Revista 19

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NESTA EDIÇÃO...

>> Atitude

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Flávio Romano Scognamiglio

Entrevista

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Com JAIRO CANTARELLI Empresa secular atenta ao novo milênio

Água

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Preservação e economia para garantia da vida

Biodiesel

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A energia que agrega e inclui

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ATITUDE

FOTOS divulgação

ENTRE PEDRAS, MÚSICAS E CRIANÇAS

Flavio Romano – empresário e pianista

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Uma década conciliando o trabalho como executivo de uma empresa de granitos e mármores e a música clássica. Assim é Flavio Romano Scognamiglio, proprietáem ação. e Minérios, empresa paulistana no mercado há 43 anos e rioTeda BarberoAbrasivos co Cobral líder do segmento no país. Depois de mais de três décadas voltado quase que exclusivamente ao mundo executivo, há dez anos Flavio se reencontrou com a música e voltou a se dedicar ao piano, instrumento que tocava na infância. Neste segundo semestre, lança seu 4º CD, todos com composições próprias. A reaproximação com a música impulsionou o empresário a fomentar a arte entre as crianças. Há dez anos ele ajuda a Associação dos Moradores do Jardim Juliana, Vila Paulicéia e Vila Nova Suíssa (AJPS), em Mogi das Cruzes/SP, onde 250 crianças e adolescentes carentes da região recebem aulas de balé contemporâneo, dança de salão, dança de rua, circo e música. Hoje alguns jovens da instituição já se tornaram profissionais da dança e conseguem garantir o sustento de suas famílias com esse trabalho, além de atuar como multiplicadores dentro da própria entidade.


Trabalho

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Onde estão os empregos formais

Opinião

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Opinião

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POR MARTIN STÄHELI Controle isolado não é o suficiente

POR CLEMENTE GANZ LÚCIO 2010 tem a maior taxa de crescimento dos últimos 24 anos

Ensaio

Planeta Obra

Semiárido alagoano: experiências de desenvolvimento local

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Reciclados na construção civil

Análise

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Normas sociais e ambientais em cadeias produtivas

Água

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Agenda global

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Meu Mundo

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Opinião LE MONDE

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POR AMÂNCIO FRIAÇA Biosfera ameaçada

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Incluir

Em destaque

Soluções

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Saideira

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Hummm chuáaa

Paulo Markun

EDITORIAL “A água é vulnerável como o ar que respiramos”. A afirmação, aparentemente fatalista, é a conclusão baseada em fatos reais de vários estudiosos sobre a disponibilidade dos recursos hídricos pelo mundo em função de sua distribuição desigual no planeta. Por isso a preservação e a garantia de acesso global à água somam-se a pauta mundial e são tão importantes quanto as ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Nesta edição, trazemos à tona o que vem sendo feito, as experiências brasileiras de cuidados ambientais e soluções tecnológicas que buscam universalizar o acesso à água e promover a economia cada vez mais necessária. Esse também foi o tema do Ensaio, o qual inaugura uma feliz parceria entre a revista e o Curso Superior de Tecnologia em Fotografia da Univali (Universidade do Vale do Itajai - Campus Florianópolis-Ilha). A partir desta edição, contaremos com a colaboração desses profissionais

>> EXPEDIENTE

com um olhar aguçado para as diversas realidades que norteiam a nossa linha editorial. O leitor verá fotos dessa turma em outras seções também, como na Saideira. A revista fala ainda da função social do biodiesel - continuando a série sobre Energias Renováveis, mostra onde estão os milhões de empregos criados nos últimos anos, analisa as normas sociais e ambientais na cadeia de suprimentos e relata as experiências de desenvolvimento local no semiárido brasileiro. Destacamos também a parceria com Le Monde Diplomatique, as inovações ecológicas para a construção civil e as entrevistas com o jornalista Paulo Markun, com o empresário-pianista de São Paulo, Flavio Romano e sobre as ações sociais e ambientais da bicentenária empresa familiar Faber-Castell. Boa leitura!

Diretor: Odilon Luís Faccio

Fotografia Sérgio Vignes

Direção de Redação: Maria José H. Coelho (Mte/PR 930- JP)

Secretaria e Distribuição Lilian Franz

Editora chefe Alessandra Mathyas (MTe/SC 755-JP)

Colaboradores: Michelle Lopes, Isabel Miranda, Clemente Ganz Lúcio, Amâncio Friaça, Martin Stäheli

Redação Alessandra Mathyas Vanessa Campos (MTe/SC 3058-JP) A Revista Primeiro Plano é uma publicação do Instituto Primeiro Plano. Edição nº19 - novembro

www.primeiroplano.org.br

Edição de Arte Cristiane Cardoso (Mte/SC 634-JP) Capa Maria José H. Coelho Foto da capa Cleber Tomas/Univali

Parceiros Institucionais Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) • Fundação Vale do Rio Doce (FVRD) • Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) • Instituto Observatório Social • Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social • Rede de Tecnologia Social (RTS) • BSD Consulting • Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI)

R. João Pinto, 30, Ed. Joana de Gusmão, s 803 • 88010-420 - Florianópolis - SC - Brasil • Fone: 55 (48) 3025-3949 • contato@primeiroplano.org.br

Os artigos e reportagens assinados não representam, necessariamente, o ponto de vista das organizações parceiras e da revista Primeiro Plano. A divulgação do material publicado é permitida (e incentivada), desde que citada a fonte.




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ENTREVISTA

Empresa secular atenta ao novo milênio

A

Faber-Castell é um dos grupos industriais mais antigos do mundo. Surgiu antes mesmo da Revolução Francesa e da formação dos Estados Unidos. Fundada em 1761, em Stein, na Alemanha, está presente há 80 anos no Brasil. Aqui se consolidou como líder de mercado. São 15 fábricas no mundo e três unidades no Brasil (Manaus/AM, São Carlos/SP e Prata/MG). Desde a sua criação, é dirigida pela mesma família, sendo o presidente atual o Conde Anton Wolfgang von FaberCastell, membro da oitava geração. Trabalham na empresa 7000 pessoas, sendo que no Brasil são 2.814. Nesta entrevista, o engenheiro Jairo Cantarelli (53), há 26 anos na empresa, Gerente da Divisão Madeira, fala das ações da Faber-Castell no Brasil de respeito ao meio ambiente e valorização das pessoas.

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divulgação

JAIRO CANTARELLI Gerente da Divisão Madeira da FaberCastell no Brasil

PP: Todos os lápis fabricados com madeira reflorestada. Essa é a orientação da empresa no século XXI. Em que momento na sua história a empresa atentou-se para a necessidade da preservação florestal? Jairo Cantarelli: A Faber-Castell do Brasil, seguindo a mesma filosofia social e ambiental da matriz alemã, foi a primeira empresa de penetração mundial a plantar suas árvores para a produção de lápis. O projeto no Brasil é pioneiro e o único no mundo em grande escala. Em São Carlos foram feitas as primeiras experiências ao final da década de 50 e anos 60. Essa experiência foi levada para o sul do Brasil (Paraná e Santa Catarina) nas décadas de

70 e 80, vindo, com toda a bagagem acumulada, resultar no final da década de 80, no Projeto Prata na região do triângulo Mineiro. Desde seu princípio esse projeto foi gerenciado considerando os aspectos ambientais (como o respeito à floresta) e sociais. A responsabilidade socioambiental faz parte das “Essências da Marca FaberCastell” e é uma das principais responsáveis pela longevidade do grupo, pois nenhuma empresa consegue chegar aos 249 anos sem valores solidamente estabelecidos. Para uma empresa que fabrica produtos para a educação infantil, a arte e o lazer criativo é fundamental dar o exemplo e colocar o consumidor, seus colaboradores, a comunidade e a pro-

teção do meio ambiente como preocupações prioritárias, promovendo o desenvolvimento autossustentável e levando ao mercado produtos de alta qualidade socioambiental, garantidos por diversos órgãos e instituições competentes nacionais e internacionais. Atualmente os EcoLápis da FaberCastell são certificados pelo FSC (Forest Stewardship Council), além de levarem os selos ISO 9001 e ISO 14001. São produzidos aproximadamente 1,8 bilhão de EcoLápis ao ano. PP: A empresa já recebeu diversos prêmios em função das ações de preservação. De quais vocês se orgulham mais? PRIMEIROPLANO . Novembro 2010

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ENTREVISTA

divulgação

JC: A Faber-Castell se orgulha de todos os prêmios conquistados, principalmente pelo reconhecimento público. Ultimamente a empresa tem sido convidada para participar de eventos mundiais de grande destaque e relevância. Foi assim com a COP-9 da Biodiversidade, promovida pela ONU em 2008 e o Global Media Fórum, promovido pela Deutsche Welle em 2010, quando tivemos a oportunidade de expor nosso trabalho.

Nas áreas de plantação e matas nativas dos parques florestais da Faber já foram identificadas mais de 232 espécies de pássaros, 55 de mamíferos e 55 de répteis e anfíbios. Muitos dos quais, ameaçados de extinção.

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PP: Que metodologia a FaberCastell utiliza para incorporar a responsabilidade socioambiental em seu negócio? JC: A Faber-Castell tem estabelecido o que é mais importante para a sua marca, que são representados pelos quatro pilares da empresa. São eles: Competência e Tradição, Qualidade Acima da Média, Inovação e Criatividade e, como já citado anteriormente, Responsabilida-

de Socioambiental. Consideramos esses pilares a essência da marca e são trabalhados e reciclados todos os anos com nossos colaboradores diretos em nossos programas de treinamento e capacitação, de maneira que os conceitos passam a fazer parte do dia a dia dos nossos colaboradores. Além da alta carga horária de treinamento, temos vários modelos de comunicação direta destinados aos nossos colaboradores, tais como o jornal eletrônico diário “Na Ponta do Ecolápis”, displays nos refeitórios, quadros de avisos e os programas chamados “Bom Dia”, onde nossos supervisores e demais lideranças têm a oportunidade de se comunicar diretamente com os colaboradores antes das jornadas de trabalho. No programa de ginástica laboral, também pioneiro no país, a empresa mostra aos colaboradores o cuidado que tem com eles, acentuando essa relação.


Unidades da faber castell no Brasil

Manaus (AM) – fábrica de canetas e lapiseiras São Carlos (SP) - fábrica de EcoLápis Prata – (MG) – produção de mudas e beneficiamento de madeira

No fomento há cerca de 10 anos e no apoio ao programa de voluntariado, a empresa mostra que também se importa com a comunidade. Externamente, nossos fornecedores assinam carta de compromisso de responsabilidade socioambiental e são auditados sobre o cumprimento da mesma. Assim, a empresa dissemina seus valores à sua cadeia de fornecedores. Ao mercado em geral, a empresa apoia ONGs que se dedicam à divulgação do consumo consciente, seguindo as diretrizes do Instituto Ethos. PP: Os clientes finais veem na Faber-Castell uma empresa de fato comprometida com a sustentabilidade? Que tipo de pesquisa a empresa faz para lançar novos produtos e medir a receptividade do seu portfólio? JC: Realizamos pesquisas constantes, seja para lançamento de um produto

inovador ou para medir a satisfação do produto disponibilizado no mercado. A preocupação com a segurança e a aceitação do produto é constantemente identificada e monitorada pela companhia, que não mede esforços para produzir itens com a qualidade máxima em segurança e eficácia, tanto que a companhia utiliza processos e certificações internacionais de qualidade. A Faber conta com o apoio direto de várias empresas especializadas em pesquisa para direcionar seu desenvolvimento e sua comunicação com os consumidores, coordenadas pelas diversas áreas de marketing da companhia.. Também existem pesquisas reconhecidas pelo mercado que definem resultados e orientações que devem ser incorporadas. Um exemplo foi uma pesquisa do Datafolha, do ano passado, que mostrou que o consumidor brasileiro está reconhecendo cada vez mais a certificação FSC e que

uma das fontes de informação sobre essa certificação foram os produtos da FaberCastell. PP: Qual é a proposta do Instituto ECOmunidade? JC Esse instituto mobiliza educadores, alunos e comunidade da região de Prata (MG) em trabalhos e ações socioambientais. Ele tem como objetivos a conscientização sobre questões ambientais da comunidade da região onde estão localizadas as plantações da Faber-Castell, o despertar da prática da cidadania, a promoção de valores e ações “socialmente justas” e “ecologicamente prudentes” o estímulo à integração entre a empresa e a sociedade. No ECOmunidade, a empresa procura sensibilizar as pessoas sobre a importância de se auto-conhecerem, admirarem, amarem e se respeitarem, para, então, olhando para o seu entorno, conservarem os recursos naturais. PRIMEIROPLANO . Novembro 2010

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ENTREVISTA

Número de colaboradores:

Brasil: Aproximadamente 2.814 colaboradores, sendo que em São Carlos estão 2.124 pessoas, em Prata 450, em Manaus 202 e 116 estão distribuídos em escritórios de marketing e vendas em São Paulo. No mundo todo a Faber-Castell tem cerca de 7.000 colaboradores.

divulgação

PP: A Faber Castell está no mercado há quase 250 anos sempre chefiada pela mesma família, há oito gerações. Como a empresa consegue manter esse vínculo familliar na sua gestão?

