Revista Política Social e Desenvolvimento #10

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revista política social e desenvolvimento #10

QUESTÃO AGRÁRIA E SEGURANÇA ALIMENTAR Brancolina Ferreira

Walter Belik

Wilson Cano

ANO 02_Dezembro 2014

plataforma política social Código ISSN: 2358-0690


Revista eletrônica desenvolvida pela rede Plataforma Política Social Agenda para o Desenvolvimento que reúne cerca de 300 pesquisadores e proossionais de mais de uma centena de universidades, centros de pesquisa, órgãos do governo e entidades da sociedade civil e do movimento social.

Apoio:

www.fes.org.br

Direção de Arte e Editoração:

Coletivo Vaidapé


Índice 04 Apresentação Eduardo Fagnani e Thomas Conti

06 Reforma agrária, assentamentos rurais e segurança alimentar Brancolina Ferreira

21 Segurança Alimentar e Reforma Agrária Wilson Cano

25 Segurança Alimentar e Nutricional e o Direito Humano à Alimentação Walter Belik


apresentação

[ revista política social e desenvolvimento Professor#10 do ]

Eduardo Fagnani

Instituto de Economia da Unicamp, pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e do Trabalho (Cesit) e coordenador da rede Plataforma Política Social - Agenda para o Desenvolvimento

Thomas Victor Conti thomasvconti@gmail.com | www.thomasconti.blog.br

Nesta edição #10 da Revista, trazemos uma grande atualização sobre o crucial problema da segurança alimentar e sua tensa contrapartida política, a questão agrária no Brasil. Se, sobre a segurança alimentar, o combate à fome tornouse grande bandeira de governo na última década, a questão agrária é tema bem menos recorrente, principalmente no debate público mais amplo, como vimos nas eleições deste ano. Entretanto, a baixa atenção que o tema recebe está longe de significar baixa relevância. Como os artigos desta edição mostram sem deixar margem para dúvidas, a agricultura familiar ainda mantém uma elevada proporção da oferta de alimentos para o mercado interno; e as políticas de assentamento de famílias ainda contribuem para a diminuição da pobreza e da subnutrição no campo – tudo isso a despeito de os avanços no cultivo de terra terem sido majoritariamente direcionados para os tradicionais grandes latifúndios monocultores, rebatizados de “agronegócio”. Em Reforma Agrária: assentamentos rurais e segurança alimentar, Brancolina Ferreira traz à tona os números impressionantes da situação do campo no Brasil de hoje. Os problemas abrangem desde a guinada massiva da compra de terras por pessoas e empresas estrangeiras, até a diminuição da 4

Mestrando em desenvolvimento econômico pelo Instituto de Economia da Unicamp


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área redistribuída mediante a política de assentamento rural. Em linhas gerais, a autora mapeia o quanto a agricultura de pequena propriedade ainda é central para a segurança alimentar no Brasil de hoje, e as dificuldades de compatibilizar esse setor e o avanço da grande propriedade exportadora. Em Segurança Alimentar e Reforma Agrária, o professor Wilson Cano usa da sua erudição para retomar em poucas linhas o quanto um projeto nacional de desenvolvimento historicamente pode aparecer atrelado a uma política de reforma agrária bem-sucedida, como ocorrera no Japão e – poderíamos acrescentar – até mesmo nos Estados Unidos. No Brasil, o autor argumenta que a reforma agrária seria pouco custosa aos cofres públicos, em troca de impactos muito importantes, tanto na oferta de alimentos quanto na garantia de moradia e emprego acima do que os não assentados conseguiriam caso migrassem para as periferias urbanas das grandes cidades brasileiras. A ênfase nos programas de transferência de renda dá suporte ao lado da demanda de alimentos, e a reforma agrária faria o ajuste correspondente no lado da oferta. Por fim, em Segurança Alimentar e Nutricional e o Direito Humano à Alimentação, Walter Belik retoma brevemente a árdua tarefa de incluir o Direito à Alimentação como mais um princípio norteador para políticas de Estado no Brasil. Após a obtenção dessa grande vitória, hoje o desafio é criar mecanismos para atuar de fato no problema da produção e abastecimento de alimentos, pois cada vez mais as instituições voltadas para a segurança alimentar têm direcionado seus recursos para dar suporte à política de transferência de renda, deixando uma margem menor para atividades importantes de coordenação e gerenciamento do mercado de alimentos do país. Convidamos os leitores a conhecer esta edição da Revista e acreditamos que, com ela, estarão bem munidos para situar o problema da Segurança Alimentar e da Reforma Agrária no Brasil, como ele aparece em 2014, após tantos avanços, mas ainda com muito a caminhar. Boa leitura! 5


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REFORMA AGRÁRIA: ASSENTAMENTOS RURAIS E SEGURANÇA ALIMENTAR Brancolina Ferreira

1. Introdução A segurança e soberania alimentar deveriam compor uma diretriz estratégica que perpassasse todas as políticas econômicas e sociais, as quais, contudo, têm ficado restritas às formulações relativas à agricultura familiar. Não que não se reconheça a importância deste setor como o principal ofertante de alimentos. Tal reconhecimento, contudo não extrapola os limites do discurso para apresentar-se como políticas efetivas. Por mais que alguns programas de apoio à produção agrícola familiar tenham ganhado relevância em anos recentes, ainda assim estão longe de ombrearem os recursos e dispositivos de proteção destinados ao agronegócio. Como componente fundamental à vida e à saúde da população, as questões relativas à segurança alimentar e nutricional 6

Pesquisadora do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA).

se situam num patamar bem mais amplo que o da produção primária de alimentos. Atravessam toda cadeia produtiva de alimentos, aí compreendendo todos os fatores que impulsionam, dificultam ou impossibilitam tal produção, passam pela geração de quantitativos que embasem sistemas de beneficiamento e distribuição até aportarem nas mesas dos consumidores. Aqui nos deteremos em uma questão que determina a produção de alimentos em primeira instância: o acesso à terra. Isso porque entendemos que a segurança e soberania alimentar têm que estar primariamente fundadas na soberania territorial. Sem governabilidade sobre a destinação e uso de nosso território, pouco resta para colocar a serviço da segurança alimentar ou de qualquer outra.


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2. Expansão desordenada dos interesses ligados aos setores exportadores e o esvaziamento da Reforma Agrária (iniciativa ultrapassada) Desde sempre a questão da apropriação de grandes extensões de terra para monocultivos de exportação é constitutiva da questão agrária brasileira. A variação de intensidade e de destinos alternativos para o uso da terra, já no

período colonial, dependia da flutuação dos preços internacionais: quando estes subiam, a mão de obra escrava era utilizada prioritariamente nos cultivos de exportação, o que restringia o funcionamento interno do sistema de produção e abastecimento alimentar. Todo período escravocrata esteve tensionado entre a realização de lucros advindos do comércio internacional e a produção de alimentos para consumo interno.

