Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017 www.registrandoodireito.org.br
Entrevista da Edição: José Renato Nalini A desconstrução do modelo ocidental clássico de casamento e seus efeitos no Registro Civil das Pessoas Naturais
por: Desembargador Ricardo Dip
O Registro Civil das Pessoas Naturais após a Lei 13.484/17 por: Marcelo Salaroli de Oliveira e Mario de Carvalho Camargo Neto
Decisões Jurisdicionais Decisões Administrativas
Editorial
Registrando o Direito: o berço da jurisprudência do Registro Civil do Brasil A Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (Arpen/SP) acaba de conseguir realizar um de seus mais aguardados projetos. Com o grande auxílio, extrema dedicação e com refinada capacidade intelectual, nasce, pelas mãos do juiz de Direito Alberto Gentil de Almeida Pedroso, a Revista Digital Registrando o Direito. Embora com uma atuante Comissão de Enunciados, brilhantemente coordenada pelo registrador Marcelo Salaroli de Oliveira, sempre atenta às mudanças contínuas que envolvem o Direito de Família, com amplas e sucessivas consequências para o Registro Civil, faltava-nos um repositório contínuo, comentado e organizado das principais decisões e jurisprudências que se relacionam ao Registro Civil das Pessoas Naturais. Creio que a gestão que se encerra neste semestre na Arpen/SP cumpre assim uma de suas mais esperadas missões: proporcionar que todo o registrador civil receba e consulte, online, um repositório organizado da matéria do Registro Civil brasileiro. De agora em diante, a Revista cumpre o
papel de berço da jurisprudência registral brasileira. A publicação desenvolvida pela Arpen/SP e coordenada pelo magistrado Alberto Gentil foi pensada em quatros seções que se repetirão bimestralmente. Teremos a seção de entrevista, que nesta abertura conta com uma aula do atual secretário da Educação de São Paulo, doutor José Renato Nalini, outra seção destinada a artigos jurídicos – para a qual aceitaremos contribuições de registradores civis de todo o Brasil – e as duas últimas envolvendo as decisões jurisdicionais e as administrativas. Assim, caros colegas, a Arpen/SP pretende oferecer a todos uma leitura agradável, porém profunda, capaz de auxiliar a todos nós na prática diária dos serviços registrais, aprimorando nossos serviços e levando cada vez mais qualidade e conhecimento ao cidadão, fonte primordial de nosso constante aprimoramento. Boa leitura. Luis Carlos Vendramin Júnior Presidente Arpen/SP
“Creio que a gestão que se encerra neste semestre na Arpen/SP cumpre assim uma de suas mais esperadas missões: proporcionar que todo o registrador civil receba e consulte, online, um repositório organizado da matéria do Registro Civil brasileiro”
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Expediente A Revista Acadêmica Registrando o Direito é uma publicação bimestral da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo, coordenada pelo Dr. Alberto Gentil de Almeida Pedroso. Praça Dr. João Mendes, 52 conj. 1102 – Centro CEP: 01501-000 São Paulo – SP URL: www.arpensp.org.br Fone: (11) 3293 1535 Fax: (11) 3293 1539 Presidente Luis Carlos Vendramin Junior 1º vice-presidente Leonardo Munari de Lima 2º vice-presidente Ademar Custódio 3º vice-presidente Monete Hipólito Serra Coordenação Científica: Alberto Gentil de Almeida Pedroso Juiz de Direito (TJSP) Jornalista Responsável Alexandre Lacerda Nascimento Diagramação e Projeto Infographya Comunicação
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Sumário
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Entrevista da Edição:
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A desconstrução do modelo ocidental clássico de casamento e seus efeitos no Registro Civil das Pessoas Naturais
José Renato Nalini
por: Desembargador Ricardo Dip
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O Registro Civil das Pessoas Naturais após a Lei 13.484/17 por: Marcelo Salaroli de Oliveira e Mario de Carvalho Camargo Neto
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Decisões Jurisdicionais
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Decisões Administrativas
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entrevista
“Notários e registradores são os primeiros conselheiros da população brasileira” Atual secretário da Educação de SP, ex-presidente e corregedor geral do TJ-SP, José Renato Nalini fala sobre como os Poderes da República poderiam se valer mais da atividade extrajudicial para servir o cidadão e desburocratizar o País Atual secretário da Educação do Estado de São Paulo, José Renato Nalini deixou o Poder Judiciário há dois anos, quando se aposentou de desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), onde atuou como presidente da Corte (2014 a 2015) e Corregedor Geral da Justiça (2012-2013), para assumir a Secretaria da Educação, a convite do governador Geraldo Alckmin. Desde 2016, o magistrado vem se dedicando às questões do Poder Executivo, o qual define como indiscutivelmente mais difícil de atuar, pelo enfrentamento de situações críticas e pela insuficiência de recursos. Em entrevista exclusiva para a 1ª Edição da Revista Jurídica Registrando o Direito, o secretário fala sobre o desafio de atuar na administração da Secretaria da Educação, e, com 4
a experiência vivida em dois dos Poderes da República – Judiciário e Executivo – destaca como a atividade extrajudicial poderia colaborar ainda mais com a prestação de serviços à população e desburocratização do Estado brasileiro. Revista Registrando o Direito - Cartórios e Secretaria da Educação estão em vias de lançar o projeto “Adote uma Escola”. Qual a importância desta iniciativa? José Renato Nalini - É da máxima importância. A Constituição da República é muito clara ao tratar da educação. Ela erigiu a educação a um “direito de todos”, mas em “dever do Estado e da família, em colaboração com a sociedade” - artigo 205. O Estado de São Paulo investe 30% de seu orçamento em educação. Mesmo assim, não consegue aten-
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der a todas as demandas, pois elas são crescentes e se sofisticam. Por isso é que família e sociedade precisam ajudar a cuidar da educação. Com a participação desses autores, igualmente responsáveis pelo projeto de educar as novas gerações, tudo será mais eficiente, eficaz e efetivo. E as delegações extrajudiciais são instituições de primorosa gestão, não têm o erário por si, então têm de se autoadministrar com seriedade, prudência e racionalidade. Podem prestar imenso auxílio à causa educacional se assumirem afetivamente as escolas públicas. Revista Registrando o Direito - O senhor vivenciou durante anos a atividade na magistratura e agora encontra-se no Executivo. O que o levou a aceitar este desafio? José Renato Nalini - Foi a insistência do governador do Estado de São Paulo, que me solicitou esse sacrifício pessoal. Eu poderia permanecer mais cinco anos no Tribunal de Justiça de São Paulo, instituição que eu respeito e amo. Ali deixei meu coração. Mas sabia que, se me recusasse, minha consciência rígida me acusaria de negar minha modesta contribuição a uma causa de extrema relevância para a nação. Sem dúvida, a maior e a mais importante das causas. Sem educação de qualidade, nunca chegaremos ao Brasil de nossos sonhos. Revista Registrando o Direito - Onde é mais difícil atwuar, no Poder Executivo ou no Poder Judiciário? José Renato Nalini - Indiscutivelmente, no Executivo. O Poder Judiciário é um paraíso. A atuação em segunda instância tende a tornar o magistrado alguém distanciado da realidade. Só estuda teses, só lê argumentos, só escreve e decide, sem o enfrentamen-
to de uma situação crítica, a de insuficiência de recursos, de obstáculos de toda a ordem, começando pela estreiteza do pensamento jurídico. É surrealista a posição do Direito quando se trata da administração. Presume-se a má-fé, a resposta é sempre negativa. Não há criatividade, nem flexibilização da rigidez formal e procedimental. Em tempos de crise, é uma epopeia realizar qualquer missão. E o momento também não ajuda quem se propõe a gerir a coisa pública. Há uma espécie de desalento geral que contamina grande parte da população. Todo juiz deveria experimentar seu dia de administrador, para adquirir maior consequencialismo. Revista Registrando o Direito Como avalia o atual cenário jurídico do País? José Renato Nalini - Tenho a convicção de que o excesso de faculdades de Direito, a proliferação das carreiras jurídicas, o ensino ultrapassado que prioriza a solução processual, dificultaram bastante o desenvolvimento brasileiro. A vida brasileira foi judicializada. As pessoas já não se esforçam para obter uma composição consensual dos conflitos e preferem adentrar em juízo, enfrentando as vicissitudes de um sistema bastante sofisticado de Justiça, com quatro instâncias e mais de cinquenta oportunidades de reapreciação do mesmo tema, pois é caótica a estrutura recursal. O Direito precisa de uma urgente revisita. Sob essa vertente, as delegações extrajudiciais estão muito à frente da Justiça em sentido estrito. Detectaram as mutações da sociedade, anteciparam-se à 4ª Revolução Industrial e cumpriram, com exatidão, o princípio da eficiência, inserto no artigo 37 da Constituição da República. Deveriam merecer carga
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entrevista maior de atribuições, pois realizam missões com celeridade, exatidão e economia superior às reservadas ao Estado, quando as exerce diretamente.
ção jurídica. Sua missão é essa. Quem procura um tabelião para uma escritura, um testamento, para lavrar uma procuração, conta as suas necessidades, relata suas dúvidas e obtém a resposta adequada. O registrador resolRevista Registrando o Direito - Durante seus anos ve todas as questões dominiais e de outros direitos reais à frente da Corregedoria e depois da Presidência confiados ao seu zelo para a aquisição da ambicionada do TJ/SP, o senhor sempre criticou o excesso de de- segurança jurídica. Lamentável que o meu Provimento mandas no Judiciário. Como vê a importância de na Corregedoria, que apenas reconhecia aquilo que a Lei que se busquem métodos alternativos de jurisdição? já atribui aos delegados de serviços extrajudiciais, tenha José Renato Nalini - Sempre defendi essa busca, não com sido questionado no CNJ. Ao contrário do que a própria o intuito de aliviar a carga de trabalho do Judiciário, mas Justiça prega: conciliar, negociar, mediar, obter consenpor pensar que uma democracia participativa não pode so, é o que realmente pacifica a sociedade. A sentença prescindir de uma cidadania proativa, assertiva, conscien- pode ser até um fator de recrudescimento na estranhete. O indivíduo que não consegue dialogar com o adverso za gerada pela controvérsia. Há conflitos intermináveis, em busca de uma solução negociada, mas que só acabam quando os contendores precisa do equipamento judicial para rese entendem. Isso nem sempre - ou mesolver questiúnculas, na verdade não é lhor, quase nunca - ocorre no âmbito do “As delegações aquele cidadão de que a República está Judiciário. extrajudiciais são a necessitar. Embora chamemos, eufeinstituições de misticamente, a parte de “sujeito procesRevista Registrando o Direito - Tamprimorosa gestão, sual”, ela é, na verdade, “objeto da vonbém em sua gestão à frente da Corregenão têm o erário tade do Estado-juiz”. A decisão judicial por si, então têm de se doria foi editado o primeiro provimento incide sobre ele sem que tenha exercido a autoadministrar com de mediação extrajudicial no País, que potencialidade de livre discussão do con- seriedade, prudência acabou suspenso pelo CNJ. Passado flito. Há regras no processo e elas inibem tanto tempo, como vê o fato dessa quese racionalidade. o exaurimento de um debate que se torna tão ainda não ter tido uma solução? Podem prestar José Renato Nalini - É mais um dos paramais profícuo, livre e completo, no âmbito imenso auxílio à de uma negociação, de uma conciliação, causa educacional se doxos brasileiros. Situação surreal, kafkiana, irracional. Com o Brasil precisanmediação ou qualquer outra das múltiassumirem plas possibilidades há muito exploradas do tanto de soluções harmônicas, com o afetivamente as no direito anglo-saxão. O defeito maior recrudescer da crítica ante a lentidão dos escolas públicas” da judicialização excessiva é converter processos, da insuficiência do aparato jua massa de jurisdicionados em pessoas dicial para resolver questões, impede-se tuteladas, sempre consideradas hiposquem tem a missão de pacificar, quem suficientes, pois não sabem cuidar de seus próprios in- possui expertise, quem é por lei obrigado a conferir a resteresses sem a intermediação de profissional provido de posta jurídica mais adequada ao problema que se lhe aprecapacidade postulatória. Não treinam para ser cidadãos, sente, de cumprir com exatidão o seu estatuto funcional. pois se não aprendem a defender aquilo que lhes pertine diretamente, como o farão em relação ao bem comum, ao Revista Registrando o Direito - Em sua atuainteresse de todos? ção como Corregedor Geral da Justiça, o senhor visitou cartórios em todo o Estado de São PauRevista Registrando o Direito - Dentro deste contex- lo. Qual foi a realidade que vivenciou nestas visitas? to, qual a importância da participação de notários e José Renato Nalini - Fiquei impressionado com a dedicaregistradores neste processo de diminuição da car- ção, o devotamento, o zelo e a competência técnica de toga do Judiciário? dos os responsáveis. Vi a seriedade com que a delegação José Renato Nalini - Os notários e registradores são os é conduzida. Cotejei com o funcionamento do serviço púprimeiros conselheiros para os necessitados de orienta- blico, onde o acúmulo de vantagens funcionais, os direi6
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tos e o regime que vai sendo enxertado de benefícios per- ensino jurídico permanece o mesmo: disciplinas compartimitem uma vida bem mais tranquila do que a propiciada mentadas, ênfase no processo, desconhecimento total de que aos cartorários. Estes não têm por si o erário, não têm ho- a inteligência artificial poderá substituir toda a “decoreba” lerite. Se não trabalharem, não receberão salário. Causou- que se insiste em preservar. Já existem startups que resol-me admiração as jovens gestantes que, à frente do seu car- vem problemas jurídicos em segundos, com 98% de exatitório, não usufruem da licença maternidade, pois têm de dão e que podem substituir inúmeras profissões jurídicas. atender à clientela e, se a pequena serventia de Registro Ainda recentemente vi a iniciativa de um jovem francês que Civil não estiver aberta, não terão como satisfazer as suas criou a “Wonderlegal” e que já tem clientes em nove paídespesas mínimas. Admiro muito a classe, que aprendi a ses. Responde-se a qualquer indagação, redige-se contrato respeitar quando no exercício da 1ª Vara de Registros Pú- e outras peças jurídicas, sem a intermediação humana. Só blicos e também na 2ª, depois na assessoria do correge- inteligência artificial! Se os educadores não se conscientidor geral da Justiça, o inesquecível e saudoso desembarga- zarem, continuarão a vender ilusão aos futuros bacharéis dor Sylvio do Amaral, como integrante da que, após cinco anos de faculdade, não comissão de concurso junto ao eminenterão condições de encontrar mercado de “A desenvoltura que te e também saudoso desembargador Antrabalho compatível com o tempo e os reo Estado não tem, a tonio Carlos Alves Braga e, finalmente, cursos investidos. Continuarão a fazer o delegação extrajudicial, como presidente do 6º Concurso de Ouque já faziam antes da faculdade, mas além de possuir, torga de Delegações e como corregedor frustrados, decepcionados e ressentidos. ainda sabe dela se geral da Justiça. Posso falar com certo É urgente mostrar que o Direito precisa valer para tornarconhecimento de causa sobre a excelênreduzir o fosso em que se encontra, diante se insubstituível na cia do serviço extrajudicial, cujo status República Federativa da era digital que oferece desafios como a constitucional considero a mais intelirobótica, a nanotecnologia, o mundo das do Brasil” gente estratégia do constituinte de 1988. redes, o big data, a programação, a automação, a biotecnologia, a engenharia geRevista Registrando o Direito - O senhor sempre defen- nética e tantos outros temas que vão sugerir profissões para deu a prestação de serviços eletrônicos pela atividade ex- as quais sequer nomes ainda temos. trajudicial. No entanto, as normas não permitem ou não acompanham a evolução da sociedade. Como conciliar Revista Registrando o Direito - Outra defesa que o seesta dicotomia? nhor sempre fazia era a de que notários e registradores José Renato Nalini - Torno a dizer que a ciência jurídica eram em muitos municípios o único elo do cidadão com o precisa ser repensada. Estamos imersos em plena 4ª Revo- Estado. Acaba de ser sancionada a Lei 13.484/2017, que lução Industrial, num turbilhão em que sequer temos con- permite aos cartórios de Registro Civil prestar, mediandição de avaliar o grau e intensidade das mutações, e o te convênio, alguns serviços à população, como a emissão Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017
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entrevista de carteiras de identidade ou de trabalho. Como vê esta inovação? José Renato Nalini - Pode parecer cabotinismo, porém já sugeri isso muitas vezes. O Registro Civil das Pessoas Naturais é o detentor de informações que nele deveriam ser centralizadas como repartição estatal que funciona em caráter privado e que, por isso mesmo, não tem os ranços e os vícios do serviço público. É muito bom que, embora tarde, o Estado perceba que precisa se servir mais desses delegados responsáveis, concursados, preparados, competentes e devotados que são os detentores de tais atribuições estatais.
nética, a eletrônica, todas as tecnologias da informação e comunicação, já pioneiramente desenvolvidas pelas serventias, têm condições de alavancar os serviços e de torná-los a cada dia melhores, mais seguros, confiáveis e eficientes. Revista Registrando o Direito - Como avalia a atuação dos serviços de notas e registros na concessão de segurança jurídica às relações econômicas? José Renato Nalini - É a melhor alternativa, pois não encontramos disfuncionalidades nos cartórios, a despeito do elevado número de atos praticados. É o que distingue a serventia de um serviço exercido por particular que não passa por concurso público, nem é fiscalizado, controlado e orientado pelo Poder Judiciário, como ocorre com as delegações.
