Engajados com os objetivos do milênio
EXPEDIENTE
Diretor executivo: Odilon Luís Faccio Diretora de redação: Maria José H. Coelho (Mte/PR930) Editora Chefe: Sara Caprario (MTe/SC 625-JP) Redação: Sara Caprario, Vanessa Pedro (MTe/SC 831-JP), Alessandra Mathyas, Raquel Sabrina Edição de Arte: Maria José H. Coelho Sandra Werle (MTe/SC 515-JP) Assistentes de diagramação e arte: Léo Bretas Fotografia: Sérgio Vignes, Vinicius Carvalho e Divulgação Colaboradores: Clemente Ganz Lúcio, Larissa Barros, Michelle Lopes, Pieter Sijbrandij, , Reginaldo Magalhães, Ricardo Young, Ronaldo Baltar, Vinicius Carvalho Secretaria : Lilian Franz Distribuição: Mônica Funfgelt
Parceiros Institucionais Banco do Estado de Santa Catarina (BESC) Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Fundação Vale do Rio Doce (FVRD) Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) Instituto Observatório Social Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social News Wire Comunicação Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento(PNUD/ Brasil) Rede de Tecnologia Social (RTS) Julho de 2008
R. João Pinto, 30, Ed. Joana de Gusmão, s 803 Florianópolis - SC - Brasil - 88010-420 F: (48) 3025-3949 / Fax:3028-4615 contato@primeiroplano.org.br
Os artigos e reportagens assinados não representam, necessariamente, o ponto de vista das organizações parceiras e da revista Primeiro Plano. A divulgação do material publicado é permitida (e incentivada), desde que citada a fonte.
Quando abordamos os assuntos relacionados à responsabilidade social empresarial e desenvolvimento sustentável, abrangemos praticamente a totalidade dos interesses pertinentes ao bem estar da sociedade. E nesse entrelaçamento de temas, esperamos que as diversas expectativas da sociedade sejam incorporadas aos negócios e nas políticas públicas para que tenhamos como resultado um mundo melhor e mais equilibrado. Os 8 Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODMs), preconizados pelas Organizações das Nações Unidas (ONU), organizam esta teia e pontuam metas a serem alcançadas, tendo como eixo principal a erradicação da pobreza no mundo, a sustentabilidade e a cooperação entre os países. Isso permite mensurar os efeitos das políticas públicas aliadas às iniciativas das organizações não governamentais e das empresas. É possível avaliar o que está sendo feito, quais caminhos estão sendo utilizados e o quanto melhorou a vida das pessoas.e dos países. Este trabalho é coordenado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), órgão que tem o mandato de promover o Desenvolvimento Humano Sustentável no mundo. Por existir congruência entre a missão corporativa do PNUD e os objetivos do Instituto Primeiro Plano, no que tange à disseminação de mensagens relevantes para o Desenvolvimento Humano Sustentável, assim como a adoção de ações concretas que promovam a inclusão, o desenvolvimento e a justiça social, foi assinado em junho um Memorando de Entendimento entre as partes. O evento foi em Brasília, na sede do PNUD, com a presença da presidente do Instituto, Maria José Coelho e Ana Rosa M. Soares em nome do representante residente do PNUD no Brasil, Kim Bolduc. O Memorando prevê a concretização de um plano de ação com objetivos claros de difusão dos 8 ODMs através de matérias publicadas aqui, organização de eventos como seminários ou palestras e utilização do site do Instituto Primeiro Plano (www.primeiroplano.org.br) para colaborar nesta divulgação. Esperamos oferecer ao nosso público-alvo acesso regular aos assuntos relacionados aos 8 ODMs e, a partir disto, estejam mais sensibilizados e passem a atuar para que suas instituições se engajem na promoção destas metas assinadas por 191 países em 2000 na Declaração do Milênio. (Leia a matéria nas páginas 22 e 23). Seguindo nossa política de difundir as boas práticas, temos nesta edição uma matéria com destaque para os 10 anos da certificação FSC e a indústria de papel e celulose . Neste edição também tem, uma entrevista especial com o diretor de Assuntos Institucionais da Alcoa, Nemércio Nogueira e na área de desenvolvimento sustentável, apresentamos a terceira matéria da série Energias Renováveis e mostramos como evolui a indústria movida pelo vento. Boa leitura!
REVISTA dez
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INCLUIR
ENTREVISTA
Adequação às normas internacionais e cuidados socioambientais
Agricultores da Amazônia se organizam em cooperativas
Diretor da Alcoa relata como a empresa evolui no tema sustentabilidade
06 | POR EXEMPLO
24 | PLANETA PAPEL
48 | ENSAIO FOTOGRÁFICO
08 | ARTIGO Regi Magalhães|BANCO MUNDIAL
28 | ENERGIA EÓLICA
56 | MEU MUNDO
42 | PERFIL: FUNDAÇÃO BANCO DO BRASIL
58 | SOLUÇÕES
16 | OPINIÃO Ricardo Young | ETHOS
PRIMEIRO PLANO . ANO 3 . NO 10 . JULHO 2008
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CERTIFICAÇÕES
44 | AMBIENTE 18 | MUNDO DO TRABALHO 46 | DESENVOLVIMENTO LOCAL 20 | ARTIGO Clemente Ganz Lúcio | DIEESE 22 | OBJETIVOS DO MILÊNIO
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você sabia?
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Segundo estimativa de um estudo conduzido pelas ONGs Conservação Internacional (CI) e The Nature Conservancy, além da Universidade Federal de Goiás e divulgado pelo O Estado de São Paulo, manter o cerrado remanescente em pé e reflorestar as áreas degradadas do bioma podem render no mínimo US$ 20 bilhões, cerca de R$ 35 bilhões em crédito de carbono. Os pesquisadores mapearam as regiões com cobertura vegetal abaixo da prevista pelo Código Florestal para o bioma (35% para as áreas de cerrado localizadas na Amazônia Legal, 30% no Piauí e 20% nas demais) e aquelas que mantêm a vegetação original acima desse limite. A idéia era checar quanto é possível gerar de créditos de carbono em duas frentes: com o reflorestamento das áreas degradadas e com o desmate evitado das que se mantêm conservadas. E medir também quão eficiente o bioma é em seqüestrar carbono. “Cada hectare do cerrado é capaz de retirar até duas toneladas de CO2 da atmosfera por ano. É mais do que o estimado para a Amazônia, de uma tonelada por hectare, apesar de lá a biomassa ser maior”, comenta o diretor do Programa CerradoPantanal da CI, Ricardo Machado.
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Modelo sustentável de negócio
O
s dez anos do Instituto Ethos marcam um importante redirecionamento das empresas brasileiras: a incorporação de objetivos sociais e ambientais às metas econômicas para tornar possível o desenvolvimento de uma sociedade sustentável. Atento a conjuntura global, o Instituto alinha o país ao movimento mundial de consciência das empresas, realizando a articulação das melhores práticas com políticas públicas voltadas para inclusão social, erradicação da pobreza e da fome, combate à corrupção e proteção ambiental. Nas comemorações dos 10 anos do Instituto Ethos, serão realizados cinco eventos de forma simultânea e direcionados a diferentes públicos, além da Conferência Internacional, em sua quinta edição. Será realizada a primeira Mostra de Tecnologia de Sustentabilidade, uma exposição sobre os dez últimos anos do movimento de responsabilidade social empresarial e o encontro dos membros do Conselho internacional do Instituto Ethos. Destaque nas comemorações, a Mostra visa tanto a ampliação do uso de tecnologias sustentáveis pelos indivíduos e organizações como o estímulo de organizações públicas e privadas a intensificarem o desenvolvimento desses processos. A Conferencia Internacional também passará por mudanças em 2008 e terá como tema central o mercado socialmente responsável. Para o Ethos, o desenvolvimento sustentável precisa de mudanças no relacionamento da sociedade com o meio ambiente e com as organizações, criando uma cultura de sustentabilidade ligada a cultura de negócios. De maneira geral, a característica principal das 1378 empresas associadas ao Ethos é o interesse em estabelecer padrões éticos de relacionamento com os stakeholders: funcionários, clientes, fornecedores, comunidade, acionistas, poder público e com o meio
Instituto completa dez anos como a principal referência em responsabilidade social e sustentabilidade empresarial no país ambiente. Estratégia que cabe a qualquer tipo de empresa, os associados do Instituto têm faturamento anual correspondente a cerca de 35% do PIB brasileiro e empregam mais de 2 milhões de pessoas. Referência no Brasil e no mundo, o Ethos dissemina a prática de responsabilidade social por meio de troca de experiências através de conferências, debates e encontros com empresas e através de publicações e informações especificadas em manuais e ferramentas de gestão, instrumentos de disseminação, avaliação e planejamento que oferecem uma linha de programas educacionais sobre cidadania empresarial, ética, indicadores sociais, ambientais, culturais e de direitos humanos que auxiliam as empresas a incorporar às suas atividades passo a passo o conceito de negócio sustentável, buscando promover o aprendizado por meio das melhores práticas e ferramentas nessa área empresarial. Há alguns anos, o Instituto amplia suas atividades para projetos diferenciados, que buscam entender e buscar a criação de uma sociedade sustentável, como o Movimento Nossa São Paulo e o Fórum Amazônia Sustentável. A idéia do Amazônia Sustentável é criar ou fortalecer práticas de produção e valorização dos recursos da região em benefício da população local. Já o movimento “Nossa São Paulo: Outra Cidade” é inspirado no projeto realizado na capital da Colômbia, Bogotá. Lá, a partir da participação popular e da transparência das lideranças na prestação de contas foi possível im-
Projeto Ethos 10 Anos Pesquisa de RSE - A ser lançada na Conferência Internacional 2008 a pesquisa de Responsabilidade Social está sendo realizada em parceria entre o Instituto Ethos, o Instituto Akatu pelo Consumo Consciente e o Ibope. O objetivo é avaliar o movimento nacionalmente, com a perspectiva de identificar estágios de engajamento das empresas brasileiras no movimento. Encontros com Empresas Associadas – O Instituto estabeleceu uma agenda de encontros da diretoria e da equipe do Ethos com empresas associadas para 2008. Estes encontros serão um espaço de troca de experiências em diversos Estados brasileiros, onde participantes serão convidados a apresentar suas experiências, projetos, dilemas e iniciativas realizadas durante os dez últimos anos. O objetivo é conhecer e compartilhar avanços regionais, para que seja possível traçar um diagnóstico mais preciso sobre atitudes e estratégias. Encontros com Presidentes de Empresas - O Ethos estabeleceu uma agenda de encontros com presidentes de empresas com objetivo de criar um diagnóstico de resultados que a organização quer traçar com relação às estratégias e direções seguidas nos últimos dez anos.
INSTITUTO VONPAR
POR EXEMPLO
Com essas e muitas outras iniciativas o Instituto propõe-se a ampliar os canais de diálogo com a sociedade civil e governos para reforçar o compromisso do setor empresarial com outro modelo de desenvolvimento: empreender esforços para aprofundar e reconhecer alternativas concretas de processos, produtos e serviços de baixo impacto ambiental, inovadores e promotores da inclusão social. Segundo Ricardo Young, presidente do Ethos, há a tendência de aceleração do comprometimento com a sustentabilidade. "Vejo que é necessário fazer a mudança de maneira mais rápida. É necessário que as evidências das ações concretas e seus resultados comecem a aparecer para provocar um maior compromisso das organizações, privadas ou públicas. É com esse grande desafio que o Ethos quer se alinhar nos próximos dez anos”.
Com o objetivo de contribuir para a inclusão de pessoas em situação de risco por meio do fomento a geração de renda nas periferias urbanas, a Vonpar Refrescos, franqueada da CocaCola no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, lançou o Instituto Vonpar. A entidade opera nos dois estados do sul, elegendo a reciclagem como meio de promoção humana, desenvolvimento social e preservação ambiental. O Instituto funciona como uma agência de cooperação técnica e financeira, financiando com recursos não-reembolsáveis, disponibilizados anualmente por meio de editais públicos. Na primeira etapa do Concurso de Projetos de Reciclagem, lançada em setembro de 2007 no Rio Grande do Sul, inscreveram-se 40 projetos e 25 foram escolhidos. O total do repasse às entidades classificadas será de R$ 690 mil até o final de 2008. Em Santa Catarina, o Concurso de Projetos foi lançado em 19 de maio e deverão ser aplicados R$ 400 mil nos projetos selecionados. Léo Voigt, diretor executivo do Instituto Vonpar, diz que a instituição almeja construir políticas sociais que viabilizem “portas de saída” para programas governamentais de renda mínima, bem como fortalecer os vínculos familiares e o papel provedor dos adultos no interior dos lares, erradicando o trabalho infantil. A Vonpar atende a aproximadamente 13 milhões de pessoas em sua área de cobertura, gera 2,5 mil empregos diretos e a quarta maior fabricante de Coca-Cola no Brasil.
RÔ REITZ
Exposição 10 Anos do Movimento de RSE no Brasil - A exposição pretende mostrar ao visitante toda a trajetória percorrida pelo Instituto Ethos desde sua criação, há 10 anos, e a contribuição que a organização tem dado ao movimento de responsabilidade social empresarial no Brasil e no mundo. O conteúdo da exposição terá como base um paralelo entre as ações desenvolvidas pelo Ethos e por seus parceiros e os acontecimentos e situações que as motivaram.
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plementar melhorias significativas em relação aos índices de qualidade de vida, de segurança e de saúde, entre outros. A proposta é motivar a participação dos paulistanos, transformando a cidade de São Paulo num lugar melhor para se viver. Além dessas novidades, o Instituto passou a replicar suas melhores práticas para outros seis países da América Latina, onde serão multiplicadas e difundidas: os Indicadores Ethos, Prêmio Ethos de Jornalismo e Rede Ethos de Jornalistas são exemplos de atividades que serão aplicadas à Bolívia, Colômbia, Equador, Guatemala, Paraguai e Peru. Essa é a proposta do Programa Latino-Americano de RSE, anunciado durante a Conferência 2007. Essas experiências serão implantadas em cada um dos países em três frentes de ação: Ferramentas de RSE; RSE na Mídia; e RSE e o Combate à Pobreza.
OPINIÃO
Empresas e Sociedade Civil
REGI MAGALHÃES Doutorando da Universidade de São Paulo. Especialista em Sociedade Civil da Corporação Financeira Internacional
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(IFC/Grupo Banco Mundial).
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Empresas não estão isoladas do ambiente social, cultural e político dos quais dependem para se consolidar, nem são impermeáveis às pressões externas. Organizações da sociedade civil provocaram nas últimas décadas grandes transformações nos mercados. Fortes campanhas contra as empresas de petróleo, de mineração, instituições financeiras, contra a exploração de madeira e a pesca predatória, contra a produção de soja ou de biocombustíveis, por exemplo, estão obrigando as empresas a criar novas regras de produção e novas formas de organização dos mercados. Movimentos sociais que até então eram apenas agentes de contestação passam a agir como “empreendedores institucionais”, como define o professor da Universidade de Indiana, Tim Bartley. As organizações sociais passam a ter cada vez maior poder na definição das regras do jogo. Quando militantes vestidos como barões chamaram a população para cortar seus cartões de crédito nas portas das agências na Europa e Estados unidos, em pouco tempo grandes e poderosos bancos passaram a adotar critérios de avaliação de impacto social e ambiental nos seus financiamentos. Quando militantes fanta- “Grande parte das siados de frango, chamaram a atenção dos con- decisões estratégicas sumidores que estariam comendo a Amazônia das empresas não ao se deliciarem com seus hambúrgueres, em podem mais ser poucos dias, as grandes indústrias de soja ado- tomadas apenas no taram uma moratória para impedir que o produ- interior dos gabinetes” to fosse plantado em áreas desmatadas. Grande parte das decisões estratégicas das empresas não podem mais ser tomadas apenas no interior dos gabinetes. Importantes decisões passam a ser objetos de debate em espaços públicos onde controvérsias precisam ser negociadas entre diversos grupos sociais, empresariais e governamentais. Por isso, mais do que poder econômico e competências técnicas, as empresas dependem cada vez mais do aperfeiçoamento de habilidades de comunicação e de relacionamento para contruir credibilidade, liderança, legitimidade, transparência, aceitação pública e aprovação governamental. Para isso, as empresas precisam especialmente de bons laços sociais, de se inserir em redes de relacionamento que permitam acesso a informações, aprendizado e identificação de oportunidades. Isso não quer dizer que os conflitos e as divergências sejam ofuscados, mas que a aproximação entre as ONGs e movimentos sociais com as empresas permita que as fronteiras ideológicas e as diferenças de pensamento e de interesses não sejam empecilhos para o debate. O que mais reforça essa idéia é o fato de um grande número de empresas, ONGs e movimentos sociais estarem construindo parcerias para solucionar problemas sociais e ambientais. O monitoramento dos impactos ganha credibilidade quando legítimas organizações da sociedade civil participam diretamente, com livre acesso a informações e poder de avaliação sobre o desempenho das empresas. Organizações da sociedade civil vêm aperfeiçoando sofisticados sistemas de monitoramento e conhecimento técnico e científico, agregando às empresas maior capacidade de avaliação e mitigação de impactos, assim como, ampliam possibilidades de empresas desenvolverem políticas estratégicas de responsabilidade social e de identificar oportunidades de negócios sustentáveis.
