UFF - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE EAU - ESCOLA DE ARQUITETURA E URBANISMO
RAISA MONTEIRO DE BARROS OLIVEIRA Autora do Trabalho
Criação, inovação e o cenário urbano: alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado à Escola de Arquitetura e Urbanismo, Curso de Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal Fluminense, como parte dos requisitos para a sua conclusão.
VINICIUS DE MORAES NETTO Orientador ANA LÚCIA VIEIRA DOS SANTOS Supervisora Período Letivo 2017.1 Niterói, RJ - Julho de 2017
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
agradecimentos Em primeiro lugar, gostaria de agradecer ao professor Vinicius Netto por ter concordado em ser o meu orientador mesmo dois períodos antes da realização deste TCC, assim como por ter apoiado a escolha do meu tema e por apresentar, durante todo este período, conceitos e teóricos que foram imprescindíveis para a estruturação deste trabalho. A toda minha família, em especial, à minha mãe, Mariza, que me apoiou durante todo esse processo e também foi a minha companheira em todas as visitas de campo realizadas. E também a minha irmã, Luiza, revisora oficial deste TCC, que me deu todo o suporte para conceber a parte escrita deste trabalho, e ao meu pai, Ricardo, por todo o apoio e carinho dado. Ao meu namorado, Antoine, por toda atenção durante este período. Mais do que isso, por ter me acompanhado em diversas horas de estudo e também disponibilizado vários dos registros fotográficos presentes neste trabalho. Merci! Gostaria de agradecer também a todos os meus amigos que me ajudaram durante este período com mensagens de apoio. Em especial, Othávio, Tiago, Fernanda e Janine, que disponibilizaram parte do seu tempo para me ajudar a tornar este trabalho real. Assim como Jefferson e Renan, meus parceiros de TCC, que acompanharam e vivenciaram comigo toda esta etapa. Por fim, gostaria de agradecer a todos que me ajudaram e me apoiaram de alguma forma durante esta fase da minha vida.
Muito obrigada.
APRESENTAÇÃO
Fashion is not something that exists in dresses only. Fashion is in the sky, in the street. Fashion has to do with the ideas, the way we live, what is happening — Coco Chanel.
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
RESUMO Este trabalho final de conclusão de curso tem como objetivo estudar os conceitos relacionados à indústria criativa e os seus impactos no desenvolvimento econômico e urbano das cidades. Para analisar essas questões dentro do contexto brasileiro, foi escolhido o bairro de São Cristóvão na cidade do Rio de Janeiro, onde foi identificada uma ocupação crescente desse setor, em especial, do segmento da moda. Por fim, o trabalho propõe um cenário no bairro de estudo que estimule a ocupação de espaços vazios ou subutilizados através de iniciativas voltadas ao meio criativo.
Palavras-chave: indústria criativa, desenvolvimento urbano, São Cristóvão, indústria da moda.
abstract This concluding coursework aims to study the concepts linked to the creative industry and its impact on the economic and urban development of cities. To analyse these issues within the Brazilian context, the São Cristóvão neighbourhood of the city of Rio de Janeiro was chosen, as it is characterised by a fast-growing creative sector, especially the fashion segment. Finally, this paper suggests a scenario for the neighbourhood under study where the occupation of empty or underused spaces is stimulated through cultural initiatives.
Keywords: creative industries, urban development, São Cristóvão, fashion industry.
APRESENTAÇÃO
LISTA DE siglas
ABIT – Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção AEIU – Área de Especial Interesse Urbanístico CEPAC – Certificados de Potencial Adicional de Construção DCMS – Departamento de Cultura, Mídia e Esportes DUR – Divisão Técnica de Urbanismo e Planejamento Regional FIRJAN – Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IPP – Instituto Pereira Passos MinC – Ministério da Cultura PCRJ – Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro PEU – Projetos de Estruturação Urbana PIB – Produto Interno Bruto SC – São Cristóvão TJERJ – Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro UNCTAD – Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento UNESCO – Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura VAB – Valor Acrescentado Bruto VLT – Veículo Leve sobre Trilhos ZAC – Zonas de Planejamento Negociado ZCS – Zona Comercial e de Serviços ZIC – Zona de Indústria e Comércio ZR – Zona Residencial ZUM – Zona de Uso Misto
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
SUMÁRIO
Introdução
10
Objeto de estudo
12
Método
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1. Indústria criativa, um agente transformador do meio urbano 1.1 — O processo de inovação no meio de trabalho
15
1.2 — O setor da indústria criativa
17
1.3 — A geografia de escopo e os clusters
23
1.4 — Cidades Criativas: referências urbanas
27
2. São Cristóvão: de bairro Imperial a pós-industrial 2.1 — Recorte histórico: a formação e transformação urbana de São Cristóvão
40
2.2 — Políticas Urbanas: de César a Paes
44
2.3 — Uma análise urbana das interações no bairro
50
3. As possibilidades do cenário criativo em São Cristóvão 3.1 — Os impactos da indústria da moda em São Cristóvão
60
3.2 — Incentivando a criatividade: ocupações alternativas
86
3.3 — Aproximação da área: a identificação de espaços inutilizados
93
Conclusão
109
Referências Bibliográficas
110
INTRODUÇÃO
Evento público da marca de roupas Farm — 20 anos de sol, Rio de Janeiro | Raisa Barros, 2017
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
introdução As grandes transformações urbanas que ocorreram em todo o mundo estão sempre ligadas a alguma inovação nos meios de trabalho. Isso pode ser observado na formação das primeiras cidades industriais durante o século XVIII na Europa, resultado da primeira Revolução Industrial, e no século XX com a introdução do Fordismo como um novo método de produção que transformou as existentes estruturas urbanas, adaptando-as ao uso do automóvel. Tais mudanças no espaço urbano, apesar de inovadoras e agentes de um grande desenvolvimento, não estão isentas de propiciar impactos negativos no meio urbano. Em função disso, produzimos neste último século cidades voltadas ao uso do automóvel, grandes distritos comerciais sem presença de vida urbana e complexos residenciais sem qualquer conexão com o restante da malha urbana. É inegável a relação entre as inovações nos meios de trabalho com o espaço urbano: o primeiro agente desta relação opera como um verdadeiro potencializador do desenvolvimento urbano. Jacobs (1969) aborda esse assunto ao defender que espaços com economias inovadoras possuem a capacidade de se desenvolver e expandir, e os que continuam com a mesma forma de trabalho não conseguem crescer o suficiente e consequentemente, não se desenvolvem. Ela estende essa ideia para a compreensão da formação das cidades, já que nelas o processo de adição de novos métodos de trabalho ocorre de forma vigorosa. Isso torna o desenvolvimento econômico nesses centros urbanos muito mais complexo 10
do que em áreas rurais, definindo, assim, a existência da cidade como necessidade primária para o desenvolvimento econômico.1 Em suma, busca-se, através da inovação, novas formas de desenvolvimento urbano. Atualmente, as chamadas Smart Cities (Cidades Inteligentes) conceituam essa inovação tecnológica para o desenvolvimento de cidades mais integradas, eficientes e sustentáveis. Para isso se tornar possível, grandes investimentos que visam o contínuo desenvolvimento devem ser feitos na área das tecnologias, tendo como consequência a atração de novos benefícios para a cidade. É importante ressaltar que 1 Apesar da organização espacial que hoje chamamos de cidade ser posterior ao estabelecimento de um sistema econômico, ainda é possível estabelecer a cidade como necessidade primária se pensarmos na urbanização como um produto de formação de mercado (Ikeda, 2011). Rudimentarmente, um espaço onde há a reunião de diferentes grupos de pessoas para o ato de troca.
INTRODUÇÃO
o investimento em Smart Cities não se restringe apenas à criação de um sistema de infraestrutura urbana digital e inteligente — o mesmo investimento deve ser feito no setor econômico local. É possível dizer que as Smart Cities são um novo paradigma para o desenvolvimento urbano, mas que esse modelo não é condizente com locais onde a carência de serviços e infraestruturas básicas urgem. Talvez esse conceito seja muito mais tangível em cidades que de fato investem em tecnologia. É importante ressaltar também que o conceito de desenvolvimento urbano não precisa ser único e global. Como já mencionado anteriormente, a forma como o espaço urbano é produzido muda continuamente, e o que é possível relacionar entre os saberes do passado e do presente é a importância do espaço para a inovação em nossas cidades. No contexto nacional, qual indústria permeia a maioria das cidades brasileiras com resultados positivos significativos? Qual setor possui como característica a capacidade de transformação e inovação? Talvez exista mais de uma resposta para essas perguntas. Porém, este trabalho tem como objetivo estudar somente uma — a indústria criativa. O potencial de inovação é enorme e característico desse setor. Diferentemente do setor da tecnologia, a indústria criativa está presente em diversas cidades brasileiras, mesmo que de maneira informal, afirmando a capacidade dessa indústria como principal setor de inovação e vetor do desenvolvimento urbano. 11
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
objeto de estudo A indústria criativa já é internacionalmente reconhecida por seu aspecto transformador tanto no cenário urbano como no econômico. As chamadas “cidades criativas”, como Londres e Berlim, já identificaram a criatividade como fator estratégico para o seu desenvolvimento urbano. No caso do Brasil, o Produto Interno Bruto (PIB) da indústria criativa cresce desde 2007 e, apesar da atual crise econômica federal e estadual, o Rio de Janeiro ainda apresenta a segunda maior contribuição, superado apenas pelo estado de São Paulo.2 Em meio a essa perspectiva, a cidade do Rio de Janeiro apresenta um imenso potencial a ser explorado, especialmente em bairros como o de São Cristóvão, onde já é possível identificar diferentes setores da área criativa. Sobretudo o setor da moda, que apresenta numerosas confecções, fábricas têxtis e suas respectivas sedes situadas no bairro. Porém, apesar da crescente presença desse setor e de diversas condições favoráveis, São Cristóvão ainda não é reconhecido amplamente como um ambiente próspero para a criatividade. Portanto, ao levar em consideração esses apontamentos iniciais, este presente trabalho pretende estudar a relação entre a indústria criativa e o desenvolvimento urbano. Procurando entender as transformações geradas por essa indústria, mas sem a intenção de sua defesa. E tendo o bairro de São Cristóvão como objeto de estudo para a análise dessa relação no contexto brasileiro.
12
2 Cf. SISTEMA FIRJAN. Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil. Disponível em: < http://www. firjan.com.br/EconomiaCriativa/pages/default.aspx>. Acesso em: 16 de maio de 2017.
INTRODUÇÃO
método
Este presente trabalho parte da premissa, adquirida através de uma análise empírica, de que o setor criativo possui a capacidade de transformar a configuração urbana do bairro de São Cristóvão. Então, a partir desse primeiro apontamento, o trabalho busca, por meio de referências bibliográficas, teoria e conceitos nos campos de estudo da economia e do urbanismo que sustentem essa proposição. Após o embasamento teórico, é analisado o contexto urbano e histórico do bairro de estudo, de forma que seja possível entender como o processo de evolução desse local foi feito. Essa etapa possibilita uma maior compreensão das presentes interações do contexto urbano desse bairro. Em seguida, a análise do local de estudo é aprofundada através da produção de mapas e da apresentação de dados que auxiliam na construção de uma resposta às indagações iniciais discutidas no trabalho. Por fim, esse embasamento permite que seja elaborado um cenário futuro, que possibilite a aplicação dos conceitos e teorias estudadas.
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Evento público da marca de roupas Farm — 20 anos de sol, Rio de Janeiro | Raisa Barros, 2017
1.1 | O processo de inovação no meio de trabalho
Indústria criativa, um agente transformador do meio urbano
01
1.1 | O processo de inovação no meio de trabalho
Antes de analisarmos como a indústria criativa pode contribuir no desenvolvimento das cidades, é pertinente compreender como ocorre o processo de inovação no meio de trabalho e quais são os fatores que propiciam este acontecimento.
Determinar o momento inovação é impossível. As inovações não surgem sozinhas — tornam-
se possíveis por meio de processos anteriores que contribuíram para a necessidade ou interesse de um determinado desenvolvimento e que, por fim, resultam em uma inovação. Jacobs (1969) chama este processo de “novo trabalho” que deriva de um “antigo trabalho”.3 A teórica americana exemplifica esse processo com o caso de uma antiga loja de vestidos em Nova York. No exemplo fornecido por Jacobs (1969), os proprietários da loja de roupas não estavam satisfeitos com o caimento de seus vestidos nas clientes. Para resolver essa insatisfação com o resultado final dos seus produtos, a loja lançou o primeiro modelo de sutiã e, assim, passou a dar junto com o vestido essa nova peça de roupa íntima para as suas clientes. Esse é um claro exemplo do processo de inovação sendo resultado de um “antigo trabalho”. Neste caso, a produção de vestidos é o “antigo trabalho”, a insatisfação da loja com o produto final é o motivo para o desenvolvimento de uma nova peça e, por fim, o sutiã é o “novo trabalho”, fruto do processo de inovação da loja. Ainda que o sutiã seja considerado uma peça de vestuário, todo um novo setor de trabalho é gerado a partir dessa peça. Neste caso, surge o setor de peças íntimas. Nem sempre as inovações estão necessariamente vinculadas à mesma categoria do “antigo trabalho” do qual foram originadas. Um exemplo disso são as pesquisas militares realizadas durante a Guerra Fria que desenvolveram a internet — hoje, uma ferramenta de comunicação que vai muito além do setor militar. A compreensão desse processo de inovação é importante, pois a partir dele podemos entender a vitalidade econômica das cidades. Ikeda (2011) explica que, para Jacobs, a melhor forma de avaliar a vitalidade de um sistema econômico não é através da sua eficiência, mas sim por meio da razão entre o “novo trabalho” e o total de trabalho. Essa razão é apresentada pela autora através da fórmula D + A → nD, em que D é a divisão de trabalho original, A é a nova atividade adicionada ao trabalho original e Nd é o resultado do número indeterminado de novas divisões de trabalho.
3 Jane Jacobs, no livro The economy of cities, utiliza dois termos em inglês: old work e new work. Nesta monografia foi feita uma tradução livre desses termos para “antigo trabalho” e “novo trabalho”.
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
FIGURA 01:
Diagrama explicativo da fórmula D + A → nD
Fonte: The economy of cities, 1969, p. 38.
Inovações são o motor de novas divisões de trabalho e consequentemente, do desenvolvimento econômico nas cidades. Nem toda indústria é inovadora, apenas alguns setores do mercado possuem capacidade de inovar e estimulam em seu ambiente a criatividade, e assim conseguem agregar em seu espaço pessoas criativas. A diversidade das indústrias e a sua escala também é outro ponto relevante para a inovação, já que grandes indústrias, em geral, tendem a focar em quantidade e nos seus próprios interesses internos e externos, ao contrário de pequenas e médias empresas, que são detentores de grande potencial de transformação e se beneficiam de uma atividade de troca no seu meio. Esse perfil traçado, propício para a inovação, é compatível com a indústria criativa, caracterizada como “aquelas atividades que têm sua origem na criatividade, habilidade e talento 16
individuais, assim como possuem o potencial de criar emprego e riqueza através da geração e exploração da propriedade intelectual”.4 Esse assunto é abordado no seguinte tópico deste capítulo.
4 BRITISH COUNCIL. A economia criativa: um guia introdutório. Disponível em: <http://creativeconomy.britishcouncil.org/media/ uploads/files/Intro_guide_-_Portuguese.pdf >. Acesso em: 15 de maio de 2017. p. 15. (Série Economia Criativa e Cultural, v.1).
1.2 | O setor da indústria criativa
1.2 |O setor da indústria criativa Criatividade não é o mesmo que inovação. A criatividade é um processo em que ideias são geradas, transformadas e, por fim, são valorizadas. Já a inovação vai além da criatividade: é quando o processo de uma ideia resulta em algo completamente novo. Então, é possível dizer que toda inovação deriva do processo de criatividade, mas nem toda criação é inovadora. Como já dito anteriormente, inovações são importantes para o desenvolvimento das cidades. Nesse meio, a indústria criativa possui como característica a capacidade de criação, uma vantagem para o surgimento de inovações em relação à produção da indústria clássica.
FIGURA 02:
Linha do tempo da evolução na discussão do conceito de indústria criativa O conceito “classe criativa” é popularizado por Richard Florida com a publicação do livro A Ascensão da Classe Criativa
O termo “indústria criativa” é utilizado pela primeira vez no relatório australiano Nação Criativa Criação do Departamento de Cultura, Mídia e Esporte (DCMS) no Reino Unido. O termo “indústria criativa” passa a ser difundido mundialmente
1994
1997
1998
O conceito “cidade criativa” é popularizado com a publicação do livro A cidade criativa por Charles Landry
2001
O Sistema FIRJAN publica o primeiro Mapeamento da indústria criativa no Brasil
2002
O termo “economia criativa” é criado por John Howkins em seu livro The Creative Economy O DCMS faz o primeiro Mapeamento das Indústrias Criativas
Fonte: elaborado pela autora.
2008
2010
2012
O MinC publica o Plano da Secretaria da Economia Criativa As Nações Unidas, através do orgão UNCTAD, publica o Relatório de Economia Criativa
Apesar do imenso potencial da indústria criativa, o surgimento do termo e da teoria sobre esse setor é relativamente recente. O termo “indústria criativa” tem origem na Austrália com o relatório Nação Criativa5 em 1994. O conceito é difundido mundialmente a partir de 1997, através da criação do Departamento de Cultura, Mídia e Esporte (DCMS, em inglês)6 no Reino Unido. Uma das primeiras decisões do DCMS é a elaboração de um grupo de trabalho para estudar a indústria 5 DEPARTMENT OF COMMUNICATIONS AND THE ARTS. Creative nation: Commonwealth cultural policy. Australia, 1994. 6 Department for culture, media & sport.
