguém acreditava possível. É a melhor opção da Escócia para nos liberar do jugo inglês. Ganhou os corações do povo. Mas o ódio de seu pai e seu orgulho lhe impedem de vê-lo desse modo. Prefere ver uma marionete inglesa no trono… Os MacDougall ficam sozinhos, Anna. Inclusive Ross acabará rendendo-se. Anna ficou completamente rígida. —Meu pai faz o que considera correto. —Não, seu pai faz tudo o que está em sua mão para não admitir a derrota. Não se equivoque em relação às razões de tudo isto. Seu pai preferiria os ver mortos antes que aceitar a derrota. Advertiu a indignação que ruborizava suas bochechas. —Vocês não sabe nada de meu pai.
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Anna fez uma tentativa de levantar-se, mas ele a agarrou pelo pulso e a obrigou a permanecer sentada. —Sei mais do que queria a respeito de seu pai. Sei exatamente do que seria capaz por ganhar. Anna tentou libertar seu braço. —Me solte. —Não até que ouça tudo o que tenho a dizer. Não havia nada que desejasse menos que desiludi-la, mas era consciente de que não podia protegê-la da verdade durante muito mais tempo. —Não vos disse tudo o que vi o dia em que mataram a meu pai. —Não quero… —Entretanto,
ouvirá
—a
interrompeu
—
Embora não queira fazer. Eu estava nessa colina e o vi tudo, Anna. Meu pai tinha ao seu a mercê
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de sua espada. Poderia tê-lo matado e, não obstante, teve piedade dele. Seu pai aceitou os termos, acordou a rendição e depois, quando meu pai deu a volta, matou-o. Anna deixou escapar um grito afogado com uns olhos cheios de horror e incredulidade. —Está errado. Meu pai jamais faria algo tão desonroso. Arthur a agarrou firmemente e a obrigou a olhá-lo nos olhos. —Eu estava ali, Anna. Vi e ouvi tudo, mas não pude fazer nada para detê-lo. Tentei advertir a meu pai, mas era muito tarde. Lorn me ouviu e enviou a seus homens a que me caçassem, e tive que me ocultar na floresta durante uma semana. Quando saí dali, era muito tarde para mudar a história. Ninguém teria acreditado. Arthur se deu conta do pânico que a
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sobressaltava.
Sentiu
seu
coração
bater
fortemente contra o peito. Lutava por aferrar-se a qualquer fio que pudesse preservar suas ilusões em relação à verdadeira pessoa que ela via em seu pai. —Deve ter interpretado mal o ocorrido. Estava muito longe. —Não interpretei mal nada, Anna. Ouvi tudo. Equivocava-se. Tinha que equivocar-se. Não era certo? Seu pai tinha mau gênio, mas ela sabia que tipo de pessoa era. Voltou-lhe as costas bruscamente. —Não acredito. O pesar de seus olhos cortava mais que o cristal. — Pergunte tu mesma. —Anna não disse nada. Não queria atender a razão — Seu pai não se deterá ante nada para conseguir a vitória,
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Anna. Nada. Por todos os diabos, se inclusive utilizou a sua própria filha… Anna ficou tensa, ofendida por tal acusação. —Já vos disse que a aliança com o Ross foi minha idéia. —Não estou falando disso. Refiro-me a lhe usar como mensageira. Anna ficou sem fôlego. Sabia? Céu santo, teria devotado informação sem ser consciente disso? —Quando? —exclamou — Desde quando sabes? —Não
o
descobri
até
umas
semanas,
infelizmente. —Seu rosto tinha uma expressão temível — Por todos os Santos, Anna! Sabem o perigo que correstes? —Sim, mas nunca imaginei de onde provinha. «De ti.» Ele era o inimigo. Ele a espiou e fez
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quanto pôde por… Anna ficou olhando-o ao mesmo tempo em que todas as terríveis conseqüências iam em turba a sua mente. De repente deu um salto para trás, horrorizada. «Não, isso não, por favor.» Lhe revolveu o estômago. —Por que insistiu em me acompanhar ao norte, Arthur? —Para te manter a salvo. —E para evitar uma aliança com o Ross? —Sim, em caso de que fosse necessário — disse, fazendo frente a seu olhar sem pestanejar. A dor machucava tanto o coração de Anna que se afogava em seus próprios soluços — Mas não é o que pensa. Aquilo não formava parte de meus planos. Era como se a fustigassem por dentro. Parecia sangrar-se, como se estivesse em carne
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viva. —E acha que tenho que acreditar? Arthur contraiu a mandíbula. —É a verdade. O que ocorreu naquele aposento foi porque o ciúmes e o medo de te perder me deixaram meio louco. Não me orgulho do que fiz, mas juro Por Deus que não o tinha planejado. —Ocorreu por acaso, isso quere dizer? E o que passa com o de ontem à noite? Ocorreu também por acaso? —Sua voz se quebrou pela emoção que a embargava — Como pode, Arthur? Sabias o que acabaria passando e mesmo assim me deixou acreditar que te importava, que queria te casar comigo. E não eram mais que mentiras. Como podia ser tão idiota para oferecer-se a um homem que planejava traí-la, trair a todos
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eles? —Não
—
disse
Arthur
com
rudeza,
obrigando-a a lhe olhar nos olhos — Não era mentira. Nada disso era mentira. Eu… — Vacilou, como se aquelas palavras não coubessem em sua boca — Eu te amo, Anna. Nada me faria mais feliz que me casar contigo. Por um estúpido momento o coração lhe deu um tombo ao escutar essas palavras que tanto tempo tinha esperado. Umas palavras que deviam fazer que tudo fosse perfeito, mas que não conseguiram mais que afundar na desgraça daquele assunto. Era um homem cruel. Era cruel lhe dizer aquilo que tão desesperadamente ansiava ouvir. Bem certo, não fazia mais que manipulá-la para que não o delatasse. «Delata-o.» Oh, Deus, o que poderia fazer?
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Tinha a obrigação de dizer a seu pai o que acabava de descobrir. Mas se o fizesse não cabia a menor duvida do que aconteceria. Arthur morreria. E se não o fizesse, Arthur passaria ao inimigo a informação que tinha obtido. Tratava-se de uma escolha impossível, mas sabia que, apesar de tudo o que Arthur fizesse, não podia ser ela quem jogasse o laço ao seu pescoço. Um só homem não podia derrotar a um exército. —De verdade espera que acredite que me ama? Arthur adotou uma postura rígida, mas seguiu olhando-a nos olhos. —Sim, espero. Não tenho nenhum direito a fazer, mas essa é a verdade. Jamais antes disse essas palavras a ninguém e nunca pensei que o faria. Mas do primeiro momento que te vi, senti algo especial. Sei que você também o sentiu,
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uma conexão a que não me pude resistir. —O que sentia era luxúria — disse Anna devolvendo suas palavras. Arthur franziu os lábios. Ela era consciente de que o estava levando ao limite, mas se sentia muito doída e furiosa para que lhe importasse — Como pode esperar que acredite em seu amor quando me mentistes
do
primeiro
dia
em
que
nos
conhecemos? —O que queria que fizesse? Não estava em posição de dizer a verdade. Acredita que eu queria que acontecesse isto? Por Deus santo, é a última pessoa no mundo que queria me ter apaixonado. —Anna se estremeceu. Supunha que isso tinha que fazê-la sentir melhor? Embora lhe doesse que aceitasse seus sentimentos com tal dificuldade, as palavras de Arthur tinham o distintivo da verdade — Tentei me manter à
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margem —assinalou, dando rédea solta a sua frustração — Mas não me permitiram isso. —Então é minha culpa, não? Arthur suspirou e voltou a levar as mão aos cabelos. —Não, é obvio que não. Inclusive caso tivesse me evitado, eu teria me apaixonado por você a distância. Atraiu-me desde a primeira vez que a vi. Sua calidez. Sua vitalidade. Sua doçura. É tudo que não sabia que perdia na vida, o que não acreditava possível para mim. Jamais quis ter esse tipo de intimidade com alguém até que a conheci. —Apesar de todas suas tentativas para não cair em seus enganos de novo, Anna não pôde evitar que seu coração se comovesse. Arthur a puxou pelo queixo e voltou seu rosto para olhá-la nos olhos — Sei que não posso esperar que acredite, Anna, mas sim espero que
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tente compreender que o fiz o melhor que pude dadas
as
difíceis
circunstâncias.
Estava
condenado a lhe trair inclusive antes que nos conhecêssemos. Os olhos de Anna examinaram seu rosto em busca de sinais de engano, mas somente encontravam sinceridade. Queria acreditar, mas como podia fazer sabendo o que pretendia? Inclusive no caso de que seus sentimentos fossem sinceros, tinha a intenção de traí-la. Ele estava em um lado e ela no outro. Queria matar a seu pai. Anna voltou o rosto bruscamente, receando sua própria debilidade. Quando a olhava com essa expressão, somente podia pensar em lhe beijar e no quão protegida se sentira entre seus braços, fingindo que tudo sairia bem. —Como poderia acreditar que te importo
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quando está aqui para nos espiar, destruir a minha família e se vingar de meu pai? Se me amas de verdade, não poderia fazer. Os olhos de Arthur brilharam com força na escuridão, como se queria discutir com ela mas compreendesse a inutilidade do gesto. —O que outra coisa poderia fazer? —Poderia deixar de lado sua ânsia de vingança. —Olhou-o nos olhos, consciente de que estava a ponto de lhe pedir um impossível, mas sabendo também que essa era a única oportunidade que teria para ambos — Poderia escolher ficar comigo. Arthur ficou petrificado. Maldita seja por lhe fazer isso! Por lhe fazer escolher. Pedia-lhe quão único não podia dar. Não podia jogar por terra toda sua honra e lealdade, nem sequer por ela. Seu rosto adotou o aspecto do granito.
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—Fiz um juramento, Anna. Jurei dar minha espada
ao
Bruce.
—E
ao
Guarda
dos
Highlanders, pensou — Ir contra isso seria ir contra minha consciência. Ir contra todo aquilo no que acredito. E apesar de que tenha razões para acreditar o contrário, sou um homem de honra. Era o dever, a lealdade e a honra o que o tinham levado até ali. —Mas isto não é só uma questão de honra. Não é certo? —desafiou-o — É uma questão de vingança. Quere a destruição de meu pai. —Quero justiça — disse Arthur esticando a mandíbula. Seus
grandes
olhos
o
olhavam
com
expressão luminosa e suplicante, remoendo sua consciência. Anna pôs uma mão sobre a sua, mas pareceu que com ela se agarrava a seu coração.
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—É meu pai, Arthur. Pareceu que todo seu interior se retorcia. Essa suave súplica chegava mais fundo do que gostaria. Como era capaz de lhe fazer isso? Como podia apertar as porcas para que ele se visse na necessidade de fazer quanto pudesse por satisfazê-la? Mas era impossível. Isso não podia fazer. Durante quatorze anos sua vida se centrou em uma só coisa: desfazer uma ofensa. Tinha esperado muito tempo para encontrar-se com o Lorn cara a cara no campo de batalha. Assim como não podia negar seus sentimentos por ela, tampouco podia evitar sua promessa de justiça. —Acredita que não sou consciente de que se trata de seu pai? Acha que não passei cada um dos dias destes dois últimos meses desejando que não fosse assim? Eu não queria que
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acontecesse nada disto, maldita seja. As lágrimas brilharam nos olhos de Anna. —Acredito que isso já deixa suficientemente claro. Seus sentimentos por mim são um obstáculo. —Eu não disse isso. —Arthur apertou os punhos. —Não têm nada que explicar. Acredite, entendo. A aspereza de seu tom deixava muito claro os sentimentos de Anna. Levantou-se do banco e caminhou uns passos para o interior do pátio com o olhar perdido na escuridão. —Parte —disse sem expressão na voz — Parta antes que mude de opinião. Não podia acreditar que fosse o deixar partir. Por um segundo teve um brilho de esperança. Isso somente podia significar que ela ainda lhe
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amava, pois ao deixá-lo partir anteporia-o a sua família. E tinha que partir. Não gostava da idéia de deixá-la plantada assim, mas tinha que advertir ao rei. Aproximou-se dela, ficou a seu lado, tomou pelo cotovelo e a atraiu para si com delicadeza. Dava a impressão de ser mais jovem e frágil à luz da lua, com esse rosto pálida que parecia um ovalóide de alabastro. —Juro-lhe que voltarei assim que possa. Anna negou com a cabeça sem deixar de olhar ao infinito. —Já têm feito sua escolha. Se partir agora o fará para sempre — disse, olhando-o ao fim com um rosto imperturbável — Não quero voltar a te ver jamais. A determinação de sua voz cortava como uma espada. —Não diz a sério. —Não podia falar sério.
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Era sua raiva que falava. Mas a rigidez da posição de seu queixo fez que o pânico corresse pelas veias de Arthur. Conhecia essa expressão. Atraiu-a para si com força, consciente de que tinha que fazê-la entrar em razão — Não diga algo do que poderia te arrepender. Anna escoiceou ao sentir o contato. —O que faz? Me soltem! —Deu-lhe um empurrão para desembaraçar-se dele. Mas seus esforços não fizeram mais que aumentar a sensação de pânico de Arthur. Tinha que fazer o ver. Como podia negar? Acaso não sentia ela a energia que desprendiam seus corpos? O calor? Estavam destinados um para o outro. Ficou sem palavras e sem tempo, de modo que a beijou, capturando sua boca com a dele em um desesperado e feroz abraço. Ela ficou
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lívida, já sem lutar, simplesmente deprimida sobre seus braços. «Não, maldita seja. Não.» A ausência de reação piorava a sensação de urgência. Beijou-a com mais força, com mais paixão, obrigando-a a abrir os lábios, procurando algo que muito temia lhe estava escapando entre os dedos. Seus lábios estavam quentes e suaves, seguiam tendo sabor de mel, mas nada era como antes. «Ela não quer que a beije.» deteve-se. «Que demônios estou fazendo?» Deixou-a ir ao mesmo tempo em que soltava uma imprecação e ficava olhando com horror. Nunca antes tinha feito algo assim. A idéia de perdê-la fazia que se voltasse louco. —Deus, Anna! Sinto—disse com uma voz rouca e entrecortada pela aspereza de seu fôlego. Merecia que lhe dirigisse esse olhar, como se
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ele fosse o barro que se aderia a seus sapatos. —Jamais acreditei que fosse um bruto, mas dá a sensação de que está em seu lugar junto ao rei usurpador. Simplesmente tomam quanto querem. —Anna, eu… —Parte de uma vez — disse ela com Isso é o melhor que pode fazer. Já têm feito suficiente dano. —Olhou-o nos olhos, desafiante — Acaso pensava que poderia te perdoar isto? Era a confirmação de seus piores temores. Fora um idiota. Permitia que as emoções turvassem sua percepção da realidade. Pensava que seria possível um futuro para eles pela simples razão de que a queria mais que a tudo no mundo. Mas nunca tivera nem a mais mínima oportunidade. Jamais lhe perdoaria aquilo que a obrigação, a honra e a lealdade lhe impunham.
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Fixou os olhos em Anna em busca de algum sinal de debilidade, mas ela o olhava com frieza, imutável. A ausência de lágrimas, ira ou emoção não deixava lugar a dúvidas. Tudo tinha acabado. Deus, tudo tinha acabado de verdade. Arthur sempre soube que poderia chegar este momento, mas nunca esperou sentir-se tão impotente e desesperançado. Jamais pensou que doeria tanto. Parecia que o tivessem quebrado em mil pedaços por dentro e não houvesse nada que fazer a respeito. —Vos amo, Anna. Sempre te amarei. Nada poderá mudar isso. Espero que algum dia compreenda que nunca quis te fazer dano. Alongou o braço para tocar sua bochecha uma vez mais, incapaz de deter-se, mas ela se separou dele como se fosse um leproso e sua mão caiu sem força sobre o ar.
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—Adeus. Dito isto, Arthur a olhou pela uma última vez, uma imagem que teria que reter para sempre, deu meia volta e abandonou o lugar. Jamais esqueceria o aspecto que tinha naquele momento: pequena, sozinha; de uma beleza dolorosa, com seus longos cabelos dourados caindo sobre os ombros em sedosos cachos e seus delicados traços resplandecendo sob a opalescente luz da lua. Tão frágil que poderia
romper-se
como
o
cristal.
Mas
determinada. Com uma determinação atroz. Parecia ter o peito ardendo e que seu calor se intensificava a cada passo. Acreditava caminhar sobre as brasas do inferno e que o peso de suas pegadas
fosse
pura
agonia.
Não
podia
desprender-se da sensação de que estava mal deixá-la ali de tal modo, de que não fazia o
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correto nesse momento, depois já não teria oportunidade de fazer. Estava a meio caminho da estrebaria quando se voltou. Mas já era muito tarde. Ela não estava. Olhou para o alto da escada que conduzia à torre da comemoração e alcançou a ver uma mecha de cabelo dourado seguindo a esteira de sua figura como se de um pendão se tratasse antes de desaparecer depois da porta. Uma vez esta se fechou, pareceu que algo se fechava também em seu interior. Para sempre. Era uma parte dele que jamais devia ter aberto. Isso era o que conseguia por relacionarse
intimamente
com
as
pessoas.
