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Mau uso da voz pode detonar muitas carreiras promissoras

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dia a dia

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Maria Lucia Tolouei marialucia@progresso.com.br

Voz traduz a personalidade, é um segundo ‘rosto’, revela condição de saúde, estado de espírito, é marca registrada mas nem sempre representa a realidade, quando deformada pelo mau uso que, via de regra, pode prejudicar atividades do dia a dia e detonar muitas carreiras promissoras.

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Segundo o especialista em voz, Ademir Garcia Baena, alterações vocais ocasionadas principalmente pelo esforço repetitivo têm levado profissionais de diversas categorias, especialmente os educadores, ao afastamento pela incapacidade ao desempenho das funções, o que implica custos financeiros, profissionais, pessoais e sociais.

“A prevenção é o principal meio para se evitar problemas vocais”, diz o fonoaudiólogo de Dourados, que também alerta para outros sinais alarmantes, como rouquidão frequente, inclusive na infância.

O tema ganha maior repercussão nesta semana, quando se comemora o Dia do Fonoaudiólogo, em 9 de dezembro. Confira a entrevista:

Problemas de voz podem passar despercebidos. Rouquidão na infância, alteração do tom, entre outros, como saber se é doença ou característica pessoal?

As disfonias infantis normalmente passam despercebidas porque pais, professores, pediatras se preocupam com a precisão articulatória da fala da criança e não com a qualidade vocal que ela poderia estar apresentando e, também, porque os problemas de voz em crianças, em geral, não afetam o desempenho acadêmico e podem passar despercebidos pelos professores, que estão ali voltados para as questões eminentemente de aprendizagem, não considerando caso especial para tratamento.

A rouquidão muitas vezes é considerada parte do processo normal do desenvolvimento, e pode ser vista como uma característica pessoal, (rouquidão persistente tem que ser avaliada) isto retarda o diagnóstico e pode comprometer o prognóstico, contribuindo para que a comunicação seja difícil, tensa, fator de estresse infantil. Raramente a criança se queixa de cansaço, dor ou esforço para falar, normalmente o sintoma mais presente, é rouquidão, “falhas” na voz com queda de intensidade, alteração do tom (uma voz mais grave do que as outras crianças da mesma idade).

A maioria não recebe tratamento fonoaudiológico e poucos são encaminhados para uma avaliação adequada com o médico otorrinolaringológico, ou o fonoaudiólogo, acarretando, desta forma, uma discrepância entre incidência (que varia entre 6% e 23%) e tratamento. Nós, profissionais da saúde e da educação, temos grande responsabilidade nessas questões. Programas educacionais que visem à orientação e triagem com indicação adequada podem diminuir consideravelmente o número de crianças que apresentam rouquidão ou outros sintomas de natureza vocal.

O que a voz diz sobre a personalidade corresponde, via de regra, à verdade? Como "afinar" isso?

Sim, normalmente, a voz é considerada uma tradução e uma das extensões mais fortes da nossa personalidade, ela nos representa revelando nossa saúde, nosso estado emocional, nossas angustias, tristezas, alegrias, nosso equilíbrio, sobriedade, confiança, segurança, e outras características; através dela, as pessoas demonstram quem são o que sentem e como enxergam o mundo.

A voz é um “segundo rosto”, é como se fosse uma “impressão digital”, posto que é única e, portanto singular. Na voz, é possível detectar as sombras e a luminosidade de cada um. Não é só a aparência que cria a imagem de uma pessoa, mas também sua voz. Afinal, nossa forma de falar depende dos traços de nossa personalidade e também do nosso estado de ânimo.

Quando estamos motivados, a voz segue um compasso rítmico e harmonioso, quando estamos desanimados, a voz é “melosa”, quando bem-humorados e serenos, falamos pausadamente, numa altura suficiente para que os outros ouçam. Falar alto demais demonstra agitação interior e anseio por ser ouvido pelos outros. A voz nos permite conjugar o verbo Ser.

Rouquidão ou falha na voz são indicativos de problemas? Quais os tratamentos?

Toda pessoa com quadro de rouquidão, falhas na voz, que dure mais de 10 a 15 dias deve procurar um médico especialista que é o otorrinolaringologista, ou o fonoaudiólogo, para avaliação detalhada. A maioria das causas agudas (laringite aguda) resolve-se antes de 10 dias, e não requer maiores preocupações. Laringite crônica pode causar tensão das cordas vocais e lesões ou tumores na corda vocal (pólipos ou nódulos). A laringite requer tratamento médico.

Já a rouquidão crônica, duradoura, demanda atenção especial. O especialista responsável é o médico otorrinolaringologista, capacitado a realizar exames que permitem a visualização das pregas vocais. Com isso, ele consegue identificar a presença de lesões que podem ser responsáveis pela rouquidão e outros sintomas.

O tratamento vai, então, depender do tipo de causa. Nos casos funcionais (quando não há lesão) o principal tratamento é a fonoterapia.

O paciente aprende como usar a voz de maneira mais equilibrada e adequada, através da realização de exercícios específicos, orientados por profissional capacitado, que é o fonoaudiólogo especialista em voz. O tratamento dos nódulos pode ser feito com a fonoterapia, mas em alguns casos é necessária a realização de cirurgia para sua retirada. O pólipo também requer cirurgia, seguida de fonoterapia no pós-operatório. Os cistos recebem o mesmo tratamento dos pólipos.

O edema de Reinke é tratado com a interrupção do tabagismo (o que é indicado sempre, para todos os pacientes com rouquidão), e também fonoterapia. Os papilomas são tratados com cirurgia, porém a possibilidade de recidiva é grande. A paralisia de pregas vocais é tratada com fonoterapia.