17
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Setores criativos – a ampliação dos setores culturais
se
to
FIGURA 03:
r
criativos s e se
tores
c ul
turais Fonte: Plano da Secretaria da Economia Criativa, 2012, p. 23 (adaptado pela autora).
criativa no país, o que em 1998 culmina na realização do primeiro Mapeamento das indústrias criativas.7 A difusão do termo indústria criativa e a pesquisa de seus impactos econômicos, socioculturais e territoriais foram avanços importantes, pois, até então, as atividades relacionadas a aspectos culturais e criativos eram tidas como atividades independentes de subsídios estatais e marginalizadas pela economia, apesar do comum incentivo cultural dos governos à cultura e às artes. Pode-se considerar o conceito de indústria criativa como uma ampliação do conceito de indústria cultural. De acordo com a UNESCO, a indústria cultural pode ser caracterizada como o 18
conjunto de serviços que “combinam a criação, produção e comercialização de conteúdos intangíveis e culturais por natureza. Esses conteúdos são tipicamente protegidos por direitos autorais e podem assumir a forma de produtos e serviços” (UNESCO apud UNCTAD, 2012). Tal definição fornece um caráter mais definido e distinto à indústria cultural, já que as indústrias criativas chegam a agregar, dependendo do modelo de categoria, os setores de publicidade, mídias, tecnologia e até esportes. É importante ressaltar que apesar de um certo consenso sobre o conceito da indústria criativa, diversos modelos foram criados nos últimos anos com o objetivo de sistematizar as principais categoriais desse setor. Cada modelo contém um objetivo distinto, o que resulta na estruturação de categorias diferentes dentro desse mesmo setor. A seguir são apresentados, na tabela 1, três modelos diferentes: o modelo das UNCTAD, na esfera internacional; o modelo do Ministério da Cultura, na esfera nacional; e o modelo da FIRJAN, na esfera do comércio e da indústria nacional. 7 DEPARTMENT FOR CULTURE, MEDIA & SPORT. Creative Industries Mapping Document. Reino Unido, 1998.
1.2 | O setor da indústria criativa
TABELA S i s t 01: e m a s dSistemas e c l a sdes classificação i f i c a ç ã o para p a ra aindústria a s i ncriativa dústrias
criativas
1. MODELO UNCTAD
2. MODELO MinC
3. MODELO FIRJAN
Patrimônio
Patrimônio
Consumo
Expressões culturais tradicionais: artesanato, festivais e celebrações Locais culturais: sítios arqueológicos, museus, bibliotecas e exposições
Patrimônio material Patrimônio imaterial Arquivos Museus
Publicidade: atividades de publicidade, marketing, pesquisa de mercado e organização de eventos Arquitetura: design e projeto de edificações, paisagens e ambientes, planejamento e conservação Design: design gráfico, multimídia e de móveis Moda: desenho de roupas, acessórios, calçados e acessórios, modelistas
artes Artes visuais: pinturas, esculturas, fotografia e antiguidades Artes cênicas: música ao vivo, teatro, dança, ópera, circo e teatro de fantoches
e x p r e s s õ e s c u lt u r a i s Artesanato Culturas Populares Culturas Indígenas Culturas Afro-brasileiras Artes Visuais Arte Digital
MÍDIA
artes de espetáculo
Editoras e mídias impressas: livros, imprensa e outras publicações Audiovisuais: filmes, televisão, rádio e demais radiodifusões
Dança Música Circo Teatro
cRIAÇÕES FUNCIONAIS Design: interiores, gráfico, moda, joalheria, brinquedos Novas mídias: software, videogames, conteúdo digital criativo Serviços criativos: arquitetônico, publicidade, cultural e recreativo, pesquisa e desenvolvimento (P&D) criativo, outros serviços criativos digitais
Audiovisual, do Livro, da Leitura e da Literatura Cinema e vídeo Publicações e mídias impressas
Criações Culturais e Funcionais Moda Design Arquitetura
C u lt u r a Expressões Culturais: artesanato, folclore, gastronomia Patrimônio e Artes: serviços culturais, museologia, produção cultural, patrimônio histórico Música: gravação, edição e mixagem de som, criação e interpretação musical Artes Cênicas: atuação, produção e direção de espetáculos teatrais e de dança
MÍDIA Editorial: edição de livros, jornais, revistas e conteúdo digital Audiovisual: desenvolvimento de conteúdo, distribuição, programação e transmissão
Tecnologia
Fonte: elaborado pela autora.
P&D: desenvolvimento experimental e pesquisa em geral, exceto biologia Biotecnologia: bioengenharia, pesquisa em biologia, atividades laboratoriais TIC: desenvolvimento de softwares, sistemas, consultoria em TI e robótica
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
O modelo da UNCTAD antecede os dois outros modelos apresentados e também serve como referência para a elaboração dos posteriores. Nesse modelo há um grande esforço em ampliar o escopo da indústria criativa ao contemplar em suas categorias as questões relacionadas ao patrimônio, novas mídias e tecnologia — algo essencial para a compreensão da real contribuição das atividades criativas e culturais, considerando as atividades econômicas, formas comerciais e avanços tecnológicos que dão vida ao conceito (BRITISH COUNCIL, 2010). O modelo do MinC é estruturado por categorias de natureza tipicamente culturais, ampliando essa característica para serviços de aplicabilidade funcional com uma base cultural, como moda, design e arquitetura. Ao contemplar somente categorias relacionadas à cultura, o Plano da Secretaria da Economia Criativa8 concebe um modelo ultrapassado e relacionado, de forma indireta, ao conceito de indústria cultural. Por não contemplar as categorias vinculadas à tecnologia, às novas mídias e ao marketing, que atualmente são pontos importantes para essa indústria, o plano perde a oportunidade de avançar na discussão de um desenvolvimento econômico, tecnológico, inclusivo e sustentável através da indústria criativa. Por último, o modelo concebido pela FIRJAN sobre o setor tem um forte aspecto comercial em sua categorização. Questões como consumo, mídia e tecnologia aparecem em primeiro plano, enquanto questões de patrimônio e artes ficam sob um mesmo plano, o cultural. Apesar disso, a subcategorias contidas no Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil9 conseguem contemplar diversos setores. Assim, o resultado é um modelo muito mais completo do que o concebido pelo MinC.10 Mesmo com os diferentes modelos, de instituições nacionais e internacionais, de um mesmo conceito, é pertinente a definição pontual da indústria criativa feita pela UNCTAD.
As indústrias criativas: •
20
• • • •
são os ciclos de criação, produção e distribuição de produtos e serviços que utilizam criatividade e capital intelectual como insumos primários; constituem um conjunto de atividades baseadas em conhecimento, focadas, entre outros, nas artes, que potencialmente gerem receitas de vendas e direitos de propriedade intelectual; constituem produtos tangíveis e serviços intelectuais ou artísticos intangíveis com conteúdo criativo, valor econômico e objetivos de mercado; posicionam-se no cruzamento entre os setores artísticos, de serviços e industriais; e constituem um novo setor dinâmico no comércio mundial (UNCTAD, 2012, p.8).
8 MINISTÉRIO DA CULTURA. Plano da Secretaria da Economia Criativa: políticas, diretrizes e ações, 2011 – 2014. Brasília, 2012. 9 SISTEMA FIRJAN. Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil. Rio de Janeiro, 2016. 10 Apesar dos esforços na elaboração de um plano de ação para a indústria criativa, o MinC ainda não realizou nenhum mapeamento deste setor. Enquanto isso, o Sistema FIRJAN tem publicado desde de 2008 o Mapeamento da Indústria Criativa, um estudo que acompanha bianualmente as mudanças desta indústria e contempla as vinte e sete unidades da federação. Por isso, este presente trabalho irá usar como base da indústria criativa no Brasil o estudo da FIRJAN em função da quantidade de dados levantados pela instituição
1.2 | O setor da indústria criativa
Outro conceito relevante para a indústria criativa é a noção de “economia criativa”. Independentemente da classificação ou do modelo utilizado para categorizar a indústria, é possível dizer que ela se encontra nessa esfera econômica, característica do setor, e que nos últimos anos tem se provado resiliente as diversas crises econômicas, tanto em escala global quanto local. O termo “economia criativa” surgiu em 2001 no livro The Creative Economy11 de John Howkins, no qual o pesquisador trata sobre o relacionamento entre criatividade e economia. Para Howkins, “a criatividade não é uma coisa nova e nem a economia o é, mas o que é nova é a natureza e a extensão da relação entre elas e a forma como combinam para criar extraordinário valor e riqueza” (2001 apud UNCTAD, 2012, p.9). A noção de economia criativa é importante, pois de acordo com as avaliações do mercado durante crises econômicas, a indústria criativa tem provado ser uma das mais resilientes a esses eventos. Em 2008, durante a crise econômica mundial, o comércio global apresentou uma queda de 12%. Apesar disso, o comércio mundial de produtos e serviços criativos continuou a crescer apresentando uma taxa de crescimento de 14% de 2002 a 2008.12 No cenário da crise econômica brasileira, a área criativa apresentou a mesma resistência, apresentando um crescimento de 2,56% para 2,64% na sua participação no PIB Brasileiro durante o período de 2013 a 2015.13
GRÁFICO 01:
Participação do PIB Criativo no PIB total Brasileiro — 2004 a 2015
PIB Criativo 2015 estimado: R$ 155,6 bilhões
2,09%
2004
2,26%
2,21%
20 0 5 20 0 6
20 0 7
2,20%
2,37%
2,38%
2,46% 2,49%
2,55%
2,56% 2,62% 2,64%
21
20 0 8 2 0 0 9 2 0 1 0
2011
2012
2013
2014
2 015
Fonte: Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil, 2016, p. 13 (adaptado pela autora).
11 HOWKINS, John. The Creative Economy: How People Make Money from Ideas. Londres, 2001. 12 CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE COMÉRCIO E DESENVOLVIMENTO. Relatório de economia criativa 2010: economia criativa, uma opção de desenvolvimento. Brasília: Secretaria da Economia Criativa/Minc; São Paulo: Itaú Cultural, 2012. 13 Participação estimada com base na massa salarial. Cf. SISTEMA FIRJAN. Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil. Disponível em: < http://www.firjan.com.br/EconomiaCriativa/pages/default.aspx>. Acesso em: 16 de maio de 2017.
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Então, a partir desse cenário econômico, é possível definir a economia criativa como um instrumento vital para o destaque do: papel da criatividade enquanto uma força na vida econômica contemporânea, materializando a proposta de que o desenvolvimento econômico e cultural não caracterizam um fenômeno separado ou não relacionado, mas fazem parte de um processo maior de desenvolvimento sustentável no qual tanto o crescimento econômico quanto o cultural podem ocorrer simultaneamente (UNCTAD, 2012, p.10, grifo nosso).
Para encerrar esta breve conceituação da indústria criativa, é pertinente a compreensão de mais um termo, considerado controverso, referente ao grupo de pessoas que trabalham neste setor, a chamada “classe criativa”. O termo foi popularizado por Richard Florida que defende a relação de benefício mútuo entre o espaço urbano e a classe criativa. Para Florida, atrair membros dessa classe é uma estratégia viável para o desenvolvimento urbano e econômico das cidades. Porém, segundo o teórico, para atrair esse grupo, as cidades devem aplicar políticas urbanas que promovam o que ele chama de “três Ts”: talento, tolerância e tecnologia.14 Essencialmente, o que torna a classe criativa tão convidativa para as cidades é a capacidade dessa classe de atrair pessoas criativas para um mesmo meio urbano. Outra capacidade é a de incentivar pessoas menos criativas a pensarem de forma inventiva em função do ambiente proporcionado, o que torna essas áreas mais propensas a transformações urbanas e inovações (IKEDA, 2011).
22
14 A teoria dos “três Ts” de Richard Florida está alinhada com o pensamento de sua mentora, Jane Jacobs. Ao estipular o talento como um dos “Ts”, Florida estabelece uma visão contemporânea, porém essencialmente similar à de Jacobs, na qual o desenvolvimento econômico e urbano pode ser adquirido através do incentivo de criação e inovação.
1.3 | A geografia de escopo e os clusters
1.3 | A geografia de escopo e os clusters A dinâmica da indústria criativa também é refletida no seu arranjo territorial. É essa organização que influencia de forma direta as interações sociais e espaciais nas cidades. A escolha de um local não é determinada somente por uma questão legislativa do zoneamento urbano, mas também é influenciada por questões de custos, fluxos e da localização de serviços vinculados a esse setor. Diversos teóricos estudaram tal dinâmica de organização espacial através da relação da economia de escala, clustering e localização. Porém, antes do aprofundamento na discussão desta relação é importante a compreensão dos termos empregados. A “economia de escala” surge a partir do processo de produção em que o custo médio de um produto é diminuído com o aumento da sua produção. Isso se deve à relação inversa entre o aumento da quantidade de produção e a diminuição do preço fixo por unidade, de forma que o custo inicial de uma produção consegue ser dividido por um maior número de produtos.
FIGURA 04:
Economia de escala - diminuição do custo com o aumento da produção
Fonte: elaborado pela autora.
Já o termo clustering é a ação de agrupamento de diferentes objetos que compartilham entre si características em comum, formando assim os chamados clusters. A relação da economia de escala, clustering e localização foi estudada inicialmente por Marshall, que argumentava que o agrupamento de um determinado setor proporcionava retornos de escala a partir desse posicionamento em conjunto (1920 apud FLORIDA, MELLANDER & STOLARICK, 2011). No entanto, Jacobs, em uma proposta mais abrangente, defendia a ideia de que as cidades são formadas por uma concentração de diversas atividades que funcionam em complemento ao conceito de escala. Na concepção de Jacobs, as cidades ganham mais com o efeito de troca entre diversos setores do que com a formação de clusters e os seus efeitos de escala (1969 apud FLORIDA et al. 2011).
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
FIGURA 05:
Diagrama conceitual do efeito de clustering
Fonte: elaborado pela autora.
Então, é possível distinguir duas correntes sobre esta relação de geografia econômica: na primeira corrente, seguida por Marshall e outros, os impactos gerados sobre o espaço surgem a partir de externalidades positivas ou por efeitos indiretos das indústrias e da sua localidade. E na segunda corrente, seguida por Jacobs e seus sucessores, os impactos de urbanização refletem no surgimento de externalidades positivas através da relação de proximidade de uma indústria diversificada (FLORIDA et al. 2011). Florida et al. (2011), ao estudar a indústria do entretenimento nos Estados Unidos, argumenta a respeito de um terceiro conceito, fruto desta relação entre a indústria e a geografia econômica, 24
que ele chama de “geografia de escopo”. O conceito deriva do termo econômico “economia de escopo”, e é associado com a questão geográfica no espaço urbano. “Economia de escopo” se refere à relação de eficiência e custo de produção na qual uma indústria que produz diversos produtos simultaneamente é mais eficiente e tem menos custos do que um conjunto de indústrias menores e com uma produção especializada. Já a geografia de escopo analisa a relação espacial de diferentes atividades, que em função da sua proximidade, se beneficiam do ato de troca dos seus serviços. Por fim, essa relação pode ocasionar, em uma determinada escala, impactos positivos ao meio urbano e gerar um aumento de eficiência e de qualidade na produção dessas atividades. Nesse sentido, a geografia de escopo opera em conjunto com a economia de escala. Isso porque, quanto maior a escala de diferentes atividades operando em conjunto, maior é a troca desses atores, o que proporciona uma rede de informações e oportunidades.
1.3 | A geografia de escopo e os clusters
FIGURA 06:
Economia de escopo - diminuição do custo através da diversificação
Fonte: elaborado pela autora.
Como a escala é um elemento determinante, a geografia de escopo só ocorre em áreas urbanas que tenham a capacidade de agrupar pessoas de diferentes capacitações, meios de produção e serviços variados, e de disponibilizar políticas facilitadoras a inovação. É através desse meio urbano e também junto aos espaços individuais de cada indústria que é possível criar um ambiente onde há uma produção de produtos novos e diferenciados. Essa rede de troca estabelecida pela geografia de escopo também possibilita a redução de custos, e amortece possíveis riscos para indivíduos e estabelecimentos que possuem essa característica individualizada e inovadora (FLORIDA et al. 2011). Esse cenário proporcionado pela geografia de escopo é particularmente relevante para a atuação da indústria criativa. Nesse setor, muito da produção realizada possui um resultado incerto ou desconhecido por sua característica criativa e experimental. Além disso, a sua produção geralmente é voltada a projetos de curto e médio prazo, devido ao fato da indústria criativa estar sempre e se modificando e renovando. Outro ponto importante para a indústria criativa é o agrupamento ou clustering, comum entre esse setor. O clustering pode ocorrer em uma área urbana junto à geografia de escopo, já que o último está organizado espacialmente em uma escala maior. Como já mencionado, Marshall estudava tal relação de agrupamento e a associava à economia de escala ao concluir que a proximidade de uma mesma categoria industrial proporcionava uma redução de custos a todo setor. Teorias mais recentes debatem a respeito do surgimento de benefícios que vão além da questão de custos. Porter (2000 apud FLORIDA et al. 2011) argumenta sobre as vantagens dos clusters por proporcionarem uma rede de networking, fornecedores, mercado e conhecimento de uma mesma categoria, de forma que diferentes firmas possam aproveitar das mesmas conexões.
