MITOLOGIA CHINESA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS CENTRO DE EDUCAÇÃO ABERTA E A DISTÂNCIA CURSO DE LETRAS ESPANHOL A DISTÂNCIA – FPELE CURSO DE EXTENSÃO MITO E LITERATURA

Mitologia Chinesa

A base da mitologia chinesa é milenar e baseia-se fundamentalmente em elementos oriundos das três principais religiões chinesas: o Taoísmo, o Confucionismo e o Budismo. A mistura dos elementos deste tripé religioso torna suas lendas e mitos complexos para nós que não estamos familiarizados com a civilização chinesa e suas sutilezas.


Grande parte dos mitos chineses conhecidos vem, principalmente, de três textos chaves: “Shan Hai Jing”, Pergaminho da Montanha e do Mar, que descreve os mitos, a magia, a religião e a geografia da China antiga, sendo uma das primeiras enciclopédias da China; “Shui Jing Zhu”, Comentário sobre o Pergaminho da Água, tratando de forma aprofundada e rica sobre a geografia, história e as lendas chinesas; e “Hei’an Zhuan”, Épico da Escuridão, trata-se de uma coleção de poesia épica sobre as lendas, preservada pelos habitantes montanheses de Hubei.

Para os chineses da Antiguidade, a Terra era quadrada. Acima dela, o céu arredondado tinha forma de cúpula. No meio da Terra, encontrava-se um império que se estendia nas cinco direções: leste, oeste, norte, sul e, sob o sol no zênite, o meio. Quatro montanhas, servindo de pilares, sustentam o céu, e os quatro Soberanos dos pontos cardeais têm, cada um, seu palácio. Eles regulam as divindades da natureza, do vento e das águas, bem como os animais fabulosos. Todos os quatro se submetem ao mais poderoso deles, o Imperador do Meio, também chamado Imperador Amarelo, ou Imperador Celeste. Além dos quatro lados do Império, estendem-se terras desconhecidas, onde vivem outros homens, estrangeiros, bárbaros. Depois dessas terras, começam quatro mares; em seguida, é o vazio, certamente reinos dos demônios. Nada de bom poderia vir de lá, segundo os chineses. Agora que temos uma ideia de como os chineses viam o seu mundo, vamos conhecer a origem do Universo, segundo suas crenças. A lenda chinesa a seguir, é a mais antiga das histórias a respeito da origem do Universo, e fala de um tempo em que a terra e o céu eram povoados por seres fabulosos e imortais.


Os 3 Soberanos Xuaxu, bela imortal, banhava-se na água doce do lago do Trovão. Ao sair do banho, ficou intrigada ao encontrar uma pegada imensa. Só um gigante poderia tê-la produzido. Talvez pertencesse ao dono do lugar, o deus do Trovão, com sua cabeça de homem e bico de pássaro. Xuaxu colocou seu próprio pé dentro da pegada do gigante e, ligeira, continuou seu caminho. Pouco mais tarde, Xuaxu teve um filho. Seu nome é Fuxi. Seu corpo é metade humano, metade serpente. Tem cabeça de homem, dentes de tartaruga, lábios de dragão e uma barba branca tão longa que toca o solo.

Imagem de Fuxi Nas pedras entalhadas em que está representado, Fuxi segura um esquadro, que simboliza o quadrado, o masculino. Fuxi reside na Terra, mas quando quer, sobe ao céu por meio de uma árvore imensa, cujas raízes estão na terra e o cimo chega ao firmamento. Ele é versado em religião e magia. Tem os olhos bem treinados. Observa atentamente como uma aranha tece sua teia e inventa, a partir desse modelo, as redes que poderiam ser úteis para caçar e pescar. Mas não há ninguém para tirar proveito de seu ensinamento, pois a humanidade ainda não havia nascido. Fuxi tem uma irmã, Nüwa. Assim como o irmão, ela tem cabeça humana e cauda de serpente. Seu dom é mudar de aparência a seu bel-prazer, mas não mais do que setenta vezes por dia. Nüwa tem um compasso, que simboliza o círculo, o feminino. É a primeira a imaginar o povoamento da Terra, o que acontece certo dia, quando Nüwa, à


beira de um lago, apanha um pouco de argila amarela e a faz enrijecer com muita habilidade. Assim, forma seres até então desconhecidos: homens e mulheres.