Revista Registrando o Direito - Quais outras parcerias poderiam ser desenvolvidas entre as atividades judiciais e extrajudiciais brasileiras? José Renato Nalini - Penso que “Penso que todo o todo o relacionamento da cidaRevista Registrando o Direito relacionamento da dania com o Estado e com ou- Qual a importância da ativicidadania com o tras entidades, e mesmo as reladade de notas e registro para a Estado e com outras sociedade? ções entre as pessoas, deveriam entidades, e mesmo prescindir de qualquer outra re- O sistema brasileiro se notaas relações entre as partição ou burocracia, mas conbiliza pela segurança jurídica, pessoas, deveriam pelo contínuo aprimoramento e centrar-se nos Registros Civis prescindir de das Pessoas Naturais. Toda delepela eficiência. Repito: é a mais qualquer outra inteligente dentre as estratégias gação deveria ser uma instância repartição ou adotadas pelo Constituinte de de pacificação e de obtenção de burocracia, mas 1988. Passa à responsabilidaacordos, ajustes, consensos. Os concentrar-se nos Registros de Imóveis poderiam de do particular uma obrigação Registros Civis das se encarregar de receber o IPTU, eminentemente estatal e, além Pessoas Naturais” por exemplo. Tudo o que signide não contribuir com um centafica retrabalho, superfetação, sovo para o andamento dos servibrecarga de atribuições, poderia ços, ainda leva percentual conser bem exercido se entregue aos delegados de ser- siderável daquilo que o delegado percebe para viços extrajudiciais. Para ganho da população e da praticar o ato em nome do Estado. Detentor da eficiência, tão desprestigiada no Brasil. segurança jurídica, da confiabilidade provinda da delegação estatal após concurso público de Revista Registrando o Direito - No último re- provas e títulos, realizado pelo Poder Judiciário, latório Doing Business, o Brasil ficou em 128º o cartório é uma instituição que orgulha o Brasil na avaliação referente ao registro de proprie- e que tem sido cogitada para implementação em dades, ficando atrás, inclusive, de países com outros Países, tamanho o êxito e acerto alcançamaior custo e maior tempo para efetuar o re- dos durante sua trajetória, sempre ascendente e gistro. O senhor acredita que os cartórios têm sempre surpreendente. A desenvoltura que o Eselementos necessários para melhorar a posição tado não tem, a delegação extrajudicial, além de do País neste quesito? possuir, ainda sabe dela se valer para tornar-se José Renato Nalini - Sim. E a informática, a ciber- insubstituível na República Federativa do Brasil. 8
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A desconstrução do modelo ocidental clássico de casamento e seus efeitos no Registro Civil das Pessoas Naturais. por: Des. Ricardo Dip.
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artigo
A desconstrução do modelo ocidental clássico de casamento e seus efeitos no Registro Civil das Pessoas Naturais por: Des. Ricardo Dip I-Diz Aristóteles, na Ética a Eudemo, que o homem é um “animal familiar”1, e, na mesma direção, S.Tomás de Aquino afirma ser o homem um “animal conjugal”. Vai além o Doutor Comum, ao assentar que o homem é até mesmo um animal mais naturalmente conjugal do que político2 pelo fato de a comunidade matrimonial ser anterior à comunidade civil. Ora, ordenando-se a comunidade conjugal −de modo prioritário− à geração e à educação da prole, essa comunidade, por mais se constitua a partir de um acordo de vontades, é um ente que interessa fundamentalmente à sociedade política e à espécie humana. E exatamente por esta maior transcendência política e específica (é dizer, de relevância para a propagação da espécie) é que o matrimônio se alista entre as instituições reconhecidamente naturais3. 10
A ideia de “natureza” empregou-se, primeiro, para significar a geração dos entes vivos: é a natureza ut generatio nascentium, e, depois de estender-se autonomamente à matéria e à forma dos entes, o conceito “natureza” passou a significar também a “substância” −determinação da matéria pela forma−; daí que “natural” também se compreenda o conveniente a uma coisa em razão de sua própria substância4.5 Todavia, cabe distinguir neste ponto: algo pode ser “natural” porque convenha à natureza genérica de um ente (natura ut genus), à sua natureza específica (natura ut species) ou à sua natureza individual (natura ut individuum). Pois bem, sendo a conservação de sua vida algo conveniente ao homem, pode entender-se isto quer num plano individual, quer num âmbito genérico (corporal), quer no do-
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mínio específico (da razão)−natura ut species− e, em todas estas dimensões, o homem necessita naturalmente da mulher, quanto a mulher necessita naturalmente do homem, para que se amparem mutuamente na vida, suavizem a lei do fomes (concupiscentia carnis) e gerem filhos6, cumprindo neste último passo sua natureza segundo a espécie. Deste modo, conclui-se que o matrimônio é uma instituição natural ut individuum, ut genus, mas, sobretudo, ut species, capítulo que muito interessa à comunidade política e ao destino da espécie humana. Há nos homens um “natural” próprio da razão, e outro, originário do corpo. Ali, quanto à natureza racional, já Boécio integrara o conceito de “natureza” à definição de “pessoa”: substância individual de natureza racional −rationalis naturæ individua substantia. Mas a “natureza do homem” não se reduz ao racional (natura rationalis), sendo-lhe também natural o sensitivo ou comum ao gênero (natura sensibilis vel animalis), de maneira que poderia falar-se em uma natureza que ensina a todos os animais, incluído o homem (quod natura omnia animalia docuit7. E, neste quadro, a união dos sexos é de direito natural, mas, se isto pode acomodar-se ao ius naturale definido por Ulpiano, cabe distinguir: essa união dos sexos não pode, quanto ao homem, fazer-se senão do modo conveniente à espécie8: nos homens, o que é próprio da natureza humana corporal9 deve submeter-se à ordenação e à direção racionais, porque a formalidade específica (que, no caso dos homens, é a razão), detém primazia por natureza: “(…) o ser animal racional é a forma que classifica o homem em sua espécie própria. De conseguinte, o que é contrário à ordem da razão é diretamente oposto à natureza do homem, enquanto tal; e, ao revés, é conforme à natureza o que siga a ordem da razão (…)”10. Coube ao direito romano a glória de ter recolhido a realidade matrimonial secundum naturam e feito fortuna histórica de sua definição. Modestino, jurisconsulto pagão do século III, conceituara o matrimonium: “união do varão e da mulher, consórcio de toda a vida e comunicação do direito divino e do humano” −nuptiæ sunt coniunctio maris et feminæ et consortium omnis vitæ, divini et humani iuris communicatio11. E de Justiniano (segundo alguns) procede o conceito de ser o matrimônio “união do varão e da mulher que compreende o comércio indivisível da vida” − nuptiæ sive matrimonium est viri et mulieris coniunctio, individuam vitæ consuetudinem continens12. II-A notória e atualíssima crise do tipo clássico do ma-
trimônio ocidental é uma aversão contra naturam. Foi o que anunciara Friedrich Engels (o parceiro de Karl Marx), em A origem da família, da propriedade privada e do Estado, ao dirigir-se contra a família tradicional. Ainda agora, a eclosão dos “novos modelos familiares” vem propulsionada pela perseverante ideologia revolucionária de maio de 1968 (mormente sob a matriz de Michel Foucault), propagadora da ideia de liberdade negativa, de que é muito emblemático o mote desfiado pelo ocultista britânico Aleister Crowley: “do what thou wilt” −faz o que quiseres!13. Ou seja: a vontade humana não se limita por meio de coisa alguma, não se limita pela razão, não se limita, enfim, pela natureza das coisas14. Nada proviria dessa natureza −nulla viene dalla natura, tutto si fonda sull’autodeterminazione dell’uomo (Roberto de Mattei)−, de sorte que o único pecado consistiria no impedimento de o homem seguir seus instintos e tendências. Com esta liberdade negativa, com a vontade absolutamente livre para escolher segundo não importa quais inclinações do homem, o bem e o mal, efetivamente, tornam-se irrelevantes15. No campo do direito matrimonial, o que se tem proclamado, nesta linha ideológica e em resumo, é um relativismo familiar assimétrico. Ou seja, de uma parte, pleiteia-se o respeito aos mais variados tipos de família (sequer já limitada a relações interhumanas16), mas, de outra parte, após o discurso de que todos os modelos familiares valem o mesmo, segue a paradoxal asserção acusatória de que nem todas as famílias valham a mesma coisa, pois a família tradicional, diz-se, é “patriarcal, machista, repressiva, etc.” (Contreras e Poole17), dando aparente razão ao que assevera um autor judeu, Joseph Weiler, professor de Direito Internacional e Europeu na New York University Law School, no sentido de que o desconstrucionismo contemporâneo configura uma das manifestações sintomáticas da christian foby18. É, de fato, instigante sindicar os vários elementos desta desconstrução do modelo do matrimônio europeu clássico, mas isto não cabe nos limites deste pequeno artigo. Basta aqui considerar −o que muito importa− que este desconstrucionismo é ideológico, equivale a dizer, corresponde a uma cosmovisão erigida por meio de “puras construcciones mentales” (Vallet). É o que está a ver-se atualmente com mais nitidez do que faz algumas décadas: p.ex., The American Sex Revolution, de Pitirim Sorokin, publicado em 195619, soaria hoje quase como um conto infantil, tamanha a aceleração desconstrucionista oriunda de diferentes ideologias (v.g., de gênero, de defesa da pedofilia, de legitimação da bestialidade, da admissão da relação sexual com coisas, etc.).
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artigo O que vivemos, em síntese, é uma revolução egótica − um hiperindividualismo ímpar na história da humanidade−, que sustenta (ainda uma vez com relativismo assimétrico20) a legitimidade de todas as pulsões individuais (sobretudo, as sexuais). Assim, os “novos modelos familiares” são correlatos da tentativa de alguma sorte de “organização jurídica” de energias sexuais cuja liberdade negativa se almeja reconhecer. Diversamente do que se passa com os instintos dos animais brutos, as pulsões individuais, nos homens, entretanto, podem retificar-se moralmente –é dizer, guiar-se segundo a racionalidade. GALIMBERTI, em Psiche e Techne, faz observar que entre as pulsões e a ação humana existe um intervalo, e esse intervalo é exatamente o que permite a retificação moral de inclinações humanas que, sob o domínio da só potência volitiva (que é não cognoscente), são inclinações indiferenciadas. Mas não à toa essa revolução também acena ao “direito dos animais” e à expansão do conceito de “família” para nela abranger os animais. III- O interesse político (ou seja, da comunidade política) pelo matrimônio é, sobretudo, o de que ele sirva ao bem comum, ao bem da comunidade, tanto −principalmente− considerando a geração da prole e a boa formação cidadã, quanto, embora secundariamente, a felicidade dos cônjuges e filhos. A instituição pública de um registro custódio do status
matrimonial é emblemática da importância concedida pelo Poder político à realidade matrimonial, no concernente quer à contratação (ou instituição) do casamento (matrimonium in fieri), quer à perseverança do estado matrimonial (matrimonium in facto esse). Ora, a admissão de modelos factuais de casamento −instituições-sombra do matrimônio21−, com o acolhimento de uma “faculdade de escolha” fundado num absoluto direito individual à felicidade, põe à mostra que o registro civil das pessoas naturais, centro de convergência dos fatos, atos e negócios relativos ao status pessoal, vai perdendo sua importância assecuratória, pois que já não pode conter a avulsão de instabilidades cotidianas. Nada parece já obstar as vontades oscilantes e caprichosas que, de não se contentarem com fantasias individuais de sua identidade (uma, hoje; amanhã, outra), fazem com que esses devaneios ingressem no registro público, fazendo-se “ficções” para a convivência na polis. O “auditório” comunitário é sensível a estas mudanças institucionais. A desconstrução sistemática do objeto desconstrói o sistema de sua proteção. O registro civil passa por uma crise de identidade. Tem de saber se ainda será o bastião das categorias e dos valores que recebeu de seus Maiores ou se, ao revés, atira-se aos braços das ideologias que demolem esses valores.