25
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Essas vantagens são vitais para a interação de alguns setores. Currid (2007 apud FLORIDA et al. 2011) destaca como exemplo as indústrias da moda, arte e música, que funcionam através da promoção de atividades em conjunto com os seus concorrentes por meio de eventos como desfiles de moda, festivais de música, eventos de arte, entre outros. É nesses espaços de integração que as pessoas desses setores interagem, trocam informações e têm a oportunidade desenvolver novas ideias e conceitos. A geografia de escopo e o clustering são duas das diversas formas que atividades e serviços se organizam no espaço urbano. Certamente a característica mais vantajosa de ambos é a capacidade de criar uma rede de troca de informações, pessoas e ideias que, por fim, contribuam para o desenvolvimento econômico, social e urbano desses espaços. Diversas cidades já notaram em seu meio urbano essa forma de organização, principalmente através do agrupamento da indústria criativa em áreas urbanas. Esses locais aproveitam essa dinâmica espontânea entre o espaço urbano e a indústria, estimulando políticas de apoio à ascensão desse setor, transformando-as em “cidades criativas”.
26
1.4 | Cidades Criativas: referências urbanas
1.4 | Cidades Criativas: referências urbanas O conceito de “cidade criativa” surgiu no final da década de 1980, mas foi somente introduzido como uma questão relevante na discussão das cidades na década de 1990, principalmente a partir da publicação de A cidade criativa por Charles Landry. O conceito aparece junto ao debate sobre a importância do setor criativo na esfera econômica e social, levando o tema à dimensão urbana. Conceitualmente, a cidade criativa surge a partir da observação dos impactos da economia criativa sob a economia das cidades. Essa economia, como já mencionado anteriormente, apresenta uma abrangência e resiliência muito maior e participativa no contexto econômico do que o esperado. As cidades criativas seguem como uma resposta a tal observação, sendo descritas como “um complexo urbano em que os vários tipos de atividades culturais constituem um componente integral do funcionamento econômico e social da cidade” (UNCTAD, 2012, p.12). Isso estabelece uma mudança de valores, na qual o setor criativo passa a ter um papel central na formação desses locais. A contribuição, no aspecto econômico, deste componente criativo pode ser mensurada através do seu impacto direto na renda e no emprego, e também indiretamente com a contribuição de outros setores, por exemplo, o de turismo. Já no aspecto social, a contribuição do setor criativo está no estimulo à habitabilidade urbana, à coesão social, ao reforço da identidade cultural e à tolerância social. Nesse sentido, as cidades criativas reconhecem, aproveitam e estimulam o seu potencial criativo. Além disso, a utilização desse potencial pode ocorrer de várias formas: pode ser por meio da promoção de atividades culturais a habitantes e visitantes; da divulgação dos patrimônios locais ou até mesmo com a organização de festivais e feiras que contribuam na formação da identidade cultural da cidade. Em alguns casos, a presença das grandes indústrias culturais — entretenimento, moda e design — podem estimular o aumento da presença do setor criativo. Esse estímulo incentiva o crescimento no número de indivíduos como artistas, designers, músicos, entre outros que, por fim, contribui na formação de cidades altamente criativas, como é o caso de Londres e Berlim.
27
Festival Winter Lights, Londres | Antoine Vallas, 2017
1.4 | Cidades Criativas: referências urbanas
No caso da cidade de Londres, diversos fatores a tornam uma cidade altamente cultural e criativa. A capital inglesa conta com a presença de uma indústria criativa sofisticada, diversificada e voltada ao mercado internacional. Tais características garantem uma variedade de atividades criativas tanto em uma esfera local quanto global, podendo estar voltada ao meio comercial ou público. Essa diversificação de atividades é importante por sua capacidade de gerar impactos sociais e urbanos na cidade, seja com o surgimento de subculturas ou ao possibilitar uma atmosfera de excitação e vitalidade (LANDRY, 2001). Em 2014, Londres possuía um total de 795.800 empregos na área criativa, representando 16,3% do total de empregos na cidade. Além disso, a indústria gerou um valor acrescentado bruto15 de £34,6 bilhões em 2012, o correspondente a 47,6% do total arrecadado pela indústria criativa no Reino Unido e a 10,7% do total do VAB de Londres.16
TABELA 02:
VAB total das indústrias criativas em Londres e no Reino Unido, 2012
SETOR DA INDÚSTRIA CRIATIVA
VAB TOTAL DE LONDRES (£m)
VAB TOTAL PARTE DE LONDRES REINO UNIDO NO TOTAL (%) (£m)
Publicidade e Marketing
3.631
6.628
54,8%
Arquitetura
1.349
3.302
40,9%
Arte
159
325
48,9%
Design: produto, gráfico e design de moda
947
2.271
41,7%
Cinema, televisão, video, radio e fotografia
8.633
13.011
66,4%
10.777
30.195
35,7%
5.341
10.616
50,3%
Tecnologia da informação, software e serviços de informática Publicações Museus, galerias e bibliotecas Música, artes cênicas e visuais TOTAL
601
2.214
27,1%
3.163
4.175
75,8%
34.601
72.737
47,6%
Fonte: GLA Economics calculations. The Creative industries in London, 2015, p.7 (adaptado pela autora).
29 Os dados citados acima demonstram a dinâmica econômica que essa indústria gera tanto em Londres como em todo Reino Unido. Essa dinâmica é refletida no espaço urbano através dos agrupamentos e clusters, comuns no setor criativo, desencadeando um processo espontâneo ou incentivado de regeneração urbana e de fomento da economia local. Um exemplo relevante desse processo de regeneração urbana na cidade de Londres é o bairro de Shoreditch. Esse bairro passou por transformações radicais em seu espaço devido ao aparecimento da indústria criativa no local.
15 Valor acrescentado bruto (VAB) é o valor final de uma atividade produtiva durante um determinado período. Este resultado é a diferença entre o valor da produção e o valor do consumo intermédio. 16 Cf. GREATER LONDON AUTHORITY. The creative industries in London. Disponível em: < https://www.london.gov.uk/sites/ default/files/creative-industries-in-london.pdf>. Acesso em: 08 de junho de 2017.
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Localizado no leste de Londres, o bairro de Shoreditch passava por um processo de degradação urbana até o início dos anos 90, devido ao declínio da produção industrial na cidade durante o século passado. O bairro, que era conhecido pela presença da indústria tradicional, em especial a de móveis e têxteis, sofria com o abandono do setor na área, deixando uma grande quantidade de imóveis e terrenos vazios e desocupados. Devido a essa grande oferta de espaços a um preço razoável e à sua proximidade da área central de Londres, Shoreditch passou a ser ocupado a partir dos anos 90 pela população do setor criativo. Principalmente por artistas, que contribuíram nos anos seguintes para a ascensão do bairro e atribuíram um perfil artístico à vizinhança, em especial no cenário da arte urbana. FIGURA 07:
Intervenções artísticas no bairro de Shoreditch, Londres
Fonte: Antoine Vallas, 2017.
Essa nova característica atribuída ao local por uma parte do setor criativo atraiu outras empresas desse mesmo setor, como os ramos de arquitetura, fotografia, publicidade e, acima de tudo, o de design (BRITISH COUNCIL,2010). Esse agrupamento da indústria criativa estimulou o 30
crescimento de comércio e serviços no bairro — bares, restaurantes e boates tornaram Shoreditch um novo local para a vida noturna e para o entretenimento, em especial para a nova geração de jovens adultos. O processo de regeneração urbana possibilitou novos usos e ocupação de espaços antes vazios e degradados, assim como promoveu uma nova dinâmica econômica no local, contribuindo com a geração de empregos e renda. Porém, Shoreditch não ficou ileso dos efeitos negativos dessa regeneração, tendo o processo de gentrificação como a maior consequência em seu ambiente urbano. O novo perfil artístico ligado ao bairro começou a atrair redes de hotéis, empreendimentos residenciais e comerciais de alto padrão que começaram a expulsar os antigos moradores e até o mesmo grupo de artistas e trabalhadores responsáveis pela transformação inicial do bairro. Tal efeito chamou a atenção de estudiosos e autoridades locais, tornando Shoreditch um dos estudos
1.4 | Cidades Criativas: referências urbanas
de caso sobre a gentrificação e o setor criativo mais relevantes da cidade de Londres (ver figura 8).17 O exemplo de Shoreditch está ligado a um processo espontâneo de apropriação de um local pela indústria criativa, no qual não houve um plano ou políticas urbanas que incentivassem diretamente o surgimento e crescimento desse cluster criativo no bairro. Já o próximo estudo de caso a ser analisado neste trabalho — Berlim — teve o emprego de fortes políticas públicas, priorizando o desenvolvimento urbano e econômico através da promoção do setor criativo. FIGURA 08:
A repercussão na mídia britânica sobre o caso de Shoreditch
Recortes de notícias publicadas em sites de notícias do Reino Unido: 1. Kentishtowner: “Shoreditchification: 10 questões que você deve perguntar.” 2. The Telegraph: “Em defesa da Shoreditchification de Londres.” 3. Shout Out UK: “O que é Shoreditchification?”
Fonte: https://www.kentishtowner.co.uk/2014/01/15/shoreditchification-10-questions-really-must-ask/; http://www.telegraph.co.uk/men/thinking-man/10571976/In-defence-of-the-Shoreditchification-of-London.html; https://www.shoutoutuk.org/2014/04/17/what-is-shoreditchification/.
17 O caso de Shoreditch foi tão pesquisado e vinculado por mídias tanto locais quanto internacionais, que posteriormente o processo de gentrificação em outros bairros de Londres foram apelidos de “shoreditchification”. Uma junção do nome do bairro (Shoreditch) e o termo — gentrificação (gentrification, em inglês).
31
Entrada de uma casa noturna, Berlim | Tilman Brembs, Zeitmaschine.org
1.4 | Cidades Criativas: referências urbanas
Apesar de apresentar o mesmo apelo turístico e cultural de cidades como Londres, Paris e Nova York, a cidade de Berlim se diferencia pela sua característica cultural em torno do movimento underground18 e das diversas subculturas existentes no local. Porém, esse aspecto cultural e distinto de Berlim só passou a ser abordado como parte do planejamento estratégico da cidade a partir do ano de 2001, durante o governo do prefeito Klaus Wowereit. Nesse período, fortemente influenciada pelo discurso sobre os conceitos de cidade e economia criativa, especialmente o pregado pelo urbanista Richard Florida, a prefeitura de Berlim passou a adotar medidas que incentivaram a indústria criativa no seu território. Esse destaque de políticas públicas centradas na criatividade foi uma tentativa de capitalizar e incentivar as atividades culturais alternativas da cidade, e também de inserir-se com força na rede global financeira (SELDIN, 2015). Bettina Heinrich (2008 apud SELDIN, 2015), diretora sênior de políticas culturais da Associação de Cidades Alemães, destaca a questão do uso da esfera cultural como ferramenta para o desenvolvimento e a ressalta como uma tendência global: Cidades estão competindo na “liga” regional, nacional, continental ou mundial. [...] Berlim está em algum ponto entre a liga europeia e a liga mundial. Cidades estão competindo para atrair turistas globais, o investimento global e a classe criativa global. Para enfrentar essa competição, as cidades grandes e pequenas investem numa identidade coerente e numa política de imagem. E: a cultura é uma ferramenta importante para serem competidoras bem-sucedidas. Assim, muitas cidades da Europa, e também a cidade de Berlim, alegam ser não só metrópoles, mas “metrópoles culturais” (HEINRICH, 2008 apud SELDIN, 2015, p.102, grifo nosso).
É importante ressaltar que essa nova postura política e estratégica da cidade de Berlim, iniciada a partir dos anos 2000, vai em sentido oposto às políticas aplicadas durante os anos 90. No período anterior, o processo de transformação urbana e de reparação do tecido urbano da cidade era voltado à produção da imagem de uma cidade ordenada e contrária às ocupações e formas alternativas de apropriação no espaço (SELDIN, 2015).19 Além disso, o novo planejamento estratégico não foi implementado só em função dessa nova tendência global em torno do setor criativo. De acordo com Bader & Scharenberg (2009/2013 apud SELDIN, 2015), a indústria criativa em Berlim cresceu mais de 23% entre 2000 e 2005, totalizando 18,5 bilhões de euros, o que demostra o crescimento desse setor e justifica a aplicação de políticas alinhadas com a valorização desse meio. Considerando esses indicativos, o prefeito Klaus Wowereit adotou uma postura em favor do 18 Derivado da palavra underground (subterrâneo, em português), o termo “movimento underground” ou “cultura underground” designa a produção e ambiente cultural fora dos padrões comerciais e vinculados pela mídia. 19 Após a queda do Muro de Berlim em 1989, a cidade passa por um processo de reunificação. Para marcar esse novo estágio da cidade, os planejadores apostaram em um desenvolvimento urbano grandioso, integrado e com um forte apelo estético. Esse novo formato de planejamento urbano acabou gerando a expulsão e remoção de uma parte da população com um estilo de vida alternativo e de minorias nas áreas mais centrais e turísticas de Berlim.
33
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
cenário mais boêmio e artístico de Berlim a partir do apoio a novas empresas startup, ao aumento do financiamento para as artes, à facilitação da entrada e concessão de vistos para artistas estrangeiros e à provisão de espaços urbanos que atendessem as indústrias criativas, encorajando a ocupação dos mesmos em locais e espaços degradados. De acordo com Novy & Colomb (2013 apud SELDIN, 2015, p. 103) “essas medidas faziam parte de um plano maior, de dez anos, que vislumbrava o desenvolvimento de uma “meca para a classe criativa”, de uma cidade de designers, que levariam suas ideias às grandes corporações mundiais”. Essas políticas empregadas alcançaram o seu auge entre o ano de 2005 e 2008, sendo que em 2006, Berlim se torna a primeira cidade europeia a entrar na Rede de Cidades Criativas da UNESCO, tendo o design como o seu campo de especialidade.20 No ano seguinte, uma pesquisa sobre as indústrias criativas foi realizada. Essa pesquisa, que incluía o desenvolvimento de software, arquitetura e telecomunicações, mostrava que o setor criativo tinha obtido um faturamento de 119 bilhões de euros — o correspondente a 18% do PIB da cidade. Além disso, o setor havia empregado 168 mil profissionais naquele mesmo ano (SELDIN, 2015). Outro ponto importante para a compreensão do desenvolvimento de Berlim é a transição que ocorreu nesse período do “planejamento cultural estratégico” para o “planejamento criativo estratégico”. Essa transição é extremamente relevante, pois permite a ampliação dos objetivos principais desse planejamento, assim como possibilita a inclusão em seu plano atividades de locais criativos e culturais característicos de Berlim, como os espaços subculturais. Bader & Scharenberg (2009/2013 apud SELDIN, 2015, p. 107, grifo nosso) explicam a importância desses espaços para o desenvolvimento econômico criativo e para a formação da identidade berlinense:
34
a cena alternativa berlinense tem sido de imensa importância para o desenvolvimento da economia criativa local, principalmente da indústria da música eletrônica, que é extremamente dependente da acumulação de “capital subcultural” em uma cidade. Em outras palavras, ela depende da presença de uma cultura subversiva, que diverge da corrente principal, porém exercendo uma função de distinção social, particularmente entre os jovens. Neste sentido, artistas marginalizados, squats21, bares e clubes noturnos ilegais são importantes lugares para a experimentação, o encontro, a troca de informações e ideias e o estabelecimento de redes entre os profissionais criativos.
A atuação da cena alternativa tem impacto direto nas formas de apropriação do espaço urbano da cidade. A prática dos chamados squats culturais — ocupações que abrigam galerias, cafés e 20 Criado em 2004 pela UNESCO, a Rede de Cidades Criativas tem como objetivo cooperar em uma rede internacional com diferentes cidades que escolheram a área criativa como ponto estratégico para o desenvolvimento urbano sustentável. Atualmente, 116 cidades fazem parte desta rede, sendo que cada uma delas deve se especializar em pelo menos um desses sete campos criativos: artesanato e folclore, mídia, cinema, design, gastronomia, literatura e música. 21 O termo em inglês “squat” também é utilizado na Alemanha para denominar uma ocupação habitacional e/ou cultural de um imóvel abandonado ou ameaçado. Essas ocupações são geralmente realizadas por pessoas que não possuem a propriedade legal da terra, e também possuem um aspecto reivindicador na forma da sua ocupação, às vezes pelo o direito à moradia ou de resistência ao sistema capitalista (SELDIN, 2015).
1.4 | Cidades Criativas: referências urbanas
exposições — passam a ser percebidas de forma positiva pelo poder público, assim como o uso de pátios internos públicos para atividades criativas e culturais. FIGURA 09:
Squat cultural em uma antiga fábrica têxtil no bairro de Mitte, Berlim
Fonte: Da capital de cultura à cidade criativa: resistência inspiração de Berlim, 2015, p. 107.
Outra prática urbana que passa ser estimulada é a do uso temporário de áreas urbanas. São locais que recebem provisoriamente mercados de pulgas, brechós, bares, cafés e “praias urbanas” — espaços onde são montadas áreas de banho de sol durante o verão. FIGURA 10:
Uso temporário: “praia urbana” e mercado de pulgas do Mauerpark, Berlim 35
Fonte: Da capital de cultura à cidade criativa: resistências a paradigmas urbanos sob a inspiração de Berlim, 2015, p. 108 e 109.