Além de fornecerem matéria-prima para a produção de seus EcoLápis, as áreas de plantio da Faber-Castell auxiliam na conservação do solo e na sobrevivência de animais.

JC: A Faber-Castell tem à sua frente atualmente o Conde Anton Wolfgang von Faber-Castell. O crescimento contínuo da empresa tem como um dos pontos fortes a paixão que cada presidente (membro da família) conduziu e administrou a Faber-Castell. O atual presidente concentra fortemente os negócios em novos produtos e na expansão das atividades internacionais da companhia de forma a posicionar a Faber-Castell como uma empresa verdadeiramente global. PP: O senhor trabalha há mais de 20 anos nesta empresa. Como os valores adotados pela companhia interferem diariamente na sua vida de cidadão. Que ações corriqueiras adotou e que, na sua opinião, fazem a diferença e dão exemplo para o alcance pleno da sustentabilidade? JC: Minha experiência e valores pessoais se fundiram completamente com os valores da empresa. Tratando-se de sustentabilidade, sinto que houve um cres-

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cimento conjunto. A moderna visão de sustentabilidade que o mundo começa a ter foi desenvolvida internamente sobre uma base de responsabilidade histórica da empresa, mas com uma contribuição particular minha sobre o futuro que viria. Foi assim que estabelecemos projetos e ações de vanguarda, como a definição do uso exclusivo de madeiras reflorestadas, ainda na década de 80, o manejo das plantações com o conceito de gestão de parques florestais, a certificação FSC no final da década de 90 e várias outras ações. A preocupação e o investimento na manutenção da biodiversidade, que foi de certa forma ofuscada pela preocupação mundial com o aquecimento global, já fazem parte de nosso trabalho há cerca de 20 anos. Tanto em minha ação, como gestor ou executivo da empresa, como na minha vida pessoal, o balanço ambiental do que faço ocupa lugar relevante na minha árvore de decisões. Respeito ao próximo, principalmente aos nossos colaboradores. Acima de tudo, sou ético no que faço. Aliás, ser ético, para mim, é um dos sinônimos de sustentabilidade. Ter ética social, ética com o meio ambiente, ética em todas as nossas ações, certamente garante a sustentabilidade do que fazemos.



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>> ÁGUA

Água

Preservação e economia para garantia da vida

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cleber tomas/univali

Um bilhão de pessoas não têm acesso à água potável no mundo. No Brasil, é preciso investir R$ 18,2 bilhões para garantir abastecimento urbano até 2015. Uma das Metas do Milênio adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU) é reduzir pela metade a proporção de pessoas privadas de água e saneamento básico. Essa soma, no país, chega a R$ 41 bi. Fica a pergunta: conseguiremos alcançar essa façanha?

O

último Atlas de Abastecimento Urbano de Água, coordenado pela Agência Nacional de Águas (ANA), nos mostra uma realidade que poucos admitem enxergar: podemos, sim, ficar sem água. Dados levantados pela ANA das condições dos mananciais e dos sistemas de produção de água revelam que 64% de 2.965 municípios brasileiros estudados necessitam de investimentos prioritários em produção de água até 2025, que totalizam R$ 18,2 bilhões. Outros 1.517 precisam injetar R$ 23 bilhões em tratamento e coleta de esgoto. A tradução? Não basta somente ter boa vontade, mas investimento alto em pesquisas, tecnologia e integração da gestão das políticas em saneamento e água. O quadro crítico desse recurso natural tão vital vai além quando o cenário é mundial. Segundo um grupo de trabalho de especialistas em finanças e desenvolvimento, formado pelo Conselho Mundial de Água e da Parceria Global para a Água, o número de mortos pela escassez da água no planeta pode chegar a oito milhões por ano, considerado um escândalo mundial por Michel Camdes-

sus, ex-diretor do Tesouro entre 1987 e 2000, ex-governador do Banco da França e ex-diretor do Fundo Monetário Internacional; Bertrand Badré, inspetor de finanças, sócio-gerente do Banco Lazard, participou do Painel Mundial sobre o Financiamento da Infraestruturas da Água; Ivan Chéret, engenheiro de pontes e estradas, serviu de 1950 a 1958 na África negra, foi membro do Comitê Técnico do Global Water Parthership; e PierreFrédéric Ténière-Buchot, engenheiro da Escola Central de Paris e doutor economia. O trabalho do grupo rendeu o livro: Água – Oito milhões de mortos por ano. Um escândalo mundial, traduzido pela editora Bertrand Brasil, no Rio de Janeiro (2005/R$30). Para os estudiosos, ‘o século XX nos ensinou que a água é vulnerável como o ar que respiramos’, já que não temos água bem distribuída em todo o planeta. Eles enfatizam que ela deve se tornar prioridade para todos e assim associar uma reforma entre a governabilidade e os circuitos de financiamento. O gerente de Uso Sustentável de Água e Solo da Agência Nacional das Águas (ANA) e engenheiro agrônomo, Devanir dos Santos, exemplifica uma ação que

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ÁGUA

O Brasil possui:

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Conselho Nacional de Recursos Hídricos em funcionamento desde 1998

Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos

160 Comitês de Bacias Hidrográficas

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deu certo na economia de energia com o Selo Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica - Procel. Ele foi instituído em 1993 e coordenado pelo Ministério de Minas e Energia (MME). Muitas famílias brasileiras trocaram suas lâmpadas, geladeiras e máquinas de lavar antigas por uma nova. O resultado foi uma considerável queda no valor das contas de luz em muitas residências do país. Segundo Devanir, o mesmo deveria acontecer com equipamentos para economizar a água como a troca de chuveiros, torneiras e descargas. Porém, ainda há falta de financiamento para a troca desses equipamentos. Ele enfatiza também que há uma grande preocupação da ANA com as perdas na distribuição da água no Brasil, principalmente no setor agrícola, que cresceu bastante. “É necessário mudar o perfil da agricultura no país com a criação de programas e pesquisas como o Produtor de Água, em parceria com a Empresa de Água e Saneamento (Emasa) de Balneário Camboriú, em Santa Catarina”, cita o especialista. Para o diretor de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente, Marco Neves, o Brasil tem uma potencialidade e responsabilidade muito grande em relação à água do planeta. Ele afirma que o país tem uma legislação avançada em matéria de águas, saneamento, resíduos sólidos e um sistema de geren-

ciamento de recursos hídricos em plena implementação. Além disso o Brasil também possui um Conselho Nacional de Recursos Hídricos em funcionamento desde 1998, 26 Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos e mais de 160 Comitês de Bacias Hidrográficas. “No entanto, um dos grandes desafios do país é a universalização do saneamento, não só a disponibilização de água para as populações mas também a coleta e tratamento de efluentes e resíduos sólidos” – comenta Neves.

Projeto Produtor de Água

O projeto Produtor de Água da Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú, no Litoral Norte catarinense, tem como conceito o ‘pagamento por serviços ambientais (PSA)’ – ainda em construção na agenda pública do país. O principal objetivo do programa é recuperar as margens da mata ciliar, as áreas de nascentes e áreas prioritárias para os recursos hídricos, para assim evitar o assoreamento dos rios, melhorar a qualidade da água e garantir a regularização hídrica da bacia, além de proteger os mananciais. Outro intuito do programa é incentivar financeiramente produtores rurais que aderirem ao projeto voluntariamente. A metodologia utilizada para cálculo dos incentivos financeiros no âmbito da bacia do Rio Camboriú, que compreende


os municípios de Camboriú e Balneário Camboriú, considera os lucros médios das produções de rizicultura, atividade agrícola na região também responsável pela degradação de Áreas de Preservação Permanente (APP’s), mais expressivos no entorno da bacia. Além disso, para a sistematização dos valores de PSA serão considerados demais critérios técnicos definidos a partir de estudos especializados. De acordo com o estudo do Manancial da Emasa, a área total cultivada com arroz

irrigado na Bacia do Rio Camboriú abrange cerca de 1.200 hectares. A produção de rizicultura utiliza em torno de 6.000.000 m³ de água durante os 70 dias de pico para a irrigação, entre agosto e setembro. Com o projeto, para que seja possível interceptar, reter e filtrar as águas das chuvas na bacia, pretende-se aumentar os seus índices de cobertura vegetal nas áreas estratégicas para os recursos hídricos. A Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú tem uma área de 199,80 km²,

sendo que a montante da captação de água atual é de 137,87 km². O projeto tem como parceiros, além da Emasa e da ANA, as secretarias de Meio Ambiente de Balneário Camboriú e Camboriú, a secretaria de Desenvolvimento Econômico Sustentável de Santa Catarina (SDS), The Nature Conservancy –TNC, o Instituto de Desenvolvimento Ambiental (Ideia), o Instituto Federal de Ciência e Tecnologia (IFC) e a Bunge Natureza.

O projeto desenvolvido pela Emasa, em Itapema, mostra uma ação local que faz parte de uma preocupação global de preservação dos rios e abastecimento humano. Recente estudo apresentado pela revista Nature mostrou que 80% da população mundial é refém da má gestão da água. A pesquisa mostra que a agricultura intensiva e as cidades densamente povoadas são as maiores responsáveis pela ameaça à segurança da água e da biodiversidade dos rios do mundo. Link da Nature (inglês) com mapa da situação no mundo: http://www.nature.com/ news/2010/100929/full/ news.2010.505.html?s=news_rss

Divulgação emasa

A gestão da água

Curso dágua sem proteção

Nascente bem preservada

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ÁGUA

“Água é fator limitante do

Exemplos de escassez de água no Brasil Grandes metrópoles com problemas de escassez de água no Brasil têm uma oferta pobre do recurso natural. Hoje, a água é buscada em até 100, 150 quilômetros de distância da cidade. Além da Capital paulista, Curitiba, no Sul do país, onde há maior abundância de mananciais, (inclusive está na área do Aquífero Guarani) também já passou por racionalização de água. É o que conta o coordenador de Recursos Hídricos do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e doutor em Meio Ambiente e Desenvolvimento, Sanderson Leitão. Em sua tese desenvolvida na Universidade Federal do Paraná (UFPR) Escassez de água na cidade: uma perspectiva a partir de situações de risco e vulnerabilidade em Curitiba, ele mostra que em 2006 a cidade enfrentou um racionamento de água e acabou tendo que fazer um rodízio no seu uso. Leitão explica que o problema é sentido principalmente nas grandes e médias cidades, onde houve acúmulo de pessoas vindas do campo ou de cidades do interior. Situação que exige atenção especial na gestão da água. Leitão, também engenheiro agrícola pela Universidade Federal de Campina

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divulgação

desenvolvimento e da vida”

Sanderson Leitão , coordenador de Recursos Hídricos do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

Grande (UFCG) e mestre em Saneamento Ambiental pela Universidade de Gent, na Bélgica, e em Engenharia Civil, Hidráulica e Saneamento pela Universidade de São Paulo (USP), afirma que o Brasil possui a maior reserva de água doce do planeta, com 14%. Ele diz que é urgente o desenvolvimento de pesquisas para o uso de tecnologias sustentáveis e de recursos hídricos. Para isso, está sendo criado o Instituto Nacional das Águas (INA), em parceria

com Itaipu Binacional e Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que terá sedes no Parque Tecnológico em Foz do Iguaçu no Paráná e no Sudeste e Nordeste. De acordo com Leitão, o INA tem como foco desenvolver pesquisas e programas para o desenvolvimento de tecnologias inovadoras com novas ações em relação à preservação e utilização racional e eficiente da água no país. O especialista explica que o Brasil é 85% urbano e representa bem os riscos que a sociedade moderna vive com a ocupação desordenada: a demanda de pessoas nas grandes cidades é desproporcional à oferta de água, o que acarreta problemas de escassez. “O país está avançando, mas precisa integrar a gestão da água, unindo a pesquisa, o monitoramento e o gerenciamento” , opina Leitão. Os projetos desenvolvidos pela Itaipu Binacional e pelo Parque Tecnológico Itaipu (PTI) no âmbito da preservação das águas farão parte de uma rede nacional de laboratórios. O acordo de cooperação técnico- científico para a implantação do Instituto Nacional de Águas – Unidade Itaipu, no PTI, foi assinado em 18 de junho deste ano, em Foz do Iguaçu. O INA terá 12 laboratórios, entre Aquicultura e Pesca Fluvial; EcoHidroinformática; Recuperação de Bacias; Centro de Segurança de Barragens; Centro de Saberes e Cuidados Socioambientais da Bacia do Prata;


Aquíferos no Brasil

Aquífero alter do chão

Recentemente, em 2009, pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) descobriram o Aquífero Alter do Chão, no Norte do país. Ele se estende pelos estados do Amazonas, Pará e Amapá. Segundo dados da pesquisa, o manancial pode ser ainda maior que o Guarani em espessura, o que resultaria em maior volume de água. Especialistas acreditam que o Alter do Chão possa gerar um volume de água superior a 86 mil quilômetros cúbicos. De acordo com a Agência Nacional das Águas, ainda neste semestre será lançado um processo de licitação para contratar consultores que deverão aprofundar nas pesquisas sobre a nova descoberta.