‘NOTAS DE FIM’ 1 - ARISTÓTELES. ÉTICA A EUDEMO. BKK. 1242A20 ET SQQ. 2 - IN DECEM LIBROS ETHICORUM. VIII-12, N. 1719: MAGIS EST SECUNDUM NATURAM ANIMAL CONJUGALE QUAM POLITICUM. 3 - SUMA THEOLOGIÆ. II-II, Q. 154, ART. 2, RESPONDEO (CF. TAMBÉM SUPPLEMENTUM, Q. 41, ART. 1). 4 - S.TOMÁS DE AQUINO. SUMA THEOLOGIÆ. I, Q. 29, ART. 1, AD 4UM. 5 - CALDERÓN, ÁLVARO. LA NATURALEZA Y SUS CAUSAS. BUENOS AIRES: CORREDENTORA, 2016, TOMO I, P. 82 ET SQQ. 6 - S.TOMÁS DE AQUINO. SUMA THEOLOGIÆ. IA.-IIA., Q. 105, ART. 4, RESPONDEO. 7 - ULPIANO. DIGESTO, LIVRO I, TÍTULO I. 8 - ERA ISTO JÁ LIÇÃO DE RUFINO (1157) E SIMÃO DI BISIGNANO (1173), ASSIM REFERE RAMÍREZ EM DERECHO DE GENTES (MADRI: STUDIUM, 1955, P. 36 ET SQQ.). 9 - S.TOMÁS DE AQUINO. SUMA THEOLOGIÆ. IA-IIAE, Q. 31, ART. 7. 10 - S.TOMÁS DE AQUINO. SUMA THEOLOGIÆ. IA.-IIÆ., Q. 71, ART. 2, RESPONDEO. 11 - DIGESTO 23.2 (DE RITU NUPTIARUM). 12 - DE PATRIA POTESTATE I,9. 13 - APUD CANTELMI, TONINO E CACACE, CRISTINA. IL LIBRO NERO DEL SATANISMO, MILÃO: SAN PAOLO, 2007, P. 101. 14 - LIMITAR-SE A VONTADE DO HOMEM POR DEUS, NEM HÁ PENSAR; ALIÁS, É MESMO INTERESSANTE CONSIDERAR, NESTE CAPÍTULO, QUE A DEVOTIO MODERNA É UMA FORMA DE INDIVIDUALISMO, O PIETISMO INDIVIDUAL UM MEIO DE DESAPREÇO DA LITURGIA COMUNITÁRIA. 15 - MATTEI, ROBERTO DE. LA DITTATURA DEL RELATIVISMO. CHIETI: SOLFANELLI, 2007, P. 86. 16 - BASTARIA VISITAR AO ACASO AS PÁGINAS DA INTERNET PARA RECOLHER A NOTÍCIAS DE CASAMENTOS ATUAIS COM DRAGÃO INFLÁVEL, CAMINHÃO, CACHORRO, VACA, GOLFINHO, CABRA, TORRE EIFFEL, GATO, NAMORADA MORTA, MURO DE BERLIM (COM DIREITO ATÉ MESMO AO SOBRENOME: “EIJA-RIITTA BERLINER-MAUER”), TRAVESSEIRO, ETC. 17 - CONTRERAS, FRANCISCO JOSÉ E POOLE, DIEGO. NUEVA IZQUIERDA Y CRISTIANISMO. 2.ED. MADRI: ENCUENTRO, 2012, P. 71. 18 - WEILER, J.H.H. UNA EUROPA CRISTIANA: ENSAYO EXPLORATORIO. TRADUÇÃO DE JOSÉ MIGUEL ORIOL. MADRID: ENCUENTRO, 2003, PASSIM. 19 - BOSTON: EXTENDING HORIZONTS BOOKS. 20 - COM EFEITO, NÃO SÃO TODAS AS ENERGIAS “LIVRES” QUE SE AFIRMAM DIGNAS DE PROTEÇÃO. HÁ UMA SELETIVIDADE IDEOLÓGICA QUE FAZ SEPARAR AS METAS IDEOLÓGICAS DA SIMPLÍSSIMA REALIDADE MAIS AMPLA DE “SER LIVRE”: PARA A IDEOLOGIA, VALE PROIBIR QUE SE PROÍBA, MAS NÃO VALE PROIBIR QUE SE PROÍBA PROIBIR, E VIA DICENDO. ROMANO AMERIO, NO IOTA UNUM, OBSERVOU, A PROPÓSITO, QUE, AO PASSO EM QUE SE OBJETA A UM CATÓLICO, P.EX., EXIGIR DA LEI CIVIL O MATRIMÔNIO INDISSOLÚVEL −PORQUE ISTO AFLIGIRIA A CONSCIÊNCIA DE QUEM, AO REVÉS, DESEJA DISSOLÚVEL O CASAMENTO −, NEGA-SE, PORÉM, AO CATÓLICO O DIREITO A UM MATRIMÔNIO CIVIL INDISSOLÚVEL. SERÁ DE FATO INDISSOLÚVEL O MATRIMÔNIO, PELA PRÓPRIA VONTADE DOS CÔNJUGES, MAS NÃO O SERÁ DE DIREITO, O QUE PÕE À MOSTRA A INEXISTÊNCIA DE PARIDADE ENTRE AS SITUAÇÕES. 21 - CF., A PROPÓSITO, BREVITATIS CAUSA, NAVARRO-VALLS, RAFAEL. MATRIMONIO Y DERECHO. MADRI: REAL ACADEMIA DE JURISPRUDENCIA Y LEGISLACIÓN, 1994, PASSIM. MARTÍNEZ DE AGUIRRE, CARLOS. DIAGNÓSTICO SOBRE EL DERECHO DE FAMILIA. MADRI: RIALP, 1966, PASSIM.
RICARDO DIP É DESEMBARGADOR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO −DA QUAL É, POR AGORA, PRESIDENTE DE SUA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO−, PROFESSOR ASSISTENTE NA ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA; FOI PROFESSOR EM VÁRIAS UNIVERSIDADES, ENTRE ELAS, CONVIDADO, DA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BUENOS AIRES. ACADÊMICO DE HONRA DA REAL DE JURISPRUDENCIA DE MADRID, MEMBRO FUNDADOR DO INSTITUTO INTERDISCIPLINAR DA FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DO PORTO E DO CENTRO DE ESTUDOS NOTARIAIS E REGISTAIS (CENOR) DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA, INTEGRA OS COMITÊS CIENTÍFICOS DA REVISTA INTERNACIONAL DE FILOSOFÍA PRÁCTICA, DE BUENOS AIRES, DO INSTITUTO DE ESTUDIOS FILOSÓFICOS “SANTO TOMÁS DE AQUINO”, TAMBÉM DE BUENOS AIRES, E DA REVISTA VERBO, DE MADRI. É MEMBRO DO CONSELHO ACADÊMICO DA SEÇÃO DE FILOSOFIA DO DIREITO DE EL DERECHO: DIÁRIO DE DOCTRINA Y JURISPRUDENCIA, SOB A RUBRICA DA UNIVERSIDADE CATÓLICA ARGENTINA, E INTEGRA A SOCIEDADE PERUANA DE HISTÓRIA. É DIRETOR DA SEÇÃO DE ESTUDOS DE DIREITO NATURAL DO CONSEJO DE ESTUDIOS HISPÁNICOS “FELIPE II”, DE MADRI, E MEMBRO DO CONSELHO DE REDAÇÃO DE SUA REVISTA FUEGO Y RAYA. MESTRE EM FUNÇÃO SOCIAL DO DIREITO, É AUTOR DE VÁRIOS ESTUDOS PUBLICADOS NO BRASIL E NO EXTERIOR (PORTUGAL, ESPANHA, ARGENTINA E CHILE).
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artigo
O Registro Civil das Pessoas Naturais após a Lei 13.484/17 por: Marcelo Salaroli de Oliveira Mario de Carvalho Camargo Neto
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INTRODUÇÃO
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OFÍCIOS DA CIDADANIA
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A EMISSÃO DO CPF NO REGISTRO DE NASCIMENTO
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NATURALIDADE
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A NATURALIDADE NA CERTIDÃO DE NASCIMENTO
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A RESIDÊNCIA DA MÃE - IGUALDADE CONSTITUCIONAL E HOMOPARENTALIDADE
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OS REGISTROS LAVRADOS ANTES DA NOVA LEI
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A NATURALIDADE NO REGISTRO DE CASAMENTO
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ATRIBUIÇÃO TERRITORIAL PARA O REGISTRO DO ÓBITO
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AVERBAÇÕES
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O MINISTÉRIO PÚBLICO
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RETIFICAÇÕES
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RETIFICAÇÃO DE OFÍCIO
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MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
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RECUSA DA RETIFICAÇÃO ADMINISTRATIVA
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HIPÓTESES DE RETIFICAÇÃO ADMINISTRATIVA
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ATOS PASSÍVEIS DE RETIFICAÇÃO
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EMOLUMENTOS
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BIBLIOGRAFIA
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INTRODUÇÃO A Lei 13.484, de 26 de setembro de 2017, trouxe alterações relevantes para a atividade do registro civil, as quais merecem uma análise cuidadosa para sua boa e correta aplicação. As novidades, em linhas gerais, são as seguintes: possibilidade de firmar convênios com órgãos públicos e outras entidades para ampliar os serviços prestados ao cidadão; inclusão da naturalidade como um novo elemento do registro de nascimento, e definição do que configura naturalidade; ampliação da atribuição territorial para o registro de óbito; desburocratização do procedimento de averbação, excluindo a obrigatoriedade de audiência do Ministério Público; desburocratização e aperfeiçoamento da retificação administrativa. OFÍCIOS DA CIDADANIA Muitas vezes se apresenta a informatização e a internet como solução para levar ao cidadão os serviços públicos, sem filas e com agilidade. No entanto, para que o cidadão tenha acesso aos serviços disponibilizados no mundo eletrônico, é preciso antes ter um documento de identidade e até mesmo um CPF, que lhes serão exigidos pelas empresas operadoras de telecomunicações. É nesse contexto que sobressai a importância dos serviços de registro civil, presentes em todos os municípios brasileiros (Lei 8.935/94, art. 44, §2º), apto a contribuir com sua imensa capilaridade em todo o território nacional e a atender pessoalmente os cidadãos, emitindo os documentos essenciais para o exercício da cidadania. A inclusão de parágrafo no artigo 29 da Lei 6.015/73, transforma o registro civil das pessoas naturais em ofícios da cidadania, com o seguinte teor: § 3º Os ofícios do registro civil das pessoas naturais são considerados ofícios da cidadania e estão autorizados a prestar outros serviços remunerados, na forma prevista em convênio, em credenciamento ou em matrícula com órgãos públicos e entidades interessadas. § 4º O convênio referido no § 3o deste artigo independe de homologação e será firmado pela entidade de classe dos registradores civis de pessoas naturais de mesma abrangência territorial do órgão ou da entidade interessada. A expressão cidadania para identificar o registro civil é bem feliz, pois atualiza e expressa a essência dessa atividade. O registro civil das pessoas naturais, em sua origem no século XIX, antes mesmo da proclamação da República, tinha por função registrar os nascimentos, casamentos Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017
e outros atos referentes às pessoas não católicas. Assim, a expressão civil foi utilizada para distinguir do registro religioso e atender aos não católicos, que desejavam um registro de nascimento, não um certificado de batismo. Com a proclamação da República e o advento do estado laico, o registro civil passou a ser obrigatório para todas as pessoas. Como se vê, o registro civil sempre esteve ligado à pessoa, que na égide atual do Estado é o cidadão, garantindo-lhe direitos, ou seja, garantindo cidadania. Para além das questões terminológicas, a alteração legislativa amplia os serviços oferecidos ao cidadão pelo registro civil das pessoas naturais, permitindo a expedição de documentos de identidade, carteira de trabalho e outros mediante convênio a ser firmado entre as entidades de classe dos registradores civis e quaisquer outros órgãos ou entidades públicos. O serviço de registro civil das pessoas naturais, peça fundamental que bem respondeu às políticas públicas de erradicação do sub-registro de nascimento, agora poderá contribuir para a emissão de diversos outros documentos para a população, como carteira de identidade ou carteira de trabalho. É um novo e promissor capítulo que se inaugura na história de acesso à documentação básica e renova a esperança de bons resultados. A EMISSÃO DO CPF NO REGISTRO DE NASCIMENTO Exemplo notável e bem sucedido da ampliação do fornecimento de outros documentos pelo registro civil das pessoas naturais é o caso do Cadastro das Pessoas Físicas da Receita Federal do Brasil. Antes mesmo da previsão legal dos ofícios da cidadania, a Receita Federal do Brasil formulou convênio com a Associação dos Registradores Civis das Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (ArpenSP) para a emissão de CPF já no ato do registro de nascimento, sem custos adicionais para o cidadão (Instrução Normativa da RFB 1548/2015, artigo 3º, inciso V). A medida teve impacto direto no acesso ao documento, simplificando a vida do cidadão, que deixou de ter de buscar um outro órgão e pagar uma taxa para a obtenção do CPF, um documento que já se afigura como básico para o exercício de direitos, haja vista, por exemplo, a necessidade do mesmo para cadastro nos programas assistenciais do governo federal. Também conferiu mais racionalidade e segurança para a emissão do CPF, evitando fraudes, já que a mesma pessoa não conseguirá se inscrever duas vezes e obter dois números de CPF, com intuito de receber benefícios de forma duplicada ou aplicar outros golpes. Observe-se que a emissão do 15
artigo CPF não é uma faculdade do declarante do nascimento, mas uma obrigatoriedade, sempre que o cartório de registro civil fizer parte do convênio. O convênio somente foi viável do ponto de vista técnico graças à informatização e interligação dos registradores civis, por meio da CRC (Central de Informações do Registro Civil), atualmente prevista e regulamentada no Provimento 46/2015 do CNJ. Já foram emitidos mais de 1,3 milhão de CPF, juntamente com o registro de nascimento, por meio desse convênio, desde sua implementação no ano de 20151. A previsão é ampliar a interligação entre registro civil das pessoas naturais e a Receita Federal, por exemplo, para que as alterações de nome ocorridas em virtude de casamento ou quaisquer outras sejam imediatamente atualizadas no CPF, em evidente simplificação da burocracia ao cidadão. NATURALIDADE No Direito brasileiro, a naturalidade foi costumeiramente entendida como o município onde ocorreu o nascimento da pessoa natural. No entanto, uma leitura atenta da Lei 6.015/73 revela que esse conceito não esteve legislado, pois o texto legal, ao arrolar os elementos do registro de nascimento, refere-se apenas ao lugar do nascimento (art. 54, 1º). Esta lacuna foi colmatada com a edição da Lei 13.484/17, que inseriu uma nova alínea no rol, exigindo que a naturalidade do registrando conste expressamente dos registros de nascimento (art. 54, 11º), e definiu o que é a naturalidade (art. 54, §4º). Observe-se que houve inserção de um novo elemento a naturalidade - não tendo sido derrogado nem alterado o inciso que exige constar o lugar do nascimento no registro. Quanto ao conceito, agora está expresso na lei que a naturalidade poderá ser o município onde ocorreu o nascimento ou o município de residência da mãe do registrando na data do nascimento, desde que localizado no Brasil. A opção caberá ao declarante do registro de nascimento e deverá ser feita no ato do registro (Lei 6.015/73, art. 54, §4º). A novidade, como já era esperado, causou estranheza em muitos operadores do direito. Importante ouvir os argumentos das críticas à alteração e compreender seu ponto de
vista, a fim de aperfeiçoar os argumentos e alcançar níveis melhores de conhecimento. Um dos motivos da estranheza foi o aspecto artificial, arbitrário e falso, que distorce o conceito de naturalidade, desvinculando-o do fato concreto. Outro motivo foi a inutilidade e desnecessidade da alteração. Os autores deste artigo, em seu livro Registro Civil das Pessoas Naturais2, já viam com bons olhos essa possibilidade de escolha da naturalidade e recomendavam a aprovação do projeto de lei nesse sentido. A escolha da naturalidade, restrita a dois municípios bem identificados (local do nascimento ou residência da mãe) é interessante tanto do ponto de vista do indivíduo, quanto do ponto de vista da sociedade. Do ponto de vista do indivíduo, a medida permite que este se identifique mais adequadamente, ostentando em seu documento o município que indica a sua origem, o local em que efetivamente cresceu e com o qual tem um vínculo afetivo, pois é onde suas primeiras histórias aconteceram. Não é raro as pessoas nascerem durante uma viagem e são muitos os pais que buscam um outro município apenas para ter acesso a melhor atendimento de saúde, mais comodidade e segurança para o parto, ou seja, o local de nascimento é ocasional, sendo o município de residência dos pais o local onde a criança foi sonhada, onde irá ter seus próprios sonhos e crescer. Do ponto de vista da sociedade, com a indicação da naturalidade, o serviço de registro civil passa a fornecer mais uma informação relevante para a elaboração das estatísticas da população, pois indica o município que efetivamente vai receber um novo habitante. A estimativa de novos habitantes por município, feita pelo IBGE, é um dado importante utilizado para estabelecer a cota que cada município vai receber na repartição das receitas federais do Fundo de Participação dos Municípios (Constituição Federal, art. 159, I e Lei Complementar 91/1997, artigo primeiro). Observe-se que as estatísticas do IBGE3 já contemplavam os dados de nascimento conforme a residência da mãe, o que demonstra a relevância dessa informação. Permitir que o município de residência da mãe seja considerado naturalidade do filho nascido, como se vê, tem boa justificação e não é uma arbitrariedade, mas feita dentro de normas expressas, robustecidas pela atuação do registro civil
1 Informação disponível em http://www.arpensp.org.br/?pG=X19jcmNfY3Bm acesso em 15.09.2017. 2 CAMARGO NETO, Mario de Carvalho; OLIVEIRA, Marcelo Salaroli. Registro Civil das Pessoas Naturais. Volumes I. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 38 3 IBGE. Estatísticas do Registro Civil. V. 41 2014. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/ periodicos/135/rc_2015_v42.pdf. Acesso em 15.09.2017 16
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das pessoas naturais. Tampouco se trata de uma invenção estranha dos governantes brasileiros. O conceito atual de naturalidade está inspirado no direito português, que conta com previsão muito semelhante, qual seja, “considera-se naturalidade o lugar em que o nascimento ocorreu ou o lugar, em território português, da residência habitual da mãe do registando, à data do nascimento, cabendo a opção ao registando, aos pais, a qualquer pessoa por eles incumbida de prestar a declaração ou a quem tenha o registando a seu cargo; na falta de acordo entre os pais, a naturalidade será a do lugar do nascimento”4 Verifica-se que a legislação portuguesa já previu a solução para o caso de falta de acordo entre os pais, determinando que a naturalidade será a do lugar do nascimento. Não há disposição semelhante na legislação nacional. O registrador civil brasileiro, ao lavrar o nascimento, deve se ater à vontade manifestada pelo declarante, que é o legitimado para a escolha, conforme o texto expresso de lei. No entanto, havendo desacordo manifestado ao registrador no momento do registro, deve-se aplicar a mesma solução proposta à divergência quanto à escolha do nome do registrando, qual seja, a regra geral para solução de divergência entre os titulares do poder familiar, inscrita no artigo 1.631, parágrafo único, do Código Civil, que estabelece que divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo. Por outro lado, há que se considerar que a criança recém-nascida tem o direito humano fundamental a ser registrada logo após o nascimento, sendo a sua certidão um documento essencial para o exercício da cidadania, muitas vezes necessário logo nos primeiros dias de vida, como para inscrição no plano de saúde ou para que seus pais recebam benefícios previdenciários ou trabalhistas. Nessa ordem de considerações, submeter o caso para apreciação judicial poderá ser moroso e causar prejuízos ao registrando, devendo ser utilizado apenas como última op-
ção. Antes, deve o registrador civil, como já costuma fazer, esclarecer e informar aos pais as consequências dessa divergência, a importância do registro, o melhor interesse da criança. Deve agir como conciliador, abrindo caminhos para despertar a consciência dos pais e chegar a um acordo, promovendo paz social. Sendo a naturalidade um elemento obrigatório do registro de nascimento, deve-se redigir o registro de nascimento constando a naturalidade. Devem os registradores civis ficar atentos aos seus fornecedores de software, para que não sejam consumidores de um serviço defeituoso. O sistema que gera o texto do registro de nascimento sempre deverá expressar a naturalidade. É equivocado o entendimento de que seria desnecessário mencionar a naturalidade quando foi escolhido o município do nascimento, conforme a regra costumeira. Tampouco prevalece a interpretação de que coincidindo o município de residência da mãe com o município do nascimento, por não haver opção a ser feita, não seria necessário mencionar a naturalidade. Os registros públicos primam pela segurança, clareza e exatidão de suas informações, assim, a boa técnica de redação dos atos registrais deve seguir esses mesmos princípios, evitando conteúdos implícitos ou subentendidos. É necessário constar a naturalidade em todos os casos. Não se deve deixar espaço para dúvidas. Ademais, redigindo com clareza haverá também segurança de que o registrador civil bem orientou o declarante do registro de nascimento. A NATURALIDADE NA CERTIDÃO DE NASCIMENTO A alteração legislativa abrangeu não apenas o registro de nascimento, mas também a respectiva certidão, que é o instrumento pelo qual o público toma conhecimento do registro de nascimento. Antes, era dever do registrador civil fazer constar das certidões o lugar do nascimento, agora deverá constar a naturalidade (Lei 6.015/73, art. 19, § 4º).