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
É importante ressaltar que a presença de espaços degradados e inutilizados e de vazios urbanos em Berlim são essenciais para a ocupação do setor criativo local. Muitos desses espaços são resultado dos processos de desindustrialização ou da queda do muro, o que resultou na exposição de áreas e brechas consideradas antes como “faixa da morte” ou “terra de ninguém” (SELDIN,2015). A ocupação desses espaços em Berlim pela indústria criativa e também pela prática da cultura alternativa obteve sucesso ao desenvolver urbanisticamente esses lugares através de ações inovadoras e eficientes, assim como ajudou a contribuir na valorização desses locais, que, por fim, não escaparam do processo de gentrificação. Os estudos de caso de Londres e Berlim são importantes para exemplificar o processo de ocupação da indústria criativa no espaço urbano. Esses presentes casos apresentam alguns aspectos similares, como a força do setor criativo no cenário econômico dessas cidades e a sua contribuição direta no processo de desenvolvimento urbano de áreas degradas e desocupadas. Porém, é possível identificar características individuais de cada caso, como a importância da cultura alternativa na formação do cenário urbano criativo de Berlim e o processo espontâneo de agrupamento do setor criativo no bairro londrino de Shoreditch. Também é importante ressaltar que, por mais que essas ações da indústria criativa contribuam na valorização desses locais, eles não estão isentos de efeitos negativos. O efeito de gentrificação nessas áreas pode contribuir para a expulsão dos habitantes locais, assim como para a expulsão do próprio setor criativo, responsável pela valorização inicial desses lugares. No próximo capítulo, será aprofundada a análise urbana do bairro de São Cristóvão. Um bairro de baixa densidade, com diversas rupturas urbanas — devido às transformações realizadas em seu território, e com um passado recente de desindustrialização. Tais características são, como já mencionamos neste capítulo, pontos positivos para a implantação da indústria criativa, principalmente se considerarmos o contexto da cidade do Rio de Janeiro. 36
Centro Municipal Luiz Gonzaga de Tradiçþes Nordestinas, Rio de Janeiro | Raisa Barros, 2016
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
São Cristóvão: de bairro Imperial a pós-industrial
02 MAPA 01:
O bairro Imperial de São Cristóvão, popularmente conhecido como São Cristóvão, está situado na Zona Norte do Rio de Janeiro. O seu limite vai até os bairros de Santo Cristo, Praça da Bandeira, Maracanã, Mangueira, Benfica, Vasco da Gama e Caju, totalizando uma área de 410,56 ha (IBGE, 2003).
Mapa dos limites de São Cristóvão e bairros vizinhos N
MANGUINHOS
CA JU
BENFICA
VASCO DA GA M A
ROCHA
38
S A NT O CR I S T O
SÃO M ANGUEIRA FRANCISCO XAVIER P R A ÇA DA BA ND E I R A
M AR A CA NÃ VIL A ISABEL
CI DA D E NOVA
E S TÁ CI O T I JU CA
Fonte: elaborado pela autora.
A população do bairro é de 26.510 habitantes (IBGE, 2010), um valor superior a todos os bairros limites. Apesar disso, a sua densidade é de apenas 64,57 (hab./ha). Podemos justificar essa baixa densidade devido, em parte, à sua extensa área e a uma característica reconhecida do bairro, que é a forte presença do setor industrial e de serviços no local.
TABELA 03:
Dados demográficos de São Cristóvão e bairros vizinhos
São cristóvão e bairros vizinhos
população ibge 2010 (hab)
área territorial ibge 2003 (ha)
densidade populacional (hab/ha)
Benfica
25.081
173,64
144,44
Caju
20.477
534,75
38,29
Mangueira
17.835
79,81
223,47
Maracanã
25.256
166,73
151,48
8.662
71,99
120,32
Santo Cristo
12.330
168,47
73,19
Vasco da Gama
15.482
86,31
179,38
São Cristóvão
26.510
410,56
64,57
Praça da Bandeira
Fonte: IBGE, 2010 (adaptado pela autora).
Apesar da atual configuração urbana, o bairro Imperial de São Cristóvão já foi marcado por diversas mudanças em seu espaço. As dinâmicas sociais e econômicas da adjacência foram impactadas por distintas decisões políticas e urbanas ao longo das décadas que mudaram não só o cenário urbano do bairro como de toda a cidade do Rio de Janeiro.
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
2.1 | Recorte histórico: a formação e transformação urbana de São Cristóvão Século XVI – XVII: Após o descobrimento do Brasil, em 1500, a região da cidade do Rio de Janeiro foi inicialmente identificada como um aldeamento dos índios Tamoios. Em 1565, após um breve período de batalha para reconquistar o território tomado pelos franceses, Estácio de Sá funda a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. No último quarto do século a cidade é colonizada com a forte presença de jesuítas, ordem religiosa que recebeu uma das sesmarias. Comandados pela Companhia de Jesus, três grandes engenhos são formados na área. Um deles é a fazenda de São Cristóvão, onde é construída na praia, em 1627, a capela de São Cristóvão, que posteriormente foi substituída pela Paróquia de São Cristóvão. Os jesuítas também estabelecem um espaço público destinado a trocas, onde atualmente se situa o Campo de São Cristóvão.
Século XVIII - XIX: Em 1759, os bens dos jesuítas são confiscados pela Coroa Portuguesa, que os vende progressivamente. As fazendas passam a ser divididas em chácaras e sítios, com uma ocupação mais efetiva, com limites e propriedades definidos. Em 1808, a Família Real chega ao Brasil. A propriedade do Paço de São Cristóvão é doada para Dom João VI, e o imóvel passa a ser a Residência Real. Essa mudança estimula melhorias de infraestrutura na região de São Cristóvão, que se estabelece como o bairro da aristocracia do Rio de Janeiro. 40
São realizadas intervenções no bairro durante esse período, como a pavimentação das ruas, a erradicação de pântanos, aterramentos e a instalação de iluminação pública. No ano de 1862, ocorre a instalação de serviços sanitários, tornando São Cristóvão o primeiro bairro na cidade a receber esse tipo de infraestrutura. Grandes obras de arquitetura também foram feitas, como a expansão e o projeto paisagístico da Quinta de Boa Vista22, o Solar da Marquesa de Santos e a primeira fábrica da região, a Fábrica de Velas Luz Steárica.
22 No período do Segundo Reinado, a Quinta da Boa Vista passou por uma grande reforma geral e intervenção paisagística. O parque situado ao redor da Residência Real não tinha um projeto paisagístico condizente com a condição da família real. Para atender a essa demanda, o paisagista francês Auguste François Marie Glaziou foi encarregado de transformar o entorno do Palácio de São Cristóvão. O paisagista planejou e executou intervenções que dispuseram o aspecto geral do parque com uma produção paisagística do estilo romântico.
2.1 | Recorte histórico: a formação e transformação urbana de São Cristóvão
FIGURA 11:
Quinta da Boa Vista e o Solar da Marquesa de Santos
Fonte: http://www.rio.com/places/primeiro-reinado-museum.
A ocupação do solo na região é intensificada com a inauguração da linha férrea de São Cristóvão no ano de 1870. Assim, o traçado urbano do bairro é alterado e as chácaras e fazendas existentes são retalhadas para a abertura de novas ruas e lotes. Além disso, com o aumento da atividade econômica na cidade, a instalação da indústria na região começa a ocorrer de forma espontânea, influenciando a chegada de pequenos grupos proletariados, dando início a uma transformação na dinâmica social no bairro. O Período Imperial chega ao fim em 1889 e, nas décadas seguintes, a crise cafeeira muda a condição política e econômica do país. Na cidade do Rio de Janeiro, se intensifica a implantação da indústria, principalmente a da indústria têxtil. Nesse período, apenas três indústrias desse setor estavam localizadas em uma área urbana na cidade, sendo que duas delas, a Fábrica de Tecidos São Lázaro e a Fábrica Santa Rita, se situavam no bairro de São Cristóvão.
Século XX: 41 Na virada do século, entre os anos de 1890 e 1906, a população em São Cristóvão dobrou, chegando a 45.000 habitantes. Para adequar a cidade às novas demandas urbanas, o prefeito Pereira Passos empreendeu uma grande reforma urbanística, visando o saneamento e o embelezamento da cidade dentro dos moldes franceses. Na época, São Cristóvão foi um dos bairros mais afetados pela reforma urbanística de Pereira Passos. A sua proximidade ao centro da cidade e a estrutura existente de meios de transporte e abastecimento de água no local contribuíram para essa decisão. Uma das principais obras dessa gestão foi a revitalização do Campo de São Cristóvão, que ainda é um forte ponto nodal no bairro, apesar das diversas mudanças feitas nesse espaço.
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
As décadas seguintes consagram São Cristóvão como bairro industrial. O uso de solo foi transformado, e o uso residencial que era predominante passa a ser de uso industrial, em função da proximidade do bairro aos eixos ferroviários, ao Centro e ao Porto da cidade. Esses eventos mudaram o perfil da vizinhança de forma permanente: assim, São Cristóvão perde o seu status perante a configuração da cidade e inicia-se um processo de declínio da sua estrutura urbana. Na década de 30, a indústria no bairro sofre um processo de aceleração devido ao Estado Novo e chega ao seu auge. O decreto-lei 6000/37, denominado Código de Obras, é formalizado e consolida o zoneamento da cidade. Na região de São Cristóvão, mais áreas de uso industrial são configuradas, formando, assim, a primeira zona industrial da cidade. Nos anos seguintes, os processos de urbanização e de desenvolvimento da indústria avançam, afirmando a classe operária e imigrante como parte da população no bairro. Entretanto, com o aumento de mão de obra na região, o número de moradias informais é crescente. O resultado disso é uma ocupação gradativa dos morros da área. Em 1946 é inaugurada a Avenida Brasil, via que causa um impacto intenso na região. As indústrias de grande porte começam a se mudar para áreas mais distantes devido à valorização do terreno e as indústrias de pequeno e médio porte, especialmente a do setor têxtil, se consolidam. A partir disso, o bairro é marcado pela ocupação mista do solo, com o aumento do número de locais de comércio e serviços. No ano de 1957, o projeto do Pavilhão de São Cristóvão é iniciado. Destinado a eventos e exposições, esse espaço permaneceria ativo até a inauguração do Riocentro.
FIGURA 12:
Pavilhão de São Cristóvão
42
Fonte: http://www.archdaily.com.br/br/765444/classicos-da-arquitetura-pavilhao-de-sao-cristovao-sergio-bernardes.
Nas décadas seguintes, o pavilhão entra em um estado de abandono pelo Estado e somente em 2003 o espaço volta à ativa, com a permanência da Feira Nordestina no local. Através do Decreto 322/76, é estabelecida a Zona de Indústria e Comércio (ZIC) no bairro de São Cristóvão. Essa decisão restringe a ocupação residencial, e o comércio que ocupava somente as ruas principais se espalha por todo bairro. Somente dez anos depois, com a reivindicação de movimentos comunitários, que o governo, a partir do Decreto 5840/86, transforma a ZIC em cinco áreas residenciais e restringe o uso industrial no bairro.
2.1 | Recorte histórico: a formação e transformação urbana de São Cristóvão
O Estado segue nos anos seguintes com medidas de reparação aos impactos causados pela indústria no bairro, estabelecendo condições para o uso e ocupação do solo na área. Porém, com a inauguração da segunda fase da construção da Linha Vermelha em 1992, a região sofre grandes impactos urbanísticos, que contribuem para rupturas existentes em seu tecido urbano e para a desvalorização da paisagem do entorno. FIGURA 13:
Construção da Linha Vermelha
Fonte: https://www.flickr.com/photos/sandra_de_souza/albums/72157626763328719.
43
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
2.2 | Políticas Urbanas: de Cesar a Paes Nos anos 2000, a região de São Cristóvão era portadora de um dos maiores índices de esvaziamento populacional. A continua degradação do bairro devido à desativação de unidades industriais denunciava a necessidade de um plano urbanístico que atendesse à nova ocupação do bairro e que estimulasse a integração do mesmo. Para atender a essa demanda da região, em 2004, durante o governo do prefeito Cesar Maia, é instituído o Projeto de Estruturação Urbana (PEU) da VII região administrativa de São Cristóvão.23 Esse PEU tem como objetivo recuperar o desenvolvimento físico-urbanístico da área, assim como promover a recuperação urbanística dos quatros bairros (São Cristóvão, Mangueira, Benfica e Vasco da Gama) que compõem essa Região Administrativa. Sob a Lei Complementar nº 73 de julho de 2004, é definida a ordenação do território no seguinte artigo: Art. 4º. Esta Lei Complementar define a ordenação do território da VII Região Administrativa mediante: 1. a hierarquização dos logradouros; 2. a indicação de diretrizes para projetos urbanísticos ou ambientais; 3. a definição das Áreas de Especial Interesse; 4. a definição das zonas de uso; e 5. a definição das normas e parâmetros urbanísticos que regularão o parcelamento e a ocupação do solo da área (PCRJ, 2004, p.1).
As diretrizes constituídas no PEU de São Cristóvão estabelecem uma organização no território, antes fragmentado devido aos diversos decretos ao longo das décadas que alteraram o uso e ocupação de diferentes áreas sem uma estruturação única na região. O PEU junto ao Plano Diretor permanece como ferramenta legal estruturadora da região até o ano de 2009, quando é instituída a Lei Complementar nº 101, que modifica o Plano Diretor, instaura 44
a Operação Urbana Consorciada da Região do Porto do Rio e dá outras providências, na qual é incluída em seu plano de intervenção a VII Região Administrativa de São Cristóvão. Também no ano de 2004 foi firmado um programa de cooperação técnica entre as cidades do Rio de Janeiro e de Paris, a Caixa Econômica Federal e o Ministério das Cidades, que a partir dos objetivos e estratégias existentes no PEU estabeleceu um plano de ação integrado para área. Esse plano foi nomeado como Plano de Reabilitação Integrada da Região de São Cristóvão24, que segundo a sua publicação na Coleção Estudos Cariocas introduzia:
23 PREFEITURA DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, Lei Complementar nº 73, de 27 de julho de 2004. Institui o PEU São Cristóvão, Projeto de Estruturação Urbana dos bairros componentes da VII Região Administrativa-São Cristóvão/UEP 05 (São Cristóvão, Mangueira, Benfica e Vasco da Gama), e dá outras providências. Diário Oficial. Rio de Janeiro, RJ, p. 42-60, 30 de julho de 2004. 24 Após o Protocolo de Intenções firmado em 27 de janeiro de 2004, o Grupo de Trabalho do Plano de Reabilitação Integrada de São Cristóvão é criado pelo Decreto nº 25950, de 10 de novembro de 2005 e tem o seu plano aprovado pelo Decreto nº 26.180, de 12 de janeiro de 2006.
2.2 | Políticas Urbanas: de Cesar a Paes
[...] a noção de reabilitação integrada, que alia à proposta de requalificação do espaço urbano, o desenvolvimento econômico e social, a reformulação do sistema viário e dos transportes, a melhoria da qualidade ambiental e a intensificação da produção habitacional como formas de promover o repovoamento da região e impulsionar o desenvolvimento sustentado e a melhoria da qualidade de vida na região (IPP, DUR, PCRJ, 2006, p.3).
Para estabelecer tal plano, um profundo estudo da área foi realizado pelo Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos (IPP), em colaboração com a Divisão Técnica de Urbanismo e Planejamento Regional (DUR) e a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro (PCRJ), o que possibilitou a fomentação de seis linhas de ação paralelas, integradas e coordenadas dentro de metas de curto, médio e longo prazos. As seguintes linhas de ação foram traçadas (IPP, DUR, PCRJ, 2006): 1. 2. 3. 4. 5. 6.
FIGURA 14:
Requalificação do Espaço Urbano; Estímulo à Produção Habitacional; Melhoria da Qualidade Ambiental; Conservação do Patrimônio Cultural; Acessibilidade e Mobilidade; Desenvolvimento Socioeconômico.
Estudo geral dos eixos de atuação do Plano de Reabilitação Integrada
45
Fonte: Plano de Reabilitação Integrada da Região de São Cristóvão, 2006, p.2.
É importante ressaltar que durante a implementação do Plano de Reabilitação Integrada foi presente a participação da comunidade local no processo de planejamento. Também é necessário destacar o reconhecimento pela equipe técnica da importância do bairro de São Cristóvão no
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
desenvolvimento urbano na cidade do Rio de Janeiro, conforme atesta o seguinte parágrafo do plano: [...] todos os ingredientes urbanos existem em São Cristóvão para tornála uma das regiões de maior interesse e mais promissoras da cidade, faltando apenas políticas públicas integradas que funcionem como catalisadoras das potencialidades existentes, justamente o espaço explorado pelo Plano para promover o desenvolvimento sustentado da região (IPP, DUR, PCRJ, 2006, p.1).
Apesar dos esforços de restruturação do bairro de São Cristóvão e dos seus arredores, o Plano de Reabilitação Integrada não conseguiu alcançar as metas aspiradas. As Zonas de Planejamento Negociado (ZACs)25 previstas no plano não chegaram a acontecer devido ao baixo poder de investimento inicial dos governos locais e federal na região. Além disso, o bairro apresentou a maior redução do número de moradores na última década na cidade do Rio de Janeiro. De acordo com o censo do IBGE, no ano de 2000 o número de residentes no bairro que era de 38.309 habitantes. Em 2010, esse número é reduzido para 26.510 habitantes, uma queda de 30,8%.