Imagem de Nüwa Em determinada altura, já atingido certo número daquelas novas criaturas, e cansada daquela tarefa, ela resolve apenas mergulhar uma corda na lama e sacudi-la. Cada gota que cai torna-se um homem ou uma mulher. Logo, surge diante de Nüwa uma multidão. Diz-se que os seres de argila tornaram-se os nobres e os ricos, e que os outros, os que foram feitos de qualquer jeito, logo após sua formação, ainda cobertos de lama, tiveram como descendência os humildes e os pobres. Naquele momento, nenhum deles sabia fazer nada, nem mesmo se reproduzir. É Nüwa quem os ensinará. Fuxi se instalou no cimo quadrado de uma colina. O sopro dos oito ventos, vindos das oito direções, leste, nordeste, norte, noroeste, oeste, sudoeste, sul e sudeste, inspirou-lhe a forma de oito trigramas, oito figuras que se tornaram a primeira base da escrita chinesa, e designam forças da natureza: o céu, a terra, a água, o fogo, a montanha, o trovão, o vento e a bruma que se ergue dos lagos. Fuxi ensinou aos homens como caçar, pescar e começar a escrever. Ao ver uma fênix – enorme e magnífico pássaro lendário -, Fuxi mergulhou em profundas reflexões. A ave apenas comia sementes de bambu e pousava só nas árvores esterculiáceas e não nas outras. Notando isso, Fuxi teve a ideia de cortar um tronco dessa árvore em três pedaços. O pedaço que tocava o chão soava demasiado grave. O que se erguia para o alto demasiado agudo. O pedaço do meio produzia um som adequado,


nem muito alto, nem muito baixo. Dele, Fuxi fez a cítara. Nüwa inventou a flauta, e dali em diante os homens teriam a música para celebrar as divindades. Assim, o trabalho de civilizar os homens absorve completamente Fuxi e Nüwa. Nos relatos, eles são chamados de Soberanos e Augustos. Seu reino benevolente dura cento e vinte anos. Nesse período, o deus das Águas, Gonggong, despeitado por não ser o senhor do mundo, subitamente se revolta. Sua força é aterrorizante. Ele tem rosto de homem, mas seu olhar é fixo. Os cabelos são vermelhos, o corpo, de dragão. Nunca tem fome, nem sede. Gonggong lança-se com toda a fúria contra o monte Buzhou, uma das quatro montanhas da Terra que sustentam o céu, a noroeste. O choque é tão violento que o céu, nesse local, se quebra como vidro. Um grande buraco se abre. As estrelas, para não cair no vazio, deslizam para o oeste. O impacto também abala a terra, que oscila para sudeste. A desordem cósmica provoca inundações e incêndios. Do buraco aberto no céu podem provir, a qualquer momento, calamidades desconhecidas.

Imagem de Gonggong Para proteger os homens, Nüwa forja pedras de várias cores e tenta consertar o firmamento. Como as pedras não se encaixam muito bem, ela sacrifica uma grande tartaruga e usa a carapaça e as patas do réptil para erguer pilares entre o céu e a terra. E faz um pó de junco para tapar o buraco do céu. Não é bem-sucedida: o buraco não fica bem tapado, e a Terra continua inclinada. É por isso que as águas dos rios, inclusive as do Rio do Céu- nome que designa a Via Láctea- correm para um dos lados e vão formar o mar. Por causa da nova posição da terra, surgem as estações, e os rios banham ainda mais terras; e as árvores ficam cada vez mais verdes, as flores desabrocham cada vez


