Mais de um século de arqueologia em vila nova de gaia

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Estudos do Quaternário, 13, APEQ, Braga, 2015, pp. 1-22 http://www.apeq.pt/ojs/index.php/apeq.

MAIS DE UM SÉCULO DE ARQUEOLOGIA EM VILA NOVA DE GAIA: INVESTIGAÇÃO E GESTÃO DE UM PATRIMÓNIO EM RISCO

ANTÓNIO MANUEL S. P. SILVA(1)

Resumo:

Datam de 1908 as primeiras escavações arqueológicas no concelho de Vila Nova de Gaia, dirigidas por José Fortes nas necrópoles do Alto da Vela (Gulpilhares), mas nas sete décadas seguintes foram muito escassos e de quase nula produção científica os trabalhos realizados. A partir da década de 1980 a investigação arqueológica foi reanimada, atingindo desde os finais do século um incremento muito substancial, graças às intervenções de salvaguarda e minimização de impactes negativos da actividade imobiliária, particularmente na área do centro histórico. Em 2006, o levantamento arqueológico executado para a revisão do Plano Director Municipal permitiu actualizar e acrescentar informação crítica a inventários anteriores, na óptica de uma gestão moderna e pró-activa dos bens arqueológicos. Todavia, a publicação do PDM, em 2009, não acolheu as medidas regulamentares propostas nem tão pouco o zonamento de sensibilidade previsto, reduzindo assim drasticamente a sua eficácia como instrumento não só de salvaguarda, como também de estudo e valorização do património arqueológico. Neste contexto, apresenta-se um breve historial da arqueologia gaiense e discutem-se, à luz dos conceitos actuais de gestão territorial, patrimonial e cultural, as oportunidades perdidas e o valor (ainda) potencial dos vestígios arqueológicos do território do município de Vila Nova de Gaia. Palavras-Chave: Vila Nova de Gaia, Gestão do Território, Carta Arqueológica, Arqueologia de Salvaguarda

Abstract:

More than a century of Archaeology in Vila Nova de Gaia (North of Portugal): research and management of a heritage in risk The first archaeological diggings at Vila Nova de Gaia were carried on in 1908 by José Fortes, who undercoved Alto da Vela, Gulpilhares’ necropoles, but during the seventy years which passed since then, archaeological excavations were very scarce and produced almost none scientific results. From 1980 onwards, archaeological research has been rekindled and achieved since the end of 20 th century a very substantial increase, thanks to the interventions of safeguarding and minimization of negative impacts of real estate activities, particularly in the area of the historic center. In 2006, the archaeological survey performed for the revision of the Municipal Managing Plan (port. PDM) updated and added critical information to prior inventories, in the sense of a modern and proactive management of the archaeological assets. However, the publication of the PDM, in 2009, didn’t welcome the regulatory measures proposed nor the preventive zoning provided, thus reducing drastically its effectiveness as a tool not only to the safeguard, as also for the study, public awareness and valoration of the archaeological heritage. In this context, the paper presents a short history of archeology in Vila Nova de Gaia and discusses, in the light of current concepts of territorial and cultural heritage management, some missed opportunities but mainly the (still) potential value of archaeological remains in the territory of the municipality. Keywords: Vila Nova de Gaia, Territorial management, Archaeological field survey map, Preventive archaeology

Received: 1 December 2015; Accepted: 19 December 2015

“A archeologia do concelho de Gaya está por fazer – a antehistorica como a historica. É que só agora começam a colligir-se acuradamente e a registrarem-se com interesse os materiaes precisos para lhe esboçar a paleothnologia, para lhe restaurar o passado protohistorico, para reconstituir, emfim, a ethnografia dos primeiros séculos da nossa era” (FORTES 1909:9) 1.