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Este tensionamento ainda compõe a realidade rural. Nas últimas décadas, o setor agrícola vem cumprindo importante papel na obtenção de superávits da balança comercial, e suas perspectivas de crescimento são bastante promissoras. O setor agrícola cada vez mais especializado na produção de commodities cresce impulsionado por grandes fusões e aquisições de grupos transnacionais, além do grande aporte de financiamentos públicos e subsídios estatais. De outra parte, a pequena agricultura baseada na mão de obra familiar e os assentamentos de reforma agrária vivenciam condições adversas para se estruturarem e se desenvolverem. As dificuldades enfrentadas pela pequena produção agrícola em unidades familiares e em assentamentos rurais passam pelo enfrentamento ao oligopólio transnacional de produção de sementes e insumos, pela liberalização e desregulamentação dos mercados, pela ausência de regulação estatal sobre a atividade produtiva, pela imposição da lógica mercantil comandando a produção de alimentos, pela introdução de capitais especulativos no processo de aquisição de terras, diminuição da disponibilidade global de alimentos em razão dos agrocombustíveis,

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`a par da elevação da demanda global por alimentos, especialmente em países em desenvolvimento como Brasil, Índia e China. Em 2008, os sintomas dos desajustes estruturais do modelo de produção vigente vieram à tona expressos pela elevação dos preços internacionais dos alimentos, que agravou as condições de vida das populações mais vulneráveis, sobretudo em países africanos e asiáticos mais pobres. “A crise sistema agroalimentar “A crise mundial domundial sistema do agroalimentar provocou busca desenfreada provocou uma busca uma desenfreada por terras por terras férteis redor do mundo. Alicerçados na férteis ao redor doao mundo. Alicerçados na clarade percepção de que a terra clara percepção que a terra é um bem é um bem e que a única forma de garantir segufinito e que finito a única forma de garantir segurançaé alimentar através da apropriação rança alimentar através daéapropriação controle direto de dosprodução, meios de produção, ou controle ou direto dos meios grupos financeiros governos estrangeiros grupos financeiros e governoseestrangeiros têmnainvestido compra e/ou arrendamento têm investido compra na e/ou arrendamenpaíses estrangeiros. to de terras de emterras paísesem estrangeiros. Esta Esta nova investida vem acompanhada de uma tendênnova investida vem acompanhada de uma de alargamento do da usoterra da terra tanto para tendência deciaalargamento do uso produçãode demonocultivos monocultivos como para fins tanto para aaprodução meramente especulativos” como para fins meramente especulativos” (CODER/DISOC/IPEA, 2010). (CODER/DISOC/IPEA, 2010). A segurança alimentar e nutricional precisa ter como fundamento o controle dos meios de produção, daí decorrendo a necessidade de democratização do acesso à terra, a par do estabelecimento de mecanismos públicos de controle relativos a aquisições de terras por estrangeiros, bem como o estabelecimento de um limite à extensão dos imóveis rurais, além de um marco regulatório sobre o agronegócio. Ou seja, depende não só do cumprimento de toda a legislação já existente como também de definir politicamente o que, para quem e sob quais condições continuaremos produzindo alimentos no Brasil.


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3. Novo ciclo de concentração fundiária e De acordo com a ONU, em 1960 o 1 aquisição de terras por estrangeiros mundo possuía pouco mais de 1 hectare de área agricultável per capita; em 2030, A apropriação de terras por estrangei- este valor atingirá 0,3 hectares per capita. ros não é um fenômeno novo, mas acele- Nesta conjuntura, o Brasil emerge como rou-se nos últimos anos, em decorrência um campo fértil para interesses externos, da elevação do preço dos alimentos e da uma vez que possui nada menos que 15% crise de produção que afetou alguns países. das terras agricultáveis não exploradas no Já há algumas décadas, o preço dos produ- mundo; a maior biodiversidade concentratos alimentares tem apresentado quedas da em um bioma do planeta (Amazônia); constantes, mas, segundo a FAO, de janeiro percentual elevado de terras improdutivas a dezembro de 2007 o preço dos alimen- apropriadas por poucos especuladores; tos aumentou 40% no mundo2. As causas enorme potencial mineral ainda inexplodo fenômeno são diversas: aumento da rado; políticas públicas voltadas ao fortademanda impulsionada pelo crescimen- lecimento do agronegócio; e, até agora, a to econômico de Índia e China, queda da ausência de controle público efetivo sobre a produção relacionada a eventos climáticos, aquisição de terras por estrangeiros. elevação do preço internacional do petróleo com reflexo nos custos do transporte, o Até 2010, os estrangeiros já haviam avanço dos biocombustíveis sobre áreas de adquirido 46,6 milhões de hectares de cultivo alimentar, baixos estoques alimentí- terras em países em desenvolvimento. No cios, uso de cereais para produção de ração Brasil, os dados do SNCR só permitem animal e outros fatores. No início de 2008, identificar um total de 4 milhões de hectajá havia escassez de arroz, trigo e milho em res em mãos estrangeiras. O dado contualguns países. do está longe de refletir a situação real da apropriação estrangeira de terras brasiA utilização de toda a área agricultável leiras, reflexo da inexistência de aparato disponível em países cuja demanda está fiscalizatório eficiente. Uma das estratégias em forte expansão (China e países árabes) utilizadas pelo capital internacional para a e a relação de dependência destes países em compra de terras no país tem sido a criarelação aos países produtores de commodi- ção de empresas brasileiras em nome de ties agrícolas gerou uma grande demanda laranjas. Dados do SNCR mostram que pela terra dos países em desenvolvimento o número de imóveis sob o domínio de com área agricultável disponível. A FAO empresas nacionais passou de 31.000 em estima que existam 4,2 bilhões de hecta- 1998 para 67.000 em 2008. A área registrares de terras agricultáveis no mundo, dos da sob domínio empresarial passou de 80 quais são utilizados apenas 1,6 bilhões. milhões para 177,2 milhões de hectares em O maior percentual de desuso das terras dez anos. Em contrapartida, apenas 34.371 está na África subsaariana e na América imóveis rurais estão registrados em nome Latina, alvo preferencial dos investidores de estrangeiros em 2010. De acordo com o estrangeiros. INCRA, o volume de terras estrangeiras em 9