mais, e as colheitas são cada vez melhores. Há quem diga que o sol não se arrisca mais a surgir na região em que Nüwa tentou consertar o céu. Mas um dragão bondoso lá se instalou, soltando chamas pela boca. Não pode impedir que os raios venham do vazio atrás de si, mas ele brilha no lugar em que poderia ter permanecido um buraco negro. Sabe-se da existência de um terceiro benfeitor dos homens: Shennong (“divino lavrador”). Ele também nasceu de uma imortal. Numa caminhada, sua mãe não conseguiu evitar que um dragão vindo das nuvens se chocasse contra sua cabeça. Talvez por isso Shennong tenha focinho, orelhas e chifres de búfalo. Ele sabe fazer surgir da terra os seis cereais que crescem por todo o país, do trigo do Norte ao arroz do Sul. Inventou o arado e desenvolveu a arte de utilizá-lo. Ensinou aos homens um pouco mais de escrita, de cálculo, como fazer comércio e como utilizar o fogo para sacrifícios. O incomparável dom de Shennong é saber curar pelas plantas. Com um chicote ele bate nas flores, nos frutos, nas folhas, nas raízes, e deles extrai seu poder, e usa a si mesmo como cobaia. Ele não hesita me fazer experiências, sendo capaz de absorver até setenta plantas por dia para conhecer seus segredos. Com tanta dedicação, acaba se envenenando. Mesmo assim, reinou por cento e vinte anos. No entanto, hás duas outras histórias sobre a criação do mundo, mais recentes que a dos Três Soberanos, e são muito conhecidas na China. É sobre elas que falaremos a seguir.

Imagem de Shennong


O Ovo do Mundo

Representação do “Ovo do Mundo” chinês No princípio do mundo, o céu e a terra formavam um ovo composto de uma mesma e única matéria. No meio desse ovo estava P’an Kou. Ele cresceu dentro do ovo ao longo de dezoito mil anos. Ao fim desse período, despertou e, com um golpe de machado, fendeu seu abrigo, dividindo-o em céu e terra. E assim surgiu o mundo. Os três, céu, terra e P’an Kou, continuaram a crescer por mais dezoito mil anos. O céu ficou cada vez mais alto; a terra, cada vez mais profunda; e P’an Kou, que preenchia o espaço entre os dois, cada vez maior. Quando o céu e a terra atingiram suas dimensões ideais, pararam de crescer e se mantiveram imóveis. P’an Kou, então, se transformou: seu peito, sua barriga, seus braços e suas pernas viraram montanhas. Os olhos se instalaram no céu: o esquerdo é o sol; o direito, a lua. Sua respiração se confunde com as nuvens e o vento. Sua voz ribomba no trovão. Seu sangue forma os rios. Seus pelos viraram árvores, sua barba brilha nas estrelas. Um texto mitológico chinês antigo chega a dizer que seus piolhos tornaram-se os homens, bem como as quatro outras espécies, que, com os homens, compõem os seres vivos: os animais, as plantas, os espíritos e os fantasmas. Portanto, todas as categorias de seres vivos pertencem à mesma família, pois nasceram do mesmo modo. Também estão intimamente ligadas à natureza, ao cosmo, pois tudo proveio de P’an Kou. No pensamento chinês, é costume analisar os elementos naturais, classificando-os de Yin ou Yang. O elemento quente e leve do ovo do mundo, que vai criar o céu, é o elemento masculino: o Yang. A parte mais pesada, mais fria do


ovo, que forma a Terra, é o elemento feminino: o Yin. Este é o princípio passivo da natureza, noturno e escuro (a representação em cor preta do ovo). Já o Yang é o princípio ativo, diurno e luminoso (a parte em cor branca ou mais clara do ovo). O símbolo de Yin Yang, conhecido também como Diagrama de Taiji Tu, representa, então, a união entre esses dois princípios opostos e complementares. Os dois elementos compõem tudo o que existe no Universo, segundo a Mitologia Chinesa.