Aquífero Guarani

O maior manancial de água doce subterrânea do Brasil e do mundo, o Aquífero Guarani, abrange os Estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, além de abranger também a Argentina, Paraguai e Uruguai. O gigante possui aproximadamente 1,1 milhão de quilômetros quadrados de área. O nome do manancial se dá por grande parte de seu território ter sido ocupado pela nação indígena Guarani, que habitava a região. Seu volume de água chega a 30 mil quilômetros cúbicos, é de boa qualidade e importante tesouro por sua capacidade de armazenamento do recurso renovável. Sua recarga natural anual (principalmente pelas chuvas) é de 160 Km³/ano, sendo que 40 Km³/ano constitui o potencial explorável sem riscos para o sistema aqüífero.

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ÁGUA

Educação Ambiental; Centro Hidrológico de Excelência Doppler; Qualidade da Água, Eco-toxicologia Controle de Agentes Invasores; e Laboratório de Micro-organismos ambientais e patogênicos na água. Todos com centro de informática e medição de eficiência de recursos hídricos, segundo o diretor superintendente da Fundação Parque Tecnológico Itaipu Brasil, Juan Carlos Sotuyo. O investimento será de R$ 20 milhões nos cinco primeiros anos — R$ 5 milhões de Itaipu e R$ 15 milhões do Ministério. Já estão garantidos R$ 6 milhões para dar início às obras. Só falta o edital ser lançado para a construção do prédio, segundo Sotuyo.

Valioso rio São Francisco

O polêmico e valioso Projeto de Integração do rio São Francisco, que mo-

biliza mais de R$ 4,8 bilhões em obras, gera empregos, aquece a economia local e tem como princípio melhorar as condições de vida de quem vive em torno da bacia do Velho Chico. Sob responsabilidade do Ministério da Integração Nacional (MI), o projeto prevê a construção de canais que chegam a 700 quilômetros de extensão. Com a transposição de parte das águas do rio, pretende-se irrigar as regiões nordeste e semi-árida do Brasil, consideradas as piores em escassez de água. Um dos calos no sapato da transposição é que além da obra ser cara e abranger somente 5% do território, há quem diga que somente os grandes latifundiários nordestinos irão se beneficiar com a integração das águas, já que boa parte da área do projeto passa pelas terras de grandes fazendas.

Segundo o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) do MI, o projeto visa ao fornecimento e água para vários fins, sendo a maior parte dedicada à irrigação (70%), seguido pelo uso industrial (26%) e somente 4% para a população. Outro fator relevante é a destinação do uso da água. Profissionais da ONG ECOA, de Campo Grande (MS) afirmam que a água será retirada de regiões onde a demanda para uso humano é maior que a demanda na região de destino. A conclusão de críticos é que a transposição beneficiará principalmente a agroindústria e a carcinicultura – técnica de criação de camarões em viveiros bastante desenvolvida no litoral brasileiro do Rio Grande do Norte. A cobrança pelo uso da água no rio São Francisco deve arrecadar até o fim do ano R$ 10 milhões, estima a Agência

Além da importância da gestão na água, o uso de equipamentos econômicos também faz parte da estratégia de sua preservação. Empresas como a Acquabrasilis, com sede em São Paulo, aposta desde 2001 em sistemas para reuso de água, captação da água da chuva, tratamento para irrigação, vasos sanitários e lavagem de carros. A tecnologia é desenvolvida na Alemanha e adaptada às necessidades dos projetos nacionais.

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A empresa Docol, fundada em 1956, com sede em Jaraguá do Sul (SC), é outro exemplo de produção em equipamentos metálicos que contribuem para o uso racional da água. Entre as inovações estão o registro regulador de vazão para chuveiro

Docol

Acquabrasilis

Tecnologia aliada da economia


márcia martins da silva

Nacional das Águas (ANA), que iniciou em agosto a distribuição dos boletos. Quem capta mais de quatro litros por segundo (14,4 metros cúbicos por hora), como companhias de saneamento e indústrias, também serão cobrados pelo uso do recurso renovável. Os valores arrecadados pela ANA serão repassados integralmente ao Comitê de Bacia do São Francisco para serem aplicados em ações de recuperação da bacia, integrada pelos estados de Alagoas, Sergipe, Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, Goiás e o Distrito Federal.

Barragem do Canindé do Rio São Francisco (SE).

- para tomar banho, (o brasileiro urbano leva em média 10 minutos). Levando em conta que o chuveiro de uma casa dispensa aproximadamente 20 litros por minuto, em um banho de 10 minutos o usuário gastaria 200 litros de água. Com a instalação do registro regulador de vazão para chuveiro (RRVC), pode-se chegar a uma economia de 50%. A mesma eficiência apre-

senta o registro regulador de vazão para torneira. Outra novidade é o acabamento para descarga Salvágua – onde o consumidor escolhe qual a vazão a ser usada no vaso sanitário: os convencionais 6,8 litros (volume de descarga recomendado pelas normas da ABNT) ou 4 litros (para uso mais freqüente). Só com esse dispositivo pode-se chegar a 30% do consumo.

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ÁGUA

O caminho das águas ATÉ os centRos urbanos

1 - Represa 2 - Captação e Bombeamento Após a captação, a água é bombeada para as Estações de Tratamento de Água. Depois de bombeada, a água passará por um processo de tratamento, conforme as etapas explicadas a seguir. 3 - Pré cloração Adição de cloro assim que a água chega à estação para facilitar a retirada de matéria orgânica e metais.

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Pré-alcalinização Adição de cal ou soda à água para ajustar o ph aos valores exigidos para as fases seguintes do tratamento.

5 - Decantação Na decantação, os flocos de sujeira, mais pesados do que a água, caem e se depositam no fundo do decantador.

Coagulação Adição de sulfato de alumínio, cloreto férrico ou outro coagulante, seguido de uma agitação violenta da água para provocar a desestabilização elétrica das partículas de sujeira, facilitando sua agregação.

6 - Filtração Nesta fase, a água passa por várias camadas filtrantes onde ocorre a retenção dos flocos menores que não ficaram na decantação. A água então fica livre das impurezas. Essas três etapas: floculação, decantação e filtração recebem o nome de clarificação. Nesta fase, todas as partículas de impurezas são removidas deixando a água límpida. Mas ainda não está pronta

4 - Floculação Floculação é o processo onde a água recebe uma substância química chamada de sulfato de alumínio. Este produto faz com que as impurezas se aglutinem formando flocos para serem facilmente removidos.


fonte: sabesp

para ser usada. Para garantir a qualidade da água, após a clarificação é feita a desinfecção. 7 - Cloração A cloração consiste na adição de cloro. Esse produto é usado para destruição de microorganismos presentes na água. Fluoretação A fluoretação é uma etapa adicional. O produto aplicado tem a função de colaborar para redução da incidência da cárie dentária.

8 - Reservatório Após o tratamento, a água tratada é armazenada inicialmente em reservatórios de distribuição e depois em reservatórios de bairros, espalhados em regiões estratégicas das cidades. 9 - Distribuição Desses reservatórios a água vai para as tubulações maiores (denominadas adutoras) e depois para as redes de distribuição até chegar aos domicílios.

10 - Redes de distribuição Depois das redes de distribuição, a água geralmente é armazenada em caixas d’água. A responsabilidade pela entrega da água até a entrada da residência onde estão o cavalete e o hidrômetro (o relógio que registra o consumo de água) é das empresas estaduais ou municipais criadas para esse fim (Samaes. Sabesp, Casan, etc). A partir daí, o cliente deve cuidar das instalações internas e da limpeza e conservação do reservatório. 11 - Cidade

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BioDIESEL

A energia que agrega e inclui

Entre as vantagens do biodiesel está a ambiental, pois ele não tem enxofre, é pequena a geração de partículas poluentes e diminui as emissões de gás carbônico: uma tonelada de biodiesel evita a emissão de 2,5 toneladas de CO2 para a atmosfera. 22 PRIMEIROPLANO . Novembro 2010

A

biomassa vem se consolidando na matriz energética brasileira, não somente na eletricidade com as usinas térmicas a bagaço-de-cana, restos de madeira ou com a queima de resíduos urbanos. Quando se fala nesse assunto no Brasil logo o que vem à mente são os biocombustíveis – etanol de cana-de-açúcar e biodiesel. O primeiro, iniciado na década de 1970 pelo Programa Próalcool (capitaneado pelo físico Bautista Vidal), depois de 40 anos, mostrou que é a alternati-

divulgação petrobras

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José Cruz/ABr

Integrantes do MST promovem ato público em frente ao Congresso Nacional pedindo a aprovação da PEC do Trabalho Escravo Plantação de cana-de-açúcar em São Joaquim da Barra. geraldo falcão/petrobras

va combustível ao petróleo. Hoje, 91% das vendas totais de veículos novos no país são do tipo FLEX (bicombustível). A informação da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores e da União da Indústria de Cana-deAçúcar (Única) mostra que esse percentual vem se mantendo desde 2007. É um ramo da economia nacional considerável e que ainda tem importantes barreiras a serem superadas para ser considerada, de fato, sustentável. Esse tem sido o entrave da proposta de internacionalização do nosso etanol. Ao mesmo tempo em que há espaço para o crescimento, dada a necessidade da redução de emissão de gases poluentes, há barreiras tarifárias internacionais e uma importante questão social a superar que compromete a indústria sucroalcooleira como provedora de empregos verdes: a existência ainda nas lavouras brasileiras de trabalho análogo à escravidão. Segundo a Única, algumas ações públicas e privadas foram implantadas para a melhoria das práticas sociais e ambientais. Entre elas está o Zoneamento Agroecológico da Cana, que proíbe o cultivo em biomas sensíveis – como a Amazônia e o Pantanal, o Compromisso Nacional, para valorizar as melhores práticas trabalhistas, e o Projeto Renovação, de requalificação de trabalhadores de corte da cana. Ainda assim, essa é uma preocupação permanente e que compromete a sustentabilidade dos subprodutos da cana. Segundo o relatório da ONG Repórter Brasil, divulgada no início deste ano, a maior empresa sucroalcooleira em ativi-

dade no Brasil foi inserida na lista negra do Ministério do Trabalho sobre o trabalho escravo e muitas outras usinas foram flagradas com situações trabalhistas degradantes. Algumas dessas empresas são signatárias do compromisso pela erradicação do trabalho escravo e usam isso como marketing empresarial, mas na prática, mostraram ações opostas ao que se comprometeram. Segundo a Repórter Brasil, em 2009 foram libertados em canaviais 4234 trabalhadores. Atualmente cerca de um milhão de pessoas trabalham com cana-de-açúcar. Esse é o maior desafio com o etanol: garantir o trabalho decente no setor, explica Maurício Tolmasquim, da Empresa de Pesquisa Energética. “Poderemos ampliar a produção de etanol em 150%, utilizando de cinco a sete milhões de hectares para isso sem que qualquer bioma possa ser afetado. Não há falta de terra para produção de alimentos em nosso país”. Segundo Tolmasquim, para o atendimento da demanda de etanol em 2017, será necessária a utilização de apenas 2,56% da área agriculturável do Brasil. Essas áreas estão distantes mais de dois mil quilômetros da Amazônia, concentrando-se basicamente nas regiões Sudeste e parte do Centro-Oeste e Nordeste. O etanol, como se vê, é negócio “grande”, que requer extensas áreas e polpudos investimentos. Não é a mesma situação para a produção de biodiesel. A idéia para esse biocombustível é que se concentre nas pequenas propriedades, agregando valor às atividades já desenPRIMEIROPLANO . Novembro 2010

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BioDIESEL

divulgação petrobras

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Quando o Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel foi lançado em 2004, 16.328 agricultores familiares participavam dos programas. Agora eles já ultrapassam os 100 mil 24 PRIMEIROPLANO . Novembro 2010

Usina de biodiesel em Marialva (PR)

volvidas pela agricultura familiar. Essa é a meta do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel, criado pelo Governo Federal. Ele estabelece um adicional de 5% de biodiesel ao óleo diesel comum. Inicialmente, a projeção era de alcançar essa meta em 2013, mas devido a boa produção – 2,4 bilhões de litros/ ano, desde janeiro deste ano esse percentual já está sendo aplicado. Com essa mistura de biodiesel no diesel, o país reduziu em US$ 0,6 bilhão a importação do combustível fóssil em 2009, quando o percentual era menor – 3% e 4%. Segundo relatório do Ministério de Desenvolvimento Agrário, para chegar a essa marca, 30 empresas possuem o Selo Combustível Social comprando matéria prima efetivamente de 51 mil agricultores familiares. Essas empresas juntas representam 92% da capacidade instalada

de biodiesel (3.313 mil metros cúbicos). Mas o número de empregos verdes proporcionados por esse programa vai além das empresas certificadas. Em 2004, quando o programa foi lançado, eram 16.328 agricultores que participavam dos programas. Agora já ultrapassam os 100 mil. Entre essas milhares de famílias beneficiadas com o biodiesel está a do agricultor familiar de Pernambuco, Raimundo Fernandes de Souza, do Assentamento Vitória, em Santa Maria da Boa Vista. A produção no assentamento, segundo Raimundo, é diversificada: feijão, milho, melancia, mandioca, mamona, goiaba, maracujá, mamão, banana, manga, ovinos, caprinos e gado. Ele explica que cada agricultor que entrou no programa plantou dois hectares consorciados com mamona e feijão. “Mas também teve


divulgação petrobras

Usina de biodiesel em Marialva (PR)

alguns que plantaram a mamona com a melancia”, completa. Só com a mamona, o agricultor teve um incremento na renda de R$ 1200. “O feijão eu não vendi. Ficou para o consumo da família, que é grande”. Para os 34 agricultores do assentamento que entraram no Programa Nacional do Biodiesel inicialmente, além do aumento na renda, nunca mais faltou assistência técnica. “A assistência foi de qualidade. Nós em todo tempo que moramos no assentamento nunca tivemos um programa com um técnico exclusivo para uma cultura. Mas aí, já que o técnico vinha pro biodiesel, não custava nada a gente pedir para ele olhar as outras culturas”, explica o agricultor. O cultivo da mamona para biodiesel trouxe ainda o reconhecimento da sociedade, como explica o agricultor Raimundo. “Muitos zombaram quando

texto nós iniciamos o plantio, mas quando assistência técnica veio, o pessoal do pólo começou a andar no assentamento e em especial os técnicos da Petrobrás. Aí eles viram que a gente estava começando a ficar importante. Éramos 34 e os demais deixaram para entrar se a gente se saísse bem”. Para ele, que é uma liderança no assentamento, o biodiesel significa uma mudança importante no município. “Aqui o futuro já começou. Na safra do ano passado o programa iniciou com 85 agricultores em todo o município de Santa Maria. Este ano nós somos 264 e no ano que vem eu tenho esperança e creio em Deus que seremos 500 agricultores familiares”.