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território nacional deve ser três vezes supe- que regulamenta os dispositivos constiturior ao identificado pelo cadastro. cionais relativos à reforma agrária, instituiu restrições ao arrendamento de imóveis Embora o descontrole seja evidente, é rurais por estrangeiros, como previsto na necessário ressaltar que nem sempre houve Lei de 1971. quem desejasse que houvesse um controle desse tipo.3 Além do mais, coube ao próprio Contudo, a Emenda Constitucional n. Estado o papel de induzir a ocupação do 06/95, promulgada no contexto de intensiterritório por capitais externos em algu- ficação da abertura econômica do país e de mas regiões do país. Foi o caso do processo entrada de capital estrangeiro no procesde ocupação da Amazônia nas décadas de so de privatização, revogou o artigo da 1960 e 1970. Para atrair capitais produtivos, a Constituição que disciplinava a distinção União ofereceu vantagens e incentivos fiscais entre empresas brasileiras e empresas de à ocupação de terras a grandes grupos econô- capital nacional das empresas estrangeimicos, alguns estrangeiros, que desejassem ras, dispensando-lhes tratamento diferencriar empreendimentos na região. ciado e disposições especiais. Com isso, a AGU, através de Parecer de 1997, ratificou o A aquisição de terras por estrangeiros no entendimento de que o §1º do art.1º da Lei país é regulada pela Lei 5.709/71. Além desse 5.709/71 – que submetia à forma dessa Lei a dispositivo, o Decreto 85.064/80 regula a aquisição de terra por estrangeiro residenaquisição de terras em faixa de fronteira. te no País e por pessoa jurídica estrangeira Posteriormente, a Constituição previu, em autorizada a funcionar no Brasil – estava seu art. 190, que “a Lei regulará e limitará a revogado. Aprovado pelo presidente da aquisição ou o arrendamento de proprieda- República e publicado no Diário Oficial da de rural por pessoa física ou jurídica estran- União, o parecer adquiriu efeito vinculangeira e estabelecerá os casos que depende- te para todos os órgãos da administração rão de autorização do Congresso Nacional.” pública federal. Atendendo a essa previsão, a Lei 8.629/93,

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Diante do crescimento da participação estrangeira na propriedade de terras e da ausência de controle nos últimos anos, a AGU firmou em 2008 parecer favorável à revisão da orientação anterior. Mas, em vista da pressão da Associação Brasileira de Papel e Celulose (Bracelpa) e da crise econômica de 2008, a nova decisão teve de ser adiada.

da especulação imobiliária, com consequente aumento do custo de desapropriações para a reforma agrária e redução do estoque de terras disponíveis para tal fim; crescimento da venda ilegal de terras públicas; utilização de recursos oriundos da lavagem de dinheiro, do tráfico de drogas e da prostituição na aquisição dessas terras; incremento da biopirataria na Região Amazônica; ampliação, sem devida reguAntes de a AGU revisar o parecer, o lação, da produção de etanol e biodiesel; Ministério Público Federal (MPF) instruiu aquisição de terras em faixa de fronteira, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a pondo em risco a segurança nacional, etc. tomar providências quanto à normatização dos registros imobiliários da compra de terras por estrangeiros no país, e emitiu O parecer destaca que a imposição de recomendação formal ao Advogado Geral limites legais à aquisição de terras por da União para revisar o parecer AGU/ GQ-181. Sustentou o MPF que na matéria estrangeiros é comum noutros países. em causa deveriam prevalecer as disposi- Nos Estados Unidos, por exemplo, devem ções da Lei 5.709/71. O CNJ, em atenção ser elaborados relatórios das aquisições a essa norma, indicou que os cartórios à Secretaria de Agricultura. Alguns estadeveriam promover a lavratura dos atos de dos possuem regulação própria: em Nova aquisição de terras por empresas brasileiras York, só o estrangeiro naturalizado está controladas por estrangeiros, e determinou apto adquirir terras rurais. Na Virgínia, é o envio da relação das aquisições anterior- permitida a posse apenas ao estrangeiro mente cadastradas aos Tribunais de Justiça residente por mais de cinco anos. Em Iowa, e corregedorias locais ou regionais. Mesmo terras destinadas à agricultura não podem ante a pressão de setores do agronegócio, pertencer a não residentes; e no Missouri, um novo parecer da AGU em 2010 restau- elas não podem ser de estrangeiros. O rou a vigência da Lei 5.709/71. Publicada México, por sua vez, proíbe o domínio no Diário Oficial da União, a nova inter- estrangeiro de terras em faixa de fronteira pretação passou a valer para toda a admi- e à beira-mar. Empresas mexicanas com participação de capital estrangeiro sujeinistração pública direta e indireta. tam-se a outras restrições, como o limite O atual parecer da AGU atesta que a máximo de propriedade. ausência de controle do território gerou inúmeros efeitos ao país: expansão da fronteira agrícola com avanço do cultivo em áreas de proteção ambiental; valorização desarrazoada do preço da terra e incidência 11


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A Reforma Agrária: Hoje4

papel central nas estratégias de desenvolvimento econômico-social, sobretudo do Uma política articulada do Estado que espaço rural. vise a promover a segurança e a soberania alimentar deve ter como componentes Especificamente, que papel os assentaestratégicos as políticas de fortalecimen- mentos rurais já desempenham e ainda to da agricultura familiar e de efetivação podem vir a desempenhar no sentido de da reforma agrária, igualmente cruciais contribuir tanto para a segurança como para que se enfrentem a desigualdade para a soberania alimentar? e a pobreza no meio rural. A segurança As respostas podem começar a ser buscaalimentar extrapola a garantia de oferta e de acesso de alimentos, pois, crescente- das nos resultados do Censo Agropecuário contrimente, a questão da garantia do domínio de 2006, que revelam a importante 5 territorial se tornará mais determinante. buição da agricultura familiar na produção As definições legais sobre as formas de de itens fundamentais para alimentação dos acesso e uso das terras passam a ocupar brasileiros, como mostra a Tabela 1. Tabela 1: Produção vegetal e Pecuária: quantidade da Produção

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006. 12


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Por conta da própria formatação e destinação de terras no âmbito das ações governamentais de reforma agrária, a estruturação produtiva dos assentamentos da reforma agrária deve satisfazer critérios técnicos que garantam o uso sustentável da terra. Exceto os projetos de cunho extrativista e de preservação florestal, todos os demais são fortemente direcionados para a produção de culturas alimentares. Com isso duas questões fundamentais para o Estado brasileiro podem ser viabilizadas: a produção de alimentos que contribui para a segurança alimentar, e a posse da terra por agricultores familiares, que garantem a soberania sobre o território. 4.1. A Reforma Agrária em crise O Programa de Reforma Agrária – que nunca se realizou como tal, mas passou por uma fase de multiplicação dos assentamentos rurais – vem se apequenando pelo menos desde os anos finais do governo Lula. A partir de 2011, o programa ficou ainda menor e, mais grave, os assentamentos se tornaram alvo da imputação de serem em grande medida os responsáveis pela tragédia da pobreza rural mais extrema e pela devastação ambiental, sobretudo na Amazônia. O Programa de Combate à Pobreza – apesar de todos os seus méritos – ainda não estabeleceu ações e mecanismos capazes de atuar de forma definitiva sobre a extrema pobreza rural. De certa forma, ao não levar em conta a extraordinária concentração fundiária, na origem da questão agrária brasileira e na persistência da pobreza

