Direito e Desenvolvimento no século XXI

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Direito e Desenvolvimento no Século XXI: rumo ao terceiro momento? Rafael A. F. Zanatta Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

2ª Conferência do Desenvolvimento Brasília - 23/11/11


Estrutura da apresentação 1. Problematização: o que é direito e desenvolvimento? 2. O “vôo da coruja”: D&D no século XX 3. As razões do fracasso dos dois “momentos” do direito e desenvolvimento 4. Há futuro para o direito e desenvolvimento? O empirismo na busca de soluções ótimas


O que é direito e desenvolvimento? Relação entre sistema jurídico e processo de desenvolvimento? Direito como estrutura formal? Desenvolvimento como crescimento econômico? Boom do direito e desenvolvimento: FGV, ABDI, IPEA, BNDES, INPI “Ambiente jurídico, investimento e inovação” (as relações existentes entre direito e desenvolvimento são relevantes objetos de estudo e de políticas públicas)


O que é direito e desenvolvimento? Como isso se reflete na academia: teoria ou slogan? EUA: debate entre céticos e otimistas As instituições importam (North). Mas quais? David Trubek: D&D como nódulo entre teorias econômicas, teorias jurídicas e práticas institucionais Proposta de análise sociológica: os “momentos” do direito e desenvolvimento


O “vôo da coruja”: a análise de Trubek sobre o direito e desenvolvimento do século XX Direito e desenvolvimento é “uma ideia que define uma prática e molda a ação” (Trubek, 2011) Olhando para trás, é possível identificar dois momentos (duas ondas) do direito e desenvolvimento Nelas, três teorias sobre o direito foram defendidas: (i) direito como instrumento, (ii) direito como barreira, (iii) direito como moldura


Momentos do direito e desenvolvimento Primeiro momento (Década de 60): (i) paradigma do legalismo liberal (ii) teoria da modernização (iii) crescimento econômico conduzido pelo Estado (iv) transplante de normas de direito público (v) reforma do ensino jurídico (vi) crença que o desenvolvimento econômico resultaria em democracia liberal (vii) Guerra Fria (viii) Estados Unidos - América Latina (ix) USAID e Fundação Ford


Momentos do direito e desenvolvimento Segundo momento (Década de 90): (i) paradigma do rule of law (ii) globalização econômica (iii) Estado mínimo que garanta segurança jurídica e calculabilidade para o agente econômico (iv) transplante de normas de direito privado (v) reforma do Judiciário (vi) crença que a liberalização da economia resultaria em crescimento e alocação eficiente dos recursos (vii) neoliberalismo (“fim da história”) (viii) Instituições Financeiras - países em desenvolvimento (ix) Banco Mundial


Distinção entre os dois momentos


Pontos em comum dos dois momentos Meta-narrativa sobre “como se desenvolver” (modernização x crença no mercado) Definição sobre o setor responsável pela mudança Exigência do transplante jurídico Grande fórmula: one size fits all Atores internacionais responsáveis por direcionar as reformas


Razões do fracasso dos dois momentos 1º momento: modernização autoritária, etnocentrismo, weberianismo vulgar, ignorância dos fatores culturais, crise do Welfare State, juristas como parte do estamento patrimonialista 2º momento: desregulamentação excessiva, limitações do Consenso de Washington, economia heterodoxa, críticas ao conceito de desenvolvimento, instituições para o mercado


Críticas ao D&D do século XX Universalismo e simplicidade (one size fits all?) Economicismo (desenvolvimento é crescimento econômico? A riqueza é um fim?) “As práticas, que tinham que lidar com a realidade confusa de culturas e sistemas jurídicos, revelavam com frequência falhas nas ideias”


Há futuro para o direito e desenvolvimento? LANDS: Law and New Developmental States (2007) Alguns países em desenvolvimento, como o Brasil, estão explorando formas por meio das quais o Estado pode promover crescimento e igualdade Ideias: a economia de mercado pode falhar, a intervenção regulatória é necessária e que a ideia de desenvolvimento deve incluir a liberdade humana Direito como meio e como fim (Estado de Direito é desenvolvimento) BRICSLAW: Rede de expertises de Brasil, China, Rússia e Índia


Tipo-ideal do novo modelo de Estado desenvolvimentista (Trubek, 2010) Elementos: (i) confiança primária no setor privado como investidor ao invés de empreendimentos estatais (ii) aceitação do papel principal do Estado em coordenar o investimento, projetos e garantir informação (iii) colaboração extensiva e comunicação entre público e privado (iv) forte interesse em exportação e relativa abertura à importação (v) atenção direta ao empreendedorismo, inovação e desenvolvimento de novos produtos


Tipo-ideal do novo modelo de Estado desenvolvimentista (Trubek, 2010) Elementos: (vi) promoção do investimento direto produtivo (vii) ênfase em tornar empresas privadas competitivas ao invés de protegê-las da competição (viii) privatização ou parcerias público-privadas para serviços públicos (ix) promoção do mercado de capital doméstico e setor financeiro para gerar e alocar recursos (x) atenção à proteção social incluindo esforços para reduzir desigualdades (xi) programas de bem-estar condicionados ao investimento em capital social


Direito e Novo Estado Desenvolvimentista Implicações em novas políticas públicas: (i) sistema organizado para compartilhamento de informações público-privado (ii) sistemas subsidiados para promover buscas por mercados e produtos promissores (iii) esforços cooperativos público-privados para construir regimes regulatórios que fomentem a competitividade global e eficiência doméstica (iv) esforços para criar “campeões nacionais” (v) investimento em educação, pesquisa e desenvolvimento (vi) uso seletivo de tarifas, taxas e subsídios para estimular indústrias (vii) uso de parcerias público-privadas para investimentos em infra-estrutura


Existe um terceiro momento? David Trubek crê que a teoria do terceiro momento do direito e desenvolvimento é muito incipiente Mesmo assim, ela propõe o desafio de pensar desenhos institucionais que garantam flexibilidade e segurança jurídica em nome de novas políticas públicas que coordenem a economia É preciso um compromisso com o experimentalismo (Unger)


Novas reflexões do direito e desenvolvimento do século XXI O direito deve promover e facilitar a experimentação e inovação (busca público-privada de soluções inovadoras e trajetos desenvolvimentistas ótimos) O direito é crescentemente afetado por forças globais (direito transnacional, normas da OMC, Mercosul) O direito em si é parte do desenvolvimento (parte necessária do processo de emancipação) Medidas de direito e desenvolvimento devem ser empíricas (instrumentos para diagnosticar problemas e medir resultados de reformas)


Direito e desenvolvimento “sem script” Não há fórmula desenvolvimentista que possa ser aplicada a todos os países em desenvolvimento. O conhecimento deve ser buscado de forma situada A pesquisa em direito deve ser funcional e empírica e não formal e doutrinária É preciso distinguir entre o “direito nos manuais” (law in books) e o “direito em ação” (law in action) A mudança estrutural depende da prática engajada de novos pesquisadores e de políticas públicas concebidas democraticamente


Obrigado! E-mail: rafaelzanatta@usp.br Twitter: @rafa_zanatta


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