Imagem de P’an Kou com o símbolo do Yin Yang nas mãos


Um cão como ancestral Os Yao, chineses do Sul, têm outra versão. Para eles, P’an Kou era um cão pouco

comum, de cinco cores, que nasceu de um inseto ainda no casulo, que saiu da orelha de uma dama do palácio, no Império Celeste. Esse cão extraordinário, portanto, pertence ao Imperador Celeste. Recebe o nome de P’an Kou e vive na corte. Em certa ocasião, o Imperador descobre uma conspiração para tirar-lhe o trono. Furioso proclama: “Quem me trouxer a cabeça do chefe desse grupo receberá, como recompensa, minha filha mais nova, uma montanha de ouro e uma cidade para governar!”. Em instantes, a cabeça do general Wu, inimigo do Imperador, é levada ao palácio por ninguém menos do que P’an Kou, que não viu dificuldade em entrar no acampamento dos rebeldes. Ninguém desconfiou de um simples cão. Desse modo, P’an Kou se aproximou sorrateiramente do chefe e o atacou, matando-o. O Imperador ficou muito satisfeito. Seu inimigo fora morto, e ele poderia continuar com sua filha a seu lado, com sua montanha de ouro e sua cidade, pois um cão não poderia se casar com uma mulher, nem governar. “Ah, pode sim, papai!”- disse a filha mais nova. “Promessa é promessa! Exijo meu marido, seja ele um cão ou não”. O Imperador, contrariadíssimo, se vê obrigado a concordar, mas impõe a condição de que o jovem casal deixe o palácio e até mesmo o país. O casamento acontece na corte. Em seguida, P’an Kou coloca a jovem esposa nas costas e partem para viver em uma ilha, segundo alguns; nas grutas na região de Hunan, segundo outros. Seus filhos são os ancestrais de um povo que ainda gosta de se vestir com cores berrantes, um resquício, sem dúvida, do cão multicolorido que se casou com a princesa. Há uma outra versão do fim desta história. Quando o Imperador se dá conta de que foi um cão que derrotou Wu, ele se alegra, mas nem lhe ocorre cumprir a promessa. Mas, há uma maneira de P’an Kou se tornar um homem e se casar com a princesa: ele precisa ficar sete dias debaixo de um sino de ouro para ter uma metamorfose completa. Contudo, ninguém poderá vê-lo durante esse período. Passam-se cinco dias. No sexto, a


princesa, não suportando mais a curiosidade, espia debaixo do sino. P’an Kou é quase um homem: tem pernas, braços e corpo de homem, mas a cabeça ainda não se transformara. O encantamento é rompido, o que trona impossível concluir a transformação. P’an Kou continuará com cabeça de animal. Por isso, o casamento ocorre num país secreto, e seus três filhos e sua filha são os primeiros seres humanos a habitar o planeta Terra.


Os principais Imperadores (deuses) chineses

Imagens que simbolizam os quatro Imperadores (deuses) chineses, os quais representam os quatro pontos cardeais da Terra

Uma das principais lendas da China antiga é a das quatro criaturas celestiais, ou quatro deuses celestiais (Shishin), cada um deles guarda um ponto cardeal, representa uma estação, uma cor, um elemento, uma virtude, entre outras características. Cada um representa um quadrante no céu, e cada quadrante destes é composto por sete pequenas constelações, que simbolizam, respectivamente, uma parte do corpo destas criaturas celestiais, também chamados de 28 mansões celestiais. Existe também um guardião central representando a própria China, ou o planeta Terra, que é o principal imperador ou deus: o Imperador do Meio (ou Amarelo), chamado Huangdi, e é representado por um dragão amarelo chamado Huang Long. Então, com ele, como regente principal da Terra, há também os quatro deuses celestiais que recebem os nomes de Qīng Lóng (o dragão azul), Zhū Qiǎo (o pássaro vermelho, ou fênix), Bái Hǔ (o tigre branco) e Xuán Wǔ (a tartaruga negra, sendo um misto de cobra). Assim, depois dos Três Soberanos, Fuxi, Nüwa e Shennong, estas cinco divindades, todas chamadas Imperadores, vão se suceder. Os imperadores dos quatro


