Jornal Plástico Bolha #22

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plástico bolha Distribuição Gratuita

Ano 3 - Número 22 - Junho/Julho 2008

envolvendo palavras

AGORA COM 16 PÁGINAS Ao som do belíssimo poema de Paulo Henriques Britto (um toque aos novos poetas), Heinz Langer se levanta para dançar. Também a ocasião não é para menos: o jornal plástico bolha cresceu e agora vem com inacreditáveis 16 páginas e nova diagramação.

Heinz Lan

ger

Para comemorar, criamos um novo suplemento musical, onde Santuza Cambraia Naves continua Por dentro do tom. Juntam-se a ela Mauro Rebello, que, na coluna Estouros Futuros, revela quem serão os bolhas de amanhã, e Mauro Ferreira, com suas Notas no Plástico, resenhas fresquinhas sobre o mercado fonográfico.

Um pouco de Strauss

Em meio aos sons de tanta festa, as Mulheres-damas bordam suas tramas e corações sem ar sobrevivem como podem. De repente, Carolina de Jesus constata: é junho, é o ano que desliza! Que o diga Miriam Sutter, que analisa o mês sexto na coluna Oráculo. E, se é tempo de juventude, as crianças também estão convidadas para a comemoração, na coluna mineira das Bolhas Geraes.

Não escreva versos íntimos, sinceros, como quem mete o dedo no nariz. Lá dentro não há nada que compense todo esse trabalho de perfuratriz, só muco e lero-lero.

Até mesmo o escritor e diplomata Edgard Telles Ribeiro, que passou pela PUC-Rio no mês passado, foi tragado para a festa da Bolha em uma entrevista exclusiva. O clima vai ficando quente, e a professora da UERJ e bandeirante das bolhas, Ana Chiara, puxa a poeta portuguesa Luiza Neto Jorge, que passava pelo local, para deitar-se com ela no aconchego da página 14.

Não faça poesias melodiosas e frágeis como essas caixinhas de música que tocam a “Valsa do Imperador”. É sempre a mesma lengalenga estúpida, sentimental, melosa.

Se você acha que as coisas estão ficando esquisitas, vá até a nova seção dos Contos Insólitos, onde Greco Blue mostra a que ponto as coisas podem chegar. A loucura é tanta que até Antonin Artaud veio marcar presença em mais um Puzzles de Anna Lee. Desafio poético, novo Clique Aqui, o melhor da poesia e da prosa, está tudo aqui no plástico bolha!

Esquece o eu, esse negócio escroto e pegajoso, esse mal sem remédio que suga tudo e não dá nada em troca além de solidão e tédio: escreve pros outros.

Agora, para a festa ficar completa mesmo, só falta você. Adiante! Boa leitura!

Mas se de tudo que há no vasto mundo só gostas mesmo é dessa coisa falsa que se disfarça fingindo se expressar, então enfia o dedo no nariz, bem fundo, e escreve, escreve até estourar. E tome valsa.

Paulo Henriques Britto Poema do livro Trovar Claro (Companhia Das Letras, 1997)

NESTA EDIÇãO

EDGARD TELLES RIBEIRO / ANNA LEE / SANTUZA CAMBRAIA NAVES / MAURO FERREIRA / HEINZ LANGER / PAULO HENRIQUES BRITTO / AUGUSTO DE GUIMARAENS CAVALCANTI / THIAGO COSTA FARIA / DIMITRI MERINO / ISABEL DIEGUES / LUIZA MARCIER / FELIPE CARVALHO DOS SANTOS BEATRIZ JUNQUEIRA PEDRAS / CATHARINA WREDE / ALEXANDRA WILTSHIRE / GRECO BLUE / ALEXIA BOMTEMPO / MAURO REBELLO / CAROLINA MARIA DE JESUS / SELMA FONTES / DANIEL PIRAS CONSTANZA DE CÓRDOVA / LETÍCIA SIMÕES / MARA LIBBER / ALICE SANT’ANNA / PRISCILA MENDES MIRIAM SUTTER / EDSON SANTANA / DIANA SANDES / ANA CHIARA / PAULO GRAVINA / CARLA GUEDES MARCELA SPERANDIO ROSA / ANTONIA RATTO / EDITE DIAS DOS SANTOS / PÉRICLES F. DRELOS ≠1


BOLHETIM Extra! Extra! Surto de plástico bolha invade o estado do Rio de Janeiro. Casa de Cultura de Paraty A Casa de Cultura de Paraty é um local dedicado à cultura e à arte. Localizado no Centro Histórico da cidade, o espaço conta com auditório, sala de exposição, loja de artesanato e café, mas é na livraria onde os visitantes e moradores de Paraty podem encontrar a mais nova cara da literatura fora da Flip: o plástico bolha. Podem conferir: Rua Dona Geralda, 177, Centro — Paraty/RJ.

Botequim Honesto O plástico bolha atravessa a ponte para aumentar ainda mais o sorriso dos moradores de Niterói, que, para ler o jornal, não precisam mais vir ao Rio. Basta pegá-lo no Botequim Honesto! Localizado no bucólico e aprazível Jardim Icaraí, o bar conta com um ambiente confortável e um atendimento diferenciado. Aproveitem a leitura entre uma cervejinha e outra. O endereço é Rua Ministro Otávio Kelly, 483, Icaraí — Niterói/RJ.

os ingênuos mesmo através do turvo e estilhaçado espelho das feras, mesmo através dos mapas litúrgicos, mesmo através das igrejas teleguiadas que me perseguem, qual será o novo desastre? todo índice é símbolo, tudo é artifício, tudo é caverna. em todo esse tempo o meu cinema era você. um dilúvio de cartões postais, me manda uma mensagem de batom para naufrágio, sete segundos de radiação, só os ingênuos não viram esse colírio de óleo diesel, puro aborto luminoso, a rainha de sabá já chegou. uma mulher acaba de parir um peixe rompendo a escuridão de todos os túneis do metrô.

Barraca das Letras

Augusto de Guimaraens Cavalcanti

Maricá, Maricá, o plástico bolha acaba de chegar. Temos o prazer de distribuir o jornal na Barraca da Letras, projeto de inclusão social que divulga a leitura e a cultura de forma simples, prática e popular, promovendo a leitura em todos os níveis por meio da locação de livros e da troca de idéias. Além de ter acesso ao plástico bolha, na Barraca das Letras o leitor pode participar de rodas de leitura e história, saraus poéticos, palestras literárias e esquetes de teatro. Esperamos que todos os leitores aproveitem essa rara oportunidade! A Barraca das Letras fica na Praça do Skate — Maricá/RJ; aos finais de semana, em funcionamento das 17 às 21 horas.

EDITORES

COMISSÃO aVaLIaDORa

COORDENaÇÃO

EQUIPE

Lucas Viriato Paulo Gravina

Constanza de Córdova Carlos Andreas Tomé Lavigne Nadja Voss Mauro Rebello Isabel Wilker Edson Santana Manoela Ferrari Cristiane Mendes Roberta Rubinstein

Thiago Bento Lucas Viriato

Márcia Brito Beatriz Pedras

REVISÃO

aGRaDECIMENTOS

Marilena Moraes Rubiane Valério Rafael Anselmé Gabriel Matos

Gisela Gold Leonardo Marona Lasana Lukata Andrea C. Stark Léo Carnevale

EDITORa aSSISTENTE Marilena Moraes

CONSELHO EDITORIaL Luiz Coelho Gregório Duvivier Isabel Diegues

DISTRIBUÍDO no estado do Rio de Janeiro e na cidade de Belo Horizonte / TIRAGEM 8.000 / IMPRESSO na CUT Graf ENVIE SEUS TEXTOS PARA JORNALPLASTICOBOLHA@GMAIL.COM

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Insônia monstruosa

Dia de grilo Dia novo e nós aqui Cheios de idéias. Sei que tem sentido E o vazio passará, Mas agora é ar, Sons, olhos, dispersos. Estou mais pra montanhas, Coisinhas mudas, ciscos, Vozes d’água, etc... Um de meus nós Pede lagartixas, grama, Boca e boca, Desminhocar goiabas. Hoje me sinto desimportante. Formigas memórias Me dizem nuvens, elefantes, Por isso são gigantes essazinhas. Eu grilo de dia, Ou a lua noturna ensolarou esta manhã? Dimitri Merino

