O uso de filme na aula de história

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Presley Renato Rocha da Silva

O ensino de história e suas metodologias já promoveram vários debates teóricos na tentativa de construir uma estratégia eficaz da aplicação desse ensino, que por sua vez, estimule o educando a ser um sujeito pensante diante de sua sociedade. O cinema, como recurso didático (apenas como recurso), trás consigo uma interessante forma de abordar os conteúdos da historiografia, dependendo da habilidade do professor em lidar com este auxílio de ensino, que levará o aluno para outra dimensão, sendo para o mesmo é bem mais interessante do que a leitura, que pode desaguar em excelentes resultados para o ensino de história. Entretanto, o educador tem que estar atento para o desempenho do filme como recurso didático. Pois, cada aluno carrega as mais variadas experiências díspares entre eles, logo, talvez o resultado em assistir o filme não haverá opiniões coerentes entre a imagem com o conteúdo da história, ou melhor, eles não entenderão o porquê de estarem assistindo tal filme se não acontecer um direcionamento de antemão do professor referente ao filme. A produção fílmica, assim como a historiografia, é uma construção humana. Portanto, está repleta de erros e coerências e admite uma reformulação no ato de pensar aquela temática, não é a dona da verdade. A produção fílmica ao longo do século XX esteve auxiliando várias nações em seus respectivos projetos de autoafirmação no poder, sendo eles: Na Europa, com os sistemas totalitários Nazifascistas, antes e durante a segunda guerra mundial; No Brasil, no decurso do regime de Estado Novo de Getúlio Vargas; Nos Estados Unidos, durante a guerra fria com as produções hollywoodianas. Entre muitas outras que poderia utilizar como exemplo. Contudo, devemos levar em consideração que a utilização por esses aparelhos de Estado seria a manipulação ideológica de suas próprias populações, sendo que, é necessário entender que há particularidades, não obstante todos enfatizam nestes filmes, a exaltação do país.


O professor, quando fazer uso deste recurso didático, tem que estar atento ao discurso do filme e fazer um prévio direcionamento da aula. Para que, não haja no entendimento do aluno apenas o objetivo do diretor do filme, e assim, o aluno obterá dificuldades em relacionar com os conteúdos. De acordo com Katia Maria Abud em “A construção de uma Didática da História: algumas ideias sobre a utilização de filmes no ensino”, criticando a realidade da relação do ensino de história com a produção cinematográfica, ela afirma: O filme é mais utilizado como um substituto do texto didático ou da aula expositiva, ou é ainda considerado uma ilustração que dá credibilidade ao tema que se está estudando. (ABUD, 2003, p. 189). No ensino fundamental, no qual, o público deve ser restrito a muitas cenas impróprias por seu conteúdo, à atenção do educador ampliasse. Pois, esta categoria de alunos não possui maturidade suficiente para avaliar a complexidade das cenas. Então, cabe ao professor situar o aluno, assim como na leitura, para que o mesmo tenha bases sólidas para ponderar a respeito do filme e perceber que o filme é simplesmente um discurso e não a verdade em si. No filme “A história oficial”, uma produção do cinema argentino, cujo filme se passa na Buenos Aires do período ditatorial, marcado por manifestações

da

população

buscando

informações

sobre

familiares

desaparecidos durante a guerra das Malvinas, que por sua vez, destruiu muitas famílias dos militantes. Alicia, a personagem que protagoniza o drama, é uma professora de história integradora, afinal seu marido possui uma boa condição perante o regime, e apegada às verdades da classe burguesa desta cidade. Em contrapartida, está basicamente alienada ao processo histórico-social de espoliação e repressão por parte do Estado argentino à população menos favorecida. Isto se justifica na passagem, na qual, os alunos implicam em utilizar fontes não oficiais para contrapor ao conteúdo por ela proposto, e ela disse: “isto é uma aula de história, não um debate”.