4“Código de Registro Civil Português, Artigo 101º – Competência – 1 – É competente para lavrar o registo de nascimento qualquer conservatória do registo civil, a unidade de saúde onde ocorreu o nascimento ou aquela para onde a parturiente tenha sido transferida, desde que seja possível declará-lo na unidade de saúde. 2 – Para efeitos dos assentos de nascimento ocorrido em território português, a lavrar após a entrada em vigor deste diploma e de que não haja registo anterior, considera-se naturalidade o lugar em que o nascimento ocorreu ou o lugar, em território português, da residência habitual da mãe do registando, à data do nascimento, cabendo a opção ao registando, aos pais, a qualquer pessoa por eles incumbida de prestar a declaração ou a quem tenha o registando a seu cargo; na falta de acordo entre os pais, a naturalidade será a do lugar do nascimento.” Disponível em: http://www.irn.mj.pt/sections/irn/legislacao/docs-legislacao/codigo-do-rc/downloadFile/file/Codigo_do_Registo_Civil-Set09.pdf?nocache=1252073052.76. Acesso em 19.10.2017. Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017
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artigo Diferentemente do que já se comentou acima sobre o teor do registro, na lavratura da certidão foi excluída a obrigatoriedade de menção ao lugar do nascimento. Porém, atente-se que houve revogação da obrigatoriedade prevista em lei, permanecendo a obrigatoriedade prevista nos Provimentos 02 e 03 de 2009 da Corregedoria Nacional de Justiça. Em outras palavras, a lei atual não impõe a obrigatoriedade de menção do lugar do nascimento nas certidões, impondo apenas a obrigatoriedade da naturalidade. No entanto, por força das normas administrativas, há expressa obrigatoriedade de constar o lugar do nascimento nas certidões. A Corregedoria Nacional da Justiça, considerando a importância da padronização desse importante documento em nível nacional, editou os provimentos 02 e 03 do ano de 2009, onde estabeleceu os modelos das certidões de nascimento, casamento e óbito. Estes provimentos continuam vigentes e devem ser cumpridos. Com efeito, o município do nascimento é um elemento relevante para a individualização da pessoa, sendo interessante que conste das certidões, para maior publicidade e segurança jurídica. Assim, para o registrador civil cumprir a nova lei, que exige a naturalidade, e cumprir os provimentos do CNJ, que estabelecem o padrão da certidão, deve-se apenas e tão somente acrescentar no campo das observações a informação da naturalidade do registrando. Basta uma simples frase “A naturalidade do registrando é Município-UF”. Aguarda-se que a Corregedoria Nacional da Justiça altere o provimento para adequá-lo à nova legislação. A melhor solução é alterar o campo denominado “Município de Nascimento e Unidade da Federação” para “Naturalidade (Município e UF)”, bem como orientar que no campo “Local de Nascimento” deverá constar o Município e Unidade da Federação em que ocorreu o nascimento. A RESIDÊNCIA DA MÃE - IGUALDADE CONSTITUCIONAL E HOMOPARENTALIDADE. O novo texto legal faz expressa referência à “residência da mãe” para permitir que esse município seja a naturalidade de seu filho. Assim, já podemos antecipar algumas questões
que merecem uma resposta bem fundamentada. São elas: I) se o pai tem residência diversa da mãe, é facultado ou não escolher como naturalidade o município de residência do pai?; II) se os genitores são dois homens, fato que se tornou possível em razão das técnicas de reprodução assistida, regulamentada pelo Conselho Federal de Medicina 2.121/2015 e Provimento 52/2016 da Corregedoria Nacional de Justiça, é facultado ou não escolher o município de residência destes como naturalidade?; III) se as genitoras são duas mulheres que tenham residências em municípios diversos, é facultado ou não escolher qualquer um desses municípios. Essas três questões precisam ser analisadas sob a luz do princípio jurídico da igualdade entre homem e mulher, expresso no artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal, com o seguinte texto, “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”. Ocorre que a igualdade não é absoluta e deve ser entendida como tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. Seguindo-se o ensinamento de Celso Antônio Bandeira de Mello, segundo o qual é possível a diferenciação no tratamento sem haver quebra da isonomia, desde que se atenda a três requisitos: A) “O traço diferencial adotado, necessariamente há de residir na pessoa, coisa ou situação discriminada” 5; B) Deve haver “correlação lógica entre o fator erigido em critério de discrímen e a discriminação legal decidida em função dele”6; C) “In concreto, o vínculo de correlação suprarreferido deve ser pertinente em função dos interesses constitucionalmente protegidos, isto é, resultar em diferenciação de tratamento jurídico fundada em razão valiosa – ao lume do texto constitucional – para o bem público”7. No caso em análise a lei faz distinção entre pai e mãe para a determinação da naturalidade do filho deles, passa-se, então, a analisar essa distinção conforme os requisitos mencionados. O requisito A) está atendido, pois o fator de diferenciação é o sexo, que é um fator inerente as pessoas, não um fator alheio. O requisito B) não está atendido, pois não há correlação lógica entre a distinção elegida pela lei (sexo dos genitores) e a determinação da naturalidade do filho deles.
5BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 23. 6Ibid. p. 37. 7Ibid. p. 41. 18
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Relembrem-se as motivações dessa alteração legislativa, já comentadas acima, que são, do ponto de vista do indivíduo, ter sua naturalidade reconhecida como o município que realmente diz sobre sua pessoa e, do ponto de vista das políticas públicas, conhecer qual o município realmente recebeu um novo cidadão. Assim, o fator relevante para os fins da norma é identificar em qual município o recém-nascido vai residir e crescer e não há correlação lógica entre o sexo dos pais e a futura residência da criança. Deve-se ressaltar, a bem da busca da verdade, que há argumentos para se concluir que existe correlação lógica, embora os autores deste trabalho não compartilhem desse entendimento. Tais argumentos seriam: o princípio jurídico de que a mãe é sempre certa, decorrente da gravidez e do parto, sendo assim mais segura e certeira a indicação da naturalidade; e, que em razão da amamentação e do costume cultural tradicional, há forte presunção de que o recém-nascido, notadamente nos primeiros meses de vida, irá ficar sob os cuidados da mãe, ou seja, vai residir com mãe, não com o pai, se os domicílios forem diversos. Do ponto de vista adotado pelos autores, tais argumentos não devem prevalecer, pois ainda que sejam verdadeiros na maioria dos casos, tal situação não é absoluta, havendo possibilidade de a criança morar com pai, por inúmeros motivos peculiares, por exemplo, mães que trabalham e mães que falecem no parto. Não parece lógico privar esses casos concretos da escolha da naturalidade, apenas para proteger uma regra que acontece na maioria das vezes. Por fim, o requisito C) também não está atendido, pois a suposta correlação lógica de que a residência da mãe é a residência da criança não assegura, em concreto, nenhum interesse constitucionalmente protegido, ou seja, não há razão valiosa voltada ao bem público que justifique a distinção. Essa argumentação, que leva a uma interpretação conforme a constituição do §4º incluído ao art. 54 da Lei 6.015/73, ampliando-se a expressão mãe, constante do texto legal, para abarcar também o pai, respondendo-se afirmativamente às três questões ora postas. Todavia, compreendem os autores deste trabalho que o registrador civil não pode, por si só, alargar o conceito legal e deve se ater a residência da mãe, quando esta for diferente da do pai. É certo que os registradores são profissionais do Direito (Lei 8.935/94, artigo 3º) e gozam de independência no exercício de suas funções (Lei 8.935/94, artigo 28). Em razão disso, devem conhecer não apenas a lei, mas também a ju-
risprudência, a doutrina e a Constituição Federal, para que possam exercer sua atividade com a eficiência que se espera e assim cumprir sua missão de conferir autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos (Lei 8.935/94, artigo 1º). Nesse sentido, para que os registradores possam ampliar a hipótese legal e admitir a residência do pai como município de naturalidade, com a prudência que lhes é peculiar, ainda é necessário aguardar o desenvolvimento da ciência jurídica, com produções doutrinárias e manifestações do Poder Judiciário, que irão expressar o alcance e sentido da norma jurídica em análise.
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OS REGISTROS LAVRADOS ANTES DA NOVA LEI Antes dessa novidade legislativa, embora não estivesse expresso na lei, o conceito de naturalidade se resumia ao município do nascimento, conforme o costume jurídico. Como o registro de nascimento é o documento público apto a fazer prova do fato do nascimento, a naturalidade se provava, para os atos anteriores à lei, pela certidão de nascimento. Agora há dispositivo expresso determinando constar a naturalidade na certidão de nascimento (Lei 6.015/73, art. 19, §4º), cabendo perguntar como proceder diante dos registros lavrados anteriormente a vigência da lei, nos quais não há informação sobre naturalidade, mas apenas sobre o local de nascimento. A resposta parece bem simples, nos registros anteriores, o município do nascimento é o município da naturalidade, conforme o direito então vigente por ocasião da lavratura do registro. É essa a naturalidade da pessoa, que certamente já constará em seus documentos pessoais, como sua cédula de identidade, seu cadastro de pessoa física (CPF) na Receita Federal do Brasil e muitos outros. Não é necessário lavrar averbação junto ao registro de nascimento para constar expressamente a naturalidade da pessoa. O Oficial poderá constar a naturalidade na certidão de nascimento, extraindo tal informação diretamente do município de nascimento, pois conforme as regras vigentes por ocasião da lavratura do registro de nascimento, a naturalidade coincidia com o município do nascimento. Embora não seja necessária, tal averbação é possível e está expressamente prevista na nova lei, com a inclusão do inciso IV no artigo 110 da Lei 6.015/73, que permite a retificação de ofício ou a requerimento do interessado nos casos de “ausência de indicação do Município relativo ao nascimento ou naturalidade do registrado, nas hipóteses em que existir descrição precisa do endereço do local do nascimento” (grifo nosso).
