COMPORTAMENTO
Natal do novo normal O ideal é cada família na sua casa, mas, se decidir por abrir a ceia para outros convidados, melhor se ligar nas atuais e já velhas regras de etiqueta.
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MARLI BARBOSA
ma das épocas mais aguardadas do ano já está chegando, só que desta vez acompanhada de uma dúvida incômoda para a maioria dos brasileiros: com tanta coisa já funcionando, será possível reunir a família para celebrar o Natal e o Ano-Novo e matar a saudade acumulada em quase um ano de isolamento social? Para os infectologistas, o mais prudente é insistir no isolamento, mas eles compreendem que até pessoas que têm se comportado de forma mais consciente já se sentem desgastadas e precisam desses encontros para manter a saúde mental. O médico infectologista Estevão Urbano, professor da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, alerta que, para diminuir os riscos de contaminação, as comemorações também terão que ser adaptadas ao novo normal. “Até existir uma vacina ou uma forma de enfrentar a covid-19, será preciso conviver com distanciamento, máscaras e reforço da higiene, inclusive nas reuniões familiares”, avisa. Revista Coop | 58 | Dezembro 2020
Seu primeiro conselho é reduzir a lista de convidados ao núcleo familiar mais próximo. Não há um número-limite. Segundo ele, a matemática é a do bom senso. Como ambientes fechados representam maior risco de contaminação, por concentrarem mais partículas virais no ar, o ideal é escolher espaços abertos ou com boa circulação para a reunião da ceia. “Quem apresentar qualquer sintoma suspeito de covid-19 ou quem tenha mantido contato com essa pessoa não deve comparecer ao encontro”, orienta. O médico diz que, apesar de não ser nada fácil, a norma de evitar a proximidade física é
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inegociável para as pessoas que não convivem normalmente dentro da casa, pois a boa etiqueta agora é evitar beijos, abraços e apertos de mão. "Podemos usar jeitos diferentes de saudação, talvez inclinando o corpo como os orientais ou enviando beijos e abraços com gestos”, exemplifica. Já na mesa, vale dar um maior espaçamento entre os assentos e também deixar o peru e outras iguarias, assim como bebidas, louças e talheres, em uma bancada que possibilite o distanciamento na hora de se servir, assim como nos restaurantes self-service. “Ninguém tem uma receita certa, mas tentar
errar menos já é um grande passo”, afirma. Nem pensar em abrir mão da máscara, que só pode ser retirada na hora de comer e beber, sem esquecer de levar outras unidades para trocar após duas horas de uso ou quando ficar úmida. Ele acrescenta que, neste ano, é recomendável que as festas sejam mais tranquilas e silenciosas, pois estudiosos já observaram que em reuniões com música alta as pessoas acabam falando mais alto para serem ouvidas e, às vezes, se entusiasmam e também cantam e dançam. O problema, ele explica, é que tanto a cantoria como a eleRevista Coop | 59 | Dezembro 2020
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vação da voz podem fazer uma pessoa infectada liberar mais aerossóis carregados docoronavírus. Já osmovimentos de dança comprometem o distanciamento. Então, não caia na pista. O médico salienta que é importante manter os cuidados, já que as reuniões festivas têm todos os fatores de que o vírus precisa para se disseminar: contato próximo e prolongado, euforia e descontração, que potencializados às vezes pela bebida, deixam os cuidados preventivos em segundo plano. “Uma única pessoa
assintomática infectada pode contagiar muitas outras. Entre elas, alguém pode até desenvolver a forma mais grave da doença e correr risco de morte”, previne. CUIDADO COM O VOVÔ Os idosos, mais vulneráveis à doença, não precisam ser privados desses encontros, mas merecem atenção especial e devem ser mantidos em segurança, com máscara e distanciamento de pelo menos um metro e meio de outras pessoas. “Não tocar agora é uma demonstração de afeto e cuidado. Por mais que avós e netos estejam com muita saudade do convívio próximo, não é o momento de afrouxar as restrições”, reforça. Claro que há exceções: aqueles que já convivem com os netos podem agir normalmente.
Ceia virtual Consultoria: Estevão Urbano: médico infectologista; professor da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, coordenador do setor de Infectologia do Hospital Madre Teresa, em Belo Horizonte. Mara Lins: doutora em Psicologia Clínica e diretora do Centro de Estudos da Família e do Indivíduo (Cefi), em São Paulo.
Mara Lins, doutora em Psicologia, ressalta que, devido ao tempo prolongado de isolamento, muitas pessoas já podem estar sentindo sinais de ansiedade e depressão, que podem se intensificar nesta época do ano, que valoriza o contato, o afeto e a família. Segundo ela, a tecnologia e a criatividade podem ser aliadas daqueles que não querem ou não podem participar das festividades. “É muito importante perceber que o afastamento social não é o mesmo que isolamento emocional”, destaca. Telefonemas e chamadas de vídeo são ótimos recursos para entrar em contato com amigos e familiares e demonstrar todo o afeto por eles. “Precisamos um do outro, e conversar e interagir com outras pessoas, principal-
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mente com aquelas que são importantes para nós, são componentes valiosos para a saúde mental e emocional”, aconselha. Para datas importantes como o Natal e o Ano-Novo, ela sugere entrar mesmo no espírito da festa: escolha uma roupa bonita e organize uma festinha de longe. Combine um horário com os convidados para se encontrarem e brindarem. Dá até para fazer a brincadeira do amigo-secreto, ou melhor, do amigo-virtual. O sorteio pode ser feito com antecedência e os presentes podem ser comprados online com endereço de entrega do seu amigo. Aí, na hora do encontro, os participantes revelam quem tirou quem. Claro que não será igual aos encontros tradicionais, mas é o melhor que tem hoje em dia.