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Prata da Casa: Grande Otelo
Almanaque
UBERLÂNDIA DE ONTEM & SEMPRE
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NÓS PROJETOS DE CONTEÚDO • ANO 4 • NÚMERO 8MARÇO DE 2015
PRATA DA CASA
GRANDE OTELO
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CARLOS GUIMARÃES COELHO Especial para o Almanaque
Toda biografia provoca
controvérsias e com Grande Otelo não seria diferente. Da origem do apelido à grafia correta de Otelo (com ou sem h), da relação de afeto com sua cidade natal ao verdadeiro ano de seu nascimento. Não importa. Grande Otelo foi um artista ímpar, de grandeza imensurável e o maior patrimônio cultural de Uberlândia. Controvérsias à parte, a cidade continua tendo uma dívida de gratidão e respeito à sua relevância artística. Para o jornalista e biógrafo Sérgio Cabral, Grande Otelo não guardava ressentimentos da cidade. Entre os manuscritos de seu acervo há textos poéticos com alusões carinhosas a Uberlândia. De acordo com Cabral, “Uberabinha” sempre esteve presente na memória afetiva de Grande Otelo. Em entrevistas, Otelo gostava de dizer que seu sucesso era apenas um golpe de sorte, mera consequência da necessidade
2015 MEMÓRIA CULTURAL
OTELO FAZ 100 ANOS?
Data de nascimento do grande ator de Uberlândia provoca controvérsias no ano de seu centenário
de sobreviver na selva urbana. Autodidata, seu nível de escolaridade foi comprometido com as fugas constantes da escola em São Paulo. Poliglota, Otelo dominava fluentemente quatro idiomas, segundo seu filho, Mário Luiz de Souza Prata, e falava um português bem acima da média. A verdade é que era homem de extrema inteligência e sensibilidade, visíveis não apenas nas tiradas de humor improvisadas em cada show, mas também
no fato de ser compositor e poeta de grande qualidade. Apesar da biografia de Cabral apontar 1917 como provável ano do nascimento de Otelo, estamos comemorando seu centenário em 2015 porque ele, ao longo da vida, sempre afirmou ter nascido em 1915. Há 10 anos, quando foram celebrados os 90 anos do artista, Uberlândia recebeu o espetáculo “Eta Moleque Bamba” no Teatro Rondon
“A cidade continua tendo uma dívida de gratidão e respeito à relevância artística do grande ator que foi Otelo”
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Pacheco, com plateias lotadas. No pacote nacional das celebrações havia ainda o lançamento da biografia de Otelo por Sérgio Cabral, um site e a organização de seus documentos e objetos pessoais em parceria com a Funarte e Prefeitura do Rio. O projeto iniciado em 2005 se consolida agora no centenário. Estão previstas várias ações com o apoio da Caixa Econômica Federal, como exposições e mostras de filmes no Rio e em São Paulo e a recuperação do acervo de Grande Otelo, com patrocínio da Petrobras e da Fundação Roberto Marinho no novo Museu da Imagem e do Som do Rio. Em Uberlândia, a Secretaria de Cultura tem também ações planejadas para 2015. No início do ano, foi lançado o calendário comemorativo ao centenário. Além de palestras, debates e espetáculos, está prevista a instalação de uma estátua de Otelo na praça Adolfo Fonseca, onde ficava o Grande Hotel, cenário de sua
Grande Otelo: Biografia de Otelo, por Sérgio Cabral. Obra definitiva sobre a vida do ator e compositor
Em Uberabinha: Grande Otelo menino, destacado na foto da família de José Resende Ribeiro, o Juquita, na década de 1920
infância nas ruas na cidade engraxando sapatos e revelando talento precoce para as artes.
1 A ORIGEM DO APELIDO
Otelo era um apelido que Sebastião carregava consigo desde que saiu de Uberabinha. Muitas vezes assinava desse modo. Em outras, era Sebastião Prata, sobrenome inventado por ele como homenagem à família proprietária da fazenda em que seu pai trabalhava, que ficava onde hoje se localiza o bairro Dona Zulmira. Pela estatura baixa, era chamado de Pequeno Otelo. Inspirado em um filme de sucesso na época, “The Great Gabo”, o diretor de cinema Jardel Jércolis o chamava de Great Otelo, que acabou “abrasileirado” para Grande Otelo, o pseudônimo que iria consagrá-lo.