Se aquele estranho e súbito pressentimento (que mais se parecia com uma indisposição) estivesse correto, se realmente não existissem monstros, então seus maiores medos se tornariam realidade. Não poder apontar alguém como uma exceção bizarra do que deveria ser um autêntico ser humano, com todas as suas elevadas aspirações morais e o sentimento de altruísmo, não poder dizer que todos os horrores até hoje cometidos — todas as mesquinharias, as mentiras, as traições, o ódio, a violência em seu estado mais instintivo e, o que é pior, em seu estado mais requintado, tudo isso, sem exceção — foram levados a cabo por pessoas desumanas e estranhamente cruéis, mas, muito pelo contrário, por pessoas como ele próprio, feitas todas da mesma substância e sob a mesma moldura, lhe era inadmissível, quase uma ofensa. Não havia senão irmãos ao seu redor, Caim e Abel vivendo no mesmo jardim. Ou todos eram monstros ou nenhum o era. A primeira opção lhe soara inverossímil, posto que jamais havia sido uma pessoa má ou desonesta e, ademais, não poderia desconsiderar assim tão levianamente todos os seus reiterados esforços de ser não somente agradável e útil às outras pessoas, mas também ser um homem bom, em tudo o que essa palavra possa invocar de grandeza e desprendimento. (Não era raro vê-lo distribuindo sorrisos a porteiros e bom-dia aos vizinhos, sendo amável à exaustão.) Absolutamente, ele não poderia ser um monstro; essa era uma opção absurda. Descartou-a. Mas então sobrou-lhe apenas a consideração, não menos assustadora, de que não há monstros. O que, em outras palavras, queria dizer era que havia uma desconcertante comunhão entre aquilo que se reprovava e o reprovador. Não quis (não podia) aceitá-la. Não ser diferente, fundamentalmente diferente da escória do mundo lhe causava calafrios. Desconfiar que ele mesmo era capaz de se tornar um monstro, já que estruturalmente nada lhe impediria a tanto (aquilo que o faz humano faz humano a todos) era algo intolerável. Tremia só de pensá-lo. E o que lhe fez tremer mais ainda, a ponto de desabar, foi dar-se conta de que não se tratava de transformar-se em um monstro, pois que, em nenhum momento, nem nos melhores nem nos piores, se deixa — não temos esse privilégio — de ser homem. Deu-se conta, finalmente, de que Caim era seu irmão de sangue, o caçula, e que por muito pouco não foi ele quem nasceu agarrado ao seu calcanhar. Esta descoberta o arrebentou todo, do início ao fim. Sem monstros para velar seu sono, suas noites se tornaram insuportáveis. Thiago Costa Faria

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PUZZLES

por aNNa LEE

ARTAUD, SILVIANO E AS ÂNCORAS Antonin Artaud está a bordo do S. S. Albertville Não vou seguir para a região dos taraumaras, no porto de Antuérpia. É dia 10 de janeiro de 1936. pelo menos não agora. Escolho estar, neste moEle deixara Paris de trem no dia anterior, numa mento, na Universidade do México na companhia manhã recoberta de nuvens cinzentas, baixas e de Artaud. Interessam-me as Mensagens revolupesadas. Caía uma garoa fina e incômoda que, cionárias. Numa de suas palestras, ele afirmou: de vez em quando, era chicoteada por rajadas de “Eu vim para o México fugido da civilização vento, e Artaud sentiu prazer ao olhar para a mala européia, produto de sete ou oito séculos de nova de papelão na cor marrom-escuro e pensar cultura burguesa, movido pelo ódio contra essa que estava partindo. Ele não suportava umidade. civilização e essa cultura. Esperava encontrar aqui uma forma vital de cultura e só encontrei o Agora, Artaud está deitado, sonolento, no beliche cadáver da cultura da Europa, do qual a própria da cabine de segunda classe, que divide com três Europa já começa a se desembaraçar”. companheiros no navio que o levará ao México. De repente, ele tem um sobressalto e pula da cama. Muito antes disso, em 1925, Artaud escrevera A trepidação causada pelo movimento das hélices a “Carta aos reitores das universidades euroindica que a viagem começava de fato naquele péias”: “(...) A Europa cristaliza-se, mumifica-se momento. O navio se afasta do cais. A trepidação lentamente sob as ataduras das suas fronteiras, aumenta. Artaud sente uma zonzeira que ainda das suas fábricas, dos seus tribunais, das suas não sabe se é boa ou ruim, mas tem certeza de universidades. (...) a culpa é vossa, reitores presos que não há mais terra firme sob seus pés. “Navio e no laço dos silogismos. Os senhores. fabricam passageiro perderam as âncoras”, afi rma Silviano engenheiros, magistrados, médicos, aos quais Santiago em Viagem ao México, no qual evoca a escapam os verdadeiros mistérios do corpo, as ida do dramaturgo francês à América, em 1936. leis cósmicas do ser, falsos sábios, cegos para o Foi neste ano que ele nasceu numa cidade do in- além-terra, filósofos com a pretensão de reconsterior de Minas Gerais, em fins de setembro — e tituir o espírito(...)”. isto é tratado no livro, não na perspectiva simplista de coincidência, mas como uma permissão que os É significativo que durante o Maio de 68 na astros deram para Silviano criar seu personagem França, este texto tenha servido como panfleto revolucionário e sido afi xado na Sorbonne. Falo e fabular um encontro com ele. disto aqui porque neste 2008 se comemoram Não sei se a viagem de Artaud se deu exatamente não só os quarenta anos do movimento francês, como está narrada em Viagem ao México. De mas das manifestações ocorridas em diversos qualquer forma, isso pouco importa, não vou países durante 1968 — um ano-constelação. me dar o trabalho de checar fatos nas biografias Se, por um lado, esses eventos não provocaram tradicionais do escritor francês. Os dados desse transformações radicais no cenário político livro, dos quais me apropriei à minha maneira, mundial, por outro marcaram profundamente o me servem. comportamento e os valores sociais e culturais. A partir de 1968, houve mudanças fundamentais Silviano Santiago enfatiza o sentido utópico da na maneira de enxergar e pensar o mundo. E não viagem de Artaud, que queria resgatar o passado há dúvida de que temas levantados há quarenta mítico da civilização asteca, mas se decepciona anos – aliás, mais que isso, em 1925 e 1936, por diante de uma intelectualidade que inveja o ra- Artaud — ainda colocam em xeque a sociedade cionalismo da cultura européia. Na verdade, o contemporânea. livro de Silviano é uma espécie de preâmbulo de Viagem ao país dos taraumaras, no qual Artaud Sim, isto é um convite (não uma carta). Um connarra sua viagem ao México, que começou efe- vite para uma viagem a bordo do S. S. Albertville, tivamente depois de ele deixar a capital e rumar na qual certamente navio e passageiros perderão para a região dos índios taraumaras, onde expe- suas âncoras. rimentou o peiote.

Leidriadne Como é forte essa lei Que me explica o que eu já sei E me unifica em não-sonhar Como é forte essa lei Que trasborda de mentira Faz do oposto a minha mira E me impede de prever Como é minha essa lei Que nasceu do meu mormaço E faz de mim meu próprio inverso Como é minha essa lei Que me obriga a ser dois Põe em mim o próprio ser Que eu matei quando nasci Péricles F. Drelos

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MULHERES-DAMAS por ISaBEL DIEGUES O bordado da espera Entre os dedos longos fios escorregam desfiando o tecido a ser traçado a espera retocando Desenhado à luz do dia o traçado a ser tecido as mãos ágeis decidindo desfazer o seu destino Costurando dia a dia à espera faz-se o manto tentando frear o tempo ao novelo aprisionando Quando a tarde traz a noite o sol carrega consigo a extrema ponta do fio e assim desfaz o tecido Sol-carretel anoitece enrola o fio ao novelo o tempo pára e concede espaço espera enlevo

(SOBRE)VIVêNCIAS por FELIPE CaRVaLHO DOS SaNTOS

E com a manhã seguinte desponta a ponta do fio sol traz de volta o caminho do bordado do tecido

000 Coração sem ar Preso no peito Dor Arranhado e amarrado Pulsa a força Dor

Ela ao tecer incansável isola o corpo no manto constrói um fosso um abismo pretendentes afastando E enquanto borda a memória na direção do marido ele recolhe as pegadas reconstruindo o caminho

Entre a perfeição e o erro. Entre a iluminação (nirvana) e o samsara junkie (nossas vidas do dia-a-dia). Entre o já sabe tudo e o não sabe nada. Entre a exata força e a exaustão da força. Impossível reconciliação. Caminhar descalço sobre as pedras?

E passam longos os dias trama traçado tecido à espera do encontro desaprisionar o tempo e tece o manto mais uma vez como se fora a primeira vez

Luiza Marcier

Entre o choro e o não se importar ou, simplesmente, limpar as lágrimas, lavar o rosto e olhar. Em meio à comunicação com os outros e não conseguir falar — palavra sufoca a garganta, engasga e abafa o coração. No choque da adaptação protocolar ao mundo com a ruptura completa de suas amarras. Este é o meu lugar (último que virou primeiro ou o primeiro que virou último). Entre a clareza e a obscuridade.

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BOLHAS GERAES

por BEaTRIZ PEDRaS

A bienal do Livro de BH pelo olhar de uma menininha de 3 anos e meio O que será uma buenu do livro que a vovó e a Tia Ana estão me convidando para ir visitar? O livro já conheço e é meu grande amigo desde que era pequenina, porque agora já sou glande. Me explicam que é um lugar cheio de livros e onde eu poderei pegar os que eu quiser para ler. Parecido com a biblioteca em que a vovó trabalha.

Damos meia volta e saímos em busca de mais novidades. Em cada loja encontro mesinhas com livros e cadeirinhas do meu tamanho, onde posso sentar e folhear os livros: do gatinho, do cachorrinho, da Arca de Noé, do Charlie e da Lola...