Estava
destinado à solidão. Nunca deve esquecer isso. Tentou evitar o vazio que ardia em seu interior. Tinha que deixar de pensar nisso. Precisava centrar-se na tarefa que tinha entre as mãos. Mas o rosto de Anna seguia aparecendo
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ante ele. Perseguia-o. Distraía-o. Entrou na cavalariça e se apressou a preparar seu cavalo. Apresentar-se voluntário à ronda
noturna
se
provou
duplamente
providencial. Não só servia como desculpa para sair do castelo, mas sim também significava que não teria que perder
tempo voltando para os
barracões. Seus pertences mais importantes levava consigo: a cota de malha e as armas. As mudas de roupas e os poucos artigos pessoais que tinha podia deixá-los ali. Os planos tinham mudado. Tinha que partir para sempre, por mais que isso significasse que Lorn estivesse a par de que seu plano estava em perigo. Não ficava mais opções toda vez que Anna tinha descoberto a verdade. Não podia arriscar-se a que ela mudasse de opinião. Não empregou mais de cinco minutos no
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estábulo. Não pensava mais que em sair dali quanto antes e pôr terra entre eles. Dizia a si mesmo que isso era o melhor que podia acontecer. Estava bem antes na solidão e voltaria a estar. Entretanto, não chegou a sair do estábulo. Seus sentidos o advertiram, mas não o fizeram a tempo. De novo suas emoções o distraíram. Embora nesse caso não teria feito diferença alguma. Abriu a porta do estábulo e se encontrou rodeado. John de Lorn e seu filho Alan flanqueados por ao menos uma vintena de guardas espadas em mão. A mandíbula de Arthur se contraiu pela dor que representava aquela punhalada nas vísceras. Não podia acreditar. Anna o tinha delatado. Talvez teria que ter esperado, mas não acreditava que seria capaz
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disso. Subestimou o amor que Anna tinha a seu pai e superestimou o que sentia por ele. Não havia razões para que encarasse como uma traição. Mas assim era. Lorn arqueou uma sobrancelha de maneira indolente. —Ia a alguma parte, Campbell? —Sim — respondeu despreocupadamente, como se não estivesse rodeado por homens armados — vou unir me ao grupo de vigilância noturna. —Olhou em redor, sem sinal de fingir sua indignação — O que significa isto? Lorn sorriu, embora em sua expressão não havia nenhum sinal de simpatia. —Temo que estamos obrigados a lhe reter um momento. Há vários assuntos que temos que esclarecer. Arthur deu um passo à frente. Ouviu o tinido
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do metal enquanto os guardas respondiam a sua afronta elevando as espadas e fechando o cerco a seu redor. Mas não era necessário. Estava apanhado. Talvez conseguisse abrir com golpes através
de
uma
vintena
de
homens
que
apontavam a seu pescoço as espadas, mas as portas do castelo já estavam fechadas. Não seria capaz de atravessar sem que todo o castelo se erguesse contra ele. Não havia saída. Olhou ao Alan, mas não obteria ajuda dele. Mostrava um olhar tão duro e inquebrável como o de seu pai, embora sem esse brilho de maldade acerada. Todos seus instintos clamavam por que lutasse, por desembainhar a espada e levar consigo a alguns homens de Lorn. Mas se obrigou a manter a calma. A não fazer nenhuma tolice. Sua missão era que vinha em primeiro. Se existia a mais remota possibilidade de que
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pudesse escapar para avisar ao Bruce, teria que considerá-la.
Talvez
pudesse
sair
desse
embrulho por meio do diálogo. Não estava seguro de quanto havia contado Anna. —Não pode esperar? —disse — Estão me aguardando. —Temo que não — repôs Lorn. Fez um gesto com a mão e dois de seus homens mais fortes se adiantaram para agarrar Arthur nos braços — Levem-no às masmorras. Revistem. «Diabos.» Ao que parecia não teria modo de sair dali por meio do diálogo. Tinha esquecido a nota, a mensagem que pensava deixar na cova essa noite para o rei. Um pequeno pedaço de papel dobrado que levava na bolsa com três palavras que selariam seu destino: «Ataque, 14, Brander». Embora talvez seu destino tivesse ficado
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sentenciado
dois
meses
atrás,
quando
se
encontrou cara a cara com a moça que acabava de resgatar de um ataque fatal. A garota que poderia desmascará-lo. Arthur emitiu um feroz grito de guerra que atravessou a noite e deixou que fosse seu instinto quem tomasse o mando: «Bàs roimh Gèill!». Morrer antes que render-se. Lutou como um selvagem e tombou a cinco soldados antes de cair sob o punho da espada do Alan MacDougall. À medida que a escuridão se abatia sobre ele, soube que aquilo não tinha acabado. E que estava a ponto de piorar. Queriam-no vivo. Capítulo 23 Supunha-se que não teria que sentir o
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coração partir-se. Anna queria que Arthur fosse embora. Tinha mentido. Tinha-a traído. Tinha-a usado. Queria destruir tudo que era importante para ela. Como podia pensar que existia possibilidade
alguma
de
continuar
juntos?
Inclusive chegava ao ponto de tentar beneficiarse da paixão que existia entre ambos. Como se um beijo pudesse fazê-la esquecer o que tinha feito. Odiou-o naquele momento. Odiou-o por manchar algo que era formoso e puro. Dizia a si mesma que isso era o que ela queria, mas assim que Arthur deu meia volta e partiu, o gelo de seu coração começou a racharse. Partia. Abandonava-a. Jamais voltaria a vê-lo. «Oh, Deus.» ficou completamente quieta, sem ousar mover-se ao estremecimento de seu
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interior. Sentia-se como uma fina lâmina de cristal sacudida por uma violenta tormenta de emoções.
Forte
na
superfície
e
frágil
na
realidade. Assim que o vento soprasse com força, romperia em mil pedaços diminutos. Não devia sentir-se assim depois do que tinha feito. Não tinha por que sofrer tanto. A dor. O remorso. A desolação. A sensação de que lhe arrancavam o coração. Essa intensidade de emoções parecia pura debilidade. Onde estava seu orgulho? Era uma MacDougall e entretanto, nesse momento, somente se sentia como uma garota que observa como o homem ao que ama parte de sua vida para sempre. Incapaz de suportar por um momento mais, temendo o que ele veria se desse a volta, pôs-se a correr. Subiu a escada tão rápido como pôde até que alcançou a segurança de sua câmara. Ali
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se desabou sobre a cama com cuidado de não despertar a suas irmãs, jogou a manta por cima da cabeça e se amassou sentindo-se como uma boneca de trapo. Somente então se deixou levar pela emoção e rompeu a chorar em silenciosos soluços que pareciam arrancados de sua própria alma. Escudeiro, sentindo sua angústia, se aninhou junto a ela. Anna abraçou ao cachorrinho e fez dessa cálida bola de pelo de amor incondicional sua
companhia
durante
daquela
longa
e
miserável noite. «Amo-te.» Não podia tirara as palavras da cabeça. Soavam tão sinceras… Mas Arthur tinha mentido em todo o resto, assim por que teria que acreditar nisso? Inclusive no caso de que fosse certo, não deveria ter importância. Anna repassava o
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ocorrido uma e outra vez, recordando cada uma das
palavras
de
sua
explicação,
sua
justificação… ou como que pudesse chamar aquilo que tentava fazer. Já era suficiente que estivessem em lados contrários da guerra, mas realmente esperava que ela compreendesse sua necessidade de destruir ao clã familiar? De matar a seu pai, o homem a quem ela mais admirava no mundo? E tudo por certa forma retorcida de vingança? Justiça, tinha chamado ele. Não queria ouvir suas explicações nem entender suas razões. E tampouco acreditou nem por um momento as mentiras que tinha dito a respeito de seu pai. Ele jamais teria matado a um homem de maneira tão desonrosa. «Faria tudo por ganhar», pensou tapando as orelhas com o travesseiro como se as plumas pudessem conter seus próprios temores. «Pergunte você mesma»,
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tinha-a desafiado Arthur. Não
precisava
perguntar.
Ela
sabia
a
verdade. Mas Arthur parecia muito seguro a respeito do que tinha visto. Anna saiu da cama assim que as primeiras luzes do amanhecer estenderam seu manto pelo chão. Fez suas abluções matinais e passou sigilosamente junto a suas irmãs para sair da câmara.
Sabia
exatamente
o
que
faria.
Demonstraria que Arthur se equivocava. Assim poderia deixar tudo aquilo atrás e deter esse miserável sofrimento de seu coração. Ainda não tinham disposto as mesas com seus cavaletes e alguns dos homens seguiam ainda despertando em seus lugares do grande salão quando se apressou para os aposentos de seu pai. Sabia que estaria de pé, apesar de que
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mal tivesse passado uma hora do amanhecer. Quando se preparava para a batalha, John de Lorn virtualmente não dormia. Ouviu sua voz assim que se aproximou da entrada. —Não me importa quanto tempo dure. Quero saber os nomes. —Não sei por quanto mais poderá… Alan deteve em seco suas palavras ao vê-la entrar no aposento. Com somente olhá-lo à cara, Anna soube que algo ia mal. Seu pai estava sentado à mesa. Frente a ele seu ajudante, o capitão da Guarda e seu irmão Alan. Seu pai entreabriu os olhos com ira ao vê-la, enquanto os outros desviaram o olhar, quase como se quisessem evitá-la. Anna, pensando que a irritação de seu pai se devia à interrupção, apressou-se a bater-se em retirada. —Sinto muito. Voltarei mais tarde.
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—Não —respondeu John de Lorn — Tenho que falar contigo. Já acabamos com isto. Não quero mais desculpa —disse ao Alan — Consiga o que quero. Custe o que custar. Alan franziu o cenho, mas assentiu. Anna sentiu uma pontada no coração ao ver que saía do aposento sem lhe dirigir a palavra, nem sequer um olhar. Tomou assento no banco que havia em frente a seu pai e cruzou os braços sobre o regaço. A intensidade de seu olhar a fazia sentir incômoda em certa forma. Estava furioso e não era por causa da interrupção. —Se tiver algo que me dizer, chega muito tarde. A Anna lhe encolheu o coração. —Algo… algo que lhes dizer? Seu pai tirou um pedaço de papel de sua bolsa e o pôs sobre a mesa ante ela. Um calafrio
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percorreu sua nuca ao reconhecer o mapa. —Sim —disse John de Lorn — Quando viu isto antes, por exemplo. —A vergonha tingiu as bochechas de Anna. Como o tinha averiguado? Seu pai respondeu à pergunta por ela — Sua reação. Que fosse lhe buscar imediatamente depois de ver o mapa confirmou a procedência. Acaso seu pai os tinha vigiado durante todo o tempo? Não, talvez no pátio, mas não era possível que os tivesse divisado no jardim, pois este não alcançava a ver do salão. Embora, obviamente, tinha visto o suficiente. —Não esperava isto de ti, Anna. Inclinou a cabeça, profundamente afetada por tê-lo decepcionado. Não tinha desculpa. Queria dizer que não estava segura, mas sim o estava. Assim que tinha visto o mapa, tinha sabido que Arthur era um espião.
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—Sinto muito, pai. Queria lhe dar uma oportunidade para que se explicasse. —E te satisfez sua explicação? —repôs seu pai com uma voz tão afiada como um látego. Ela negou com a cabeça. Embora sabia que tinha a obrigação de contar-lhe tudo, essas palavras seguiam sendo muito difíceis de dizer. Teve
que
recordar
que
Arthur
a
tinha
abandonado. —Sua lealdade está com Bruce — começou, detendo-se depois para olhar a seu pai com cautela — Disse que Bruce se ganhou o coração do povo. Que é a melhor alternativa para nos libertar da tirania inglesa de uma vez por todas. E que vamos perder e que será melhor que nos rendamos. Seu pai ficou vermelho de cólera. —E acreditou? Arthur Campbell diria tudo
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para ganhar sua simpatia. Você, pequena insensata… estava te utilizando para escapar. Jamais nos renderemos. E não vamos perder. A segurança de suas palavras jogou Anna em muitas dúvidas e a fez duvidar de se devia mencionar o resto. Seu pai já estava mais que zangado com ela, mas tinha que acabar com tudo aquilo. —Afirma que estava ali quando matou a seu pai e que ele viu tudo. A leve separação do olhar de seu pai poderia significar algo, mas fez que o coração de Anna se detivesse. —Isso é impossível — disse, descartando a idéia — Não sei o que veria, mas Colin Mor e eu estávamos longe do grupo. Não havia ninguém ali quando combatemos. Em qualquer caso, eu nunca neguei que caísse sob minha espada.
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Nem que a vitória que consegui para nosso clã fosse a causa da perda das terras dos Campbell no lago Awe. Que Arthur Campbell albergue desejos de vingança por isso é algo inevitável, mas não supõe desculpa alguma. Obrigou-se a olhar nos olhos, apesar de que se odiasse a si mesmo por repetir a acusação de Arthur. —Disse que seu pai o tinha sob a ponta de sua espada e que lhes ofereceu a rendição, que aceitou e que depois o assassinou quando deu a volta. Nessa ocasião a separação do olhar paterno não podia ser interpretada mal. Nem tampouco a tensão de sua mandíbula, nem as rugas brancas que se marcavam ao redor de sua boca. Estava zangado. Zangado sim, mas não quão ofendido deveria. O rosto de Anna empalideceu. «Oh,
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Deus. É verdade.» O horror que adivinhou na expressão de sua filha pareceu incomodar ao John de Lorn. —Aquilo ocorreu faz muito tempo. Fiz o que devia fazer. Colin Mor era cada vez mais poderoso; invadia nossas terras. Teria que detêlo. Anna parecia estar na presença de um estranho e que pela primeira vez via o homem que realmente era. Seguia sendo o mesmo pai ao que amava, mas já não era esse homem incapaz para ela de fazer nada mal. Já não era um homem ao que não podia questionar. Tinha deixado de ser um deus. Não, mostrava uma humanidade temível. Parecia-lhe imperfeito e capaz de cometer enganos. Grandes enganos. Enganos execráveis. Arthur tinha razão. Seu pai faria tudo pra
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ganhar. Nem sequer se deteria pelo bem de seu próprio clã. —Tem pouco pelo que me julgar, filha. Você, que deixa que alguém que trai nosso clã parta em liberdade… —Endureceu tanto a voz que quebrou — Sabe o dano que poderia ter feito? Seu pai tinha razão. Tinha decidido deixar livre Arthur, inclusive sabendo que poderia fazer dano a seu clã, porque não suportava a idéia de converter-se em instrumento de sua morte. —Não queria que lhe fizessem mal. Eu… lhe tenho carinho. —Anna ficou calada de repente, surpreendida
de
que
seu
pai
falasse
em
condicional — O dano que poderia ter feito? — perguntou. Seu pai franzia o cenho de modo forçado e a brancura de seus lábios contrastava com a cor avermelhada de seu irado rosto.
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—Tem sorte de que pudesse mitigar o desastre. Meus homens rodearam ao Campbell ontem à noite quando tentava a fuga. Levava uma mensagem que prova sua culpa —disse com os olhos ardendo
de fúria — Uma
mensagem que poderia ter arruinado tudo. Anna não podia respirar do horror que bulia em seu interior. O medo atendia seu coração e o espremia. —O que têm feito com ele? —Isso não é de sua incumbência. O pranto contido lhe ardia na garganta. Nos olhos. O pânico comprimia seus pulmões. Mal pôde pronunciar umas palavras: —Por favor, pai, simplesmente me diga… está vivo? Ele não respondeu imediatamente, mas sim a observou com seu frio e escrutinador olhar.
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—Por agora sim. Tenho algumas pergunta para ele. Anna fechou os olhos e exalou o ar com uma sensação de alívio assustadora. —O que farão com ele? Seu pai a observou com paciência. Era óbvio que não gostava daquele interrogatório. —Isso depende dele. —Por favor, tenho que o ver. Anna tinha que assegurar-se de que Arthur se encontrava bem. Seu pai pareceu ultrajado por tal petição. —Para que lhe deixe partir de novo? Não acredito — disse apertando a mandíbula com raiva — Não serviria de nada. Esse homem é perigoso e não se pode confiar nele. —Arthur jamais me faria mal — disse Anna sem pensar, para imediatamente conscientizar-se
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de que era a verdade. Ele a amava. Sabia que no fundo era certo. Não mudava nada do passado, mas talvez sim do futuro. O coração lhe encolheu. Se é que tinha um futuro — Por favor… Seus rogos caíam em ouvidos surdos. Os olhos escuros de seu pai a olharam com uma dureza inquebrável. —Arthur Campbell já não é teu assunto. Já tem feito suficiente dano. Como posso estar seguro de que não tentará procurar um modo de lhe ajudar? —Os protestos de Anna morreram em sua garganta. Para falar a verdade, tampouco ela podia estar segura. O medo que atendia seu coração
ao
pensar
que
Arthur
estava
encarcerado fazia que se inteirasse de que não era tão fácil evadir-se do que sentia por ele — Não esperava isto de ti, Anna. —A decepção de
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sua voz a rasgava até o mais profundo, e essa sensação se via agravada pela segurança de que merecia.
Mas
estava
entre
duas
águas,
apanhada entre dois homens que amava. Seu pai a despediu com um gesto anti-social da mão — Estará pronta para partir dentro de uma hora. Ficou sem respiração. —Partir? Mas pra onde? —Seu irmão Ewen partirá como vanguarda do exército com um contingente amplo de homens para assegurar nossas defesas em Innis Chonnel. Irá com ele. Uma vez que tenhamos mandado ao rei Hood ao inferno, fará uma visita a meu primo o bispo do Argyll em Lismore. Ali terá tempo de pensar no que tem feito e em onde reside sua lealdade. Anna assentiu com lágrimas cada vez mais abundantes. Estava claro que seu pai não
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confiava nela e não a queria no castelo enquanto ele permanecesse fora. Sabia que poderia ter sido pior, que o castigo de seu pai poderia ter sido muito mais severo. Mas não podia suportar a idéia de abandonar Arthur sem saber o que seria dele. —Por favor… Farei o que me peça. Mas me prometa simplesmente que não o matarão quando eu esteja fora —disse, engasgando-se com seus soluços — O amo. —Basta! Põe a prova minha paciência, Anna. Seus ternos desejos para esse homem lhe fazem esquecer seu dever. O único que te libera de um castigo muito pior é saber que talvez eu também tenha parte de culpa por te pedir que o vigiasse. Arthur Campbell é um espião. Sabia o risco que corria quando decidiu nos trair. Não terá nada menos do que mereça.