rural, limitou suas possibilidades de oferecer uma solução definitiva à miséria rural. O acesso à terra para os trabalhadores rurais só tem possibilidade de acontecer pela intervenção direta do Estado, sendo ainda um passo central na determinação das possibilidades de sucesso dos assentamentos de reforma agrária e das políticas direcionadas para a agricultura familiar. A configuração historicamente dada e politicamente perpetuada da estrutura fundiária, as estratégias nem sempre “legais” de ocupação e domínio de vastos territórios – e de todo patrimônio natural neles contido – são excludentes e reproduzem relações de trabalho precárias, quando não análogas à condição de escravidão. São estes os condicionantes maiores da pobreza rural que evidenciam, mais diretamente que a simples computação das rendas, as causas da situação de exclusão social e tornam coincidentes os estados de extrema pobreza e de insegurança alimentar. Problemas seculares ainda estão sem solução no campo brasileiro, afetando grandes parcelas dos povos rurais, impedindo a democratização do acesso à terra e aos bens naturais, corroendo as relações de trabalho, dificultando o acesso a políticas públicas e aos diretos de cidadania. Para os trabalhadores rurais e camponeses do Brasil profundo, resistir é a única forma de sobreviver à ameaça de desterritorialização, uma ameaça que, por vezes, se concretiza, seja por uso da força do Estado ou de particulares, seja pela recorrência a manobras legislativas e judiciárias, que acompanham 13


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o avanço do capital sobre os territórios de ribeirinhos, quilombolas e povos indígenas. O objetivo de transformar o campo num território de produção de commodities agrícolas e minerais – de mercantilização da natureza no sentido mais amplo – tem se sobreposto ao mandato constitucional que deve garantir a função social da terra. Além disso, há que se levar em conta que os assentados pelo programa de reforma agrária não constituem um universo homogêneo:

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“Para avançarmos na reforma agrária é fundamental não perder de vista que os assentamentos representam um conjunto complexo e diferenciado de processos sociais em curso, onde as condições de existência e os campos de possibilidades se alteram na interação entre o fortalecimento da organização social, as dinâmicas socioeconômicas locais e regionais e a qualificação das políticas públicas nos marcos de disputas mais amplas pelos caminhos do desenvolvimento nacional” (MARQUES et alli, 2012).


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4.2 Famílias Assentadas: situação em 30 de nordeste (33%). Segue-se a região centro-ojunho de 2014 este (14%). O sudeste e sul abrigam – cada uma-, cerca de 4% dos assentados (Tabela Os assentamentos rurais compõem 2). Essa desproporção – relativamente às parcela importante da agricultura familiar, demais regiões – decorre da disponibilidaatendendo todos os requisitos de enqua- de de terras públicas na região norte, aonde dramento previstos pela legislação vigen- a criação de novos projetos de assentamente. Ao final do primeiro semestre de 2014 to vinha encontrando menores resistêno Sistema de Informações de Projetos de cias. A emergência de questões ambientais Reforma Agrária (Sipra)/Incra informava e a necessidade de se buscar formas mais que estavam em execução 9.154 projetos de sustentáveis de ocupação e exploração da assentamento, que abrigavam 957.348 famí- Amazônia fizeram com que o modelo antelias, em uma área total de 88,01 milhões de rior de formatação dos projetos de assenhectares. Ou seja, quase 1 milhão de famí- tamento – modelo da colonização oficial lias assentadas em diferentes tipos de proje- consagrado nos anos 1970 – esteja sendo tos em todo país, todos direcionados para responsabilizado pelos déficits ambientais o fortalecimento da economia familiar e e falta de sustentabilidade que vem sendo a promoção da agrodiversidade. A região detectada pelos órgãos ambientais nos norte abriga o maior contingente de famí- assentamentos rurais. lias assentadas (44%) seguida pela região Tabela 2: Projetos de Reforma Agrária em Execução: projetos criados entre 1900 e 2014 (1º semestre)

Fonte: SIPRA/SDM/Relatório: Rel_0227/ Data: 3/7/2014.

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O reconhecimento da necessidade de preservar o patrimônio natural tem incentivado a criação de projetos de assentamentos rurais com explícitos objetivos preservacionistas, mesmo porque a produção de alimentos na quantidade e qualidade necessárias também depende da manutenção da qualidade do solo e da disponibilidade adequada de água, o que apenas o uso sustentável da terra pode propiciar. Mas tais projetos são ainda minoritários e encontram imensas dificuldades para se viabilizarem. A desapropriação de terras improvdutivas para fins de reforma agrária diminuiu ao longo dos anos, não apenas por conta de dificuldades jurídicas e políticas, mas devido à perda de prioridade da reforma agrária nas agendas de governo. Sempre enfrentou dificuldades difíceis de serem superadas: ainda deve obedecer aos índices

de produtividade estabelecidos há décadas com base nos dados do Censo Agropecuário de 1975. Ademais, terras públicas, que por mandato constitucional devem ser destinadas à reforma agrária (art. 188) têm tido outras destinações, e a sucessão de CPIs contra o movimento social rural e os órgãos da reforma agrária paralisa – de tempo em tempo – a política agrária. A disponibilidade de terras públicas, sobretudo no Norte e no Centro-Oeste, durante todo século XX, possibilitou a criação, primeiramente de grandes projetos de colonização oficial e, depois, de assentamentos rurais. Somente a partir de 1964, com o Estatuto da Terra, foram estabelecidos critérios para desapropriação de terras por interesse social, reconhecido como o principal instrumento para assegurar o cumprimento da função social da terra6 (Tabela 3).

Tabela 3: Total de áreas obtidas via desapropriação, por grandes períodos

Fonte: SIPRA/SDM/Relatório: Rel_0227/ Data: 3/7/2014. 16


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Sobretudo após a legislação ambiental ter estabelecido parâmetros a serem observados para a constituição e ocupação de projetos de assentamento rural, passou-se a incrementar a criação de projetos explicitamente voltados para a preservação ambiental, de exploração florestal e extrativista, visando a possibilitar novos rumos para a reforma agrária – sobretudo na Amazônia. Atualmente, já ocupam uma área de quase 45 milhões de hectares, abrigando 188 mil famílias. Mas ainda um grande déficit ambiental está para ser resgatado, principalmente por duas ordens de fatores. Os projetos de colonização implantados na Amazônia, especialmente nos anos de 1970, estabeleciam que os “beneficiários” deviam desmatar as áreas recebidas e dar início ao processo produtivo. Sem assistência técnica, sem instrumentos de trabalho, sem

recursos técnicos e financeiros, a sobrevivência dos colonos acabava dependendo do corte e venda da madeira. Boa parte dos atuais déficits ambientais foi produzida naqueles anos (e décadas seguintes). Mas nem só de terra pública se valeu a reforma agrária. O principal instrumento conforme o Estatuto da Terra estava na desapropriação de terras improdutivas. E, com frequência, improdutividade associada ao uso indevido e devastação. Menos de 30% das terras que atualmente formam os projetos de assentamento rural foram obtidas por desapropriação por interesse social; a maior parte – 69% – eram terras públicas: estaduais e federais. Possivelmente, exceto os projetos agroflorestais, as demais foram incorporadas à reforma agrária já com sérios problemas ambientais: desmatadas, devastadas, erodidas (Tabela 4).