De repente vejo uns fantoches. Tem do Chapeuzinho Vermelho... Será que tem do Lobo Mau? No caminho, fico ansiosa: já chegamos? Mas está Achamos. Como adoro contar as historinhas que muito longe! Por que está demorando? Afinal o conheço, vovó me pergunta se quero um fantoche. carro parou. O lugar é muito grande e cheio de Prefi ro do Chapeuzinho porque na minha casa gente. Isso me deixa um pouco assustada, mas não tem floresta, então não posso levar o do Lonada que um colinho aconchegante não resolva. bo Mau. Junto com o fantoche, ganhei livrinhos E como tem criança! Estão todas alegres e ani- dos animais selvagens — do tucano, da cobra, do rinoceronte, do tubarão... Depois foram dez madas, e eu fico também. revistinhas para colorir. As novidades começam a chegar. Logo no começo encontro muitos livros novos. Algumas histórias Depois de um tempo, com algumas sacolas e o eu já conheço, mas a capa e os desenhos são di- cansaço chegando, pedi para voltar para casa. No ferentes. Conta para mim, Tia Ana, a historinha carro mesmo já começamos a ler uns livrinhos. da Cigarra e da Formiga. Mas tem a da Raposa e das Uvas; eu quero ouvir essa. Gosto muito de Segunda-feira, quando eu for para a escola, vou ouvir as fábulas, mas algumas palavras são meio contar, na rodinha, para todo mundo como foi difíceis e logo começo a me distrair. Que bom! boa a buenu do livro! Vovó achou o livrinho da família do Trully, meu cachorro. Ah! Esse está bem mais fácil e eu quero A 1ª Bienal do Livro de Belo Horizonte aconteceu esse. Você compra para mim, vovó?! de 15 a 25 de maio de 2008. Em onze dias, 225 Com a sacolinha no braço, vejo um pipoqueiro. mil pessoas passaram pelo local — das quais 28 Lá vem minha tia com um saco de pipocas, e eu mil, pela visitação escolar e 197 mil, público adoro pipoca. Pena que atrás dela estou vendo um em geral. Nesse pequeno conto, narro a bienal coelho gigante. Quero voltar. Vovó me explica pelos olhos de minha neta, porque o evento teve que é um moço fantasiado de coelho, mas eu não como principal participante o público infantil. gosto. Prefiro os coelhinhos pequenos, que posso Longe das pretensões literárias, espero que este segurar no colo. texto sirva como uma recordação para minha neta, recordação esta que compartilho com os leitores do jornal.

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Meu sentimento tem que caber numa caixa silábica e torto o ritmo é dividido em dois palavras e bordas todas tortas para descrever o que não posso. Alexandra Wiltshire

Drama Olhou a navalha com espanto fez que ia segurar o pranto mas num grito agudo caiu na calçada dura com o vestido sujo de lama e o rosto triste de choro cegando os olhos com as mãos trêmulas em lábios de súplicas erguendo a cabeça para ver o que era: apenas o amolador de facas. Catharina Wrede

CONTOS INSÓLITOS por GRECO BLUE 101 Eu, meu pai e o ator Jim Carrey viajávamos há horas em uma minivan. Jim Carrey dirigia a minivan. Ninguém pediu que ele dirigisse, nós até nos oferecemos para revezar, mas ele recusou e ficou de cara emburrada. O clima estava tenso, eu e meu pai estávamos constrangidos. Daí, o Jim Carrey perguntou se nós fumaríamos um baseado. É claro que nós fumaríamos, nós adoraríamos fumar, nós tínhamos o fumo. O problema é que nós pensamos que ele era um policial à paisana. Nós pensamos que ele fosse um policial, mas ele só estava com um figurino. Saber que aquele policial era o ator Jim Carrey nos deixou muito tranqüilos. Ele era uma pessoa muito agradável. Sabe todas aquelas caretas que ele faz em seus filmes? Ele realmente sabe fazêlas, não é nenhum dublê, como meu amigo Marcos sempre insistiu em dizer. Então nós chegamos na festa que Clint Eastwood nos havia convidado, mas quem tinha alugado o hotel àquela noite foi a Xuxa. Clint certamente escreveu errado no convite. Clint nunca daria uma mancada dessas comigo. Certamente não. Eu não me aborreci porque fiquei horas conversando com o empresário Edson Arantes do Nascimento, enquanto o jogador Pelé dava investidas contra a anfitriã. O empresário Edson Arantes


do Nascimento é realmente um cara muito legal, nheiro feminino e realizar minha cota de travessumas cheio de manias, entende? O legal foi saber do ra ali mesmo. Ninguém na festa se importava com seu ponto de vista muito peculiar sobre as questões nada, tinha cinco mil trezentos e cinqüenta e sete do Sudão nos dias de hoje. O empresário começou convidados, e mil e setecentos e vinte e nove penea me encher um pouco o saco, e eu resolvi me jun- tras, além, é claro, de quinhentos e quarenta e dois tar ao guitarrista Ronnie Wood e ao bailarino Jean serventes, e por volta de vinte e dois banheiros feClaude Van Dame, que estavam se embebedando mininos. Todos estavam muito entretidos assistindo e agarrando modelos em começo de carreira con- ao violonista e filho do cão Robert Johnson tocar tratadas para a figuração da festa. O bailarino nos suas composições inéditas ao piano. Eu disse para abandonou logo que foi convidado para um ména- minha garota que não tinha intenção de machucáge com a anfitriã e o maior jogador de futebol de la, eu só queria parar num tablóide fazendo traquitodos os tempos. Ronnie me convidou para dar um nagem ao lado de um Rolling Stone, prometi que teco, eu disse que estava bem assim, mas que o eu seria educado e a amaria pra sempre, do fundo acompanharia até o banheiro. Quando o guitarris- do meu coração. Naquele momento eu amava muita saiu de sua cabine, sugeriu que nós invadíssemos to aquela mulher e torcia pra que ela me amasse o banheiro feminino. Meu pai, que nessa hora também. Eu perguntei seu nome e ela respondeu usava o urinol coletivo, disse que aquilo era uma que era Rebeca. Rebeca tinha cabelos ruivos natuidéia terrível, mas Ronnie falou que ele estava com- rais, algo entre o fogo e a cenoura, pele branca pletamente ultrapassado e fora de moda. Eu disse como a neve, mas muito longe da palidez e falta de que talvez fosse uma boa idéia ouvir meu pai, mas saúde, e seu corpo era algo realmente muito especial Ron gemeu “Hmmm.... oooooh” e completou que para receber qualquer tipo de comentário. E eu eu poderia ouvir meu pai ou ir parar nos tablóides amava muito ela. Eu rasguei toda sua roupa, deicom um Rolling Stone, e aquilo foi o suficiente xando Rebeca totalmente nua, e amando muito ela. para me convencer. Nós pegamos a tubulação de Eu beijei seu corpo todo, e entrei em Rebeca. Horas gás, já que atravessar o corredor era óbvio demais. depois que suas lágrimas de humilhação já se haViramos à esquerda logo que passamos pela big viam transformado em lágrimas de prazer e que band de ratos cegos, e o guitarrista rolante falou todos os músculos de seu corpo já se haviam con“É aqui!”. Nós pedimos um delivery de armamentos torcido junto ao meu, ela disse que me amava tampesados — que chegava em 14 minutos ou seu pe- bém. Eu me ajoelhei, tirei o buquê e o anel da dido grátis! Eu comecei a jogar as bombinhas de cartola e pedi que Rebeca se casasse comigo. Ela fumaça, enquanto meu novo melhor amigo de todos, disse que também me amava, mas que estava noiva o guitarrista Ronnie Wood, soltava os morcegos de um mezzo-baiano que cantava na melhor banda programados para enroscar em cabelos femininos. do país, uma com um nome muito ruim, alguma Depois que todas estavam imobilizadas por nossas coisa sobre a cor azul. Eu perguntei se ele já a havia feras e em nossas miras a laser, nós as separamos feito sentir-se tão bem assim, e ela disse que isso em grupos: um com mulheres bonitas bem-arru- não estava em questão e que o ponto principal era madas, um com mulheres bonitas deselegantes e que ela deveria ser fiel a sua palavra. Eu fiquei posoutro com todos os tipos de mulheres feias que lá suído por ira, joguei Rebeca no vaso sanitário, se encontravam. As mulheres bonitas e deselegantes puxei a descarga e, enquanto ela descia rodopiando foram levadas ao paredão, onde seriam tortutadas rumo ao esgoto, eu gargalhava e urrava que ela não e executadas por Bill Wyman & John Entwistle. As era nada pra mim e que eu aceitaria a Madonna de mulheres feias em geral foram vendidas como es- volta! Eu saí do banheiro bufando, perguntando crava a Don Quixote, que havia sido contratado por Ronnie, exigindo que ele me encontrasse. Crupara fazer mágica para uma coleção de bebês de zei com meu pai, que agora bebia algum Johnnie proveta. Nessa hora, meu pai entrou no banheiro Walker, e ele me disse que tinha conhecido as mucom uma taça de champanhe para comentar que lheres de seus sonhos e que assinou um contrato de no grupo de mulheres feias, em geral, havia muitas casamento com as nove mulheres do grupo bonitas jeitosinhas que não mereciam ser dispensadas e que e arrumadas que nós lhe demos de presente. Ele havia um pastel de tofu delicioso que deveríamos disse também que tinha visto o guitarrista Ronnie experimentar. Nós demos algumas das bonitas e Wood fugindo num Jaguar que não lhe pertencia e arrumadas a ele de presente, a fi m de que ele as que arrancou da garagem, derrubando o portão e levasse para tomar champanhe, comer tofu e fazer seguindo pela rodovia a uns cento e vinte quilômeuma orgia. Das restantes, algumas foram entregues tros por hora. Eu xinguei Ron com as mãos para o ao Hulk para que ele desse uma morte rápida a elas, céu e disse que, como meu melhor amigo, ele não e as duas com ar mais esnobe e olhar mais arro- poderia ter feito uma coisa dessas! Nessa hora, gante ficaram para serem estupradas por mim e barulho de freadas de carro e rodopios de hélice de Ronnie. Ronnie levou sua nova acompanhante helicóptero invadiram a casa, misturados com forpara o bosque, pois lá ele se sentia mais à vontade tes luzes de canhões de busca. Foi aí que o Batalhão e dizia que seu sangue circulava melhor ao ar livre. de Operações Especiais da polícia adentrou a casa, Já eu resolvi simplesmente trancar a porta do ba- regido pelo ator Jim Carrey, que era seguido pela