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Arthur já não sentia nada. Fazia horas que tinha ultrapassado a soleira da dor. Tinham-lhe batido, fustigado e quebrado cada um de seus dedos com o aplastapulgares15. Mas sim percebia o sabor do sangue. Esse nauseabundo sabor metálico enchia seu nariz e boca como se estivesse
afogando-se
nele.
Sua
cabeça
pendurava para frente e seu cabelo, molhado e empapado em suor e sangue, ocultava seu olhar daqueles que lhe rodeavam. Em algum momento da noite chegaram a ser mais de uma dezena os homens que tentavam fazer que se rendesse. Agora que os raios de sol atravessavam as seteras da masmorra, somente ficavam três deles. Estava preso a uma cadeira, mas não era 15
O aplastapulgares é uma das torturas mais antigas e simples. Embora vários dispositivos mecânicos foram usados para realizar a
tortura em si foi o esmagamento das unhas, falanges e juntas em um lento e gradual, estendendo-se a dor por dias, sem causar danos letais para a vítima. O nível de perturbação pode ser controlado, a ponto de quase mutilação do membro. Para crimes de tortura geralmente grave usa-se lentamente, começando com as unhas, passando depois para as falanges e terminando nas juntas, e destruindo completamente as duas mãos.
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necessário
imobilizá-lo.
Já
não
supunha
nenhuma ameaça. Tinham-lhe retorcido tanto o braço direito que tinha saído do ombro. Sua mão esquerda pendurava inerte junto a seu corpo, com cada um de seus ossos quebrados um a um com uma lentidão agonizante. E pensar que tinha rido a primeira vez que tinha visto aquele artefato… Aquela pequena braçadeira de metal parecia inofensiva, certamente nada que pudesse obrigá-lo a lhes contar o que queriam. Mas logo aprendeu como algo simples podia provocar um sofrimento terrível. Mais dor do que jamais tinha imaginado. Estivera a uma volta de lhes contar tudo que queriam saber. Teria dito o que fosse para que parassem. —Maldito seja, Campbell. Diga simplesmente o que querem saber. Arthur olhou a Alan MacDougall através do
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véu emaranhado de seu cabelo empapado. O irmão de Anna permanecia junto à porta como se não pudesse esperar mais para sair dali, com o rosto lívido e contraído. Quase parecia que fosse ele a quem torturavam. O herdeiro de Lorn não tinha estômago para isso. Mas seu ajudante sim. Arthur tinha a impressão de que aquele filho de cadela sádico poderia continuar com isso durante dias e dias. Apesar de não poder falar, emitiu uma espécie de grunhido e negou com a cabeça, sem forças. Não. Ainda não. Não lhes diria nada ainda. Entretanto, a palavra «nunca» já não aparecia entre seus pensamentos. A cabeça foi para trás, impulsionada pelo novo golpe daquele filho de cadela, que lhe sacudiu com um punho envolto em correntes que, bem, parecia uma marreta. —Os nomes —exigiu — Quem são os
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homens que lutam na guarda secreta? Arthur já não se incomodava em fingir ignorância. Não acreditavam. Anna o tinha condenado sem se dar conta disso. Graças ao acontecido no Ayr, quando ele a resgatou, e também ao último ataque nos bosques, Lorn estava seguro de conhecer menos a um dos membros da infame guarda fantasma. Não podia culpá-la por isso. E pelo que parecia, tampouco podia culpá-la por delatá-lo. Em algum momento da noite entre os golpes e o látego, Arthur percebeu de que, dadas as perguntas que lhe dirigiam, o mais provável era que estava errado. Em caso de que ela o tivesse traído, não havia lhes dito muito. Percebeu como o punho do filho de cadela voltava para ataque, como uma mancha negra nos limites de sua consciência. Preparou-se de
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maneira instintiva para o golpe embora soubesse que não serviria de ajuda, já que por seu tamanho e o poder de seus socos, diria que o ajudante provinha de uma longa dinastia de ferreiros. Entretanto, alguém bateu na porta e reclamou ao ajudante de Lorn, de modo que Arthur pôde recuperar um instante. Derrubou-se sobre a cadeira e procurou introduzir um sopro de ar em seus encharcados pulmões. Tinha uma costela quebrada como mínimo, embora achasse que fossem mais. —Eles o matarão se não contar — disse Alan. Arthur tomou seu tempo para responder, tentando fazer provisão das forças necessárias para falar. —Matarão-me de qualquer forma — grunhiu. Embora Alan não afastou o olhar, sua careta de agonia disse a Arthur que seu rosto devia
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refletir a dor que sentia. —Sim, mas será muitíssimo menos doloroso. E mais rápido. Contudo, Arthur tinha fracassado já muitas vezes e estava decidido a salvar o que pudesse daquela maldita missão. Se fosse capaz de confrontar o momento final sem revelar os nomes de seus companheiros de irmandade, revestiria sua morte com certa aparência de honra. Mesmo assim, dada a magnitude catastrófica de seus fracassos, não significaria mais que uma vitória vazia. Tinha perdido tudo. Anna. A oportunidade de destruir ao Lorn e render justiça a seu pai. E a oportunidade de avisar ao rei da ameaça. Bruce e seus homens iriam direto para a emboscada e ele não teria meios para lhes advertir. Tinha falhado igual falhou a seu pai.
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Que lhe batessem até convertê-lo em uma massa sanguinolenta, esfolassem-no até deixá-lo a borda da morte e lhe rompessem os dedos um a um servia para que seus pensamentos não escapassem das quatro paredes da prisão. Mas nos
pequenos
conseqüências
descansos
temia
que
captura
sua
as
outras pudesse
conduzir. Lorn amava a sua filha e não lhe faria mal; mesmo assim tinha que perguntar. —Anna? Alan o olhou com expressão grave. —Não está mais aqui — Arthur sentiu o mundo desabar sobre ele. Ao ver a horrorizada expressão de seu rosto, Alan se apressou acrescentar — Está a salvo. Meu pai pensou que era melhor tirá-la do castelo até que… Alan deteve suas palavras. «Até que esteja morto», disse-se.
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O ar voltou a encher seus pulmões. Somente a tinham enviado a outro lugar. Mas então o recordou. —Não… é seguro — conseguiu dizer. Em vésperas da batalha, Bruce teria linhas de ataque rodeando-os e estreitando o cerco. A severa expressão que se desenhou no rosto do Alan lhe dizia que não se mostrava em desacordo, mas, igual a Arthur, via-se impotente para detê-lo — Meus irmãos? —perguntou Arthur. Pode ser que Dugald e Gillispie fossem seus inimigos no campo de batalha, mas não queria que eles tivessem que sofrer suas preferências. —Meu pai não tem razão alguma para acreditar que estejam implicados. Fizeram-lhes um breve interrogatório e pareciam tão surpresos como o resto de nós. —deteve-se, com o olhar confuso — por que salvou minha vida? Não tinha
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por que fazer. Arthur sacudiu o cabelo do rosto para lhe olhar nos olhos. —Sim, tinha que fazer. Alan assentiu, compreendendo tudo. —Ama-a de verdade. Não disse nada. O que teria podido dizer? Nada daquilo importava. A porta se abriu e o ajudante de Lorn voltou a aparecer na saleta com uma corda na mão. A Arthur lhe acelerou o pulso como reação imediata ao perigo. —Hora de partir —disse — Os homens estão preparados para partir. Arthur se preparou para o pior, consciente de que tinha chegado seu final. Tinha ganho. Teriam que o matar. Uma pequena vitória nesse amargo mar de fracassos.
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—Então terá que enforcá-lo? —disse Alan. O ajudante sorriu, brindando Arthur com o primeiro sinal de emoção que percebia em seu feio e curtido rosto. —Ainda não. A corda é para o fosso. —O alívio que embargou Arthur indicou que não estava
tão
preparado
para
morrer
como
acreditava. Depois do que acabava de passar, o úmido buraco de uma fossa de castigo lhe pareceria o paraíso — Talvez os ratos lhe afrouxem a língua — disse o ajudante com uma gargalhada. Ou talvez um inferno em vida. O ataque de terror que atravessou seu corpo serviu para lhe dar um jogo de forças primitivo. Lutou contra o metal de seus grilhões como um possuído. Sua pele arroxeada e em tiras sucumbia diante da sensação de ter ratos
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percorrendo-a. Tinha que escapar dali. Mas não podia. Encadeado e ferido, não era rival para os guardas que o arrastavam dos calabouços até a sala contígua. Ao final nem sequer se preocuparam com a corda, mas sim o jogaram dentro. Escuridão. Chiados. Queda. Impacto. Um duro e arrepiante golpe. E
depois,
felizmente,
escuridão.
Só
escuridão. Capítulo 24 —Ewen, temo que preciso de um momento de privacidade —disse Anna, fingindo um rubor
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embaraçoso. —Já? —Seu irmão a olhou como se ela tivesse cinco anos. Estavam no coração da floresta, perto de um túmulo funerário, a uns três quilômetros do castelo — Por que não fez antes de sair? Anna o fulminou com o olhar para lhe comunicar que não fazia nenhuma graça que lhe falasse como se fosse sua mãe. —Porque então não precisava fazer. Ewen pôs cara feia. —Pararemos quando chegarmos ao Oban. Está a menos de dois quilômetros. —Não posso esperar tanto —repôs Anna negando com a cabeça — Por favor… — implorou com voz doída, removendo-se um pouco nos arreios para dar ênfase a sua urgência.
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Seu irmão murmurou uma maldição e depois se voltou para dar o alto à vintena de homens que
os
escoltavam
através
dos
perto
de
cinqüenta quilômetros que o separavam do Innis Chonnel, uma viagem que era muito mais rápido de navio mas que seu pai, depois de navegar do castelo com sua frota, tinha considerado muito perigosa. —Te apresse — disse com impaciência — Um de meus homens te acompanha… —Isso não será necessário — interrompeu Anna bruscamente. «Arruinaria tudo» — Eu… — continuou sem ter que fingir o abafado— Temo que esta manhã comi algo que me tem revolto estômago. Pode ser que tarde um pouco. A seu irmão pareceu lhe envergonhar que compartilhasse detalhes muito pessoais de um assunto que jamais devia mencionar-se. Anna
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mesma estava horrorizada pela natureza e o alcance de seu embuste, mas necessitava todo o tempo que fosse possível para escapar. Tinha que voltar para castelo. Não havia explicação para isso, mas do mesmo momento em que tinha saído dos aposentos de sua mãe essa manhã, não tinha conseguira deixar de lado a uma insuportável
premonição.
Talvez
estivesse
motivada pelas palavras de seu pai, mas ela sabia que algo sairia mal, terrivelmente mal. E essa sensação não tinha feito mais que piorar à medida que o castelo se desvanecia atrás deles sob a luz do sol. Não sabia o que poderia fazer; simplesmente, mas tinha que fazer algo. Pode ser que não tivesse nenhuma possibilidade de estar juntos, mas tampouco desejava sua morte, e dado que seu pai tinha partido do castelo atrás deles, aquela era sua oportunidade.
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Em conta da humilhação que supunha que vinte homens observassem como se afastava para fazer suas necessidades, Anna fez provisão de toda a dignidade com que contava, aceitou a ajuda que lhe oferecia o escudeiro de seu irmão para descer do cavalo, deu-lhe as rédeas e entrou em atitude régia para a densa folhagem de árvores e samambaias. Assim que esteve fora do olhar se arregaçou as saias e se pôs a correr. De ali não demoraria mais de dez minutos em chegar até o castelo. O que demoraria era convencer para que a deixassem entrar nos calabouços onde albergavam aos prisioneiros. Mas esperava conseguir antes
que seu irmão
Ewen se desse conta de que tinha desaparecido. Não demoraria muito em figurar-se aonde teria ido. E ao contrário dela, ele iria a cavalo. Correu através das árvores em paralelo à
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estrada para que não a vissem, procurando fazer o mínimo ruído possível. Mas as folhas secas e os ramos caídos faziam com que o silêncio fosse impossível. Ouviu um ruído atrás dela e quis gritar de raiva. Como tinham descoberto tão logo sua fuga? Escondeu-se depois de um penhasco em
uma
tentativa
em
ocultar-se,
mas
se
encontrou com que alguém pegava seu pulso por trás. —Me solte — disse, e tentou libertar-se. Como esperava topar-se com seu irmão ou com algum de seus homens, ao dar meia volta e ver um guerreiro de olhar feroz com elmo e nasal ficou lívida. Deixou escapar um grito de alarme, amortecido pela mão do homem. —Silêncio, moça! Não quero te fazer dano. Seu
temível
rosto
não
inspirava
muito
confiança. Tinha a compleição de uma montanha
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e uns traços toscos e rústicos que se adequavam perfeitamente a seu tamanho. Anna se obrigou a ficar quieta, fazendo ver que acreditava o que lhe dizia, mas depois, assim que ele se relaxou, golpeou-lhe tão forte como pôde com o salto da bota e lhe fincou o cotovelo no mais profundo de seu peitilho de couro, estremecendo-se ao golpear as partes de metal. O homem deixou escapar uma exclamação de surpresa, mas não afrouxou seu abraço o suficiente para que Anna pudesse libertar-se. Voltou a olhar com frustração e ficou imóvel, dessa vez de verdade. Havia algo familiar nele. Não, nele não. Em seu traje. Anna ficou sem respiração. O elmo escurecido, o cotun de couro negro tachonado com metal, o estranho corte da manta… Se tratava da mesma indumentária característica que levavam seu tio e os guerreiros
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da floresta do Ayr. Aquele homem formava parte da Guarda secreta de Bruce. Um fato que Anna viu confirmado só um momento depois. —Duvido que se fosse minha sobrinha acreditaria, Santo. Anna ficou atônita de surpresa ao ver que Lachlan MacRuairi saía de entre as árvores com outro guerreiro. —Santo, Templário — disse, assinalando em sua direção — Permitam que vos presente a lady Anna MacDougall. —Fez um gesto com a mão ao homem que a agarrava — Pode soltá-la. Não gritará, a menos que queira ver mortos seu irmão e ao resto de seus homens. Anna se esfregou a boca mal esteve livre, tentando recuperar as sensações. Olhou a seu redor. —Só são três.
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Seu comentário pareceu divertir sinceramente aos homens. —Dois a mais dos que precisamos — disse o terceiro deles. Era só um pouco mais baixo que os outros dois. Anna começava a pensar que ser um gigante recoberto de músculos era condição indispensável para ser membro do exército secreto de Bruce. Sob a sombra de seu elmo com nasal, o homem fazia ornamento de um sorriso tão afável como simpático. Templário, tinha o chamado seu tio. Um nome do mais estranho. Era muito jovem para ter lutado contra os infiéis. Fazia trinta e cinco anos da última cruzada. E ao homem que a agarrava MacRuairi o tinha chamado Santo. Anna percebeu de que tinham que ser apelidos, nomes de guerra. «Guardião!» Assim tinha chamado o guerreiro
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arrumado a Arthur na floresta. Seria esse seu nome de guerra? —O que fazes aqui, tio? Parecia estranho chamar «Tio» a alguém que não era mais que dez anos mais velho que ela. Não parecia muito maior que Arthur, embora devesse ter trinta e três ou trinta e quatro anos. —Talvez devessea lhes perguntar eu o mesmo. Por que fugistes de seu irmão e de seus homens? Não lhe surpreendia que MacRuari não respondesse
a
sua
pergunta.
Ou
estava
reconhecendo o terreno ou vigiando o castelo. Como estavam perto da costa, Anna supôs que teria chegado de navio. Lachlan MacRuairi era um pirata dos pés à cabeça. —Assim oferecem cobertura ao ataque de Bruce contra meu pai além mar — disse ela,
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tentando adivinhar seu propósito. Seu tio encolheu os ombros evasivamente. —Agora me diga, lady Anna, por que vos encontro correndo através da floresta? —Preciso retornar ao castelo. —Por que? Mordeu o lábio enquanto pensava no que devia lhes contar. Mas sabia que não tinha muito tempo. Já a tinham entretido muito. Custaria muito pedir a Deus ajuda retornar ao castelo antes que seu irmão Ewen a alcançasse. Talvez quisessem levá-la? —Têm cavalos perto? —perguntou. MacRuairi franziu o cenho. —Sim. Anna respirou aliviada. —Bem. Pode ser que precise sua ajuda para retornar ao castelo. Preciso me assegurar de que
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Arthur está bem. —Nenhum deles reagiu, e Anna supôs que assim devia ser. Não sabiam que ela estava a par da verdade — Acredito que o chama de Guardião. MacRuari amaldiçoou. —Ele lhe disse isso? Anna negou com a cabeça. —É uma longa história. Descobri a verdade por mim mesma. Infelizmente, não fui a única. Meu pai também sabe. MacRuari voltou a amaldiçoar, dessa vez fazendo uso de um impropério que inclusive o próprio pai de Anna rara vez usava. —Então… está morto. —Não — repôs ela, desconcertada por sua veemência — Encarcerado. Meu pai o está interrogando. MacRuairi cuspiu e um olhar de puro ódio
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atravessou seus escuros traços. —Em tal caso desejará estar morto. —A que se referia? Perguntou-se Anna. Seu tio, vendo a confusão em seus olhos, o explicou—: Estive do outro lado dos interrogatórios de seu pai. Tem uns métodos bastante persuasivos e imaginativos na hora de extrair informação. Se Guardião não estiver morto já, logo o estará. O estômago lhe decompôs para ouvir suas palavras. —Meu pai jamais… Não foi a expressão sombria do rosto do MacRuairi o que a deteve, a não ser a lembrança da conversa parcial que tinha ouvido antes de entrar na câmara de seu pai. «Consiga o que quero. Custe o que custar.» «Oh, Deus.» Anna se sentiu desfalecer. Seu pai o estava torturando. Sabia que esse tipo de
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coisas ocorria, claro, mas aquilo supunha uma parte feia da guerra em que não queria pensar. E tampouco gostava de pensar que seu pai pudesse
estar
comprometido
em
tamanha
crueldade. —Temos que o ajudar — quase gritou, com lágrimas nos olhos. O coração lhe deu um tombo em ouvir um grito a pouca distância deles. —Anna! —Estão-me chamando. Temos que partir já. MacRuairi negou com a cabeça. —Não há nenhuma necessidade de que venhas. Nos encarregaremos de tudo. —Mas… MacRuairi cortou seus protestos em seco. —Se vierem conosco, seguirão-nos. Custarános
menos
trabalho
lhe
ajudar
se
não
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suspeitarem nada. Voltem com seu irmão e continuem a viagem. —Mas pode ser que necessitem minha ajuda. —Anna desejava ver Arthur por si mesma — Como
chegarão
ao
castelo?