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“O homem em prantos dos intervalos era o oposto do ator em cena, sem marcas de tragédia no rosto”
TRAGÉDIA EM
2 DOSE DUPLA
No final da década de 1940, no auge da carreira, Grande Otelo conheceu Lúcia Maria, mãe de Elmar, de 3 anos, que Otelo apelidou de Chuvisco. Os três passaram a morar juntos na Urca e, poucos meses depois, Otelo e Lúcia se casaram. Mas, a alegria duraria pouco. Contrariada com a vida boêmia de Otelo e se sentindo enclausurada no casamento, Lúcia pôs fim à vida do filho e se matou em seguida. Sérgio Cabral relata que Lúcia Maria, três anos antes, apresentara o garoto a Grande Otelo como sendo filho dele. Logo após o enterro, Otelo filmaria uma de suas cenas cômicas mais famosas, em “Carnaval de Fogo”, de Watson Macedo, 1950, na qual interpreta Julieta com Oscarito (no papel de Romeu). Macedo recorda que “o homem que caía em prantos nos intervalos da filmagem, era o oposto do ator que entrava em cena sem a menor marca da tragédia no rosto”. Sérgio Cabral afirma que Grande Otelo conseguiu assistir às cenas filmadas apenas 25 anos depois.
Otelo e Oscarito: “Carnaval de Fogo”No alto: Otelo e Ankito Abaixo: Otelo é Macunaíma, de Joaquim Pedro (1969)
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Gibi: Dupla do barulho invade a cultura de massa brasileira
Acima: Grande Otelo com Ruth de Souza e Oscarito em noite de gala
Teatro: Sancho Pança Negro
GRANDE OTELO
3 EM FAMÍLIA
Acima: Com Olga, Pratinha, Mário Luiz, Carlos Sebastião e Osvaldo Aranha
Grande Otelo casou-se, em 1954, com Olga Vasconcelos de Souza, com quem teve quatro filhos: Carlos Sebastião Vasconcelos Prata, Mário Luiz de Souza Prata, José Antônio de Souza Prata, o Pratinha (único que seguiria a carreira de ator), e, por fim, Osvaldo Aranha de Souza Prata. Em 1962, uma antiga namorada, Nilza Alves, com quem viveu algum tempo após a morte Lúcia Maria, apareceu com uma menina de 10 anos, que dizia ser sua filha. Grande Otelo assumiu a paternidade de Jaciara.
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MILITÂNCIA
4 ARTÍSTICA
Grande Otelo tornou-se um dos expoentes da cultura negra brasileira, sem jamais levantar as bandeiras dos principais movimentos. Para Sérgio Cabral, Otelo levou muitos anos para entender que também era vítima do racismo. Quando amigos envolvidos nas lutas dos movimentos negros cobravam-lhe posições mais firmes contra o preconceito racial, ele simplesmente argumentava que seu primeiro alimento fora o leite de uma mulher branca, Augusta Maria de Freitas, matriarca da casa onde a mãe de Otelo, Maria Abadia, foi cozinheira. Em Uberlândia, na escola primária Bueno Brandão, Grande Otelo se sentia acanhado por ser o único aluno negro em sua sala de aula. Na imprensa da época há indícios claros de que havia casos de racismo explícito na cidade. Sérgio Cabral relata que Otelo, nas primeiras turnês, tinha de fazer suas refeições no quarto, pois os hotéis não permitiam negros no restaurante. Curioso é que ele não tenha se sentido discriminado. No final da década de 1930, Otelo viria a integrar a Companhia Negra de Operetas, no espetáculo “Algemas Quebradas”, que quebraria barreiras ao se apresentar no palco do teatro do Copacabana Palace, onde até então não era permitida a presença de atores negros. No auge da carreira, na década de 1950, Grande Otelo chegou a fazer uma investida na política, lançando sua candidatura a vereador em 1958, com o slogan de campanha: “Não vote em branco, vote em Grande Otelo”. Não foi eleito: provavelmente, porque ninguém conhecia Sebastião Bernardes de Souza Prata, o nome que constava na relação de candidatos do Tribunal Eleitoral.
Com Louis Armstrong e JK, ao fundo, Braguinha e Pixinguinha Abaixo: Grande Otelo com Virgílio Galassi no Uberlândia Clube