artigo A Lei expressamente tratou da hipótese de registros omissos quanto ao município de naturalidade e permitiu a sua inserção, por meio da retificação administrativa, sendo desnecessário requerimento do registrado, impondo apenas a necessidade de existir descrição precisa do endereço do local do nascimento. Em razão de tal previsão legal, cabe perguntar se foi aberta a possibilidade de escolha do município da naturalidade entre o município de nascimento e o município de residência da mãe por ocasião do parto, mesmo para as pessoas registradas antes da nova lei. Observe-se que ambas informações constam do registro de nascimento. A hipótese legal está versando sobre a ausência de município de naturalidade, que é o caso dos registros lavrados antes da lei em comento, e permite sua inserção administrativamente, mediante requerimento do interessado. Acrescentando ainda que não se trata de uma alteração, mas inserção de um novo elemento do registro de nascimento, a naturalidade, poder-se-ia chegar à conclusão de que essa inserção prevista na lei deveria ser feita levando em conta o atual conceito de naturalidade, que permite a escolha. No entanto, tal interpretação não deve prevalecer, pelos seguintes motivos: I) a nova lei é expressa de que a escolha da naturalidade somente pode ser feita no momento do registro nascimento (Lei 6.015/73, art. 54, §4º); II) em matéria de registros, vigora o princípio “tempus regit actum” e por ocasião da lavratura dos registros não havia previsão de escolha da naturalidade; III) a parte final do inciso IV exige para a referida retificação a indicação precisa do local do nascimento, ou seja, a hipótese legal considera que o município a ser inserto pela retificação é aquele que poderá ser apurado pela indicação desse local, não permitindo outros; IV) tal inclusão pode ser feita de ofício pelo oficial de registro, ou seja, não precisa de manifestação do interessado, justamente porque não há espaço para escolha. Eventuais casos concretos em que a pessoa queira mudar a naturalidade deverão ser apreciados pela via jurisdicional, não pelo caminho facilitado da retificação administrativa. Por outro lado, haverá maior garantia do princípio de segurança jurídica, pois a naturalidade é um elemento importante de individualização da pessoa perante a sociedade e os órgãos públicos, que já constará de inúmeros registros, cadastros, base de dados. Permitir a alteração da naturalidade tem grande potencial de causar dificuldades na identificação das pessoas, notadamente nas bases nacionais, que utilizam a naturalidade como elemento para afastar a homonímia. 20
É certo que diante da certidão de nascimento é seguro apurar que se trata da mesma pessoa, pois apesar da naturalidade diversa, é possível ler na certidão o município do nascimento e compreender o que houve. No entanto, isso é possível em uma análise humana, feita por quem conhece o assunto de registro e identificação de pessoas. Muitas vezes, o cruzamento de informações é feito por sistema informatizado, que poderá concluir se tratar de pessoa diversa, tendo em vista a não coincidência da naturalidade, que é um elemento estático na vida da pessoa, assim como a data de nascimento. A NATURALIDADE NO REGISTRO DE CASAMENTO No registro de casamento, como elemento de identificação dos nubentes, exigia-se a indicação do lugar do nascimento. Com a nova lei, passou-se a exigir a naturalidade, não sendo mais exigido indicar o lugar do nascimento. (Lei 6.015/73, art. 70, 1º). Trata-se de uma boa medida de padronização, pois doravante se deve privilegiar a naturalidade como elemento de individualização da pessoa. Como já se disse acima para o registro de nascimento, nada impede extrair certidões de casamento utilizando o município do nascimento para a indicação da naturalidade, nos casos de registros lavrados anteriormente à vigência da lei. ATRIBUIÇÃO TERRITORIAL PARA O REGISTRO DO ÓBITO O serviço de registro civil das pessoas naturais deve obedecer às normas que definem sua circunscrição geográfica (Lei 8.935/94, art. 12). A lei dá atribuição à circunscrição que juridicamente tem melhores condições de tornar cognoscível o fato, atingindo uma das finalidades dos registros públicos que é dar publicidade. Por outro lado, a lei também precisa deixar o serviço acessível ao cidadão, eliminando os entraves meramente burocráticos e harmonizando as finalidades dos registros públicos. Por exemplo, numa medida para combater o sub-registro de nascimento, a Lei 9.053/1995 ampliou a atribuição para o registro de nascimento, permitindo que seja lavrado tanto no local do nascimento quanto no local de residência dos pais. A mesma ampliação de atribuição agora é feita para o registro de óbito, permitindo que o registro seja lavrado no município ou distrito do local onde ocorreu o falecimento ou do local de residência do falecido. Esta é a nova redação do art. 77 da Lei n. 6.015/73: “Nenhum sepultamento será feito sem certidão do oficial de registro do lugar do falecimento ou do lugar de residência do
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de cujus, quando o falecimento ocorrer em local diverso do seu domicílio” (g.n.). Tanto o local do falecimento quanto o local de residência são elementos que constam no atestado de médico de óbito, emitido em modelo padronizado, denominado Declaração de Óbito (DO), prevista na Lei n. 11.976/2009 e regulamentado pela Portaria n. 116/2009 da Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde. O registro civil deverá se pautar pelo teor do atestado médico de óbito, devendo seguir os munícipios ou distritos ali indicados para aferir sua atribuição territorial para o registro. Caso o declarante do registro de óbito venha a informar que o local do óbito expresso na DO está incorreto, será necessário retificar a DO também por ato médico, pois esse é um dos elementos centrais do atestado, que não pode ser alterado por mera declaração. Caso o erro recaia sobre o município de residência, que é um elemento secundário do atestado de óbito, é possível ao declarante comprovar, por meio de documento hábil e recente, a residência do falecido. Nestes casos é desnecessária a retificação formal da DO, podendo o oficial seguir o documento apresentado para a lavratura do óbito. Isto pois não deve o registrador impor condições e empecilhos ao registro sem que estejam realmente fundamentadas a sua necessidade e legalidade. A escolha entre o registro no local do óbito ou no local de residência compete ao declarante do óbito. A finalidade da norma é colocar à disposição do cidadão um caminho mais fácil para aceder ao serviço público, logo, o responsável pela declaração do óbito a registro é quem decidirá em qual local será mais fácil cumprir seu dever. A alteração não irá prejudicar a publicidade do registro de óbito, pois atualmente está em vigor e em operação a Central de Informações do Registro Civil das Pessoas Naturais – CRC – de âmbito nacional, prevista no Provimento 46/2015 da Corregedoria Nacional de Justiça. Todos os registros de óbitos, no prazo máximo de 10 dias contados de sua lavratura, são informados para a CRC, onde é possível obter informações e certidões dos óbitos (Provimento 46, art. 6º). Sempre que for emitida uma certidão negativa de óbito é feita prévia consulta a CRC (Provimento 46, art. 10). Assim, a nova atribuição territorial não causará prejuízo para que cidadãos, empresas e poder público tomem conhecimento do óbito. O mesmo efeito se extrai do sistema de anotações previsto nos artigos 106 a 108 da Lei 6.015/73, garantindo-se que o registro de óbito seja informado a todos que solicitarem certidões de outros atos relativos ao falecido.
AVERBAÇÕES A nova lei trouxe uma alteração singela na temática das averbações, mas com relevante repercussão prática. Trata-se de tornar desnecessária a audiência do Ministério Público para a lavratura da averbação feita com fundamento em documento legal e autêntico. Retomem-se a importância e características da averbação para o registro civil das pessoas naturais, para depois comentar a novidade legislativa. O registro civil das pessoas naturais não é estático, pelo contrário, convive com as alterações. A vida das pessoas é dinâmica, logo o registro que a espelha também é. Portanto, as alterações do estado das pessoas são (ou pelo menos devem ser) acompanhadas de alteração nos registros públicos. É verdade que, como uma das funções do registro é tornar o ato ou fato perene, não se pode simplesmente descartar o registro já lavrado e fazer um novo. Pelo contrário, é preciso preservar os registros, ainda que alterados, pois ao tempo que foram feitos correspondiam à verdade registral e assim produziram efeitos jurídicos. Diz-se, portanto, que os registros públicos não apenas trazem o estado mais atual da pessoa, mas também a sua história. É justamente por meio das averbações e anotações, que o sistema de registro civil se mantém atualizado e íntegro, indicando todos os atos e fatos jurídicos relevantes referentes àquela pessoa. A averbação é um ato acessório a um ato de registro, que dá publicidade às alterações pelas quais passou aquele registro. É lavrada junto ao registro ao qual se referem, de modo que, ao ver o registro, já se tem com praticidade, na mesma folha, as informações relevantes sobre suas alterações. Não há rol taxativo de averbações, sendo possível averbar, além dos atos e fatos previstos em lei, qualquer ato ou fato que altere o conteúdo ou efeito de registro, ou, ainda, atos ou fatos que sejam relevantes ao estado da pessoa natural e aos quais seja desejável outorgar publicidade, segurança, autenticidade e eficácia típicas do registro civil das pessoas naturais. Exemplificando alguns atos: a averbação do divórcio e a do reconhecimento de filho estão expressamente previstas em lei, artigo 10, incisos I e II, do CC; a averbação de mudança de sexo, em caso de transgenitalismo, mesmo não prevista em lei, altera o conteúdo do registro, logo reclama a respectiva averbação; a nomeação de tutor altera os efeitos
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Por fim, oportuno relembrar que a lei atribui o registro de óbito para o local onde o óbito ocorreu e não onde foi atestado, como pode acontecer nos casos em que o corpo é levado já sem vida ao hospital que irá atestar o óbito.
artigo do registro, uma vez que o tutor, e não mais os pais, passará a exercer o poder familiar; a averbação do estabelecimento da guarda do menor é fato relevante ao estado do registrado, legitimando que terceiro tenha a criança em sua companhia, podendo opor-se até mesmo em face dos pais, logo é desejável conferir ao ato a publicidade, a segurança e a eficácia típicas do registro. O MINISTÉRIO PÚBLICO Para as averbações, deve-se atender ao princípio da instância inscrito no artigo 13 da Lei 6.015/73, que não foi alterado pela nova lei, sendo lavradas por determinação judicial, a requerimento do interessado ou do Ministério Público, este quando autorizado em lei. A alteração legislativa recaiu sobre o artigo 97 da Lei 6.015/73, derrogando sua parte final, que estabelecia que a averbação seria feita com “audiência do Ministério Público”. Tal dispositivo, hoje derrogado, já se interpretava de forma restrita. Havendo determinação judicial – mediante carta de sentença ou mandado – não era necessária a intervenção ministerial, apenas nos casos de petição acompanhada de certidão ou documento legal e autêntico, exigia-se a oitiva do Ministério Público. Aliás, embora o mencionado artigo fosse expresso, vigoravam inúmeras possibilidades que fugiam à regra, dispensando-se a oitiva do Ministério Público, a saber: Perda da nacionalidade, que é comunicada pelo Ministério da Justiça, conforme artigo 102, 5º, da LRP, Lei n. 818/1949 e Decreto n. 3.453/2000; Reconhecimento voluntário de filho, quando há anuência do outro genitor ou consentimento do filho maior, que nos termos do artigo 7º do Provimento n. 16 da Corregedoria Nacional de Justiça do CNJ dispensa a intervenção do Ministério Público e do Judiciário; Escritura pública de separação, reconciliação ou divórcio, lavrada nos termos da Lei n. 11.441/2007, que dispensa a atuação do Ministério Público ou do Judiciário conforme o artigo 40 da Resolução 35 do CNJ; A nacionalidade brasileira do filho de brasileiro nascido no exterior e registrado em Consulado entre a Emenda Constitucional de Revisão n. 3 de 1994 e a Emenda Constitucional n. 54 de 2007, cuja averbação pode ser feita ex officio, ou mediante requerimento, dispensada a atuação do Ministério Público e do Judi22
ciário, conforme artigo 12 da Resolução 155 do CNJ; A alteração de patronímico nos termos da Lei n. 8.560/92, artigo 3º, parágrafo único, cuja desnecessidade de intervenção do Ministério Público é ratificada pelo item 119.1, do Capítulo XVII das NSCGJ-SP. Todas essas hipóteses de averbação, fundadas em documento legal e autêntico, com dispensa de oitiva do Ministério Público, demonstram o quanto obsoleta estava essa exigência legal. Isto porque, mesmo com a previsão de audiência do Ministério Público, permanecia o dever de o registrador qualificar o requerido em conformidade com a lei e com os princípios e analisar a possibilidade de averbação, de maneira que, para alguns casos, havia um duplo exame das averbações, e para outros, apenas o registrador a qualificava. Diante disso, é seguro dizer que a dispensa da oitiva do MP, não implicou perda da segurança jurídica. Os Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais, com o desenho atual que lhes foi conferido pela Constituição Federal (art. 236) e Lei Federal 8.935/94, são profissionais do direito, recrutados por concurso público, capacitados para exercer o relevante serviço de registros públicos, sendo seguro e eficiente confiar-lhes a atribuição – acompanhada da respectiva responsabilidade – de examinar a possibilidade ou não da averbação. Observe-se que permanece a possibilidade de participação do Ministério Público nos atos de averbação, conforme o parágrafo único inserido no artigo 97, ipsis literis: “Parágrafo único. Nas hipóteses em que o oficial suspeitar de fraude, falsidade ou má-fé nas declarações ou na documentação apresentada para fins de averbação, não praticará o ato pretendido e submeterá o caso ao representante do Ministério Público para manifestação, com a indicação, por escrito, dos motivos da suspeita.” Assim, na sistemática atual das averbações, o registrador, nos casos específicos de fraude, falsidade ou má-fé, deverá submeter o caso ao Ministério Público. Não havendo suspeita, mas constatando óbice ao cumprimento da averbação, deve o registrador elaborar nota explicativa a ser devolvida ao requerente, contendo os motivos da impossibilidade de se proceder à averbação e as eventuais exigências a serem cumpridas. Se o requerente não atender às exigências e não concordar com os motivos da devolução, poderá reiterar o pedido e exigir
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que seja encaminhado ao Ministério Público juntamente com os motivos da negativa, para que opine e, sendo caso, encaminhe ao juízo competente para decisão acerca da averbação. Em qualquer caso, o interessado pode se insurgir contra a recusa do oficial, solicitar providências de maneira análoga ao procedimento de dúvida previsto no artigo 198 da Lei n. 6.015/73. Cumpre observar que no Estado de São Paulo, para dissenso acerca de atos de averbação, não é cabível o procedimento de dúvida, mas o pedido de providências, motivo pelo qual se sugere ao leitor a verificação do procedimento cabível em cada localidade conforme normas da Corregedoria da Justiça. RETIFICAÇÕES A nova lei alterou substancialmente o artigo 110 da Lei 6.015/73, disciplinando mais adequadamente a retificação, pois tornou clara a possibilidade da retificação de ofício, eliminou a necessidade de manifestação do Ministério Público, especificou as hipóteses de erros retificáveis administrativamente, tornou expresso que o objeto da retificação é o registro, averbação e anotação, deixou claro que os emolumentos não são devidos nos casos de erro imputável ao oficial de registro. No tópico anterior foi exposta a averbação das alterações do registro (art. 97 da Lei 6.015/73), as quais não se deve confundir com as retificações do registro (art. 109 e 110 da Lei 6.015/73), cuja análise se desenvolve a seguir. Há importante distinção entre retificação e alteração. Retificar é tornar reto o que está torto, é corrigir um erro. Alterar significa modificar, mudar de um estado para outro, sem que necessariamente o estado anterior seja um erro. Sempre que há um descompasso entre o registro e a realidade deve-se pensar se há um erro ou uma alteração posterior ao registro. Não se pode dizer que se busca uma retificação do regime de bens, quando em verdade se quer alterar o regime de bens. Não se pode dizer que se busca uma retificação da paternidade no registro, quando em verdade se busca uma destituição cumulada com investigação de paternidade. Nesse mesmo sentido, quanto ao nome, são hipóteses distintas a alteração do nome e a retificação do nome. Retificação pressupõe a existência de erro, assim, é possível retificar por erro de grafia, erro de digitação, correção da grafia do sobrenome para adequar a forma que consta de seus ancestrais estrangeiros, primeira via da certidão distinta do registro. O próprio art. 57, caput, da LRP exclui de sua hipótese de incidência o art. 110, ou seja, prestigia a distinção entre alterações posteriores do registro e retificações. Daí exsurge uma importante regra para a retificação de Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017