Como
o
encontrarão? O rosto do MacRuairi adotou uma expressão severa. —Sei onde está. —Pelo modo em que o disse, Anna soube que ele mesmo estivera ali; sentiu um calafrio. Mas o que lhe gelou o sangue foi a angústia que viu refletida em seus olhos. Deus, o que teria feito seu pai? E o que estaria fazendo Arthur? — Já têm feito suficiente —disse — Se Guardião está vivo, ele mesmo lhe agradecerá. «Se
estiver
vivo.»
Anna
reprimiu
suas
lágrimas e assentiu, consciente de que tinham
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razão. O melhor modo de ajudar Arthur era que fossem sozinhos para buscá-lo. Mas isso não fazia mais fácil vê-los desaparecer entre as árvores. Queria ir com eles. «Está vivo», dizia a si mesma. Tinha que estar. Se não fosse assim saberia, porque uma parte dela também teria morrido. Assim que estiveram fora de seu olhar, Anna começou a correr na direção oposta a que tinha tomado para chegar ali. Ao chegar a um pequeno córrego respondeu às chamadas de seu irmão. Teria que dar algumas explicações, mas, tendo em conta a natureza do assunto, não acreditava que Ewen se visse inclinado a lhe formular muitas perguntas. Tudo que Anna podia fazer era rezar para que se produzisse um milagre. Pois isso era o que necessitariam para resgatar Arthur do
virtualmente
impenetrável
castelo
de
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Dunstaffnage antes que fosse muito tarde. Arthur os deixava aproximar-se. Afinava seus sentidos para captar qualquer sinal de correria ou chiado e permitia que os ratos se aproximassem o suficiente para os agarrar. Assim podia lhes romper o pescoço com uma mão contra sua própria perna, algo que, dado que somente tinha uma mão operativa, parecia de tudo fortuito. O mal era que essa mão estava unida a um braço deslocado, com o que cada movimento lhe produzia uma dor atroz. Tentou recolocar o ombro por si mesmo, mas não tinha a força nem o apoio necessários. Acabar devorado por ratos famintos não era exatamente o modo em que esperava morrer, mas não sabia por quanto tempo poderia os manter a raia. Cada vez que desmaiava, suas persistentes
dentadas
despertavam.
Tinha
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perdido muito sangue e a cada hora que passava estava mais débil e pior respondiam seus sentidos. Logo não seria capaz de voltar a despertar. Teria matado já umas cinqüentas daquelas asquerosas criaturas segundo seus cálculos, mas havia centenas delas ali abaixo. Estremeceu-se. Quando iluminaram o vão com a tocha para jogálo lá dentro, o fundo do fosso se via repleto delas. Uma vez fechado, aquele buraco tinha ficado na mais absoluta escuridão. Dependia de seus sentidos, e estes o abandonavam lentamente. Seus olhos começaram a fechar-se. Estava tão cansado que somente queria relaxar-se durante um… «Ah!», gritou de dor, despertando à realidade graças a uns dentes afiados como facas que se cravavam em seu tornozelo. Esperneou e o rato
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voou pelos ares. Supunha que teria que agradecer ao Dugald o que fosse capaz de agüentar tanto tempo ali. Aquelas horas passadas na escura despensa lhe tinham servido de lição. Sabia que tinha que estar alerta e como antecipar os movimentos dos ratos. Mas as reações de Arthur eram cada vez mais lentas. Cada vez escapava um número maior delas e um número maior lhe mordia a mão. Sabia que não poderia durar muito assim. Não viriam a por ele até que não acabasse a batalha, e como tinha perdido a conta do tempo fazia já horas, não sabia quando seria isso. «Maldição.»
Não
era
só
o
horror
do
movimento dos ratos o que estava deixando-o louco, a não ser saber que seus amigos estavam ali fosse dirigindo-se para uma armadilha mortal e que não podia fazer nada para ajudar. Tinha
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fracassado. «Fracassado.» Fechou os olhos em uma tentativa de que a amarga verdade se desvanecesse. A languidez se abatia sobre ele. Cada vez lhe parecia mais difícil resistir e não deixar-se levar para essa bendita escuridão da inconsciência. Estava tão cansado… Seus olhos não voltaram a abrir-se. Nada poderia despertá-lo. Nem os ratos, nem a explosão de mil demônios que faria que os guardas corressem até as portas do castelo minutos depois. Alguém o sacudia. —Guardião! Guardião! Maldita seja, desperte! Não temos muito tempo. Quem era Guardião? Abriu
os
olhos
só
para
fechá-los
imediatamente ao sentir que a luz da tocha lhe atravessava o crânio como se fosse uma adaga.
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Guardião era ele. Mas como…? Voltou a abrir os olhos. Essa vez lentamente, permitindo que se adaptassem à luz. MacRuairi. Advertiu o alívio que se refletia no rosto do outro. —Não estava seguro de que seguissem com vida. A mente de Arthur estava embotada e pensada com lentidão. —Eu tampouco estava. MacRuairi se estremeceu, e Arthur percebeu que não tinha bom aspecto, inclusive diante da tênue luz da tocha. Tinha o rosto macilento e seus olhos foram parar de um lado a outro com inquietação. Quase se diria que tinha um ataque de pânico.
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—Saiamos
daqui
quanto
antes.
Podes
caminhar? Arthur assentiu e tentou incorporar-se por si só. Tomava cuidado de não olhar para baixo. A tocha mantinha aos ratos longe no momento. —Acredito que sim. —Melhor. Não tinha muita vontade de tentar te tirar daqui. MacRuairi lhe estendeu a mão, mas Arthur a rechaçou e as arrumou para ficar em pé por seus próprios meios. —Está sozinho? —perguntou. MacRuairi o olhou de cima abaixo, e em seguida fez uma idéia de qual era seu estado. Franziu o cenho ao conscientizar-se por que rechaçava sua ajuda. —Não. Santo e Templário estão comigo. Falcão queria vir, mas alguém tinha que ficar com
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a frota. Não ouviu a explosão? Arthur negou com a cabeça. —É assim como conseguistes entrar? MacRuairi lhe ajudou a assegurar a corda ao redor da cintura e entre as pernas. Umas pernas que, embora tremiam como se fossem as de um potro recém-nascido, conseguiram lhe manter em pé. —Não, mas não está mal como manobra de distração. MacRuairi se agarrou a uma segunda corda e subiu rapidamente. Depois içou o corpo de Arthur com a outra, o qual não parecia fácil, já que tinha um peso morto ao outro extremo. Mas MacRuairi, além de ser tão daninho como uma serpente, era além disso tão forte como um maldito boi. A sensação de alívio que assaltou Arthur ao estar
fora
daquele
buraco
infernal
era
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virtualmente assustadora. Tinha vontade de chorar
como
um
menino.
MacRuairi
se
desprendeu da manta que levava e a deu. Arthur tinha esquecido que estava nu. Aceitou-a com gratidão, ajustando-a ao redor da cintura e dos ombros o melhor que podia com sua mão maltratada. —O cheiro de merda de rato acabará desaparecendo. Arthur surpreendeu-se ao ver um traço de compaixão no olhar do outro. De repente percebeu a razão pela que MacRuairi parecia estar tão perto do ataque de pânico ali abaixo. Conhecia bem. Certamente, devia ter passado por algo similar. —E o resto? —perguntou Arthur. MacRuairi voltou o rosto violentamente, como se lhe incomodasse reconhecer essa greta em
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sua couraça de gelo. —O resto demora mais a desaparecer. «Ou não desaparece nunca.» Arthur ouviu essas palavras não pronunciadas. —Como me encontrastes? —A moça nos disse que o tinham feito prisioneiro. O resto… imaginei. «A moça…» —Anna? —perguntou Arthur com uma voz aguda por sua incredulidade. —Sim. Tivemos sorte de vê-la. MacRuairi
lhe
explicou
que
estavam
reconhecendo o terreno e comprovando que não houvesse suas mensagens no túmulo funerário quando ouviram aproximar-se de um grupo de cavaleiros. Ao reconhecer a Anna a seguiram e notaram como tentava lhes dar escapar de seu irmão e seus homens.
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Arthur estava surpreso. —Tentou escapar? —Ao que parecia, queria assegurar-se de que estavam bem. Arthur murmurou uma maldição. Graças a Deus, não fora ela quem o encontrou. Não queria que se inteirasse jamais do que lhe tinha feito seu pai. Era um banho de realidade muito forte. Melhor que pudesse acolher-se a alguma ilusão. Mas saber que importava o suficiente para ir a seu encontro significava muito para ele. Mais que muito. Devia-lhe a vida. E também lhe dava esperanças. —Oh,
não!
—murmurou
MacRuairi
com
desgosto — Têm exatamente o mesmo olhar de parvo do MacSorley. Não temos tempo para isto. Contarei o resto mais tarde. MacRuairi lhe rodeou a cintura com um braço,
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com cuidado de evitar seu ombro machucado, e lhe ajudou a caminhar até a porta. Chamou duas vezes sem deixar espaço entre um e outro golpeio, e depois fez uma pausa e repetiu a chamada. A porta se abriu. —Por todos os demônios, Víbora. Estava a ponto de sair para lhes buscar. —Magnus MacKay, o Santo, jogou uma olhar a Arthur e estremeceu — Está bem, Guardião? Arthur procurou sorrir, mas fraquejou diante da intensidade da dor. —Não estou em meu melhor momento, mas me alegro muito de os ver. Como puderam…? Uma
explosão
estrondosa
clamou
atravessando a brisa da noite e deixou sua pergunta no ar. «A brisa da noite.» Deus santo: o ataque! —Que horas são?
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—Pouco depois da meia-noite — disse MacKay. —Tenho informação para o rei. —Mais tarde —disse MacRuairi — Não temos tempo. Essa era nossa manobra de distração. Se queremos sair daqui teremos que nos apressar. MacKay e MacRuairi flanquearam Arthur e o levaram do hall ao interior do calabouço. Um rápido olhar ao chão lhe informou do destino que tinham seguido os guardas. Infelizmente nenhum dos corpos pertencia a seu torturante. O ajudante tinha partido com o Lorn. Uma razão mais pela que desejava com todas suas forças que chegassem ali a tempo. Outra conta que devia saldar. Saíram à torre que albergava o calabouço dos refugiados na escuridão. Embora o pátio estivesse deserto, ouvia-se a comoção que
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chegava das portas do castelo. Entretanto, em lugar de dirigir-se para ali, começaram a subir pelo adarve, com o que Arthur soube qual era o plano do MacRuairi. Tinham assegurado três cordas à mureta do baluarte que ficava em frente às portas na parte mais afastada, olhando ao lago. Em geral havia um guarda vigiando o perímetro, mas a explosão tinha feito que se desviasse para a porta. Arthur olhou para baixo na escuridão e fez uma careta de desgosto. —Antes teremos que lhe arrumar o ombro — disse MacRuairi. Deu a volta, agarrou-o pela base do ombro e lhe ofereceu sua adaga — Preparado? Arthur pôs o punho de madeira entre os dentes e assentiu. A dor foi extrema, mas rápido. Depois de um momento, já era capaz de girar o
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braço livremente sobre seu ombro. —Fez isto antes? —perguntou Arthur. —Não —disse MacRuairi com um estranho sorriso no rosto — Mas o vi fazer. Suponho que têm sorte de que aprenda rápido. Uma vez que teve o braço em seu lugar, Arthur pôde deslizar-se corda abaixo com a ajuda dos outros. Quando estiveram todos em terra, MacRuairi os conduziu para uma parte escura do muro exterior. Ao olhar ao chão, Arthur percebeu de que faltavam algumas das pedras e viu que havia
um
buraco
debaixo
elas.
Entraram
virtualmente arrastados. —Esta é a parte mais antiga do muro — explicou MacRuairi — As rochas quase se pode esmiuçar. Esse
comentário
indicou
a
Arthur
que
certamente não era a primeira vez que avançava
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por esse buraco. Do outro lado os esperava Gordon. —Por que demorastes…? —disse detendo-se o ver o estado de Arthur — Diabos, Guardião, parecem um asco. —Isso dizem — respondeu Arthur secamente. Tomaram seu tempo em reparar o muro, no caso de algum dia voltarem a necessitá-lo, e pouco depois já corriam seguindo a costa. A pouco menos de um quilômetro encontraram a pequena
embarcação
que
MacSorley
tinha
escondido na cova. —Têm que me levar ante o rei. O quanto antes possível —disse Arthur. Sobre o horizonte oriental se viam já os primeiros raios do amanhecer suavizando o céu noturno. Teriam que ir a cavalo, já que a rota marinha para o Brander estaria cercada pela frota de Lorn —
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Espero que cheguemos a tempo. —O que é que acontece? —disse MacKay advertindo a urgência do caso — O que averiguastes? Enquanto
navegavam
para
o
oeste
e
penetravam entre a frota de navios, lá onde o lago Etive se encontrava com o mar aberto, no fiorde de Lorn, Arthur explicou com presteza o plano traiçoeiro do pai de Anna, tanto os detalhes da emboscada como sua decisão de atacar antes do fim da trégua. Gordon soltou uma imprecação. —Esse filho de puta traiçoeiro… Os sentimentos do MacKay eram idênticos, mas os expressou em termos muito mais precisos, para depois acrescentar: —O rei será surpreendido. —Sim —disse Arthur — Lorn escolheu o lugar
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muito bem. Arthur lhes falou do estreito caminho e os escarpados de Ben Cruachan. —Conheço o lugar —disse MacRuairi — Aos exploradores custará muito encontrá-los. —E por isso temos que os advertir. MacRuairi negou com a cabeça de modo sombrio. —Sairão na primeira hora do amanhecer. Inclusive no caso de que chegássemos antes que alcancem a parte mais estreita do caminho, não seria fácil que um contingente de três mil homens dê meia volta. Toda essa zona é perigosa. —Não é necessário que dêem meia volta — disse Arthur — Tenho um plano. —Seus três companheiros da Guarda mudaram um olhar — O que? —perguntou. Foi Gordon quem expressou o que todos
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estavam pensando. —Não está em condições de lutar. Nós faremos chegar a mensagem ao rei. Arthur chiou os dentes. —Eu vou. Nada evitaria que lutasse. Se tinha alguma possibilidade no mundo de enfrentar-se ao Lorn no campo de batalha, faria uso dela. —Só conseguirá dar lentidão a nossa marcha —disse MacRuairi sem rodeios — Não têm forças nem para sentar numa mula, como ides cavalgar em nosso passo? E como diabos acha que poderá agarrar as rédeas com essa mão? Arthur lhe dirigiu um olhar carregado de veneno. —Deixem que eu seja quem me preocupe disso. MacRuairi ficou olhando-o nos olhos e depois
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de uns segundos assentiu. —Será melhor que encontremos algo com o que lutar. Chegaram a tempo e Arthur não caiu do cavalo, embora para sua vergonha esteve muito perto de fazer. Como os homens do MacDougall já estavam posicionados tiveram que rodeá-los pelo sul. Cruzaram com o rei a pouco mais de um quilômetro do lugar. Este não era dado a mostrar seu aborrecimento, mas Quando Arthur lhe informou dos planos de Lorn o fez. Perjurou e chamou Lorn por todos os nomes vis que cabiam sob o sol. —Pelos pregos de Cristo, como é possível que não soubéssemos? —perguntou sem dirigirse a ninguém em particular, apesar de que todos os guerreiros sentiram sua parte de culpa pelo que teria significado um desastre. E também o
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rei, pois sabia melhor que ninguém que não tinha que confiar no código de cavalaria. —Escondam-se entre as rochas de uma ladeira escarpada —disse Arthur — Não é fácil vê-los se não está procurando. Pelo olhar que MacLeod dedicava aos rastreadores, Arthur temia, por mais que pudesse compreendê-lo, que pagariam muito caro. —Dizia que tinham um plano? —perguntou o rei. —Sim. —Arthur se ajoelhou e desenhou um mapa no chão com um pau — Podemos vencer ao Lorn em seu próprio terreno. Tem a várias centenas de homens nesta posição — disse, marcando um ponto a meio caminho da ladeira — O resto do exército atacará na boca do estreito quando partirem em retirada e os agarrarão entre duas frentes: acima e abaixo. —Arthur assinalou
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um lugar um pouco mais acima de onde estavam os homens de Lorn — Se enviarem um contingente por cima, seus homens se verão apanhados. Quando a emboscada não der resultados, Lorn se desesperará. Bruce ficou circunspeto. —Está seguro de que podemos conseguir que nossos homens cheguem ali em cima? Como descreve, é um terreno escarpado e traiçoeiro. Se nos descobrirem antes de chegar à posição, não servirá de nada. —Meus highlanders podem fazer —disse Neil Campbell — Conhecem estas terras. —Está seguro? —perguntou Bruce. —Sim —disse Neil — Lutam como leões, mas se movem como gatos. —Eu os levarei —disse Arthur — Conheço bem o terreno.