Quais os entraves decor- rentes do mau uso da voz?

O que o senhor orienta? Evidentemente que, dependendo do distúrbio vocal e do impacto que este causa na voz, os entraves são claros e podem ser pessoal, social, emocional e especialmente profissional, limitando este profissional e, em algumas situações, interrompendo uma carreira promissora, reduzindo a satisfação com o trabalho.

As alterações vocais ocasionadas principalmente pelas questões relacionadas à organização do trabalho têm levado diversas categorias, especialmente os educadores à situações de afastamento e incapacidade para o desempenho de suas funções, o que implica custos financeiros, profissionais, pessoais e sociais. A prevenção é o principal meio para se evitar problemas vocais. É importante que estes profissionais mantenham hábitos corretos de postura, gestos precisos e uma boa qualidade vocal. Além do aquecimento e desaquecimento vocal, oriento hábitos saudáveis, como: evitar o consumo de cigarro, ingestão de álcool, agridem o sistema respiratório, as pregas vocais e o trato vocal; o uso associado pode causar o câncer de laringe; evitar o contato com ar-condicionado, pois o mesmo provoca ressecamento na mucosa do trato vocal, quando sob ar condicionado, a ingestão de água é muito importante; evitar a competição sonora, falar alto, gritar, o ato de pigarrear, aumenta o atrito das pregas vocais. O uso de sprays e pastilhas,

A profissão de fonoaudiólogo é relativamente nova. Como é a atuação no setor de saúde, conjuntamente com médicos?

Alerta

“Consumo associado de cigarro e álcool pode causar o câncer de laringe”

“Uso de sprays e pastilhas, sem prescrição médica é um equívoco e tem ação semelhante a do álcool”.

“É de fundamental importância tomar água, de preferência de gole em gole durante o dia” sem prescrição médica é um equívoco e tem uma ação, semelhante a do álcool. É de fundamental importância tomar água, de preferência de gole em gole durante o dia, especialmente durante a exposição vocal. Evitar a automedicação, pois coloca a saúde do indivíduo em risco, e a maioria das medicações causam alterações no trato vocal. Evitar roupas ou acessórios apertados na região do pescoço, para não causarem dificuldades na respiração e não atrapalharem a movimentação muscular que promove a fala; articule com precisão as palavras, mas sem exagero.

Com relação à audição e voz, como detectar algum desvio, inclusive nos primeiros anos de vida?

Em relação à audição, o diagnóstico audiológico antes do primeiro ano de vida (teste da orelhinha) possibilita a intervenção médica e fonoaudiológica no período de maturação e plasticidade funcional do sistema nervoso central, prevenindo futuras alterações; a família, pediatras, e os professores têm uma importância fundamental na identificação de algum problema que a criança possa apresentar, seja ele em relação à audição ou voz. Isso pode ser feito através de observações do comportamento da criança e os pais devem ficar atentos quanto à qualidade da fala, qualidade da voz, desempenho escolar, com o objetivo de buscar, se for o caso, atendimento o mais precoce possível.

Mesmo sendo uma profissão nova, a Fonoaudiologia tem destaque não só no Brasil, mas também em outros países, através da rica produção cientifica de seus profissionais. O fonoaudiólogo atua com equipes multidisciplinares e interdisciplinares, o que sem dúvida gera uma integração maior com outros profissionais, como gastroenterologistas, otorrinolaringologistas, pediatras, neurologistas, neonatologistas, cardiologistas, geriatras, geneticistas, fisiatras, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, psicólogos, nutricionistas, ortodontistas, enfermeiros, entre outros.

Quais os avanços e estanques?

O início da Fonoaudiologia nos serviços públicos foi marcado por práticas assistencialistas, limitadas a atendimentos individuais, de caráter eminentemente clínico, com ênfase na reabilitação de agravos nas áreas da linguagem oral e escrita, voz, audição e motricidade oral. Um grande avanço surgiu a partir da criação do Sistema Único de Saúde (SUS), um movimento de reflexão e mudanças que procura redirecionar a prática fonoaudiológica numa perspectiva social, coletiva e preventiva. Embora ainda existam alguns estanques, como a falta de conhecimento da atuação do fonoaudiólogo, a ausência de fonoaudiólogos em equipes multiprofissionais e interdisciplinares, no serviço publico, conseguimos estabelecer os caminhos da profissão e conquistar de forma expressiva o respeito das demais categorias e da população.

Como é hoje o mercado para o profissional fonoaudiólogo? Dourados não tem o curso, certo?

Excetuando-se profissionais que trabalham essencialmente na área de audiologia, os demais se distribuem em um campo de atuação diversificado, que compreende serviços públicos de saúde. Há fonoaudiólogos inseridos em equipes interprofissionais, atuando de forma preventiva em hospitais, postos, unidades básicas, especialidades e hospitais-dia; creches, escolas de 1º e 2º graus, orientando os professores e auxiliando na elaboração de programas de alfabetização; como docente; saúde ocupacional/indústrias - a atuação do fonoaudiólogo, na área de saúde do trabalhador está em franca ascensão em virtude da legislação vigente, que obriga as indústrias a realizarem exames audiológicos nos funcionários, com programas de conservação auditiva e controle de ruído; avaliações audiológicas, seleção e adaptação dos aparelhos auditivos; meios de comunicação, artes e telemarketing: junto aos profissionais que tem a fala e a voz como instrumento de trabalho; entidades, assistência a deficientes: clínicas geriátricas/asilos. Em MS, não há curso de Fonoaudiologia.

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