pontos cardeais, a serviço do Imperador do Meio, dividem entre si as estações do ano, os elementos e as cores. Cada um tem (especificamente como foi dito) seu animal: -O Imperador do Sul rege o verão, o fogo, o vermelho. Seu animal é a fênix. -O Imperador do Leste rege a primavera, a madeira, a cor azul. Seu emblema é o dragão azul. -O Imperador do Oeste é o senhor do outono, do ouro, e do branco. Um magnífico tigre branco o protege. -O Imperador do Norte é o do inverno, da água, do preto. Um animal meio serpente, meio tartaruga o acompanha. Esses cinco Imperadores não devem ser confundidos com os imperadores da China, ou seja, com os personagens históricos que unificaram e governaram o país de dinastia a dinastia. Essa confusão foi espertamente usada pelos imperadores chineses, que, para garantir o poder, decretaram que os deuses eram seus ancestrais (assim como o fizeram os egípcios também). Para comprovar essa afirmação, mandaram escrever, ao longo de seus reinados, crônicas em que os deuses levavam títulos de imperador. Esse título, logicamente, era transmitido, de sucessor a sucessor, até chegar a eles próprios. Foi assim que os imperadores da China conseguiram estabelecer a crença de que eram Filhos do Céu.


O Imperador Amarelo e as míticas batalhas contra outros Imperadores Huangdi, o imperador do Meio, é o primeiro entre os cinco imperadores da mitologia chinesa. É também chamado de Imperador Amarelo, da cor da terra. O deus da terra, Huandu, encontra-se, aliás, muitas vezes perto dele, como servidor dedicado. Huangdi é o meio-irmão mais novo de Shennong. É em razão disso que o sucede. Contase que sua mãe estava numa colina quando surgiu um arco-íris ou uma nuvem cortada de raios. No mesmo instante, ressoou o trovão. Foi assim que ela concebeu Huangdi, que, em certas histórias, tem uma cabeça de dragão plena de inteligência.

Huangdi: O Imperador do Meio (Amarelo) Durante seu reinado, Huangdi se mostra pródigo inventor. São suas invenções, por exemplo, a arte militar e o jogo de bola. Além disso, causou uma revolução: inventou o cozimento dos alimentos (ele seria o Prometeu chinês?). Seu antecessor, Shennong, sabia fazer os cereais crescerem, mas ninguém ainda tivera a ideia de cozê-los antes de comer. Os homens dessa época já apreciavam carne, peixe e saborosos moluscos, mas os ingeriam crus. Como as carnes cruas não permanecem frescas por muito tempo, a humanidade deve a Huangdi a diminuição de suas dores de estômago e cólicas, causadas pela contaminação dos alimentos crus.


Mas a grande glória de Huangdi foi ter domado os animais: ursos, linces, tigres, lobos, leopardos, águias. Não para prendê-los em jaulas, e sim para que servissem em seus exércitos. Pois Huangdi tinha inimigos. Primeiro ele teve que lutar contra Yandi, divindade das chamas, Imperador do Sul, e saiu vencedor. Depois, Chiyou foi quem se revoltou. Chiyou era um dos ministros de Huangdi e lhe devia obediência. Como suas asas indicam, ele é uma divindade dos Ventos. Mas tem também uma pesada cabeça de bronze, chifres, orelhas peludas, seis mãos e seis pés, ou, segundo outros relatos, cascos de búfalo. Conhece a arte de fundir metais e é tido como inventor das armas, lanças, sabres e espadas de todo tipo.