banda do colégio militar. Jim Carrey empunhou o megafone e declarou ordem de prisão a todos naquela festa. Eu perguntei do que aquilo se tratava, se era uma pegadinha ou se o filme estava sendo rodado lá e eu não tinha sido informado. Ele me disse que, na verdade, ele sempre foi um militar interpretando um ator civil e que eu não poderia mais chamá-lo de Jim, e sim de gal. James Eugene Carrey e que eu seria preso por formação de quadrilha, aliciação de menores e por muitos outros motivos que ele preferia não citar para não agredir os ouvidos dos muito inocentes ali presentes. Gal. James Eugene Carrey ainda sussurrou ao meu ouvido que tinha pego Ronnie numa blitz, mas que, para sair limpo, disse tudo sobre mim. Maldito Ronnie! Ele me disse, ainda, que sabia tudo sobre Rebeca e que eu ia fritar na cadeira elétrica. Eu berrei que ele não sabia nada sobre Rebeca e que se soubesse estava errado, pois nós nos amávamos e nós iríamos nos casar. Ele riu de mim, me chamou de lunático e disse que iria gozar nas calças quando me visse queimando na cadeira elétrica. Eu precisava de Rebeca do meu lado. Só ela realmente me conheceu e me entendeu bem o suficiente para me apoiar nesse momento de tensão e desespero e, oh, como eu amo essa mulher! Com um tapa atrás da orelha, eu parei de pensar em minha amada e voltei para a realidade. Olhei em minha volta, tentando solucionar o problema, e vi que aquele cão amigável que ajudava o Sebastião a solucionar a história sem fi m, bebia um martíni e conversava com algumas modelos. Eu berrei pra ele que dava cem pratas pra ele me tirar dali bem depressa. Ele respondeu “Fechado!”. Eu pulei na garupa dele, joguei uns canapés em sua boca, fi z um carinho atrás da orelha e disse que não lembrava seu nome, se ele não se importava de chamá-lo de Totó, que era o nome mais comum dado aos cães na minha terra natal. Ele disse que era uma honra trabalhar comigo e que, por mais cem pratas, eu rodava com ele à vontade, por tempo indeterminado. Então nós fomos até a estação de esgoto mais próxima, buscamos Rebeca, e eu disse a ela como eu estava arrependido e que ela era mulher da minha vida. Rebeca disse que me perdoava e que nunca havia deixado de me amar. Nós nos beijamos. Um beijo demorado e molhado, com um abraço apertado e muito amor. Rebeca subiu na garupa do nosso amigo Totó, me agarrou pela cintura e nós partimos para Las Vegas, onde eu comecei minha grande carreira como cover de Elvis Presley gordo e fui feliz para sempre — com Totó, como meu empresário e Rebeca, preparando pratos fantásticos e deixando tudo arrumado para quando eu chegar em casa exausto banquetear, satisfazê-la e ter boas noites de sono e nunca me lembrar que um dia eu não tive essa mulher ou que eu já fui traído pelo novo guitarrista dos Rolling Stones.

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POR DENTRO DO TOM

por SaNTUZa CaMBRaIa NaVES

Entrando na conversa sobre o fim da canção (2) No artigo anterior, eu havia argumentado que a canção tropicalista não é mais o artefato completo, totalmente contido na unidade música-letra, que fora a canção bossa-nova, pois ela só se completa com elementos externos — arranjo, interpretação, até mesmo capa de disco. Retomo, neste número, o tema da desconstrução da canção pelos músicos tropicalistas a partir de um outro viés, referente ao uso de procedimentos intertextuais. Citam-se, além de composições que fazem parte do cancioneiro nacional e estrangeiro, os mais diferentes elementos de tradições culturais também distintas, provenientes tanto do universo pop, como também da “alta cultura”. As citações aparecem na própria forma de estruturar a canção, nos arranjos inusitados de Rogério Duprat para o LP Tropicália (1968) e até mesmo nas performances do grupo. As canções-citações se criam a partir de músicas já consagradas pela tradição do nosso cancioneiro. Tomo como paradigmática do gênero “Paisagem útil”, de Caetano Veloso (LP Caetano Veloso, 1968), que me dedico a analisar nesta coluna. O título inverte o sentido de “Inútil paisagem”, composição de Tom Jobim e Aloísio de Oliveira, de 1964. “Inútil paisagem” é prenhe de subjetividade, dando voz a um sujeito lírico que se sente só. Vejamos a letra:

Mas pra quê Pra que tanto céu Pra que tanto mar, Pra quê? De que serve esta onda que quebra E o vento da tarde De que serve a tarde Inútil paisagem? Pode ser Que não venhas mais Que não voltes nunca mais De que servem as flores que nascem Pelo caminho Se o meu caminho Sozinho é nada É nada É nada

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A inversão completa, entretanto, dá-se apenas no Chico Buarque, não apenas por lhe imitar o modo título, pois “Paisagem útil”, de maneira inusitada, de cantar, mas também pela sucessão de versos reúne os espíritos solar e noir, alternando poética iniciados por “quem”, os quais trazem à lembrane musicalmente a melancolia presente em “Inútil ça várias passagens de canções de Chico: “Quem paisagem” com a celebração do cotidiano. A canção canta comigo/ canta o meu refrão” (“Meu refrão”), “Estou vendendo um realejo/ Quem vai levar? / se inicia com a plena positividade da estrofe Quem vai levar?” (“Realejo”) e, é claro, “Quem te Olhos abertos em vento viu, quem te vê”. Sobre o espaço do aterro Logo depois, também de maneira inesperada, no Sobre o espaço sobre o mar intervalo que prepara o próximo tema, ouvem-se “Paisagem útil” surpreende o ouvinte habituado com acordes de bossa-nova que introduzem a passagem a tradição poética construtivista ao lidar com temas poética “Os automóveis parecem voar”. A marchaconcretos — objetos e informações que povoam o rancho é retomada em seqüência e, como que prepaespaço modernizado do Aterro do Flamengo, como rando a introdução do tema lunar, Caetano começa os automóveis “que parecem voar” e a “lua oval a cantar como um intérprete de boleros, soltando a da Esso” — de maneira introspectiva, fazendo jus, voz e pronunciando os erres à maneira de Nelson dessa maneira, à concepção de “Inútil paisagem”. Gonçalves, na seguinte passagem: Mas, se a interioridade de “Inútil paisagem” é cantada a partir do estilo musical da bossa nova, Mas já se acende e flutua com instrumentação e interpretação pequena, “Pai- No alto do céu uma lua sagem útil” é uma marcha-rancho que recorre a um Oval, vermelha e azul arranjo exuberante com cordas e metais. No alto do céu do Rio Num certo ponto do desenvolvimento da música, O tom intimista retorna com a estrofe fi nal, que natureza e cultura do Aterro são contempladas — substitui, entretanto, o espírito cool e sofisticado de “Inútil paisagem” por um registro kitsch, porém O céu vai longe do Outeiro triste, lembrando um circo retratado por Fellini: O céu vai longe da Glória Uma lua oval da Esso O céu vai longe suspenso Comove e ilumina o beijo Em luzes de luas mortas Dos pobres tristes felizes Luzes de uma nova aurora Corações amantes do nosso Brasil Que mantém a grama nova E o dia sempre nascendo — para em seguida comentar o cenário urbano povoado de transeuntes com um destino certo — “Quem vai ao cinema/ quem vai ao teatro/ Quem vai ao trabalho/ quem vai descansar” —, de artistas — “Quem canta/ quem canta/ Quem pensa na vida” — e fl anêurs — “Quem olha a avenida/ quem espera voltar”. Neste trecho, Caetano alude a


NOTAS NO PLÁSTICO por MaURO FERREIRa Baleiro desmembra ‘Coração’ em dois volumes O próximo CD de inéditas de Zeca Baleiro, O Coração do Homem-Bomba, vai ser duplo, mas ficará desmembrado em dois volumes que serão vendidos em edições avulsas. Já em fase final de mixagem, o primeiro volume tem seu lançamento agendado para 25 de julho. O segundo deverá chegar às lojas somente em novembro, mas a gravadora MZA Music autorizou o artista a disponibilizar algumas faixas já em setembro.