CERTIF
Oportunidades e desafios
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FSC A certificação FSC (Forest Stewardship Council ou Conselho de Manejo Florestal) completou 15 anos. Criada em 1993 especialmente como uma resposta ao desmatamento das florestas tropicais no mundo, a ONG foi idealizada (em 1993) por um grupo que incluía madeireiros, silvicultores, ambientalistas, movimentos sociais, povos indígenas e artesãos de 26 países, com o propósito de conservar as florestas.
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ICAÇÃO Nesses 15 anos do FSC, a certificação avançou muito em florestas naturais temperadas, a Suécia tem a maior extensão de florestas certificadas no mundo. No entanto, nos trópicos, a complexidade socioambinetal aliada à questão fundiária, são os principais entraves para o crescimento da certificação de florestas naturais. Maior produtor de madeira
tropical, o Brasil forneceu, segundo a Cypress Associates, 24,5 milhões de m3 em 2004, dos quais mais de 60% foram provenientes de extração ilegal (sem autorização do governo, ou às custas de propinas à fiscalização e com mão –de- obra explorada e em situação irregular). Somente 2% eram certificados. O FSC é um selo com gran-
de valor no mercado nacional e internacional e certifica a maior área de florestas. É ainda o órgão com maior credibilidade e reconhecimento da sociedade. Isso acontece porque é o único sistema voluntário, composto, de fato, pelos setores empresarial, social e ambiental, com independência, transparência e participação social. Além da representativi-
* Os autores são do Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola) www.imaflora.org.br
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Priscila Mantelatto e Luís Fernando Guedes Pinto*
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dade setorial, o FSC garante o balanço Norte-Sul em todas as esferas de decisões – técnicas e políticas. Em 2007, o primeiro empreendimento certificado FSC pelo Imaflora completou 10 anos – a Madeireira Mil, do Estado do Amazonas. Em 2008, foi a vez das plantações florestais da Klabin do Paraná, num processo que se iniciou em 1996. Nos últimos dois anos outros empreendimentos passaram por auditorias de re-certificação, completando cinco anos, incluindo as duas primeiras comunidades certificadas na Amazônia – PAE Porto Dias e PAE Cachoeira - ambos no Acre, em 2002. Aos poucos, o Brasil tornouse o país tropical com a maior área certificada pelo sistema, num total de, pouco mais, de 5 milhões de hectares, distribuídos em 69 empreendimentos – Figura 1. Uma análise destes números revela a diversidade do setor florestal brasileiro: há empreendimentos em 12 estados e três biomas do país, sendo 60 empresas (aproximadamente 3,5 milhões de hectares) e nove comunidades (pouco mais de 1,5 milhões de hectares).
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A produção é majoritariamente madeireira, mas há certificação de manejo de produtos não madeireiros. As plantações somam 43 empreendimentos (2,2 milhões de hectares) contra 26 de florestas naturais (2,8 milhões de hectares). Vale destacar que os números de comunidades e florestas naturais são inflacionados pela área de manejo de castanha- do- pará, dos Kayapó, da Terra Indígena do Baú, que engloba 1,5 milhão de hectares. Expurgando-se desse empreendimento, a área de comunidades fica em torno de 48 mil hectares e a de florestas naturais atinge 1,2 milhão de hectares. (Dados do FSC Brasil) Os empreendimentos certificados são a vitrine do setor
florestal brasileiro, demonstrando que é viável desenvolver essa atividade em realidades ecológicas e sócio-econômicas muito distintas. Entre 2004 e 2008, a área florestal certificada pelo FSC internacionalmente passou de 40 milhões de hectares para mais de 103 milhões de hectares. Neste período, os países com áreas certificadas passaram de 59 para 79 e o número de florestas certificadas de 600 para 933. No Brasil, o número de florestas com o selo FSC passou de 35 para 68 em quatro anos. Atualmente, é o país com o maior número de empreendimentos e com a maior área certificada da América Latina, com mais de 5 milhões de hec-
nua é uma realidade no campo, desde que conjunturas externas estejam alinhadas com o instrumento. Para tanto, é fundamental haver estímulos econômicos, seja de novos mercados, sobre-preço, acesso ao crédito, garantia aos acionistas ou melhoria de imagem. Adicionalmente, é aconselhável que a certificação esteja imbricada com a aplicação e a formulação de políticas públicas. A in-
certeza fundiária e aspectos legais de regularização de empreendimentos e aprovação de planos de manejo e planos operacionais anuais são os principais entraves ao manejo florestal e a consequente certificação de empresas e comunidades na Amazônia. As mudanças socioambientais ocorrem intensa e efetivamente no interior de empreendimentos florestais e podem acontecer de maneira direta ou difusa no seu entorno. Todavia, os efeitos na paisagem são restritos ao tamanho do empreendimento e ao efeito da certificação em uma região. Entretanto, o instrumento não dão conta de dilemas como a concentração de terras, a expansão da fronteira agropecuária, as contradições das companhias transnacionais e o destino da produção de empreendimentos certificados. Há muitos interesses nacionais e internacionais, públicos e privados envolvidos, com armadilhas onde pode-se usar a certificação como cortina de fumaça para questões de fundo muito mais complexas. No caso do manejo florestal comunitário, o Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Flo-
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tares. O comportamento da certificação FSC passou a servir como termômetro do setor florestal nacional, antecipando tendências, oportunidades e desafios. Acredita-se que a certificação socioambiental voluntária, independente, realizada de maneira transparente seja um poderoso instrumento para promover mudanças em empreendimentos e no seu entorno. O processo de melhoria contí-
restal e Agrícola) acredita que a certificação pode promover melhorias na qualidade de vida de comunidades, a partir da agregação de valor dos recursos florestais manejados e conseqüente incremento de renda, e do estímulo à organização social que se faz necessária para o cumprimento dos pa-
drões de certificação FSC. Entende que a certificação de manejo florestal comunitário pode estimular o desenvolvimento sócio-econômico de comunidades, aliando ao bom uso dos recursos naturais e à conservação dos ecossistemas florestais. Apesar disso, o Imaflora reconhece que existem sérias li-
mitações à implementação desta estratégia em regiões com baixo nível de governança institucional, e que o sucesso da mesma depende da interação entre outros fatores, como crédito, segurança fundiária, assistência técnica de qualidade, capacidade de gestão, entre outros. Esses fatores fogem aos limites de atuação de uma única instituição e não são inteiramente contemplados pelos padrões de certificação do FSC. Para finalizar, o Instituto acredita que a “sustentabilidade” em projetos de manejo florestal comunitáro é um modelo que deve ser buscado como parte de um processo de aprendizado constante para todos os atores envolvidos com esta questão.
Estudo inédito faz comparativo
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Estudo compara o desempenho de empreendimentos certificados e não certificados em associações extrativistas de madeira do Acre e em fazendas de café de Minas Gerais. O Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola) em parceria com a Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz ” da USP (Universidade de São Paulo) e a Entropix Engenharia lançou duas publicações “Impacto da certificação da Rede de Agricultura Sustentável (RAS) em fazendas de café - Estudo de caso no Cerrado e Sul de Minas Gerais - Brasil” e “Impacto da certificação florestal FSC (Forest Stewardship Council - Conselho de Manejo Florestal) em comunidades agroextrativistas do Acre”. As publicações são resultados dos estudos independentes de Avaliação de Impacto dos Programas de Certificação do Imaflora realizado pelo Esalq e pela Entropix. Para realizá-los, foram necessárias cinco semanas no Acre, em associações extrativistas de madeira certificadas FSC e não certificadas e seis semanas, em Minas Gerais, em fazendas de café certificadas RAS e não-certificadas.
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O estudo nas fazendas de café observou a quantidade de florestas, a conservação dos recursos naturais, o uso de agrotóxicos, o destino do lixo e de resíduos, os direitos dos trabalhadores, bem como as condições de segurança e de alojamento das propriedades. Desta forma, foi possível verificar se a certificação tem causado ou não mudanças, assim como quantificá-las e qualificá-las. O levantamento foi feito por meio de entrevistas com proprietários ou gerentes gerais, com trabalhadores fixos e temporários. Também foram feitas observações de campo, coleta sistemática de fotos para fins de comparação visual e ainda interpretação de imagens de satélite. Para complementar o estudo da certificação FSC, foram colhidos depoimentos dos representantes do governo do Acre e das ONGs atuantes no Estado. Para o estudo da certificação RAS, foram colhidos depoimentos do superintendente da CACCER (Conselho das Associações do Café do Cerrado) e dos extensionistas das cooperativas atuantes da região (núcleos da Cooxupé, Cotrel e outras). Os resultados mostraram significativas diferenças nas fazendas de café RAS, com maior desempenho nas certificadas. No caso das comunidades certificadas FSC no Acre, as diferenças foram menos evidentes, pois há grande interferência do governo e da ação de outros atores no manejo florestal do estado. A versão digital das publicações já estão disponíveis na sessão publicações do site do Imaflora (www.imaflora.org).
Abertura oficial do evento que reuniu 50 expositores
A Feira Brasil Certificado é um projeto do Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola) em parceria com as ONGs FSC Brasil (Conselho de Manejo Florestal), Imazon (Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia) e Amigos da Terra. Ela surgiu para promover o setor florestal brasileiro comprometido com a sustentabilidade. Em sua primeira edição, realizada em abril de 2004, a feira mostrou o grande potencial do mercado de certificação no Brasil, reunindo 50 expositores, formados, exclusivamente, por empresas e comunidades com certificação FSC. Na ocasião, o evento recebeu quase 4.500 visitantes, em três dias, sendo 117 provenientes de 27 países. O resultado positivo estimulou a realização da II Feira Brasil Certificado - I Feira Latino-Americana de Produtos Certificados FSC, em abril de 2006. Durante os três dias do evento, os 56 expositores receberam 6.125 visitantes, os quais puderam conhecer empreendimentos comprometidos com o desenvolvimento sustentável, realizar con-
tatos institucionais e comerciais, aprofundar seus conhecimentos sobre o mercado de produtos florestais nos Fóruns de Mercado e, ainda, conferir uma Mostra de Design e Certificação Florestal FSC. O evento afirmou-se como uma referência político-institucional e comercial do setor florestal responsável. Além disso, durante a segunda edição da feira, constatou-se o aumento na variedade de produtos florestais certificados no mercado latino-americano, como: madeira, móveis, papel e celulose, livros, painéis reconstituídos, objetos de decoração, brindes, produtos florestais não madeireiros (alimentos, cosméticos, óleos, essências), entre outros. Inspirados no sucesso dos anos anteriores, Imaflora, FSC Brasil, Amigos da Terra e Imazon promoveram, na segunda quinzena de abril desse ano, a terceira edição da Feira Brasil Certificado. Durante o evento, os visitantes tiveram a oportunidade de conhecer a variedade de matérias-primas e produtos florestais com o selo FSC disponíveis no Brasil, conferir uma mostra de móveis e objetos certificados, participar dos fóruns de mercado, além de realizar negócios. www.brasilcertificado.com.br
Feira atraiu 4,5 mil visitantes em três dias do evento
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Feira mostrou os avanços da certificação florestal no Brasil
Gestão sustentável e contabilidade empresarial
OPINIÃO
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RICARDO YOUNG
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Presidente do Instituto Ethos
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o debate atual sobre sustentabilidade, um tema vem tomando corpo nas discussões: como medir o capital sustentável? Não se questiona mais a necessidade de se adotar um modelo de desenvolvimento sustentável, ou seja, baseado no equilíbrio social, ambiental e econômico em todas as atividades humanas. Para as empresas, no entanto, permanece a pergunta: qual o valor gerado por este modelo? Ele dá lucro? Sustentabilidade é necessariamente estratégia de longo prazo e, se o mercado não sabe como avaliá-la, acaba por barrar a disseminação das boas práticas já adotadas e, mais do que isso, obrigando o recuo de empresas com avanços significativos na gestão. Então, é imprescindível encontrar modelos financeiros e contábeis, aceitos universalmente, que consigam “perceber” o valor dos ativos intangíveis. É preciso, inclusive, achar um consenso sobre o que é intangível. O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBCG) define “intangível” como um conjunto de direitos que garante uma posição exclusiva para a empresa e contribui para seu valor econômico. Qual é esse valor econômico? É esta fórmula que precisa ser inventada. De qualquer maneira, já há estudos que, utilizando os cálculos tradicionais, demonstram como o “imaterial” avançou na composição do capital da empresa. Um destes estudos foi feito consultoria Arthur D. Little e indica que há 27 anos, os intangíveis representavam 17% do valor de mercado das empresas. Em 1998, eles respondiam por 29% deste valor. Por sua vez, o economista e ex-vice-presidente da IBM, Bob Willard, aplicou os critérios contábeis universais e fórmulas tradicionais de matemática financeira para avaliar os benefícios da gestão sustentável em empresas. Os resultados estão no livro “The Sustainability Advantage”, lançado em 2002 e ainda sem tradução em português. Willard cruzou uma série de informações dos balanços comerciais de centenas de empresas e concluiu que são principalmente sete os benefícios: redução dos custos de produção;redução das despesas administrativas; aumento das receitas e do valor de mercado; aumento da produtividade; redução de riscos; facilidade em contratar e reter talentos; diminuição de conflitos. De acordo com Willard, a empresa que adota o tripé social-ambiental-econômico no seu planejamento estratégico tem um aumento potencial de lucro de 38% e um aumento potencial de produtividade de 8%. Assim, fica evidente que, até mesmo pelos padrões tradicionais, a gestão sustentável é investimento que dá lucro. Quando vamos deixar de incluí-la como despesa?
Por que reduzir a
você sabia?
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Em 2007 cerca de dois milhões e 560 mil novos processos trabalhistas foram autuados na Justiça do Trabalho. Foram julgados 2 milhões e 550 mil e passados 1 milhão e 400 mil para 2008, considerando que 1 milhão e 390 mil processos não julgados foram passados de 2006 para 2007. Em 2006, 21,3% das Ações Trabalhistas foram originadas na Indústria, 15% no setor de Prestação de Serviços, 13,8% no Comércio e os 48,9% nos outros setores da economia. As Ações Trabalhistas resultaram em pagamentos de indenizações aos reclamantes no valor de oito bilhões e duzentos e quinze milhões de reais em 2006. Esses números mostram que ainda há muito por fazer em relação à gestão de recursos humanos.
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CONHEÇA UMA SÉRIE DE ARGUMENTOS QUE DÃO SUSTENTAÇÃO À CAMPANHA PELA REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO SEM REDUÇÃO DE SALÁRIO A campanha de redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais sem redução de salários tem sido uma das bandeiras de luta hasteadas pelas Centrais Sindicais, que este ano já realizaram manifestações, paralisações, assembléias, atos e passeatas em todo o país. Mas, para que reduzir a jornada de trabalho? Quais as vantagens para o trabalhador? Para responder estas e outras perguntas, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) reuniu uma série de argumentos que dão sustentação à Campanha pela Redução da Jornada de Trabalho sem Redução de Salário. Além destes argumentos relacionados ao tempo de trabalho, há outros relacionados à economia brasileira, como por exemplo, o crescimento da economia e da produtividade do trabalho; e argumentos relacionados ao tempo de vida do trabalhador, como por exemplo, o pouco tempo que sobra ao trabalhador para o convívio familiar, o estudo, o lazer, o descanso e a luta coletiva, em função do grande tempo ocupado direta e indiretamente com o trabalho.
1. REDUÇÃO DO DESEMPREGO A redução da jornada de trabalho é um dos instrumentos para geração de novos postos de trabalho e a conseqüente redução das taxas de desemprego. Se os ocupados de hoje trabalharem um pouco menos, todos poderão trabalhar.
2. JORNADA NORMAL DE TRABALHO MUITO EXTENSA A jornada normal de trabalho no Brasil é uma das maiores no mundo: 44 horas semanais desde 1988.
3. JORNADA TOTAL DE TRABALHO MUITO EXTENSA A jornada total de trabalho é a soma da jornada normal mais a hora extra. No Brasil, não há limite semanal, mensal ou anual para a execução de horas extras, o que torna o país um dos campeões de horas extras no mundo.
4. AUMENTO DA FLEXIBILIZAÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO Desde o final dos anos 1990, verifica-se no Brasil um aumento da flexibilização do tempo de trabalho. Assim, às antigas formas de flexibilização do tempo como a hora extra, o trabalho em turno, trabalho noturno, as férias coletivas -, somam-se novas - como a jornada em tempo parcial, o banco de horas e o trabalho aos domingos.
6. AUMENTO DO NÚMERO DE DOENÇAS Em função das jornadas extensas, intensas e imprevisíveis, os trabalhadores têm ficado cada vez mais doentes (estresse, depressão, hipertensão, distúrbios no sono e lesão por esforços repetitivos, por exemplo).
Falta emprego para jovens
MUNDO DO TRABALHO
jornada de trabalho?