Estátua de Chiyou O combate se inicia no dia em que Chiyou provocou Yandi, que Huangdi acabara de subjugar. Chiyou persegue Yandi e recruta homens no sul do país para guerrear, no entanto, Yandi foge e pede ajuda a Huangdi, seu suserano, este fica furioso em saber disso e pelo fato de ter recrutado homens nos assuntos que só dizem respeito aos deuses. Com uma vanguarda de leopardos, tigres e ursos, Huangdi se lança ao ataque. Chiyou, senhor do Vento, provoca uma bruma densa, volumosa, que envolve todo o exército. Desnorteados, os atacantes se detêm, ficam às cegas, se dispersam; ou atraem Chiyou com os gritos que soltam, e acabam sendo massacrados. Huangdi recorre à sua bela cabeça de dragão e tem uma ideia. Convoca o príncipe dos Ventos, que lhe deve favores e é mais forte que Chiyou. -“Livre-nos desse pesadelo”ordena Huangdi. O príncipe dos Ventos instala imediatamente um cata-vento mágico: uma pequena estátua em pé num carro, que funciona em meio à bruma, no nevoeiro e em qualquer situação meteorológica complicada. Ela começa dando viravoltas e acaba


apontando para a saída. Encolerizado, Chiyou bate no chão com seus cascos de búfalo, e uma tempestade mais forte que a bruma cai para engolir Huangdi. Felizmente, o Imperador tem uma filha, Ba, capaz de provocar a seca. Então, ele a faz descer do céu. Ba se esforça até o esgotamento e o solo, enfim, seca. A infeliz Ba não tem mais forças para subir ao céu e sua presença afasta qualquer vestígio de umidade. A terra se enche de rachaduras, o deserto aparece. Desde então, Ba vai e vem, trazendo a seca por onde passa, seja no Sul ou no Norte do país. Os homens precisam pronunciar fórmulas rituais para fazê-la ir-se. Chiyou, sempre rebelde, decide fazer aliança com os gigantes. Mas o Imperador Amarelo é mais forte. Chiyou é feito prisioneiro. Sua sorte é determinada: é condenado à morte. A execução é rápida: ele é decapitado antes mesmo de tirar a armadura. O golpe fatal na cabeça atingiu na altura das orelhas, já que sua armadura o protegia até uma parte da cabeça. Isso explicaria a máscara de Taotie, a cabeça sem boca e sem queixo que vemos entalhada em vasos, tripeças, escudos e objetos de bronze, a fim de lembrar o poder absoluto de Huangdi, o Imperador do Meio, e também assustar os espíritos ou quem ousasse se rebelar, como o fizera Chiyou.

A máscara de Taotie Huangdi não esqueceu que Chiyou conseguiu levar homens ao combate. Isso não poderia mais acontecer. Desse modo, ele estabelece que a partir de então, as divindades do céu não mais poderão descer à terra sem autorização. Os dragões lhes servirão de meio de transporte. Além dessa, a outra função dos dragões será apenas a de provocar chuva. Daquele dia em diante, eles passariam a viver nos mares, nos rios e nas nuvens.


Esse foi o começo do Império Celeste, uma organização muito precisa, com muitos regulamentos, na chamada burocracia dos céus. Assim, Huangdi encarrega dois irmãos, Shentu e Yülu, de vigiar os espíritos que vagueiam à noite e precisam, imperativamente, se apresentar, de manhã, no cimo de Dushuo, uma montanha do Leste. Cada espírito é rigorosamente observado. Se, durante a noite, algum deles tiver provocado injustamente o mal, os dois guardiões o amarram com cordas de junco ao tronco de uma árvore, um magnífico pessegueiro. E ali, indefesos, são devorados por tigres.