Dominguinhos e Domenico no álbum de Camelo Dominguinhos, Clara Sverner e o grupo paulista Hurtmold — além de Domenico Lancellotti — estão entre os convidados do primeiro disco-solo de Marcelo Camelo. Programado para o segundo semestre de 2008, o lançamento do álbum vai ser acompanhado por uma turnê nacional, que começa no fi m do ano. Camelo vem formatando, desde dezembro de 2007, seu primeiro trabalho após o recesso por tempo indeterminado do quarteto Los Hermanos. A conferir.

Tributo a Noel sai em CD e DVD pelo selo MP,B Na noite de 5 de dezembro de 2007, um elenco de cantores — integrado por Diogo Nogueira, João Bosco, Maurício Pessoa, Moska, Ney Matogrosso, Roberta Sá, Rodrigo Maranhão e Zé Renato, entre outros — subiu ao palco da casa Vivo Rio, no Rio de Janeiro, para festejar Noel Rosa (1910 - 1937). Intitulado Acervo Noel Rosa, o show foi gravado ao vivo para gerar CD e DVD que chegam às lojas no fi m de julho de 2008 pelo selo MP,B (Maior Prazer, Brasil), com distribuição da major Universal Music. Os intérpretes revivem clássicos do cancioneiro do Poeta da Vila. Roberta Sá, por exemplo, canta O X do Problema, samba lançado por Noel em 1936. Ney Matogrosso interpreta duas músicas. Entre elas, Último Desejo. Já Diogo Nogueira recorda Conversa de Botequim. Todos os astros foram acompanhados pelo grupo de samba Anjos da Lua.

Para ler mais notas musicais acesse http://blogdomauroferreira.blogspot.com

fUTUROS ESTOUROS

por MaURO REBELLO

ALEXIA BOMTEMPO Trinta minutos nos pilotis da PUC com a simpática permitem o acesso online ao álbum ou música Alexia Bomtempo, que lança seu primeiro disco, de uma banda, Alexia revela com humor: “Achei Astrolábio, pela gravadora EMI, foram suficientes que o CD fosse virar o pen drive; o pen drive para conhecer um pouco melhor essa simpática numa caixinha bonitinha”. cantora, apontada por muitos como um dos novos Alexia foi uma das convidadas brasileiras do talentos da MPB. festival South by southwest (Texas, 2008), onde Filha de pai brasileiro e mãe americana, Alexia também cantaram Marcelo D2 e Pierre Aderne. nasceu nos EUA e veio para o Brasil aos 7 anos Em agosto, ela estará no Festival Sudoeste, em de idade. Entre idas e vindas, Alexia que estudava Portugal, ao lado de destaques da música intercanto lírico na Plymouth State University, em New nacional. Hampshire, conheceu em 2005 no Rio de Janeiro o produtor Dadi Carvalho — ex-novos baianos, com Encantado, despedi-me de Alexia com a certeza quem passou a compor e a gravar algumas canções. de ter conhecido uma grande artista. Além de ser Em poucos meses de parceria, se deram conta de dona de uma técnica vocal impecável, a moça é que tinham um disco praticamente pronto em mãos. linda e muito simpática. Em casa, escutei todo O contato com a gravadora EMI surgiu no final das o álbum e vi que não tinha perguntado sobre o título do disco, Astrolábio. Àquela altura, já não gravações, em 2006. importava mais. Astrolábio “é um disco de encontros, encontros felizes, a começar pelo produtor Dadi”, declara o músico Domenico Lancellotti no release da cantora. O álbum contém — além das ótimas parcerias de Dadi e Alexia, como “Para dormir mais tarde”, “Nuvem d´água” e “Cromologia”, co-assinadas também por Pierre Aderne, belíssimas releituras Para saber mais sobre a cantora, acesse www.myspace.com/alexiabomtempo das músicas “Leãozinho”, de Caetano Veloso, e “Roxanne”, de Sting. No papo, Alexia chamou atenção para a revitalização do samba e para a importância da Lapa, o bairro com maior abertura para o gênero. Sobre o mercado fonográfico, internet, e mídias alternativas, Alexia, que diz nunca ter baixado uma música, assume que fazer parte do casting de uma grande gravadora tem lá suas vantagens, mas diz que qualquer artista pode divulgar seu trabalho pela internet, apoiado ou não por um selo ou gravadora. Ela destaca a ferramenta myspace como um ótimo espaço para a difusão de músicas e para o trabalho de marketing de bandas independentes. Sobre a crescente utilização das novas mídias digitais, como o brasileiro SMD — semi metalic disc, e os cards coolnex — pequenos cartões personalizados que

Divulgação

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QUARTO DE DESPEJO

por CaROLINa MaRIa DE JESUS

Eu nada tenho que dizer da minha saudosa mãe. Ela era muito boa. Queria que eu estudasse para professora. Foi as contingências da vida que lhe impossibilitou de concretizar o seu sonho. Mas ela formou o meu caráter, ensinando-me a gostar dos humildes e fracos. É porisso que eu tenho dó dos favelados. Se bem que aqui tem pessoas dignas de desprêso, pessoas de espírito perverso. Esta noite a Dona Amélia e o seu companheiro brigaram. Ela — Eu fui vacinado com o sangue do Lampeão! disse-lhe que êle está com ela por causa do dinheiro que ela lhe dá. Só se ouvia a voz de Dona Amélia Dia 1 de janeiro de 1958 êle disse-me que ia quebrarque demonstrava prazer na polemica. Ela teve vários me a cara. Mas eu lhe ensinei que a é a e b é b. Êle é filhos. Distribuio todos. Tem dois filhos moços que de ferro e eu sou de aço. Não tenho força física, mas ela não os quer em casa. Pretere os filhos e prefere as minhas palavras ferem mais do que espada. E as os homens. feridas são incicatrisaveis. Êle deixou de aborrecerme porque eu chamei a radio patrulha para êle, e êle O homem entra pela porta. O filho é raiz do coficou 4 horas detido. Quando êle saiu andou dizendo ração. que ia matar-me. Então o Adalberto disse-lhe: É quatro horas. Eu já fiz o almôço — hoje foi almôço. — É o pior negocio que você vai fazer. Porque se Tinha arroz, feijão e repolho e lingüiça. Quando eu você não matá-la ela é quem te mata. Eu tenho uma faço quatro pratos penso que sou alguem. Quando habilidade que não vou relatar aqui, porque isto há vejo meus filhos comendo arroz e feijão, o alimento de defender-me. Quem vive na favela deve procurar que não está ao alcance do favelado, fico sorrindo isolar-se, viver só. O Vitor está tocando radio. Pen- atôa. Como se eu estivesse assistindo um espetaculo so: hoje é domingo e nós podíamos dormir até as 8. deslumbrante. Lavei as roupas e o barracão. Agora Mas aqui não há consideração mutua. vou ler e escrever. Vejo os jovens jogando bola. E êles correm pelo campo demonstrando energia. Penso: se êles tomassem leite puro e comessem carne...

1 de junho é o início do mês. É o ano que deslisa. E a gente vendo os amigos morrer e outros nascer. (...) É treis e meia da manhã. Não posso durmir. Chegou o tal Vitor, o homem mais feio da favela. O representante do bicho papão. Tão feio, e tem duas mulheres. Ambas vivem juntas no mesmo barraco. Quando êle veio residir na favela veio demonstrando valentia. Dizia:

2 de junho Amanheceu fazendo frio. Acendi o fogo e mandei o João ir comprar pão e café. O pão, o Chico do Mercadinho cortou um pedaço. Eu chinguei o Chico de ordinário, cachorro, eu queria ser um raio para cortar-lhe em mil pedaços. O pão não deu e os meninos não levaram lanche. ...De manhã eu estou sempre nervosa. Com medo de não arranjar dinheiro para comprar o que comer. Mas hoje é segunda-feira e tem muito papel na rua. (...) O senhor Manuel apareceu dizendo que quer casar-se comigo. Mas eu não quero porque já estou na maturidade. E depois, um homem não há de gostar de uma mulher que não pode passar sem ler. E que levanta para escrever. E que deita com lápis e papel debaixo do travesseiro. Por isso é que eu prefi ro viver só para o meu ideal. Êle deu-me 50 cruzeiros e eu paguei a costureira. Um vestido que fez para a Vera. A Dona Alice veiu queixar-se que o senhor Alexandre estava lhe insultando por causa de 65 cruzeiros. Pensei: ah! O dinheiro! Que faz morte, que faz odio criar raiz.

Trechos do diário da moradora da favela do Canindé, São Paulo, catadora de lixo e mãe de três filhos.