A pesquisa "Juventude e políticas sociais no Brasil", organizada por Jorge Abrahão de Castro e Luseni Aquino, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), reúne textos que abordam a inserção da temática juventude no âmbito das políticas sociais brasileiras. De acordo com a pesquisa, falta emprego para metade dos jovens brasileiros. Entre 10 países analisados, o Brasil possui o maior número de jovens entre os desempregados: a proporção chega a 46,6% da população. O desemprego desta população é 3,5 vezes maior do que o de adultos com mais de 24 anos. A diferença vem aumentando. Era de 2,9 vezes em 1995 e de 2,8 vezes em 1990. PAÍS
JOVENS entre desempregados
16,3% 22,1% 25,6% 25,9% 33,2% 33,3% 38,6% 39,6% 40,4% 46,6%
Fonte: Ipea
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5. RITMO INTENSO DO TRABALHO O tempo de trabalho total também está cada vez mais intenso em função de diversas inovações técnico-organizacionais implementadas pelas empresas (como a polivalência, o just in time, a concorrência entre os grupos de trabalho, as metas e a redução das pausas). Também em muito tem contribuído para essa intensificação a implementação do banco de horas (isso porque, nas horas de pico, os trabalhadores são chamados a trabalhar de forma intensa e nas horas de baixa demanda são dispensados do trabalho).
Alemanha França Espanha Itália Estados Unidos Suécia Grã-Bretanha Argentina México Brasil
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Reduzir a jornada sem diminuir o salário
OPINIÃO
E
CLEMENTE GANZ LÚCIO
PRIMEIRO PLANO . ANO 3 . NO10 . JULHO 2008
Diretor técnico do DIEESE
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m maio, as centrais sindicais realizaram mobilização nacional pela redução da jornada de trabalho sem redução salarial. Em vários países, a mudança na jornada ocorreu graças à ação sindical e foi tratada como um instrumento capaz de preservar e criar empregos de qualidade e possibilitar melhores condições de vida. No Brasil, a jornada é uma das maiores no mundo: 44 semanais desde 1988 e só há limitação diária para horas extras, possibilitando assim que um grande percentual de trabalho extraordinário seja realizado mensalmente. É um tempo de trabalho extenso e também intenso, devido a diversas inovações técnicoorganizacionais implementadas pelas empresas e raramente negociadas com os trabalhadores. Outra característica desse tempo de trabalho é a flexibilidade, sobretudo a partir do final dos anos 1990, com a implantação do banco de horas. Além do tempo de trabalho, há aquele gasto no deslocamento entre a residência e o local de trabalho, o utilizado na qualificação profissional e na execução de tarefas fora do tempo e do local de trabalho, facilitada pela utilização de celulares, notebooks e internet. Como conseqüência, a jornada real é muito maior que a legal, o que ocasiona problemas na saúde e na vida pessoal, restando pouco tempo para o convívio familiar, o estudo, o lazer, o descanso e a vida coletiva. É importante, desta forma, que a sociedade brasileira passe a atuar para uma mudança na legislação no sentido de reduzir a jornada e limitar a hora extra, abrangendo todos os trabalhadores, independente da categoria profissional e da força do sindicato ao qual pertençam. Essa atuação pode apoiar as entidades sindicais, que continuarão as negociações de mudanças na jornada de trabalho nas relações diretas com os empregadores. No contexto atual, o Brasil criou condições favoráveis para a redução da jornada de trabalho, uma vez que apresenta crescimento continuado e estabilidade econômica. Também não haveria pressão de custos do trabalho. Para ilustrar essa afirmação, vale lembrar dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) que mostraram que, em 1999, a participação dos salários no custo da indústria de transformação era de 22%, em média. Fazendo as contas, uma redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais (de 9,09%) representaria aumento no custo total de produção de apenas 1,99%. Além disso, o custo da mão-de-obra no Brasil é muito baixo, comparado a diversos países, de forma que a redução da jornada não traria prejuízo à competitividade das empresas, sobretudo porque o diferencial na competitividade não está no custo da mão-de-obra, mais sim nas vantagens sistêmicas que o país oferece. Finalmente, a redução da jornada de trabalho é um bom instrumento para melhorar a distribuição de renda, bem como a geração de novos empregos. Se todos trabalharem um pouco menos, todos poderão trabalhar.
DECLARAÇÃO DO MILÊNIO: O MÍNIMO NECESSÁRIO Odilon Faccio
OS ODMS SÃO OS COMPROMISSOS MAIS SÉRIOS DOS GOVERNOS, EMPRESAS E SOCIEDADE PARA ERRADICAR A POBREZA, PROMOVER IGUALDADE HUMANA E A SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL
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www.odmbrasil.org.br
Ao passar quase a metade do tempo previsto para cumprir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs), muitos avanços foram obtidos, porém, as desigualdades entre países e populações ainda permanecem. Os recentes estudos sobre as Mudanças Climáticas adicionam novas preocupações sobre o futuro. Em 2000, 191 países membros da Organização das Nações Unidas (ONU) assinaram a Declaração do Milênio. Trata-se de uma agenda global de desenvolvimento com 8 Objetivos a serem atingidas até 2015. Essas metas não vão salvar o planeta, mas é o mínimo necessário a ser feito para tornar a globalização mais equilibrada e contra a pobreza no mundo. A Declaração do Milênio assume maior importância na medida em que deixa de ser uma retórica de governos, ao ser estruturada em objetivos, com 18 metas concretas a serem alcançadas, e possuem 48 indicadores que monitoram os progressos e desafios. Cada país, conforme a sua realidade, adicionou algumas metas e indicadores nacionais específicos. O Brasil incluiu a Meta 1 A que assume maior compromisso de reduzir a pobreza. A intenção é reduzir a um quarto, ao invés de reduzir pela metade a proporção da população com renda inferior a 1 dólar por dia. No mesmo sentido, o Brasil assumiu o compromisso de erradicar a fome - Meta 2A - entre 1990 e 2015, ao invés de reduzir pela metade (Meta 2). Para monitorar a evolução dos ODMs, cada país deve produzir um Relatório Nacional de Acompanhamento. Estes relatórios nacionais
são de grande importância para registrar os progressos obtidos em escala global, para enfrentar as debilidades e para orientar as políticas públicas. No terceiro Relatório Nacional de Acompanhamento 2007 do Brasil é possível perceber que, de um modo geral, se não houver descontinuidade nas políticas públicas, o país atingirá todas as metas estabelecidas. No caso da Meta 1 - "Reduzir pela metade, entre 1990 e 2015, a proporção da população com renda inferior a 1 dólar PPC por dia", o país já alcançou a meta. Em 1990, 8,8% viviam na pobreza extrema, em 2005, caiu para 4,2%. Porém, se os resultados médios são positivos, permitindo visualizar um país menos desigual, ainda há sérios problemas a serem resolvidos. As médias nacionais mascaram profundas desigualdades regionais, as diferenças de cor e de sexo. No Brasil, em pleno século XXI, as desigualdades têm cores: preta e parda. Pobreza Houve uma redução significativa do número de pessoas em pobreza extrema, mas ainda existem 7,5 milhões (2005) recebendo menos de 1 dólar PPC (Paridade do Poder de Compra), taxa de câmbio que considera as diferenças de preços entre os países, permitindo comparações internacionais. Quando comparamos a pobreza recortando por cor/raça, fica evidente a gravidade da discriminação social, derrubando o mito que no Brasil não há discriminação. Talvez seja um dos piores tipos de discriminação, àquela que é oculta sobre
8 OBJETIVOS
Erradicar a extrema pobreza e a fome
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Universalizar Reduzir a Promover a mortalidade na a Educação Igualdade entre Básica Infância sexos e a autonomia das Mulheres
Melhorar a saúde Materna
Combater a Garantir a Estabelecer uma AIDS, a malária Sustentabilidade parceria Mundial e outras doenças Ambiental pelo Desenvolvimento
Sustentabilidade Ambiental Embora o termo sustentabilidade tenha muitos entendimentos, é gratificante saber que ganhou adesão na sociedade. Quase todo mundo fala da necessidade de proteger o meio ambiente e as pessoas estão, cada vez mais, mudando de atitudes e hábitos. Para o Brasil é uma questão decisiva, tanto porque temos a maior e mais diversificada floresta do mundo, como também, porque somos o 4º maior poluidor do planeta em termos de produção de CO2. A Meta 9 é a que integra os princípios do desenvolvimento sustentável às políticas públicas e aos programas nacionais e reverter a perda de recursos ambientais. Quando analisamos o desflorestamento na Amazônia Legal a situação exige atenção. O desflorestamento em 2005 e 2006 atingiu 13.100 quilômetros quadrados que são semelhantes aos de 1989/90. Em quilômetros quadrados, significa que uma área de floresta semelhante à cida-
de de São Paulo deixa de existir por ano no Brasil. Podemos nos congratular porque conseguimos um grande consenso de que a sustentabilidade é necessária e exige a engenhosa combinação entre o economicamente viável, o socialmente justo e o ambientalmente correto. Podemos chamar de sustentabilidade completa. Pode parecer pouco, mas numa sociedade tão complexa e diversa como a brasileira, obter um norte comum a seguir, já é um passo gigantesco. É claro que entre o consenso teórico e sua materialização tem um abismo a ser transposto. O nome deste abismo está muito mais em como fazer a sustentabilidade. Num mundo onde há uma guerra não declarada por mercados e consumo, ainda predomina o econômico sobre o social e ambiental. A questão chave não é mais um fator em detrimento do outro, mas como associá-los em todas as etapas dos negócios. É um caminho sem volta porque, os produtos e serviços sustentáveis, cada vez mais se tornam fatores de competitividade das empresas ou vantagens comparativas entre países. Tem o outro
lado da moeda: quem é menos sustentável enfrenta barreiras para acesso aos mercados e aos consumidores conscientes. É possível melhorar os resultados do atual quadro brasileiro. Muito está sendo feito e muito mais pode ser feito. Crescimento, estabilidade monetária, emprego decente, educação e saúde são fatores importantes. Mas é necessário fazer mais e melhor. Os ODMs são como uma bússola que podem orientar as ações dos governos, das empresas e das organizações da sociedade civil. Nos últimos anos, é crescente o investimento social das empresas em projetos sociais. Agora, mais do que nunca, é importante alinhar os projetos sociais das empresas com os ODMs, especialmente focalizados em regiões ou segmentos sociais mais excluídos. Outra iniciativa importante é a promoção da igualdade dentro das empresas e nos órgãos públicos. No caso das empresas, é necessário desenvolver planos de ação para aumentar a presença de mulheres e negros em cargos de chefia. Outra ação importante é adotar os ODMs nos negócios e na cadeia de valor. As empresas líderes podem induzir que, ao longo da cadeia de valor, sejam estabelecidos vínculos sustentáveis de negócios e sugerindo que os fornecedores considerem os ODMs. O Relatório de Acompanhamento fornece elementos para uma agenda de desenvolvimento qualitativamente superior para que todos os agentes econômicos e sociais possam contribuir com a concretização e melhoria das metas estabelecidas. Todos vão ganhar.
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aquele véu que nos encobre como um país tolerante. São as nossas “verdades inconvenientes”.
Mais papel De acordo com os dados da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa), há uma perspectiva de que até final deste ano os fabricantes de papel produzirão 9,2 milhões de toneladas de papéis, volume 3,2% maior do que o alcançado em 2007.
EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PRODUÇÃO * em toneladas ANO
IMPRENSA
IMPRIMIR
ESCREVER
EMBALAGEM
SANITÁRIOS Cartões/Cartolinas ESPECIAIS TOTAL
1962
62.107
66.365
70.656
290.927
25.570
58.600
27.604
601.829
1990
246.400
931.531
357.732
2.184.300
403.712
470.038
122.078
4.715.791
2000
266.179
1.992.229
100.403
3.347.384
596.732
723.653
173.552
7.200.132
2006
135.084
2.450.372
100.935
4.231.216
787.417
819.481
200.126
8.724.631
Fonte: Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa) www.bracelpa.org.br
FABRICAÇÃO
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A fabricação do papel consiste essencialmente de três etapas principais, partindo-se da matéria-prima que pode ser a celulose, pasta mecânica ou reaproveitamento de papéis usados. Dependendo do uso que terá o papel, há uma série de tratamentos especiais antes, durante ou depois de sua fabricação. As três etapas são:
HISTÓRIA DO PAPEL NO MUNDO 24
- PREPARAÇÃO DA MASSA - FORMAÇÃO DA FOLHA - SECAGEM
Antes da criação do papel, o material mais utilizado para escrita, foi o pergaminho, feito com peles de animais.
INVESTIMENTOS EM PRODUÇÃO Os fabricantes de celulose e papel concluíram investimentos de US$ 1,9 bilhão em expansão de capacidade em 2007. Indústrias como Aracruz, Suzano e Klabin expandiram suas capacidades de produção este ano.
PLANETA
De acordo com levantamento da Bracelpa, há novos projetos a caminho da Norske Skog, VCP e International Paper. Estes investimentos serão realizados no período de 2008 a 2009 e demandarão recursos totais de US$ 1,97 bilhão. Várias empresas têm planos elaborados para aumento de produção. Por este motivo, as análises e avaliações da Bracelpa indicam que o programa setorial de investimentos que prevê a aplicação de US$ 14,4 bilhões no período de 2003 a 2012, deverá ser superado.
Os antigos egípcios utilizavam, o talo do papiro.
Sua fabricação era penosa e rudimentar; a medula do talo era cortada em tiras que eram colocadas transversalmente, umas sobre as outras, formando camadas que eram batidas com pesadas marretas de madeira, resultando numa espessura uniforme e produzindo um suco que impregnava e colava as tiras entre si.
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PAPEL
Selo verde
MENOS CHAMINÉS
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A expansão da maior fábrica de papel do país aumentou não só a produção, mas a eficiência em relação à preservação ambiental e à integração com a comunidade. A fábrica Monte Alegre, da Klabin, está na cidade de Telêmaco Borba, no Paraná. O investimento de R$ 2,2 bilhões serviu para instalar uma nova caldeira de biomassa, um turbogerador para produção de energia que elevou de 65 para 80% a autosuficiência energética da fábrica, entre . A produção da Klabin tem por base a madeira de florestas plantadas de pínus e eucalipto, cujas plantações são entremeadas com extensas áreas de mata nativa preservadas, num sistema de manejo chamado de "mosaico". NÚMEROS Até março de 2008, a Klabin possuía 436 mil hectares de área florestal, dos quais 216 mil hectares de florestas plantadas e 177 mil hectares de florestas nativas preservadas. A Klabin foi a primeira empresa no setor de papel e celulose das Américas a ter suas florestas certificadas pelo FSC (Forest Stewardship Council), em 1998. A certificação de quase 100% das florestas pelo FSC aumenta a competitividade da Klabin nos mercados internacionais – cada vez mais exigentes sobre a origem da madeira que consomem.
A Veracel reforçou o compromisso com o desenvolvimento da região onde atua. Em março último a empresa recebeu a certificação do FSC (Conselho de Manejo Florestal) ou selo verde. A certificação é a certeza de que a celulose produzida pela empresa está de acordo com as melhores práticas ambientais e sociais do mundo. Na ocasião estiveram na Veracel e em algumas instituições com as quais a Veracel se relaciona -comunidades do entorno, comunidades indígenas, Câmara Municipal e ONGs ambientalistas -- equipes de técnicos do FSC Internacional e da SGS, empresa certificadora credenciada pelo FSC. Para mais uma auditoria de confirmação da certificação. A empresa iniciou as atividades, em 1991, como Veracruz Florestal, uma subsidiária da Odebrecht, e em 1997 houve associação entre Odebrecht e Stora (Suécia). No ano de 2000, um novo acordo de acionistas marca ingresso da Aracruz no empreendimento, sendo que um pouco mais tarde a Odebrecht vende sua participação aos outros sócios. Em 2004 a empresa cria e aprova a Agenda de Sustentabilidade e adere ao Pacto Global.
Mais florestas A área de florestas preservadas do setor cresceu, em 2007, 200 mil hectares. Os números atualizados mostram que os fabricantes de celulose e papel mantêm hoje 2,8 milhões de hectares de matas nativas e reservas legais protegidas pela indústria. O setor detém atualmente certificações internacionais para 1,4 milhão de hectares de florestas. São áreas de matas nativas e florestas plantadas que passaram por auditorias realizadas por organismos internacionais que atestaram o manejo correto e o cumprimento de normas de proteção do meio ambiente e da biodiversidade. As florestas plantadas de eucaliptos e pínus para fins industriais mantiveram-se em 1,7 milhão de hectares em 2007 e as
Oficialmente, o papel foi fabricado pela primeira vez na China, no ano de 105, por Ts’Ai Lun que fragmentou em uma tina com água, cascas de amoreira, pedaços de bambu, redes de pescar, roupas usadas e cal para ajudar no desfibramento.
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parcerias com produtores rurais para o plantio de eucalipto para a indústria foram ampliadas. A indústria mantém acordos para produção de madeira com cerca de 10 mil pequenos e médios produtores rurais, que hoje representam uma área total de 304 mil hectares no País. O setor de celulose e papel, representado pela Bracelpa, é formado por 220 empresas instaladas em 450 municípios de 17 estados brasileiros. As empresas mantêm 110 mil empregos diretos - 65 mil nas atividades industriais e 45 mil pessoas dedicadas à área florestal. As indústrias movimentaram em 2007 cerca de R$ 24 bilhões em negócios e recolhem R$ 2,1 bilhões em impostos.