Tabela 4: Forma de obtenção das terras dos projetos de assentamentos rurais. Brasil e Grandes Regiões. Situação em 30/6/2014

Fonte: SIPRA/SDM/Relatório: Rel_0227/ Data: 24/4/2013. Notas: (*) Reconhecimento, Arrecadação, Discriminação, Em Obtenção – T.Coop.Tec. SPU. (**) Compra e Venda, Doação, Transferência, Adjudicação, Reversão de Domínio, Incorporação, Confisco, Cessão, Dação, Cessão Gratuita, Outros, Escritura Pública de Doação e sem especificação

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A crise que atinge o programa de reforma agrária não se manifesta apenas pela quase total paralisação na constituição de novos assentamentos. Um discurso de desqualificação que até recentemente partia dos grupos ruralistas mais conservadores vem sendo repetido com uma espécie de mantra por outros segmentos sociais, inclusive por agentes públicos federais, que equiparam os assentamentos rurais a favelas urbanas, o que denota duplo preconceito: contra as populações urbanas mais vulneráveis e contra os beneficiários das políticas de reforma agrária. O que não se comenta é que a situação precária de muitos assentamentos rurais (e urbanos) resulta da omissão do Estado e do abandono dessas populações. O que abundou em “boas intenções”, expressa em diversos documentos oficiais (planos, legislação, discurso pré-eleitorais, etc.), sumiu quando da execução dos planos, da aplicação das leis, no cumprimento das promessas eleitorais.

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No campo, aos que já tiveram acesso à terra, mesmo que em lotes extremamente pequenos, podem-se propor políticas de modernização tecnológica e agrícola. Isso vem sendo prometido pelo menos desde a promulgação do Estatuto da Terra: necessário embora tardio. Continuam desejáveis e necessárias políticas públicas que possibilitem a consolidação dos assentamentos rurais. O fato de raramente se distribuírem de forma contínua pelo território nacional dificulta a articulação dos interesses dos assentados, fragmentando as demandas e a implementação das políticas. O atendimento das famílias que ainda lutam por um pedaço de chão foi secundarizado com a justificativa de que antes seria preciso estruturar e dar garantias de sustentabilidade aos já assentados. Guardadas as devidas diferenças, mas relevando a mesma lógica perversa dos anos de chumbo, quando se falava em esperar o ‘bolo crescer’ para depois distribuí-lo, repete-se o discurso que procura justificar a exclusão e o abandono de milhares de famílias rurais à própria sorte.


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6. Considerações finais – alguns pontos de reflexão

de soja, milho e café (ver IPEA, BPS-21).

(e) A insegurança alimentar e nutricio-

(a) Diversos estudos e pesquisas, a nal resulta da combinação de uma série de

par de apontarem dificuldades e problemas econômicos e sociais presentes nos assentamentos rurais, também destacam a melhoria nas condições de vida dos assentados, em comparação com situação anterior, não apenas pela garantia de moradia e segurança na posse da terra, como a possibilidade de enfim poderem ter um projeto de futuro, especialmente para as crianças e jovens.

fatores, que começam com o modelo de desenvolvimento da agricultura, fundado na monocultura e produção de commodities, na distribuição desigual da renda e de oportunidades entre as classes sociais, na distribuição desigual de políticas de apoio e incentivo à produção.

(f) As áreas para a produção de uma alimentação saudável vêm diminuindo com a expansão do uso indiscriminado de (b) A reforma agrária, ao possibilitar fertilizantes químicos e agrotóxicos que garantia de moradia e trabalho, constitui afetam a biodiversidade e aumentam a por si só mecanismo poderoso de inclusão poluição de terras e águas. social e consolidação de cidadania. (g) A reforma agrária é estratégica para (c) O Programa de Reforma Agrária a reprodução da agricultura familiar; a sempre enfrentou dificuldades para sua agricultura familiar é fundamental para efetivação, desde as relacionadas com a a produção de alimentos, sem a qual se desapropriação de terras, os contingencia- instala a insegurança alimentar. mentos orçamentários, a criminalização (h) A reforma agrária e seus assentados movimentos sociais, até o avanço dos mentos rurais constituem garantia estrasetores ruralistas na defesa de seus interesses, com a edição e proposição de leis tégica de soberania territorial, desde que que visam a inibir as demandas dos movi- as terras permaneçam indisponíveis para mentos sociais rurais e a penalizar suas a especulação imobiliária. lideranças. (i) A agenda da Reforma Agrária não (d) Os programas de apoio à agricul- está esgotada. Embora com ritmo e sentitura familiar e por extensão aos assenta- do diferentes, há anos compõe a agenda dos rurais (também agricultores familia- governamental, com implementação res) ainda são insuficientes para atender flutuando conforme os ventos políticos e adequadamente a todos. O maior destaque as pressões dos contrarreformistas. está dado pelo Pronaf, que vem amplian(j) Sua importância e atualidade decordo suas linhas de atuação, mas atualmente rem tanto da busca em corrigir a excessiva concentra seus financiamentos na região concentração da estrutura da propriedade, sul do país direcionados para a produção quanto da necessidade de estabelecer um 19


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instrumento de justiça social num território em que a igualdade de direitos é débil e corre riscos.

(k) As áreas de agricultura familiar,

reformadas ou não, sempre cumpriram uma importante função de abastecimento alimentar e de matérias primas para os setores urbanos. Finalmente, os assentamentos não só são promissores como, nos locais em que se institucionalizaram, têm sido responsáveis pela elevação da renda das famílias rurais e pela melhora significativa de sua condição de vida em relação à época em que eram “sem-terra”. Essa melhora afeta positivamente o desenvolvimento econômico e social do país e tem efeitos multiplicadores de emprego e renda nas respectivas regiões.