INTRODUÇÃO. A ACTIVIDADE ARQUEOLÓGICA EM VILA NOVA DE GAIA 1

rareavam nos começos do século XX mas são frequentes no presente, mas essencialmente porque a tal volume de intervenções, ditas preventivas, de salvaguarda ou minimização de impactes negativos, não corresponde seguramente um proporcional acréscimo de conhecimento consolidado sobre a

Escrita há mais de um século, a sentença de José Fortes que epigrafa este texto mantém flagrante actualidade, não tanto por falta de escavações arqueológicas e outros trabalhos de campo, que (1)

CITCEM – Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória (Universidade do Porto). Gabinete de Arqueologia, História e Património (ASCR-Confraria Queirosiana). Bolseiro de Doutoramento da Fundação para a Ciência e Tecnologia na Universidade de Santiago de Compostela. E-mail: amspsilva@hotmail.com 1 Texto correspondente à comunicação apresentada aos Encontros de Maio (2015), iniciativa da APEQ e outras entidades. O autor utiliza a ortografia anterior ao acordo ortográfico em vigor.

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António Manuel S. P. Silva

história e a forma de vida das comunidades que ao longo de milénios se sucederam na ocupação do território gaiense. Na verdade, se bem que o interesse pelas antiguidades e vestígios do passado em Vila Nova de Gaia remonte aos finais da década de 1870, época em que Marciano Azuaga começou a exibir num apreciado “museu” a colecção que ia reunindo e que viria a oferecer ao Município em 1904 (GUIMARÃES 1992:17), datam apenas de 1908 os primeiros trabalhos arqueológicos realizados no concelho de Gaia. Naquele ano, o achado ocasional de algumas sepulturas em trabalhos de reparação de um caminho no sítio do Alto da Vela, na freguesia de Gulpilhares2, sensibilizou o presidente da Câmara Municipal, Joaquim Augusto da Silva Magalhães, e deu origem ao que seria a primeira escavação arqueológica levada a efeito em terras gaienses, promovida pela Autarquia, que para tal convidou o reputado arqueólogo José Fortes a dirigir as pesquisas. Na Carta-prefácio ao Relatório das Escavações, apresentado à Câmara em Outubro de 1908, José Fortes não deixaria de assinalar a singularidade da iniciativa municipal, enaltecendo

(CORREIA 1924a: 281 e 292, 1924b; GUIMARÃES 1993a; SILVA 1994: 101-2). Mais tarde, o achado avulso de utensílios pré-históricos em Lavadores (Canidelo), em 1932, levou talvez à abertura de uma pequena sondagem por Russel Cortez (CORREIA 1935; CORTEZ 1946; COSTA & TEIXEIRA 1957; BRANDÃO 1962; MONTEIRO-RODRIGUES 2000), e por alturas de 1937 foram também recolhidos alguns vasos cerâmicos no Castro da Madalena, estação que nos anos subsequentes viria a ser destruída quase na totalidade pela extracção de pedra (CORREIA 1924a: 277; VELOSO 1963; GUIMARÃES 1993a; SILVA 1994: 63-4; QUEIROZ 1997). Por mais de quatro décadas ficou depois quase por completo adormecida a arqueologia gaiense. E foi em contexto de emergência que foram retomados os trabalhos de campo: em 1979, a inadvertida realização de uma obra no Alto da Vela faria regressar os arqueólogos à necrópole de Gulpilhares (SILVA 1980; VALE 1987; SILVA 1994: 99; LOBATO 1995); em 1980, arranjos na Estrada Nacional 1 suscitaram oportunidade para a caracterização de um troço da via romana da Senhora do Monte (Pedroso), que Armando de Matos noticiara já em 1937; (MATOS 1937; COSTA 1980: 35-7; MANTAS 1996: 830-1); em 1982, outra construção pôs à vista o forno romano do Paranho, em Canelas, obrigando a nova acção de salvamento (SILVA et al. 1984). Nos anos seguintes, decorreram também de destruições e situações de emergência a maior parte das intervenções arqueológicas realizadas em Gaia, sendo escassas as escavações programadas com fins científicos no âmbito de projectos de investigação, que podemos exemplificar com as intervenções na Mamoa 1 da Gestosa, Sandim (JORGE 1984), no Castelo de Gaia, Santa Marinha (SILVA 1984, 1986), no Castro da Baiza, Vilar de Andorinho (SILVA et al. 1987; SÁ & PAIVA 1994) ou, já mais tarde, no centro oleiro das “soengas” de Coimbrões (RIBEIRO 1997, 2003a, 2003b, 2008), assim se encerrando, de certo modo, este segundo ciclo da arqueologia gaiense (GUIMARÃES 2000a). Observando o gráfico das intervenções arqueológicas realizadas em Vila Nova de Gaia (Fig. 1) podemos verificar o ritmo dos trabalhos desde o começo do século XX. Se calcularmos a média aritmética desses trabalhos por década, constatamos que o efectivo “arranque” da arqueologia gaiense como prática regular se dá na década de 1981 -1990 (0,8 intervenções/ano), para subir a 2,2 intervenções/ano no decénio de 1991-2000. Na viragem do milénio dá-se na verdade o grande boom de trabalhos arqueológicos, que atingem uma média anual de cerca de 10 intervenções entre 2001 e 20104.