Shentu e Yülu Desde a Antiguidade, essa história agrada aos homens, que pregam nas portas de suas casas imagens dos dois irmãos, transformados em deuses das Portas, e também imagens de tigres, a fim de barrar a entrada de maus espíritos. Num dia de festa, no solstício de inverno, colocam-se também galhos de pessegueiro e uma vassoura de junco. Além de livrar dos demônios, essas vassouras têm o dom de afastar velhas inquietações que povoam a cabeça e atormentam a vida das pessoas. Huangdi sancionou ainda muitas leis justas e boas. Quando chegou o dia de sua morte (de fato, os deuses chineses não são imortais), um dragão o levou nas costas para o paraíso. Seus ministros, não querendo abandoná-lo, voaram com ele, agarrados na barba do dragão.


O Paraíso Chinês No paraíso dos deuses chineses, sob a Estrela Polar, encontramos a Rainha-Mãe do Oeste, Hsi Wang Mu. O palácio da Rainha é uma montanha de jade, ao norte do monte Kunlun, cujos pés tocam a terra e o cimo chega ao céu. O magnífico jardim suspenso da Rainha-Mãe é protegido por uma floresta em chamas, animais mágicos, muralhas de ouro e areia movediça.

Hsi Wang Mu Hsi Wang Mu é representada em dois aspectos diferentes. Num deles, com rosto de mulher, cabelos longos, dentes de tigre e cauda de leopardo. Pássaros estranhos, verdes, de três patas, a servem em sua caverna. Em outra, porém, é uma bonita jovem, rodeada de servas graciosas, num palácio refinado. Ela organiza festas e jogos perto de um lago reluzente, pois o menor de seus seixos é uma pedra preciosa. Essas pedras são de sete tipos, sendo o jade a mais apreciada. O tempo não tem importância nessa terra onde cresce o pessegueiro da imortalidade. Quem provar um de seus pêssegos torna-se imortal. Os pêssegos amadurecem a cada seis mil anos. Primeiro, é preciso que o pessegueiro tenha folhas ( a cada três mil anos); e em seguida, frutos (três mil anos depois). E nesse dia se dá o aniversário da Rainha-Mãe do Oeste. Os imortais são convidados para um banquete em


que são servidos, entre outros pratos, pernas de urso e fígado de dragão, antes de serem saboreados os pêssegos da imortalidade. Às vezes, algum humano é convidado para essa festa em reconhecimento a feitos extraordinários. E tendo provado a carne saborosa do pêssego da imortalidade, ele poderá, após a vida terrena, ir viver, festejar e desfrutar infinitamente naquela montanha bem-aventurada, pois se tornou imortal. Os seres humanos, os sábios, os santos que mereceram a vida eterna, graças as suas virtudes, ali ganham plumas, asas e uma palidez diáfana. É assim que são representados nas pinturas e nos ornamentos chineses. Vivem uma vida de sonho nas ilhas montanhosas, em meio a uma mar bem real, o mar do Leste. Seus habitantes moram em palácios brancos, cercados de animais também brancos. A própria relva é um tesouro: serve para fazer o elixir da imortalidade. Em razão disso, Imperadores enviaram navios com exércitos inteiros para tentar encontrar tais ilhas. Porém, por serem encantadas, elas mudam de lugar diante do risco de serem avistadas por algum barco. Os sábios não se preocupam com isso. A cada manhã, eles visitam de ilha em ilha. Todas as noites, voltam para casa voando em linha reta. Em seus jardins, que se estendem em sete níveis, as árvores dão pérolas e frutos de jade, o alimento dos imortais. Seus galhos balançam ao vento, numa música suave. Flores de lótus ornamentam os lagos, orlados de pedras preciosas. A água transparente desses lagos deixa visível o fundo coberto de ouro em pó. Como se não bastassem todos os privilégios, os habitantes dessas paragens conhecem o segredo da fabricação do ouro.

Referências bibliográficas: HELFT, Claude. Explorando a Mitologia de todo o mundo. São Paulo: Arx, 2005.


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