GRÁFICO 02:
Redução do número de residentes no bairro de São Cristóvão
4 0 . 0 0 0 ( h ab )
38.309
30.000 26.510
20.000 10.000
46
Fonte: IBGE 2000/2010 (adaptado pela autora).
2 00 0
2010
(ano)
Nos anos seguintes, o bairro apresenta drásticas mudanças no valor do seu solo, com o interesse do mercado imobiliário na área. Essas transformações ocorrem devido à grande operação urbana, Porto Maravilha e aos megaeventos, como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016.
25 Sigla em Francês, correspondente a Zones d’Amenagement Conserté (ZAC). As Zonas de Planejamento Negociado tinham como objetivo balancear os custos das obras de infraestrutura com os retornos econômicos previstos pelo mercado, de forma que as obras de requalificação fossem financiadas por parte da valorização adquirida do investimento público.
2.2 | Políticas Urbanas: de Cesar a Paes
FIGURA 15:
Valorização do metro quadrado em São Cristóvão em 2010
Fonte:https://oglobo.globo.com/economia/imoveis/preco-do-metroquadrado-em-sao-cristovao-ja-vale-mais-que-do-recreio-2947889.
A partir do primeiro ano (2009) do mandato do prefeito Eduardo Paes, o plano da Operação Urbana Consorciada Porto Maravilha começa a ser colocado em ação. Seguindo os célebres moldes internacionais de requalificação urbana de áreas centrais e portuárias, como Port Vell em Barcelona e Inner Harbor em Baltimore, a Prefeitura do Rio de Janeiro traça um grandioso plano que repensa o uso e ocupação da região portuária da cidade. A área de intervenção desta operação urbana está inserida nas Regiões Administrativas I, II, III, IV, compreendendo os bairros Saúde, Santo Cristo e Gamboa, e parcialmente os bairros Caju, Centro, Rio Comprido e São Cristóvão. A justificativa para essa intervenção urbana foi a continua degradação da área ao longo dos anos (resultado do abandono pelo próprio poder público), a baixa densidade demográfica e a extensa quantidade de imóveis e terrenos sob o controle do poder público. Motivos que certamente interessaram o setor privado, já que a região também é privilegiada por sua conexão com o restante da cidade. Tal interesse também motivaria o uso de CEPACs26 para financiar o investimento público, alterando, assim, os parâmetros de construção de toda região de acordo com uma logística mercadológica.
26 A Lei Complementar nº 101, de 23 de novembro de 2009 que criou a Operação Urbana Porto Maravilha definiu novos parâmetros de construção, aumentando o potencial construtivo na região. Para obter tal possibilidade de expansão, o investidor deve comprar obrigatoriamente Certificados de Potencial Adicional de Construção (CEPAC). A quantidade de certificados varia de acordo com a área que a construção será implantada e de acordo com o seu uso (residencial ou comercial). O dinheiro arrecadado com a venda dos CEPACs pode ser convertido para investimentos de infraestrutura e serviços públicos municipais.
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
FIGURA 16:
Situação fundiária dos terrenos na área do projeto Porto Maravilha
Fonte: Estudo de Viabilidade Econômica para o Consórcio Mar e Vila.
Por ser um plano muito extenso, que incorpora vários bairros da região, o projeto de intervenção na área foi dividido em diferentes setores. O bairro de São Cristóvão, como já dito anteriormente, tem parte do seu bairro integrado ao projeto Porto Maravilha. Essa região é categorizada pelo plano como “Setor M”. Esse setor é delimitado pela Rua São Cristóvão com a Rua Figueira de Melo e a Rua Francisco Eugênio com a Avenida Francisco Bicalho.
FIGURA 17:
Mapa de setorização por faixas de equivalência dos CEPACs
48
Fonte: Porto Maravilha: a evolução urbana da região portuária e os cinco primeiros anos da operação urbana consorciada, 2015, p. 48.
2.2 | Políticas Urbanas: de Cesar a Paes
Dentro desse setor, destaca-se o terreno do Gasômetro, a área de maior potencial construtivo do plano, o que torna esse espaço de grande interesse para o projeto Porto Maravilha e para o setor privado. Importância que é analisada por Bruno Amadei Machado em O que pode o Gasômetro? Devir e experimentação na Zona Portuária do Rio de Janeiro: [...] o terreno encontra-se em posição privilegiada, na interseção dos principais eixos viários de acesso ao Norte do Estado (por meio da Ponte Rio-Niterói), Zona Norte, Centro e Zona Portuária. [...] os expressivos 120 mil metros quadrados contínuos de solo viabilizam seu parcelamento em lotes menores e em um possível sub-bairro, mas também possibilitam a construção de empreendimentos que exijam grande área útil, como complexos hoteleiros e torres empresariais. [...] o Gasômetro está inserido na Área de Especial Interesse Urbanístico (AEIU) Porto Olímpico, prevista para abrigar edifícios com o maior gabarito da região, de até 50 pavimentos (150 m) (MACHADO, 2013, p. 41-42, grifo nosso).
Tal possibilidade de expansão construtiva e de investimentos impacta diretamente o bairro de São Cristóvão, que apesar de apresentar condições e história similares aos da região da Zona Portuária, não foi considerado como um todo nos estudos de impactos do projeto Porto Maravilha. Consequentemente, no ano seguinte à aprovação do projeto (2010), o jornal O Globo já destacava o aumento do valor do metro quadrado no bairro, que superava os valores de alguns bairros normalmente mais valorizados, como o Recreio (ver figura 15), em uma comprovação da especulação imobiliária no bairro durante este período. De 2006 até o ano passado, São Cristóvão recebeu seis grandes lançamentos imobiliários. A maioria de dois e três quartos, com até 79 metros quadrados, segundo dados da Pesquisa de Inteligência de Mercado da Lopes. O primeiro deles, o Paço Real - parceria da construtora Concal com a RJZ Cyrela - estreou no mercado com o metro quadrado a R$ 2.600. Valorizou 53,8% (O GLOBO, 2010).
Além disso, o projeto Porto Maravilha perde a oportunidade de implantar os serviços e a infraestrutura que São Cristóvão necessita, o que somente dificulta a transição desse bairro ainda característico do uso industrial para um bairro de uso e ocupação mista. Pode-se concluir que, apesar de um grande histórico de alteração das condições urbanas em São Cristóvão, a área ainda não se recuperou das diversas medidas prejudiciais tomadas por diferentes gestões no último século, o que estabelece como referência urbana somente o seu passado como bairro imperial. Assim, chegamos à situação presente estudada por esse trabalho com os seguintes questionamentos: qual é a conjuntura atual do bairro? Quais medidas podem ser feitas para prover o desenvolvimento sustentável que o bairro tanto necessita?
49
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
2.3 | Uma análise urbana das interações no bairro Muito da atual conjuntura do bairro de São Cristóvão remete ao legado dos megaeventos na cidade e dos projetos urbanos implementados durante esse período. Diversas promessas e projetos não foram concluídos ou sequer iniciados. Além disso, as expectativas, especialmente as do mercado imobiliário, não obtiveram o resultado esperado devido, em parte, à recessão econômica do país que começa no ano de 2014 e atinge o seu pior resultado após uma segunda queda expressiva do PIB no ano de 2016.27 O bairro de São Cristóvão não fica isento dessas mudanças no cenário econômico e urbano, embora a prefeitura tenha apresentado, nos anos anteriores, uma grande expectativa com o setor inserido no bairro pelo projeto Porto Maravilha. O maior exemplo dessa euforia anterior foi a compra do terreno do gasômetro, feita pelo próprio município. No entanto, poucos foram os investimentos públicos e privados realizados na área nos anos últimos anos. As expectativas do projeto Porto Maravilha podem ainda não ter se concretizado nesse determinado setor do bairro. Porém, se analisarmos o bairro como um todo, é possível notar agentes transformadores em atuação na região. Esses agentes têm a capacidade de se tornar verdadeiros catalisadores para o desenvolvimento do bairro de São Cristóvão por sua característica inovadora e transformadora. Entretanto, antes de estudar tais influências, é relevante uma breve análise do uso e ocupação do solo na área para a sua compreensão. FIGURA 18:
Delimitação do zoneamento da VII Região Administrativa de São Cristóvão
BENFICA
50
VASCO DA GAMA
Zona Residencial 1 Zona Residencial 2 Zona Residencial 3 Zona de Comércio e Serviço Zona de Uso Misto 1
SÃO CRISTÓVÃO MANGUEIRA
Zona de Uso Misto 2 Zona de Conservação Ambiental
Fonte: http://www2.rio.rj.gov.br/smu/imagens/PEU/ZONEAMENTO_SC.pdf. 27 Cf. PIB do Brasil cai 7,2% em dois anos, pior recessão desde 1948. Valor Econômico. Rio de Janeiro, 07 de março 2017. Disponível em: <http://www.valor.com.br/brasil/4890366/pib-do-brasil-cai-72-em-dois-anos-pior-recessao-desde-1948>. Acesso em: 21 de junho 2017.
2.3 | Uma análise urbana das interações no bairro
Como é possível observar na figura 18, São Cristóvão apresenta um variado zoneamento que permite diferentes usos na região. De acordo com o PEU da Região Administrativa, dez categorias de usos são aceitas, entre elas os usos residencial, comercial, serviços e até industrial de maior porte. Essa variedade de usos possibilita uma diversidade no seu tecido urbano, o que é um fator positivo para o desenvolvimento do bairro. Entretanto, a materialização dessa diversidade ainda não é presente na área. São Cristóvão apresenta inúmeros vazios urbanos, galpões e construções subutilizados ou abandonados, um baixo índice de residências e uma carência por serviços e comércio que atendam à demanda dos moradores. Outro ponto interessante pautado no PEU, através do Artigo 32, é a exceção concebida no zoneamento para permitir o uso industrial em galpões na Zona Residencial II, Zona Comercial e de Serviços e Zona de Uso Misto I. Art. 32. Nos galpões existentes anteriormente à aprovação desta Lei Complementar, situados na Zona Residencial 2 (ZR2-SC) e na Zona Comercial e de Serviços (ZCS-SC), serão admitidos os usos industrial I e II, e, nos galpões existentes anteriormente à aprovação desta Lei Complementar, situados na Zona de Uso Misto 1 (ZUM1-SC), será admitido o uso industrial III [...] (PCRJ, 2004, p.11).
Como já comentado anteriormente, o PEU da VII Região Administrativa é em parte um instrumento de reparação aos impactos causados pela indústria de grande porte na região. Assim, esta ferramenta estabelece em seu zoneamento o privilégio dos usos residencial e de comércio e serviços. Porém, através do artigo 32, é garantida a permanência de pequenas e médias indústrias características dessa região, como a de confecção de roupas e a de peças automobilísticas.
FIGURA 19:
Confecção da marca Enjoy e lojas de peças automobilísticas no bairro 51
Fonte: Raisa Barros, 2017 / https://imagesapt.apontador-assets.com.
Essas indústrias estão inseridas na história do bairro, em especial, a indústria têxtil, que está presente em São Cristóvão desde o final do século XIX. É importante ressaltar que apesar da atual
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
configuração espacial desse setor industrial ser diferente da estabelecida no século XIX, ainda é possível traçar vantagens similares no espaço para a sua permanência. Dentre tais benefícios, é possível citar o baixo custo dos imóveis, a grande oferta de galpões e edificações e a viabilidade para diversos usos industriais e mistos no bairro. Ikeda (2011) defende essa diversidade de usos ao argumentar que se as cidades desejam prosperar e se tornarem espaços “incubadores de ideias”28, elas devem sempre se diversificar, assim como elas também devem flexibilizar o uso do solo de forma que as ações que constituem essa diversificação possam ocorrer. Além disso, talvez o ponto mais vantajoso para a apropriação de São Cristóvão por este setor seja a localização geográfica do bairro e os acessos que o mesmo tem com o restante da cidade e com toda região metropolitana. De acordo com o IPP (2000 apud FREITAS 2003), existem quatro grandes eixos de acessos principais em São Cristóvão que estão conectados a diversos pontos da região metropolitana do Rio de Janeiro e que recebem o fluxo viário oriundo de outros estados. Esses quatro eixos são caracterizados pelos seguintes acessos: Eixo 1: Acesso do Centro da Cidade - Através da Av. Rodrigues Alves (Cais do Porto), tem-se acesso proveniente do centro da cidade, onde se situa o centro de negócios e financeiro, bem como o Aeroporto Santos Dumont para voos domésticos regionais; Eixo 2: Acesso Zona Sul - Através da Av. Francisco Bicalho e Túnel Rebouças é feito o acesso aos bairros mais valorizados da Zona Sul da cidade (Copacabana, Ipanema, Leblon, etc.) e a todas as cidades litorâneas do sul do Estado do Rio de Janeiro e de São Paulo; Eixo 3: Acesso Zona Oeste - Através da Av. Brasil e Linha Vermelha, faz-se o acesso aos bairros das Zonas Oeste e Norte da cidade. Estas vias estão interligadas com a autoestrada Presidente Dutra, que recebe todo o fluxo oriundo de São Paulo e dos outros estados do sul do país. Ainda por este eixo e em conexão com a Rodovia Washington Luiz tem-se acesso às cidades serranas do Estado do Rio de Janeiro e a Belo Horizonte;
52
Eixo 4: Acesso Norte - Através da Ponte Rio-Niterói e da Rodovia BR-101, tem-se o acesso da cidade de Niterói e de todas as cidades litorâneas do Estado do Rio de Janeiro, bem como a ligação com os estados localizados ao norte do país (IPP, 2000 apud FREITAS, 2003, p.73, grifo nosso).
A grande quantidade de acessos presentes nesses eixos demonstra a importância estratégica do bairro de São Cristóvão, se considerarmos todo o sistema viário da cidade do Rio de Janeiro. Além disso, a sua proximidade ao cais do porto e a sua curta distância (quatro quilômetros) até o Centro é um atrativo aos depósitos, transportadoras, comércios atacadistas e indústrias que se localizam no bairro, já que isto possibilita um rápido escoamento de mercadorias e de troca de informações e serviços. 28 Tradução do termo em inglês “incubators of ideas”.
2.3 | Uma análise urbana das interações no bairro
uíz Rodovia Washington L
N
Ilha do Governador
Aeroporto Internacional
Rodovia Pr esidente Du tra
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Sara
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Cidade Universitário
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4 Ponte Rio - Nit eró
Linha B
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Cais do Porto
3 Linha Deodo
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1
São Cristóvão Aeroporto Santos Dumont
Linha 1
Estação de São Cristóvão
Flamengo
53
2 Cristo Redentor Floresta da Tijuca
Pão de Açúcar
Copacabana
Ipanema
São Conrado
Mapa 02: Principais eixos viários da cidade Fonte: elaborado pela autora.
Barra da Tijuca
*Dados:IPP, 2000.
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Mapa 03 | sistema viรกrio do bairro
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VASCO DA GAMA
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Ao analisar a infraestrutura viária presente em São Cristóvão, é possível notar a presença em seu entorno de vias estruturais para cidade, como é o caso da Avenida Brasil, da Ponte Presidente Costa e Silva (mais conhecida como Ponte Rio-Niterói) e da Via Expressa, assim como a presença de vias estruturais passando por dentro do bairro, como é o caso do eixo Linha Vermelha — Avenida Paulo de Frontin, que corta todo o perímetro do bairro, dando acesso da Zona Oeste à Zona Sul da cidade. As vias mencionadas acima influenciam fortemente na circulação de veículos que passam pelo bairro. A presença de veículos de grande porte aumenta no local tanto pela característica conectora dessas vias quanto pela demanda desse tipo de veículo, como caminhões e carretas, pelas indústrias e comércios presentes nos arredores. A localização próxima ao bairro do Terminal Rodoviário Novo Rio também aumenta a presença de ônibus no entorno, potencializando a característica de São Cristóvão como um bairro de passagem. Outros sistemas de transportes se encontram nos limites ou no entorno do bairro, como é o caso da linha ferroviária da Supervia, contendo a Estação de São Cristóvão com integração ao metrô, e o mais recente veículo de transporte adicionado à malha urbana do Rio de Janeiro, o VLT, o que gera um maior fluxo de pessoas nesses locais. É importante ressaltar que a maior parte da infraestrutura viária presente em São Cristóvão ou nos seus arredores provém de grandiosas intervenções urbanas realizadas na cidade do Rio de Janeiro. Tais intervenções causaram grandes impactos e rupturas na malha urbana e na ambiência do bairro. Um exemplo disso é a Rua Bela, que teve uma agressiva intervenção com a construção do viaduto da Linha Vermelha, o que ocasionou danos irreparáveis na ambiência e na imagem do conjunto arquitetônico presentes na rua.
FIGURA 20:
As atuais condições de ambiência urbana na Rua Bela
56
Fonte: Raisa Barros, 2017.