Biodiesel do óleo usado

O biodiesel pode ser feito com plantas oleoginosas, como dendê, mamona, sor-

“No ano passado o programa iniciou com 85 agricultores em Santa Maria (PE). Este ano somos 264 e no ano que vem eu tenho esperança e creio em Deus que seremos 500 agricultores familiares” Raimundo Fernandes de Souza, do Assentamento Vitória, em Santa Maria da Boa Vista.

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BioDIESEL

divulgação biotechnos

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Biotechnos espera instalar até 25 usinas de biodiesel nas cidade-sede dos jogos da Copa 2014

go, soja, pinhão-manso, amendoim, algodão, girassol e também com a gordura animal (o sebo). Mas também já está sendo produzido no Brasil a partir do reuso de óleo de cozinha. Em Santa Rosa/RS, a empresa Biotechnos desenvolveu uma usina, que pode ser móvel ou fixa, para esse fim. A empresa levou a idéia para a África do Sul, durante a Copa do Mundo deste ano e está empenhada para que, na Copa do Brasil, em 2014, sejam instaladas no mínimo 25 usinas de biodiesel nas doze cidade-sede dos jogos. Segundo Márcia Werle, diretora executiva da Biotechnos para projetos Autossustentáveis, cada usina estabelece uma cadeia produtiva desde o recolhimento do óleo de fritura, passando pelo processamento na usina até a sua utilização, que pode

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ser no transporte coletivo municipal e no transporte das delegações participantes da Copa. Nesse processamento, explica Márcia, tudo no processamento é aproveitado. A maior parte para biodiesel e as sobras se tornam glicerina, a qual tem vários usos.

Para saber mais Petrobras Biocombustíveis http://www.petrobras.com.br/pt/energia-e-tecnologia/fontes-de-energia/ biocombustiveis/ Portais do Biodiesel: http://www.biodiesel.gov.br http://www.biodieselbr.com Biotechnos Projetos Sustentáveis www.biotechnos.net



TRABALHO

Onde estão os novos empregos formais

O

Brasil em 8 anos atingiu a marca de 14 milhões de postos de trabalho formais. Falando em bom português, 14 milhões de brasileiros passaram a trabalhar com carteira assinada. Aos 12,5 milhões de empregos gerados entre 2003 e 2009 segundo a RAIS – Relação Anual de Informações Sociais, incorporou-se 1,47 milhões de postos celetistas no primeiro semestre deste ano, de acordo com o CAGED – Cadastro Geral de Empregados e Desempregados. Os setores que mais contribuíram para este crescimento foram a construção civil

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e a indústria, onde o número de trabalhadores com carteira assinada cresceu acima da população economicamente ativa, o que caracteriza o aumento do grau de formalização do mercado. Entenda-se por formalização do mercado a contratação de trabalhadores com carteira assinada, o que significa diretamente a garantia de direitos - previdência, 13º salário, férias, entre outros - e o aumento de recolhimento de impostos a serem aplicados, por exemplo em saúde, educação. Mesmo considerando que estes postos de trabalho ainda são ocupados majoritariamente por homens, adultos e brancos, o que reflete um índice de desemprego

carlos eduardo uehara/univali

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maior na população de mulheres, de jovens, negros e de idosos, esta situação vem gradualmente sendo alterada justamente pela necessidade do mercado. O ritmo da geração de empregos formais e em setores que exigem certo nível de especialização concorre para o que está se chamando de “apagão de mão de obra”. Isto reforça a importância da ampliação de vagas nas universidades, a criação de escolas técnicas federais e investimentos em ciência e tecnologia. Na construção civil, apenas nos primeiro meses de 2010 foram criados 127.694 empregos formais, o que representa 19% do total de empregos


criados em todos os segmentos econômicos. Isto significa segundo um estudo da Câmara Brasileira da Construção Civil - Cbic com base nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e EstatísticasIBGE, que em apenas 3 meses foram contratados um número de pessoas correspondente a população de uma cidade do porte de Berna, capital da Suíça. Outro aspecto relevante é a presença das micro e pequenas empresas na contratação de mão de obra formal. Conforme o Sebrae, na 3ª edição do Anuário do Trabalho na Micro e Pequena Empresa estas correspondem a mais de 99% dos 5,8 milhões de negócios formais existentes no Brasil e empregam 52,3% dos 24,9 milhões de trabalhadores com carteira assinada. Desse percentual a maior parte dos postos de trabalho (64,9%) estão no interior do país. Também aqui os homens são maioria somando 8,8 milhões. No entanto já existe um significativo aumento de contratação de mão de obra feminina que corresponde a 4,6 milhões em 2008, registrado principalmente nos setores do comércio, serviços e indústria. O nível de escolaridade também aumentou significativamente nos últimos 8 anos (de 21,4% para 41,7%). O Diesse - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos também apresentou dados positivos. Segundo a instituição o Brasil uma redução de 11,9% na taxa de desemprego em agosto. Para José Álvaro Cardoso, economista responsável pelo escritório regional do

Dieese/SC, esta situação é conseqüência da redução da dependência do capital externo, que provocou uma mudança estrutural no balanço de pagamentos, através da qual perdeu importância o endividamento externo, especialmente a parcela pública. Essa mudança, juntamente com a ampliação significativa do mercado consumidor interno, foram, possivelmente, as grandes novidades dos últimos anos. Neste período cresceram os Investimentos Externos Diretos (IED) e os juros líquidos da dívida externa brasileira diminuíram a sua importância, em termos relativos. “Neste momento, o Brasil não é mais um país com vulnerabilidade externa de curto-prazo, fator que sempre derrubou a economia e quebrou o país nas crises anteriores”, explica Cardoso. Em boa parte o fenômeno está relacionado à

existência de robustas reservas internacionais que atingiram volume inédito. Ao contrário de todas as crises anteriores, quando o Estado quebrava, desta vez foi o Governo que acudiu o setor privado com injeção de crédito e outras medidas. Isso inclui no mercado consumidor uma parcela significativa da população para a compra de bens duráveis como eletroeletrônicos, automóveis e imóveis. Além disso descobertas do pré-sal, se adotada a política adequada, darão ainda mais folga para as contas externas e irão tornar o Brasil, nos próximos anos, um grande exportador de energia.O plano de investimentos da Petrobrás para os próximos cinco anos atinge US$ 224 bilhões. Neste cenário, as perspectivas do emprego para os próximos ano é de continuidade de crescimento. A quesPRIMEIROPLANO . Novembro 2010

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TRABALHO

texto

tão é se esta ampliação do número de postos de trabalho refletirá também no reconhecimento de direitos e consolidação do trabalho decente nessas novas ocupações. Segundo o professor e advogado trabalhista Prudente José Silveira Mello a crescente formalização do emprego, vai à contramão da afirmativa do economista Jeremy Rifkin que causou polêmica há alguns anos atrás com seu livro “O fim dos empregos”. Nele o autor descreveu o sombrio cenário que a economia globalizada promoveria mundialmente. “Ainda é cedo para afirmarmos que esta tendência não encontrou terreno favorável em países emergentes onde a mão de obra em

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setores como construção civil e indústria ainda são significativas para que o índice de desemprego seja negativo”, comenta Mello. No entanto não há como dizer que a qualidade do emprego melhorou a ponto de intervir nos direitos, condições de trabalho e segurança. “É possível sim afirmar que houve uma real melhoria na vida da população formalmente empregada, principalmente pela melhora do soldo percebido”, conclui. Em consonância com esta afirmação José Álvaro Cardoso, do Dieese, comenta que a informalidade ainda é muito grande. Porém a formalização do emprego vem crescendo e, mantida essa tendência, poderemos cami-

nhar cada vez mais para um trabalho de tipo decente. O forte ritmo de crescimento do emprego tem, inclusive, melhorado a sua qualidade. Segundo o CAGED nos primeiros seis meses de 2010, a diferença entre o salário médio dos demitidos e dos admitidos foi reduzida pela metade em relação a igual período de 2009. No primeiro semestre deste ano, o salário médio dos novos contratados foi de R$ 821,13, o que representa 7,2% menor que o salário dos demitidos no mesmo período no ano anterior. Mas, no primeiro semestre de 2009, a diferença chegava a 13,2% segundo a mesma fonte. O fenômeno é típico de períodos em que a economia está aquecida e o mercado está demandando mão de obra em quantidade, o que reduz a margem de achatamento salarial via rotatividade. A tendência em relação a empregabilidade deve ser mantida ou melhorar em face ao Programa de Aceleramento do Crescimento 2 (PAC2), e também da necessidade de obras de infraestrutura para recepcionar a Copa do Mundo em 2014 e os Jogos Olímpicos em 2016. Cerca de 5,7 milhões de empregos serão criados, na construção civil, no turismo e na educação entre outros. Mas é a garantia dos direitos e de políticas sociais que beneficiem um número cada vez maior de brasileiros que consolidará um desenvolvimento social compatível com o desenvolvimento econômico.


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OPINIÃO

CLEMENTE GANZ LÚCIO Dieese

2010 tem a maior taxa de crescimento dos últimos 24 anos

O

mercado de trabalho está em expansão no Brasil. Entre janeiro e agosto de 2010 foram criados 1.954.531 postos de trabalho, segundo dados do CAGED – Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho e Emprego. Deste total, cerca de 506 mil empregos foram criados na indústria de transformação, setor que reflete grande dinamismo de toda a economia. Os destaques na indústria foram os ramos têxtil e vestuário, metalurgia e alimentação e bebidas. Na construção civil foram criados aproximadamente 308 mil novos postos de trabalho e no setor de serviços, cerca de 680 mil. A retomada do crescimento é o fator que explica o bom desempenho do mercado de trabalho formal e justifica também a redução das taxas de desemprego. Outro fator positivo verificado no primeiro semestre de 2010 foi a melhora no balanço das negociações coletivas de reajustes salariais. Aproximadamente 97% das 290 negociações salariais registradas no primeiro semestre de 2010, pelo Sistema de Acompanhamento de Salários (SAS) mantido pelo DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos, conquistaram reajustes salariais iguais ou acima da inflação medida pelo INPC-IBGE , acumulada desde o último reajuste. Os resultados apresentados ainda apontam não apenas para uma redução no percentual dos reajustes abaixo da inflação - o que indica que as entidades sindicais de trabalhadores estão conseguindo fazer da reposição das perdas inflacionárias o patamar mínimo da negociação dos reajustes salariais –

como também para a conquista de aumentos reais maiores. No entanto, é preciso considerar que grande parte das negociações analisadas ainda se concentra nas menores faixas de ganhos reais. A título de exemplo, cerca de 40% dos reajustes registrados no primeiro semestre deste ano se encontram na faixa de ganho real de até 1% acima do INPC-IBGE. As previsões de expansão do PIB para 2010 são otimistas, acima de 7%. Nesse ritmo de crescimento, o maior dos últimos 24 anos, o desemprego continuará a cair, o emprego deve aumentar e os salários continuarão crescendo. Adicionalmente, o reajuste do salário mínimo vai ajudar a elevar os salários de base, aumentado a massa salarial de toda a economia. Mas é preciso cautela para estimar o desempenho da economia em 2011 e nos próximos anos, uma vez que a taxa de câmbio valorizada estimula as importações, desestimula as exportações e afeta o equilíbrio das contas externas. A manutenção do déficit externo pode colocar em risco a sustentação desse patamar de crescimento nos próximos anos. Outra questão importante é a manutenção, ou não, da política de valorização do salário mínimo para os próximos anos. Entre tantos desafios pode-se dizer que, apesar do cenário mais provável ser de crescimento nos próximos anos, aumentaram as incertezas econômicas externas e internas, o que pode exigir que a condução da política macroeconômica do próximo governo tenha que enfrentar o atual desajuste de variáveis chave como as taxas de juros e de câmbio. PRIMEIROPLANO . Novembro 2010

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planeta OBRA

Um dos maiores desperdícios de materiais acontece na construção civil. Cientes disso, várias empresas do setor estão apostando na eficiência das construções, gerando menos entulho, utilizando materiais reciclados e mais duradouros.