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Neil seguia sendo um dos guerreiros mais formidáveis do reino, mas tinha cinqüenta anos e não estava tão em forma como antes. Bruce pousou o olhar sobre ele, e Arthur se deu conta de sua incerteza. Apesar de que limpara o sangue e a sujeira antes de por a indumentária de guerreiro que lhe tinham emprestado, de que enfaixou a mão e o pulso, de que tivesse comido e bebido suficiente uisge-beatha para devolver a cor a seu rosto, sabia que ainda parecia que uma besta raivosa do inferno o tivesse tragado, tivesse o amassado com seus dentes e o tivesse cuspido depois. Antes que o rei pudesse negarse, acrescentou: —Posso fazer, senhor. Não me encontro tão mal como parece delatar meu aspecto. Era uma mentira, mas não muito grande. Saber que estava perto da hora da verdade com
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o Lorn lhe dava novas forças. —Ganhaste esse direito, sir Arthur —disse o rei — Sem sua informação, isto poderia ter sido um desastre. Arthur sabia que a lembrança de Dal Righ fazia dois anos, quando se viu empurrado pelo Lorn a fugir para salvar a vida, seguia muito fresco na memória do rei. Bruce chamou a seu lado a um de seus cavalheiros mais jovens e de um dos mais dignos de confiança que tinha: sir James Douglas. O único que o fazia sombra, o sobrinho do rei e outrora renegado, sir Thomas Randolph, estava com o MacSorley no oeste, preparando o ataque pelo mar em caso de que fosse necessário. —Douglas, quero que vá com ele —disse o rei. Ato seguido fez gestos a outro dos guerreiros. Gregor MacGregor, o companheiro original de
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Arthur nos Guardiões dos Highlands, avançou entre outros — Estarão à frente dos arqueiros — disse. E depois se dirigiu a Arthur—: Tome tantos homens como necessita. —Será
melhor
que
ponham
algalguns
MacGregor no lote, Guardião — disse Flecha assim que o rei se voltou para se consultar com o Neil e MacLeod — Não podemos permitir que os Campbell levem toda a glória. Arthur conseguiu esboçar um sorriso. Deus, era fantástico estar de volta. Era fantástico poder brincar a respeito das velhas rixas de sangue entre os MacGregor e os Campbell que em outro momento tinham feito deles inimigos acérrimos. —Assim
são
os
MacGregor,
sempre
dispostos a tirar benefício do duro trabalho dos Campbell. —Necessito algo com o que impressionar às
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moças —disse MacGregor. Campbell soltou uma gargalhada. MacGregor não necessitava nada para impressionar às moças. Isso já fazia seu rosto por ele, e não poucas vezes se colocaram com ele por causa disso. —Se necessitais ajuda para melhorar seu rosto bonito, posso te mandar ao tipo que me fez isto —disse, assinalando seu próprio rosto. MacGregor fez uma careta de dor. —O tipo se empregou a fundo. Isso tenho que reconhecer. —Assegurarei-me de que chegue seu castigo quando o agarrar — disse Arthur secamente. Ambos sabiam que aquela não seria uma conversa muito longa. Neil tinha acabado de falar com o rei, e quando viu que Arthur se dispunha a preparar
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aos homens, levou-o à parte. —Está seguro de que te encontra bem, irmão? Qualquer um entenderia que não tenha vontade de seguir. Já tem feito suficiente. «Eu entenderia», era o que queria dizer. Arthur percebia isso no olhar de seu irmão Neil. Mas ambos sabiam que esse não seria o final. —Estarei bem —lhe assegurou— quando tudo isto tiver acabado. Capítulo 25 O plano de Arthur funcionou. Junto a Douglas, MacGregor e uma pequena leva dos homens de seu irmão, dirigiu o grupo de guerreiros para um lugar elevado nas montanhas do Ben Cruachan, por cima de onde estavam escondidos os homens do clã de Lorn. Os
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guerreiros do MacDougall desdobraram uma chuva
de
flechas
e
penhascos
sobre
os
«despreparados» soldados assim que o exército de Bruce passou pelo desfiladeiro que havia debaixo deles. Mas o ataque «surpresa» dos MacDougall recebeu outro ataque surpresa como resposta. Os guerreiros de MacDougall ergueram o olhar, horrorizados, e descobriram que Arthur e seus homens deixavam cair outra chuva de flechas de sua própria colheita e saltavam sobre eles como se fossem uma aparição. Ao perder o elemento surpresa e a posição estratégica nas alturas,
a
emboscada
dos
MacDougall
se
transformou em uma disparada. Apanhados entre duas frentes, abaixo e acima, seus homens foram massacrados. Quando Lorn lançou seu ataque frontal na boca do desfiladeiro, em lugar de enfrentar a um exército no que reinava o caos se
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encontrou com as poderosas hostes de Bruce fortemente armadas. Arthur correu para descer a montanha e unirse à luta, atravessando o barulho de soldados em luta com um só objetivo em mente: encontrar ao Lorn. Conseguiu distinguir a Alan MacDougall ao outro lado da ladeira, concentrando seus homens com a valente intenção de liberar uma nova carga. Mas a valentia não seria suficiente. Esperava pelo bem de Anna que se desse conta disso antes que fosse muito tarde. O estreito funil do desfiladeiro rebateu em parte a vantagem numérica de Bruce, mas o ataque de Lorn não demorou muito em ver-se frustrado. Arthur alcançou a primeira linha de frente justo quando a vanguarda dos MacDougall começava a romper-se. O rei Robert, à cabeça de seu exército, lutando junto a seus cavalheiros
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de confiança e os membros dos Guardiões das Highlands, ordenava perseguir os fugitivos do clã inimigo. Em sua frenética tentativa de retirar-se ao
castelo
de
Dunstaffnage,
muitos
dos
MacDougall fossem derrubados ou se afogaram ao tentar cruzar a ponte sobre o rio Awe. Tinham ganhado! A tentativa dos MacDougall de superar ao Bruce fracassava e o rei obtinha sua
revanche
pela
batalha
de
Dal
Righ.
Acabavam de romper o cerco do clã mais poderoso das Highlanders. A vitória era doce, mas
não
seria
completa
até
que
Arthur
encontrasse ao Lorn. No caos da retirada, examinou o contingente de fugitivos em busca de seu inimigo. Aliviou-o comprovar que Alan MacDougall liderava a um grupo de seus homens para terreno seguro. Ao ver MacRuairi junto à ponte, Arthur desceu para
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encontrar-se com ele. —Onde está? Não
tinha
que
dizer
de
quem
falava.
MacRuairi cuspiu ao chão e assinalou em direção sul à entrada do lago Awe. —Nunca saiu de seu birlinn. Esse maldito covarde dirigiu a batalha da água. Assim que seus homens se retiraram, fugiu em direção ao lago. Arthur amaldiçoou sua sorte, negando-se a acreditar que, depois de ter chegado tão longe, lhe seria vedada a possibilidade de justiça no último momento. —Quanto tempo faz disso? —Não mais de cinco minutos. Em tal caso, ainda tinha uma oportunidade. Mas necessitaria os dotes de marinheiro do MacRuairi se queria o apanhar. Lorn possuía três
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castelos no lago Awe, mas Innis Chonnel, o antigo forte dos Campbell , era o mais novo e melhor fortificado. Ali seria onde iria. Arthur olhou ao MacRuairi com parcimônia. —Gostaria de uma regata? MacRuairi, conhecido por ser um dos mais temidos e ousados piratas sobre o mar, sorriu. Ao menos pareceu que esboçava um sorriso. —Eu reunirei aos homens. Encarregue-se do navio. Arthur estava já correndo para a ribeira do rio para chegar ao porto. Era uma corrida que não tinha nenhuma intenção de perder. Nessa ocasião, John de Lorn não escaparia a seu destino fatal. **** Anna não podia fazer mais que esperar. Mas não saber o que acontecia depois dos grossos
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muros do castelo do Innis Chonnel era uma autêntica tortura. O coração se encolheu. Não, tortura não. O seu não era nada comparado ao que Arthur estava sofrendo. Nem sequer podia suportar pensar nisso, embora não parecia ser capaz de outra coisa mais que de imaginar o que estava acontecendo, sem saber se estaria vivo ou morto. Era coisa de loucos! Como conseguiria seu tio entrar no castelo, por não falar de o resgatar? «Teria que ter ido com eles.» Assim ao menos saberia o que tinha passado. Mas seu tio estava certo. Não teria conseguido mais que levar a seu irmão de volta ao castelo. As horas passavam com lentidão. Quando não estava ajoelhada, rezando na pequena capela, Anna procurava manter-se ocupada. Chamaram à batalha à maioria dos soldados, de modo que somente ficava uma pequena reserva
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de guardas no castelo para defendê-lo. Na noite anterior, já sem mais falsas visitas ao córrego, assim que o grupo chegou ao castelo, Anna organizou aos homens para que preparassem as câmaras,
refrescassem
o
grande
salão
e
fizessem inventário das provisões com que contavam. O castelo de Innis Chonnel fora construído mais
ou
menos
na
mesma
época
que
Dunstaffnage. Apesar de não ser tão grandioso, era uma edificação similar. A fortaleza quadrada fora construída sobre uma base de penhascos no confinante sudoeste da ilha. Seus altos muros de pedra rodeavam um pequeno pátio. Nos cantos tinham levantado duas torres, a maior das quais servia como torre da comemoração, enquanto a segunda se utilizava como calabouço. Entre ambas estava o grande salão. Sobre os muros se
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edificaram outras dependências de madeira menores que acolhiam os barracões, os arsenais, os estábulos e as cozinhas. Parecia estranho pensar que aquele tivesse sido o lar de Arthur em sua infância. Anna sempre desfrutava de suas estadias no castelo junto a seu pai, mas nesse momento se sentia estranha. Como se não devesse estar ali. Como se fosse uma intrusa. Sabia que aquilo era ridículo. Os castelos mudavam de mãos com freqüência durante a guerra. Mas depois do que Arthur lhe tinha contado… Anna estava dividida. Dividida entre o pai ao que ainda amava, embora sem dúvida idealizava, e um homem a quem deveria odiar, apesar de não poder fazer. Não queria compreender por que Arthur fizera aquilo, mas o compreendia. Podia entender a lealdade que regia seus atos porque era quão mesma
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regia os dela. A lealdade ao rei e à pátria. A lealdade ao clã e à família. Sim, isso entendia especialmente. Arthur
era
um
highlander.
Sangue
por
sangue, assim era como funcionavam as coisas nas Highlands. De modo que vingar seu pai se convertia em seu dever. Mas ela sabia que não se tratava só de vingança. Uma parte dele seguia sendo aquele menino que tinha visto morrer seu pai e seguia pensando que teria que ter evitado. Justiça.
Vingança.
Mas
também
significava
expiação. Não obstante, compreendê-lo não oferecia a Anna resposta alguma. O que se podia fazer quando amar a um significava perder ao outro? Depois de uma noite sem descanso, passou o dia seguinte a sua chegada de modo muito similar ao primeiro deles: rezando e procurando
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manter-se ocupada todo o tempo para não pensar no que acontecia depois dos grossos muros do castelo. Se por acaso seus temores pelo destino de Arthur não bastassem, também tinha a batalha. Quem sabia se nesse momento não teria deixado já de existir o mundo no que ela tinha vivido sempre. Os homens aos que amava podiam jazer mortos ou feridos, e mesmo assim, nos protegidos limites do Innis Chonnel, sobre a incomunicável ilha do lago Awe, tudo tinha uma aparência normal. A brilhante luz do sol seguia brilhando
sobre
as
mansamente
onduladas
águas do lago, os pássaros seguiam voando e o vento úmido ainda pulverizava seus cabelos quando passeava pelo pátio. Distinguiu a figura do Ewen, que saía da torre da comemoração. —Alguma notícia? —perguntou, apesar de
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saber a resposta de antemão, já que em caso de que se aproximasse alguém ouviria a chamada. —Não, ainda nada — respondeu seu irmão negando com a cabeça. Sabia que a espera também era dura para Ewen, embora por diferentes motivos. Ele queria lutar. Não obstante, se culpava a ela seu confinamento em Innis Chonnel, nunca deixou ver. Anna mordeu o lábio inferior. —Oxalá soubesse como vão as coisas. —Oxalá —disse seu irmão com um sorriso — Mas assim que haja algo do que informar… —Aproximam-se navios, senhor! —gritou um dos guardas da torre vigia. Anna seguiu a seu irmão em sua fulgurante descida da escada para as almenas. Somente podia distinguir as três velas quadradas que se
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aproximavam deles do norte a toda velocidade. —É o pai — disse Ewen com uma voz desencorajada. Um
pressentimento
fez
que
Anna
se
estremecesse de cima abaixo. —O que acontece? Algo vai mal? Ewen não se incomodou em tentar ocultar a verdade. —Disse que somente viria em caso de que fosse necessário. «Necessário.» A Anna lhe deteve o coração. Isso significava que o faria se tivesse que bater em retirada. Tinham perdido! Anna cambaleou, sentindo que suas pernas eram como gelatina. Pôs a mão na borda da mureta para recuperar o equilíbrio, observou como se aproximavam os navios e rezou por que
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houvesse outra explicação. Algo diferente que Bruce tivesse ganhado. Então entreabriu os olhos para proteger-se dos brilhos do sol e viu algo mais. —O que é isso? —disse, assinalando justo trás dos navios que se aproximavam — O que é isso que vem trás? Mas Ewen estava já ditando ordens. —Atacam-nos! A seus postos! Os homens saltaram à ação imediatamente enquanto Anna, incapaz de desviar o olhar, observava aterrorizada como se aproximavam os navios. Ao que parecia, os homens de seu pai não
pareciam
conscientizar-se
de
que
os
perseguiam. —Atrás! —gritou em uma tentativa de lhes avisar. Mas o vento levava sua voz.
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—Anna, sai daqui!—gritou-lhe Ewen — Isto não é seguro. Vá à torre e tranca a porta. Anna assentiu em silêncio e fez o que seu irmão lhe pedia. Uma vez dentro, correu para sua câmara do segundo andar para olhar da seteira. Já que a torre da comemoração estava no canto sul do castelo, não pôde ver os navios até que virtualmente estavam já junto ao embarcadouro. Observou com o coração em um punho como começava a batalha justo a seus pés. Viu seu pai situado atrás de seus homens, gritando ordens ao mesmo tempo em que o navio de guerreiros inimigos chegava… ficou petrificada, com o coração lhe dando saltos no interior do peito. Piscou. Não, não era um sonho. Uma intensa onda de alívio abriu caminho em seu interior fazendo que lhe estremecesse o coração. Arthur estava vivo. Vestia um traje de batalha
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que não lhe parecia familiar e embora a simples vista, com o rosto e o cabelo resguardados sob o elmo com nasal, fosse impossível de distinguir dos outros guerreiros, sabia que se tratava dele. «Graças a Deus.» Então se revelou a absoluta transcendência de sua presença no castelo. O horror se apoderou dela e a apanhou com seu frio abraço. Se Arthur estava ali, somente podia ser por uma razão. Correu para a porta, consciente de que tinha que fazer algo. Tinha que o deter. Não podia permitir que matasse a seu pai. Arthur o tinha a frente o momento que tanto tinha
esperado.
Em
certo
modo
parecia
adequado que o encontro final tivesse lugar na pequena ilha do Innis Chonnel, sob a sombra entristecedora do castelo que um dia fora seu lar. A corrida fora acirrada, mas ao final MacRuairi
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deu fé de que sua reputação era merecida. Oculto pela cegante luz do sol, seguiu aos navios em
retirada
de
Lorn
sem
que
estes
se
inteirassem de sua presença até alcançar aos três birlinn quando se dispunham a atracar. Somente então dispôs Arthur uma descarga de flechas sobre os despreparados MacDougall. MacRuairi tinha reunido a quarenta piratas de seu clã, algo que seria um combate desigual, já que os MacDougall os triplicavam em número. Mas os homens de MacRuairi estavam mais que dispostos a aceitar o desafio. Patifes, rufiões, esquartejadores, eram qualificativos generosos para alguns MacRuairi que ganhavam a pulso sua reputação como o maior flagelo dos mares. Mas em terra lutavam com a mesma ferocidade. Os guerreiros de MacRuairi estavam já saltando pela amurada espada empunhada ao
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grito de «Pelo leão!», ao mesmo tempo em que seu chefe deixava o navio escondido até pô-lo virtualmente em cima dos do MacDougall. Arthur estava ali mesmo, liderando a carga. Lorn tinha situado a seus homens ao final do embarcadouro com a esperança de conter aos homens de MacRuairi assim que tentassem tomar a terra. Mas os guerreiros de MacDougall não eram rivais para os selvagens ataques de seus
parentes.
