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JORGE QUEIROZ Sociólogo
N
ão há uma História de Portugal, mas várias escritas em épocas distintas, por diferentes autores, descrições semelhantes, divergências ideológicas e interpretativas. Distinções existem de âmbito disciplinar e temático, histórias da filosofia, do direito, da economia, das religiões comparadas, da ciência, das artes, ... A história da cultura portuguesa desenvolveu-se como área de estudo e investigação a partir do século XIX, foi no século XX que se construíram os alicerces de investigação e obras importantes foram editadas sobre as influências, movimentos e personalidades. Em que época se poderá afirmar a existência de uma cultura portuguesa com característicasdiferenciadoras das demais? Porque no século XII, na “finis terrae” continental, surgiu um reino politicamente independente, com um idioma próprio ainda em evolução? Quais as razões porque os reinos ibéricos não constituíram nacionalidades politicamente independentes e se consolidaram na Península dois Estados soberanos?
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Sobre a antiguidade e autonomia de Portugal vários autores apresentaram razões geográficas, demográficas e culturais. António José Saraiva escreveu que entre portugueses e castelhanos existe uma região intermédia semidesértica, “espécie de vácuo”, os portugueses do lado de cá do planalto central, castelhanos espalhados por cidades no centro da meseta ibérica. Em “Portugal, o Atlântico e o Mediterrâneo”.
Orlando Ribeiro no âmbito da geografia humana, desenvolveu a fundamentação das caracterís- ticas do território, civilizações do granito a norte e do barro a sul.
A história medieval escrita por clérigos foi acompanhada de narrativas da tradição oral que incorporaram temas da cultura clássica. Impôs-se uma história providencialista, causas sobrenaturais explicariam as origens de Portugal, tal como a presença de um grupo étnico pré-romano, os lusitanos, sobre os quais não existe consenso científico.
A ocupação dos territórios pelas ordens militares levou à estruturação e definição de fronteiras e a centralização régia à organização do Estado, necessidade de serviços para arquivo de documentos da governação, títulos de nobreza e de propriedade, de outros actos administrativos.
No século XIV foi instalada a “Torre do Tombo” no Castelo de São Jorge. Hoje, o Arquivo Nacional possui modernas instalações onde se guarda de D. Dinis, o primeiro rei alfabetizado e reconhecido poeta, 137 cantigas do período medieval. Os cronistas realizaram relatos escritos dos primeiros reinados dos séculos XII e XIII, de acontecimentos políticos e sociais. As crónicas ajudaram ao desenvolvimento da cultura e língua portuguesas, a literatura atingiu a maturidade já nos séculos XV e XVI.
D. Duarte em 1419 decidiu criar o cargo de “escrivão dos livros”, nomeando Fernão Lopes para “pôr em crónica dos reis que em Portugal antigamente foram”. Lopes é considerado o primeiro cronista, demonstrou apurado sentido da História e escrita elaborada. A dinastia de Avis (1385-1580) promoveu as ciências e as artes, apostou na inteligência nacional, do estrangeiro vieram professores, arquitectos, cientistas, pintores, músicos. No século XVI Rui de Pina escreveu as crónicas de D.
Duarte, D. Afonso V e D. João II, Garcia de Resende a crónica do Príncipe Perfeito, Damião de Góis e o bispo do Algarve Jerónimo Osório publicaram crónicas de D. Manuel I “O Venturoso”. Cronistas das viagens para outros continentes foram João de Barros, Castanheda, Diogo do Couto, … Com a expansão marítima intercontinental, afirmou-se uma pujante cultura renascentista portuguesa, emergiram obras literárias, artísticas e cientificas, de Gil Vicente, Luís de Camões, Pedro Nunes, Damião de Gois, João de Barros, Francisco de Holanda, Grão Vasco, Arruda, …
A formação e desenvolvimento da cultura portuguesa foi e é um processo contínuo com influências anteriores à nacionalidade, que continua hoje a evoluir com a expansão da língua, das literaturas e de outras formas de expressão.
*O autor escreve de acordo com a antiga ortografia