Reciclado

Da mesa para a estrutura divulgação

nário já solicitado, mas já consegue suprir a necessidade em algumas importantes obras no seu estado, como o calçadão de Itapema e a orla da Avenida Beira Mar de Florianópolis (ambas cidades litorâneas de Santa Catarina). “Hoje já podemos pisar sobre blocos verdes. Sempre sonhei com isso”, festeja a engenheira Bernadete. Com essa inovação, a profissional recebeu prêmios nacionais e internacionais. (www.blocoverde.com.br)

Do lixo à construção A mesma pesquisadora desenvolve ainda estudos para outros blocos “verdes”. Há os feitos com resíduos de poliuretano de pranchas de surfe, com sobras de marmorarias e com o lodo de efluentes industriais de empresas cerâmicas.

Racionalização Em Santa Catarina, estado com a maior produção de ostras e mariscos do país, buscava-se destino para as cascas desses frutos do mar. Através de uma pesquisa desenvolvida pelo curso de Engenharia Ambiental da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul) conseguiu-se uma combinação ideal entre essas cascas e resíduos de obras, como pós de porcelanato e de vidro, areia e cimento para criar um bloco estrutural ecológico. Com a iniciativa, segundo a autora do projeto, Bernadete Batalha Batista, é possível economizar 50% de areia e cimento, os quais são responsáveis por 7% as emissões de CO2 no mundo.

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Segundo a engenheira, a inspiração veio de José Lutzembeg, pesquisador em Porto Alegre/RS. Quem já está implementando a iniciativa em escala industrial é a Blocaus Pré-Fabricados. A empresa de Santa Catarina recebe por mês mais de 46 toneladas de cascas de ostras e mariscos mensais para conseguir atender à crescente demanda. A engenheira garante que esse bloco é 30% mais resistente e absorve menos água que o convencional. Além disso, a aposta é que haja uma redução de até 30% nos custos de uma obra com o uso desse bloco. A empresa ainda não produz em grande escala, pois espera o maqui-

A empresa onde Bernadete trabalha desenvolve ainda blocos de concreto que buscam a racionalização na construção civil, tanto na redução de custos quanto no isolamento termo-acústico e resistência. Outro uso que esse tipo de material vem ganhando é o decorativo, pois os blocos de concreto arquitetônicos podem ser moldados com diferentes modelos e texturas. www.blocaus.com.br


na Construção Civil Isopor

Moldura externa para aplicação em fachadas

30% em redução de custos

Outra empresa catarinense que se destaca na inovação de construção civil é a Termotécnica, de Joinville. Lá o EPS ( poliestireno expandido, ou simplesmente “isopor”) é reciclado após o uso e a partir dele diversos produtos são feitos. Para a construção civil, a empresa inovou ao apresentar soluções de decoração e acabamento, como isolantes em lajes, coberturas, molduras, blocos e aditivos para o chamado “concreto leve”. A Termotécnica recicla o EPS pós-uso em suas unidades fabris e desenvolve ainda diversas ações de orientação ao consumidor, quanto à utilização e à reciclagem do EPS. www.termotecnica.com.br

Mais reciclados Vários municípios estão recomendando o aproveitamento do entulho da construção civil em outras obras. Um exemplo disso é o Rio de Janeiro. Segundo testes da Secretaria Municipal de Obras, esses materiais substituem os agregados naturais, extraídos de pedreiras (como brita e areia), com redução de custos de até 30%. Além disso, é menos entulho que vai parar nos aterros.

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análise

O desafio da economia global Normas sociais e ambientais em cadeias produtivas

Relatos sobre condições difíceis de trabalho e escândalos ambientais na cadeia de suprimentos colocam as empresas frente a um novo desafio: Aplicar normas ambientais e sociais em suas cadeias de suprimentos. Mas a aplicação de normas só pode ter sucesso se acompanhada de controle e apoio aos fornecedores. 34 PRIMEIROPLANO . Novembro 2010

A

conscientização dos consumidores, investidores e da sociedade em geral para questões sociais e ambientais na cadeia de valor está crescendo. Dificilmente passamos uma semana sem relatos na imprensa sobre condições desumanas de trabalho ou escândalos ambientais em regiões com baixos salários e restrições na fiscalização. Para manter a confiança dos clientes, mais e mais empresas exigem que seus fornecedores cumpram normas ambientais e sociais em todas as fases da produção, da compra e extração de materia prima até a finalização do produto

Desafios

Com a aplicação de critérios ambientais e sociais mínimos em suas cadeias de fornecimento, as empresas assumem

cada vez mais funções de regulamentação de negócios, que as instituições do governo em países com baixos salários não conseguem empenhar. Órgãos fiscalizadores, em certas regiões, estão cada vez menos capazes de garantir o cumprimento das leis trabalhistas e ambientais. Isto deve-se, sobretudo, a receio de que a regulamentação restritiva e os altos custos para o seu cumprimento possa reduzir a competividade no contexto da economia global. A competência e o dever das empresas em integrar objetivos sociais e ambientais nas suas atividades econômicas têm se tornado objeto de debates. Representantes da sociedade civil colocam em dúvida se as empresas atuam em prol de interesses da sociedade, e as empresas preferem ver que a tarefa de garantir o cumprimento de critérios sociais e ambientais seja realiza-


montagem sobre foto de BSK

da por instituições do estado. Mas, devido as precárias condições de produção em muitos lugares, as empresas devem levar as expectativas de stakeholders e clientes em conta, de forma séria e empenhadas em melhorar a situação. Um outro desafio deve-se ao fato de que gerir a produção e as condições de trabalho em fornecedores é mais difícil de controlar do que a qualidade ou a segurança do produto. Isso porque as violações deste tipo de requisitos não são visíveis no produto em si, e devem ser verificadas no local da produção. Por outro lado, o ambiente econômico, o baixo nível de tecnologia, a falta de know-how de gestão e valores culturais diferentes têm um papel significativo no que diz respeito ao cumprimento de condições mínimas de sustentabilidade na cadeia de valor.

Instrumentos e sistemas

Várias organizações e iniciativas desenvolveram ferramentas e sistemas para enfrentar os desafios de sustentabilidade na cadeia de valor. Com a participação de autoridades reguladoras estaduais, organizações privadas e ONGs (organizações não-governamentais), essas iniciativas ajudam - desde o início dos anos 1990 - as empresas a assumirem essa responsabilidades. Entre elas estão: ISO 14001, SA 8000, BSCI e FSC. Tais iniciativas fornecem, principalmente, padrões com elementos normativos e mecanismos de acompanhamento para verificar o cumprimento dos requisitos. Os padrões ou códigos de conduta contam, em sua maioria, com requisitos mandátorios de desempenho e/ou exigências de processos. Os requisitos de desempenho podem abranger o cumpri-

mento das leis, a proibição de utilização de certas substâncias ou o cumprimento das convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Requisitos de processo são relativos à gestão de uma organização, bem como critérios para o processo de queixas, a comunicação e a cooperação. Mecanismos de controle incluem dispositivos de auditorias realizadas pelo comprador (auditorias de segunda parte), inspecções independentes por prestadores de serviços comerciais (auditorias de terceira parte) e auditorias de verificação, realizadas por terceira parte independente. Na prática, duas abordagens para garantir o cumprimento das exigências ambientais e sociais são comuns: • Os fornecedores podem solicitar uma certificação de acordo com certas norPRIMEIROPLANO . Novembro 2010

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análise

mas (por exemplo, ISO 14001, SA 8000, Forest Stewardship Conuncil - FSC). Como os certificados são amplamente reconhecidos, eles podem ser usados na relação com outros compradores. • Compradores cooperam em iniciativas para que seus fornecedores cumpram com um conjunto comum de demandas ambientais e sociais e para coordenar os esforços de controle (por exemplo, BSCI – Business Social Compliance Initiative, EICC – Eletronic Industry Citzienship Coalition). Fornecedores controlados com sucesso recebem um aval positivo, sem ter um certificado a exibir para o mercado. Os membros da iniciativa, no entanto, trocam entre

eles os resultados de auditoria, a fim de evitar múltiplas auditorias em uma mesma empresa fornecedora. Em ambos os casos, as auditorias são um importante instrumento para verificar o cumprimento dos critérios.

Treinamento

Para um processo de melhoria sustentável dos fornecedores, o treinamento é um fator essencial. Abordagens de treinamento que atendam as expectativas acima devem ser destinadas a: • Mudanças sustentáveis de processos, que têm como objetivo a redução de custos e maior produtividade (por exemplo: por menos falhas); • Criar a consciência da necessidade destas medidas na alta administração dos fornecedores;

A cadeia produtiva no GRI O tema do controle da cadeia produtiva está integrado nas Diretrizes para Relatórios de Sustentabilidade do GRI (www.globalreporting.org). Citamos abaixo dois exemplos referentes a Direitos Humanos que exigem um sistema de controle como descrito neste artigo: ASPECTO: PRÁTICAS DE INVESTIMENTO E DE PROCESSOS DE COMPRA Indicador HR1 Percentual e número total de contratos de investimentos significativos que incluam cláusulas referentes a direitos humanos ou que foram submetidos a avaliações referentes a direitos humanos.

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Indicador HR2 Percentual de empresas contratadas e fornecedores críticos que foram submetidos a avaliações referentes a direitos humanos e as medidas tomadas.

• Gestão de conhecimento para melhorar os fornecedores; • Aprofundar o conhecimento dos trabalhadores sobre seus direitos e obrigações; • Promover a boa vontade da gestão para criar um diálogo com os trabalhadores; • Permitir uma diálogo com os trabalhadores, onde ambos os lados mostram interesse para resolver impasses de forma construtiva; • Estabelecer canais de comunicação entre gestores e trabalhadores. Várias empresas e iniciativas têm reconhecido que o apoio para o fornecedor é necessário para trazer uma melhoria


significativa. Programas de treinamento a longo prazo, serviços de apoio pontual realizado pelos clientes e seus prestadores de serviços, por exemplo, já são práticas comuns realizadas pelos compradores.

Fatores de sucesso

A implementação de normas ambientais e sociais em fornecedores precisa de tempo e apoio por parte do cliente. Assim, é útil que o cliente foque primeiro nos fornecedores importantes e de alto risco socioambiental. A concentração do volume de compras faz sentido, pois maiores quantidades de compra permitem mais influência sobre um fornecedor e a coordenação necessita de menores esforços. A experiência dos últimos anos vem demonstrando que as condições de compra têm uma influência significativa sobre o cumprimento das normas. O prazo apertado para a entrega, mudanças de curto prazo nas especificações dos produtos e fortes pressões sobre os preços são muitas vezes fatores decisivos para a exploração das condições de trabalho e os ambientalmente questionáveis métodos de produção dos fornecedores. Empresas pioneiras na implementação de tecnologias ambiental e socialmente responsáveis nas condições de produção já começaram a ajustar seus processos de compra para garantir o cumprimento de normas sociais e ambientais sem viver um conflito permanente com a área comercial.

Passos certos

Cinco passos para implementar critérios sociais e ambientais na cadeia de valor PASSO 1 . Análise da situação atual e Planejamento do projeto

DESCRIÇÃO - Análise da estrutura de fornecimento - Identificação de riscos sociais e ambientais na cadeia de valor - Análise da gestão de suprimentos - Definição de plano de ação

2. Definição de política e critérios de suprimentos

- Seleção de normas/padrões - Definição da política de suprimentos - Elaboração de critérios sociais e ambientais - Informação e engajamento com fornecedores

3. Implementação

- Compromisso e auto-avaliação dos fornecedores - Critérios contratuais - Avaliação de risco de fornecedores

4. Controle e Correção

- Monitoramento de fornecedores - Implementação e controle de ações corretivas nos fornecedores

5. Prestação de contas

- Definição de indicadores - Medição de resultados - Relatórios internos e externos

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OPINIÃO

MARTIN STÄHELI Consultor Sênior – BSD Consulting

Controle isolado não é o suficiente

O

tema de normas e iniciativas socioambientais em cadeias de suprimento é relativamente recente e ainda não existe consenso sobre como as exigências devem ser repassadas e cumpridas. A crítica mais comum dessa prática aponta que várias iniciativas não consideram todas as partes interessadas na tomada de decisão sobre as regras. Isso pode significar que o peso dos interesses dos compradores é maior do que os interesses dos trabalhadores e fornecedores. Esse fato pode, por sua vez, afetar negativamente a legitimidade das iniciativas. Outra crítica existente refere-se à qualidade dos códigos. Diferentes códigos de conduta não cobrem todos os riscos significativos necessários a serem tratados para uma melhoria real das condições de trabalho na cadeia da produção. Uma análise rigorosa dos critérios dos padrões e o endossamento das iniciativas por organizações da sociedade civil e instituições de pesquisa poderiam ajudar as empresas a selecionar melhor as ferramentas de controle. Um outro desafio deve-se ao fato de muitos fornecedores viverem em contextos difíceis de atenderem aos requisitos: horários de trabalho, salários ou a liberdade de associação. Por isso, críticos de normas questionam a eficácia das iniciativas orienta das por puro controle. O fato de várias iniciativas focarem somente no cumprimento de critérios de desempenho não condiz com a melhoria contínua das condições de trabalho e produção.