As passadas intervenções urbanas realizadas em São Cristóvão estavam voltadas para uma questão do planejamento urbano da cidade do Rio de Janeiro como um todo, e falham em reparar ou evitar possíveis danos na escala do próprio bairro. Como já comentado anteriormente, os planos de
2.3 | Uma análise urbana das interações no bairro
reparação às rupturas urbanas causadas em São Cristóvão não ocorreram ou não foram concluídos. E apesar dos recentes projetos implementados em parte do bairro, como o projeto Porto Maravilha, ainda não terem alcançado os seus almejados objetivos, as suas diretrizes ainda estão em vigor. Tal conjuntura, portanto, viabiliza possíveis impactos e novas rupturas à malha urbana do bairro em um futuro próximo. Outro ponto importante é que as passadas tentativas de implementação de planos de reabilitação em São Cristóvão, ainda que positivas, falharam ao não identificar as crescentes atividades e economia atuantes no bairro. Caso elas tivessem sido notadas, um modelo de desenvolvimento urbano muito mais alinhado com as afinidades dos interesses locais poderia ser traçado para o local, já que é inegável a existência da correlação entre os processos de urbanização e a economia local. Em última instância, o impacto poderia refletir até mesmo na economia nacional, embora ainda seja debatido academicamente se as cidades são a causa ou consequência do desenvolvimento econômico (IKEDA,2011).29 Nesse sentido, a atividade econômica presente em São Cristóvão apresenta a capacidade de ser utilizada como um instrumento para o desenvolvimento do bairro, principalmente se a atividade analisada sob essa perspectiva for a indústria criativa, com o setor da moda como um forte representante dessa indústria no bairro. Como já mencionado, o incentivo à indústria criativa influencia diretamente no desenvolvimento urbano, o que pode levar à melhoria da infraestrutura urbana, ao aumento no número de residenciais, de trabalho e da economia local. Diversas cidades no âmbito nacional e internacional começam a adotar medidas que estimulam essa indústria, ainda que, ao mesmo tempo, seja importante aplicar instrumentos que possibilitem a restrição da propagação de possíveis impactos negativos, como é o caso do efeito de gentrificação — comum em locais onde a indústria criativa opera em uma grande quantidade. No bairro de São Cristóvão, a indústria da moda está presente em grande número, e nos últimos anos esse setor começou a apresentar uma movimentação cada vez maior, expandindo as suas atividades para além das confecções tradicionalmente situadas na área. O aparecimento de novas iniciativas culturais e criativas tem muito a ver com o desenvolvimento econômico da indústria criativa local. Assim, há condições para que esse setor possa tornar-se um verdadeiro agente transformador da configuração urbana do bairro — assunto tratado no seguinte capítulo.
29 No artigo Economic Development from a Jacobsian Perspective, Sanford Ikeda questiona o debate entre desenvolvimento econômico e a formação da cidade. No texto, Ikeda menciona a corrente de pensamento econômico que acredita que as cidades são essenciais para o crescimento econômico. Isso gera um paradoxo, já que a formação do que hoje chamamos de cidade são posteriores ao processo inicial de desenvolvimento econômico.
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Isométrica do bairro de São Cristóvão | Elaborado pela autora
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
As possibilidades do cenário criativo em São Cristóvão
03
3.1 | Os impactos da indústria da moda em São Cristóvão
De acordo com o jornal O Globo, o bairro de São Cristóvão se consolida como o maior polo de moda da cidade. No ano de 2007, cerca de 300 empresas do ramo têxtil estavam
instaladas no bairro.30 A indústria têxtil está presente no bairro desde o século XIX, o que com o passar das décadas confirmou-se com a presença de confecções de roupas e acessórios no local. Apesar do histórico estabelecimento de fábricas e confecções desse setor no bairro, é só a partir dos anos 2000 que São Cristóvão começa a receber, em grande quantidade, as sedes administrativas dessas empresas — tradicionalmente situadas na zona sul da cidade. Essa mudança é importante, pois estabelece um real interesse de permanência no bairro, já que é na sede onde estão os departamentos mais estratégicos da empresa, como o criativo, o de recursos humanos e o comercial. A relação entre localização, permanência e a categoria industrial é relevante nesse caso. Vernon e Hoover (1959 apud FLORIDA et al. 2011) comentam que, enquanto a produção de produtos padronizados pode ser facilmente dispersada para locais mais baratos, o mesmo pode ser mais improvável em setores criativos. Isso porque, nessa categoria, a produção de produtos diferenciados é constante, e a necessidade de uma rede de troca de informações e de serviços é primordial. Esse ponto é corroborado por diversos relatos de profissionais do ramo em diferentes 60
reportagens do jornal O Globo. Nelas, os especialistas da área ressaltam a tendência de permanência e a importância do funcionamento de uma rede criativa no bairro. — Temos aqui a integração de todas as áreas da empresa. Além disso, circulam pelo bairro profissionais de várias marcas, fornecedores e futuros parceiros — diz Mario Pedro, fundador da Ecletic (O GLOBO, 2014, grifo nosso). — Mudamos de Copacabana para cá em 2006 e, hoje, temos 230 pessoas trabalhando no bairro. Investimos R$ 300 mil na reforma dos imóveis, porque achamos São Cristóvão uma área de fácil localização e próxima às principais vias da cidade — confirma Renato Cohen, diretor comercial da Mercatto (O GLOBO, 2014, grifo nosso). 30 Cf. SÃO CRISTÓVÃO abriga 300 empresas de moda e tem circuito exclusivo. O Globo. Rio de Janeiro, 23 de agosto 2017. Disponível em: < https://oglobo.globo.com/rio/bairros/sao-cristovao-abriga-300-empresas-de-moda-tem-circuitoexclusivo-13694870>. Acesso em: 09 de julho 2017.
3.1 | Os impactos da indústria da moda em São Cristóvão
— A presença de tantas empresas do setor aqui em São Cristóvão ajuda a fortalecê-las, porque elas contratam serviços entre si. A fábrica de roupas está ao lado da fábrica de botões, que é vizinha de uma estamparia. Então, elas se fortalecem fazendo negócios entre si. [...] — diz Ana Paula Gomes, Diretora da agência Aaposta (O GLOBO,2014, grifo nosso).
Esses relatos também fundamentam um ponto importante sobre a questão da configuração espacial desse setor em São Cristóvão, pois, a partir deles, é possível identificar a formação de um cluster, nesse caso, o cluster da moda. Entretanto, o reconhecimento desse agrupamento do setor no local não é suficiente para a compreensão da dinâmica econômica e geográfica estabelecida por esta indústria na área. Como já comentado anteriormente, o setor criativo precisa essencialmente de espaços onde a troca de informações e serviços possa ocorrer de forma fluida e eficiente. Esse é um fator importante para a sua organização espacial e a difere de um arranjo mais comum entre a indústria clássica — que pode se estabelecer de forma mais independente a outros serviços e atividades. Essa característica é identificada, pelo teórico Richard Florida, como parte de um efeito que ele chama de “geografia de escopo”. A ocorrência desse efeito gera impactos positivos, como redução de tempo, de custo e de risco gerados a partir da relação de proximidade de indústrias vinculadas entre si. Assim, há o compartilhamento de serviços, conhecimento e investimentos dentro de uma determinada escala. Então, para analisar a ocorrência da geografia de escopo no bairro de São Cristóvão, a sua atual organização espacial e os seus possíveis impactos, foi realizado um mapeamento das atividades criativas no bairro.31 Esse mapeamento foi concebido sob a ótica do setor da moda, a partir do qual foram selecionados serviços e atividades que estão presentes em grande quantidade no bairro, e que se beneficiam diretamente ou indiretamente da permanência desse setor no local. É importante ressaltar que a realização de um mapeamento desse setor contribui no destaque da indústria criativa, colocando o valor social, econômico e cultural do setor em evidência. 61
31 O mapeamento concebido foi feito através de canais de busca que possuem o cadastro dessas atividades em sua rede, assim como também foi realizado a verificação dessas informações junto com os dados de registro e endereço desses locais.
mapa 04 | atividades setor da moda LEGEN DA : 1 GOMEBE MALHARIA 2 MO NT E R E I S C O N F E C Ç Ã O
10
3 GA Ú C H A C O N F E C Ç Õ E S
11 12 13
4 in d - i n di s t r i p e 5 un c l e k 6 iz o l a
14
VASCO DA GAMA
BENFICA
1
1
7
7 E C LE C T I C
8 1
8 G RUP O S O M A ( S E DE )
5
9 C HIF O N
6
1 0 MA RY ZA I DE 11 E N J OY
2
3
4
MANGUEIRA
12 UN IM I X 13 MA R I A F I L Ó 1 4 D IMP U S 15 Z IMPY 16 ARM A DI L L O 17 RE S E RVA ( S E DE ) 1 8 LAK R E Fonte: elaborado pela autora.
MARAC
17
CAJU
BAÍA DE GUANABARA
15 35
18
21
16 19
34
GRUP O SOMA (FÁBRI C A)
19
C AV END I SH
20
OSKLEN
21
Z I NZ ANE
22
MARI A BONI TA
23
C H AP EAUX C ONF EC Ç ÕES
24
lEELOO
25
C OMP LEXO B
26
MERC ATTO (SED E)
27
V I ÉS 21 C ONF EC Ç ÃO
28
D I A P OSI T I V E C ONF EC Ç ÕES
29
AF GH AN
30
AGAT H A
31
SAC ADA
32
BOT SWANA
33
MALH A
34
C ASA 44
35
20
9
8
CANÃ
22 24 23 25 28 27 26 29 31
30
SANTO CRISTO
32
33
PRAÇA DA BANDEIRA
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
No mapeamento do setor da moda, 33 marcas (incluindo confecções, fábricas e sedes) foram identificadas. Além disso, dois empreendimentos criativos, vinculados a esse setor, foram incluídos. O destaque desse mapa vai para o eixo Rua Bela — Rua General Bruce (ao lado do bairro Vasco da Gama), que dos 35 imóveis apontados, possui 18 no seu entorno. Além disso, em tal região há características distintas na condição dos imóveis e na ambiência de cada rua.
FIGURA 21:
Fonte: Raisa Barros, 2017.
Constraste da ambiência entre a Rua Bela (1) e a Rua General Bruce (2)
1
2
Em toda a sua extensão, a Rua Bela exibe uma ambiência deteriorada. Isso ocorre, em parte, devido à presença do viaduto da Linha Vermelha de grandes trechos completamente murados — o que interfere na interação do comércio com a rua. Além disso, todas as confecções situadas ao longo desse eixo não possuem qualquer interação com o lado externo, assim como apresentam em seus imóveis variados elementos de vigilância e segurança. Apesar da sua proximidade, a Rua General Bruce, situada transversalmente à Rua Bela, possui uma grande discrepância na sua ambiência se comparada à primeira. Nessa rua, a presença de grandes terrenos ocupados por sedes e fábricas é mais aparente. É o caso dos terrenos pertencentes 64
ao Grupo Soma, uma empresa que abriga as marcas de roupa Farm, Animale, A.Brand, FYI, Fábula e Foxton. O grupo ocupa dois grandes imóveis na rua, que juntos totalizam quase 10.000m² — o equivalente ao valor de um quarteirão tradicional.32 Outro aspecto relevante na rua é a frequente remodelação dos antigos galpões e fábricas da área, procedimento que aos poucos está mudando a ambiência da rua.
32 Os valores citados foram aproximados. Medidas realizadas através da ferramenta de medição do Google Earth.
3.1 | Os impactos da indústria da moda em São Cristóvão
FIGURA 22:
Novo uso e remodelação de uma fábrica (1,2) e a fábrica do Grupo Soma (3) 2
Fonte: Raisa Barros, 2017.
1
3
A mesma rua abriga, desde do ano passado (2016), um dos mais recentes empreendimentos criativos do bairro: a Malha. O espaço, que era um antigo galpão, foi completamente remodelado e, hoje, abriga 42 contêineres, na qual diferentes atividades e eventos são organizados, tais como: coworking, oficinas, palestras, aulas etc. FIGURA 23:
O empreendimento criativo - Malha
Fonte: http://cargocollective.com/tavaresduayer/Malha.
65
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Figura 24: Sala de costura na Malha | Fonte: http://cargocollective.com/tavaresduayer/Malha. O interessante desse novo empreendimento é a proposta de abrigar, sob o mesmo espaço, toda a linha de produção do setor da moda — empreendedores, produtores, criadores, fornecedores e consumidores convivem lado a lado. Assim, há a instauração de um ambiente de estímulo à troca de conhecimento e de ideias. A elaboração de espaços que funcionem como pontos de encontro para a troca de informações e fortalecimento de conexões já foi identificado, nesta monografia, como elemento primordial para o funcionamento de setores criativos, pois é a partir desses lugares que novas ideias e inovações 66
surgem — o que contribui para o desenvolvimento dessa indústria. No caso do empreendimento Malha, a sua real contribuição para o avanço desse setor é o seu objetivo de promover a moda sob a ótica da sustentabilidade ambiental e social, através de iniciativas de apoio à produção local independente e ao avanço de novas tecnologia sustentáveis na moda. Essa iniciativa é relevante tanto no contexto bairro, que passa a abrigar mais exemplos desse tipo de empreendimento criativo33, assim como no contexto do próprio setor, que passa por um processo de busca por novas alternativas de produção e consumo. Sobre esse assunto, o sóciofundador da Malha, Herman Bessler, comenta, em entrevista ao site Projeto Draft: 33 Próximo à Malha, na Rua Sá Freire, se encontra a Casa 44: um showroom de móveis e objetos para locação por produções de cinema e propagada. Além disso, o espaço serve como ponto de encontro de arquitetos, decoradores, produtores, diretores de arte etc. Também instalado no bairro, o empreendimento Semente oferece cursos, palestras e espaços de trabalho compartilhado voltados ao setor de design industrial e marcenaria.
3.1 | Os impactos da indústria da moda em São Cristóvão
O ecossistema da moda está construído sobre conceitos como commodities, competição, tendência, sazonalidade, moda descartável e etc. Grande parte do ecossistema ignora noções de sustentabilidade social e ambiental e a importância da colaboração [...]. Acreditamos em comércio justo, sustentabilidade ambiental e social, produção local independente, revolução tecnológica, com investimento em tecidos biológicos, uso de matéria-prima certificada. Queremos construir uma possibilidade para a moda do futuro (PROJETO DRAFT, 2016).34
Portanto, é a partir da disseminação de ideias e propostas, geradas nesses espaços, que um novo rumo no setor da moda começa a ser traçado. Tanto dentro do próprio setor, a partir de parcerias e colaborações entre diferentes empresas, quanto nos serviços que trabalham atendendo às demandas desse ramo. Essa necessidade de atender os novos requisitos do mercado da moda acaba por ocasionar em uma especialização de serviços distintos. Essa tendência é evidenciada nos seguintes mapeamentos realizados na área.
67
34 Cf. A MALHA, no Rio, surge como uma alternativa de futuro para a moda: “o justo é o novo preto”. Projeto Draft, Rio de Janeiro, 04 de julho 2016. Disponível em: < http://projetodraft.com/a-malha-no-rio-surge-como-uma-alternativa-de-futuro-paraa-moda-o-justo-e-o-novo-preto/>. Acesso em: 09 de julho de 2017.
mapa 05 | atividades gráficas
LEGEN DA: 1 g ráf i c a P R O S I N G 2 mA G I C G L O B A L
PRO DU Ç Õ E S G R Á F I C A S 3 G RÁF I C A S B A L M A S E FIL H O S 4 RIQ U E A R T I M P R E S S Ã O D IG ITA L
VASCO DA GAMA
BENFICA 6
7
5 g ráf i c a L A S T R O
5
8
6 MR G R Á F I C A E DE S I G N
9
LT DA
10
7 D RQ G R Á F I C A 8
12
ALS E M ÁQU I N A S E MA T E R I A I S G R Á F I C O
9 D IG IR I O L A B O R A T Ó R I O
FO T O G R Á F I C O DI G I TA L
1
2 3
MANGUEIRA
4
10 O PÇ Ã O L A S E R 11 FO T O S F E R A 12 E D EN S O L U Ç Õ E S
MARAC Fonte: elaborado pela autora.
CAJU
GRÁF I C A & ED I T ORA MI NI ST ER 13
BAÍA DE GUANABARA
15
13
H OLOGRÁF I C A ED I T ORA LTDA 14 BELA GRÁF I C A 15
14
GRÁF I C A NOVA BRASI LEI RA 16
11
GRÁF I C A MM D I GI TAL 17 ALVOLASER SERV I Ç OS 18 D E I MP RESSÃO I MP RENSA DA C I DAD E 19
16
SANTO CRISTO
17
18 19
CANÃ
I MP ERI AL D I GI TAL 20 GRÁF I C AS E SOLUÇ ÕES STUD I O ALFA 21
21 22 20
EC OD I GI TAL RI O 22 24 23
PRAÇA DA BANDEIRA
RI O BP C ARTES GRÁF I C AS 23 SP L SERV I Ç OS GRÁF I C OS 24
mapa 06 | atividades transportadora e logística LEGEN DA : 1 J AD L O G 2 RS M T R A N S P O R T E S 3 FAS T S E RV I C E 8
4 DA TA C E R TA L O G Í S T I C A 5
VASCO DA GAMA
BENFICA
CBEX CB EXPRESS S E RV I Ç O S DE E N T R E GA
S ID E S U L L O G Í S T I C A E 6 T RAN S P O R T E S LT DA
1
3
7 SANGERIO RIO
T RA N S P O R T E S LT DA 4
8 S S E N T R E GA S 2
9 T RA N S P O R TA DO R A M E D
1000 RIO BONITO
10 O RE N S E T R A N S P O R T E S
5
MANGUEIRA
11 EFFI C I E N T E X P R E S S 12 A US T R Á L I A L O G Í S T I C A 13 T RAN S P O R TA DO R A C O N T I N E NTAL 14 LC E X P R E S S B R A S I L 15 A FE N I X T R A N S P O R T E S
MARAC Fonte: elaborado pela autora.