CADEIA PRODUTIVA SUSTENTÁVEL 1.FLORESTAS PLANTADAS – Florestas de reflorestamento manejadas de acordo com práticas ambientais e sociais responsáveis 2.ÁGUA – O ideal é que a água utilizada na fabricação seja tratada e volte a ser usada. 3.BIOMASSA – Restos que não serão utilizados para produção, viram biomassa para geração de energia do próprio fabricante. A biomassa pode ser usada em termoelétricas. 4.CELULOSE – A produção de celulose precisa ser acompanhada até o descarte final para minimizar os impactos ambientais do processo. 5.EMBALAGEM – Chapas e caixas de papelão, entre outros produtos especiais, podem ser fabricados para serem reutilizadas novamente na fabricação de papel. 6.PAPEL – Dependendo da utilização final, alguns tipos de papéis podem utilizar como matéria-prima os reciclados.
Projeto de efluentes
Na pasta formada, submergiu uma forma de madeira revestida por um fino tecido de seda - a forma manual - como seria conhecida. Esta forma coberta de pasta era retirada da tina e com a água escorrendo, deixava sobre a tela uma fina folha que era removida e estendida sobre uma mesa.
de lagoas anaeróbias por sistemas aeróbicos. Com investimento total de R$ 7 milhões, o projeto de MDL da Estação de Tratamento de Efluentes foi implantado na Divisão Papel em maio de 2007. O mecanismo baseia-se na substituição da degradação anaeróbica pela degradação aeróbica da matéria orgânica, evitando assim, a emissão de metano, um gás de efeito estufa que provoca o aquecimento global. A empresa
também certificou em 2008, de acordo com a ISO 14.064, o seu inventário de Gases de Efeito Estufa. Outros dois possíveis projetos de MDL identificados pelo inventário estão em fase de estudo e deverão ser implementados nos próximos anos.
Esta operação era repetida e as novas folhas eram colocadas sobre as anteriores, separadas por algum material; as folhas então eram prensadas para perder mais água e posteriormente colocadas uma a uma, em muros aquecidos para a secagem. A idéia básica de de Ts’Ai Lun continua válida até hoje.
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A Celulose Irani obteve a aprovação e registro do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL da sua Estação de Tratamento de Efluentes (ETE), pelo órgão da ONU, o Conselho Executivo do MDL. É o primeiro MDL de Efluentes registrado na ONU em toda a América Latina e utiliza a metodologia de pequena escala AMS.III.I, que determina que se evite metano no tratamento de águas residuárias, por meio da substituição
Bons ventos:
como aproveitar essa energia Alessandra Mathyas
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As
mudanças climáticas responsáveis por catástrofes recentes em várias partes do mundo, da China ao Peru, de Santa Catarina aos Estados Unidos, vêm forçando cada vez mais o debate em torno das energias limpas. No caso específico do Brasil, chamou a atenção, no início de junho, a pesquisa apresentada pela COPPE/UFRJ (Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro), “Mudança Climática e Segurança Energética no Brasil”, que aponta a vulnerabilidade do país no uso de energia. Segundo este estudo, que teve o apoio da Embaixada do Reino Unido, as mudanças climáticas poderão interferir direta-
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mente no atual cenário para energia eólica e hidrelétrica. Na hidrelétrica, pela maior evaporação e com isso, diminuição dos lagos e do potencial de geração. No caso da energia eólica, a alteração climática fará com que os ventos mudem tanto de direção quanto de intensidade, e que passem a existir em regiões onde hoje não são significativos. Assim, conforme apontou o relatório, o potencial eólico energético do litoral brasileiro – onde hoje está concentrada a maioria dos parques eólicos – poderá ter uma redução de 30% a 60% . Em compensação, outras regiões poderão tornar-se atrativas para este segmento. Tal informação deverá motivar a Eletrobrás na realização de novos estudos de viabilidade desta fonte energética pelo Brasil. Afinal, a energia eólica é considerada, entre as várias fontes possíveis de se conseguir energia elétrica sem agredir o meio ambiente, uma das mais eficazes. O uso deste “vento do bem”, no entanto, não é nenhuma novidade. Ao contrário, a literatura mostra o quanto a humanidade já dependeu da energia eólica. Um exemplo por todos conhecido é o clássico Dom Quixote de La
Mancha, onde os “moinhos de vento” foram imortalizados pelo escritor espanhol Miguel de Cervantes. Os moinhos de vento do século XXI, no entanto, até contribuem para uma paisagem bucólica, mas a tecnologia empregada em nada se compara aos seus antepassados. Com uma indústria mundial em expansão, já existem empresas fabricando aerogeradores de até 7,5MW a unidade, ou seja, uma única torre pode ser capaz de produzir mais energia que uma das conturbadas usinas hidrelétricas a serem construídas no Rio Madeira, no Norte do Brasil. Mas com uma diferença considerável: sem alagar extensas áreas ou forçar o afastamento de comunidades próximas. Não à toa que, das energias renováveis atuais, a eólica é a que mais desponta no cenário mundial. Relatório recente da Associação Mundial de Energia Eólica (WWCA, sigla em inglês), aponta que em 2008, 1% de toda a eletricidade global vem da força dos ventos. Parece pouco, mas esta energia, atualmente produzida em mais de 70 países, tem uma capacidade instalada (já em operação) de 93.849 MW.
tas tecnologias. Outra que fez anúncios animadores recentemente foi a Google. A empresa pretende gastar centenas de milhões de dólares para auxiliar a redução dos preços da energia gerada por fontes renováveis e atualmente tem participação nos setores eólico e solar. Já na Índia e China, que juntas alcançaram a geração de 10 mil MW de energia eólica em quatro anos, a meta é alcançar 20 mil MW até 2010, isto só no mercado chinês. E para tal, as ações de governo têm sido fundamentais, através das deduções de impostos, concessões, processo competitivo de licitação para o desenvolvimento de parques eólicos, promoção de transferência de tec-
nologias e subsídios para as pesquisas. Na Europa, berço das renováveis de forma geral, o custo da energia eólica vem caindo significativamente, mas os países ainda apostam em legislações mais aprimoradas. Na Espanha, por exemplo, a Associação Empresarial Eólica reafirmou, na Convenção Anual, realizada no início de junho em Madri, que as boas perspectivas futuras do setor passam obrigatoriamente por uma regulação estável, consenso social e político, desenvolvimento de redes de transmissão, competitividade e pelo Mercado Único Europeu. Para a entidade, a integração energética do velho
QUADRO MUNDIAL Dez países despontam hoje na produção mundial de energia eólica: Alemanha, Espanha, Estados Unidos, Índia, Dinamarca, China, Itália, Reino Unido, Portugal e França. A Alemanha é a líder em todas as energias renováveis, enquanto a Dinamarca é o maior produtor de aerogeradores e a Espanha, um dos países com maior quantidade de parques eólicos em operação – cerca de 500 distribuídos em seus Estados Autônomos. O Brasil, pelo ranking da Associação Mundial de Energia Eólica, está em 20º lugar, contabilizando basicamente os parques contratados pelo PROINFA. Em todos os países aonde as energias renováveis vêm conseguindo significativa participação, um dos pontos decisivos para este quadro é o marco regulatório – a legislação para o fomento da energia descentralizada, que atrai investimentos privados. Empresas como a General Eletric apostam no crescimento geométrico das energias renováveis nos Estados Unidos, por exemplo, onde a meta é quadruplicar a energia de fontes eólica em dez anos. Até o momento a GE investiu quatro bilhões de dólares nes-
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Destes, 19.696 MW foram incluídos apenas em 2007. A indústria da energia eólica emprega mais de 350 mil pessoas no mundo e, em alguns países ou regiões, contribui com mais de 40% da energia produzida. Em dez anos – de 1997 a 2006 – a capacidade instalada de energia eólica mundial teve um aumento de dez vezes. Reunidos na cidade de Kingston, no Canadá, de 24 a 26 de junho, a Conferência Mundial de Energia Eólica avaliará (discutiu) os avanços e desafios para a consolidação desta fonte de energia, pois, baseada no desenvolvimento acelerado das tecnologias, a Associação Mundial estima que no final de 2010 já estejam em operação 160 GW de energia eólica, praticamente o dobro do consumo anual de energia no Brasil.
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continente, superando os obstáculos ainda presentes, “levarão a Espanha para a liderança mundial” em energia eólica. Neste país, as eólicas estão consolidadas. Segundo o diretor geral do Instituto para a Diversificação e Desenvolvimento da Energia (IDAE, sigla em espanhol), são três os pilares que garantem um bom futuro para o setor: o objetivo europeu de, até 2020, ter 20% da matriz energética do continente de energias renováveis, a Lei de Energias Renováveis da Espanha, e o Novo Plano de Energias Renováveis (PER) 20112020. Com estas legislações criouse um cenário de segurança e estabilidade que poderá levar o país a ter, até o final desta década, 30% de sua energia de origem renovável, conforme estimativa da Rede Elétrica da Espanha (REE). No bojo destas legislações estão as tarifas feedin (ou FIT), que são preços especiais pagos pelas concessionárias para a energia de fontes renováveis. Não só a Espanha, mas todos os países europeus que estão apostando no incremento das renováveis adotaram esta modalidade tarifária, que é capaz de suportar grandes mercados de energia renovável a custos que são pulverizados entre todos os consumidores. Assim, com as obrigações previamente estabelecidas por lei, há segurança aos investidores e outros são atraídos para o setor, pois as remunerações das tarifas cobrem os custos de geração e proporcionam boa margem de lucro, além de ter um preço acessível ao consumidor. REALIDADE E PERSPECTIVAS NO BRASIL A experiência européia é o esque-
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leto do que está sendo desenvolvido no Brasil, sobretudo com o PROINFA – Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia (Lei 10438 /02). No entanto, representantes do setor apontam falhas na legislação brasileira. Para Marco Antônio Morales, diretor da Empresa Ventos do Sul, que administra o Parque Eólico de Osório (até o momento, o maior da América Latina em operação), é preciso criar um marco regulatório estável de médio e longo prazo, que garanta a compra de energia elétrica de fontes renováveis para que investidores, entidades de financiamento e fabricantes de equipamentos orientem os seus planos estratégicos. “Na América Latina, e especificamente no Brasil, encontram-se algumas das melhores regiões do mundo para desenvolvimento de energia eólica. Aqui há potencial para reproduzir o sucesso industrial ocorrido em países como Alemanha, Estados Unidos, Espanha, Índia e China, e liderar o processo no continente Sul-americano”, argumenta o executivo. No entanto, a primeira fase do PROINFA terminará em dezembro de 2008 e não há uma sinalização clara do Estado Brasileiro sobre o futuro das renováveis. Algumas das falhas detectadas pela própria Eletro-
brás foram sendo adaptadas ao longo do programa, como ampliação do limite de financiamento pelo BNDES (de 70% para 80% do empreendimento), o índice mínimo de nacionalização, garantia de compra da eletricidade, definição das competências dos agentes (MME, Aneel, Eletrobrás), chamadas públicas e fixação dos preços da energia renovável. Ao que tudo indica, pelo cenário internacional, o mercado das eólicas aguarda ansiosamente uma posição do Brasil para voltar a aquecer. As entidades ligadas ao setor tentam encontrar os caminhos para isso. Para Fernando Cunha, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Energia Renovável – Abeer, a Política Nacional para Energias Renováveis – que vem sendo discutida entre a entidade e integrantes do governo – deverá ser voltada principalmente para o desenvolvimento das energias eólica e solar. Segundo o empresário, o Governo envolveria neste plano os ministérios de Minas e Energia, Ciência e Tecnologia e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Entre os pontos que estão sendo discutidos estão uma estratégia de longo prazo para implantação de usinas solares e eólicas, a viabilização financeira dos empreendimentos, conexão dos projetos com o sistema elétrico nacional e novos mecanismos de incentivo para o uso de fontes renováveis, o que, obrigatoriamente, terá que passar por uma
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Montagem de uma usina eólica com equipamentos da empresa Repower Systems, da Alemanha pequena central hidrelétrica (PCH). “O preço do MW destas duas fontes é muito parecido”. Assim, opina Lopes, com a legislação atual – PROINFA – um investimento para se viabilizar teria que ser contratado por uma média de R$ 200 MW/h (megawatt/hora). Um valor ainda considerado alto, se comparado ao que foi aprovado para a construção da Hidrelétrica de Jirau, no Rio Madeira, no leilão realizado em maio, onde o Consórcio Energia Jirau foi o vencedor com uma proposta de R$ 71 MW/h. Este, no entanto, não é o preço final da energia ao consumidor. A partir desta definição, no caso das hidrelétricas, os consórcios revendem a energia no chamado “mercado livre” e conseguem aí um preço melhor, o que teoricamente, cobre os investimentos e dá uma razoável margem de lucro. No caso do consórcio vencedor para a construção de Jirau, já se noticia a venda da energia no mercado livre a um valor próximo de
R$ 120 MW/h. Para a energia renovável, no entanto, o que se espera é que o Governo, através da Eletrobrás, garanta a compra da energia produzida integralmente. É o que está valendo no PROINFA. O Parque Eólico de Osório, por exemplo, está operando em sua capacidade máxima, 150MW, desde dezembro de 2006, o que gera em média um faturamento de R$ 100 milhões de reais por ano. “A garantia de compra da energia é necessária para viabilizar um empreendimento como este e para possibilitar, no caso, a obtenção de financiamento. São projetos de longo prazo e grandiosos em termos de capital”, justifica Marco Antônio Moralles. O prazo de amortização desta obra, financiada pelo BNDES, é de 12 anos. O grupo espanhol Elecnor, proprietário do Parque Eólico de Osório através da sua filial Enerfin no Brasil, aposta no potencial brasileiro e espera a definição de um marco re-
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legislação específica, como aconteceu nos países anteriormente citados. Tais ações são o ponto de partida da ampliação da indústria da energia renovável no país. No caso específico da energia eólica, é preciso que haja definições claras sobre projetos, pois o fabricante depende de uma cadeia de sub fornecedores e isso é um processo demorado e caro. Esta é a opinião de Eduardo Lopes, da Wobben Wind Power, localizada em Sorocaba/SP (com uma filial no Ceará) e até o momento, a única fabricante de aerogeradores de grande porte do Brasil. “Não se faz um parque eólic de uma hora para outra. É preciso ter a certeza do investimento, com medição de vento pelo menos por um ano e depois, a avaliação da topografia do terreno. Só aí a empresa poderá dimensionar o tipo do aerogerador e a quantidade”, explica Lopes. Mas de uma forma resumida, segundo ele, uma usina eólica equivale a uma
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O potencial e os problemas do Brasil No final de 2006, o Brasil estava em 20º lugar no ranking de energia eólica da Associação Mundial, com 208 MW instalados, número praticamente irrisório se levado em conta o potencial eólico de 143,5 GW, estimado pelo Atlas Eólico Brasileiro, do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (CEPEL), em 2001. No entanto, foram contratados pelo PROINFA – Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica – 1422,92 MW. O prazo para o término dos contratos para que as usinas entrem em operação termina em dezembro de 2008 e dificilmente se chegará ao total contratado. De acordo com os dados disponibilizados pela Eletrobrás, em maio de 2008, das 54 usinas contratadas, apenas seis estavam em operação (218,5 MW) e outras 15 estão em construção, respondendo por 123,83 MW. No entanto, 33 unidades, que pelos projetos responderiam por 1080,59MW, sequer iniciaram a construção. Mesmo assim, a Associação Brasileira de Energia Eólica – Abeeólica aposta que é possível chegar à potência total configurada pelo PROINFA, sendo mais de 1.000 MW novos em operação em 2009. O jeito é esperar para ver!