Esta fala é bastante insustentável, pois, uma aula de história sem um debate é simplesmente, um discurso de “verdade” do professor. Além disso, não estimula a curiosidade e muito menos a criatividade do aluno em pensar e criticar a sua realidade enquanto cidadão. Portanto, o ensino de história não está sendo usado no contexto deste filme, assim como descreve Selva Guimarães Fonseca no capítulo “O ensino de história e a construção da cidadania”, para emancipar o indivíduo, isto é, torná-lo um cidadão participativo e contribuinte, referente a questionamentos sociais, que busca a melhoria da sociedade como um todo. Mas, coabita com a abordagem positivista, que enaltece os grandes homens e faz uma leitura estatal da história e não verifica a posição do restante da população. Propõe deste modo, uma disciplina decoreba, memorizar fatos e datas e nunca há reflexão do processo histórico. Levando em consideração as especificidades dos locais, no Brasil de Getúlio Vargas esta perspectiva foi muito semelhante à Argentina. A escola metódica predominava no sistema educacional desde o inicio do século, com Vargas esta situação não se modificou. Apenas ampliou-se. Visto que, o fenômeno da ideologia social nacionalista da Europa influenciou bastante a política do Estado Novo. E assim como demonstra no inicio deste texto, o cinema contribuiu para o fortalecimento do aparelho de Estado. Na educação, Vargas pretendendo formar “cidadãos” para seu tipo de nação, não hesitou no uso do cinema para o ensino de história. Esses filmes sempre trabalhavam com a lógica da exaltação da pátria, cuja moral residia no fato de que aquelas cenas era a mais pura verdade do ocorrido. Esta percepção de verdade, embora seja muito combatida pelos teóricos, ainda persiste entre as pessoas não instruídas academicamente. Partindo deste pressuposto, o aluno pode pensar naturalmente que assistir o filme tem a mesma eficácia de uma competente exposição de seu professor. Katia Maria Abud cita: “O cinema seria um bom recurso, pois atrairia a atenção dos jovens mais que as aulas e exposições orais pelo professor em sua sala de aula” (ABUD, 2003, p. 188). Então, o cinema pode ser uma excelente ferramenta no ensino de história, desde que o filme transmitido tenha um


direcionamento, seja para criticá-lo enquanto uma distorção do passado de uma sociedade ou, no caso de um bom filme, passar uma ideia de como eram as vestes, comidas, costumes e etc. Assim como estipula os PCN’s, no ensino fundamental poderia transmitir, através da imagem cinematográfica, e exercitar a noção de mudança e permanência de sua sociedade; habilitá-lo para o debate das diferenças culturais dos demais povos, qualificando-o para o respeito mútuo das diferenças. Deste modo, o uso da produção fílmica alcançará um excelente desempenho nas crianças do ensino fundamental. Portanto, considera-se que é um ótimo recurso didático, o cinema. Entretanto, o professor necessita de muita cautela, do contrário ele poderá estar contribuindo para uma má formação leitora de seus alunos. Eles julgarão que assistir um filme, consideravelmente requer menos trabalho. Logo que, estamos convivendo em um sistema capitalista que exige diplomas e não competência. Então, a profissão de educador, nesta realidade, ordena a um sistema sumariamente de extrema facilitação e não de mediador do ensino. Apenas o professor é quem trabalha e o aluno tem que pegar pronto e acabado. Enfim, o professor para exercer sua profissão com qualidade tem que ter habilidade para não ser mais uma peça deste sistema espoliativo, cujo objetivo está na lógica de formar mão de obra e não cidadão. Deste modo, cabe ao professor, precisamente da área de história, despertar a vontade do aluno em aprender, descobrindo por si os caminhos para uma boa formação e não somente informação. O exercício pleno do filme tem que estabelecer relações com os conteúdos, senão o mesmo não obterá significância para o aluno e será um fato isolado, sem conexão. O sentido de reproduzir um filme, ainda que para alunos do ensino fundamental não tenha maturidade para entender a complexidade da trama, selecionar cenas bastante significantes e produzir um pequeno texto para auxiliá-lo no entendimento do conteúdo, afim de que a necessidade da leitura não se dilua em suas concepções embora o mundo sedutor da imagem atraia para “lei de menos esforço”. Então, o professor precisa trabalhar este fascínio da imagética em benefício do conhecimento e não simplesmente do facilitamento.


Referências ABUD, Katia Maria. A construção de uma didática da história: algumas ideias sobre a utilização de filmes no ensino. História [online]. 2003, vol. 22, n. 1, pp. 183-193. FONSECA, Selva Guimarães. O ensino de história e a construção da cidadania. In: Didática e Prática de Ensino de História: experiências, reflexões e aprendizados. 3ª edição, Campinas-SP: Papirus, 2003, pp. 89-96.


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