Olhos Meus Para a adorável Ângela Perriconi, mulher generosa, sábia e sensível, referência de ser humano e de profi ssional. O sol que brilhava lá fora? Quantas saudades sinto. As crianças já não brincam como antes; agora elas trocam fraldas. A respiração é lenta para uma mulher que desaprendeu a viver. Lembranças breves e eternas me fazem companhia. Não, não me equivoquei: tudo é breve e eterno aos olhos em suas primeiras descobertas. Na moldura o traje permanece alinhado. Retrato da época em que eu me vestia. Havia bolas coloridas no salão, excitação dentro do vestido, beleza e música.Eu brilhava em olhos alheios. Todas tínhamos o mesmo penteado, penteado de mulher. Imitar os homens, só mesmo em segredo.

Saudades? Quantas sinto de ficar observando minha mãe conversar. Ela parecia saborear as palavras. Eu queria saber falar como ela e ser um ponto de partida na vida de alguém. Quantas saudades sinto das meias compridas, das fitas nos cabelos e do abraço do vento. Hoje, o vento apenas me cumprimenta. Saudades sinto do tempo amigo, das risadas compartilhadas, da alegria inocente e da alma intocável. A inocência e a alegria são o que há de mais preciosos em um Ser. Quando profanados perde-se a poesia cabível a eles. O tempo ora amigo — ora o pior dos inimigos — me faz crer: Não somos o que desejamos, mas o que a vida nos permite ser. É, o tempo passa com a mesma velocidade que o vento. Quantas saudades sinto do sol que brilhava lá fora. Selma Fontes

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DESAfIO POÉTICO Nesta edição, nossos queridos

Cosme Velho

Copacabana

poetas foram desafiados a escrever

uma mulher carrega sua televisão no colo como se fosse um bebê um homem desce de muletas pela porta da frente, um jovem anota exclamações para si mesmo em um caderno (terminar o trabalho hoje sem falta!!!!!!) uma turista enrolada em uma canga azul não passou protetor solar, a cobradora altiva conversa com dois homens que esticam pescoço de ganso para assistir ao balanço de seus brincos, o ônibus atravessa desembestado o rebouças no fim de tarde, alguns escutam música poucos lêem, uma menina brinca com os cabelos, saímos do túnel e flutuamos numa lagoa de céu rosa rabiscado com duas ou três nuvens

Segunda quase terça fito meus pés de calçadas inóspitas: latejam buzinas ponteiros, entranhas que choram pois trocam verões por noites céus encobertos de cinzas - etérea eterna angústia, palidez dos vazios olhares, olheiras de medo aziadas retinas me encaram: as minhas doentes insones febris, refletidas nas tuas -- doentes, insones febris. Constanza de Córdova

sobre localidades, colocando em versos seus bairros, suas cidades. Chegaram poemas de todos os lugares: do Rio de Janeiro, de Belo Horizonte e até mesmo de Paquetá. Para o próximo número, convidamos os leitores para escreverem um poema sobre o mais batido de todos os temas: o amor. Aproveitem o dia

Alice Sant’anna

dos namorados para dar inspiração e mãos à obra! Basta enviar seu poema

Laranjeiras

para jornalplasticobolha@gmail.com,

às vezes, muitas vezes, temo a loucura que aparece em noites de domingo dentro deste apartamento fracamente iluminado.

estamos aguardando.

o calor é meu mais fiel amante e divido com ele um cigarro, o último da noite, que acabou o dinheiro e a esperança. Letícia Simões

Paquetá Paquetá é um paraíso E o paraíso é meu lugar Paquetá é um sorriso que a ilha oferece ao mar Paquetá é Moreninha bicicleta é amar Mas o que fascina mesmo essa ilha é o luar de Paquetá Mara Libber

Minas Cidades de Minas Cidades de Belos Horizontes Sabará, cidade dos contos Sete Lagoas, cidade dos encantos Ouro Preto, cidade da nobreza Diamantina, cidade de extrema beleza. Cidades de Minas Cidades de respectividades Belo Horizonte, cidade do mineiro do pão de queijo, do movimento, da multidão e da simplicidade. Priscila Mendes

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ORÁCULO

por MIRIaM SUTTER

O MÊS DE JUNHO JUNHO, etimologicamente, provém do latim Iunius mensis, o mês de Juno. Luno, -onis — em português, Juno — era a deusa itálica, cujas características originais se perderam nos tempos devido ao sincretismo Juno-Hera. Segundo Ovídio (Fastos, VI, 1-100), a origem do nome Iuno pode estar relacionado com iuuenis, “jovem”, cujo sentido na língua latina é “o que está entre o adulescens e o senex, logo “aquele que está na força da idade” — o que significa, outrossim, “na idade própria para o casamento e a procriação”. Sem dúvida, este valor semântico confirma-se na principal interferência da deusa latina na vida dos mortais e, sobretudo, na das mulheres: presidir aos matrimônios e aos partos. Sob estas faces, recebia, respectivamente, os epítetos de Juno Pronuba e Juno Lucina (< lux, lucis, “luz”, e daí, “dar à luz”). Esses epítetos caracterizam Juno como uma deusa essencialmente feminil, pois o verbo nubere, “casar”, presente em Pronuba, só era usado para designar o casamento da mulher. Vale lembrar que, sob o epíteto de Moneta (< do verbo moneo, monere, “advertir”, “fazer lembrar”), Juno, “aquela que adverte”, velava pelo tesouro do Estado, que era guardado em seu templo. Mas a associação com a atividade monetária deve-se à lenda histórica de que os gansos do santuário de Juno teriam dado o sinal da invasão gaulesa de 390 a.C., o que permitiu aos romanos defender a Arx, a Cidadela do Capitolino, dos inimigos. Mais tarde, com a cunhagem de moedas (< moneta < Moneta), esse templo de Juno passou a ser chamado de Casa da Moeda. De moneta advém nosso vocábulo “moeda”, por sonorização da consoante surda –t- em posição intervocálica na sonora –d- e pela síncope da nasal –n- em posição intervocálica. Como o humor é fundamental, se Juno era a deusa das mulheres, e sob o aspecto Moneta é aquela que, primordialmente, faz lembrar, mas também aquela que vela sobre as moedas, não é de estranhar que, na economia doméstica, as mulheres sejam, na maioria das vezes, aquelas

a “contar as moedas”. Mas, como se diz, esse costume também “faz parte” da lei (nómos) da casa (oíkos), cujas origens também se perderam nos meandros do tempo. Voltando ao mês, na Europa, é em junho que acontece o solstício de verão, quando, no dia 22, o hesmisfério norte está mais voltado para o Sol, de maneira que recebe mais luz, marcando, assim, o início do verão nesse hemisfério. Mesmo por isso, o mês de junho era a época do ano em que diferentes povos antigos (celtas, bascos, egípcios, persas, sumérios, etc.) promoviam rituais propiciatórios de fertilidade para estimular o crescimento da vegetação, a fartura das colheitas e a benção das chuvas. Sob a perspectiva de uma cultura ainda essencialmente agrária, pode-se dizer, pois, que junho é o mês a assinalar simbolicamente a potencialidade plena da vida, assim como o binômio Iuno-iuuenis assinala “aquilo ou aquele que está na força da vida” e — assim, talvez — resgatar a significação itálica original da deusa romana, e desvestí-la do seu quase exclusivo e ridículo atributo de “esposa ciumenta de Júpiter”, advindo do sincretismo cultural entre as divindades latinas e as helênicas (Zeus-Hera).

Encontrei o belo, Iluminado num corpo de mulher Vinha ele, Com palavras que eram calmantes, E o corpo luz profana, Exalando idéias, Almejando ser o que não era. Edson Santana

Um pedaço de corpo estendido cercado de medo por todos os lados. As águas dos meus sonhos são profundas, já não tenho pernas, e o fôlego me foi tomado. Olho pro céu sorrindo e peço asas que substituam meus braços partidos. Diana Sandes

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Hoje em dia, junho é marcado principalmente pelas festas juninas, em homenagem a São João Batista (dia 24), mas também a Santo Antônio (dia 13), a São Pedro (29) e a São Marçal (30). E ainda, mais em função de um fator monetário e comercial e absolutamente não religioso, comemora-se, coladinho ao dia de Santo Antônio, folcloricamente conhecido como o “Santo Casamenteiro”, o dia dos namorados (12). Capelinha de melão É de São João É de cravo, é de rosa É de manjericão … Feliz junho a todos!