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gulatório que viabilize a implantação de novos empreendimentos eólicos. Segundo Moralles, a duplicação do parque de Osório, passando para 300MW, já está em um estágio avançado com os estudos, permissões, licenças ambientais e concessões administrativas prontas, aguardando apenas a definição da legislação. Já para a Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), se o mercado brasileiro abrisse melhores perspectivas, “os fabricantes viriam todos para cá”. Segundo o diretor da entidade, Paulo Ludmer, o PROINFA engessou um mercado altamente promissor, pois, de acordo com o Atlas Eólico Brasileiro, o potencial desta fonte energética no país chega a 143,56 GW. “A Índia, a China e os EUA abriram-se e hoje já exportam equipamentos. Já as empresas que existem no Brasil abastecem mercados externos. A GE, por exemplo, exporta para os EUA”, comenta Ludmer. A entidade também vê com cautela os índices de nacionalização, previstos no PROINFA. “Temos fábricas de componentes se instalando no Brasil, que necessitam de alguma defesa num mercado ainda imaturo. Essa é uma questão de compatibilidades e harmonias dentro do setor que estão por ser definidas em pouco tempo. Qual o procedimento que atenda ao conjunto das preocupações da cadeia produtiva da eólica? O objetivo comum é desenvolver o mercado e aí estará a plataforma da solução”, opina o dirigente da Abeeólica. Ao mesmo tempo que o merca-
do está cercado por incertezas, outros empreendimentos eólicos pipocam pelo país, mesmo antes de estarem claras as definições sobre o futuro das renováveis . Em abril, a empresa australiana Pacif Hydro inaugurou seu primeiro empreendimento, no estado da Paraíba. Esta primeira usina da Pacif tem uma capacidade de 10,2 MW, mas a companhia quer investir pesado no segmento. Declarações do diretor geral da multinacional no país, Mark Agar, afirmam que a meta é gerar 300 MW de energia eólica e de PCHs no Brasil. Segundo ele, a empresa já estuda projetos eólicos no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Bahia, Ceará, outros na Paraíba e no Rio Grande do Norte. Só neste último estado, a meta é produzir 150 MW em dois parques. No entanto, para de fato que estes parques da empresa australiana saiam do papel, já se estuda a possibilidade de vender a energia no mercado livre, visto que leilões do Governo Federal para fontes alternativas, especificamente para eólicas, só deverão acontecer em 2009. Somam-se às iniciativas da Enerfin e da Pacif Hydro, a AES, que quer investir em eólicas no Brasil e estuda a possibilidade de iniciar esta geração em plataformas oceânicas, o Grupo português HLC, já responsável por várias usinas eólicas no Nordeste do país e inúmeras empresas constituídas especificamente para o setor. Em abril, por exemplo, foi anunciado pela Gargaú Energética o primeiro parque eólico
da Região Sudeste, no município de São Francisco do Itabapoana/RJ. O empreendimento terá investimentos em torno de R$ 130 milhões e contará com 17 aerogeradores, de 1,65 MW cada, somando uma potência total de 28 MW e venderá toda a energia produzida para a Eletrobrás. Também atuam no setor a Iberdrola Renováveis do Brasil, a Energias do Brasil, do Grupo EDP (Energias de Portugal) e algumas estatais. MICRO GERAÇÃO Apesar das grandes cifras que giram em torno dos negócios da energia limpa, há iniciativas bem sucedidas de micro geração, que vêm deixando satisfeitos seus clientes, a investimentos modestos. O caso do Sr. Evaldo Silva Rodrigues, da área rural de Arraial do Cabo, Região dos Lagos, no Rio de Janeiro, é um exemplo disso. Há cinco anos ele tem um aerogerador em sua residência. Na época, mesmo
residindo há 130 kms da capital do Estado, não havia energia elétrica da rede básica disponível em sua região por se tratar de uma área de preservação ambiental de uso controlado. Ao ver a instalação pela empresa Enersud de um protótipo de aerogerador próximo à sua casa, não titubeou. “Eu disse: no próximo Natal vou receber visitas e eu preciso de energia elétrica. Eu quero um desses”. Mesmo ainda em fase de testes, o Sr. Evaldo pagou cerca de dois mil reais pela instalação do equipamento e continua satisfeito com os resultados até hoje. Tanto que, mesmo agora, já com energia de rede em sua casa, o “cata-vento” mantém-se em pleno funcionamento. "Eu uso apenas 40% da energia da concessionária e os outros 60% que preciso vêm da energia alternativa. Estou satisfeito, não penso em tirar, até porque tenho garantia da energia, já que da concessionária, além de cara, costuma faltar com
freqüência", justifica o aposentado carioca. Ele tornou-se um entusiasta da energia eólica. Aprendeu com os técnicos da Enersud e faz sozinho a manutenção do equipamento, já trocou de aerogerador e pretende logo construir uma torre para aumentar a capacidade de geração. "Aqui é uma região de muito vento. Quando o vento pára, eu faço minha economia. Nunca faltou energia", conclui. Assim como fez na casa do Sr. Evaldo, a Enersud, sediada em São Gonçalo, também no Rio de Janeiro, já implantou mais de 200 máquinas em residências, pousadas, barcos, telecomunicações e outras unidades de pouco consumo, em 16 estados. Segundo Bruno Bressan De Cnop, administrador e sócio criador da empresa, nos seis anos de existência da empresa o desenvolvimento tecnológico é permanente. “Nos primeiros quatro anos ficamos desenvolvendo os equipamentos e
POTÊNCIA INSTALADA NO BRASIL 247,05 MW
Até 2010 – em torno de 2500 MW eólicos Até 2015 – em torno de 5000 MW
*Projeções da Empresa de Pesquisa Energética
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METAS
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Parque eólico de Osório nos últimos dois é que estamos efetivamente comercializando, mas sem deixar a pesquisa de lado”, explica De Cnop. Tudo isso a empresa vem fazendo com recursos próprios e também com o apoio do FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos, ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia. Com a persistência no desenvolvimento tecnológico e apostando no mercado da energia distribuída, a exemplo do que acontece no mundo, a Enersud teve seu faturamento dobrado nos últimos dois anos. Entre os equipamentos oferecidos pela empresa estão aerogeradores de 250, 300 Watts, suficientes para abastecer um barco, por exemplo, até uma máquina de maior porte com 100 KW. Mas esta, ainda está em fase de projeto de base de componentes, que envolve pesquisadores de alguns estados, como da USP de São Paulo, da UFSC, da UFCE. Apesar de a micro energia eólica ainda ser pouca no país, Bruno De Cnop acredita que em breve, seguindo o cenário internacional, a população vai forçar que o Brasil adote a geração distribuída. Na Europa, além de o Estado pagar a mais pela energia produzida por uma residên-
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cia, por exemplo, há financiamento para a aquisição do equipamento de energia renovável. “Aqui nem precisaríamos do financiamento. Se fosse permitida apenas a conexão da energia de micro geração na rede básica, já seria suficiente”, opina. Como exemplo, o administrador explica que, no litoral nordestino, onde em alguns estados o preço da energia chega a R$ 0,98 kw/h para o consumidor, se o Estado comprasse ao mesmo custo a energia gerada na casa ou comércio, a estimativa é que em três anos o investimento se pagaria. Ele comenta ainda que, por se tratar de geração em pequena escala, a incorporação deste tipo de energia ao longo das linhas de distribuição auxiliaria na capacidade, pois, quando uma linha é longa, ao chegar na ponta, já está fraca, com qualidade inferior. Essa micro geração já está pautada no Congresso Nacional, através de alguns projetos que agora tramitam em grupo e estão sendo discutidos por uma Comissão Especial criada exclusivamente para agilizar o debate. No entanto, desde agosto de 2007, quando da constituição desta comissão, não se tem mais notícias a respeito das matérias.
A morosidade na legislação contribui para que este tipo de investimento ainda seja tão modesto no país, pois nem mesmo o PROINFA o afetou. Outro importante programa de eletricificação social, o Luz para Todos, ainda não incluiu a energia eólica. Há em alguns estados o modelo híbrido com a geração solar, mas para a eólica ainda não passam de experimentos. A própria Enersud está fazendo sua tentativa junto a uma concessionária do Sudeste, de incluir a energia eólica no Luz para Todos. Mas ainda não tem uma definição. “Esperamos que estas iniciativas tragam bons resultados, pois todos os nossos clientes estão satisfeitos e acreditamos que a micro geração de eólica também tem um papel social importante a cumprir no nosso país”, finaliza Bruno De Cnop. MÃO-DE-OBRA E VALORIZAÇÃO REGIONAL Tanto para novos parques eólicos quanto para pequenos aerogeradores como os fabricados pela Enersud, requerem empregados qualificados para as funções específicas do setor. Por isso nos últimos anos as instituições de ensino vêm incentivando a criação de novos la-
boratórios e o aperfeiçoamento dos existentes. Na Universidade Federal de Santa Catarina, por exemplo, o Laboratório Solar, referência internacional em energia solar, incluiu as pesquisas com eólicas na sua atividade fim. Já na PUC de Porto Alegre, criou em 2007 o seu Centro de Energia Eólica ( CE-Eólica), que além de subsidiar os trabalhos de pós-graduação, promove ciclos de palestras que vêm contribuindo com informações sobre projetos de parques e levantamentos de potencial eólico. No Nordeste, as Universidades Federais do Ceará e de Pernambuco também vêm contribuindo significativamente para a pesquisa e consolidação destes estados como referências nacionais em energia dos ventos. Há ainda vários outros focos importantes de estudos no país, mas, sem dúvida, a maior referência é o CRESESB - Centro de Referência para Energia Solar e Eólica Sérgio de Salvo Brito, do CEPEL – Centro de Pesquisa em Energia
Elétrica, órgão do Ministério de Minas e Energia, com sede no Rio de Janeiro. Nele as pesquisas englobam geração e distribuição de energia em comunidades isoladas e de baixa densidade populacional e é uma instituição que armazena informações sobre com energia solar e eólica em todo o país. As empresas do setor consideram satisfatório o ensino dirigido às energias renováveis, mas acreditam que sempre é possível avançar. Para a instalação do parque eólico de Osório, por exemplo, a Enerfin estruturou um contingente de quase 1.000 pessoas de mais de 40 empresas brasileiras, que demonstraram uma grande capacidade de aprendizagem. Cerca de 60 técnicos brasileiros foram treinados na Europa e lideraram as diferentes equipes desse contingente. O desenvolvimento e investimento foi espanhol, a tecnologia alemã, porém a fabricação e execução foram brasileiras. Segundo o diretor do parque, ape-
nas, foi necessário melhorar a especialização dos técnicos nacionais nesta área, pois as novas tecnologias do setor ainda são pouco conhecidas na América Latina até hoje. Já na fabricante Wobben, que atua desde 1996, os 1200 funcionários são brasileiros. O que se repete na maioria dos parques e empresas ligadas diretamente à energia eólica (como as fabricantes de peças e outras). E os parques não demandam somente mão-de-obra especializada, mas tornam-se pólo gerador de desenvolvimento local. A constatação foi feita pela Agência Nacional de Energia Elétrica no estudo intitulado Estado das Energias Renováveis no Brasil, produzido pelo Fórum Permanente de Energias Renováveis, ainda em 1998. Segundo a pesquisa, a geração descentralizada, aproveitando recursos locais ou em regiões de difícil atendimento pelos sistemas convencionais, possibilita soluções mais adequadas e de menor custo
ENERSUD
Mesmo antes do PROINFA já existiam no Brasil alguns parques em operação, mas muito pequenos. Em 2003 eram seis unidades, com uma capacidade instalada total de pouco mais de 22MW. Destas, duas localizadas no Ceará – os parques de Taíba e Prainha – representavam 68% da produção eólica nacional. A primeira turbina no país para geração elétrica foi instalada em junho de 1992no Arquipélago de Fernando de Noronha/PE, através do projeto do Grupo de Energia Eólica da UFPE em parceria com a companhia energética de Pernambuco e financiamento do Folkecenter – um instituto de pesquisas da Dinamarca, país líder em fabricação de aerogeradores. Essa turbina é modesta, se comparada às novas que estão em operação no Parque Eólico de Osório, por exemplo, que têm 100 metros de altura. O primeiro aerogerador de Fernando de Noronha mede 23 metros de altura, 17 metros de diâmetro, com um gerador de 75 KW. Parece pouco, mas sozinha a turbina produzia eletricidade correspondente a 10% da geração total na ilha. Já a segunda turbina entrou em operação em 2001. Com as duas torres, nos primeiros anos desta década, Fernando de Noronha foi o maior sistema híbrido eólico-diesel do Brasil. Já a primeira central eólica a atuar como produtor independente está localizada em São Gonçalo do Amarante, município cearense. Em operação desde 1999, a usina gera 5MW com dez turbinas de 45 metros de altura. E para quem acha que somente no litoral é possível ter energia eólica, a Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG), já em 1994, ousou mostrar o contrário. Com o apoio financeiro do governo da Alemanha, construiu a Central Eólica Experimental do Morro do Camelinho, gerando 1MW. Passados14 anos, ainda está em operação. Já na Região Sul, a primeira experiência foi a Central Eólica de Palmas, no Paraná, inaugurada em 2000, com potência instalada de 2,5 MW. Em 2002, o Governo do Rio Grande do Sul apresentou o seu Atlas Eólico, para auxiliar em futuros projetos naquele estado, que até então não dispunha de nenhum parque eólico. Hoje o Estado é sede da maior fazenda eólica da América Latina, situada em Osório, litoral Norte.
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Um pouco de história
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global. Além do estímulo ao aproveitamento dos recursos energéticos locais, observa-se um desenvolvimento sócio-econômico regional considerável, de forma descentralizada. É que recursos aplicados na eletricidade eólica tendem a permanecer na comunidade, incrementando as econômicas locais através da geração de renda, emprego e receita fiscal. Uma grande turbina, ocupando um quarto de acre de terra, poderá, por exemplo, facilmente render ao proprietário cerca de 2.000 dólares em royalties por ano e, ao mesmo tempo, proporcionar à comunidade algo em torno de 100.000 dólares de eletricidade. Isto vem acontecendo com freqüência em países como os Estados Unidos, Espanha e Portugal. Ao mesmo tempo, o “arrendamento” para as eólicas tem motivado um aumento no valor das terras o que, em alguns casos, inviabiliza pequenos parques. Esta é mais uma situação que precisa de definição legal para coibir abusos. Mas há estudos mais otimistas. Para Leontina Pinto, da Engenho Pesquisa, Desenvolvimento e Consultoria Ltda, a implantação de parques eólicos beneficia mais que as comunidades locais. “Todo o país beneficia-se com a redução de custos e riscos, inclusive a região Sudeste (onde se observa uma grande redução de custos e riscos) e a região Norte – que apesar de não dispor, nesta configuração, de usinas eólicas, recebe uma complementação importante vinda do Nordeste”. Para a pesquisadora, o benefício da energia eólica como fonte complementar, além de nacional, é imediato: “Parte da “reserva estratégica” de água que deveria ser guardada para o futuro passa a ser utilizada na geração imediata, uma vez que a disponibilidade futura é maior. Em conseqüência, a complementação térmica e a probabilidade de cortes de suprimento reduzemse, assim como seus custos associados.” Outro impacto positivo está nos custos. Por este estudo, a implantação de usinas eólicas entre 2009 e 2011 proporcionará uma economia operativa de aproximadamente R$3,7 bilhões em gastos com combustível e cortes de energia,
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Marco regulatório no Brasil A Comissão do Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA) do Senado propôs na semana passada a elaboração de um novo marco regulatório para a energia eólica no Brasil até o dia 30 de julho. A proposta foi apresentada durante audiência pública sobre a ampliação da participação da energia eólica na matriz energética brasileira. A elaboração do documento prevê a participação da Comissão Especial de Fontes Renováveis de Energia da Câmara dos Deputados, representantes do governo federal, estadual e municipal, a associação brasileira de energia eólica e entidades ligadas à pesquisa e à produção de energias renováveis. O marco regulatório pretende viabilizar o desenvolvimento da energia eólica no país. O Conselho Global de Energia Eólica (GWEC, na sigla em inglês) viu com otimismo as últimas iniciativas brasileiras. "Recebemos com alegria as notícias sobre iniciativas políticas para o desenvolvimento da energia eólica no Brasil", declarou Ramón Fiestas, representante do conselho.
“equivalente grosseiramente a 14% do custo total de operação”. Pelo que se percebe junto aos investidores, fabricantes e pesquisadores, falta ainda no Brasil e na América Latina a decisão tática e estratégica, logística e ideológica, de Estado e de Nação, da necessidade da energia eólica. Nos países aonde este mercado vem crescendo vertiginosamente, há geração de
empregos qualificados, benefício a regiões energeticamente esgotadas, redução nos custos de energia e nos riscos dos sistemas ao amenizar o efeito das secas, diminuição na dependência do gás e contribuição no afastamento do temor de racionamento. Que governos e legisladores levem isso em conta na discussão energética dos nossos países.
Alternativa TECNOLOGIA SOCIAL EM FOCO
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Brasília sediará, entre os dias 24 e 28 de novembro, o II Fórum Nacional da Rede de Tecnologia Social e a II Conferência Internacional de Tecnologia Social. O objetivo é reunir as 602 instituições da Rede, além daquelas que se associarem ao longo de 2008. Com caráter consultivo e propositivo, o Fórum orientará o planejamento e deve definir as diretrizes, ações e resultados esperados ao longo do biênio 2009-2010. Entre os temas em discussão estarão Segurança Alimentar e Agroecologia; Energias Renováveis; Cidades Sustentáveis; Água e Agroextrativismo. Além do Fórum, a II Conferência Internacional deve estabelecer novos parâmetros para a viabilização das Tecnologias sociais, integrando diferentes experiências internacionais e aprofundando a discussão conceitual sobre o tema.