Apesar
de
que
ambos
descendessem de filhos de Somerled, o rei norueguês que tinha governado as ilhas cento e cinqüenta anos antes, lutavam de geração em geração pela supremacia. Os MacDougall a tinham ganhado depois da batalha do Larg e receberam o favor dos reis ingleses, mas essa integração fez que se afastassem muito de suas raízes vikings. Os MacRuairi lutavam como os
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próprios bárbaros que tinham sido até tão pouco tempo
que
a
maioria
deles
podia
seguir
recebendo esse nome. Romperam
o
muro
de
contenção
dos
MacDougall rapidamente e situaram a batalha sobre as rochosas costas da ilha. Arthur estava em desvantagem ao contar só com um braço, por não falar de seu fraco estado; entretanto, em que pese a encontrar-se longe de suas habituais condições para a luta, defendia-se bem. Abria caminho com determinação entre os soldados sem tirar olho ao Lorn em nenhum momento. Este estava na retaguarda da batalha, rodeado pelo protetor círculo de seus homens, entre os que se encontrava seu ajudante. O sangue de Arthur fervia antecipando o momento. Os MacDougall retrocediam, e logo ficou claro que as superiores força em número de Lorn não
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ganhariam a partida. Arthur, envolto em um encarniçado combate com um dos homens de MacDougall, ao qual por desgraça conhecia, ouviu o grito de retirada. Amaldiçoou, consciente de que tinha que deter o Lorn e a seu ajudante antes que alcançassem a segurança das portas do castelo. «Outra vez não.» Chamou a atenção de alguns homens de MacRuari e lhes disse o que queria deles. Lutou para abrir caminho até o Lorn seguido por esses mesmos homens, que fizeram racho no círculo protetor de Lorn e tiraram ele e a seu ajudante do grupo. Uma vez que Arthur chegou até ali, os homens do MacRuairi se dispersaram para formar uma barreira atrás dele. Se Lorn não tivesse a poucos metros da segurança dos muros do castelo, Arthur teria
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desfrutado mais com sua morte, mas tal e como estavam as coisas teve que despachar ao ajudante com presteza. Por mais habilidade que tivesse aquele homem na hora de torturar, não era rival para Arthur, nem sequer com uma só mão. Ao fim se voltou para Lorn e o alcançou a escassos
metros
estavam
tão
da
porta.
ocupados
Seus
homens
defendendo-se
que
nenhum deles pôde ir em sua ajuda. Arthur advertiu a raiva em seus olhos quando John de Lorn ergueu a espada contra ele. —Como
escapou?
—perguntou
com
incredulidade. —Surpreso de me ver? Um brilho assassino aflorou nos olhos de Lorn. —Devia ter matado.
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—Sim, teria que tê-lo feito. —É o culpado de todo este desastre. Traíram meus planos para acabar com esse filho da puta assassino. —Rei Robert — o provocou Arthur, rodeandoo como a uma presa — Diria que melhor que te acostumem a chamá-lo assim, mas temo que não viverá por aqui tempo suficiente. E dito isto lhe atirou um golpe. Lorn estava preparado e arrumou para rebatê-lo, embora com muita dificuldade e tremendo com todo o corpo pelo esforço. John de Lorn, em seus dias um dos mais temidos guerreiros das Highlands, já não significava nenhuma ameaça. A idade e a enfermidade cobraram seu preço. Não era covardia, a não ser a enfermidade o que fez que permanecesse no lago e na retaguarda da batalha. O maldito
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orgulho de Lorn evitava que admitisse quão doente realmente estava. O segundo golpe de Arthur o tombou de joelhos. Pôs a ponta da espada no pescoço. A touca de malha não serviria de nada contra o afiado aço de sua arma. O sol se refletia no elmo do ancião de mesmo modo em que tinha feito quatorze anos antes quando Arthur observava da distância como seu pai sustentava a folha ante o pescoço desse mesmo homem e lhe oferecia clemência.
Era
o
momento
que
estivera
esperando. Teria sentido a antecipação dessa cena em suas próprias veias. O sabor da vitória tinha que ser doce. Seus músculos teriam que estar tensos, preparados para propinar a cutilada. Mas não sentia nada disso. Somente podia pensar em Anna. Se o fizesse, seria para ela o que Lorn
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sempre foi para ele: o homem que tinha matado a seu pai. Talvez seu perdão fosse algo mais do que tinha direito a esperar, mas se assassinasse ao Lorn destruiria qualquer opção que pudesse ficar. Que honra teria em matar a um homem muito doente para lutar? Seu pai já fora vingado. Lorn estava acabado. Sua derrota no Brander tinha acabado com qualquer opção que tivesse de deter Bruce. Anna tinha razão. O matar então não seria mais que vingança, e Arthur a amava muito mais que qualquer momento efêmero de satisfação que aquilo pudesse lhe proporcionar. Bom, pode ser que não fosse tão efêmero, mas, em qualquer caso, amava-a mais. Lorn o olhou com fúria sob o visor de ferro de seu elmo. —A que estais esperando? Faça de uma vez!
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Piedade. Apesar de que até esse momento o tivesse esquecido por completo, aquela fora a última lição de seu pai. —Renda-se ante o rei e lhe deixarei viver. O rosto de Lorn se retorceu de ira. —Prefiro a morte. —E o que será com sua família? O seu clã? Também quer que morram? Os
olhos
do
John
de
Lorn
estavam
incendiados de puro ódio. —Prefiro isso antes que me render a um assassino. —Fará que morram suas filhas por seu maldito orgulho? Aquilo fazia que o sangue de Arthur fervesse. Conhecia Anna. Jamais iria contra seu pai. A família era tudo para ela. —Dê a Anna sua bênção. Manterei ela a
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salvo. Sabes tão bem como eu que está acabado. Mas seu clã pode prosseguirr através de nossos filhos, em seus netos. A raiva de Lorn estava desenfreada. Sobre seus olhos, frágeis de loucura, ressaltavam as veias de sua têmpora e seu rosto aceso. Desafogou-se proferindo uma enxurrada de maldições vis que lhe deixaram jogando espuma pela boca. —Jamais será sua! Antes prefiro vê-la morta! —Pai! Arthur ouviu o grito angustiado que se erguia atrás dele. Anna. Voltou-se de maneira instintiva e deixou suas costas a mercê de Lorn. Exatamente o mesmo que seu pai tinha feito tempo atrás ante seus próprios olhos. Capítulo 26
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Anna chegou ao pátio justo no momento em que Arthur fazia seu pai cair de joelhos. Oh, Deus, tinha chegado muito tarde! Correu mais depressa. Ewen e outros tentavam defender o castelo lançando flechas de maneira seletiva das frestas do adarve, preparados para baixar a grade assim que seu pai e os outros conseguissem retirar-se ao interior. Os guardas estavam tão preocupados observando o que acontecia no exterior que nem sequer a viram penetrar antes seus narizes. —Milady! —chamou-a um dos guardas — Não podes… Anna não os escutava. Avançou alguns metros além das portas, mas não chegou muito longe. Os soldados inimigos tinham formado uma linha que separava Arthur e o pai de Anna do
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resto dos opositores. Quando ela tentou passar entre eles um dos homens a agarrou. —Pelas chagas de Cristo! —disse, puxando-a pelo pulso — Aonde acha que vai, moça? Abriu a boca para gritar ao aterrador rufião que a soltasse, mas então ouviu a voz de Arthur e ficou quieta nos braços do soldado. Não acreditava no que ouvia. Arthur brandia uma espada contra o pescoço de seu pai, a ponto de alcançar a vingança e a expiação que motivava seus
atos,
quando
lhe
ofereceu
piedade.
Ofereceu a seu pai a oportunidade de salvar a todos. Uma oportunidade que, depois do que certamente teria feito, seu pai não merecia. A oportunidade de um futuro. Se deu conta de que Arthur a amava. «Amame tanto que está acima de sua sede de vingança.» Mas se as palavras de Arthur
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enchiam
seu
coração,
as
de
seu
pai
o
destroçaram. «Antes prefiro vê-la morta.» Anna escapou das garras de seu captor e retrocedeu, angustiada por um horror e uma comoção que a fizeram gritar. «Não diz a sério.» Entretanto, ela sabia que sim havia dito a sério. Seu pai preferiria vê-la morta antes que casada com o inimigo, embora a amasse. Aquele cruel rechaço à oferta de Arthur fez saltar em pedaços qualquer raio de ilusão que ficasse. Mas seu grito foi um erro. Um erro mais terrível do que poderia ter imaginado. Sua voz teria que ter-se perdido no infernal estrépito da batalha. Ninguém deveria ter ouvido. Mas Arthur ouviu. Voltou-se ao ouvir sua voz e a espada pareceu perder toda sua força. «Pai nosso que está nos céus…» Sob a sombra do elmo, a visão de seu rosto golpeado e
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massacrado lhe revolveu o estômago e provocou um acesso de bílis. Mas o pior dos horrores estava por chegar. Viu o brilho da espada de seu pai pela extremidade do olho. —Não! —gritou dando um passo à frente. Mas o soldado a apanhou antes que pudesse avançar — Cuidado! «Calcanhar
de
Aquiles.»
Ela
era
seu
calcanhar de Aquiles, mas não podia permitir que morresse por isso. Arthur deu meia volta e ondeou sua espada pelo ar para rechaçar o golpe mortal do pai de Anna com suficiente força para arrebatar a espada das suas mãos e fazê-la voar. Então ergueu a espada sobre sua cabeça. Anna se voltou e protegeu seus olhos do horror que estava a ponto de acontecer. Arthur mataria a seu pai, e depois do que este acabava
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de fazer não poderia culpá-lo de nada. Esperou para ouvir o horripilante som da morte. Mas o silêncio parecia interminável. Estava tudo tão tranqüilo que percebeu de que a batalha que livrava a seu redor também se deteve. —Vá — ouviu que Arthur dizia — Tem cinco minutos para levar sua filha e a seus homens do castelo. O olhar de Anna recaiu de novo sobre seu pai. Seu pai, que seguia com vida. Arthur tinha baixado a espada e se afastava dele, enquanto John de Lorn se pôs em pé com o rosto tingido de uma pátina de raiva desafiante. —É um estúpido. —E tens a sorte de que sua filha signifique para mim muito mais que sua mísera vida. Mas lhes asseguro que o rei não sente o mesmo. Parte por seu próprio pé ou faça com grilhões,
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isso não é de minha incumbência, mas partirá. Um grito chegou das alturas para confirmar suas palavras. —Navios, milorde. Seis deles vindo para cá. «Bruce.» Lorn não pensou. Reuniu a seus homens e ordenou a Ewen evacuar o castelo e reunir quantas armas pudesse levar consigo. O homem que a agarrava a soltou. Anna correu, mas Arthur já se fora e ficava de lado junto ao resto dos homens de Bruce, entre os que reconheceu a seu tio, para deixar caminho aos MacDougall. MacRuairi não parecia muito contente com tal acerto, mas depois de um rápido mas violento intercâmbio de palavras Arthur e ele ficaram em silêncio. Arthur não parecia disposto a olhá-la. Por que não a olhava? Anna tinha vontade de
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correr a seu encontro, mas o via tão distante e afastado…
O
coração
se
encolheu
pela
incerteza. Sempre tinha pensado que seria ele quem a abandonaria e, entretanto, ali permanecia de pé como um sentinela: firme, incondicional e fiel. Um homem com o que se podia contar. Um homem que derrubaria dragões e se arrastaria através das brasas do inferno. —Vamos, Anna. Temos que partir. Ewen tinha aparecido atrás dela e lhe puxava o ombro para tirá-la dali. —Eu… — titubeou, ao mesmo tempo em que desviava o olhar para Arthur, como se esperasse, como se ansiasse que ele dissesse algo. Ewen, indeciso, olhou-a um instante e se retirou junto a seus homens. Seu pai deve ter captado aquela troca de olhares. —Não faça, filha. Nem sequer pense nisso.
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Anna olhou a seu pai nos olhos. O homem que tinha amado durante toda sua vida. Um homem que era muito mais complexo do que ela pensava. Era difícil conciliar a figura de seu carinhoso pai com a do homem que acabava de ver nesse dia, apesar de que soubesse que se tratava de uma única pessoa. Por um momento desejou voltar a ser aquela menina que se sentava sobre os joelhos de seu pai e o olhava como se fosse um deus. Voltar para momento em que as coisas eram simples. Se alguma vez pôs em dúvida o amor de Arthur, já não podia fazer. Não depois do que acabava de fazer por ela. —O amo, pai. Rogo-te isso… Advertiu a dor que suas palavras causavam antes que seu olhar se endurecesse. —Não quero ouvir falar mais nada disto. Faz
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sua escolha. Mas não te engane. Se partir com ele, jamais voltarei a te ver. Estará morta para mim. As lágrimas afloraram nos olhos de Anna e lhe ardiam na garganta. —Não diz a sério. Mas sim dizia. —Escolhe — exigiu seu pai com raiva. Anna se encaminhou para o bote em que a esperava seu irmão com lágrimas caindo pelas bochechas. Arthur, incapaz de ver como se afastava, voltou o rosto. Tinha ouvido cada palavra da dolorosa conversa que Anna acabava de manter com seu pai. Maldito fosse Lorn por fazer isso a sua filha! Por fazê-la escolher entre os dois. Não tinha por que ser assim. Arthur tinha tentado lhe dar uma saída, mas o filho de cadela não queria acolher a
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ela. Quase se arrependeu de não tê-lo matado. Quase. Mas quando ouviu a Anna dizer que o amava, soube que tinha feito o correto. Embora isso
significasse
que
devia
deixá-la
partir.
Infelizmente, a dor de sua partida não se atenuava absolutamente nessa segunda ocasião. Ardia-lhe o peito. Seus músculos tremiam pela tensão e contenção e parecia que os rasgavam com uma adaga. Queria detê-la, que não subisse naquele maldito bote. Queria dizer que seu lugar era junto a ele. Que a amava. Pedir que o escolhesse. Mas não podia fazer mais difícil do que já era. Não estava disposto a fazê-la sofrer mais. Bastou um olhar a seu aflito rosto para que se desse conta do terrível preço que se estava cobrando dela o ultimato de seu pai. —Sinto muito, Ewen. Explica tudo a mãe —
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disse de repente — Diga o quanto sinto. Sinto muito, mas meu lugar está junto a ele. Arthur ficou petrificado. Não podia acreditar no que acabava de ouvir. Voltou-se lentamente e a viu abraçar seu irmão. Despedia-se dele com aquele abraço. Arthur ficou sem fôlego. Anna se separou do abraço de seu irmão e aventurou um olhar em sua direção. A incerteza que esta refletia provocou uma pontada no peito de Arthur que rompeu até o último fio de contenção que ficava. Depois de uns poucos e largos passos chegou a seu lado. A voz de Arthur lutava com o esforço por conter a emoção que brotava em seu peito. —Está segura? Não têm por que fazer. Protegerei a ti e a tua família o melhor que possa, embora partam.
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Anna sorriu, com os olhos velados pelas lágrimas. —Que sejas capaz de fazer isso é a razão que me faz estar segura disso. O amo. Sou sua, se ainda me quiser. Deus santo, se ainda a queria… Arthur se esqueceu da sujeira e o pó que o cobria, por não falar do fedor da batalha, e tomou Anna em seus braços com um suspiro de alívio que saiu do mais profundo da alma. De um lugar que, pensou, jamais voltaria a abrir. Descansou a bochecha sobre sua cabeça, absorvendo a sedosa e dourada calidez da fragrância de seus cabelos, e a apertou fortemente contra si, muito emocionado para falar. Mas não tinha que dizer nada. A maneira com que ela o rodeava com seus braços e punha sua bochecha contra seu cotun dizia tudo. Tinha escolhido a ele. Não podia
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acreditar. Jamais pensou que poderia sentir-se de tal modo. Nunca pensou que esse tipo de felicidade lhe estivesse destinada. Mas sua alegria ficava moderada pela consciência de saber quão difícil devia ser para ela. Separou-se de Anna a seu pesar. Ela ergueu o olhar, acariciada pelos raios do sol, que deixavam em seus belos traços uma luz dourada e suave. Uma luz que se estendia por seu interior como se fosse um quente abraço. Sentiu como se
enchia
seu
interior.
Era
um
homem
afortunado. Ao conscientizar-se de que ainda não tinha respondido, fez uma careta com a boca. —Se por acaso não o adivinhastes, isso significa um sim. O sorriso de Anna fez que parasse seu coração.
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Pensava que seu destino fosse permanecer sozinho, mas agora sabia que simplesmente estivera esperando que ela chegasse. Juntos confrontariam qualquer obstáculo ou desafio que a vida lhes proporcionasse. Incluindo a seu pai. Arthur a apertou contra si em seu lado enquanto Lorn caminhava para o cais para ocupar seu lugar entre seus homens. Quando passou junto a eles sem lhe dirigir o olhar, Arthur notou que Anna se cambaleava. Apertou-a contra si com mais força, com o desejo de protegê-la contra isso.
Aquele
filho
de
cadela
estava
lhe
destroçando o coração. —Pai! —exclamou com um fio de voz. Lorn se voltou para olhá-la com expressão gélida. Mas não estava tão pouco afetado como queria aparentar. Nos olhos do ancião havia uma dor real.