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A VELA PERFUMADA Olhava para mim. Parecia entender o que se passava comigo e pedia-me para que a tirasse do lugar e a transportasse para qualquer outro, com cara de desespero, amarela, porque há muito tempo já sentira a indiferença, o descaso da vida e que sozinha não sobreviveria. Queria morrer! Era o início do desfecho de uma vida. Em poucas horas, em que o mundo nada sabia de sua existência e em que apenas o perfume alastrava-se nele como uma dissipação de algo profundo, se dava o fim. Deveria flamejar, então, a pequenina chama e que, esvaindo, cresceria e choraria lágrimas densas e porosas, chegaria à sua finitude; um destino antevisto e incontrolável. Queria mesmo era morrer! Sentia-se útil ao morrer sobre um belo tapete vermelho bordado, com flores vermelhas e laços ainda mais vermelhos e folhas verdes, com um fino fio dourado ao lado do rústico ainda verde vaso árabe, que a assistia, envolvendo um majestoso antúrio branco onde as cores dissimulavam um belo quadro, sem nada entender. Lágrimas pesadas espessas e esbranquiçadas grudam no tapete, deixando a marca última e definitiva de sua existência flébil. Frágil, com a potente chama incandescente e forte, impregna nas paredes do castelo o seu calor final e finito; atribui à sua fantasia de brilho e de luz, espetáculo de um pôr do sol, através das portas e janelas do pequeno palácio, claustrofóbica, em metros quadrados e, entre cultura e sabedoria, apinhadas em, ainda, centímetros milimétricos quadrados junto aos guardas, Quixote, cavalheiros, trabalhadores, mendigos e pajés que a admiram e prostram-se, certamente ofuscados, diante de tanta beleza instantânea da luz, aos girassóis da Rússia. Duas horas se passaram. O processo da agonia é antiantagônico. Três centímetros e meio de matéria e cento e vinte minutos de pura incandescência iniciam o processo de morte; e o príncipe, cego, insiste em viver na escuridão duplamente. Sente, por segundos, um diferente e delicioso aroma no ar, sem se dar conta de que a chama definha e agoniza a vela, num processo lento da perda do brilho da sua luz que, lentamente, o seu último pôr do sol ainda mais vermelho, esbranquiçadas e frias e sem perfume jaz no rez-de-chaussée, como nuvens, pairando, sobre o oceano num fim de dia.

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www.instituto-camoes.pt O site do Instituto Camões traz o que há de mais novo e mais antigo no mundo dos falantes da língua portuguesa. Ali se encontram notícias, datas de exposições e atividades culturais, além de concursos, bolsas e cursos que o Instituto oferece.

www.ossetenovos.org No site dos poetas “Os Sete Novos”, o leitor pode conhecer um pouco melhor esse curioso grupo de poetas e artistas. Augusto de Guimaraens, Domingos Guimaraens e Mariano Marovatto mostram um pouco de sua poesia, seus clipes e fotos, além de um link para o blog dos Sete Novos com os textos mais recentes do trio.

Vale o clique!

O castelo está às escuras. O príncipe tateia emaranhado pela vida e o momento se fez imperceptível! A ruptura da inércia fez-se obediência, testemunho e introspecção. Edite Dias dos Santos

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DEITAR COM LUIZA NETO JORGE

por ANA CHIARA

(a lei da gravidade da palavra: o coágulo; a tresleitura histórica; difícil poema de amor/ amor difícil; a transubstancialização do verbo em corpo: encarnação)

Deitar com Luiza Neto Jorge, como seria? Seria gasto? Dispêndio? Frio na espinha? Seria vertigem de cair? Como seria cair na cama com Luiza Neto Jorge? Cair de boca na poesia? Deitar com Luiza numa caminha, leitura pânica, pouca farinha? Aprenderia a vertigem de cair? O poema me ensinaria? Como seria deitar e dormir com Luiza Neto Jorge? Seria provar nosso eco, nós duas, águas impuras irrompendo noutra língua? Ato de cair como nos poemas de Luiza tudo descamba, descai, desmorona? Verbo, língua, em que impera o declive... Deitar com Luiza como cai o som, como o pingo cai, como da sombra cai a sombra, o assombro? Seria provar da palavra o peso, a textura, a densidade? Deixar o vocábulo solto na força de sua própria gravidade e daí como seria? Deitar e dormir com Luiza, provar desta arma antiaérea artesanal, a palavra estranha, familiar, rodopio sobre si mesma, giro próprio, espetacular? Seria deitar minha pouca boca nesta língua outra, língua rolada, legendada, seixos estrangeiros, rolling stones? Como seria deitar com Luiza, essa prima, essa portuguesinha? Atravessar um oceano lingüístico, atravessar a língua da mãe, a deslíngua do português, minha língua na língua de Luiza, como seria? Qual sotaque? Qual arritmia? Deitar com Luiza como subir pelas paredes, osga invertebrada, cauda de serpente, língua que toca o palato, aversão, nojo, bicho repelente, poema que se contorce sobre a areia quente? Como seria provar destes nomes, destes verbos, desta contracorrente? Deitar com Luiza Neto Jorge, cosida à garganta dela, pronunciar, coagular a palavra, palavra intensa, em suspensão, arco histérico, descolada da página, profanação: coágulo de pássaros, coágulo de luz, coágulo de leite, coágulo de sangue, coágulos nos dedos, coágulo nos ossos, coágulo dos sentidos, coágulo da dor, baba quente, substância viva, matéria encarnada, cicatriz aguda, página que agora re-escrevo, página inscrita no meu próprio corpo, garfo niquelado, tridente? Como seria desafiar meu sotaque, meu jeito? Provar da minha parente? Deitar com Luiza, passar uma Noite Invertebrada, descobrir os Dezanove Recantos. Poderia? E depois? A Terra (ficaria pra sempre) Imóvel, pasma, assustada, com nossos corpos embolados na Quarta Dimensão...? Como haveria de ser, como seria? Nós duas, nós desatados, “eros frenético” como de

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Luiza, o Jorge , outro poeta, diria? Um corpo [...] assim movido e assinalado às avessas, é um corpo em estado de alarme... Deitar com Luiza que ritmo teria? A música brava dos dela poemas, imagens surrealistas, o verbo desengatado, casas, casas, casas, asas, asas, fumaça? Como seria? Um duelo agudíssimo entre duas fêmeas? Como seria? Feminino que inscreve, escreve, Jesus me carregue e o diabo releve, em bolhas de ar, respiração difícil, verso que pende, imprensa, subleva? Deitar com Luiza e sentir, a cabeça muito pesada e o pescoço finíssimo, flor da metáfora sobre haste delicada... ? Reescrever no corpo dela a mini-biografia, revisitála em filmes, traduções, como seria? Seria o respirar difícil da sua asma, sua alma, sua pouca saúde? Deitar com ela numa tenda de oxigênio, irrespirável moradia? Deitar com Luiza e ter um filho com ela? Teria nome de rei, dinastia dos Dinis, seria príncipe, navegador, bicha, poeta, bailarino? E depois, como seria? Com Luiza Neto Jorge aprenderia o amor a qualquer preço? Repetiria tudo? The same old shit’, discurso abismado do suicida no lago? Toda tralha acumulada no rio caudaloso da poesia? Ferida narcísica doendo, remoendo: eu e ela, cara dupla no espelho? Pagaria o alto custo do amor desonesto (feito) de marés ambulantes, amor barato, baratinho fumado, amor fraco, fósforo riscado, fútil, frívolo, descartável, amor teatro, delivery, usou, jogou fora, bruma lírica, gloss, gel, glitter, adereço, brinco na orelha, pingente... ? (Não esqueço)... Deitaria, com Luiza? Repetiria a ralação amorosa, abandono, asfixia, sofrimento, luto e melancolia; trabalho analítico, overdose de porcaria? Com Luiza iria até o fim deste endereço: caixa postal violada, dor de corno, ameaças, chantagem histérica? (Estremeço...) Ou seria com Luiza difícil poema de amor? Fendas no ar que respiro, magma, pó entornado, odor de pedra, maresia, ventos e pânico na baía? De que jeito deitaria com Luiza? Faria do amor punhal entre os olhos? Quem de nós gritaria primeiro: “Eu te amo... Não, não te amo mais... Desejo-te...Não te desejo mais”? Deitaria com Luiza na cama exígua do amor difícil, do difícil do amor, celebraríamos um secreto pacto, um pacto do amor eterno, pacto de vida e morte, pacto sagrado, luz cega, favo intumescido, tenebrosa fruta? Suicídio?

Ou deitar com Luiza, motor íntimo, seria aprender o ódio? Desejo febril de acabar logo com a coisa, diálogo tenso? Com ela experimentaria ser assassinada em pleno verão? Numa tarde fria? Assassinaria o amor? E depois como seria? Sairia tonta e cega, deceparia cabeças, cometeria carnificina? Deitar com um So-Neto Jorge, em sítios perdidos no tempo, em tresleituras históricas, sem desculpas, nem culpa, sem pretender dizer o “que quer que fosse”, deitaria, à noite, na noite das palavras, no escuro poema apontado contra o peito, e todo o sentido comum se esvairia? Seria deitar e escorrer na língua em cal viva de Luiza? Deitaria com Luiza para perder o chão político, perder o solo da história, noutra história redivivo? Como seria isso? Com Luiza escorregar pelo monumento Camões, línguas bífidas, nós duas, lambendo-lhe o corpo em ciclópico acto, tempos superpostos, tempos feitos de qual tempo? Eu e Luiza a deitar no verso atemporal? Nós duas, além de nós duas, a pique, à toda, eu-toda, ela-toda, nosso dente enfiado na língua do rei dos poetas? Como seria revisitar trepidantes, trêmulas as ruínas, os restos, a erosão dos espaços conquistados, do império assombroso, do rosto de quem se encobre, do sonho para sempre adiado? Visitaríamos o canto nove, ou nos proibiriam? Sopro de búzio, areia fina, falharíamos, sem saber nos perdoar? Perderíamos as guerras na África, granadas, minas, pernas arrancadas? Eu seria sua menina? Arrebentaria em feias feridas minha boca, meu sexo, meu reto? Chegaríamos ao fadado fim? Instrumentos desses danos? Provaria dela a pimenta ardente, a seca flor, a noz, o negro cravo, a rica canela? Trocaríamos com outras aquáticas donzelas, beijos lascivos em brando movimento? Subiríamos aos montes Idálios, usando nossas coisas para sermos somente amadas, desconcerto do mundo, desejo que queima e não consume? Deitaria com Luiza em trânsito, trânsidas, num mar de acrílico, mergulharíamos juntas no oscilante orgulho português feito de desejo, aventura, conquista e fracasso? Ricto agudíssimo, desafio, tropeço, trompaço, em costas africanas, chicote e sangue? Viríamos nós duas, heroínas incandescentes, indecentes, do outro lado do tempo, possuídas por outrens, matrizes ferradas, ventrílocas loucas, bocas abertas, ondas do mar que comeu a terra, comeu os filhos, comeu as naus, boca escancarada, frenesi convulsivo, pulsos abertos?