AGRICULTORES FAMILIARES USAM COOPERAÇÃO E TECNOLOGIAS SIMPLES PARA PRATICAR UM MODELO SUSTENTÁVEL
www.rts.org.br
Seu Tamires em seu cafezal
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N
a região que abriga o município matogrossense de Alta Floresta, território por onde se alastram pastos, patas de boi e os maiores índices de devastação da floresta amazônica no último ano, um naco de esperança germina pelo trabalho da Cooperativa dos Agricultores Ecológicos do Portal da Amazônia
amazônica INCLUIR
Vinicius Carvalho (Cooperagrepa), que reúne 300 famílias de agricultoras e agricultores dedicados à produção de alimentos orgânicos. São frutas, hortaliças, rapadura, açúcar mascavo, melado, café, leite, queijo e castanhas. As vendas, mesmo pequenas, já alcançam a Itália e a Áustria, assim como a merenda escolar de 24 mil crianças da região. Formada em 2003 por colonos que chegaram há décadas para o
norte de Mato Grosso, a cooperativa, apoiada pelo Sebrae, produz cerca de 500 toneladas de alimentos por ano nos municípios Terra Nova do Norte, Peixoto de Azevedo, Matupá, Guarantã do Norte, Novo Mundo, Carlinda, Alta Floresta, Nova Santa Helena e Marcelândia, na divisa do Mato Grosso com o Pará. A experiência baseia-se em Núcleos de Produção descentralizados, com pequenas e médias agroindústrias, e na certificação dos produtos, que são colhidos, processados e embalados na própria região. Na lista de produtos certificados já estão mandioca, café, guaraná, cana-de-açúcar e castanha do Brasil. “O projeto de produção de orgânicos da Cooperagrepa mostra que é possível um novo modelo em uma área muito especial, o Arco da Amazônia, que é hoje uma vitrine para o Brasil e para o mun-
do”, diz o gerente da unidade de Agronegócios do Sebrae Nacional, Juarez de Paula. A preocupação tem lugar se tomados os números da devastação. Nos quatro primeiros meses de 2008, o desmatamento em Mato Grosso totalizou 248 quilômetros quadrados, segundo dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Imazon. Um aumento de cerca de 117% se comparado com o mesmo período de 2007. A grande maioria (86%) da devastação ocorreu em propriedades privadas no norte de Mato Grosso, enquanto o restante aconteceu nos Assentamentos de Reforma Agrária. “A Cooperagrepa trabalha junto às comunidades, na conscientização do valor dos produtos nãomadeireiros e na importância da preservação da floresta para o equilíbrio ecológico”, explica o presidente da Cooperagrepa ,
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Sobrevôo sobre a região de Alta Floresta (MT)
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Domingos Jari Vargas. Os membros da cooperativa, que conseguiram a certificação dos seus produtos pela Ecocert Brasil, investem agora na certificação FLOCert, destinada a empresas e instituições que atuam com o comércio justo. A estratégia tem gerado resultados. Enquanto em 2005 o total comercializado rendeu R$ 15 mil aos agricultores, a expectativa do grupo é movimentar este ano R$ 1 milhão em vendas, valor que deve dobrar em 2009. “Nossa força está na organização do grupo. Sempre que há um desafio, os produtores buscam novas soluções. Aqui aprendemos a aprender”, destaca Vargas. Segundo ele, a saída para o
desenvolvimento sustentável na região passa pela diversificação de culturas, o uso de novas tecnologias e a adoção de sistemas agroflorestais, que começarão a ser implementados pela cooperativa este ano. “Nosso objetivo é promover sustentabilidade e desenvolvimento social a partir do uso racional dos recursos naturais, sem devastação e sem desperdício”, complementa. Em Alta Floresta desde 1987, Tamires Gomes da Silva, natural de Campos (RJ), tem uma propriedade de 50 hectares na comunidade de São Francisco de Assis, a 40 km da sede do município, onde planta comercialmente café orgânico e muitas outras culturas para
subsistência. “Estou concretizando meu sonho, sempre preservando e ampliando meu trabalho. Não podemos esquecer a questão da qualidade de vida. Aqui produzimos vários produtos e saímos da monocultura”, revela. Após amputar o dedo indicador devido ao uso intensivo de agroquímicos e ver a mulher beirar a morte por um problema pulmonar ocasionado pelo excesso de veneno usado na terra, Tamires se diz um “mascate” da sustentabilidade. “O bom é fazer isso ganhando um dinheirinho, por isso quero fazer a torrefação do meu café aqui mesmo. Hoje não ganho tanto, mas também não gasto. A gente acha que é impossível mudar, mas o tempo corrige”, diz.
Reunião do núcleo de produção dos agroextrativistas de castanha do Brasil da Cooperagrepa
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Desafios na produção Presidente da Cooperativa dos Agricultores Ecológicos do Portal da Amazônia (Cooperagrepa), o catarinense Domingos Jarí Vargas divide seu tempo entre a visita aos Núcleos de produção agroecológica da região e a participação em feiras internacionais, onde tenta fechar negócios com compradores preocupados com a procedência ambiental dos produtos que consomem. Nesta entrevista, ele fala sobre o papel da Cooperagrepa para a construção de um novo modelo agrícola na Amazônia e aponta o papel da tecnologia para este desafio
Qual o papel da tecnologia para a
PRESIDENTE DA COOPERATIVA DOS AGRICULTORES ECOLÓGICOS DO PORTAL DA AMAZÔNIA (COOPERAGREPA)
construção deste novo modelo? Para manter a qualidade do produto e certa uniformidade para a comercialização, por exemplo, precisamos de conhecimento. A tecnologia, para nós, é aquilo que a gente tem à mão ou desenvolve diante de uma necessidade. E o nosso exercício é pensar em tudo ao mesmo tempo, até porque é impossível pensar em uma coisa separada da outra. A tecnologia é que possibilita a gente botar na prática estes princípios ao mesmo tempo em que nos tornamos competitivos no mercado. Sem esse equilíbrio, torna-se muito difícil convencer os agricultores a apostar num novo modelo. A Cooperagrepa é formada majoritariamente por colonos que saíram de seus estados de origem em busca de novas alternativas. Como esse movimento marcou a região? A colonização foi quase um transplante e trouxe o mesmo modelo das terras de onde vieram, que era abrir área e limpar a terra. Não podemos
culpar estes agricultores, até porque naquela época a mentalidade era essa e não tínhamos conhecimento e consciência dos efeitos deste modelo para a região e para o planeta. Hoje temos mais informações, conhecimento. O maior desafio é a pessoa se propor a aprender a observar como a natureza funciona. A revolução acontece primeiro na cabeça da gente e então parte para a prática. A Cooperagrepa apostará agora na implementação de Sistemas Agroflorestais (SAFs) na região. Por quê? Os SAFs trazem todos os conceitos que a gente precisa em termos de prática. Ele garante, ao mesmo tempo, uma diversidade da produção e um aprendizado de como a natureza se reproduz e se organiza. É um espaço de multiplicação de conhecimento, que também recompõe parte da paisagem desmatada. Temos que começar a discutir, na região, o que são bens e serviços ambientais e como podemos estimular o agricultor a avançar nisso.
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Como a experiência da Cooperagrepa se inscreve na tentativa de construção de um novo modelo agrícola para a Amazônia? Todas as ações, desde o começo, aconteceram pela necessidade de mudança. Como um grande diferencial, aprendemos a aprender. Hoje temos uma diversidade enorme de tecnologias sociais que foram construídas pelos próprios agricultores. E o importante é que esse desafio de mudar a paisagem do Portal da Amazônia é hoje também um diferencial de mercado. Sempre que surge uma dificuldade, partimos na busca das soluções. Temos, por exemplo, um agricultor técnico em cada núcleo de produção para buscar esses novos conhecimentos e repassá-lo aos demais agricultores. Não podemos obrigar que todos sejam iguais a gente, mas temos que ser propositivos e buscar parcerias que nos ajudem nesse desafio.
DOMINGOS JARÍ VARGAS
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Foco em educação e geração
A Fundação Banco do Brasil atua em todo o país há 21 anos representando o banco em iniciativas de inclusão social. Desde a sua criação, já atuou em diversas áreas, mas hoje tem dois focos principais: educação e geração de trabalho e renda. “Nós buscamos uma inclusão social produtiva. Que os empreendimentos sejam sustentáveis, viáveis economicamente e que promovam inclusão. Que sejam geradores de oportunidades”, avalia o presidente da Fundação BB, Jacques Pena. O investimento social é realizado em programas próprios, estruturados e fundamentados em tecnologias sociais. O lema da instituição é a promoção de parcerias que mobilizem pessoas e multipliquem soluções sociais para que essas populações sejam protagonistas de sua própria transformação. Neste sentido, a Fundação aplica como método o conceito de tecnologias sociais. São produtos, técnicas ou metodologias reaplicáveis, que podem ser utilizadas em larga escala, desenvolvidas na interação com a comunidade e que representem efetivas soluções de transformação social. O conceito toma como base a solução de problemas específicos, especialmente voltados a demandas de alimentação, educação, energia, habitação, renda, recursos hídricos, saúde e meio ambiente através de parceiras entre o saber popular, a organização social e o conhecimento técnico-científico. “Importa essencialmente que sejam efetivas e reaplicáveis, propiciando desenvolvimento social em escala”, explica o presidente. Exemplos clássicos de tecnologia social são o soro caseiro que combate a desidratação e
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reduz a mortalidade infantil e as cisternas de placas pré-moldadas para coleta de água da chuva no semi-árido. São soluções que levam em conta o conhecimento da população, agregam conhecimentos científicos, resolvem problemas específicos e na maioria das vezes de longa data e podem ser reaplicados em outras regiões e comunidades. A Fundação BB investiu R$ 387 milhões em tecnologias sociais de educação e de geração de renda, entre os anos de 2003 e 2007. A partir desse conceito e do foco principalmente em geração de trabalho e renda é que a instituição renovou também sua visão de Responsabilidade Social, migrando da criação de projetos sociais assistenciais para programas de desenvolvimento social, econômico e ambiental. “A Fundação tem uma série de programas na área de educação que optamos por manter, que são inclusive estruturados em parceria com o Banco. Programas de alfabetização, por exemplo, ainda são extremamente importantes num país como o Brasil e não vamos deixar de atender 50 mil crianças. Mas ao optar por cada vez mais investir em projetos de priorizem geração de trabalho e renda nós queremos deixar essa característica assistencial”, afirma Pena. Entre as características desta nova atuação da Fundação, que segundo o presidente da instituição tem sido definida nos últimos cinco anos, está a atuação em toda a cadeia produtiva de um setor e a busca da inserção produtiva de pessoas em cadeias de produção específicas. Há projetos da Fundação BB que buscam promover a inclusão social por meio da inserção econômica de catadores,
quilombolas e agricultores familiares em cadeias produtivas. A ação acontece através da articulação de parcerias e incentivo a empreendimentos solidários, sustentáveis e de desenvolvimento local. Desde 2003, a Fundação investiu cerca de R$ 20 milhões em ações de reciclagem em todo o país. Em setores como a apicultura, a Fundação tem projetos de articulação e fortalecimento de agricultores familiares na cadeia produtiva do mel, com investimentos em empreendimentos nos estados de Piauí, Pernambuco e Ceará. Em setembro de 2007, a Fundação Banco do Brasil e parceiros inauguraram, em Picos (PI), um complexo industrial e tecnológico para envasar e exportar o mel da região. O empreendimento, que teve investimentos sociais da Fundação BB da ordem de R$ 3,2 milhões, é uma realização da Central de Cooperativas Apícolas do Semi-Árido Brasileiro (Casa Apis), que reúne dez entidades, localizadas em Picos, Pio IX, Itainópolis, Simplício Mendes, Piripiri, Esperantina e São Raimundo Nonato, no Piauí, além de Horizonte e Barbalha, no Ceará. No mesmo período houve investimento na cajucultura através de um programa de fortalecimento da agricultura familiar na cadeia produtiva do caju, com a implantação de minifábricas e centrais de processamento de castanha nos estados da Bahia, Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte. A Fundação BB investiu no projeto cerca de R$ 9 milhões, de 2004 a 2007. O caju é um produto popular na região, que produz a fruta e a polpa (pedunco) em quantidade, mas que carece de investimentos para beneficiar e aproveitar o frágil material que é colhido. O caju pode gerar crescimento e emprego para
Reaplicação de Tecnologias Sociais
as populações locais, que podem produzir mais e aproveitar melhor o que nasce na região. No plantio de mandioca, a Fundação tem um programa com ênfase no cooperativismo na região de Vitória da Conquista (BA). O projeto envolve 2.050 famílias de agricultores, organizados na Cooperativa Mista Agropecuária dos Pequenos Agricultores do Sudoeste da Bahia (Coopasub). A Fundação BB investiu, aproximadamente, R$ 3,2 milhões para fortalecimento da agricultura familiar em todo o processo produtivo, desde o plantio até a comercialização. Na criação de cabras há ênfase em ações de capacitação, disseminação tecnológica e de acesso aos mercados de carne, leite e peles. O programa já capacitou centenas de agentes de desenvolvimento rural (ADR) para atuar com os produtores, em diversos estados do Semi-Árido, além de Goiás, Tocantins e Roraima. O futuro da Fundação BB é reavaliado a cada três anos em planejamentos de suas ações, mas atualmente a expectativa é de aumentar os programas com ênfase no desenvolvimento territorial e trabalhar em cadeias produtivas específicas. Ha o interesse em projeto de crédito de carbono, em programas que enfatizem a juventude e também na área ambiental com destaca para as questões da água. “Todas as grandes instituições precisam expressar seu compromisso social. Se exige delas um posicionamento e um investimento no setor. A Fundação procura ter focos definidos na área e atuar próxima do Banco do Brasil, contribuindo com o desenvolvimento econômico a partir do investimento social”, concluiu Jacques Pena.
Cisterna
Horta
O PROGRAMA ÁGUA DOCE Sistema Integrado de Reuso dos Efluentes da Dessalinização é outro exemplo que, além de produzir água potável, reaproveita o sal resultante da dessalinização para a criação da tilápia rosa e o cultivo da planta erva-sal, utilizada para alimentar Fossa séptica cabras e ovelhas. A tecnologia, que está sendo reaplicada nos estados do Semi-Árido, evita ainda a contaminação do solo e do lençol freático. Em relação ao saneamento básico, há um projeto para substituir as chamadas fossas negras das propriedades rurais por fossas sépticas biodigestoras, que tratam o dejeto humano e produzem adubo orgânico líquido. A Fundação está reaplicando a tecnologia junto a mais de mil famílias em assentamentos da reforma agrária no entorno do Distrito Programa Agua doce Federal e em Minas Gerais. Na cidade de Cristalina (GO), a tecnologia social foi reaplicada em dois assentamentos. No município, com a utilização do adubo orgânico, os agricultores plantam arroz, feijão, milho, mandioca, maracujá, manga, goiaba, laranja, chuchu e batata. Além de garantir a subsistência, as famílias estão se organizando para comercializar o excedente. O custo de implantação do projeto de saneamento básico rural é de R$ 1,2 mil. www.fundacaobancodobrasil.org.br
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de renda
Para dar ênfase no conceito de tecnologia social, que respeitam as culturas e valorizam saberes individuais e coletivos, e descobrir solução espalhadas pelo país, a Fundação resolveu criar um banco de solução e o Prêmio Fundação Banco do Brasil de Tecnologia Social. Nele estão reunidos produtos, técnicas ou metodologias reaplicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade, que representem soluções de transformação. O prêmio acontece a cada dois anos. As iniciativas com resultados comprovados são certificadas e passam a compor o Banco de Tecnologias Sociais, um cadastro digital que conta com 434 soluções bem sucedidas em todo o país. Os projetos certificados podem ser conhecidos através do site da Fundação e muitos deles recebem investimentos da fundação para serem reaplicados em outras regiões. Entre as soluções destacadas está a construção de barragens contentoras de enxurradas, reaplicadas na região Nordeste e nos Vales do Urucuia e do Jequitinhonha (MG). Seu processo freia a degradação do solo, evitando a desertificação, e revitaliza mananciais, nascentes e córregos. O banco destaca ainda a Produção Agroecológica Integrada Sustentável (PAIS), que está melhorando a qualidade de vida no campo e gerando renda para mais de mil famílias do Semi-Árido brasileiro. O projeto substitui as técnicas convencionais de cultivo por uma horta em formato circular, irrigação por gotejamento e um galinheiro para fornecimento de adubo orgânico. Em parceria com o Sebrae, 1.080 unidades foram implantadas em 36 municípios, em 12 estados brasileiros.
SOS MATA ATLÂNTICA Há 22 anos, quando o discurso ambiental ainda era tratado com preconceito, proteger o que ainda restava das nossas florestas foi o que motivou a criação da ONG SOS Mata Atlântica, hoje uma referência internacional
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você sabia? Os estudos feitos a partir das imagens de satélite mostram que de 2000 a 2005 a Mata Atlântica está reduzida a 7,26% do seu tamanho original. Os estados que mais desmataram foram Santa Catarina, Minas Gerais e Bahia. No entanto, o mesmo estudo mostra que apesar da continuidade do desmatamento, agora ele se dá em menor escala: uma redução de 69% na taxa comparada ao período anterior.