O facto original e sem precedentes conhecidos de um corpo administrativo [que] deliberou em pública sessão explorar directamente uma necrópole archaica que occasionalmente se revelára foi para muitos uma grata surpresa. Em Portugal pode dizer-se um acto de arrojo. No momento actual de negligencia inveterada e de secular indifferença para com as nossas velharias, o accordão camarário attingiu mesmo o vulto duma deliberação revolucionária (FORTES 1908). O extraordinário resultado destas pesquisas, traduzido pela exumação de 98 sepulturas, romanas e da Idade do Bronze, e perto de duas centenas de vasos e outros objectos (FORTES 1908, 1909; GUIMARÃES 1993a; LOBATO 1995)3, não teve sequência, todavia, na programação de outras investigações arqueológicas no concelho, sendo necessário aguardar por mais achados acidentais para que outros vestígios da antiga ocupação do território vissem a luz do dia, como sucedeu por exemplo com os objectos arqueológicos encontrados no Castro do Monte Murado, que Rocha Beleza noticiou na sua Monografia de Pedroso a partir de 1913 (BELEZA 1991-1992). Já nos inícios da década de 1920, o alargamento da linha de caminho-de-ferro, a exploração de pedreiras e a construção de habitações puseram à vista e terão destruído quase em simultâneo uma outra necrópole romana no Sameiro, Valadares, objecto de escavações pontuais por parte de Mendes Correia 2

A designação das freguesias do município de Vila Nova de Gaia é feita segundo a divisão tradicional, anterior à reorganização administrativa determinada pela Lei nº 11-A/2013, de 28 de Janeiro. 3 Considerando que a referência a numerosos sítios arqueológicos envolve um aparato bibliográfico muito extenso, reduzimos as notas bibliográficas aos trabalhos essenciais, reservando a notação das páginas para os casos que entendemos indispensável. O leitor interessado poderá consultar bibliografia mais exaustiva nas fichas de inventário do património arqueológico do Plano Director Municipal de V. N. Gaia, disponíveis em http://www.gaiurb.pt/pdm.htm.

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Mais de um século de arqueologia em Vila Nova de Gaia: investigação e gestão de um património em risco

Fig. 1. Trabalhos arqueológicos no concelho de Vila Nova de Gaia (1908-2014). Fig 1. Archaeological projects (excavations and others) in Vila Vila Nova de Gaia (1908-2014).

2.

LEVANTAMENTOS ARQUEOLÓGICAS

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CARTAS

“Introdução à Arqueologia Portucalense” com a novidade de acompanhar o ensaio de um mapa esquemático com a localização dos sítios mencionados no texto (PINTO 1927). Deve-se todavia a Mendes Correia a primeira cartografia temática para a arqueologia do Grande Porto. A designada “Carta do Porto Pre- e Protohistórico do Instituto de Antropologia do Porto” (Fig. 2), que aquele investigador reproduziu em diversas publicações (CORREIA 1932; 1935; 1938) identifica um conjunto de sítios, achados e referências

O primeiro elenco de locais de interesse arqueológico deve-se ao já referido José Fortes na monografia Mea Villa de Gaya (FORTES 1909), onde apesar de documentar essencialmente a necrópole de Gulpilhares e o Castro do Monte Murado, cita outros sítios e achados e destaca o potencial de algumas referências toponímicas e documentais. Em 1927 Rui de Serpa Pinto, baseado no trabalho de Fortes para os achados de Gaia, publicou n´O Tripeiro uma