CAJU
9
10
BAÍA DE GUANABARA
11
7
CANÃ
12 13
14
SANTO CRISTO 15 6
PRAÇA DA BANDEIRA
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Nesse estudo, dois serviços foram selecionados: os de gráficas e os de transportadoras e logística. Assim como o setor da moda, ao qual são correlacionadas, essas duas atividades se aproveitam da grande quantidade de galpões e imóveis subutilizados, e da oferta de terrenos a um baixo custo no bairro. No mapeamento das gráficas (ver mapa 5), foi identificado que este serviço é a segunda maior atividade da área, contendo 24 empresas no local, e ficando atrás somente do setor da moda. Apesar de estar próxima a algumas confecções mapeadas, a maior concentração de gráficas se encontra fora do eixo da Rua Bela – Rua General Bruce, que foi identificado como eixo principal da moda no bairro. Além disso, em uma pesquisa sobre as atividades específicas que são realizadas em cada empresa, foi descoberto que muitas delas trabalham com uma produção em grande massa. Essa produção é voltada às indústrias que estão situadas no bairro ou a grandes empresas da cidade do Rio de Janeiro. Entre elas, é possível destacar três gráficas: a Ecodigital, voltada a serviços de estamparia digital e tecidos autocolantes; a Holográfica, com serviços editoriais e de embalagens, e também fornecedora de grandes empresas como a marca de cosméticos L’Oréal; e a Fotosfera, empresa voltada para execução de materiais de merchandising para empresas como Chanel, H.Stern e Nike. A última gráfica citada fica situada na Rua General Bruce, ocupando uma área com cerca de 3.100m², em frente à fábrica do Grupo Soma e próxima ao galpão da Malha.
FIGURA 25:
Exterior e interior da gráfica Fotosfera
72
Fonte: Raisa Barros, 2017 / http://www.fotosfera.com.br/images/examples/equipe.jpg
No mapeamento de transportadoras e logística (ver mapa 6), foram identificadas 15 empresas que atuam em variados serviços como: entrega e coleta de materiais, transporte de cargas, armazenagem, distribuição de material publicitário e logística para empresas. Assim como o serviço das gráficas, as transportadoras situadas no bairro atendem, em sua maioria, empresas de médio e grande porte localizadas no bairro e no resto da cidade. É importante ressaltar que a localização privilegiada de São Cristóvão perante as suas conexões viárias com o restante da cidade
3.1 | Os impactos da indústria da moda em São Cristóvão
é extremamente vantajosa para a implantação desse tipo de serviço no bairro. Na análise mais detalhada, sobre os serviços e os clientes de cada empresa, foi constatada a mesma tendência analisada durante o mapeamento das gráficas: a relação de troca de serviços entre empresas situadas no bairro. Um exemplo disso são as empresas Efficient Express e Fast Service que possuem como clientes, respectivamente, as empresas Fotosfera (gráfica), Farm e Chifon. Nos mapas seguintes, a serem analisados, foram selecionados dois componentes do bairro — cultural e habitacional — que podem se beneficiar de efeitos indiretos proporcionados pela crescente atividade econômica criativa atuante em São Cristóvão.
73
1
mapa 07 | atividades culturais
R I O ZO O
( J A RDIM ZOOLÓGICO D O RIO DE JANEIRO)
VASCO DA GAMA
BENFICA 2
mi
n
MANGUEIRA
qui
1
8 m in
n ta 2
17
min
17
MUS E U N A C I O N A L
16
19 m in
min
3
da
boa
1 0 m in
vis
3
MARAC MU S E U DE A S T R O N O M I A E C IÊ N C I A S A F I N S Fonte: elaborado pela autora.
4
CAJU C ENT RO LUIZ GONZ AGA D E T RAD I Ç ÕES NORD EST I NA S
BAÍA DE GUANABARA
5
min 19
21
19
s ta
SANTO CRISTO
min
min
1 6 m in
4
4
4 m in
C ASA DA MARQUE SA D E SANT OS (M U S E U DA M ODA BR A S I L E I R A )
5
PRAÇA DA BANDEIRA
6
CANÃ MUSEU MI LI TAR CONDE D E LI NH ARE S
mapa 08 | atividades favelas e habitações poPulares 5
VASCO DA GAMA
4
BENFICA 2
1
MANGUEIRA
3
MARAC Fonte: elaborado pela autora.
CAJU
CANÃ
BAÍA DE GUANABARA
SANTO CRISTO L EG EN DA: fav ela d o TUI UT I 1
PRAÇA DA BANDEIRA
fav ela MAREC H AL J ARD I M 2 fav ela d os MI NEI ROS 3 C onj unto Resi d enc i al P ref ei to 4 Mend es d e Moraes (P ed regulh o) TERRENO Uni ão Fabri l Ex portad ora (anti ga fábri c a d o sabão 5 português) - EM P LANEJ AMENTO
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
No mapa cultural foram selecionados seis espaços culturais, entre eles, museus, feira, parque e zoológico, ativos em São Cristóvão. Ao identificar as características desses locais, é possível notar que praticamente todos esses imóveis, com exceção do Centro Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas, são casarões históricos, um resquício da urbanização durante o período imperial. Outro ponto relacionado a essa questão é a proximidade que esses locais possuem entre si. Ao avaliar os trajetos existentes entre cada espaço cultural, foi identificado que o maior caminho percorrido, entre eles, é de 19 minutos a pé — o que aponta uma concentração de atividades culturais dentro do bairro. A análise das atividades culturais é relevante, pois, como já mencionado, a indústria criativa pode ser considerada como uma ampliação da indústria cultural. Nesse sentindo, essas duas indústrias compartilham, em alguns casos, as mesmas demandas, necessidades e objetivos. É possível notar essa integração de atividades em São Cristóvão a partir da organização de eventos culturais que, normalmente, contemplam os setores de moda, cultura e gastronomia. Um exemplo disso é o Circuito Moda Carioca, que realiza eventos voltados a esses três setores, sempre localizados em diferentes espaços no bairro.
FIGURA 26:
78
11º edição do Circuito Moda Carioca
Fonte: http://www.circuitomodacarioca.com.br/index.asp.
O evento, que tem o apoio da Secretaria de Estado da Casa Civil e Desenvolvimento Econômico, já está na sua 11º edição e reúne, em geral, as empresas situadas no bairro. O impacto do evento sobre a integração dessas atividades em São Cristóvão é evidenciado pelo discurso de Francisca Alda, dona da Barraca Chiquita no Centro de Tradições Nordestinas: “É importante integrar os três circuitos. São Cristóvão é forte na moda, na cultura e na gastronomia, e o evento contempla todas essas áreas e ajuda a fortalecer o bairro [...]” (O GLOBO, 2014, grifo nosso).35
35 Cf. SÃO CRISTÓVÃO abriga 300 empresas de moda e tem circuito exclusivo. O Globo. Rio de Janeiro, 23 de agosto 2017. Disponível em: < https://oglobo.globo.com/rio/bairros/sao-cristovao-abriga-300-empresas-de-moda-tem-circuitoexclusivo-13694870>. Acesso em: 09 de julho 2017.
3.1 | Os impactos da indústria da moda em São Cristóvão
O último item a ser mapeado foram as favelas e habitações populares existentes ou em andamento no bairro. Esse mapa foi feito com a intenção de demarcar uma parte da população que poderia se beneficiar — através da oferta de empregos e da melhora da economia local — de um modelo de desenvolvimento urbano, consciente, voltado ao estímulo da indústria criativa. A indústria criativa cresce rapidamente e, como já mencionado, possui uma certa resiliência às crises do mercado. No caso de São Cristóvão, o setor da moda, apesar de ter apresentado uma queda na oferta de empregos — em função da diminuição de consumo durante o período de crise econômica — foi o único do setor de consumo (publicidade, arquitetura, design e moda) que apresentou um aumento da sua base salarial durante o período de 2013 a 2015.36
TABELA 04:
Número de empregados da Indústria Criativa no Brasil, por segmentos
2013
Salários* 2015
-1,8%
R$ 2.442
R$ 2.451
0,4%
851.244
0,1%
R$ 6.493
R$ 6.270
-3,4%
376.275
-1,2%
R$ 5.620
R$ 5.411
-3,7%
112.667
131.717
16,9%
R$ 6.638
R$ 6.276
-5,4%
Arquitetura
124.470
113.499
-8,8%
R$ 8.157
R$ 7.736
-5,2%
Design
86.984
81.863
-5,6%
R$ 3.250
R$ 3.010
-7,4%
Moda
56.676
49.196
-13,2%
R$ 1.663
R$ 1.724
3,7%
2013
Empregos 2015
VAR.%
48.948.433
48.060.807
Indústria Criativa
850.404
Consumo
380.797
Publicidade
Segmento Total mercado de trabalho
VAR.%
*Nota: valores de 2013 a preços de 2015 (deflator: IPCA/IBGE). Fonte: Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil, 2016, p. 14 (adaptado pela autora).
Além disso, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT), o setor já apresenta uma recuperação inicial no ano de 2017. A ABIT aponta que a perspectiva do setor têxtil e de confecção para esse ano prevê a geração de 10.000 novos postos de trabalho.37 Tais indicadores são importantes, pois, através de medidas incentivadoras à profissionalização do setor criativo em São Cristóvão, seria possível que os próprios moradores do bairro passassem a atender às demandas desse ramo.
36 Cf. SISTEMA FIRJAN. Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil. Disponível em: < http://www.firjan.com.br/EconomiaCriativa/ pages/default.aspx>. Acesso em: 12 de julho de 2017. 37 Cf. SETOR têxtil e de confecção aponta sinais positivos para 2017. ABIT Têxtil e Confecção. São Paulo, 26 de janeiro 2017. Disponível em: < http://www.abit.org.br/noticias/setor-textil-e-de-confeccao-aponta-sinais-positivos-para-2017>. Acesso em: 12 de julho 2017.
79
mapa 09 | atividades totais
5
10
11 12 13 8 14
VASCO DA GAMA
4
BENFICA
1
1
7
6
2 1
7
3
5
8
8
1
3
6
5
1
9 10
4 12
2 2
3
1 2
4 3
MANGUEIRA
5 4 3
1
2
MARAC Fonte: elaborado pela autora.
CAJU
15
17
16
9 10 15 35
18 13
14 19 7
34
BAÍA DE GUANABARA
11
21 20
11 12
9
8
13 22 24 23 25
4
28 27 26
14
29 16 31
30
SANTO CRISTO
17
18 21 22
19
CANÃ
20 4
5 32 6
24 23
15
33
L EG ENDA: C ONF EC Ç ÕES
PRAÇA DA BANDEIRA
GRÁF I C AS TRANSP ORTAD ORAS E LOGÍ ST I C A ESPAÇ OS C ULTURAI S EMP REEND I MENT OS C RI ATI VOS H ABI TAÇ ÕES P OP ULARES e fav elas
mapa 10 | atividades totais e zoneamento 5
10
11 12 13 8 14
VASCO DA GAMA
4
BENFICA
1
1
7
6
2 1
7
3
5
8
8
1
3
6
5
1
9 10
4 12
2 2
3
1 2
4 3
MANGUEIRA LEGEN DA | z on a s :
5 4 3
1
2
Z o n a r e s i de n c i a l 1 Z o n a r e s i de n c i a l 2 Z o n a r e s i de n c i a l 3 Z o n a c o m é r c i o e s e rv i ç o Z o n a de u s o m i s t o 1 Z o n a de u s o m i s t o 2 Z o n a de c o n s e rvaç ão a m bi ental Fonte: elaborado pela autora.
MARAC
CAJU
15
17
16
9 10 15 35
18 13
14 19 7
34
BAÍA DE GUANABARA
11
21 20
11 12
9
8
13 22 24 23 25
4
28 27 26
14
29 16 31
30
SANTO CRISTO
17
18 21 22
19
CANÃ
20 4
5 32 6
24 23
15
33
L EG ENDA | p o nto s: C ONF EC Ç ÕES
PRAÇA DA BANDEIRA
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Por fim, os dois últimos mapas contêm todas as informações que foram apontadas, de forma categorizada, nos estudos anteriores. O objetivo deste mapa final é destacar a relação de proximidade e de troca de serviços entre as atividades estudadas, o que, como já citado, é uma característica comum do efeito da geografia de escopo. O motivo pelo qual essas atividades se organizam espacialmente dessa forma é pela formação de uma rede, mesmo que de forma inconsciente, pelos donos dessas atividades, o que possibilita a redução de custos e o amortecimento de possíveis riscos para os estabelecimentos situados na área — como já analisado pelo teórico Richard Florida ao estudar a indústria do entretenimento nos Estados Unidos.38 Além disso, ao analisar a localização dessas atividades junto com o zoneamento do bairro, é possível observar que grande parte desses serviços se encontra na Zona Residencial II. No caso de alguns desses serviços, como as fábricas têxtil, isso só é possível pela exceção prevista no Artigo 3239, que garante a permanência dessas atividades nos galpões existentes nessa zona. Então, é possível concluir que São Cristóvão possui todas as características para se tornar um bairro voltado para o desenvolvimento da indústria criativa. As atividades desse setor são cada vez mais presentes no local, sendo que em algumas áreas já é possível notar o seu impacto na ambiência de algumas ruas. Também é importante ressaltar que apesar das atividades criativas serem cada vez mais proeminentes no bairro, a identificação da localização e o reconhecimento desses lugares ainda são desconhecidos por muitos moradores do bairro e habitantes da cidade do Rio de Janeiro. Isto ajuda na permanência da concepção de um bairro pós-industrial, relegado pelas autoridades públicas. Outra questão importante é o impacto que o setor criativo pode ter no processo de desenvolvimento urbano dos locais onde ele está inserido, como foi o caso das cidades analisadas, Londres e Berlim. Nessas duas cidades, a indústria criativa obteve impactos positivos em áreas relegadas e degradadas, através da inserção da economia criativa no local, o que, consequentemente, 84
atraiu novos estabelecimentos, empregos e comércio. Porém, é importante lembrar que no caso de processos de desenvolvimento urbano mais espontâneos como, por exemplo, o ocorrido no bairro de Shoreditch em Londres, houve impactos negativos, como o efeito de gentrificação, associados ao crescimento do setor criativo no local. Nesse sentido, é importante o reconhecimento das atividades criativas no bairro de São Cristóvão, assim como a aplicação de medidas públicas que estimulem o seu crescimento. Entretanto, essas medidas devem, ao mesmo tempo, fornecer ferramentas paliativas para os possíveis impactos negativos causados pelo interesse financeiro e imobiliário por esse setor, de 38 FLORIDA, R.; MELLANDER C.; STOLARICK K. Geographies of scope: an empirical analysis of entertainment, 1970–2000. Journal of Economic Geography, Oxford University, p. 1-22, 21 de janeiro de 2011. 39 Cf. PREFEITURA DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, Lei Complementar nº 73, de 27 de julho de 2004. Institui o PEU São Cristóvão, Projeto de Estruturação Urbana dos bairros componentes da VII Região Administrativa-São Cristóvão/UEP 05 (São Cristóvão, Mangueira, Benfica e Vasco da Gama), e dá outras providências. Diário Oficial. Rio de Janeiro, RJ, p. 42-60, 30 de julho de 2004.
3.1 | Os impactos da indústria da moda em São Cristóvão
forma que seja garantida a permanência dos moradores do bairro, assim como o funcionamento de iniciativas independentes e experimentais — o que é comum dentro do setor criativo. Então, como opção de intervenção voltada ao estímulo do desenvolvimento desse setor e paralelamente, à melhora da condição urbana no bairro, serão analisadas, nos próximos tópicos, as possíveis alternativas de ocupações criativas no local. Seguindo um modelo similar aos squats berlinenses, essas ocupações teriam o objetivo de incentivar produções independentes do setor criativo, assim como serviriam como espaço educativo e profissionalizante. É importante ressaltar que, os seguintes tópicos, tem o objetivo, somente, de referenciar e identificar no bairro uma possível forma de configuração espacial dessas ocupações criativas, se restringindo somente a uma proposição de um cenário viável para a aplicação dessas ocupações.
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
3.2 | Incentivando a criatividade: ocupações alternativas A prática de ocupação de espaços vazios ou abandonados é comum entre o setor criativo. Porém, apesar desses locais serem, normalmente, populares entre o público em geral, é recorrente em seu processo de ocupação a luta pelo direito da sua permanência. Isso ocorre devido à valorização que esses espaços ganham após a sua ocupação, já que, como mencionado anteriormente, os setores criativos estimulam diretamente a economia local em que se inserem. Tal efeito, consequentemente, atrai a atenção do setor imobiliário e do próprio governo sobre essas áreas. Entretanto, em alguns casos internacionais e nacionais, a indústria criativa conseguiu obter definitivamente ou temporariamente a sua permanência nesses espaços, em geral, devido ao seu caráter de resistência e pelo reconhecimento das atividades criativas e culturais ali exercidas. Então, a partir das experiências analisadas a seguir, é possível traçar um caminho viável para a existência dessas ocupações criativas no bairro de São Cristóvão, assim como as medidas possíveis para garantir a permanência das mesmas.