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Às vezes as auditorias não são adequadas para avaliar as condições de trabalho de forma efetiva. Isso pode ter várias causas, como por exemplo a manipulação de documentos e declarações dos trabalhadores e a nomeação de auditores que não conhecem o contexto local. Apesar de todas essas ressalvas e críticas, as iniciativas e os controles no local são um instrumento importante para medir progresso. Para que compradores possam melhorar as condições em suas cadeias produtivas devem: selecionar padrões e iniciativas que possuam viés de desenvolvimento do fornecedor; engajar fornecedores com incentivos positivos para progressos evidenciados; aplicar auditorias e análises profundas; focar no progresso dos fornecedores e garantir prazo realista para os objetivos; e providenciar apoio técnico continuo para os fornecedores durante a caminhada. É importante que os fornecedores recebam apoio para satisfazer as necessidades dos compradores, permitindo que eles criem processos de melhoria sustentáveis. Uma empresa que leva a sério o tema de sustentabilidade na sua cadeia de fornecedores garante que tanto o departamento de compras como o de planejamento entrem em sintonia com os de responsabilidade social e ambiental. Assim fica garantida a atuação do fornecedor sem prejuizo ao trabalhador e ao meio ambiente, entregando um produto de qualidade e justamente remunerado.



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ENSAIO

Água

denny sach/univali

A vida na Terra só é garantida por dois elementos: sol e água. A junção deles também proporciona imagens ímpares e que nos fazem refletir sobre a simplicidade do existir. Essa é a intenção deste Ensaio. Nele, os alunos da primeira turma do Curso Superior de Tecnologia em Fotografia da Univali (Universidade do Vale do Itajai - Campus Florianópolis-Ilha) mostram detalhes da nossa convivência com a água e o quanto ela é bela na sua simples forma cotidiana, a qual raramente percebemos. A música de Guilherme Arantes – Terra, Planeta Água –, hit nos anos 80, emoldura estas imagens e traduz em poesia a preocupação com o futuro. A coordenação do trabalho de campo dos fotógrafos é do professor Rafael Gué Martini.

Águas escuras dos rios Que levam A fertilidade ao sertão 40 PRIMEIROPLANO . Novembro 2010


denny sach/univali

andre sielski/univali carlos eduardo uehara/univali

Água que nasce na fonte Serena do mundo E que abre um Profundo grotão.

Água que faz inocente Riacho e deságua Na corrente do ribeirão.

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mario oliveira/univali

ENSAIO

carlos eduardo uehara/univali

Águas que movem moinhos São as mesmas águas Que encharcam o chão

Águas que banham aldeias E matam a sede da população...

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juliano baby/univali juiano baby/produção: christopher alisson/univali

Água que o sol evapora Pro céu vai embora Virar nuvens de algodão...

E sempre voltam humildes Pro fundo da terra Pro fundo da terra.

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Semiárido alagoano

Experiências de desenvolvimento local

Energias renováveis e tecnologias adequadas incentivam microssistemas produtivos na região que tinha o pior IDH do país.

Por Michelle Lopes e Isabel Miranda Rede de Tecnologia Social (RTS)*

O

Semiárido alagoano é uma região que abriga diversas experiências de desenvolvimento local, envolvendo prefeituras, empresas, comunidades e organizações. É o caso do Instituto Eco-Engenho, que foi criado em julho de 2001, como uma oportunidade de agrupar profissionais comprometidos com a sustentabilidade de ecossistemas brasileiros e a qualidade de vida das pessoas que ali habitam. O Instituto tem, como missão, o uso de tecnologias aplicadas ao desenvolvimento sustentável. Dentre elas, destaca-se o Programa H2Sol – Água Solar, implementado pelo Eco-Engenho, em parceria com entidades nacionais e internacionais. O Programa vem implementando uma infraestrutura mínima de abastecimento de água, energia fotovoltaica, além do tratamento de rejeitos através de um biodigestor. O H2Sol visa principalmente a instalação de microssistemas produti-

vos de irrigação para produtos de alto valor agregado, com uso de energia renovável, e tecnologias adequadas em comunidades remotas. O local escolhido para inaugurar o Programa não podia ser mais emblemático: a comunidade de Baixas, uma das mais pobres do município de São José da Tapera, a 210 quilômetros de Maceió, que se notabilizou, na última década, por apresentar o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil. Na comunidade de Baixas, foi construído um canteiro de pimentas, com 100m2. “Escolhemos a produção de pimenta devido ao seu alto valor agregado, quando comercializada em forma de vinagrete ou desidratada em secadores termosolares, para comercialização como condimento”, explica José Roberto da Fonseca e Silva, diretor presidente do Instituto Eco-Engenho. Levando-se em conta a extrema escassez de água na região, nos períodos de seca, foi adotada a

*A elaboração desta matéria também contou com a colaboração da Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA), do Instituto Eco-Engenho e do Instituto Palmas/AL

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fotos secex/rts

Você sabia?

Produção de pimenta na Comunidade Baixa (AL)

hidroponia, que consiste em um sistema de cultivo sem contato com o solo que usa canaletas (no caso, garrafas pets reaproveitadas) por onde a água circula continuamente com pequena perda pela evaporação e sem infiltração no solo. Com a hidroponia, é possível recircular água, potencializando seu uso, direcionando-a para as raízes das plantas, com o mínimo de desperdício. Devido à ausência de rede elétrica, na região, foram utilizados módulos de energia solar fotovoltaica para alimentar uma pequena bomba d’água de 12v cc, que faz a recirculação da água no sistema. A produção de pimentas já beneficia diretamente 11 das cerca de 40 famílias de Baixas. As demais ganham dinheiro

ajudando na colheita e no beneficiamento do produto. De acordo com José Roberto, é considerável o impacto positivo do Programa na comunidade: “Além de estimular a auto-estima, a produção de pimentas permite o incremento de renda das famílias envolvidas. Estima-se que, com a comercialização dos produtos, as famílias recebam cerca de um salário mínimo por mês, com perspectiva de duplicar essa renda com o crescente aumento da demanda”. O produto foi direcionado a nichos especiais de mercado, sendo comercializado, atualmente, em hotéis cinco estrelas, restaurantes famosos e supermercados classe A de Maceió. Dona Josefa trabalha diariamente com a produção e comercialização das pimentas. Ela diz que a comunidade não

Segundo o clínico geral, doutor Alexandre Feldman, as pimentas possuem propriedades terapêuticas que nos auxiliam a viver sem dor de cabeça e com bom humor. Existem estudos demonstrando a eficácia da capsaicina e da piperina – componentes químicos, respectivamente, da pimenta vermelha e da pimenta-do-reino – na prevenção de dores de cabeça. Comer pimenta ainda provoca bem-estar, devido à liberação de endorfinas, fabricadas no cérebro e responsáveis por sensações agradáveis, gerando bom humor. As substâncias químicas que tornam as pimentas ardidas também são capazes de combater dores crônicas, por sua ação antiinflamatória. Feldman conta que maias, astecas, hindus e várias tribos africanas sempre foram consumidoras de pimenta, hábito hoje disseminado entre seus descendentes, no México, Índia, África e nordeste do Brasil. Fonte: Luiz Figueiredo – Revista Terra Gente

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Piranhas, cidade a oeste do estado de Alagoas, é banhada pelo Rio São Francisco.

Artesãs da Associação de Artesãos em Couro de Tilápia (AACT), formada por mulheres, em sua maioria. Cada uma delas chega a ganhar até R$ 200,00 por mês.

esperava um trabalho desses: “No início, ficamos até assustados com a novidade, pois nunca tínhamos visto algo parecido. Baixas era um lugar esquecido”. Desde que foi criado, o Programa H2Sol – Água Solar já foi apoiado pelas seguintes instituições: Fundação Fiorello LaGuardia, Fundo de Microcrédito de Alagoas (Funcred), United State Agency for International Development (Usaid-Brasil), E3V - Environment Energy and Enterprise Ventures Private Limited e InWEnt. Atualmente, o Programa conta com o apoio da Ashoka e o reconhecimento da Rede de Tecnologia Social (RTS), bem como da Fundação Banco do Brasil. Sua reaplicação já foi realizada na África, em Moçambique, sob o patrocínio da Fundação LaGuardia, através do Projeto REEEP.

Artesanato

No oeste do Estado de Alagoas, está localizada a cidade de Piranhas, reconhecida como Patrimônio Histórico Nacional, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A cidade foi

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cenário de momentos importantes da história do cangaço. Sua beleza, banhada pelo Rio São Francisco, impressiona a todos. Entretanto, a riqueza natural e cultural da região não se reflete na economia de forma satisfatória. É preciso gerar trabalho e renda. Para tal, há iniciativas como a Associação de Artesãos em Couro de Tilápia (AACT), formada por mulheres, em sua maioria. Apoiada pelo Sebrae, pelo Arranjo Produtivo Local da Piscicultura Delta do São Francisco e pelo Instituto Palmas, a Associação criou a marca “Estação Cangaço”, que agrega aos produtos a identidade cultural, social e ambiental da região sertaneja. Cada produto tem a “cara” do sertão, trazendo temas como o cangaço, flores da caatinga, a arquitetura local e o Rio São Francisco, entre outros. As peças confeccionadas em couro de peixe (tilápia) são elaboradas a partir de matéria-prima adquirida de associações e cooperativas de piscicultores ou beneficiadores. O que, antes, eram resíduos do beneficiamento do pescado destinados ao lixo, agora geram renda extra. As peles são curtidas pelos artesãos por meio de processo orgânico, utilizando taninos vegetais e isentas de tratamentos químicos poluentes. Nas peças, também é utilizado o couro de bode. A Estação Cangaço desenvolve uma atividade produtiva contextualizada com o universo dos artesãos e artesãs, oferecendo peças de decoração, bolsas, calçados, biojóias etc. Quem adquire os produtos colabora com a inclusão social e econômica, com o aumento da renda familiar de comunidades do Semiárido nordestino, além de viabilizar empreendimentos que respeitam o meio ambiente. Os produtos têm ótima aceitação, no mercado. Eliane Souza, integrante da


Fórum de Dlis

Em 2002, o município de Olho D’água do Casado/AL foi uma localidade escolhida pelo Sebrae, para a implantação do Fórum de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável (Dlis). A partir da parceria com a ASA, o grupo interrompeu as construções individuais de cisternas e passou a trabalhar de forma coletiva. Hoje, há cerca de 800 famílias beneficiadas no município, o que alcança quase a metade da população de Olho D’água do Casado. Através da ASA, também foi implantado o Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), já com 22 famílias beneficiadas. O objetivo do Programa é ir além da captação de água de chuva para o consumo humano, avançando para a utilização sustentável da terra e o manejo adequado dos recursos hídricos para produção de alimentos (animal e vegetal), promovendo a segurança alimentar e a geração de renda. Através do Fórum de Dlis, moradores de Olho D’água do Casado também passaram a investir na

fotos secex/rts

Associação, relembra a trajetória percorrida: “Ao longo do tempo, fizemos vários cursos, melhoramos nossa forma de trabalho, organizamos o horário de serviço e a divisão dos lucros. Hoje, cada associada chega a ganhar R$ 200 por mês. Isso depende da força de vontade de cada uma de nós”. Dentre os desafios, destaca-se a divulgação dos trabalhos da Associação de Artesãos em Couro de Tilápia (AACT), a aquisição de maquinários para aumentar a escala de produção e a comercialização para além da cidade de Piranhas. Para tal, o Instituto Palmas elaborou o Projeto Ser Tão Justo, aprovado pelo Sebrae Nacional, que tem, como foco, o comércio justo solidário.

Apiário Amigos em Ação.

ovinocaprinocultura, com a criação de bodes, cabras e ovelhas.

Apicultura

Um dos eixos de desenvolvimento de Olho D’água do Casado, durante o processo do Fórum de Dlis, foi a apicultura. No município, há vários produtores de mel. Para viabilizar a comercialização do produto, foi criada a Associação dos Produtores de Mel (Aspromel). Essa articula-se, em nível estadual, com a Cooperativa dos Produtores de Mel e Derivados de Alagoas (Coopeapis). Na região, uma agricultora e professora é reconhecida como especialista em produção de mel. Seu nome é Cícera Alves da Silva, mais conhecida como Ciça Cupira. Sua caminhada é marcada por lutas para melhorias na comunidade, participação no Fórum de Dlis, diálogos com a ASA e presenças em reuniões, cursos e encontros. Dona Cícera conta que encontrou sua grande realização na apicultura, atividade pela qual se apaixonou durante cursos oferecidos pelo Fórum de Dlis.

Ana Cristina Accioly, diretora do Instituto Palmas, acompanha processos de desenvolvimento local, no Estado de Alagoas. Para ela “é importante que as iniciativas desenvolvidas, em Olho D’água do Casado, sejam reconhecidas como Tecnologia Social. Tal crédito precisa ser dado às comunidades, produtores e produtoras, detentores de conhecimento”.