Fig. 2. Carta do Porto Pré- e Proto-histórico de Mendes Correia (CORREIA 1932, 1935, 1938). Fig. 2. Pre and protohistoric Oporto’s map (CORREIA 1932, 1935, 1938). 4

Estas estatísticas são essencialmente indicativas, pois a sua afinação implicaria a utilização de metodologias e a discussão de critérios que não interessam ao propósito deste artigo. No caso dos trabalhos mais antigos, verifica-se grande escassez de informação sobre algumas pesquisas, sendo também discutível o enquadramento dessas intervenções à luz dos modernos critérios científicos; nos trabalhos modernos, para além de uma grande diversidade de operações (acompanhamentos arqueológicos, sondagens e escavações, estudos de impacte arqueológico, registos feitos na sequência de achados ocasionais, etc.), a contabilização altera-se sensivelmente se forem considerados os trabalhos iniciados ou em curso em cada ano. Por outro lado, a recolha de dados assentou parcialmente no número de pedidos de intervenção registados na Direcção Regional do Património Cultural, o que não coincide necessariamente, na quantidade e nas datas, com os trabalhos realizados.

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toponímicas e documentais para a região portuense, incluindo-se na mesma carta um conjunto de elementos de Vila Nova de Gaia, de fundamentação todavia bastante imprecisa. Maior pormenor cartográfico, mas com poucos avanços em relação à precedente no que a Gaia se refere, apresenta a “Carta Arqueológica

da Região do Porto” (Fig. 3) organizada por Fernando Lanhas, director do Museu de Etnografia e História da Junta Distrital do Porto, provavelmente na década de 1960 5, e inserida por D. P. Brandão no verbete sobre a pré-história e arqueologia do Porto da Enciclopédia Verbo (BRANDÃO 1977).

Fig. 3. Carta Arqueológica da Região do Porto, de F. Lanhas (BRANDÃO 1977). Fig. 3. F. Lanhas’ Archaeological map of Oporto region (BRANDÃO 1977).

O desenvolvimento da arqueologia, do ensino universitário e dos conceitos patrimoniais a partir da revolução portuguesa de 25 de Abril de 1974 trouxeram à ordem do dia, em Vila Nova de Gaia como em muitos outros municípios, a necessidade de dispor de inventários actualizados que permitissem um esforço consequente de salvaguarda e investigação dos vestígios arqueológicos do passado. Em 1978 fundou-se o Centro de Estudos Arqueológicos de Gaia (CEAG), “que de imediato iniciou trabalhos conducentes à elaboração da Carta Arqueológica do Concelho” (GUIMARÃES 1992: 17). A partir de 1982 o projecto da “carta arqueológica” foi prosseguido pelo Gabinete de História e Arqueologia de Vila Nova Gaia (GHAVNG), organismo criado nesse ano e que absorveu o CEAG. Se bem que a acção do GHAVNG se tenha traduzido em numerosos trabalhos de campo, importantes intervenções arqueológicas e publicações de grande valia, como a revista Gaya (19831999), o objectivo de realizar um levantamento do património arqueológico com carácter sistemático à escala concelhia nunca seria, por dificuldades diversas, totalmente conseguido. Na sequência da Lei do Património Cultural nº 13/85 e para dar cumprimento ao Decreto-Lei nº

205/88, de 16 de Junho, a Câmara Municipal aprovou em 19.09.1988 o Inventário do Património Construído de Vila Nova de Gaia, no âmbito do qual foram recenseados e propostos para classificação não só numerosos imóveis como também mais de duas dezenas de monumentos e sítios arqueológicos do concelho (GUIMARÃES 1991, 1993a). Tal listagem, todavia, teve nos anos subsequentes uma eficácia desigual em termos da salvaguarda dos sítios, por falta de cobertura regulamentar municipal. Por outro lado, os esforços para prosseguir o levantamento sistemático da carta arqueológica municipal tiveram poucos resultados. Em inventário de 2000 enumeraram-se 56 “sítios e estações arqueológicas” (GUIMARÃES 2000b); porém, este inventário utilizou um critério muito lato, quer em termos cronológicos, quer pelo facto de incluir referências documentais sem localização determinada, o que igualmente limitou de algum modo a sua utilização prática. Finalmente, seria a revisão do Plano Director Municipal (PDM), iniciada em 2005 a proporcionar ensejo para uma revisão aprofundada do património arqueológico municipal, uma vez que as disposições legais em vigor obrigam a que aquele instrumento de gestão territorial identifique o patri-