NOTAS 1 Esta seção transcreve texto editado no Boletim de Política Social: “Políticas Sociais: acompanhamento e análise”, capítulo n. 19. Ipea. Brasília, 2011. 2 De acordo com Graziano e Tavares (2008), em janeiro de 2008 o preço do trigo já estava 83% acima do preço de janeiro de 2007. Os países que mais sofrem com a alta dos alimentos são aqueles em que as famílias gastam no consumo alimentar a maior parte do seu orçamento. 3 Nos anos 1920 o governo brasileiro concedeu 1,2 milhões de hectares de terra no Pará a Henry Ford para plantio de seringueiras a fim de abastecer a indústria automobilística. Nos anos 1950, a Icomi, empresa de capital nacional e norte -americano, foi autorizada a explorar reservas de manganês no Amapá; nos anos 1970, um milionário norte-americano adquiriu cerca de 4 milhões de hectares na fronteira entre o Pará e o Amapá para a implantação do Projeto Jarí, que previa o desmatamento da área para a instalação de uma fábrica de celulose. Na ditadura militar a Operação Amazônia ofereceu incentivos fiscais a multinacionais que se instalassem na região, inclusive para a extração de madeira. Algumas obtiveram milhões de hectares, como Volkswagen e Coca-Cola. Na era FHC, o governo montou o Serviço de Vigilância da Amazônia (Sivam), a ser operado por uma empresa norte-americana com a responsabilidade de mapear a Amazônia. 4 Texto apresentado em 8/5/2013 e atualizado em 20/11/2014. A atualização dos dados não modifica substancialmente a análise neles embasadas.

BIBLIOGRAFIA IPEA. Políticas Sociais: acompanhamento e análise. Brasília, n. 19, 2011. Disponível em: http: //www.ipea.gov. br/publicações – Políticas Sociais, acompanhamento e analise. _____. Políticas Sociais: acompanhamento e análise. Brasília, n. 20, 2012. http: //www.ipea.gov.br/publicações – Políticas Sociais, acompanhamento e analise. _____. Políticas Sociais: acompanhamento e análise. Brasília, n. 21, 2013 (no prelo). MARQUES, Vicente P.M., DEL GROSSI, M. e FRANÇA, C.G – “O Censo 2006 e a Reforma Agrária: aspectos metodológicos e primeiros resultados”. Brasília. NEAD/MDA/2012. Disponível em: http://www.nead.gov.br/portal/nead/neaddebate/ download_orig_file?pageflip_id=10324476.

20

5 Conforme definição expressa na Lei n. 11.326/ 2006, art. 3º: Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos: I – não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; II – utilize predominantemente mão de obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III – tenha renda familiar predominantemente originada de atividades econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento; IV – dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. 6 O Estatuto da Terra definiu como finalidade da desapropriação por interesse social: a) condicionar o uso da terra à sua função social; b) promover a justa e adequada distribuição da propriedade; c) obrigar a exploração racional da terra; d) permitir a recuperação social e econômica de regiões; e) estimular pesquisas pioneiras, experimentação, demonstração e assistência técnica; f) efetuar obras de renovação, melhoria e valorização dos recursos naturais; g) incrementar a eletrificação e a industrialização no meio rural; h) facultar a criação de áreas de proteção à fauna, à flora ou a outros recursos naturais, a fim de preservá-los de atividades predatórias.


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SEGURANÇA ALIMENTAR E REFORMA AGRÁRIA Wilson Cano

De início, cabe lembrar que além da forte interdependência entre si, os dois temas estão relacionados. Eles também apresentam forte vinculação com a Politica Econômica, especialmente com a Agrícola, a de Abastecimento, a de Comércio Exterior e com a Política Fundiária. Dessa forma, há que investigar não só seus principais aspectos próprios, a eficácia de suas próprias políticas, e como figuram na Agenda Política do Estado. Comecemos pela Segurança Alimentar. O tema tem sido objeto de políticas especiais – que podem inclusive atingir a agenda de segurança nacional – em vários países populosos e que apresentam dotação problemática de recursos naturais e que também padecem de comportamentos climáticos erráticos e prejudiciais à produção agropecuária. O problema se intensifica no caso de países com sérios riscos

Professor Titular de Economia Brasileira do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos de Desenvolvimento Econômico – CEDE (IE/UNICAMP)

geopolíticos com vizinhos próximos. O risco, nesses países, exige radicais políticas de estoques (quantidades e preços) mínimos e reguladores, uma política agrícola de alto grau de suficiência interna no abastecimento, e que apoie (crédito, C&T, etc.) decididamente aquela produção. Ainda, exige política de comércio exterior e de investimento externo criteriosas para com a questão, como fizeram o Japão e a antiga URSS, e como faz hoje a China. O risco pode inclusive converter-se em verdadeiras tragédias de fome, em países subdesenvolvidos que padeçam de pelo menos parte daqueles problemas, como tem acontecido com certa frequência em países africanos. Mesmo para países que não apresentam os riscos aventados para os grupos acima apontados, mas que apresentam menores 21


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níveis de renda e fortes contrastes de riqueza e pobreza, o tema também é relevante, principalmente no plano social, como é o caso do Brasil.

tratamento da pré-produção, à colheita, transporte e armazenagem. Estima-se que algo como um terço da produção é danificada e perdida. Isto pode e deve ser objeto de políticas agrícolas mais voltadas espeAté o início dos anos oitenta, ainda tínha- cialmente para a agricultura familiar – via mos uma política reguladora de estoques introdução maior de progresso técnico e nas e de preços mínimos, que foram sendo cadeias de armazenagem e comercialização. desmanteladas a partir dessa década, notadamente com o advento do neoliberalismo. Se o tema da Segurança Alimentar preoApesar de terem sido em parte recriadas, o cupa e envolve muitos, o mesmo, nos parece, funcionamento dessas políticas e sua eficá- não acontece com o tema da Reforma cia merece investigação permanente. Agrária. O tema esteve, nas décadas de 1950 a 1970,entre os principais da agenda polítiA interdependência entre este tema e a ca nacional (e latino-americana), tanto na Estrutura Fundiária adquire maior impor- esfera do Estado quanto, principalmente, tância, sobretudo pelo fato da enorme parti- na dos movimentos e partidos políticos de cipação da agricultura familiar na produção esquerda. de alimentos básicos. Face ao crescente predomínio da agricultura capitalista exporO Censo Demográfico de 1960 mostrava tadora, que é altamente concentradora de que a população rural do país perfazia ainda financiamento e de terra, a agricultura fami- 54,9% do total e a população rural ocupada, liar e a questão fundiária exigem particular 54,5% da PEA total, cifras que regionalmenatenção do Estado e permanente investi- te apresentavam acentuadas diferenciações: gação por parte daqueles que estudam e se eram respectivamente de 37,2% e de 32,7% preocupam com o tema. em SP, de cerca de 64%; e 66% a 70% no NO, NE, e CO-DF. No PR e em SC, ambas relaPor último, se o governo “criou merca- ções se situavam em torno de 69%; e no RS, do” de alimentos simples para cerca de 45 em torno de 56%. O Censo Demográfico milhões de brasileiros pobres, através do de 2010 mostrava que aquelas proporções Programa Bolsa Família, cabe lembrar que haviam caído fortemente: a da população se esse Programa tem garantido essa deman- rural total era agora de 15,6.% e a dos ocupada adicional, julgo que seria conveniente dos na agricultura na PEA total, de 13,2.%. também tratar da oferta, de seu planejamen- Naquelas mesmas regiões, as cifras caíram, to, de seus preços e de seu financiamento. respectivamente, para 4,1% e 4,3 % em São A esse respeito, cabe lembrar um dado Paulo, cerca de 26% e de 22% no NO e no por muitos conhecido, mas tão pouco estu- NE, e de cerca de 14% (em ambas relações) dado e para o qual são poucas as preocupa- no Sul e no CO-DF. Até mesmo a atrasada ções da política agrícola. Refiro-me à ques- agricultura do NE viu redução modesta, de tão do enorme desperdício que a produção 487 mil pessoas, o equivalente a 3% de sua de alimentos sofre, desde o plantio e população rural de 1960. 22