ENTREVISTA

por PAULO GRAVINA

A literatura da concórdia EDGARD TELLES RIBEIRO é diplomata e escritor.

Como seria deitar e, dormir com Luiza? Crime escuro? Quebrar os membros no verso que se parte? Quebrar os dentes na palavra? Ficar acordada e atenta? Perder o sono pra sempre? Olho aberto grudado à porta, porta estreita, porta que aporta, cão noturno, sexo desperto, grão e lume? Sexo facho, sexo fácil, sexo sexo sexo, sexo inseguro, assobio, membros inertes, notas agudas, som estridente. Para Luiza, flor exótica, abriria meu sexo, entregar-me-ia? Entregaria meu ouro, meu grão, minha alegria? Generosidade e escravatura, eu e ela, nós duas, mortas na cama, assim seria?

Márcia Brito

Deitar-me-ia, eu com Luiza, sobre tantos outros corpos, corpos que proliferam em outros corpos, demais corpos, corpos demais, saídos da sua boca aberta em pasmo, substâncias soltas, corpos densos, feitos de sonho e de morte? Como seria então? Como seria dormir com Luiza Neto Jorge, esfregar meu corpo no corpo dela aceso, corpo dolorido, carne ardida, corpo intenso, mais denso que o denso, corpo apodrecendo na doença, arco teso de espasmos, corpo de cheiros, salsugem, corpo insurrecto que se diz em estado de de-com-po-sição, sulco do universo? Corpo ímpio, Desinferno número II? Afinal, como seria deitar com Luiza Neto Jorge, sanguessugas sobre a pele, incêndio na minha cintura, na parte de baixo da barriga, no púbis, entre as pernas? Como seria deitar e dormir com Luiza, sobre ela? Seria roubo, contração, homenagem póstuma, repuxo na perna, consagração?

Publicou alguns livros de contos e os romances “O Criado-Mudo”, “Branco Como o Arco-Íris” e o seu último, “Um Livro em Fuga”. Em uma passagem pela PUC-Rio, no mês de Maio, o plástico bolha aproveitou para entrevistá-lo. Nesta conversa, Edgard fala sobre o lançamento do novo romance e sobre o que há de verdade por trás de suas histórias.

Sua obra trabalha muito com a infância e também com experiências sensoriais relativas à memória. Há aí alguma tentativa de reviver o passado? Não se trata de opção muito consciente, nem creio que boa parte de meus livros trafegue por essa via; mas não resta dúvida que o filão do passado, como seus ecos de lembranças e associações, acaba representando terreno fértil para a criação literária. Não chegaria a afirmar que se trata de “reviver” o passado; mas que tal sugerir que pode se tratar de “namorá-lo”?

Há, na sua obra, uma forte combinação de elementos narrativos e descritivos e, sempre, uma mistura de ações e sensações. Qual é o ponto de partida para as suas histórias? Varia muito, de romance para romance, de conto para conto. Por vezes, é algo que testemunhei, pelo menos em parte, e que depois adaptei ou redimensionei; em outros caso, leio algo (jornal, livro, ou revista) que me leva a imaginar um cenário paralelo (ao que vi) e daí parto em vereda própria. Por fim, por vezes ganho uma história de presente (o núcleo narrativo de meu primeiro romance, “O Criado-Mudo”). A questão de “ganhar uma história de presente” ocorreu comigo e deu origem ao Criado-Mudo, meu primeiro romance, cujo núcleo básico (que fica esclarecido logo nas primeiras páginas do livro), me foi contado por uma senhora que gostava muito de mim e que sabia que eu, um dia, faria bom uso da história... (Levei 20 anos com a história na cabeça até começar a escrever um texto que pensava em dar para um cineasta filmar — texto esse que acabou crescendo, crescendo, crescendo — e se transformando no romance.).

Você está relançando agora seu livro de estréia, “O Criado-Mudo”. Algo mudou no Edgard daquela época para o Edgard de hoje? Passaram-se 18 anos e trinta quilos... Graças aos 18 anos, espero ter amadurecido; quanto aos quilos, rechearam bons momentos literários (recorro muito a cenas de almoços e jantares em meus livros...).

Você declarou, em entrevista recente, que vivemos em um mundo onde não há mais clareza na distinção entre o bem e o mal. Diante disso, qual seria o papel do escritor hoje? Trabalhar essas fronteiras imprecisas, fazendo correlações que ajudem os leitores a enriquecer suas próprias visões do mundo. E viajar com eles pelo tempo, relembrando momentos do passado que possam iluminar o futuro.

Você considera a diplomacia como porta de entrada para sua literatura ou a literatura como uma necessidade para sua atuação como diplomata? Em outras palavras, você acha que é um escritor-diplomata ou um diplomata-escritor? Essas minhas duas carreiras evoluem de forma muito harmoniosa e se enriquecem mutuamente. Tenho muita sorte, graças à carreira diplomática, de ter acesso a outras culturas, outros mundos. Dessas encruzilhadas, nascem idéias e, por vezes, histórias. Por outro lado, depois que comecei a escrever (e a publicar...), passei a relativizar muitas das pressões que sofria em meu dia-a-dia como diplomata, um pouco como se o ato de escrever me proporcionasse um recuo de observador. Você poderia comentar o seu novo romance, “Um Livro em Fuga”, em termos ficcionais e autobiográficos? Trata-se de uma obra sobre perdas, que se entrelaçam como em uma fuga bachiana, com seus temas e contrapontos: a perda da mulher amada (por força de um casamento que se desfez), a perda das ilusões (face a um mundo globalizado e crescentemente imbecilizado), a perda de valores de todo tipo (entre eles intelectuais, particularmente no domínio da literatura). Mas essa espécie de costura de perdas acaba também se abrindo para a esperança — mesmo porque o que seria do artista sem ela...?

O que você tem lido hoje em dia? Poderia deixar uma mensagem final para nossos leitores e os aspirantes a escritor? Ando relendo, muito mais do que lendo. Pode ser uma fase. Mas andei revisitando Flaubert, Camus e Borges, para ficar neste último ano. Tenho achado enorme graça em comparar minhas reações atuais (às obras primas desses escritores) às impressões de juventude dessas mesma obras. Conselho para quem quer escrever? Delicado, isso... Mas vá lá: não se preocupe em escrever uma OBRA. Faça uma frase. E depois outra. Encerrado o primeiro parágrafo, faça o segundo. Se houver tranquilidade nesse exercício, e se não surgirem autocobranças muito excessivas, é bem possível que o (eventual) prazer em escrever “passe” para o leitor.

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Café com maçãs e cigarros

Tentativa de poeta

Reflexivo

O homem de neanderthal degusta a carne de carneiro que capturou mais cedo no mercado bem refrigerado.

Riscava as primeiras rimas Como quem arriscava os primeiros passos. E rabiscando de leve, redondo e lento Compunha, em pronto, de certo,

Eu não tinha este rosto senão o esboço o risco

O homem de neanderthal cozinhou sozinho com diversas ervas o carneiro e deu para sua esposa um punhado para experimentar. A esposa do homem de neanderthal usa botas de couro negro, batom vermelho, e prende suas enormes madeixas louras de uma maneira encantadora. Pensamentos do próprio homem de neanderthal. O homem de neanderthal se perde nos fios dourados cuidadosamente trançados por mãos imortais.

Marcela Sperandio Rosa

Versos tolos. E regendo assim as palavras Libertando-as de minha sã loucura Minha escrita, hoje, é eterna procura: Nada de termos exatos ou Versos inteiros. Dentre caudalosos rios fonéticos Escolho em tantos somente poucos; Profanar temas herméticos, em meu dever de poeta; Na proeminência de meus Versos ocos. Meus desvarios lógicos, frenéticos Em minha tentativa de compor versos poéticos, Assemelho-me a crônicos, insanos, insensatos, léxicos. Tomado por inteiro de meus

Eu não tinha lábios nem barriga todas as artes do meu corpo eram tuas e eu não sabia Eu não via havia óleos meu contorno escorria até que entre teu olho reflexivo bem-me-vi e não era tarde

Antonia Ratto

Versos loucos.

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