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Ocupação 01 O squat cultural: Kunsthaus Tacheles
Squat cultural, Kunsthaus Tacheles, Berlim | Luiza Barros, 2011
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
O squat berlinense Kunsthaus Tacheles é uma ocupação que surgiu em 1990, logo após a reunificação da Alemanha. O terreno com cerca de 22 mil metros quadrados e localizado no bairro de Mitte é ocupado por imóvel datado do início do século XX e era, incialmente, uma grande galeria comercial. Após anos de deterioração e abandono do imóvel — inclusive a destruição total de metade do prédio — devido à escassez de recursos do governo socialista, foi anunciada pelo governo (póssocialista) a demolição do imóvel. Porém, a ocupação do mesmo no início dos anos 90 por um coletivo de artistas oriundos de Berlim Oriental fez com que a situação do imóvel ficasse pendente. Nos anos seguintes, o coletivo de artistas cresceu e também passou a integrar em seu grupo pessoas de diferentes nacionalidades. Além disso, o squat cultural passa a também ser residencial, ao ocupar mais dois edifícios adjacentes ao terreno e com cerca de 60 artistas residentes (SELDIN,2015). Em meados dos anos 90, o coletivo do Kunsthaus Tacheles já era reconhecido como referência na cena alternativa no local, sendo que os ateliês, galerias de arte, salas de exposição, cafés e boates inseridos no local eram extremamente populares. Além disso, o movimento de artistas consegue, na mesma década, o reconhecimento do valor histórico do imóvel, assim como a sua ocupação livre até o ano de 1998. Após esse ano o edifício, que era de posse do Estado, é vendido para uma empresa do setor privado. Em seguida à venda é assinado um contrato de aluguel temporário de dez anos, que possibilita a permanência do coletivo de artistas no local. O valor do aluguel firmado foi de uma quantia simbólica de um marco alemão por metro quadrado, que foi convertida em 50 centavos de euro nos anos seguintes. Além disso, o acordo entre as duas partes garantia a recuperação do edifício — o que foi feito no ano de 2000 (SELDIN, 2015). A partir dos anos 2000, o Kunsthaus Tacheles se populariza como um local turístico, o que diversifica ainda mais o perfil do público visitante do local. De acordo com o jornal The Local, o 88
espaço chegou a receber cerca de 400 mil visitantes por cada ano (2014 apud SELDIN, 2015). Porém, após o vencimento do contrato estabelecido com a empresa responsável pelo imóvel, o coletivo desse squat passa por um período de resistência contra um exaustivo processo de despejo. E mesmo com o grande apoio popular o grupo é retirado, progressivamente, do local até meados de 2013. Por fim, apesar da extinção do coletivo Kunsthaus Tacheles, o ato de ocupação permanece como uma característica da cidade de Berlim e dos seus habitantes. Esse aspecto é destacado pela frase do artista Blacco em entrevista pessoal a Claudia Seldin para a sua dissertação Da Capital de cultura à cidade criativa: resistências a paradigmas urbanos sob a inspiração de Berlim: “Não estou preocupado. Quando tiver que ir embora, eu irei. Para onde? Não sei... Aonde a vida me levar, afinal isso aqui é Berlim. Sempre haverá um novo lugar para ir” (SELDIN, 2015, p.143).
3.2 | Incentivando a criatividade: ocupações altern ativas
FIGURA 27: 1
O squat cultural - Kunsthaus Tacheles 2
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1. Empena com grafite icônico junto à frase How long is now (quão longo é o agora, em uma interpretação livre). Fonte: Luiza Barros, 2011. 2. Parte da fachada principal do squat berlinense. Fonte: Luiza Barros, 2011. 3. Cartazes criativos exibidos em Kunsthaus Tacheles. Fonte: Luiza Barros, 2011. 4. Área externa com atividades no squat antes do seu fechamento. Fonte: Claudia Seldin, 2007. 5. Interior do edifício ocupado por artistas. Fonte: Claudia Seldin, 2007.
Ocupação 02 A fábrica Bhering
Instalação artística do artista Marcelo Jácome na fábrica Bhering, Rio de Janeiro | http://www.timeout.com.br/rio-de-janeiro/ arte/features/243/marcelo-jacome
3.2 | Incentivando a criatividade: ocupações altern ativas
A antiga fábrica de chocolate Bhering, localizada no bairro de Santo Cristo, bairro vizinho de São Cristóvão, também teve o seu espaço ocupado pelo setor criativo. A fábrica, que estava desativada desde os anos 90, passou a ter um novo uso e ocupação a partir de 2005. O dono do imóvel se inspirou em casos similares de cidades europeias como Berlim, onde ocorrem ocupações do setor criativo em antigas construções. E, com isso, decidiu alugar diferentes espaços na fábrica para artistas, designers e arquitetos, entre outros, que estivessem interessados em um local para exibir o seu trabalho — o que com o tempo passou a ser amplamente ocupado e reconhecido como um núcleo criativo. Entretanto, no ano de 2012, devido a uma dívida com a União, o imóvel foi vendido em um leilão e foi comprado pela Syn-Brasil por uma quantia de R$ 3,2 milhões (O GLOBO, 2014).40 A empresa pretendia transformar a fábrica em um grande centro cultural e comercial e, logo, deu início ao processo de despejamento dos artistas ali instalados. Porém, após várias reivindicações e com a visibilidade nacional que o caso alcançou, o prefeito na época, Eduardo Paes, decidiu tombar o imóvel e anular o leilão garantindo, assim, a sua posse. A partir disso, a solução adotada pelo prefeito foi transformar a antiga fábrica em um edifício público de uso privado — o que garantiria a permanência dos seus locatários. Porém, em contrapartida, os usuários do imóvel tiveram que aceitar a inserção da fábrica como parte do projeto Porto Maravilha, sendo considerado como parte do “Distrito Criativo do Porto”. Além disso, os locatários tiveram que concordar na criação de uma associação administrativa coletiva, a Associação Civil Criativa Orestes 28. Com isso, os locatários tornaram-se responsáveis pela restauração e manutenção do imóvel e também pela criação de atividades culturais e criativas voltadas para o público. Apesar da garantia da ocupação pelo setor criativo na fábrica Bhering, as novas medidas exigidas para a sua operação e permanência ocasionaram na saída de parte dos ocupantes iniciais do local. Da mesma forma, a sua popularização também influenciou na ocupação de grandes marcas e artistas renomados no espaço, o que diminuiu o número de atividades novas e independentes existentes no local.
40 Cf. ENCONTROS de domingo: o empresário que fez da Bhering uma fábrica de arte. O Globo. Rio de Janeiro, 19 de outubro 2014. Disponível em: < https://oglobo.globo.com/rio/encontros-de-domingo-empresario-que-fez-da-bhering-uma-fabrica-dearte-14292251>. Acesso em: 14 de julho 2017.
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
FIGURA 28:
O novo uso e ocupação da fábrica Bhering
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92 1. Fachada da fábrica Bhering 2. Entrada com antigo letreiro 3. Corredo com vista para as lojas instaladas no local 4. Brechó Belchior 5. Editora Bolha 6. Loja de movéis: Garimpo Contemporâneo Fonte:http://starving.com.br/2015/starvingriotipsdicas-da-fabrica-da-bhering/
3.3 | Aproximação da área: a identificação de espaços inutilizados
3.3 | Aproximação da área: a identificação de espaços inutilizados A análise das atividades atuantes em São Cristóvão, junto à identificação de um setor altamente influente no local e ao reconhecimento de uma alternativa de ocupação viável para a inserção desse setor no bairro, é essencial para a elaboração de um caminho tangível para o processo de desenvolvimento urbano em São Cristóvão. Nesse sentido, a necessidade de uma leitura mais próxima da área é imprescindível para a identificação dos vazios e dos espaços subutilizados ou abandonados no bairro — o que confirmaria a possibilidade de uma ocupação alternativa em contraponto à atual forma de utilização desses espaços. Na imagem seguinte (ver mapa 11), é apresentado um mapa conceitual que tem como objetivo destacar os pontos de maior concentração das atividades mapeadas, além de relacionar esses núcleos identificados com os limites do bairro e as suas conexões. Tal análise possibilita a visualização do maior núcleo de atividades concentradas em São Cristóvão, identificado no mapa como núcleo 1, e localizado ao longo da Rua Bela, se estendendo até a Rua General Bruce e os seus arredores. Então, feita essa análise, foi possível escolher uma área de aproximação para o estudo dos vazios e espaços subutilizados. A área escolhida se encontra dentro do maior núcleo de atividades identificadas — o núcleo 1.
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LEGENDA: LIMITE DO BAIRRO CONEXÕES NÚCLEO DE ATIVIDADES
3.3 | Aproximação da área: a identificação de espaços inutilizados
MAPA 11 | NÚCLEOS DE ATIVIDADES
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Fonte: elaborado pela autora.
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3.3 | Aproximação da área: a identificação de espaços inutilizados
Moda: Osklen
Gráfica: Holográfica Editora Ltda Moda: Cavendish
Mapa 12 | Reconhecimento das atividades
Empreendimento Criativo: Malha Moda: Grupo Soma
A área selecionada possui 6 quadras delimitadas pelas Gráfica: Fotosfera
ortadora e Logística: Sangerio Rio Transportes Ltda
ruas Senador de Alencar, Conde de Leopoldina, Monsenhor Manuel Gomes e o Campo de São Cristóvão. Nessa região estão presentes três categorias das atividades mapeadas — o setor da moda (confecções e um empreendimento criativo), as gráficas e o serviço de transportadora e logística. É importante destacar que muitas outras atividades estão situadas nos arredores dessa área, como já identificado nos mapeamentos das atividades e serviços existentes.
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3.3 | Aproximação da área: a identificação de espaços inutilizados
Ocupação 01: terreno baldio
Mapa 13 | A seleção dos terrenos Para a identificação dos terrenos vazios ou subutilizados foi feita uma série de visitas em campo, assim como a análise Ocupação 02: edifício subutilizado
desses locais a partir de imagens de satélite da vista aérea do bairro. O resultado final foi a seleção de seis espaços que possuem
upação 03: estacionamento (Arquivo Central TJERJ) Ocupação 04: Terreno baldio Ocupação 05: galpão subutilizado Ocupação 06: edifício desocupado
um potencial de ocupação muito maior se comparado às suas utilizações atuais. Nessa seleção foram desconsiderados os espaços livres que atendem à real demanda dos habitantes e dos serviços do bairro, como estacionamento de prédios residenciais, fábricas e transportadoras, e pátios privados. Assim, foi feita uma restrição a somente áreas vazias ou subutilizadas. A seguir, é apontado o caminho percorrido durante a última visita de campo realizada, assim como a identificação do registro fotográfico de cada terreno selecionado.
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Fonte: Raisa Barros, 2017.
FIGURA 29: O primeiro espaço selecionado é um terreno na Rua Conde de Leopoldina, que se estende até a Rua Antônio Januzzi. O terreno, que é murado, está sem nenhuma ocupação e possui um grande potencial por compreender, em seu limite, as duas ruas da quadra.
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Fonte: Raisa Barros, 2017.
FIGURA 30: O segundo espaço está localizado na Rua Conde de Leopoldina. Nesse terreno, há uma edificação de cinco andares sendo utilizada como estacionamento. Como as características dessa construção apontam um uso inicial comercial ou industrial, é deduzível que somente o térreo esteja sendo utilizado por essa atividade.
3.3 | Aproximação da área: a identificação de espaços inutilizados
Fonte: Raisa Barros, 2017.
FIGURA 31: O terceiro terreno está localizado no Campo de São Cristóvão. Atualmente, o espaço é utilizado como estacionamento do Arquivo Central do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJERJ). Apesar de receber um certo fluxo de carros, o estacionamento desse local é muito maior do que o necessário, o que possibilita o seu parcelamento e uma nova ocupação nesse espaço.
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Fonte: Raisa Barros, 2017.
FIGURA 32: O quarto terreno se encontra na Rua General Bruce ao lado da fábrica do Grupo Soma. O terreno é murado, porém é possível identificar que o mesmo está vazio e em situação de abandono.
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Fonte: Raisa Barros, 2017.
FIGURA 33: O quinto espaço também está situado na Rua General Bruce, ao lado do terreno vazio já mencionado. O terreno é ocupado por um grande galpão, que atualmente está sendo utilizado como um estacionamento. O galpão, apesar de antigo, ainda está em ótimo estado e possui um grande potencial devido às diversas atividades que poderiam ser inseridas ali.
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Fonte: Raisa Barros, 2017.
FIGURA 34: O último espaço identificado também está na Rua General Bruce, em frente ao galpão subutilizado. O terreno é ocupado por um edifício, aparentemente, de uso comercial ou até industrial. Atualmente, a construção está desocupada e, devido ao seu estado de abandono, está em processo de deterioração.
3.3 | Aproximação da área: a identificação de espaços inutilizados
Por fim, o mapa 14 aponta, em conjunto, os terrenos selecionados e as atividades presentes nesse recorte do bairro. É importante ressaltar que parte dos edifícios demarcados estão sendo utilizados como estacionamento. Aparentemente, essa alternativa está sendo aplicada em uma tentativa de gerar lucro sobre imóveis que antes estavam sem nenhuma utilização. Esse cenário remete ao caso da fábrica Bhering, que para gerar algum tipo de lucro, passou a alugar o imóvel para indivíduos do setor criativo. Isso demostra que, assim como o caso da fábrica de chocolates, esses locais também podem ser utilizados pelo setor criativo ou por outras atividades que consigam ocupar de forma efetiva esses espaços. Nesse sentido, é possível indicar uma nova configuração desses espaços no bairro a partir da proposta de ocupações criativas. Porém, seria necessário, antes, uma proposição geral para a efetiva aplicação e regulação dessas ocupações pelo poder público. Tal proposta, neste trabalho, é orientada por meio de duas linhas de ação:
1. Medidas de facilitação e estímulo à compra ou ao aluguel dos terrenos vazios ou subutilizados pelo setor criativo, assim como o incentivo à manutenção e ao reparo desses espaços pelo mesmo; 2. A compra de parte desses espaços pelo poder público, de forma que seja possível abrigar nesses locais cursos profissionalizantes voltados para a área criativa. Além disso, esses espaços também poderiam abrigar iniciativas que promovessem a divulgação e comercialização de produtos de pequenas e médias empresas do setor criativo.
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Mapa 14 | Relação entre os terrenos selecionados e as atividad N
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3.3 | Aproximação da área: a identificação de espaços inutilizados
Essas duas linhas de ação têm como objetivo estabelecer
des existentes
um certo controle no processo de desenvolvimento urbano a partir do incentivo à indústria criativa. Enquanto a primeira medida tem a intenção de estimular a economia e a ocupação do setor criativo no bairro, a segunda medida garantiria uma regulação dessas ocupações, assim como a capacitação e permanência de um grupo mais vulnerável aos possíveis efeitos negativos gerados a partir do desenvolvimento econômico e urbano no bairro. Então, ao considerar esses pontos, é possível sugerir um formato de ocupação nesses espaços. Dentro de tal formato, medidas aplicadas para o desenvolvimento urbano do bairro estão alinhadas com as atividades atuantes do bairro de São Cristóvão e com as atividades da indústria criativa em geral.
LEGENDA: SETOR CRIATIVO GRÁFICAS TRANSPORTADORAS E LOGÍSTICA OCUPAÇÕES
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Ocupação 04,05,06: terreno baldio, estacionamento, prédio desocupado Área livre (04) voltada para atividades culturais como: exposições artísticas, teatro e cinema; Galpão (05), parceria público-privada, espaço de comercialização de diferentes segmentos do setor criativo; Prédio (06) confecções coletivas; espaço de compartilhamento para o público e pequenas empresas.
Ocupação 03: estacionamento Área livre compartilhada junto com o TJERJ. Organização de feiras temporárias e outras atividades.
3.3 | Aproximação da área: a identificação de espaços inutilizados
Ocupação 02: estacionamento Prédio público voltado a espaços de profissionalização no setor da indústria criativa para os habitantes da cidade do Rio de Janeiro.
Ocupação 01: terreno baldio Área livre para recreação, atendendo a necessidade dos moradores situados no entorno.
figura 35 | Expectativas de ocupações criativas
Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
Evento público da marca de roupas Farm — 20 anos de sol, Rio de Janeiro | Raisa Barros, 2017
Conclusão
conclusão O conceito de indústria criativa, apesar de relativamente recente, já aponta a capacidade de transformação deste setor não só no aspecto cultural e criativo — como usualmente abordado — mas também no aspecto econômico e urbano. As experiências de diferentes cidades ao aplicar instrumentos voltados ao estimulo da indústria criativa ou ao analisar os impactos desse setor na sua área urbana revelam a necessidade de uma abordagem no planejamento urbano das cidades que reconheça o valor e a influência dessa categoria. A identificação da aptidão de um desenvolvimento econômico e urbano voltado ao crescimento da indústria criativa no bairro de São Cristóvão é uma tentativa de fomentar um caminho para um desenvolvimento urbano sustentável e alinhado às crescentes atividades e economia atuantes no bairro. É importante ressaltar que, como já identificado, aos poucos a própria atividade e economia local de São Cristóvão aumentam o seu potencial. Assim, tais elementos são capazes de alterar a atual configuração urbana do bairro nos próximos anos, sem nenhum planejamento que controle os possíveis impactos negativos de um desenvolvimento desordenado. Então, a proposição da utilização de espaços vazios ou subutilizados, comuns na área urbana de São Cristóvão, através de ocupações criativas é uma alternativa para promover o reconhecimento da indústria criativa existente no bairro. Da mesma forma, tal proposta também é uma estratégia para agenciar o desenvolvimento urbano no local de forma coerente e em oposição às presentes formas de incentivo à cultura e à criatividade na cidade do Rio de Janeiro.
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Criação, inovação e o cenário urbano: Alternativas de ocupações criativas em São Cristóvão
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