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Ao longo desse período, o Brasil diminuiu sua população rural em 9,5 milhões; e as únicas regiões que a aumentaram foram o NO (+ 2,3 milhões), e o CO-DF (apenas + 144 mil), regiões que compreendem a grande expansão da fronteira agrícola no período. Excluídas essas duas, o restante do Brasil diminuiu-a em 12 milhões. Assim, no período, graças às mudanças no crescimento demográfico, ao êxodo rural e em grande parte ao

subemprego urbano, o problema agrário encolheu de tamanho. No período, foram muito modestos os esforços públicos realizados para a execução de projetos de reforma agrária. Outro importante atenuante desse problema foi, sem dúvida – a grande novidade a partir da década de 1970 – o fato de que a incapacidade de criação de empregos rurais e a melhoria dos 23


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empregos urbanos, obrigava grande parte ao programa Bolsa Família, questão da população que ainda residia no campo, esta que parece não preocupar nossos a continuar morando no campo e a traba- governantes. lhar no urbano, contingente que em 2010 Alegar falta de recursos públicos para perfazia cerca de 42% da população rural. realizar a reforma agrária tem pouco Assim, esses fatores tiveram grande sentido, quando se sabe que o investimenimportância na forte diminuição da pres- to necessário para assentar uma família são desse tema na agenda do Estado, no campo é cerca de 10 vezes menor do desde a ditadura, mas também após ela. que na indústria. Assim, o governo deveDe forma semelhante, o ímpeto desse ria executar um amplo programa de reforpleito também arrefeceu nos movimen- ma agrária, distribuindo terra a pessoas tos sociais, tendo rara presença nas preo- pobres, e não apenas uma cesta alimencupações e atitudes dos partidos políti- tar, a qual não lhes dá nenhuma forma de cos, notadamente a partir do início do empoderamento econômico, e portanto século XXI. é ineficaz para enfrentar o problema da grave desigualdade na distribuição da É preciso, contudo, deixar claro que, se renda pessoal do país. bem o tema passou a ser visto como um “problema menor”, ele contudo foi apenas escamoteado, continuando na verdade a ser causa e efeito de nossa aguda e conhecida concentração da renda e da propriedade, agora em grande parte se manifestando mais no urbano do que no rural. Chamo a atenção, contudo, para as evidências de que o problema “diminuiu”, mas não se extinguiu. A população rural continuará a diminuir, dando continuidade ao êxodo rural e ao subemprego urbano, agravando ainda mais nossas mazelas urbanas, principalmente de habitação e saneamento. Por outro lado, um eficiente programa de reforma agrária com adequados crédito e assistência técnica, certamente poderia reforçar a oferta de alimentos da pequena e média agricultura familiar, auxiliando assim o problema da segurança alimentar e criando verdadeiras “portas de saída” 24


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SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL E O DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO Walter Belik

Professor Titular do Instituto de Economia da Unicamp

A promoção de uma política de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) se insere em uma trajetória de reconhecimento do Direito Humano à Alimentação, pelo Estado brasileiro. Já em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos do Homem das Nações Unidas, o direito à alimentação foi equiparado aos demais direitos humanos como a saúde e bem-estar. Mais tarde, com a promulgação do Pacto Internacional pelos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais no ano de 1976, do qual o Brasil é signatário, atribuise ao Estado a responsabilidade pela proteção da pessoa humana contra a fome.

os seus próprios alimentos; proteger, grupos e pessoas vulneráveis; e cumprir, provendo alimentos para aqueles que não possam consegui-los pelos seus próprios meios. Anos depois, durante a Cúpula Mundial da Alimentação de Roma em 1996, o Brasil assumiu o compromisso de, até o ano de 2015, reduzir pela metade o número de pessoas subnutridas, tomando-se como base os princípios da SAN. Finalmente, em 2001 durante a Cúpula do Milênio, o nosso país endossou as metas do milênio, novamente se comprometendo a, até o ano de 2015, reduzir pela metade o número de pessoas subnutridas.

O reconhecimento desse princípio faz com que o Estado tenha obrigação de atender três diretrizes: respeitar, não restringindo a capacidade das pessoas de prover

Com esses compromissos internacionais, e devido às pressões políticas e de movimentos populares, criou-se a institucionalidade necessária para que o 25


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governo brasileiro implementasse uma ampla política de combate à fome e de Segurança Alimentar em 2003. Como se recorda, a Constituição Federal de 1988 não incluiu devidamente o problema da alimentação entre os direitos fundamentais do cidadão, e as ações governamentais nesse campo durante os anos 1980 e 90 resumiram-se a intervenções pontuais 26

para casos emergenciais ou mesmo pequenos programas complementares às ações na área de saúde e educação. Essa pouca importância dada à SAN valeu ao governo brasileiro uma reprimenda por parte do relator especial para o Direito Humano à Alimentação das Nações Unidas, em visita ao Brasil em 2002.