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—Não há nada mais que dizer. Tomaste sua decisão. Anna negou com a cabeça. —Escolho amar aos dois. Mas meu futuro está junto a Arthur. Lorn a olhou com atenção, e por um instante Arthur pensou que claudicaria. Mas o homem aplacou seu gesto e deu meia volta para partir sem dizer uma palavra mais, condenado por seu próprio orgulho. Cortando suas relações com ela assim, não fazia mais que prejudicar a si mesmo. Anna era a luz, a cola que unia as pessoas a sua volta. Sem ela, suas vidas seriam mais escuras. Arthur sabia. Tinha comprovado em sua própria carne. Desejava poder economizá-la dessa dor ou sofrer por ela, mas o único que podia fazer era permanecer a seu lado enquanto via como seu
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pai e seu clã se afastavam no navio. Quando viraram para o lago e desapareceram de seu olhar, Arthur a pegou pelo queixo para que o olhasse nos olhos. —Juro-te que me assegurarei de que nunca te arrependas disto. Anna lhe ofereceu um sorriso vacilante através do brilho de suas lágrimas. —Não farei. É a única decisão que podia tomar. Eu te amo. Arthur se inclinou e a beijou com doçura. Sua boca era inclusive mais doce e suave do que recordava. —E eu amo muito a ti. Queria dizer muitas mais coisas, mas o resto teria que esperar. Os reforços chegariam de um momento a outro. —Qual é seu quarto? —perguntou Arthur.
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Anna ruborizou. Parecia envergonhada. —Aquela acima, com vista para o lago. Teria que ter imaginado. —Eram meus aposentos. Anna abriu os olhos de par em par e se apressou a dizer: —Mudarei… Arthur negou com a cabeça, cortando em seco suas palavras. —Fique, assim saberei onde te encontrar. — Gostava de pensar nela ocupando seu aposento. Arthur olhou para trás e viu os navios aproximarse — Vai até lá. Há certas coisas que tenho que atender. Irei te buscar quando tiver acabado. Anna estirou o braço para acariciar seu queixo. —Seu pobre rosto. Arthur fez uma careta de dor.
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—Já sei que estou horrível. Seus olhos se encheram de culpa. —Deus, Arthur… Sinto tanto. —Nada disso, moça — repôs ele negando com a cabeça — Isso se acabou. Não podemos mudar o passado. Tudo que podemos fazer é viver o presente e planejar o futuro. Um futuro que só momentos antes parecia sombrio e agora transbordava de esperança. Observou-a partir, consciente do perto que estivera de perdê-la. Mas agora que estava com ela, Arthur jurou que jamais a deixaria partir. Não a fez esperar muito. Anna ouviu como batia na porta com suavidade apenas meia hora depois de que zarpassem os navios. Os homens de Bruce não ficaram muito tempo, mas mesmo assim parecia estranho ver que o pátio de armas se enchia de soldados inimigos. Não, inimigos
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não. Ao escolher ao Arthur também escolhia ao Bruce, embora supôs que levaria algum tempo familiarizar-se
com
o
que
em
realidade
significava aquilo. No momento, simplesmente tentava acostumar-se com a idéia de que não sabia quando poderia voltar a ver sua família, se é que chegaria a fazer. Ao negar-se a se render ante Bruce, a seu pai não ficava mais alternativa que seguir o mesmo caminho até a Inglaterra que tinha tomado meses antes John Comyn, o conde de Buchan. E suspeitava que sua mãe, seus irmãos e suas irmãs logo partiriam junto a ele. Mas por mais difícil que fora tomar aquela decisão, Anna sabia que tinha escolhido bem. O amor cego que tinha por seu pai era o de uma menina que pensava que ele jamais faria nenhuma maldade. Entretanto, o amor que sentia por Arthur era o de uma mulher. Uma mulher que
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entendia que as pessoas, inclusive aquelas às que amava, cometiam erros. O perdão era parte do amor. Ao abrir a porta e vê-lo ali o coração lhe deu um tombo. Sua enorme envergadura enchia a soleira e tinha que encolher-se para entrar no aposento. De repente aquela pequena câmara dava a impressão de ser minúscula. O ar estava impregnado do aroma de sabão. Banhara-se, tirado a armadura e vestia com uma camisa limpa, túnica e meias, que, suspeitava Anna, teria tomado emprestados de algum dos membros de seu clã que partiram. Mas não foi a visceral consciência de sua presença o que a fez jogar-se em seus braços e afundar o rosto em seu amplo e quente peito, a não ser a infantil expressão de incerteza que aparecia seu rosto. Anna apreciou o suspiro de alívio que
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percorria o corpo de Arthur ao rodeá-la com seus braços e agarrá-la. —Encontra-te bem? —perguntou Arthur. Anna apoiou o queixo sobre seu peito para o olhar e assentiu. —Estava preocupado? Uma mecha de cabelo molhado lhe caiu sobre a testa. —Sim, mais do que queria admitir. —Tomei uma decisão, Arthur. Sabia o que dizia. Pode ser que em algumas ocasiões não seja nada fácil, mas jamais me arrependerei disso. —Seu irmão Alan tinha razão. Merecia a um homem que a amasse com a mesma intensidade que ela amava. Um homem que derrubasse dragões e se arrastasse sobre as brasas do inferno por ela. Arthur fazia isso e ela jamais o deixaria escapar. Anna se deixou
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abraçar um instante antes de voltar a falar—: Obrigado pelo que fez. Sei que… — A emoção a embargava — Sei que não foi fácil. Seu rosto se escureceu, mas somente por uns segundos. —Jamais me arrependerei disso — disse repetindo suas palavras com um meio sorriso — Salvar a vida de seu pai é um pequeno preço a pagar pela felicidade que recebo em troca. Anna mordeu o lábio. —Mas o que passará com Bruce? Não estará zangado porque o deixasse partir? Arthur fez uma careta. —Se podemos tomar a primeira reação de seu tio como sinal, provavelmente sim. Mas o rei me deve alguns favores. Acredito que com isto saldamos as contas. Enquanto seu pai abandone a Escócia, estará inclinado a compreendê-lo.
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Inclinado. De repente Anna se deu conta de que somente notava uma mão de Arthur nas suas costas. Libertou-se de seu abraço e ao baixar o olhar viu que sua mão esquerda tinha uma pomposa bandagem. Não tinha notado antes porque Arthur levava as luvas. —O que passou a sua mão? —Está quebrada — disse Arthur com total naturalidade. Ficaram olhando-se nos olhos, e Arthur respondeu sua pergunta tácita. Anna só precisou olhar seu maltratado rosto para saber como tinha acontecido. —Que mais? —Algumas
costelas
—
respondeu
ele,
encolhendo-se de ombros — Vários cortes e alguns hematomas. Nada que não possa curar — Houve algo em seus olhos que indicou a Anna
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justamente o contrário — Não é mais do que mereço pelo que lhe fiz. —Não — repôs ela negando com a cabeça de maneira categórica — Não diga isso. O que fizeram foi horrível, mas jamais teria exigido tal castigo —continuou com lágrimas nos olhos — Não é que o tenhamos tudo muito fácil, verdade? Arthur a agarrou pelo queixo e negou com a cabeça. —Não, amor, mas te prometo que isso mudará. Acabaram-se as mentiras. Acabaram-se os segredos. —Sorriu, franzindo o cenho — Em qualquer caso, já conhece os mais perigosos. Que formava parte do exército secreto de Bruce. —Por que te chamam Guardião? Houve um momento incômodo quando Arthur olhou a seu redor no aposento em busca de algo
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onde sentar-se e percebeu de que não havia mais que a cama. Não obstante, sentou-se na borda e fez gesto a Anna para que se sentasse junto a ele. Ela notou que tomava cuidado em deixar uns centímetros de separação entre ambos enquanto explicava. Tinham-no
obrigado
a
abandonar
o
treinamento antes dos outros para que ocupasse seu posto como espião. A decisão de usar nomes de guerra fora feita em sua ausência. Alguns dos nomes saíram das brincadeiras que se fazia entre eles e outros, como o seu, provinham de suas habilidades. —Então eu tinha razão —disse Anna com alegria—
quando
pensava
que
seria
um
rastreador perfeito. Arthur riu. —Sim, embora não me fez nenhuma graça.
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Tentava ocultar minhas habilidades, mas parecia pensar em outras coisas. E em outras coisas começou a pensar Anna. Aproximou-se um pouco mais dele, deixando que seus seios lhe roçassem o braço. —E o que ocorrerá depois? Arthur parecia tentar conter-se por todos os meios. —Agora acredito que será melhor que eu vá. Não deveria estar aqui contigo deste modo. Não sem um sacerdote. Anna riu e pôs uma mão sobre a perna. Seus potentes músculos se esticaram debaixo de sua palma. —Não acredito que goste de ter a um sacerdote aqui conosco. Arthur apertou os dentes; de fato, pareceu apertar todos os músculos de seu corpo.
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—Refiro-me até que estejamos casados. —Tenho a impressão de que é um pouco tarde para nos pôr cerimoniosos, não? —Não subi com a intenção de... - Arthur não continuou — Maldita seja, Anna, deixe de fazer isso. —Agarrou sua mão e deteve sua incursão pelo interior da coxa — Tento fazer a coisa certa. —Quer dizer que anteriormente não fez certo? —Anna piscou com exagerada inocência. Arthur a olhou com recriminação. —Sabes perfeitamente que não é isso a que me refiro. Aquilo foi absoluta e totalmente perfeito. Acabou a provocação. Quando ergueu o olhar de novo o fez com todo o amor de seu coração. —Por favor, Arthur. Preciso me sentir assim uma vez mais. —Anna necessitava a cercania. Necessitava a conexão. Precisava saber que
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tudo iria bem. Seus olhos se abriram de par em par — A menos que não sejas capaz. Esquecia que… Arthur a deteve com um ardente beijo que penetrou até o mais profundo de sua alma. —Claro que sou capaz, maldita seja. E, assim, procedeu a lhe mostrar com todo luxo de detalhes quão capaz era. Lenta, profunda e meigamente, com todo o amor que albergava em
seu
coração.
estremecimentos
de
E
quando prazer
os
últimos
começaram
a
extinguir-se, quando ele sustentou seu corpo nu contra o seu arroxeado e maltratado, Anna soube que nos braços daquele fornido e firme guerreiro encontraria por fim a paz. Epílogo
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Castelo de Dunstaffnage, 10 de outubro de 1308 A paz fazia bem, tanto para a Escócia como para Anna. Menos de dois meses depois da derrota de seu pai no Brander, Bruce ganhou a batalha dos grandes líderes da Escócia. Seu avô, Alexander MacDougall, rendeu-se depois de um breve assédio ao castelo de Dunstaffnage, enquanto que o conde de Ross fez o mesmo depois de poucos dias. Bruce perdoou a vida do homem responsável pelo encarceramento de sua mulher, de sua filha e de suas irmãs, assim como da condessa de Buchan, um ato que dava fé do desejo que tinha de ver a Escócia e a seus nobres unidos sob uma mesma bandeira. «Pelo bem da Escócia.» Anna tinha que admitir que essa filosofia a impressionava. O homem em si…Bom, procurava manter a mente
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aberta. Tantos anos defendendo uma causa não se esqueciam em questão de semanas. Mas o que Bruce tinha planejado para esse dia faria bastante para que mudasse de opinião. Sabia o que significava aquilo para Arthur. Seu olhar passeou pelo grande salão e cruzou a maré de membros do clã reunidos em celebração. Alguns deles lhe pareciam familiares, embora quase todos eram estranhos. Tomaria um tempo, mas Anna prometeu que conheceria todos eles. Aquele seria seu lar. Bruce tinha concedido a guarda do castelo de Dunstaffnage a Arthur em gratidão a sua lealdade e pelos serviços prestados. Além disso, sua próxima missão tampouco o afastaria muito. Passaria os seguintes meses fiscalizando o paradeiro de Lorn e Argyll em sua totalidade e riscando mapas de quanto encontrasse.
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Arthur tomou a mão de Anna e a apertou carinhosamente. —Está contente, meu amor? Anna ergueu o olhar para o homem que estava sentado junto a ela no estrado, um homem que se convertera em seu marido nessa mesma manhã. Lágrimas de alegria cobriram seus olhos ao olhar suas bonitas feições, que já apenas viam pequenos traços do calvário que tinha sofrido. —Sim, e poderia ser de outra forma? Ao fim tem feito de mim uma mulher honrada e talvez possa voltar a olhar ao pai Gilbert nos olhos. Arthur riu. Esse profundo e harmonioso som, muito mais livre agora, seguia sendo capaz de lhe arrepiar a pele com um quente formigamento. —Já te disse que teria que ter partido antes. —Tinha frio… — Anna fez um biquinho com
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os lábios. —Ofereci-te uma manta antes de ir. —Não queria mais mantas — disse com a mesma teima que a tinha metido em problemas desde o começo. Queria a ele. Acostumou-se a dormir do seu lado em Innis Chonnel e fora difícil habituar-se de novo ao retornar ao Dunstaffnage no mês anterior. Ver-se às escondidas não era nem metade de excitante e íntimo. E, é obvio, o principal problema de ver-se às escondidas era a possibilidade
de
que
os
descobrissem,
justamente o que tinha acontecido fazia uma semana, quando o pai Gilbert pegou Arthur saindo de seu aposento. —Esta noite não necessitará mais mantas — disse ele com um olhar longo e cálido. Anna não pôde evitar ruborizar-se, apesar de
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que nos últimos dois meses tivesse perdido a inocência em muitos sentidos, alguns deles de jeitos mais reveladores. —Acredita que se darão conta se sairmos agora? —perguntou Arthur inclinando-se sobre ela. O suave sussurro de seu fôlego no ouvido a fez estremecer. Mas o que lhe provocou brilhos de calor entre as pernas foi a mão que se movia de maneira possessiva e determinada sobre sua coxa. As carícias de seu dedo recordavam a sua língua. E se recordava sua língua, não podia esquecer-se de sua boca. E se recordava sua boca, tinha que lembrar-se da maneira em que a tinha despertado essa manhã fazendo-a chorar de prazer. O mesmo dia das bodas, o muito desrespeitoso velhaco! E então recordou como tinha pago sua
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diabrura com a mesma moeda incitando-o com sua própria língua. Recordava o delicioso sabor salgado de sua pele, aquela coluna de carne aveludada
introduzindo-se
cada
vez
mais
profundo em sua boca. A maneira em que o tinha espremido até o final com a sucção de seus lábios, rodeando a grossa e potente cabeça de seu membro com a língua até que Arthur implorasse por não poder conter-se mais. O modo que acabou por perder o controle e lhe sustentara a cabeça com as mãos para meter até o fundo de sua garganta, fazendo que os gritos guturais do alívio retumbassem em seus ouvidos. O corpo de Anna começou a derreter com a doce calidez da excitação. Então recordou onde estava e se sobressaltou. Afastou-lhe a mão, confiando que ninguém os tivesse visto. Pelo amor de Deus, se tinha os olhos entreabertos!
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Era ela quem devia o distrair e não ao contrário. —Não podemos sair. Não até que… — Se deteve
ao
conscientizar-se
de
que
talvez
houvesse falado demais — Somos os convidados de honra. Arthur pôs cara de surpresa, olhando ao outro extremo da mesa no que havia vários assentos vazios. «Pelos pregos de Cristo!» Se deu conta. Pois claro que tinha feito. Não havia nada que escapasse a aquele homem tão observador. Anna o agarrou pela mão. —Vamos, deveríamos dançar. Ficou circunspeto, sem mover um dedo. —Passa algo, Anna? Atua de um modo estranho. Os olhos se puseram como pratos. —Pois claro que não. Somente quero dançar.
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Um sorriso maroto torceu seu gesto. —Temo que terá que me dar uns minutos. —Por que? Arthur baixou o olhar até sua virilha, e as bochechas de Anna se ruborizaram ao ver seu volumoso pacote. Ao que parecia não era a única que estivera relembrando. Olhou do outro lado da mesa, onde estava sentado MacGregor. Este fez uma sutil negação com a cabeça, depois da qual ela voltou a olhar de novo a seu marido, que seguia circunspeto. —Está segura de que não é por…? Sei que sente falta da sua família. Um sorriso amargo se desenhou em seus lábios. —Sinto falta deles, mas isso não significa que não seja feliz. E meu avô está aqui — disse inclinando a cabeça em direção ao chefe dos
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MacDougall, sentado a poucos assentos de distância de onde estava o rei. Bom, onde estava o rei até um momento. Uma vez tomado o castelo, sua mãe e suas irmãs receberam permissão para seguir a seu pai e seus irmãos no exílio, mas Bruce queria o apoio de seu avô. Se seria capaz de ganhar o ou não era algo que Anna não sabia, mas estava contente de ter ao menos a um de seus familiares com ela no dia de suas bodas. E é obvio estava Escudeiro. Um dia obrigaria Arthur que lhe contasse como tinha conseguido tirar o cachorrinho do castelo enquanto este estava sob assédio. Anna ficou a choramingar como uma idiota ao vê-lo e teve que explicar a um confuso Arthur que chorava de felicidade. Após, não houve um só dia que não jurasse que se arrependia assim que o mascote o perseguia,
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mas ela sabia que em realidade não se importava nem a metade do que dizia. A aceitação, ou melhor dizendo, a confiança no afeto parecia agora mais fácil. E que Arthur se esforçasse tanto por vê-la feliz era algo que a comovia até o extremo. Quando fez o mesmo com seu irmão Alan, antes que o castelo caísse e de que sua família fugisse para Inglaterra, quase a tinha matado da alegria. Ver seu irmão, sabendo que não compartilhava a decisão de seu pai e que não cortaria as relações com ela completamente, era mais do que Anna poderia esperar. Alan era leal a seu pai, mas essa lealdade não estava brigada com seu amor por ela. Sim, tinha muito que agradecer a seu novo marido. —E o que tem a ti, Arthur? Sei que certamente te decepciona que não estejam aqui
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todos seus companheiros da Guarda. Anna não sabia de todos os detalhes da Guarda de elite de Bruce, nem tampouco perguntou, consciente de que esse segredo preservava a segurança de seu marido. Mas sabia que se tratava dos melhores guerreiros de elite na Escócia, o melhor do melhor em todas as disciplinas de guerra. Sempre pensou que havia algo especial em Arthur, mas nunca imaginou quão especial era. Também
tinha
adivinhado
algumas
das
identidades por sua própria conta. Seu tio. Os dois homens que o acompanhavam e tinham ajudado a libertar Arthur, Gordon e MacKay. O bonito até dizer chega do Gregor MacGregor, que tinha formado parte do ataque tantos meses atrás. Seu rosto era difícil de esquecer. E parecia certo suspeitar que o ilhéu de feroz aspecto Tor
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MacLeod era outro deles, assim como esse nórdico
extremamente
encantador,
Erik
MacSorley. Ambos estiveram sentados junto ao rei com suas esposas, embora nesse momento só elas permaneciam ali. Pode ser que não soubesse todos os detalhes, mas Anna sabia o suficiente para compreender quanto significavam esses homens para Arthur, embora não fosse consciente disso. Entretanto, seria. Arthur encolheu os ombros como se aquilo não lhe importasse realmente. —Há paz no norte, mas nas fronteiras continuam as revoltas. Estou seguro de que teriam vindo se fosse possível. Gordon se casará logo. Talvez consiga vê-los todos nesse dia. Há muito que fazer antes que o rei atenda a seu primeiro Parlamento na próxima primavera —
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continuou, depois de uma pausa — Estou contente de que meus irmãos possam estar aqui. É a primeira vez que estamos todos juntos na mesma estadia há anos. Sir Dugald e sir Gillispie se renderam junto a seu avô e Ross. Surpreendentemente, não pareciam guardar rancor de Arthur; entretanto, pela expressão de sir Dugald enquanto discutia com sir Neil, não se podia dizer que seus sentimentos fossem os mesmos para seu irmão mais velho. —Pois
pelo
que
parece,
poderiam
ter
esperado mais tempo. Arthur sorriu. —Sempre foram assim. Rivais encarniçados, inclusive quando pequenos. Eu acredito que essa é a razão pela que Dugald se alinhou junto aos ingleses durante tanto tempo, para não ter que
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acatar ordens do Neil. Já se arrumarão. A seu devido tempo. Anna advertiu que Arthur voltava o olhar ao redor. —Está preparado para dançar? —perguntou com inquietação. Arthur arqueou uma sobrancelha. —Estou preparado para ir à cama. O olhar dela se voltou de novo para Gregor MacGregor de maneira inconsciente. Para seu consolo,
dessa
vez
o
guerreiro
assentiu.