Outras Informações Instituto Eco-Engenho Site: www.ecoengenho.org.br Estação Cangaço Fone: (82) 3686 3201 ou 8896 4806 Email: estacaocangaco@hotmail.com Instituto Palmas Fone: (83) 3686 3170 ou 9984 9098 Site: http://institutopalmas.org.br/ Casa do Mel (dona Cícera) Fone: (82) 9934 9757 Fórum de Dlis (seu Cícero) Fone: (82) 9984 8200

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INCLUIR

Protagonismo juvenil para mudança social No município de Água Branca (AL), 170 jovens reúnem-se na Associação Cultural Jovem Guarda de Água Branca. O objetivo é representar a juventude na região, viabilizar recursos para propiciar mudanças de vida aos jovens, bem como cultivar e promover a cultura no cotidiano dos associados e da comunidade. AMOSIEL DOS SANTOS FEITOSA, 24 anos, é o coordenador da Associação e compartilha detalhes desta iniciativa.

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Como surgiu a idéia da Associação? Amosiel - Participo de iniciativas sócioculturais desde os tempos do protagonismo juvenil, no Fórum de Desenvolvimento Local, Integrado e Sustentável (Dlis). A partir dessas experiências e reuniões, surgiu a idéia de construir uma entidade sócio-cultural para trabalhar com novas tecnologias, educação e outras temáticas. Criamos, então, a Associação Cultural Jovem Guarda de Água Branca. Temos três anos e oito meses. Hoje, trabalhamos com 170 jovens, divididos em núcleos. Qual é o objetivo da Associação? Amosiel - O objetivo é trazer uma nova perspectiva de realidade para os jovens, buscando atender seus anseios, suas expectativas, trabalhando suas frustrações, colaborando para que sejam bons cidadãos. Pretendemos desenvolver tudo aquilo que é próprio da juventude, para a juventude, com a juventude. Buscamos, através das artes, a qualidade de vida dos jovens envolvidos, trazendo e promovendo o direito à arte,

cultura e lazer. Buscamos desenvolver, de forma sustentável, os empreendimentos dos jovens associados, promovendo meios para sua profissionalização, sua educação e responsabilidades sociais. Queremos fortalecer a cultura local através do protagonismo juvenil - identificando e estimulando lideranças, com o desejo de atuar no meio onde vivem, com propósito de mudança social. Queremos usar os mecanismos sociais, culturais a artísticos da juventude em prol de construção de uma sociedade melhor. Quais são as atividades realizadas pela Associação? Amosiel – Destacamos o fato de sermos Ponto de Cultura e Ponto de Leitura. Realizamos reuniões periódicas com os integrantes da Associação. Também desenvolvemos atividades como palestras e encontros com professores, a fim de dialogar sobre juventude, educação e sociedade. Temos iniciativas, como levar os jovens a interagir com as novas tecnologias.


secex | rts

Além disso, em nosso espaço ocorrem outros encontros. O pessoal da Melhor Idade se reúne aqui. Os vizinhos vêm discutir questões religiosas e sociais. O que você acha que Água Branca pode compartilhar com outros jovens do Brasil? Amosiel - Nossa marca é a resistência e a inovação. Acho que a juventude tem que resistir a todas as frustrações impostas pela sociedade. Aqui em Água Branca, estamos tentando criar espaços de resistência. Também quero dizer que vale a pena ser diferente, vale a pena lutar pelo outro. A intenção é dar nosso testemunho a jovens de outras cidades, para que eles possam enxergar, aqui no sertão - um lugar com uma realidade tão dura e sofrida - que existem pessoas que pensam em propostas coletivas. O grupo assistiu a uma apresentação da Rede de Tecnologia Social (RTS). Você acha possível uma parceria entre a Rede

a Associação, na divulgação de experiências? Amosiel - Com certeza! Precisamos que as pessoas nos reconheçam. Estamos enfrentando, como dificuldade, a falta de comunicação. Nossas ações e reações precisam ser ouvidas. As pessoas precisam enxergar a juventude. Então, para alcançarmos nossos objetivos, precisamos de divulgação. E a RTS é fundamental. Faremos uso do Portal da Rede e nos mostraremos, dentro desse Portal.

Outras Informações Associação Cultural Jovem Guarda de Água Branca www.juventudevivaab.com.br leysoma@ig.com.br (82) 3644 1433 ou 99195412 Rede de Tecnologia Social (RTS) www.rts.org.br secex@rts.org.br

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agenda global

divulgação

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O carinho das Mães Sociais

A

s mães sociais são profissionais que passam a dedicar seu tempo ao cuidado de crianças, jovens e adolescntes em situação de vulnerabilidade social. Elas administram o lar com autonomia, orientam e respeitam a origem familiar, as raízes culturais e a religião de cada um. A profissão é regulamentada e registrada pela Lei nº. 7.644, de 18 de dezembro de 1987. “A mãe social trabalha para o desenvolvimento de cada criança a ela confiada, proporcionando a segurança, o amor e a estabilidade que cada uma

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precisa”, diz Sandra Greco da Fonseca, Gestora Nacional da ONG Aldeias Infantis SOS Brasil. A instituição atua na promoção ao desenvolvimento social, com a defesa, garantia e promoção dos direitos de crianças, adolescentes e jovens. Cerca de 10.000 crianças participam diariamente dos programas da ONG no país. Mas essa iniciativa é mundial e antiga. A ONG surgiu na Áustria após a 2ª Guerra Mundial em 1949, e hoje está presente em 132 países. Crianças em situação de vulnerabilidade social, que perderam ou estão prestes a perder os cuidados de suas famílias, participam de

um programa integral, com duas áreas de atuação: o Fortalecimento Familiar e Comunitário, e o Acolhimento. O trabalho das mães sociais é a última etapa do processo. No primeiro, intitulado fortalecimento familiar e comunitário, a finalidade é contribuir para a diminuição do abandono infantil, facilitar processos que propiciem o desenvolvimento e a autonomia de famílias e comunidades, na promoção e proteção de suas crianças, adolescentes e jovens. “Desenvolvemos este serviço em 14 Centros Sociais, além de 40 Centros Comunitários, com cerca de 8.300


fred fokkelman

Negócios com baixo carbono

divulgação

crianças, adolescentes e jovens participantes”, destaca Sandra Greco. Mas é no acolhimento que é feito o serviço de proteção integral a crianças, adolescentes e jovens que por motivo de risco (negligência, discriminação, abuso, exploração, entre outros) tiveram seus vínculos familiares fragilizados e/ ou rompidos. Atualmente cerca de 1.700 crianças, adolescentes e jovens estão acolhidos pela ONG e isso acontece quando a autoridade da infância avalia e decide que uma criança não pode permanecer em sua família de origem. Cada núcleo familiar é composto por até nove crianças, irmãos biológicos ou não, de diferentes idades e de ambos os sexos. A mãe social é responsável pelo cuidado e projeto de vida de cada criança e jovem. “Em uma unidade de acolhimento são garantidos seus direitos básicos - alimentação, educação, saúde, lazer e o direito à convivência familiar e comunitária”, informa Sandra. Para conhecer mais os trabalhos das Aldeias Infantis SOS Brasil acesse: www.aldeiasinfantis.org.br

É cada vez maior o número de empresas preocupadas com a sua “pegada” ambiental. A redução na produção de resíduos e de gases que contribuem para o efeito estufa está entre as ações procuradas pelas corporações para se tornarem gestões sustentáveis. No início de outubro, aconteceu em São Paulo o 2º Simpósio de Responsabilidade Social promovido pela Associação Franquia Sustentável (Afras), braço de responsabilidade socioambiental da Associação Brasileira de Franchising (ABF). E o tema foi o desenvolvimento de negócios sustentáveis em uma economia de baixo carbono. Várias empresas franqueadas apresentaram suas experiências nesse caminho, demonstrando os sucessos e as dificuldades da implantação desses negócios. Na opinião dos organizadores, a iniciativa foi positiva, pois se pode conhecer mecanismos usados por importantes redes de franquia para a redução da emissão dos gases do efeito estufa dentro da cadeia produtiva do negócio. Ao final do simpósio, foi lançado o projeto Franchising de Baixo Carbono, reunindo 15 marcas franqueadoras dispostas a entrar no mercado voluntário de crédito de carbono. Pela proposta, cada rede escolherá cinco unidades franqueadas para, juntas, inventariarem as emissões geradas com o consumo de energia, água e efluentes líquidos.

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agenda global

Sustentabilidade Entre o discurso e a prática Como os consumidores finais vêem as empresas que se dizem comprometidas com a causa ambiental? Segundo a pesquisa 2010 Gibbs & Soell Sense & Sustainability Study, as pessoas em geral são céticas e desconfiam dos discursos ambientais corporativos. Por esse estudo, apenas 16% dos consumidores acreditam nos esforços pela sustentabilidade das empresas e não apenas como ferramenta de marketing para melhorar suas imagens. E mesmo no meio empresarial há restrições quanto a esse apelo ecológico: somente 29% dos executivos acham que o discurso equivale à prática. A pesquisa ouviu 2605 consumidores e 305 executivos norte-americanos. “Este ceticismo geral sobre o comprometimento empresarial com as questões ambientais é um dos grandes obstáculos para os líderes de negócios nos próximos anos”, afirmou Ron Loch, vice-presidente da Gibbs & Soell. Tanto que apenas uma em cada dez grandes empresas possui um executivo exclusivo para a promoção

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da sustentabilidade. A maioria dissolve as “tarefas verdes” nas responsabilidades de todos. No entanto, quando os consumidores são questionados se pagariam mais por um produto apenas por este ser sustentável, 71% disseram que não. Para essas pessoas, as práticas ecológicas nos negócios são “boas para se ter” e não uma necessidade. A pesquisa, disponível na internet (em inglês), dá uma amostra do quanto é preciso avançar no mundo quando o assunto é sustentabilidade. “Diminuir essa falha na credibilidade irá requerer um maior emprego de pessoas e capital. É preciso transmitir transparência e consistência nas mensagens para os consumidores”, concluiu Loch. http://www.gibbs-soell.com/wp-content/uploads/2010/08/2010-Gibbs-Soell-Sense-Sustainability-Study.pdf



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meu mundo Paulo Markun

Paulo Markun Jornalista, escritor e produtor rural ecológico, conectado às mídias sociais e atento às mudanças do Brasil. Esse é o perfil de Paulo Markun (58), um dos profissionais da comunicação mais conhecidos do país. Passou pelas grandes emissoras de televisão, jornais e revistas nacionais. E há 12 anos, divide seu tempo entre o trabalho em São Paulo e a residência em Florianópolis, num lugar que ainda mantém as características açorianas da capital de Santa Catarina: Santo Antônio de Lisboa. Em meio à rotina exaustiva, conseguiu escrever 12 livros nos últimos anos e já prepara o próximo.

MORADIA

“Saí da TV Globo e fui para a TV Cultura para conseguir morar em Santa Catarina. Buscava uma melhor qualidade de vida. Agora que saí da Cultura, quero conseguir morar mais em Florianópolis. Lá eu peso menos para o planeta: as distâncias são menores, o consumo também. Mas não é sustentável eu pegar avião toda a semana, no entanto, ainda preciso, pois meus contatos, meu trabalho, está em São Paulo.”

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PRODUTOR

“Na serra catarinense, sou um produtor ecológico, de frutas e de ovelhas. Mas não é fácil de manter. É um problema de escala: o produtor orgânico acaba recebendo menos que o convencional e assim não consegue ampliar a produção. Ao mesmo tempo, o consumidor final continua pagando mais caro pelos agroecológicos”.

ONDA VERDE

“Acho que o discurso verde no Brasil não é realista. O que aconteceu na eleição presidencial deste ano não foi uma demonstração de que todos os 20 milhões de votos na Marina Silva estavam comprometidos com a causa ambiental. Foi um desencanto explícito do eleitor com a política nacional. Creio que na próxima década a política no país não será mais assim. Os verdes na Alemanha atuam há 30 anos e somente agora conseguiram 10% do eleitorado daquele país.”


divulgação/fundação padre anchieta

Discurso verde no Brasil não é realista. Os verdes na Alemanha atuam há 30 anos e somente agora conseguiram 10% do eleitorado daquele país.

MÍDIAS SOCIAIS E INTERNET

“Trabalho diretamente com as mídias sociais, num projeto com meu filho. Acredito que as mídias sociais vão mudar muito a sociedade. Além disso, a internet hoje tem mecanismos que permitem o trabalho à distância. Posso fazer um programa de rádio na minha casa, onde tenho um estúdio, e enviar para a emissora”.

ESCRITOR

“Boa parte dos livros que publiquei foram escritos no aeroporto, no taxi. Acho que agora, fora da televisão, conseguirei mais tempo para me dedicar a isso. Quando se gosta de uma coisa, acha-se tempo para fazê-la. Meus horários livres são destinados aos projetos dos livros”.

HERANÇA

“Tenho três filhos e dois netos. E a herança que deixo certamente não é dinheiro nem propriedades. Mas dar as condições para que cada um siga a sua vida, ainda que eu não concorde com alguns caminhos.”