registro civil, pois este procedimento, em nenhuma hipótese, será aplicável para os casos em que se postula uma alteração do registro civil, já que não é possível denominar retificação, o que, na verdade, é uma alteração do estado da pessoa natural. Outra distinção é importante. São dois os procedimentos por meio dos quais é possível obter a retificação: o judicial e o administrativo. O procedimento judicial, previsto no art. 109 da LRP, é postulado ao Juiz de Direito, por meio de advogado, em processo de jurisdição voluntária, oportunidade em que é possível utilizar-se de todos os meios de prova admitidos em Direito. O procedimento administrativo, previsto no art. 110 da Lei de Registros Públicos, é realizado diretamente perante o Oficial de Registro Civil, em um procedimento célere e simplificado, sem necessidade de advogado ou decisão judicial. A nova lei alterou apenas o procedimento administrativo, conforme se vê a seguir. RETIFICAÇÃO DE OFÍCIO A primeira mudança foi tornar expressa a possiblidade de atuação de ofício (art. 110, “caput”) pelo registrador, ou seja, sem necessidade de requerimento do interessado. A redação anterior do art. 110 da LRP causava confusão, pois mencionava retificação “de ofício pelo Oficial de Registro”, mas também estabelecia “mediante petição assinada pelo interessado”. Ou seja, a lei determinou que a correção é feita de ofício mediante requerimento do interessado, o que é uma contradição, já que correção de ofício significa exatamente a correção de iniciativa do próprio Oficial de Registro, ou seja, sem necessidade de requerimento das partes. De qualquer forma, mesmo sob a égide da Lei anterior havia a possibilidade do próprio Oficial de Registro dar início à retificação administrativa dos assentamentos sob sua guarda. Nesse sentido, posicionou-se a ArpenSP: Enunciado n. 48 – Averbações / Anotações O Oficial de Registro é parte interessada para requerer a retificação de seus assentamentos, nos termos do art. 110 da Lei de Registros Públicos. Esse enunciado teve extrema importância prática, permitindo que o próprio serviço registral zelasse pela certeza e exatidão dos registros, conferindo, assim, maior segurança jurídica. Agora o texto legal eliminou qualquer dúvida sobre essa possiblidade, o que é louvável. Atente-se que, com a nova redação da lei, sequer será necessário formalizar um requerimento, com protocolo e 23
artigo autuação, nos casos de retificação de ofício feita com fundamento em documento arquivado no cartório. Bastará que o oficial ou seu escrevente autorizado lavre a averbação de retificação mencionando o documento arquivado. Sugere-se o seguinte texto para a averbação nesses casos: “RETIFICAÇÃO – Por força do artigo 110 da Lei 6.015/73 (com redação pela Lei 13.484/17) é feita a presente averbação para constar que a naturalidade do contraente constou erroneamente “Guará-SP”, sendo o correto “Guaratinguetá-SP”, conforme apurado no respectivo procedimento de habilitação para o casamento número 30/2017, arquivado neste cartório. Local, data. (assinatura) Nome, oficial de registro, dou fé. “RETIFICAÇÃO – Por força do artigo 110 da Lei 6.015/73 (com redação pela Lei 13.484/17) é feita a presente averbação para constar que a data de nascimento constou erroneamente 18/11/2007, sendo o correto 16/11/2007, conforme apurado na respectiva Declaração de Nascido Vivo arquivada em cartório. Local, data. (assinatura) Nome, oficial de registro, dou fé.” No entanto, caso a retificação seja feita com documento externo ao acervo do cartório, mesmo que de ofício, será necessário instrumentalizar requerimento e protocolizar, para que seja possível arquivar a prova do erro, de forma organizada. MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO A nova lei deixou de exigir a manifestação do Ministério Público para os casos de retificação administrativa. Tal medida é comemorada, pois agilizou o serviço de retificação, tornando-o mais próximo do cidadão, bem como valorizou a atividade do registro civil das pessoas naturais, confiando na qualidade de seus serviços. Não se esqueça que a intervenção de órgão tão relevante para o funcionamento da Justiça era um prestígio, que ressaltava a importância do Registro Civil das Pessoas Naturais e o cuidado que se deve ter com os direitos da personalidade e direitos de família, resguardados nesse registro público. No entanto, apoiado na evidência e na simplicidade dos erros corrigidos pela via administrativa, é mesmo de se comemorar que os próprios Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais, assim como já acontece com os Tabeliães de Notas e Oficiais de Registro de Imóveis, possam retificar tais erros, independentemente de manifestação do Ministério Público e de requerimento da parte, como uma medida de desburocratização e de maior eficiência no serviço público. Afinal, quem tem competência para lavrar o registro, também tem para rever essa lavratura e detectar a ocorrência de erros materiais, podendo então corrigi-los, resguardando 24
assim a valiosa e necessária higidez do registro público. É o que se chama de autotutela. É cumprir o dever de zelar pelo acervo, assegurando a exatidão e eficiência do serviço. RECUSA DA RETIFICAÇÃO ADMINISTRATIVA Outra novidade da lei é que deixou de existir a antiga previsão legal de que, não concordando com a retificação administrativa, por entender que o pedido exige maior indagação, o procedimento deverá ser o judicial, com assistência de advogado e distribuído a uma das varas judiciais com competência para a matéria (revogado o §3º do artigo 110 da Lei 6.015/73). No regramento atual, se o registrador entender que não é cabível a retificação administrativa, deverá fazer a nota de qualificação, expondo seus motivos, para ser entregue à parte, que poderá então buscar por si próprio a assistência de advogado e utilizar a via judicial para alcançar a retificação desejada. É certo que, com base no dever de assessorar as partes e prestar informações relativas ao seu serviço, poderá o registrador analisar o pedido do cidadão antes mesmo do protocolo, é o que se chama no costume cartorial de “análise de balcão”. Na grande maioria dos casos, os cidadãos vêm tomar informações antes de formalizar qualquer pedido, sendo o registrador quem redige o requerimento e os orienta. Caso a parte queira ou precise de uma manifestação formal e escrita acerca da possibilidade ou não da retificação, é necessário instrumentalizar o procedimento, com requerimento, protocolo, juntada de documentos, para então ser analisada a retificação pelo registrador. Somente assim haverá lastro para o registrador lavrar uma nota de qualificação fundamentada e entregar à parte. Para este serviço há previsão de cobrança de emolumentos. HIPÓTESES DE RETIFICAÇÃO ADMINISTRATIVA Sendo o procedimento administrativo extremamente célere, ele é altamente desejado pelas partes, no entanto, nem todos os casos permitem o uso desta via, pelo contrário, ela está restrita aos casos especificamente previstos nos incisos do artigo 110 em comento. Essa é uma importante distinção entre os dois procedimentos, a via administrativa só cabe em casos restritos, de erros evidentes, incontestes, cabalmente comprovados. Sempre que houver incertezas ou necessidade de produção de provas mais elaboradas, o procedimento será o judicial, pelo rito sumaríssimo do art. 109, com assistência de advogado. Pode-se afirmar que o procedimento judicial é a regra geral para as retificações do registro civil. Apenas em casos excepcionais é dispensada pela lei a apreciação judicial, que
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são exatamente os casos em que o erro é tão evidente quanto Os registradores paulistas, cujas normas exigem a cosingela a sua correção, pois está cabalmente comprovado por municação dessas correções ao Juiz Corregedor Permanendocumentos idôneos, que se faz desnecessário movimentar o te, agora contam com outro fundamento normativo para opePoder Judiciário por questão tão comezinha. rar tais correções, qual seja, a própria Lei 6.015/73, sendo A redação anterior do artigo 110 não especificava as hi- assim, como a Lei não prevê a necessidade dessa comunicapóteses em que era cabível a retificação administrativa. Uti- ção, torna-se desnecessário comunicar essas correções. Afilizava-se apenas a expressão genérica “erros que não exijam nal, como a previsão legal dá mais força ao procedimento, qualquer indagação para a constatação imediata de necessi- torna-se desnecessário um acompanhamento mais próximo dade de sua correção”, este mesmo texto se tornou o inciso da Corregedoria sobre tais atos. I do mesmo artigo 110, na sua redação atual. Ou seja, ao discriminar algumas hipóteses específicas de retificação adATOS PASSÍVEIS DE RETIFICAÇÃO ministrativa, sem revogar a hipótese genérica, a nova lei não A atual redação do artigo 110 é expressa ao menciobuscou restringir os casos, mas apenas tornar expressas al- nar que a retificação poderá recair sobre os atos de registro, gumas situações, para maior clareza e maior segurança jurí- averbação e anotação. A redação anterior era mais vaga, pois dica, dando previsibilidade e uniformidade ao procedimento. fazia referência a retificação “no cartório onde se encontrar São hipóteses expressamente previstas na lei: o assentamento”. Assim, sob a égide da lei anterior era neII - erro na transposição dos elementos constantes em cessário interpretar o preceito legal para apurar se a possibiordens e mandados judiciais, termos ou requerimentos, bem lidade de retificação ali mencionada – assentamento – dizia como outros títulos a serem registrados, averbados ou ano- respeito apenas a registro em sentido estrito ou se também tados, e o documento utilizado para a referida averbação e/ abarcava os atos de averbação ou anotação. ou retificação ficará arquivado no registro no cartório; Como o dispositivo anterior exigia manifestação do MiIII - inexatidão da ordem cronológica e sucessiva refe- nistério Público e, antes da Lei 12.100 de 2009, exigia-se rente à numeração do livro, da folha, da página, do termo, também apreciação judicial, ganhou força a interpretação bem como da data do registro; de que o assentamento ali referido estava restrito ao registro IV - ausência de indicação do Município relativo ao nas- em sentido estrito. Dessa forma, as averbações e anotações cimento ou naturalidade do registrado, nas hipóteses em que eram passíveis de correções de ofício, independentemente de existir descrição precisa do endereço do local do nascimento; qualquer procedimento, com apoio no princípio da autotuteV - elevação de Distrito a Município ou alteração de la, sempre que constatado um erro material9. suas nomenclaturas por força de lei. A distinção não era vazia. Uma substancial diferença Os incisos III e V estão francamente inspirados nas entre o ato de registro em sentido estrito e seus atos acessónormas administrativas paulistas8, que mesmo antes da rios está na colheita da manifestação de vontade, que é feita novidade legislativa, já permitiam a correção de ofício, no ato de registro (assento), mas não é feita nas averbações pelo Oficial de Registro, nesses casos. O fundamento des- e anotações. Estas sempre estão sustentadas em outro docusa permissão é que são elementos do registro que inde- mento, como um mandado judicial, uma escritura pública, pendem da vontade das partes, e a constatação do erro se um instrumento particular ou, até mesmo, um outro registro apura pela ordem cronológica e sucessiva dos assentos, civil. Já os registros também consubstanciam a manifestação no primeiro caso, ou por força de lei, no caso do nome de vontade do declarante, por exemplo, a escolha do nome dos municípios, ou a elevação de distrito a município. ou o reconhecimento de filho, no registro de nascimento. Por 8 NSCGJ-SP, Cap. XVII, item 141: “141. Também serão corrigidos de ofício pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais, sem manifestação do Ministério Público, mas com posterior comunicação ao Juiz Corregedor Permanente: a) a inexatidão da ordem cronológica e sucessiva referente à numeração de Livro, Folha, Página e Termo, bem como da data do registro; b) a elevação de distrito a município ou alteração de suas nomenclaturas por força de lei”. 9 Sobre o assunto, vide artigo do co-autor Marcelo Salaroli de Oliveira, in AHUALLI, Tânia Mara; BENACCHIO, Marcelo (coords.). SANTOS, Queila Rocha Carmona dos (org.). Direito Notarial e Registral: Homenagem às Varas de Registros Públicos da Comarca de São Paulo. São Paulo: Quartier Latin, 2016. p.700. Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017
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artigo isso os registros, via de regra, são assinados pelas partes e as averbações e anotações nunca são assinadas pelas partes, mas apenas pelo Oficial de Registro (ou seus prepostos). Retificar uma manifestação de vontade somente é possível pelo próprio sujeito. Essa era a razão de uma maior cautela para retificar o registro, que consiste em um misto de declarações e informações comprovadas, do que para retificar as averbações e anotações. Em boa hora, a redação atual do artigo 110 da Lei 6.015/73 dirimiu essas questões jurídicas anteriores, tornando clara a possibilidade de retificação de ofício, independentemente de qualquer procedimento, dos erros materiais apurados nos atos de registro, averbação ou anotação. EMOLUMENTOS Outra atualização importante trazida pela nova lei diz respeito aos emolumentos cobrados pelo procedimento de retificação. Dispõe o atual parágrafo 5º do artigo 110 da Lei 6.015/73: § 5º Nos casos em que a retificação decorra de erro imputável ao oficial, por si ou por seus prepostos, não será devido pelos interessados o pagamento de selos e taxas A nova redação tornou expresso que a isenção decorre apenas de erro imputável ao oficial, podendo ser cobradas as demais retificações, conforme os regimentos de custas es-
taduais. Embora esta também fosse a melhor interpretação sistemática da legislação anterior10, a clareza da legislação, eliminando dúvidas e questionamentos, é um valor jurídico que sempre deve ser prestigiado, em nome da segurança jurídica e estabilidade das relações. A redação anterior era genérica e mencionava no “caput” do artigo 110 da LRP que a correção será feita “independentemente do pagamento de selos e taxas”. Exatamente a mesma expressão estava presente no artigo 1º da Lei 3.764, que é do ano de 1.960. Para interpretar esse ponto específico era necessário considerar o conjunto das vigentes normas acerca dos emolumentos, quais sejam, a Constituição Federal, artigo 236, § 2º, a Lei Federal 10.169/2000, artigo 3º, IV e, no Estado de São Paulo, a Lei 11.331/2001, especificamente o item 15 da Tabela V. A nova lei menciona erro imputável “ao oficial, por si ou seus prepostos”. É sabido que os oficiais aposentam, falecem ou mudam de cartório. Do ponto de vista do cidadão, no entanto, não importa se o erro foi do oficial anterior ou do oficial atual, para ele, a retificação será isenta. Para a concessão da isenção, basta que o erro seja do oficial, não exigindo a lei que o oficial responsável pela retificação seja o mesmo responsável pelo erro. Como se vê, a Lei 13.484 de 2017 trouxe grandes avanços para o serviço de registro civil das pessoas naturais, conferindo-lhe mais responsabilidades e aproximando-o dos cidadãos.
10 Vide OLIVEIRA, Marcelo Salaroli. Idem. p. 702
BIBLIOGRAFIA BANDEIRA DE MELLO, CELSO ANTÔNIO. CONTEÚDO JURÍDICO DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE. SÃO PAULO: MALHEIROS, 1998. CENEVIVA, WALTER. LEI DOS REGISTROS PÚBLICOS COMENTADA. 15ª ED. SÃO PAULO, SARAIVA, 2003. OLIVEIRA, MARCELO SALAROLI. A CORREÇÃO DE ERROS MATERIAIS NO REGISTRO DE NASCIMENTO. IN: AHUALLI, TÂNIA MARA; BENACCHIO, MARCELO (COORDS.). SANTOS, QUEILA ROCHA CARMONA DOS (ORG.). DIREITO NOTARIAL E REGISTRAL: HOMENAGEM ÀS VARAS DE REGISTROS PÚBLICOS DA COMARCA DE SÃO PAULO. SÃO PAULO: QUARTIER LATIN, 2016. P.689-708. PAIVA, JOÃO PEDRO LAMANA. DO ERRO EVIDENTE E DA RETIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL NO RCPN (LEI 12.100. DE 27 DE NOVEMBRO DE 2009) IN: HTTP://WWW. LAMANAPAIVA.COM.BR/BANCO_ARQUIVOS/ERRO_EVIDENTE.PDF ACESSO EM 26/11/2014 SANTOS, REINALDO VELLOSO. REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS. PORTO ALEGRE: SERGIO ANTONIO FABRIS EDITOR, 2006.
MARCELO SALAROLI DE OLIVEIRA - MESTRE EM DIREITO PRIVADO PELA UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” (2006). BACHAREL EM DIREITO PELA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (2001). CONSELHEIRO EDITORIAL DA REVISTA DE DIREITO IMOBILIÁRIO (2004 A 2006). COORDENADOR DA REVISTA DE DIREITO IMOBILIÁRIO (2007). OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS NO ESTADO DE SÃO PAULO (2003-2007). OFICIAL DE REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS NO ESTADO DE SÃO PAULO (DESDE 2007). DIRETOR DA ASSOCIAÇÃO DOS REGISTRADORES DAS PESSOAS NATURAIS DO ESTADO DE SÃO PAULO (ARPENSP). MARIO DE CARVALHO CAMARGO NETO - MESTRE EM DIREITO POLÍTICO E ECONÔMICO PELA UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE. BACHAREL EM DIREITO PELA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. EX-PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DE NOTÁRIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE SÃO PAULO. EX-VICE-PRESIDENTE DE REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS E DE INTERDIÇÕES E TUTELAS DA ASSOCIAÇÃO DE NOTÁRIOS E REGISTRADORES DO BRASIL. DIRETOR DA ESCOLA NACIONAL DE DIREITO NOTARIAL E DE REGISTRO. SECRETARIO GERAL DO INSTITUTO ESTUDOS DE PROTESTO DO BRASIL, SEÇÃO SÃO PAULO. REGISTRADOR CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS NO ESTADO DE SÃO PAULO(2007-2011). TABELIÃO DE PROTESTO NO ESTADO DE SÃO PAULO(DESDE 2011).
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decisões jurisdicionais
DECISÃO JURISDICIONAL - 01
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DECISÃO JURISDICIONAL - 03
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DECISÃO JURISDICIONAL - 05
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decisões jurisdicionais Responsável Jurídico:
Alberto Gentil de Almeida Pedroso Juiz de Direito Titular da 8ª Vara Cível da Comarca de Santo André (TJSP). Juiz Corregedor Permanente dos Registros de Imóveis da Comarca de Santo André. Juiz Assessor da Corregedoria Geral da Justiça nas gestões 2012/2013, 2014/2015 e 2016/2017. Especialista em Direito Civil e Mestre em Direito Processual Civil. Professor da Escola Paulista da Magistratura nos Cursos de Pós-Graduação em Direito Civil, Processo Civil e Direito Notarial e Registral. Professor de Registros Públicos do Complexo Educacional Damásio de Jesus – Cursos Preparatórios para carreiras jurídicas. Coordenador do Curso Preparatório para Cartório do Complexo Educacional Damásio de Jesus. Coordenador dos Cursos de atualização e aperfeiçoamento da Uniregistral. Coordenador da Revistas Jurídicas ARISP JUS e Registrando o Direito. Autor de diversas obras jurídicas.