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Com o lançamento do Projeto Fome Zero há dez anos, estabeleceu-se um amplo leque de políticas e programas voltados para combater as quatro dimensões da insegurança alimentar, como se segue: a falta de alimentos e água (disponibilidade); as dificuldades no acesso – em termos físicos e econômicos, das pessoas a esses alimentos; o consumo de alimentos prejudiciais à saúde; e a falta de estabilidade e continuidade na oferta e consumo acessível desses alimentos. Para que essas políticas fossem eficientes e tivessem continuidade, o Estado brasileiro evoluiu em termos institucionais criando um Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), apoiado em lei orgânica de 2006, prevendo as responsabilidades e parte do orçamento atribuídas a cada ente federativo no desenvolvimento de programas de combate à fome. Em 2010, por meio da aprovação de emenda constitucional, o Direito Humano à Alimentação passou a ser reconhecido legalmente pelo Estado, muito embora a Justiça e o Ministério Público ainda estejam despreparados para darem à população o suporte necessário. As conquistas trazidas pelo enfoque de SAN à política social brasileira nos últimos dez anos são inquestionáveis. Foram desenvolvidos diversos programas com interfaces com a produção agropecuária (principalmente voltados à agricultura familiar), combate à pobreza, acesso aos alimentos nas escolas, comunidades isoladas, periferia das cidades e educação alimentar. Com isso, o volume de recursos aplicados nos três níveis de

governo cresceu de forma exponencial. Em especial, em período mais recente buscou-se desenhar programas específicos e dar um atendimento especial para a parcela da população mais vulnerável entre os pobres. Contudo, esse esforço de focalização faz com que parte importante dos orçamentos públicos seja dirigida para a população de renda mais baixa (ou sem renda) colocando em segundo plano ações mais gerais de garantia de SAN para toda a população. Um exame dos orçamentos consolidados – de todos os ministérios e autarquias federais, em relação às ações consideradas de Segurança Alimentar e Nutricional mostra que as transferências de renda prevalecem com grande margem sobre qualquer outra política voltada para a população vulnerável. Uma política de SAN atualizada deveria atender às quatro dimensões colocadas anteriormente, mesmo porque alguns novos problemas, como por exemplo a obesidade, já estão presentes nas famílias de baixa renda. Um levantamento realizado pela equipe de pesquisa do IE-Unicamp com base nos dados da POF-IBGE de 2009 demonstra que 466 mil famílias pobres (entre as mais de 15 milhões de famílias) tinham pelo menos um membro com Índice de Massa Corpórea acima de 30 (obesidade). Por outro lado, o levantamento mostra ainda a presença de 193 mil famílias pobres com pelo menos um membro com insuficiência calórica e IMC abaixo de 18,5 (baixo peso), de um total de 2,7 milhões de famílias (pobres e não pobres) nessa condição. Em resumo, os dados de 2009 27


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já demonstravam que existiriam mais analisamos o orçamento do Ministério famílias pobres com problemas de obesi- de Desenvolvimento Social e Combate dade que com problemas de baixo peso. à Fome (MDS). Em 2012, o MDS teria disponíveis para gastar R$ 56,7 bilhões; Estatísticas compiladas pelo Conselho entretanto, R$32,7 bilhões já estaNacional de Segurança Alimentar e riam vinculados ao Fundo Nacional de Nutricional (Consea) e pelo Instituto Assistência Social e destinados excluside Estudos Socioeconômicos (Inesc) vamente para o pagamento do Benefício demonstram que o orçamento para de Prestação Continuada (BPC), nas suas programas de SAN saltou de R$11,1 diversas modalidades. Outros R$ 22,5 bilhões para R$28,5 bilhões entre 2004 e bilhões deste total teriam como destino o 2011 (em valores reais de agosto de 2011). pagamento do Bolsa Família. Esses dois Normalmente, os valores executados têm destinos totalizam 94,1% do orçamenficado entre 15 a 20% menores que os to ministerial restando poucos recurorçados, muito embora tenham acompa- sos para a execução de programas em nhado a mesma trajetória. Tomando-se âmbito nacional, de grande repercussão o Projeto de Lei Orçamentária Federal social – em outras palavras, programas de 2012, podemos identificar claramente que, além do acesso econômico proporque 55,2% dos recursos do orçamento de cionado pelo Bolsa Família, promovem SAN foram destinados para o Programa outras dimensões da SAN. Bolsa Família e outros programas de transferência de rendas; uma proporPoder-se-ia argumentar que o MDS ção de 9,9% foi voltada para a alimenta- especializou-se em políticas de transfeção escolar; 7,1% para a equalização das rência de renda e pagamento de benetaxas de juros dos empréstimos aos agri- fícios à população, cabendo portanto a cultores familiares; 6,2% para a forma- outros ministérios a função de desenção de estoques públicos de alimentos; volver programas integrais de segurança e 3,2% para as compras diretas da agri- alimentar. Observa-se, no entanto, que cultura familiar através do Programa de muito pouco desses outros programas Aquisição de Alimentos (PAA). Essas estão sediados em outros ministérios. cinco ações de governo totalizaram Mais uma vez, fazendo uso do orçamen81,5% do orçamento, restando pouco to consolidado de SAN preparado pelo mais de 19% para a realização de deze- Consea para 2013 é possível notar que nas de ações voltadas para captação de programas como o de Reforma Agrária e água, restaurantes populares, bancos Ordenamento Fundiário não receberam de alimentos, abastecimento alimentar, muito mais que R$ 1 bilhão, ou 1,4% do cozinhas comunitárias, etc. total; e todo o conjunto de programas de SAN para as áreas rurais e urbanas ficou Essa concentração de recursos em com apenas R$ 4,2 bilhões, ou 5,5% do torno dos Programas de Transferência orçamento de SAN. de Rendas se repete quando 28


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Para concluir, podemos afirmar que o Brasil avançou muito na institucionalização do tema da SAN entre as políticas públicas. O reconhecimento do Direito Humano à Alimentação muda a perspectiva da política social: o que era antes “combate à fome” e “combate à pobreza” se transforma em garantia de SAN, em todas as suas dimensões. Contudo, aspectos importantes da Política de Segurança Alimentar não estão sendo tratados devidamente pela política pública em função do seu viés focalizador. Dentro dessa concepção de política social, a SAN e o Direito Humano à Alimentação estariam sendo atendidos pelas transferências de renda, o que claramente é insuficiente e não atende os requisitos colocados pela legislação e pela expectativa dos atores sociais.

as doenças crônicas não transmissíveis. Finalmente, não podemos deixar de mencionar a área de abastecimento, que apesar de estar integrada ao Ministério da Agricultura não tem recursos e nem programas de apoio à comercialização e à organização da distribuição de alimentos nas grandes cidades. A recente alta do preço de alimentos nas grandes cidades e a sua pressão sobre a inflação reflete a baixa atenção que a política de SAN tem dado a essa área.

As políticas voltadas para o Rural, área de maior vulnerabilidade e onde a pobreza é mais profunda, necessitam ser intensificadas, sob pena de enraizarmos ainda mais a separação entre agricultores produtivos e “inviáveis”, como vêm sendo denominados os residentes rurais não integrados. Outra área importante, que diz respeito a toda a população é a da segurança dos alimentos, pois o consumidor sem informação e sem maior controle sobre a publicidade da indústria de alimentos tende a sedimentar hábitos alimentares não saudáveis, abrindo espaço para 29


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