Boa parte dos livros que publiquei também foram escritos no aeroporto e no taxi. PRIMEIROPLANO . Novembro 2010

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em destaque divulgação

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Centro de Hippoterapia 100% sustentável

uma das precursoras da inclusão de deficientes

A história desta brasileira parece enredo de filme, mas foi uma vida real. Cega aos 17 anos por complicações patológicas, Dorina Nowill nunca deixou de lutar por aquilo que acreditava e para alcançar seus objetivos, superou as imensas dificuldades impostas pela deficiência. Pedagoga, com especialização feita no exterior, ela foi uma das precursoras na elaboração de livros em Braille para deficientes visuais. Criou uma Fundação com esse objetivo, a qual leva o seu nome, e que é considerada a maior do mundo voltada para cegos. Dizia sempre: “É preciso encarar a vida como ela aparece. Não se pode disputar com a vida”. E assim o fez, nos seus 91 anos existência. Dorina Nowill morreu no dia 30 de agosto em São Paulo, deixando cinco filhos, 12 netos, três bisnetos e um legado social impossível de ser mensurado.

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será o primeiro projeto totalmente sustentável da LCE Architects no Brasil. Mas o projeto deve agregar ainda mais benefícios do que um simples abrigo para os familiares das crianças atendidas. Devem ser construídos banheiros adaptados, bebedouros de água, baias e espaços mais amplos e totalmente adequados para a realização da Hippoterapia. E tudo isso será feito de uma forma 100% sustentável, aliado a bom design e soluções inovadoras.

sundstrom

Brasil perde Dorina Nowill

Um Centro de Hippoterapia completo será construído no Parque do Peão em Barretos/SP a partir de um projeto que será doado pela empresa inglesa LCE Architects para a entidade. Os Independentes, a qual esta promove a Festa do Peão de Barretos. Referência mundial em arquitetura sustentável, a LCE será a responsável pelo projeto conceito de arquitetura de um edifício Carbono Zero que abrigará o programa que atende gratuitamente 60 crianças e adultos portadores de necessidades especiais da cidade. Esse


ESTANTE >> Livros

Generosidade Os brasileiros ficaram em 76º lugar em um novo ranking internacional de generosidade que avaliou o grau de envolvimento da população em ações de caridade. A pesquisa foi feita com base em questionários realizados pelo instituto de pesquisas Gallup em 153 países pela ONG internacional Charities Aid Foundation, a qual criou o índice World Giving Index (Índice da Generosidade Mundial, em tradução livre). Os entrevistados responderam a perguntas sobre doações para entidades beneficentes, tempo gasto em trabalho voluntário e ajuda a estranhos. Na América Latina, o Brasil aparece atrás de outros 15 países no ranking da generosidade, empatado com Argentina e Nicarágua. Entre os países dos BRICs, os brasileiros são os mais generosos, à frente dos indianos (134º lugar), dos russos (138º), e dos chineses (147º). Pelo ranking, os países cujos povos são mais generosos são Austrália, Nova Zelândia, Canadá, Irlanda, Suíça e, em quinto lugar, os Estados Unidos. Segundo a Charities Aid Foundation, as ações caridosas variam muito entre os países devido a diferenças culturais. Cada país tem conceitos diferentes sobre o que é ser generoso. No entanto, a pesquisa identificou um padrão global: quanto mais velhas as pessoas, mais generosas elas costumam ser.

ZYLBERSZTAJN, David, LINS, Clarissa (org). Sustentabilidade e geração de valor: a transição para o Século XXI. Rio de Janeiro: Campus/Elsevier, 2010. 208 pp Preço médio: R$ 55,00

Nunca o tema sustentabilidade esteve tão presente no mundo corporativo como agora. A empresa que adota práticas sustentáveis ganha sob diversos aspectos: na diferenciação de seu produto ou serviço, no reconhecimento por parte dos seus clientes, no respeito dos concorrentes e nos lucros. Transformar a sustentabilidade como ação transversal em todos os segmentos de uma empresa é o desafio maior, para que o assunto não se torne meramente um incremento nas estratégias de marketing. Assim, o livro Sustentabilidade e geração de valor trata das estratégias que permitem que as organizações inovem, consigam se diferenciar e sejam bem-sucedidas, já que as empresas que não incorporarem de fato práticas sustentáveis de produção terão grande dificuldade de se manter no mercado. O livro traz ainda depoimentos de grandes nomes do mundo empresarial e acadêmico, que ajudarão a esclarecer

o porquê da urgência de mudanças efetivas e eficazes nos modos de produção e de consumo da sociedade. O prefácio escrito por Roger Agnelli, diretor-presidente da Vale desde 2001, já orienta para o que o leitor irá encontrar nesta obra. Segundo ele, o desenvolvimento não está descolado da sustentabilidade e as companhias que não estiverem atentas a isso correm o risco de serem varridas do mapa. Entre as personalidades que contribuíram para o livro estão Israel Klabin presidente da Fundação Brasileira Para o Desenvolvimento Sustentável, o cientista político Sérgio Abranches, o professor de Administração da UFRJ, Celso Funcia Leme e Jerson Kelman, ex-diretor da Agência de Energia Elétrica (Aneel). Trata-se de uma boa fonte bibliográfica para os administradores e gestores cientes das responsabilidades individuais e corporativas para o desenvolvimento econômico e social com respeito aos limites ambientais.

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em destaque

Transporte responsável premiada pelo trabalho de desenvolvimento profissional e humano no Centro de Treinamento de Motoristas da Região Nordeste do Rio Grande do Sul, mantido pela empresa. Já a Seqtra destacou-se no índice de gestão ambiental pelo controle de emissões ao criar um sistema inédito na sua atividade: o SLLIC (Soluções Logísticas Inteligentes & Itens Controlados). A ferramenta permite o controle logístico de toda a operação de transporte em tempo real, contabilizando o nível de emissões de CO2 expelido por seus caminhões. Além disso, a empresa faz a compensação de todos os itens dos produtos transportados através da compra de créditos de carbono no mercado “de forma voluntária, sem objetivo de retorno financeiro, mas com a preocupação socioambiental”, afirma Dário Palhares, presidente da Seqtra.

caio mattos

Reconhecer e dar visibilidade aos esforços das transportadoras de carga rodoviárias para desenvolver práticas de responsabilidade social que busquem a redução dos impactos da sua atividade na sociedade. Esse foi o objetivo do Prêmio Transporte Responsável, promovido pela Motorpress Brasil Editora, com patrocínio da Scania e Facchini e parceria da (Fundação Adolpho Bósio de Educação no Transporte). O transporte de cargas no Brasil é basicamente rodoviário e por isso, é uma atividade perigosa em função de grandes distâncias percorridas e bastante poluidora através das emissões de gases de efeito estufa. As duas empresas vencedoras desse primeiro prêmio trouxeram soluções humanas e ambientais. Foram a Transportes Cavalinho, de Vacaria, e a Seqtra Engenharia Logística, de Caxias do Sul, duas cidades da Serra Gaúcha. A primeira foi

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>> OPINIÃO

Biosfera ameaçada Por Amâncio Friaça *

N

*Astrofísico e pesquisador do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAGUSP). É membro do Conselho Editorial do Le Monde Diplomatique Brasil.

o romance de ficção científica A guerra dos mundos, de H. G. Wells, os invasores marcianos, com tecnologia muito mais avançada que a dos terráqueos, conquistam nosso planeta sem qualquer dificuldade. Em seus cilindros, os marcianos trazem não só suas máquinas, mas também o “mato vermelho”, uma forma agressiva de vegetação marciana que se alastra por todos os ecossistemas da Terra. A invasão é, assim, realizada por seres inteligentes e por uma biosfera alienígena. Da mesma forma, o ser humano tornou-se invasor de seu próprio planeta, impondo monotonia à biosfera. Felizmente, ele se deu conta de que sua sobrevivência dependerá da diversidade da vida e começou a promover ações para deter as perdas de biodiversidade. Em 1992, a Conferência da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a ECO-92, adotou a Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB). Desde 2002, 193 países signatários da CDB comprometeram-se a reduzir significativamente as perdas de biodiversidade até 2010. Por esse motivo, a ONU declarou este como o Ano Internacional da Biodiversidade e, em outubro, em Nagoya, a décima Conferência das Partes da CBD (COP10/CDB) define novas metas para a redução da perda de biodiversidade. E as respostas têm sido cada vez mais numerosas. Contudo, esse crescimento está desacelerando e não vem acompanhando o ritmo constante de aumento das pressões sobre a biodiversidade. É este o cenário que se desenhou nos últimos 40 anos.1 Há um ciclo de feedback entre quatro componentes: respostas à perda de biodiver-

sidade, pressões sobre ela, o estado da biodiversidade e os benefícios que ela oferece. O estado da biodiversidade é a medida da variedade das manifestações da vida da biosfera: genes, espécies e níveis de organização ecológica – populações, comunidades, ecossistemas. Como as respostas não estão contrabalançando as pressões, ele está em declínio constante. Em consequência, o quarto componente do ciclo, o dos benefícios da diversidade, exibe uma queda, que de início foi gradual, mas está cada vez mais acelerada. Se essa tendência prosseguir, haverá uma escalada da redução dos serviços da biodiversidade, com consequências catastróficas. A biodiversidade é essencial à sociedade. Os benefícios materiais incluem bens (alimentos, madeira, fibras, medicamentos e combustíveis) e funções de estabilização (controle de enchentes, regulação climática e ciclos de nutrientes). Calcula-se que o valor econômico desses benefícios seja de dez a 100 vezes maior que o custo de mantê-los. Os benefícios não materiais da biodiversidade são de fundamental importância para a definição do humano: a fruição da beleza, o senso do sublime, a apreensão das escalas da natureza. A diversidade da vida é um dos fundamentos do mundo simbólico, que será tremendamente empobrecido se a biodiversidade for solapada. A perda dos serviços materiais da biodiversidade se traduz em cifras apavorantes: trilhões de dólares de prejuízo, centenas de milhões de pessoas desalojadas, milhões de mortos. Os efeitos não materiais da perda de biodiversidade são dificilmente quantificáveis, mas conduzirão a uma desumanização de nós mesmos. 1 Rands, M. R. W. et al., “Biodiversity conservation: challenges beyond 2010”, Science, 329, 1298-1303, 2010.

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soluções

dave dyet

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ção Aten , Torre tá Aqui o! nh limpi

Aviões e abelhas

Divulgação do bem

divulgação

Há muitas empresas, ONGs e pessoas fazendo excelentes ações para melhorar a vida de todos. Mas nem todos conhecem essas iniciativas. E como os shoppings acabam sendo locais com grande rotatividade de pessoas, uma boa idéia é aproveitar os espaços disponíveis neles para divulgar as iniciativas “do bem”. Uma experiência como essa começou no Shopping Cidade Jardim, em São Paulo. Lá se chama Espaço do Bem e as ONGs poderão divulgar serviços e vender produtos. O espaço funcionará das 12h às 20h e terá toda a renda revertida para a entidade expositora. Entre as primeiras entidades participantes estão a Casa Hope, Unibes (União Brasileiro-Israelita do Bem-Estar Social), Colégio Mão Amiga, Instituto Ayrton Senna, Make a Wish, Orientavida e Criança Brasil. Fica aí a sugestão para os shoppings do país.

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Que o mel é bom para a saúde, ninguém discorda. Mas que o produto também pode medir a qualidade do ar, isso é uma novidade. Pois na Alemanha, oito aeroportos cultivam colônias de abelhas, com esse objetivo. Os pesquisadores analisam o mel produzido nessas colônias semestralmente e se ele contiver níveis excessivos de determinados metais, a explicação é a contaminação do ar do aeroporto por poluentes emitidos pelos aviões. Essa experiência de biomonitoramento está dando certo e aeroportos de outros países europeus já estão adotando a ideia.


Canetas são itens obrigatórios em todos escritórios e escolas. Mas feitas na maioria de plástico (derivado do petróleo), quando descartadas demoram até 450 anos para se decompor. Pois a empresa estadunidense DBA criou uma caneta 98% biodegradável que se decompõe completamente em seis meses. Feita com bioplástico de batata, a caneta tem um reservatório de tinta de fibras renováveis e biodegradáveis. E a tinta é composta por água, pigmentos atóxicos, glicerina e benzoato de sódio – nenhum ingrediente tóxico. A embalagem é de material totalmente reciclado e impressa também com tinta vegetal que pode ser reciclada. E não é só o produto que é sustentável. A empresa afirma que sua fábrica é movida a energia eólica e possui certificado ISO 14001. O preço é acessível: cerca de R$ 14 por pacote com três unidades. (http:// www.dba-co.com)

divulgação

Caneta biodegradável

Plástico Biodegradável.............. 90% Fibra biodegradável................... 8% Fibra de Polyester...................... 1% Polypropyleno............................. 1% Aço Inoxidável............................. <1%

O que você acha de, enquanto estar hospedado em um hotel descansando, também ter acesso a mais de 1500 jornais de 90 países? É um bom momento de conhecer a realidade de outros lugares. Ou simplesmente, saber como está o tempo na sua cidade antes de voltar para casa? Essa é a proposta do Jornal Verde (Green Paper), um serviço que vem sendo bastante utilizado pelos hotéis no mundo. Afinal, não é necessário fazer assinaturas, não há problemas com prazos de entrega, e é satisfação garantida dos hóspedes, que podem acessar diretamente de seus quartos ou nas salas de informática disponíveis nos hotéis ou, se preferir, o jornal pode ser impresso, igualzinho ao original. www.newspaperdirect.com.br

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Jornal Verde

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SAIDEIRA

Carlos eduardo uehara/univali

Hummm Chuรกaa

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