Decisão Jurisdicional - 01
Ementa PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CASAMENTO EM REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. VERBAS TRABALHISTAS. COMUNICABILIDADE. DECISÃO MANTIDA. 1.”A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está sedimentada no sentido de que nos regimes de comunhão parcial ou universal de bens comunicam-se as verbas trabalhistas a que se tem direito na constância da sociedade conjugal, devendo ser partilhadas quando da separação” (REsp 1543932/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 20/10/2016, DJe a 30/11/2016). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.
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Processo AgRg no REsp 1313857 / RJ AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2012/0050902-1 Relator(a) Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA (1146) Órgão Julgador T4 - QUARTA TURMA Data do Julgamento 03/10/2017 Data da Publicação/Fonte DJe 09/10/2017
Acórdão A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Buzzi, Lázaro Guimarães (Desembargador convocado do TRF 5ª Região), Luis Felipe Salomão e Maria Isabel Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator.
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Decisão Jurisdicional - 02
Ementa DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO. CERTIDÃO DE ÓBITO. UNIÃO ESTÁVEL. RECONHECIMENTO. PEDIDO JURIDICAMENTE POSSÍVEL. INTERESSE DE AGIR.1. Ação de retificação de registro civil (certidão de óbito)ajuizada em 11/09/2009, de que foi extraído o presente recursoespecial, interposto em 12/12/2013 e concluso ao Gabinete em25/08/2016. Julgamento pelo CPC/73.2. O propósito recursal é decidir sobre o pedido de retificação decertidão de óbito para que nela se faça constar que a falecida,filha da recorrida, convivia em união estável com o recorrente.3. A ausência de específica previsão legal, por si só, não torna opedido juridicamente impossível se a pretensão deduzida não éexpressamente vedada ou incompatível com o ordenamento pátrio.4. Se na esfera administrativa o Poder Judiciário impõe aos serviçosnotariais e de registro a observância ao Provimento nº 37 daCorregedoria Nacional de Justiça, não pode esse mesmo PoderJudiciário,
no exercício da atividade jurisdicional, negar-lhe avalidade, considerando juridicamente impossível o pedido daquele quepretende o registro, averbação ou anotação da união estável.5. A união estável, assim como o casamento, produz efeitos jurídicostípicos de uma entidade familiar: efeitos pessoais entre oscompanheiros, dentre os quais se inclui o estabelecimento de vínculode parentesco por afinidade, e efeitos patrimoniais que interessamnão só aos conviventes, mas aos seus herdeiros e a terceiros com osquais mantenham relação jurídica.6. A pretensão deduzida na ação de retificação de registro mostra-senecessária, porque a ausência de expresso amparo na lei representaum entrave à satisfação voluntária da obrigação de fazer.Igualmente, o provimento jurisdicional revela-se útil, porque apto apropiciar o resultado favorável pretendido, qual seja, adequar odocumento (certidão de óbito) à situação de fato reconhecidajudicialmente (união estável), a fim de que surta os efeitos pessoais e patrimoniais dela decorrentes.7. Afora o debate sobre a caracterização de um novo estado civilpela união estável, a interpretação das normas que tratam da questãoaqui debatida - em especial a Lei de Registros Públicos - devecaminhar para o incentivo à formalidade, pois o ideal é que àverdade dos fatos corresponda, sempre, a informação dos documentos,especialmente no
Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017
Processo REsp 1516599 / PR RECURSO ESPECIAL 2015/0037833-7 Relator(a) Ministra NANCY ANDRIGHI (1118) Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 21/09/2017 Data da Publicação/Fonte DJe 02/10/2017
que tange ao estado da pessoa natural.7. Sob esse aspecto, uma vez declarada a união estável, por meio desentença judicial transitada em julgado, como na hipótese, há de seracolhida a pretensão de inscrição deste fato jurídico no Registro Civil de Pessoas Naturais, com as devidas remissões recíprocas aosatos notariais anteriores relacionados aos companheiros.8. Recurso especial desprovido, ressalvando a necessidade de seacrescentar no campo “observações/averbações” o período de duraçãoda união estável. Acórdão Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros daTerceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dosvotos e das notas taquigráficas constantes dos autos, porunanimidade, negar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de TarsoSanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Dra. FERNANDA BARBOSA PEDERNEIRAS MORENO, pela parte RECORRIDA: G FM 29
Decisão Jurisdicional - 03
Ementa RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ADOÇÃO. ILEGITIMIDADE ATIVA. SUCESSÃO. CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL. REGIMES JURÍDICOS DIFERENTES. ARTS. 1790, CC/2002. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO STF. EQUIPARAÇÃO. CF/1988. NOVA FASE DO DIREITO DE FAMÍLIA. VARIEDADE DE TIPOS INTERPESSOAIS DE CONSTITUIÇÃO DE FAMÍLIA. ART. 1829, CC/2002. INCIDÊNCIA AO CASAMENTO E À UNIÃO ESTÁVEL. MARCO TEMPORAL. SENTENÇA COM TRÂNSITO EM JULGADO. 1. A diferenciação entre os regimes sucessórios do casamento e da união estável, promovida pelo art. 1.790 do Código Civil de 2002 é inconstitucional, por violar o princípio da dignidade da pessoa humana, tanto na dimensão do valor intrínseco, quanto na dimensão da autonomia. Ao outorgar ao companheiro direitos sucessórios distintos daqueles conferidos ao cônjuge pelo artigo 1.829, CC/2002, produz-se lesão ao princípio da proporcionalidade como proibição de proteção deficiente. 30
Decisão proferida pelo Plenário do STF, em julgamento havido em 10/5/2017, nos RE 878.694/MG e RE 646.721/RS. 2. Na hipótese dos autos, o art. 1790, III, do CC/2002 foi invocado para fundamentar o direito de sucessão afirmado pelos recorridos (irmãos e sobrinhos do falecido) e consequente legitimidade ativa em ação de anulação de adoção. É que, declarada a nulidade da adoção, não subsistiria a descendência, pois a filha adotiva perderia esse título, deixando de ser herdeira, e, diante da inexistência de ascendentes, os irmãos e sobrinhos seriam chamados a suceder, em posição anterior à companheira sobrevivente. 3. A partir da metade da década de 80, o novo perfil da sociedade se tornou tão evidente, que impôs a realidade à ficção jurídica, fazendo-se necessária uma revolução normativa, com reconhecimento expresso de outros arranjos familiares, rompendo-se, assim, com uma tradição secular de se considerar o casamento, civil ou religioso, com exclusividade, o instrumento por excelência vocacionado à formação de uma família. 4. Com a Constituição Federal de 1988, uma nova fase do direito de família e, consequentemente, do
Processo REsp 1337420 / RS RECURSO ESPECIAL 2012/0162113-5 Relator(a) Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO (1140) Órgão Julgador T4 - QUARTA TURMA Data do Julgamento 22/08/2017 Data da Publicação/Fonte DJe 21/09/2017
casamento, surgiu, baseada num explícito poliformismo familiar, cujos arranjos multifacetados foram reconhecidos como aptos a constituir esse núcleo doméstico chamado família, dignos da especial proteção do Estado, antes conferida unicamente àquela edificada a partir do casamento. 5. Na medida em que a própria Carta Magna abandona a fórmula vinculativa da família ao casamento e passa a reconhecer, exemplificadamente, vários tipos interpessoais aptos à constituição da família, emerge, como corolário, que, se os laços que unem seus membros são oficiais ou afetivos, torna-se secundário o interesse na forma pela qual essas famílias são constituídas. 6. Nessa linha, considerando que não há espaço legítimo para o estabelecimento de regimes sucessórios distintos entre cônjuges e companheiros, a lacuna criada com a declaração de inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002 deve ser preenchida com a aplicação do regramento previsto no art. 1.829 do CC/2002. Logo, tanto a sucessão de cônjuges como a sucessão de companhei-
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ros devem seguir, a partir da decisão desta Corte, o regime atualmente traçado no art. 1.829 do CC/2002 (RE 878.694/MG, relator Ministro Luis Roberto Barroso). 7. A partir do reconhecimento de inconstitucionalidade, as regras a serem observadas, postas pelo Supremo Tribunal Federal, são as seguintes: a) em primeiro lugar, ressalte-se que, para que o estatuto sucessório do casamento valha para a união estável, impõe-se o respeito à regra de transição prevista no art. 2.041 do CC/2002, valendo o regramento desde que a sucessão tenha sido aberta a partir de 11 de janeiro de 2003; b) tendo sido aberta a sucessão a partir de 11 de janeiro de 2003, aplicar-se-ão as normas do 1.829 do CC/2002 para os casos de união estável, mas aos processos judiciais em que ainda não tenha havido trânsi-
to em julgado da sentença de partilha, assim como às partilhas extrajudiciais em que ainda não tenha sido lavrada escritura pública, na data de publicação do julgamento do RE n. 878.694/MG; c) aos processos judiciais com sentença transitada em julgado, assim como às partilhas extrajudiciais em que tenha sido lavrada escritura pública, na data daquela publicação, valerão as regras dispostas no art. 1790 do CC/2002. 8. Recurso especial provido. Acórdão Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Decisão Jurisdicional - 04
Ementa AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CASAMENTO COM PESSOA CASADA. PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO INICIAL. 1. Na linha dos precedentes desta Corte Superior, o termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de indenização por dano moral é contado da ciência inequívoca dos efeitos decorrentes do ato lesivo. 2. Agravo interno não provido.
Acórdão Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Terceira Turma, por unanimidade, negar provimento ao agravo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze (Presidente), Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017
Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira (Presidente) e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator. Referência Legislativa LEG:FED LEI:010406 ANO:2002 ***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002 ART:01790 INC:00003 ART:01829 LEG:FED CFB:****** ANO:1988 ***** CF1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ART:00226 Veja (FAMÍLIA - PROTEÇÃO ESPECIAL DO ESTADO) STF - [[ADPF 132]] (SUCESSÃO - UNIÃO ESTÁVEL E CASAMENTO - ART. 1790 DO CC - INAPLICABILIDADE) STF - [[RE 878694]]-MG(REPERCUSSÃO GERAL - TEMA 809), [[RE 646721]]-RS(REPERCUSSÃO GERAL - TEMA 498) STJ - REsp 1332773-MS
Processo AgInt no REsp 1629834 / DF AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 2016/0259524-5 Relator(a) Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (1147) Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 19/09/2017 Data da Publicação/Fonte DJe 28/09/2017
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decisões jurisdicionais
Decisão Jurisdicional - 05 Ementa DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO. CERTIDÃO DE ÓBITO. UNIÃO ESTÁVEL. RECONHECIMENTO. PEDIDO JURIDICAMENTE POSSÍVEL. INTERESSE DE AGIR. 1. Ação de retificação de registro civil (certidão de óbito) ajuizada em 11/09/2009, de que foi extraído o presente recurso especial, interposto em 12/12/2013 e concluso ao Gabinete em 25/08/2016. Julgamento pelo CPC/73. 2. O propósito recursal é decidir sobre o pedido de retificação de certidão de óbito para que nela se faça constar que a falecida, filha da recorrida, convivia em união estável com o recorrente. 3. A ausência de específica previsão legal, por si só, não torna o pedido juridicamente impossível se a pretensão deduzida não é expressamente vedada ou incompatível com o ordenamento pátrio. 4. Se na esfera administrativa o Poder Judiciário impõe aos serviços notariais e de registro a observância ao Provimento nº 37 da Corregedoria Nacional de Justiça, não pode esse mesmo Poder Judiciário, no exercício da atividade jurisdicional, negar-lhe a validade, considerando juridicamente impossível o pedido daquele que pretende o registro, averbação
ou anotação da união estável. 5. A união estável, assim como o casamento, produz efeitos jurídicos típicos de uma entidade familiar: efeitos pessoais entre os companheiros, dentre os quais se inclui o estabelecimento de vínculo de parentesco por afinidade, e efeitos patrimoniais que interessam não só aos conviventes, mas aos seus herdeiros e a terceiros com os quais mantenham relação jurídica. 6. A pretensão deduzida na ação de retificação de registro mostra-se necessária, porque a ausência de expresso amparo na lei representa um entrave à satisfação voluntária da obrigação de fazer. Igualmente, o provimento jurisdicional revela-se útil, porque apto a propiciar o resultado favorável pretendido, qual seja, adequar o documento (certidão de óbito) à situação de fato reconhecida judicialmente (união estável), a fim de que surta os efeitos pessoais e patrimoniais dela decorrentes. 7. Afora o debate sobre a caracterização de um novo estado civil pela união estável, a interpretação das normas que tratam da questão aqui debatida - em especial a Lei de Registros Públicos - deve caminhar para o incentivo à formalidade, pois o ideal é que à verdade dos fatos corresponda, sempre, a informação dos documentos, especialmente no que tange ao estado da pessoa natural.
Processo REsp 1516599 / PR RECURSO ESPECIAL 2015/0037833-7 Relator(a) Ministra NANCY ANDRIGHI (1118) Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 21/09/2017 Data da Publicação/Fonte DJe 02/10/2017
7. Sob esse aspecto, uma vez declarada a união estável, por meio de sentença judicial transitada em julgado, como na hipótese, há de ser acolhida a pretensão de inscrição deste fato jurídico no Registro Civil de Pessoas Naturais, com as devidas remissões recíprocas aos atos notariais anteriores relacionados aos companheiros. 8. Recurso especial desprovido, ressalvando a necessidade de se acrescentar no campo “observações/ averbações” o período de duração da união estável. Acórdão Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Dra. FERNANDA BARBOSA PEDERNEIRAS MORENO, pela parte RECORRIDA: G F M
DECISÃO ADMINSTRATIVA - 01
DECISÃO ADMINSTRATIVA - 02
DECISÃO ADMINSTRATIVA - 03 Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017
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decisões administrativas Responsável Jurídico:
Alberto Gentil de Almeida Pedroso Juiz de Direito Titular da 8ª Vara Cível da Comarca de Santo André (TJSP). Juiz Corregedor Permanente dos Registros de Imóveis da Comarca de Santo André. Juiz Assessor da Corregedoria Geral da Justiça nas gestões 2012/2013, 2014/2015 e 2016/2017. Especialista em Direito Civil e Mestre em Direito Processual Civil. Professor da Escola Paulista da Magistratura nos Cursos de Pós-Graduação em Direito Civil, Processo Civil e Direito Notarial e Registral. Professor de Registros Públicos do Complexo Educacional Damásio de Jesus – Cursos Preparatórios para carreiras jurídicas. Coordenador do Curso Preparatório para Cartório do Complexo Educacional Damásio de Jesus. Coordenador dos Cursos de atualização e aperfeiçoamento da Uniregistral. Coordenador da Revistas Jurídicas ARISP JUS e Registrando o Direito. Autor de diversas obras jurídicas.