Defender os remanescentes de Mata Atlântica valorizando a identidade física e cultural das comunidades humanas que os habitam. Este objetivo aparentemente atual num momento em que é crucial a manutenção das florestas para diminuir os efeitos do aquecimento global, não tem nada de novo Na época em que foi criada a ONG SOS Mata Atlantica a principal bandeira era a busca de uma política de defesa. Ao preservar as florestas, a entidade com atuação nacional, acredita que também serão conservados os patrimônios natural, histórico e cultural de
cada região do país, extremamente ricos e diversos. Nestas mais de duas décadas de existência, o SOS Mata Atlântica conseguiu importantes vitórias e tornou-se uma “grife verde”. De todas as ações, talvez a mais significativa foi a sanção pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em dezembro de 2006, da Lei da Mata Atlântica (Lei 11428, de 22/12/2006), que tramitava no Congresso Nacional havia 14 anos. No ato da assinatura em Brasília, disse o Sr. Mario Mantovani, Diretor de Mobilização da Fundação SOS Mata Atlântica: “Esta lei foi construída para ser um exercício da cidadania sócio-ambiental, está repleta de instrumentos que permitem valorizar o controle social e é de fácil entendimento para qualquer cidadão leigo. Lei aprovada, uma nova ação foi iniciada pela SOS Mata Atlântica: a de fiscalizar a aplicação da lei, denunciando abusos e promovendo a divulgação do saber através de cursos, palestras e publicações, além de manter-se atuante nos fóruns sociais sobre meio ambiente. Uma tarefa mais que necessária quando MARCELO
Centro de Experimentos Florestais, em Itú (SP)
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TRAD
Veja a íntegra da Lei 11428/2006 no link http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11428.htm - Para acessar o Atlas da Mata Atlântica: www.sosma.org.br
ambiente
tir em novas e maiores ações de conscientização, seja em comunidades isoladas, como em grandes empresas nacionais e eventos de repercussão internacional. O SOS Mata Atlântica trabalha em importantes publicações, como o Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, um projeto desenvolvido com o Instituto de Pesquisas Espaciais – INPE, atualizado periodicamente desde 1988, e que hoje é considerado a principal ferramenta de conhecimento da Mata Atlântica pela sociedade. Somam-se a estas iniciativas um número incontável de projetos de conservação, produção de dados, campanhas, estratégias de ação na área de políticas públicas e programas de educação ambiental, cidadania, desenvolvimento sustentável e proteção e manejo de ecossistemas. O desafio é interminável. Afinal, da cobertura original de 1.300.000 km2 do território nacional, hoje restam apenas 7% de floresta Atlântica, ou 1% do território brasileiro. Ainda assim a Mata Atlântica é considerada a detentora de uma das maiores diversidades do mundo, com mais de 450 espécies de árvores por hectare, protegendo outras 383 espécies de animais considerados em extinção (estima-se que o total de espécies animais nesta situação em todo o Brasil seja de 633) e abrigando 20 mil espécies vegetais e 2168 de animais. Isso sem falar do respeito à cultura e à sobrevivência das populações isoladas ao longo de toda extensão: aproximadamente 70 povos indígenas e mais de 370 comunidades quilombolas. Estes dados fazem da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica a maior em área de floresta do mundo, com 35 milhões de hectares.
PRÊMIO PARA DIVULGAR A BIODIVERSIDADE Entre as iniciativas para fomentar a disseminação de informações sobre a Mata Atlântica está o Prêmio de Reportagem sobre a Biodiversidade da Mata Atlântica. Em parceria com outras instituições como a Aliança para a Conservação da Mata Atlântica, a Conservação Internacional/Brasil, a Fundação Biodiversidade do governo da Espanha e o Centro Internacional para Jornalistas, a premiação motiva a pauta ambiental nas redações e assim, o assunto ecoa na sociedade. Junto à sociedade, já foram realizados, os projetos Viva Mata, mostra anual que desde 2005 apresenta iniciativas e projetos em prol da Mata Atlântica, o Mata Atlântica vai à escola, com palestras de educação ambiental, o Programa Costa Atlântica, que trata da biodiversidade marinha, o Projeto Clickarvore, onde foram plantadas mais de 10 milhões de mudas de árvores nativas até 2007, o Florestas do Futuro que em 2006 plantou 420 mil mudas em áreas de bacias hidrográficas, o Projeto Sustentabilidade e Certificação na Mata Atlântica, este certificado pelo FSC no Brasil como primeiro produtor de erva-mate sustentável (no ano 2003, em Putinga/RS), o Pólo Ecoturístico do Lagamar, premiado como o "Melhor Projeto de Planejamento de Destino Ecoturístico do Mundo" pela revista Condé Nast Traveler em 1999, o Centro Tuzino de Educação Ambiental e Difusão do Palmito, com a distribuição de cerca de 150 mil matrizes de palmiteiros, a Campanha pela Despoluição do Tietê, um abaixo-assinado que reuniu mais de 1,2 milhão de assinaturas em 1991, Plantando Cidadania e muitos outros bem sucedidos anteriores a estes.
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se vê os dados alarmantes do desmatamento. A Mata Atlântica está reduzida a 7,26% do seu tamanho original, mas com menor velocidade de desmatamento. E isso, para o SOS Mata Atlântica, tem que ser comemorado. Por isso, em 2008, a ONG reeditou o VIVA MATA, inúmeras atividades para celebrar o mês e o Dia da Mata Atlântica, 27 de maio. Foram exposições fotográficas de espécies e paisagens da Mata Atlântica, palestras gratuitas, teatros e a participação efetiva nos debates da Frente Parlamentar Ambientalista. Esta luta permanente de mais de duas décadas não conseguiria manter-se apenas com as doações dos valorosos voluntários e as contribuições associativas regimentais. A nobre causa foi encampada por agências internacionais de cooperação, empresas, fundações e institutos empresariais e a comercialização de produtos e venda de serviços. Assim, para alcançar um público cada vez maior em todo o território nacional, desde os moradores de áreas de ocupação, passando pelos movimentos sociais, professores e estudantes nas escolas e universidades, chegando às empresas e governos, o orçamento anual da Fundação varia de R$ 600 mil a R$ 1 milhão. Segundo o Balanço Financeiro da Entidade do ano 2007, a maior aplicação dos recursos está em projetos, seguida por produtos em campanhas e eventos e despesas com pessoal. Este investimento tem um efeito-bumerangue: ao aparecer na sociedade e mostrar sua importância, o SOS Mata Atlântica angariou um número respeitável de filiados, passando dos 360 em 1988 para mais de 200 mil em 2007. Assim, aumenta a arrecadação e é possível inves-
Alternativa para investimento local AS FUNDAÇÕES COMUNITÁRIAS TÊM DEMONSTRADO POTENCIAL EM PROMOVER A ARTICULAÇÃO DE INVESTIMENTOS DE DIVERSOS SETORES DA SOCIEDADE
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s fundações comunitárias surgiram inicialmente nos Estados Unidos, mas a partir da década de 70 foram implantadas em vários países do mundo. Apesar de assumirem características muito diferentes em função das características socioeconômicas e políticas de cada contexto, em sua expansão internacional as fundações comunitárias têm preservado sua essência, ou seja, o princípio operacional de articulação e potencialização de recursos locais. A avaliação é de Lucia Dellagnelo, doutora em Educação e
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Lucia Dellagnelo: o futuro pode ser melhor Desenvolvimento Humano pela Universidade de Harvard, consultora de organizações nacionais e internacionais na área da educação e desenvolvimento social e presidente do Icom (Instituto Comunitário Grande Florianópolis). Numa palestra realizada sobre o tema, Lucia disse que na América
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Latina o movimento de disseminação de fundações comunitárias ainda é incipiente. “Com exceção do México, onde já operam mais de 20 fundações comunitárias, as fundações comunitárias ainda são pouco conhecidas de lideranças latinoamericanas do setor público e privado”. Fundações comunitárias são organizações da sociedade civil (OSC) que têm demonstrado elevado potencial de promover a articulação de investimentos de diversos setores da sociedade em prol do desenvolvimento local. Ao reunirem recursos de uma ampla gama de doadores através de fundos de investimento social comunitário, as fundações comunitárias têm criado sinergia e potencializado o impacto de iniciativas sociais em nível local. Segundo a opinião de Lucia, as fundações comunitárias têm o potencial de responder adequadamente a um dos principais desafios do investimento social privado no Brasil: a articulação, de forma eficiente e sustentável, dos recursos de diversos setores da sociedade em prol do desenvolvimento local. Pesquisas e análises de profissionais experientes do terceiro setor mostram algumas tendências preocupantes na área do investimento social privado no país. “Entre estas tendências estão a fragilidade institucional e a dificuldade em acessar novos recursos da grande maioria das 280 mil organizações sem fins lucrativos no Brasil”, afirmou. Apesar de investirem recursos consideráveis na área social, as fundações corporativas têm optado por executar seus próprios programas sociais deixando de financiar assim a atuação de pequenas organizações que historicamente estão
inseridas e desenvolvem trabalho social relevante nas comunidades. “Delineia-se assim um cenário onde a concentração de recursos e poder de articulação de algumas poucas organizações (geralmente as grandes fundações) contrasta com a fragilidade financeira e institucional de milhares de pequenas organizações sem fins lucrativos. A desigualdade e assimetria que permeia a estrutura da sociedade brasileira permeia também o universo de organizações do terceiro setor”. Por isso é que Lucia acredita que o conceito de fundação comunitária parece promissor para reverter essas tendências que ameaçam o desenvolvimento saudável e sustentável do terceiro setor e do contexto do investimento social privado no Brasil. Principalmente ao consider as seguintes premissas das fundações comunitárias: articulação de recursos humanos e financeiros existentes e a mobilização de novas fontes de investimento social; transformação do investimento social em uma atividade acessível a todos os cidadãos; acessibilidade e transparência das fontes de financiamento e o comprometimento com a continuidade e permanência. “Isso não garante que elas sejam capazes de solucionar todos os desafios do investimento social comunitário, mas há um forte potencial das fundações comunitárias em reverter algumas lógicas que silenciosamente se instalam no cenário do investimento social privado, como a competitividade, duplicação de esforços e ausência de bases institucionais para articulação de parcerias, que começam a surgir no Brasil as primeiras experiências organizações inspiradas neste conceito”, conclui Lucia.
Uma cidade pode fazer seu check up anual. O ICOM, Instituto Comunitário Grande Florianópolis, lançou em junho o Relatório 2007 do Programa Sinais Vitais. O documento tem como objetivo oferecer às pessoas informações relativas a questões sociais, econômicas e ambientais de suas cidades. A iniciativa reúne dados de fontes disponíveis na comunidade e os apresenta de forma clara e acessível. Com o apoio da Fundação AVINA, do PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e do Community Foundations of Canada - CFC, o Icom realizou diversas parcerias locais para a realização deste relatório: Secretaria Municipal da Educação, Ministério Público de Santa Catarina - Divisão de estatística, as universidades do estado e federal de Santa Catarina, organizações privadas como a UNIMED e a Sócio-ambiental Consultoria, além do Centro Cultural Escrava Anastácia. O relatório foi desenhado em sintonia com os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e esta primeira versão apresenta informações referentes à população, realidade econômica ( PIB, remuneração), habitação, saúde, segurança e bem-estar, cuidado com as crianças, educação (básica e ensino superior), meio ambiente ( saneamento básico, acesso à água, unidades de conservação, etc) e participação comunitária ( voluntariado e organização da sociedade). Lucia Dellagnelo, presidente do Icom, diz que este relatório é um primeiro passo para identificar aspectos positivos e os que ainda precisam de atenção no desenvolvimento da cidade. “Os números são mensurados com o intuito de oferecer subsídios às autoridades e a à própria comunidade para agir dentro das suas possibilidades e obrigações. Além disso, pessoas físicas e jurídicas podem ter dados mais concretos sobre investimentos que possam vir a fazer em determinadas ações sociais ou ambientais”, explica Lúcia. O Relatório Sinais Vitais foi baseado no modelo canadense. Monica Patten, presidente do Community Foundations of Canada, organização que congrega fundações comunitárias do Canadá e incentiva o desenvolvimento de fundações comunitárias em diversos países, esteve presente no lançamento, em Florianópolis, e reforçou a idéia de que com informações é mais fácil agir e buscar soluções. “A ação depende de tomada de decisões entre os diversos setores da sociedade, por isso os dados deste check-up servem como início para aprofundar as relações e buscar novos dados”, disse Monica. Perguntada sobre as diferenças entre o Canadá e a realidade brasileira, ela disse que os princípios de fomentar o diálogo entre as partes, incentivar a prática em escolas e universidades e mostrar que todos podem ajudar são muito parecidos nos dois países. “O relatório não é um fim em si, mas um começo. É preciso que este esforço se torne sistemático, para que a comunidade possa criar a cultura de avaliar o seu desenvolvimento ao longo do tempo, em parceria com universidades, institutos de pesquisa e imprensa”, conclui.
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Check-up das cidades
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O sucesso da carreira do tenista Guga Kuerten, encerrada este ano na quadra que lhe consagrou em Roland Garros, propiciou a toda família uma intensa atividade social. A mãe Alice e o irmão Rafael acompanharam a evolução no esporte e os negócios de Guga sem deixar de lado a responsabilidade social.
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EXEMPLO VENCEDOR
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No ano de 2000, foi criado o Instituto Guga Kuerten, para organizar a mobilização de esforços, recursos e estabelecer parcerias para o desenvolvimento de novas ações sociais. O esporte é um dos focos de ação e a idéia é usar a prática esportiva como forma de desenvolvimento, educação e inclusão de crianças e adolescentes de camadas menos favorecidas à sociedade. Através dos espaços educativos complementares à escola, o IGK pretende contribuir para a formação pessoal e social de crianças e adolescentes, bem como, para o futuro do país.
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O Instituto lançou a sexta edição do Prêmio IGK, que reconhece e premia com recursos financeiros reportagens, ações sociais e educativas realizadas em prol da inclusão de crianças e adolescentes.Guga dá o nome e empresta sua alegria cada vez que visita os projetos desenvolvidos pelo Instituto. Como mostram as fotos gentilmente cedidas pelo IGK, Guga joga futebol, tênis e diverte-se com as crianças. Mesmo com outras atividades que deve iniciar ainda no mundo do tênis, Guga certamente terá mais tempo para colaborar com as iniciativas mantidas no Instituto.
ENTREVISTA ENTREV REVISTA ENTREVISTA PRIMEIRO PLANO . ANO 3 . NO 10 . JULHO 2008
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NEMÉRCIO NOGUEIRA, Diretor de Assuntos Institucionais da Alcoa América Latina e Caribe
E as questões sociais? Como isso evoluiu dentro da empresa? Podemos citar vários exemplos, mas um deles é o das parcerias – um aspecto fundamental para assegurar a sustentabilidade das comunidades e evitar que se crie uma relação de dependência entre elas e a companhia. Em Juruti, no Oeste do Pará, onde está implantando uma unidade de mineração, a Alcoa criou, em parceria com a comunidade, o Conselho Juruti Sustentável, do qual participam o poder público, empresas e organizações não-governamentais. A formação da nova instituição em Juruti é considerada, por muitos, um novo exemplo a ser seguido em outros municípios e nossa posição tem sido a de catalisador dessa iniciativa e de participante juntamente com todas as outras organizações ali presentes. Uma pesquisa realizada pelo IBOPE em Fevereiro deste ano demonstra que a quase totalidade (89%) da população de Juruti encara de forma positiva o empreendimento de instalação de uma nova mina de bauxita da Alcoa no local. Com a adoção da Agenda Positiva, composta por ações volun-
tárias voltadas para as áreas de Educação, Saúde, Segurança, Infraestrutura e Assistência Social, será possível ajudar a melhorar a qualidade de vida da população. Esse conjunto de atividades, orçado em R$ 50 milhões, garantirá benefícios que trarão frutos durante e após o tempo de atividade do empreendimento. Por meio de importantes parcerias com instituições como o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e as Associações Comerciais e Empresariais de Juruti (ACEJ) e de Santarém (ACES), a Alcoa vem estimulando o empresariado da região Oeste do Pará a se qualificar. Com isso, incentiva o crescimento profissional, bem como a geração de renda e empregos, além de melhorar a infraestrutura de serviços e fornecimento.
ENTREVISTA
A Alcoa é uma das líderes mundiais na produção de alumínio. Fundada em 1888 nos Estados Unidos, passou a ter esse nome em 1910 e dez anos depois já expandia sua atuação em outros países. A empresa atende aos mercados aeroespacial, automotivo, de embalagens, construção, transporte comercial e industrial, levando design, engenharia, produção e outras capacitações das empresas da Alcoa aos seus clientes. Reconhecida pelas ações em prol do desenvolvimento sustentável, a Alcoa foi nomeada pela quarta vez consecutiva em 2008 uma das empresas mais sustentáveis do mundo, durante o Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça. Em 1990 foi criado o Instituto Alcoa, com o objetivo de melhorar a condição de vida das comunidades onde a companhia e suas subsidiárias atuam, através da aplicação de recursos na realização de atividades, predominantemente nas áreas de educação, saúde, meio ambiente e bem-estar social. Nesta entrevista, o diretor de Assuntos Institucionais da Alcoa América Latina e Caribe, Nemércio Nogueira, relata um pouco mais da história e de como a empresa evolui para se adequar às exigências cada vez mais restritivas em relação ao setor.