Entretanto, quando voltou o olhar para este Arthur tinha os olhos entreabertos. —Importaria de me dizer por que cada vez que menciono a cama olha ao MacGregor? — Anna se ruborizou — Vai me dizer do que se trata? —exigiu com aborrecimento — Está tramando algo. E não me diga o contrário, porque
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posso pressentir. Anna ergueu o queixo, molesta com sua acuidade. —Acreditava que seu calcanhar de Aquiles fosse eu. —E é —disse Arthur com um gesto brusco da mão — Mas não o dele. Não parecia fácil surpreender a alguém que estava pendente de cada matiz, que notava qualquer
mudança
e
advertia
qualquer
movimento a seu redor. Inclusive tinha percebido as mudanças de seu corpo antes dela e a informou que seria melhor que adiantassem as bodas ou seu filho seria muito grande para ter só dois meses de vida. Anna
o
obsequiou
com
um
olhar
de
suficiência. —Está ciumento. —Deixou que seu olhar
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voltasse a recair sobre o fundo da mesa e ficou olhando de maneira pausada, como se o estivesse apreciando — É bastante bonito esse teu amigo. Sua cara feia piorou mais ainda. —Pois não será por muito tempo, se continua olhando-o assim. E não me respondeste. Anna soprou e se deu por vencida. —Está bem, mas queria que fosse uma surpresa. —O que queria que fosse uma surpresa? Depois de um breve passeio além das portas do castelo Arthur descobriu a razão para tanto subterfúgio. De pé numa clareira da floresta, com o halo laranja do sol do entardecer atrás dele, erguia-se o rei Robert Bruce ante um obelisco, investido com toda a cerimônia real que lhe supunha. Junto a ele, alinhados como um pano
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de fundo, com seus traços mascarados sob os elmos com nasal cobertos de breu, esperavam os outros dez membros da Guarda secreta de Bruce. Arthur se deteve sobre seus passos e lhe dirigiu um rápido olhar de incredulidade. —Tiveste algo que ver nisto? Anna negou com a cabeça. —Foi idéia do rei Hoo… —começou, detendose o ver o rosto que punha seu marido — Foi idéia do rei Robert —se corrigiu, embora esse título ainda não saía de seus lábios com naturalidade — Minha missão era te distrair — disse fazendo uma careta — Uma missão em que, ao que parece, fracassei. Arthur a agarrou em braços e a beijou. —Pois eu acredito que a cumpriu que maneira admirável.
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Anna transbordou de alegria. —Vá. Estão esperando. Por fim Arthur teria a cerimônia da que nunca pôde gozar. A cerimônia que lhe fora negado por seu papel como espião. Aqueles homens eram tão parte dele como ela mesma. Anna cruzou os braços sobre seu ventre. E como logo seria seu bebê. —Não demorarei muito — disse Arthur trás beijá-la de novo. —Estarei esperando. «Sempre.»
Do
mesmo
modo
que
ele
retornaria sempre para ela. Aquele homem que a todo momento olhava à porta como se quisesse fugir, tinha encontrado o lugar ao que pertencia. E em um mundo no que a paz era tão frágil como uma parte de cristal, Anna tinha encontrado a rocha em que apoiar-se.
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Observou-o dirigir-se para eles com o peito cheio pelo orgulho e felicidade. Uma vez que chegou
lá,
Anna
começou
a
afastar-se.
Entretanto, mal teve percorrido alguns metros mais à frente do círculo de árvores quando duas mulheres a detiveram. —Aonde vai? —perguntou em um sussurro Christina, a mulher de Tor MacLeod. Anna tentou não sentir-se intimidada por sua beleza, mas parecia impossível. Christina era tão deliciosa e refinada como uma princesa de conto de fadas, sobretudo ao compará-la com o aspecto aterrador de seu marido, que parecia tirado das páginas arrancadas de algum livro antigo sobre mitologia nórdica. —Eu… pensava que não pudesse olhar. A segunda das mulheres sorriu. Embora não era tão incrivelmente formosa como Christina
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Fraser, havia algo sereno e agradável em Elyne, a esposa do descarado pirata Erik MacSorley. Anna ficou perplexa quando descobriu que era a filha do conde de Ulster, um amigo íntimo do rei da Inglaterra. Mas também era irmã da esposa encarcerada do rei Robert, Elizabeth. Outra família dividida, ao que parecia. —Acham que não —disse Elyne — Mas isso não vai me deter. Não tive oportunidade de ver a de meu marido. Não perderia isso por nada do mundo. —Não se zangarão? —perguntou Anna. Christina lhe dirigiu um sorriso insolente. —Superarão. Além disso, quero ver que tipo de marca lhe põem. Anna a olhou com surpresa. —Já tem uma. O leão rampante. Pensei que todos os homens o tinham.
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—Assim é —respondeu Christina — Mas decidiram acrescentar outra pela aranha da cova. Conhece a história? Anna assentiu. A história da aranha de Bruce na cova formava já parte da lenda. —Para
honrar
a
ocasião,
Erik
decidiu
acrescentar uma em forma de gargantilha ao redor de seu braço que parece uma teia de aranha — disse Elyne — Como é marinheiro, incorporou também o birlinn nele —acrescentou com um sorriso — Uma vez que outros o viram, todos decidiram fazer um. —Elyne, entre risadas, ergueu o olhar ao céu como dizendo: «Homens». —Venha — disse Christina, agarrando-a pelo braço e arrastando-a de novo para as árvores — Já começaram. As três mulheres contemplaram juntas das sombras como Arthur se ajoelhava ante o rei e
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tomava o lugar que lhe correspondia por direito próprio entre seus companheiros da Guarda, seus amigos. «Inquebrável», dizia a gravação na espada que Bruce lhe entregou. Anna não podia estar mais de acordo. Fim
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Nota da Autora A batalha do Estreito de Brander foi chave na guerra de independência da Escócia. Não só representa
um
exemplo
da
mudança
de
estratégias de Bruce, pois este deu uma emboscada a quem pretendia lhe dar uma, mas sim também assinala a precipitada queda em desgraça dos MacDougall e a mudança de poderes na política das Highlands Ocidentais
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para outro ramo de descendentes de Somerled, os MacDonald, e também para os Campbell, que se beneficiariam do infortúnio dos MacDougall. Há certo desacordo entre os historiadores na hora de datar a campanha de Bruce em Argyll após a qual John de Lorn fugiu da Escócia e a queda do castelo de Dunstaffnage. Decantei-me pela data mais convencional do verão do ano de 1308, mas há quem opine que a capitulação final de Argyll não foi antes do ano de 1309. Embora a forma como narro a batalha seja fictícia, incorporei muitos dos acontecimentos reais, entre os quais se inclui
John de Lorn
dirigindo seus homens de um birlinn à beira do lago, já que se supunha que estava recuperandose dessa enfermidade que tinha propiciado a trégua do ano anterior. Diz-se ainda que ao falhar seu ataque, retirou-se a um de seus castelos.
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Mas há um detalhe em particular da batalha que foi o que me deu a idéia para a história. Li algo
a
respeito
de
um
explorador
que
supostamente tinha advertido ao Bruce da emboscada, com isso salvou sua pele. Aquilo soava como um trabalho perfeito para meu rastreador de elite Arthur Campbell. O personagem de Arthur Campbell está inspirado vagamente em Arthur de Dunstaffnage, o irmão, ou pode ser que o primo do Neil Campbell. Tal e como sugere seu apelido, foi renomado
governante
do
Dunstaffnage
depois
guerra.
da
castelo Algo
de que
encaixava à perfeição com minha heroína MacDougall, embora Anna seja um personagem fictício e o nome da esposa de Arthur, se é que a houve, não apareceu. Curiosamente, sim existiu um compromisso de matrimônio entre Arthur e
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Christina das Ilhas MacRuairi, embora nunca chegaram a casar-se. O que também se adequa à perfeição com Arthur, e deste modo com seu irmão Dugald, é que se dizia que esteve no lado dos ingleses durante um tempo e mais tarde passou ao de Bruce.
Arthur
de
Dunstaffnage
não
é,
provavelmente, o mesmo Arthur progenitor do clã MacArthur. Parece mais plausível que este Arthur proviesse
de
outro
ramo
da
família,
possivelmente mais antiga, os Campbell do Strachur (que significa «filhos de Arthur»). Mas há muita confusão e existem diferentes teorias respeito à linhagem dos MacArthur, incluindo a descendência direta do rei Artur. Um antigo provérbio das Highlands diz: «Não há nada mais antigo que as colinas, MacArthur e o diabo». Neil Campbell foi um dos partidários de
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Robert Bruce mais importantes e leais. De fato, ao final Neil acabaria casando-se com a irmã do rei, Mary, quando a libertaram do cativeiro da jaula nas alturas do castelo do Roxburgh, ao redor do ano 1310. Mary voltaria a casar-se depois da morte de Neil, algo comum em uma época em que havia tantos viúvos e viúvas. Aos leitores do primeiro livro da série, O Guerreiro, talvez lhes interesse saber que seu segundo marido foi Alexander Fraser, o irmão da Christina. Um interessante ponto e aparte na história do Neil dá certo colorido à época: parece ser que sua primeira esposa era filha de Andrew Crawford. Neil e seu irmão Dugald, que foram nomeados guardiães das duas irmãs Crawford, decidiram tomar como esposas de maneira literal: seqüestraram-nas. John de Lorn, também conhecido como John
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Bacach (John o Coxo) e como John de Argyll, foi uma figura destacada na política das Highlands Ocidentais, responsável não só da morte do Colin Mor Campbell na batalha de Red Ford, mas também
da
de
seu
parente
Alexander
MacDonald, lorde de Islay, o irmão de Angus Og. Lorn sofreu enormemente por sua lealdade aos
Comyn,
a
quem
estava
ligado
por
matrimônio, e também por seu ódio ao Bruce, algo que, dado que este assassinou ao Comyn o Vermelho,
era
uma
circunstância
bastante
compreensível. O uso de mensageiras femininas por parte de Lorn é minha invenção, mas a frustração das missivas que se perdiam não é. A esse período sobreviveram algumas epístolas, entre as que se inclui uma carta recentemente decifrada do oficial do Banff dirigida ao Eduardo II em que se queixa
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dos assassinatos de seus mensageiros. Do mesmo modo, a frustração de Lorn ao ficar sozinho frente a Bruce e a dificuldade de conseguir apoios dos barões locais está apoiada na correspondência entre Lorn e Eduardo II, em que o primeiro afirma que se vê obrigado a uma trégua com Bruce porque está doente e «os barões de Argyll não me emprestam ajuda alguma»
(Robert
Bruce,
G.W.S.
Barrow,
Edinburgo University Press, Edinburgo, Escócia, 2005, P. 231). Não há fonte que confirme a doença de Lorn. O
ataque
ao
coração
e
os
conseguintes
problemas coronários são de minha própria invenção, algo que resulta ajustar-se bem a sua propensão a esses violentos ataques de cólera. Paralelamente, também se desconhece a fonte da que provém a enfermidade debilitante que
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golpeou ao Bruce no inverno do ano 1307. Embora certos rumores históricos a identificam com a lepra, as últimas hipóteses apontam que devia ser escorbuto. Qualquer que fosse a causa, sacudiu com força ao novo rei e, conforme se diz, esteve
a
ponto
de
acabar
com
ele.
Supostamente, Bruce foi levado nas costas por seus homens à batalha de Inverurie. O broche que Lorn leva no capítulo dois, do qual se diz que o arrancaram de Robert durante da batalha de Dal Righ, segue em poder do chefe dos MacDougall, e sua última aparição em cena é tão recente que somente faz cinqüenta anos. Não obstante, alguns peritos asseguram que o broche em questão provinha de um período anterior. A batalha de Red Ford ocorreu de maneira diferente de como eu a retratei. Mais que uma
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emboscada, John de Lorn se encontrou com o Colin Mor junto a um córrego que desembocava no Loch na Streinge (mais tarde chamado Allt a chomhla chaidh, quer dizer, o córrego do encontro). A discussão degenerou em uma briga e este em uma batalha. Os MacDougall se viram superados em número, e parecia que perderiam, até que um arqueiro disparou sobre o Colin o Grande detrás de uma pedra e o matou. Até onde chegava o poder dos Campbell nas imediações do Loch Awe antes da guerra é algo que não se tem ciência certa, mas já que o fizeram magistrado municipal de Loch Awe perto do ano 1296, podemos presumir que não foi insignificante.
Embora
se
acredita
que
os
Campbell detiveram a propriedade o castelo de Innis Chonnel anterior a dos MacDougall, cuja existência está confirmada no ano 1308, os
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historiadores não estão seguros disso. Não obstante, no momento em que transcorre o livro, o castelo estava nas mãos dos MacDougall. Lorn menciona em uma carta ao rei Eduardo os três castelos que possui em Loch Awe. O ódio entre Bruce e os MacDougall só rivalizava com o de seus parentes os Comyn. A «perseguição de Buchan» que seguiu à batalha do Inverurie (ou batalha de Barra) de 23 de maio de 1308, a qual tem lugar a princípio do livro, parece ser uma das poucas ocasiões nas que Bruce deu rédea solta à vingança. A destruição foi tão devastadora que se diz que demoraram anos em recuperar-se e que se falou dela durante gerações inteiras. Pelo contrário, o rei Robert sim que aceitou a rendição de William (Uilleam II), o conde do Ross, sem tomar represálias pelo papel que tinha
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desempenhado Ross na captura e posterior encarceramento das damas de Bruce (sua esposa, sua filha, suas irmãs e a condessa de Buchan). Não muito tempo depois da rendição de Ross, seu filho Hugh (Aodh) casaria-se com a irmã de Bruce, Mathilda. Conforme contam, Alexander MacDougall, lorde do Argyll, era muito velho e estava doente no momento da batalha do Brander. Rendeu-se ante Bruce depois do assédio ao castelo de Dunstaffnage e atendeu ao primeiro Parlamento do
rei
em
março
de
1309,
mas
depois
acompanhou a seu filho no exílio, onde morreu em 1310. Como é habitual, alguns dos castelos que são mencionados no livro são conhecidos com outros nomes. O castelo de Auldearn se conhece também pelo Old Even e o castelo de Glassery
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(ou Glassary) conhece-se como castelo do Fincharn. A tortura medieval dos ratos era muito mais truculenta do que sugiro. Colocavam sobre o estômago da vítima uma jaula fechada com um rato em seu interior e depois a esquentavam em cima. O rato, em sua tentativa de escapar, roía lentamente as vísceras do condenado. Um detalhe… interessante que provavelmente teria dotado ao livro de um «colorido» muito fiel à época. Finalmente, os leitores do terceiro livro de minha trilogia dos Campbell, O highlander traído, talvez percebam a conexão entre a espada de Arthur e a de Duncan, em que gravaram a lenda: «Inquebrável» que passou de geração em geração dos tempos de Bruce. Apesar de que seja de minha própria mente, é obvio que era
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costume gravar lendas nas espadas e passá-las ao herdeiro. Série Guardiões das Highlands 1 – O Guerreiro 2 – O Falcão 3 – O Guardião Ebooks distribuídos sem fins lucrativos, de fãs para fãs. A comercialização é estritamente proibida.
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