Decisão Administrativa - 01 Registro Civil - Reconhecimento de Paternidade -Vigência da Lei 13.257/2016, com alteração de dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente -Gratuidade de toda averbação referente ao reconhecimento de paternidade no assento de nascimento, bem como da correspondente certidão -Revogação do Provimento CNJ19/2012 -Necessidade de adequação do texto do item 124 do Capítulo XVII das Normas de Serviço. Vistos. Trata-se de pedido de providências instaurado em razão de consulta formalizada pelo Conselho Nacional de Justiça tendo em vista a entrada em vigor da Lei 13.257/2016. A Corregedoria Geral de Justiça prestou informaçs (fls. 13/15). 34
Processo (308/2017-E) Autos nº 2017/00113083 Data da Publicação/Fonte 18/08/2017 - CORREGEDORIA GERAL DA. JUSTIÇA (TJ-SP)
Aps a consulta realizada, o Con- tratar de pai preso. 124.2. Se não for requeriselho Nacional de Justiça revogou o da a gratuidade e o reconhecimenProvimento 19/2012 (fls. 114/115). to se realizar em Registro Civil das E o relatório. Pessoas Naturais diverso daquele em que lavrado o assento de nasOpino. Preceitua o item 124 do Capítu- cimento, o Oficial preparará a dolo XVII das NSCG.I: 124. Nos ca- cumentação e a entregará à parte sos de averbação de reconhecimento para o encaminhamento necessário. 124.3. No caso do subi! em de filho serão observadas as diretrizes previstas nos Provimentos n° 16 e anterior, é vedada a intermen° 19 do Conselho Nacional de Jus- diação da arrecadação e repastiça - CNJ. se dos emolumentos devidos. 124.4. Depois de averbado o 124.1. Submete-se à égide do Provimento nº 16 do Conselho Na- reconhecimento de filho no recional de Justiça -CNJ, o reconheci- gistro de nascimento, a averbamento espontâneo de filho realiza- ção correspondente no registro de do junto às Defensorias Públicas e casamento da pessoa reconhecios Ministérios Públicos dos Estados da ou no registro de nascimento de e aquele em que a assinatura lenha seus filhos será feita por este messido abonada pelo diretor do presí- mo procedimento, independentedio ou autoridade policial, quando se mente de manifestação do Ministé-
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rio Público, ou de decisão judicial Com a entrada em vigor da lei 13.257/2016, houve a alteração do texto dos parágrafos 5º e 6º do artigo 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que passaram a ter a seguinte redação: “§5” Os registros e certids necessários à inclusão, a qualquer tempo, do nome do pai no assento de nascimento são isentos de multas, custas e emolumentos, gozando de absoluta prioridade. §6° São gratuitas, a qualquer tempo, a averbação requerida do reconhecimento de paternidade no assento de nascimento e a certidão correspondente. “ A nova legislação estabeleceu a gratuidade de toda e qualquer averbação referente ao reconhecimento de paternidade no assento de nascimento, bem como da correspondente certidão, sem qualquer ressalva ou restrição. Com a modificação da legislação federal, as normas de hierarquia inferior devem ser modificadas, como é o caso do Provimento CN.I 19/2012 e do item 124 das NSCGJ. Por essas razões e tendo sido revogado o Provimento CN.I 19/2012, as NSCGJ devem ser alteradas, conforme minuta que segue.
NOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA. NO USO DE SUAS ATRIBUIÇÕES LEGAIS, CONSIDERANDO a necessidade de adequação do texto das Normas de Serviço à legislação em vigor; CONSIDERANDO a entrada em vigor da Lei 13.257/2016 e a alteração de dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente; a revogação do Provimento CNJ 19/2012;
RESOLVE: Artigo I - O item 124 do Capítulo XVII das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça passa a ter a seguinte redação: 124. Nos casos de averbação de reconhecimento de filho serão observadas as diretrizes previstas no Provimento nº 16 do Conselho Nacional de Justiça - CNJ. 124.1. Submete-se à égide do Provimento nº 16 do Conselho Nacional de Justiça - CNJ, o reconhecimento espontâneo de filho realizado junto às Defensorias Plicas e os Ministérios Plicos dos Estados e aquele em que a assinatura tenha sido abonada pelo direior do presidio ou autoridade policial, quando se tratar de pai preso. 124.2. Se o reconhecimento se Sub censura. realizar em Registro Civil das Pessoas Naturais diverso daquele em São Paulo, l7 de agosto de 2017. que lavrado o assento de nascimento, o Oficial preparará, a documentação Paula Lopes Gomes e a entregará à parte para. o encamiJuíza Assessorada Corregedoria nhamento necessário. Provimento CGJ N.º ___/2017 124.3. Os registros e certidões necessários à inclusão, a qualquer Altera a redação do item 124 do tempo, do nome do pai no assento Capítulo XVII das Normas de Servi- de nascimento são isentos de custas ço da Corregedoria Geral da Justiça. e emolumentos, gozando de absoluO DESEMBARGADOR MA- ta prioridade. Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017
124.4. São gratuitas, a. qualquer tempo, a. averbação requerida do reconhecimento de paternidade no assento de nascimento e a certidão correspondente. 124.5. Depois de averbado o reconhecimento de filho no registro de nascimento, a averbação correspondente no registro de casamento da pessoa reconhecida ou no registro de nascimento de seus filhos será feita por este mesmo procedimento, independentemente de manifestação do Ministério Público, ou de decisão judicial. Artigo 2º - Este provimento entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposiçs contrárias. São Paulo, MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS Corregedor Geral da Justiça CONCLUSÃO: Em 18 de agosto de 2017, faço estes autos conclusos ao Desembargador MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS, Corregedor Geral da Justiça do Estado de São Paulo. Eu, ( • ), Escrevente Técnico Judiciário do gabinete, subscrevi. Aprovo, pelas razões expostas, a edição do Provimento sugerido, conforme minuta apresentada, a ser publicado, juntamente com o parecer, no D.JE. Publique-se. São Paulo, 18 de agosto de 201/7. MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS Corregedor Geral da Justiça 35
decisões administrativas
Decisão Administrativa - 02
CONCLUSÃO Em 02 de maio de 2017, conclusos ao Excelentíssimo Senhor Desembargador PEREIRA CALÇAS, DD. Corregedor Geral da Justiça do Estado de São Paulo. SENTENÇA ESTRANGEIRA - DIVORCIO CONSENSUAL AVERBAÇÃO NO REGISTRO CIVIL - Falta de homologação perante o E. STJ, requisito previsto no CPC de 1973, que inviabilizava a averbação - Novo CPC que dispensou prévia homologação para tanto Ausência, porém, de preenchimento dos requisitos traçados no art 2° do Provimento 53/16 do E. CNJ - Averbação negada - Recurso Desprovido. Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça, cuida-se de recurso interposto em face de r. sentença que entendeu pela impossibilidade de averbação de sentença estrangeira de divócio consensual, por ausência de prévia homologação perante o E. STJ. Com a entrada em vigor do CPC de 2015, a homologação tornou-se desnecessária para hipóteses tais. Seguiu a Sra. Oficiala entendendo pela impossibilidade de averbação, pela ausência de preenchimento dos requisitos do art. 2o do Provimento 53/16 do E. STJ. Sustenta o recorrente ter havido erro da Sra. Oficiala, ao averbar casamento ocorrido no exterior depois de já haver averbado divórcio do casamento brasileiro, realizado poste36
riormente ao do exterior. Requereu o cancelamento da averbação do casamento estrangeiro. O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso. É o relatório. Pretendia o recorrente, originariamente, a averbação, em seu registro civil, de sentença estrangeira de divórcio. Ao tempo em que suscitada a dúvida, vigorava a Lei Processual Civil de 1973, que impunha, como condição para a averbação buscada, prévia homologação da sentença estrangeira, a ser postulada perante o E. STJ. O recorrente, todavia, não a havia providenciado, o que bastava para o veto da Sra. Registradora. Ao longo do procedimento, entrou em vigor o Código de Processo Civil de 2015, cujo art. 961, § 5º, expressamente dispensou a homologação da sentença estrangeira de divórcio consensual como condição para que produza efeitos no Brasil. Não obstante, por meio do Provimento 53/16, o E. CNJ regrou a averbação direta de sentença estrangeira de divórcio consensual. O respectivo art. 2º determina: “Para avemação direta, o interessado devera apresentar, no Registro Civil de Pessoas Naturais junto ao assento de seu casamento, cia integral da sentença estrangeira, bem como comprovação do trânsito em julgado, acompanhada de tradução oficial juramentada e de chancela consular.”
Recurso Administrativo n° 0000469-62.2016.8.26.0268 Autos nº (2072017-E) Data da Publicação/Fonte 02/05/2017 - CORREGEDORIA GERAL DA. JUSTIÇA (TJ-SP)
Nenhum dos requisitos elencados na norma supramencionada (apresentação de cia da sentença estrangeira, comprovação do respectivo trânsito em julgado, tradução oficial juramentada e chancela consular) foi cumprido pelo recorrente. Em síntese, quer pela inobservância das exigências do Código de Processo Civil de 1973, vigente ao tempo da suscitação, quer pela falta de atendimento das condições previstas no art. 2º do Provimento 53/16 do E. CNJ, inviável a averbação almejada. Por fim, tampouco possível analisar, nesta instância e pela vez primeira, eventual cancelamento da averbação do casamento ocorrido no exterior, sequer debatido em primeiro grau. Por todo o aduzido, o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de se negar provimento ao recurso administrativo. Sub censura. São Paulo, 15 de maio de 2017. Iberê de Castro Dias Juiz Assessor da Corregedoria DECISÃO Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso administrativo. Publique-se. São Pauto, 17 de mato de 2017. Manoel de Queiroz Pereira Calças Corregedor Geral da Justiça
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Decisão Administrativa - 03
CONCLUSÃO Em 8 de maio de 2017, conclusos ao Excelentíssimo Senhor Desembargador PEREIRA CALÇAS, DD. Corregedor Geral da Justiça do Estado de São Paulo. REGISTRO CIVIL - Conversão de união estável em casamento com pedido dispensa de regime obrigatio de bens e adoção do regime convencional de separação - Decisão que determinou a intimação da ex-cjuge -Desnecessidade -Regime da separação obrigatia que se imp -Recurso provido em parte. Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça. Trata-se de pedido de providências instaurado pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do 30° Subdistrito do Ibirapuera. Os interessados requereram a conversão de união estável em casamento e pediram a dispensa do regime da separação obrigatia de bens e a adoção do regime de separação de bens, conforme pacto antenupcial. Como se trata de casamento a ser celebrado com inobservância de causa suspensiva, os autos foram remetidos ao Juiz Conegedor Permanente. O Juiz Conegedor Permanente determinou a intimação da ex-conjuge do requerente Nelson, porquanto seu interesse é tutelado pelo disposto no inciso III do artigo 1.523 do Có-
digo Civil. Contra essa decisão, foi interposto o recurso administrativo que ora se aprecia. A D. Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo acolhimento do ^8 recurso (fls. 112/115). H 9. É o breve relato. Passo a opinar. Inicialmente, é o caso de se afastar a decisão de fls. 66 do MM Juiz Conegedor Permanente, na qual foi determinada a intimação da ex-conjuge, por entender que seu interesse é tutelado pelo disposto no artigo 1.523, parágrafo único, do Código Civil. De fato, não se cogita da intimação de ex-conjuge em processo de habilitação de casamento, porquanto independe do seu consentimento qualquer uma das disposições relativas ao ato a ser praticado. Não cabe ao Juiz Conegedor Permanente conferir caráter contencioso ao procedimento de habilitação, notadamente, para incluir ex-conjuge de um dos requerentes. Assim, o recurso deve ser provido, em parte, apenas para afastar a decisão que determinou a intimação da ex-conjuge. No mais, e ainda que o pedido de dispensa do regime da separação obrigatória não tenha sido apreciado pelo Juiz Corregedor Permanente, considerado o tempo transcorrido desde orequerimento de habilitação, imp-se o enfrentamento da questão. E, respeitadas as razs do reque-
Ano 01 – Edição 01 – Novembro/Dezembro de 2017
Recurso Administrativo n° 1011394-85.2017.8.26.0100 Autos nº (199/2017-E) Data da Publicação/Fonte 08/05/2017 - CORREGEDORIA GERAL DA. JUSTIÇA (TJ-SP)
rimento e os argumentos do Ministério Publico, o pedido de dispensa do regime da separação obrigatia de bens e de adocão do regime da separação convencional de bens deve ser rejeitado. Inicialmente, importa diferenciar o regime de separação obrigatia de bens do regime da separação convencional. Diz-se convencional o regime da separação de bens que decorre da manifestação de vontade dos nubentes, exteriorizada durante a fase de habilitação, mediante pacto antenupcial formalizado por escritura pública. Por sua vez, o regime da separação é obrigatio quando decorre de imperativo legal e não da vontade das partes. Essa imposição ocorre sempre que o casamento é realizado em determinadas circunstâncias excepcionais e taxativamente previstas no ordenamento. Trata-se de exceção ao princípio da autonomia privada e à regra geral que confere aos nubentes o direito de escolherem o regime de bens que regerá as relaçs patrimoniais da futura sociedade conjugal (princípio da liberdade de escolha). No nosso sistema legal, o casamento celebrado com infringência de um dos incisos do artigo 1.641 do Código Civil terá como consequência a obrigatoriedade da adoção do regime da separação de bens. O Código Civil enumera, em seu artigo 1.523, situações em que não se 37
decisões administrativas deve casar. Ao fazê-lo, enumera as chamadas causas suspensivas. A despeito da disposição imperativa, é certo que o referido artigo, ao dispor sobre quem não deva se casar, não proibiu o casamento em tais circunstâncias. Diferentemente, o que se procurou foi desestimular o casamento em certas situaçs. Os cjuges que vierem a se casar em tais circunstâncias, desrespeitando o imperativo legal, são punidos com o cerceamento do direito à liberdade de escolha do regime de bens, restando-lhes, exclusivamente, o regime da separação. As causas suspensivas estão relacionadas no artigo 1.523 do código Civil. E, no caso destes autos, o regime da separação obrigatia se impe porque o requerente Nelson, conquanto divorciado, não realizou a partilha dos bens do seu anterior casamento. E são diversas as consequências jurídicas conforme se adote um o outro regime de bens. Exemplificando: 1) conjuges casados sob o regime da separação obrigatória de bens não podem contratar sociedade entre si ou com terceiros (artigo 977 do Código Civil). A restrição não se aplica ao regime da separação convencional de bens; 2) Segundo interpretação dominante do artigo 1.647 do Código Civil, no regime da separação convencional, nenhum dos conjuges pode, sem autorização do outro: i) alienar ou gravar de uso real os bens imóveis; ii) pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; iii) prestar fiança ou aval; iv) fazer doação, não sendo remuneratia, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação. 3) No regime da separação convencional de bens, o conjuge sobrevivente tem direito à herança, em concorrência com os descendentes (artigo 1.829, inciso I, do Cigo Civil). Além disso, na forma do §2° do artigo 1.693 do Código Civil, eventual pedido para a alteração do regime da separação obrigatória de bens somente será possível quando superada a circunstância que deu causa à imposição, isto é, quando promovi38
da a partilha dos bens integrantes do anterior casamento. Caso adotado o regime da separação convencional de bens, eventual pedido de alteração do regime de bens não dependerá de prova nesse sentido. Em suma, em que pesem as razões deduzidas e ao contrário do que se supõe, não é possível afastar a aplicação da Lei, impondo-se a adoção do regime da separação obrigatia de bens. E, nos termos do item 65 do Capítulo XVII das NSCGJ, como transcorreram noventa dias a contar da data de extração do certificado, os requerentes deverão dar início a novo pedido de habilitação. Ante o exposto, o parecer que submeto a Vossa Excelência propõe, respeitosamente, que se dê parcial provimento ao recurso, com o afastamento da decisão que determinou a intimação da ex-conjuge e impondo a adoção do regime da separação obrigatia de bens. Sub censura. São Pauto, 9 de maio de 2017. Paula Lopes Gomes Juíza Assessora da Corregedoria Recurso Administrativo 1011394-85.2017.8.26.0100
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DECISÃO Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora da Conegedona e, por seus fundamentos, que adoto, dou parcial provimento ao recurso administrativo para afastar a decisão que determinou a intimação da ex-cjuge e impor aos requerentes a adocão do regime da separação obrigatia de bens. Publique-se. São Paulo, 9 de maio de 2017. Manoel de Queiroz Pereira Calças Corregedor Geral da Justiça
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