A Alcoa é uma das líderes mundiais na produção de alumínio. Como tem sido a evolução para tratar de questões ambientais? A Alcoa tem sempre se antecipado às exigências da lei, procurando a eficiência no uso das matérias-primas em suas atividades. A empresa atua por meio das melhores práticas de recuperação de áreas mineradas de bauxita. Em Poços de Caldas (MG), por exemplo, onde está presente há 43 anos, foi implementado um sistema de reabilitação que é referência mundial, tendo sido reconhecido duas vezes pelo Prêmio de Excelência Ambiental, em 1993 e 1999, concedido pela Alcoa Inc. A reabilitação de áreas mineradas no País já era realizada na Alcoa mesmo antes da Constituição de 1988, que estabeleceu a obrigatoriedade da prática pelas empresas de mineração.
TODOS OS DIAS, NO MUNDO INTEIRO, A ALCOA: - minera 86.300 toneladas de bauxita e 27.300 toneladas de carvão - refina 41.000 toneladas de alumina - funde 9.575 toneladas de alumínio - recicla 2.300 toneladas de alumínio - fabrica 8.810 toneladas de produtos de alumínio - monta sistemas de distribuição elétrica para 20.400 veículos - gera 96.000 MWH de energia elétrica - compra US$ 27 milhões em bens e serviços Pela quarta vez consecutiva em 2008, uma das empresas mais sustentáveis do mundo, durante o Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça. O que isso representa e o que alavanca dentro da empresa? A inclusão na lista Global 100, que aponta as empresas mais exemplares em práticas empresariais
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Desafio permanente de um líder mundial
ENTREVISTA ENTREV REVISTA ENTREVISTA
sustentáveis, divulgada durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça, reflete nosso esforço e o valor que damos à sustentabilidade. Incorporamos os conceitos do desenvolvimento sustentável às nossas práticas empresariais, parcerias e participação com as comunidades. Vemos a sustentabilidade como uma conseqüência simultânea de êxito financeiro, excelência ambiental e responsabilidade social. Isso oferece benefícios de longo prazo às partes que atuam conosco e à Alcoa também. Esse reconhecimento dá impulso a nossas iniciativas.
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Qual a estrutura da empresa para cuidar dos temas RSE e desenvolvimento sustentável? Todos os profissionais que trabalham na Alcoa têm o desafio permanente de desenvolver mecanismos para que a empresa opere e cresça de forma sustentável. Para tornar essa aspiração realidade criamos em Dezembro de 2007 o Comitê diretor de sustentabilidade que, composto por nossos diretores, tem como missão garantir o desdobramento e internalização do conceito por toda a organização. Temos um time corporativo que apóia as áreas, realizando consultorias internas e treinamento em todas as unidades, para que todos estejam preparados para multiplicar o conceito. Nas unidades, nossos funcionários podem contribuir como voluntários em diversos projetos apoiados pelo Instituto Alcoa, que tem como principal objetivo melhorar a condição de vida das comunidades onde a companhia e suas subsidiárias atuam. A cultura Alcoa em busca do desenvolvimento sustentável é reconhecida. De que forma isso é trabalhado em diversos países? Há ajustes de acordo com cada lugar? A companhia adotou, em âmbito mundial, a Estratégia Global de Sustentabilidade 2020, por meio da qual são estabelecidas metas claras e ambiciosas relacionadas a fatores como redução do consumo de água e de ener-
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gia, o reaproveitamento e a reciclagem dos resíduos e a diminuição das emissões de gases. Nesse último caso, por exemplo, a Alcoa foi muito além. O objetivo inicial da empresa era obter uma redução de 25% das emissões mundiais diretas de gases causadores de efeito estufa até 2010, a partir de 1990, mas atingiu esse percentual já em 2003, sete anos antes. Nos últimos dois anos, a Alcoa no Brasil se uniu a um grupo de empresas que trabalharam com a metodologia GLN-Global Leadership Networking para identificar, junto a funcionários, representantes de governo e ONGs, as questões de sustentabilidade mais relevantes e que, portanto, necessariamente precisam ser englobadas pela estratégia e ação da companhia. Essas questões podem ser modificadas ao longo do tempo em razão de situações de mercado e de estratégias da Alcoa mas acreditamos que os seguintes temas ainda são muito relevantes: acesso à energia e seu uso eficiente, desenvolvimento local e regional, gestão e desenvolvimento de pessoas, estratégia das relações do trabalho, gestão de resíduos e emissões, conservação e biodiversidade. Estes são interligados com dois temas verticais: diálogo com partes interessadas e transparência e responsabilidade.
Como funciona o diálogo entre empresa e comunidade? Mantemos um diálogo aberto e constante com as comunidades onde atuamos. Numa democracia é a sociedade quem de fato nos dá a licença e aprovação para operar. Essa licença tem de ser renovada a cada dia, todos os dias. E nós precisamos demonstrar que merecemos essa renovação, agindo da maneira responsável que a sociedade espera de nós. Sem o diálogo com os públicos interessados em nossas atividades, nada disso é possível. Nossa participação na comunidade, que sempre foi muito intensa, está sendo ampliada ativamente, expressa em nossas parcerias com entidades não-governamentais e acadêmicas como o Instituto Ethos, o FUNBIO-Fundo Brasileiro para a Biodiversidade, o IBENS, a USP, a Fundação Getúlio Vargas e outras. É importante notar, porém, que só seremos plenamente sustentáveis, como empresa e como cidadãos, se a nossa sociedade for sustentável. Ou seja, não se consegue ser sustentável sozinho. Os caminhos e soluções dependem de parcerias. E como ocorrem essas parcerias? Essas parcerias visam a criar diálogo mais intenso e construtivo, bem como o desenvolvimento
Projeto social realizado por funcionários da Alcoa na Escola Estadual David Campista em Poços de Caldas (MG)
Dentro da empresa há uma transversalidade com estes temas? A política de relações governamentais da empresa alinha-se às decisões tomadas pela Alcoa Inc. – todas as iniciativas estratégicas devem ser aprovadas pela Alcoa Inc. A companhia possui Valores básicos que devem ser vivenciados permanentemente por todos os seus 97 mil funcionários no Brasil e nos outros 33 países em que a empresa atua. Esses valores são: Integridade; Saúde, Segurança e Meio Ambiente; Cliente; Excelência; Pessoas; Lucratividade; e Responsabilidade. A Alcoa preza pela excelência, qualidade e transparência em todas as suas atividades. Para a empresa, é preciso fazer as coisas de forma correta. Os valores da companhia devem sempre estar presentes nas tomadas de
NÚMEROS DA ALCOA Funcionários: 97.000 funcionários em 34 países
decisões dos negócios e ações de todos os funcionários, estendendo-se aos fornecedores, clientes, parceiros e comunidades onde atua. O diálogo e a transparência com todos de seu relacionamento, como dito anteriormente, estão entre as prioridades nas questões de sustentabilidade. No Brasil, quais as principais preocupações da Alcoa nas comunidades onde atua? Em todos os lugares onde a Alcoa atua a preocupação é a de ajudar a melhorar a condição de vida das comunidades, por meio de parcerias. A companhia atua por meio de programas sociais e a partir de doações das empresas do Grupo, além de recursos adicionais provenientes da Alcoa Foundation e do Instituto Alcoa financiando projetos que atendam às reais necessidades e carências das comunidades. São ações predominantemente nas áreas de educação, saúde, meio ambiente e bem-estar social. Essa atuação da Alcoa tem como forte aliado o engajamento em ações voluntárias por parte dos funcionários. Em 2007, somando os recursos da Alcoa, do Instituto Alcoa e
ENTREVISTA
Receitas em 2007: US$30,7 bilhões
da Alcoa Foundation, foram doados R$ 8,9 milhões a 155 ações e projetos comunitários, beneficiando cerca de 1,6 milhão de pessoas em 25 cidades brasileiras. Sempre há dificuldades em qualquer empresa que lida com produtos como os da Alcoa. Como a empresa enfrenta crises ambientais ou mesmo de impacto nas comunidades? Como em qualquer atividade industrial – e, a rigor, qualquer atividade humana – as atividades da Alcoa acarretam impactos no meio ambiente. Para reduzir esses impactos ou eliminá-los, a companhia investe em sistema de monitoramento e gestão ambiental e no desenvolvimento de novas tecnologias. A Alcoa também aposta no diálogo aberto e constante com a população. Isso norteia as operações da companhia, aprofundando o compromisso em proteger o ambiente, obedecer às leis e regulamentos e até se antecipar e exceder às exigências legais, obtendo eficiência máxima no uso das matérias-primas e eliminando os impactos que possam resultar de operações da companhia.
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de trabalhos voltados para a promoção da sustentabilidade, da biodiversidade, da ética empresarial. E essa ação não se concentra em uma ou outra de nossas localidades ou das operações onde temos participação na América do Sul, mas em todas elas. Todos esses fatos e ações mostram que a sustentabilidade, para a Alcoa, não é uma palavra bonita, uma filosofia esotérica, um discurso politicamente correto ou uma conversa de marketing. É na verdade uma forma de comportamento responsável – e indispensável – não só da companhia como um todo, mas também de cada funcionário. Isso é sustentabilidade. O modelo de atuação social da Alcoa, totalmente estruturado, já soma mais de 15 anos, por meio do Instituto Alcoa. A política de relações comunitárias estabelece como objetivos a identificação de áreas de conhecimento/atuação em que a contribuição da Alcoa seja mais produtiva, de ações compatíveis com seus Valores, o reforço contínuo do processo de incorporação da cidadania e a certeza de que a implementação de projetos comunitários seja norteada pelos Planos Operacionais das Unidades da empresa.
MEU MUNDO PRIMEIRO PLANO . ANO 3 . NO 10 . JULHO 2008
“Na região serrana, em São Luis do Purunã, entre Ponta Grossa e a capital paranaense, estamos montando um ateliê residência. É um espaço para atores e artistas terem tranquilidade para pensar em novos projetos, realizar pesquisas e conseguir fazer uma espécie de mergulho artístico”. “A partir da vivência neste espaço, cada um ou cada grupo pode obter resultados com seus projetos ou simplesmente garantir momentos de criação, reflexão e liberdade”.
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“A parte arquitetônica está toda sendo feita pelo Espaço Cenográfico, de São Paulo. Estão sendo utilizados materiais reciclados, madeiras de pinus e eucalipto, vindos de áreas reflorestadas. Além disso, a construção é simples mas foi erguida de maneira responsável, com materiais baratos e que aliassem efeitos térmicos e acústicos ideais para as condições da região e do propósito do ateliê”. “A intenção é que estes espaços sirvam também à comunidade. Queremos oferecer oficinas e atrações aos jovens da região, afinal o teatro exi-
ge profissionais de diversas áreas, como iluminação, som, figurino, carpintaria, adereços e cenários. A reunião de profissionais servirá também para repassar conhecimento aos jovens”. “Outra idéia é abrir a biblioteca para consultas e pesquisas de todos. Parece simples, mas um grande acervo pode servir como ferramenta para profissionalização ou mesmo interesse pelo assunto. Mais tarde devemos transformar a biblioteca em um Centro de Pesquisa, se tivermos apoio ou mesmo conseguirmos vender alguns espaços”.
O ator Luis Melo revela, numa rápida conversa, valores que hoje se perderam na modernidade dos centros urbanos e na velocidade da era da informática. Para ele, o descarte e a substituição frequente dos produtos tomaram o lugar do prazer de fazer as coisas em casa. “As pessoas querem cada vez mais praticidade e se acostumaram em consumir mil tipos de embalagens, jogar fora e comprar outra”, comenta ele ao relatar detalhes do projeto que está implantando na cidade de São Luis do Purunã (PR). Ator formado pelo Curso Permanente da Fundação Teatro Guaíra, Luis trabalhou em Curitiba como ator e professor de teatro até 1985, quando então foi para São Paulo, onde se tornou, durante dez anos, o primeiro ator do Grupo Macunaíma, dirigido por Antunes Filho. Na época ganhou prêmios importantes, como o Prêmio Shell para o
“Trabalhamos na região não de forma impositiva, estamos sempre dialogando com a comunidade e mostrando exemplos. Pequenos gestos como juntar lixo jogado no chão ou usar lenha como cerca, são exemplos que mexem com a rotina da comunidade”.
“Estou sempre preocupado em mostrar bons exemplos e acho que isso é um processo. Tenho impressão que as pessoas poluem o próprio local onde moram sem se darem conta dos
Luis Melo
Teatro Brasileiro e Prêmio Moliére – Air France, ambos pela peça “Paraíso Zona Norte”. De 1995 a 2000 desenvolveu trabalho solo em teatro de pesquisa. Sua carreira no cinema e na televisão também teve momentos marcantes, foram 27 novelas e minisséries e 13 filmes. Em 2001 retorna a Curitiba para criar juntamente com Nena Inoue e Fernando Marés o ACT – Ateliê de Criação Teatral, espaço voltado para a pesquisa e a experimentação artística fora do eixo Rio – São Paulo. Ali desenvolve atividades culturais de caráter multiárea, com programação de oficinas, cursos, workshops, ensaios,
apresentações de espetáculos, exposições e performances. Promovendo intercâmbio cultural com outros núcleos de pesquisa. Em 2002 estreou o espetáculo “Cãocoisa e a Coisa Homem”, primeiro resultado do processo de trabalho do Núcleo de Pesquisa do ACT – Ateliê de Criação Teatral. Em 2005 estreou a peça “Daqui a duzentos anos”, direção de Márcio Abreu, que lhe rendeu o Prêmio APCA/SP (Associação Paulista de Críticos de Arte). No total são mais de 30 peças de teatro. Nesta entrevista exclusiva à Revista Primeiro Plano, Luis Melo conta suas idéias de difusão cultural e inclusão.
“Nosso caminho do ateliê-residência é rumo a um encontro anual de artes. Isso já reflete na auto-estima da comunidade, que tem no turismo ecológico e nos esportes radicais seus pontos fortes de desenvolvimento econômico. Mas com o trabalho que estamos realizando conseguimos animar as pessoas e transformar aos poucos, sem mudanças drásticas, o que pode tornar os resultados mais perenes”.
prejuízos, por isso sempre recolho o que vejo de lixo pelas estradas e terrenos, reutilizo materiais e o sonho é incluir as pessoas através da arte, da cultura”.
SOBRAS NO PISO
MEU MUNDO soluções
As sobras da indústria farmacêutica, como chupetas e contagotas, são alguns dos elementos do piso de borracha modelo “I” da Haiah. A empresa trabalha com tecnologia em remanufatura de borracha, com foco nos produtos de ecodesign e serviços ecoeficientes. Seus produtos e serviços podem ser vistos em espaços públicos e espaços comunitários, como playgrounds, restaurantes, haras e espaços com acessibilidade. A empresa vem aprimorando as tecnologias em reciclagem dos refugos de borracha e hoje reprocessa não só os próprios resíduos como de outras empresas também. O piso "I" da Haiah é um piso único, anti-derrapante, feito de grãos de borracha colorida, especialmente desenhada e formulado para minimizar acidentes em playground ou áreas de recreação infantil. A instalação do piso de borracha só deve iniciar quando todos os trabalhos relativos a outros serviços tiverem terminado, como pintura ou reparos nas paredes. O piso de 20mm é colado em um contra-piso de concreto liso com no mínimo 28 dias de cura. Pode ser instalado também sobre as seguintes superfíces: madeira em placas ou encaixadas bem ancoradas, granito, mármore e outras superfícies regularizadas. O metro quadrado instalado do modelo “I” custa em torno de R$ 165,00. www.haiah.com.br
Sacola Ecobag A Bag Beach fabrica bolsas de fio de algodão e lona e lançou a sacola ecobag da marca, que pode ser utilizada nas compras diárias. A sacola da Bag Beach é moderna e criativa. É um artigo indispensável que deve ser utilizado em qualquer tipo de compra, por isso a dica é ter uma do tipo sempre à mão. www.bagbeach.com.br
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CATALISADOR BIOLÓGICO Uma empresa brasileira do Grupo Zuerst, a Pet Mais, está lançando o Catalisador Biológico para banhos, um produto que vai diminuir o consumo de água em pet shops em até 66%. O produto foi idealizado por Odir Ferreira e Paula Ferreira após muitos meses de pesquisas, desenvolvimento e testes até chegar ao resultado final desejado. Este produto é de uso exclusivo profissional, que elimina em seu processo várias etapas utilizadas atualmente no banho de animais: a primeira com sabão de coco, produto altamente prejudicial ao animal e que causa malefícios ao meio ambiente; a segunda e terceira (pré-lavagem e lavagem) redu-
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zindo o tempo do banho em 66% e economizando 66% de água e eletricidade do banho, triplicando desta forma a capacidade de produtividade do banhista. O produto elimina 100% o mau cheiro, desprende toda a sujeira que é facilmente eliminada com apenas uma lavagem com shampoo, sem a necessidade de esfregação que normalmente deixa o animal estressado e incomodado. O produto é ecologicamente correto e não gera resíduos para o meio ambiente. O produto está disponível em embalagens de 1 litro. www.petmaisecologico.com.br www.petmais.ind.br