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Talvez na altura em que, em colaboração com Domingos de Pinho Brandão procedeu ao inventário de objectos e lugares com interesse arqueológico, que publicaram entre 1965 e 1969 na Revista de Etnografia.

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mónio arqueológico, considerado como um bem de “interesse público de expressão territorial”, e estabeleça “os parâmetros urbanísticos aplicáveis e a delimitação de zonas de protecção” ao mesmo património arqueológico6. Dito por outras palavras, nos Planos Directores Municipais que vêm sendo revistos nos últimos anos, os bens imóveis arqueológicos não só devem constar de cartografia específica do PDM (independentemente de estarem ou não formalmente classificados pela Administração Central) como igualmente devem estar submetidos a normas particulares de salvaguarda na regulamentação do Plano, que constitui o principal instrumento operativo para a sua concretização. À data de início dos trabalhos de levantamento arqueológico realizados para informar este processo de revisão do PDM constavam da base de dados do Instituto Português de Arqueologia7 apenas 31 ocorrências arqueológicas para os 165 km2 de extensão do concelho de Gaia, informação manifestamente escassa, quer pela omissão de sítios e referências desde há muito conhecidos, quer pela inclusão de referências erradas ou sem localização precisa. Como resultado do levantamento arqueológico recensearam-se 196 sítios (tipificados como sítios inventariados, classifi-

cados e de potencial interesse arqueológico) e ainda 7 locais de valor geomorfológico (Fig. 4). Não entrando em aspectos metodológicos de menor interesse de momento, importa sumariar os principais critérios de inventário, tipificação e representação cartográfica dos locais propostos para integrar a carta de ocorrências arqueológicas do PDM (SILVA 2007). Desde logo o âmbito cronológico, questão essencial neste género de levantamentos. Foi decidido limitar globalmente o recenseamento aos sítios com cronologia compreendida entre a Préhistória e o século XVI, admitindo-se contudo excepções para alguns vestígios de épocas mais recentes, designadamente elementos de arqueologia industrial, para vestígios da época moderna e contemporânea cuja identificação resultou directamente da realização de escavações arqueológicas8 e ainda para todos os bens imóveis arqueológicos, independentemente da sua cronologia, registados nos relatórios de avaliação patrimonial dos projectos do Programa POLIS que se achavam já executados, nomeadamente os respeitantes às zonas da Fraga (SILVA & RIBEIRO 2002), Afurada (GUIMARÃES 2004), S. Paio/Canidelo (SILVA et al. 2005) e Frente Ribeirinha do Centro Histórico (CANHA et al. 2003).

Fig. 4. Carta Arqueológica de Vila Nova de Gaia (Fonte: SILVA 2007. Cartografia: GAIURB, EEM ). Fig. 4. Archaeological map of Vila Nova de Gaia (Source: SILVA 2007; map layout GAIURB, EEM) 6

Nos termos originais do Dec.-Lei nº 380/99, Artºs 4º - alínea b, 10º- alínea e, 15º- nº 3), que se mantiveram nas subsequentes revisões deste diploma até ao actual Dec.-Lei nº 80/2015, de 14 de Maio (ver em particular os artigos 8º e 17º). 7 Actual Direcção Geral do Património Cultural. Base de dados acessível presentemente pelo “Portal do Arqueólogo”. http://arqueologia.patrimoniocultural.pt. 8 O limite cronológico de um levantamento como este é sempre convencional. Naturalmente que os vestígios arqueológicos dos séculos XVII, XVIII ou XIX têm também muito interesse. Simplesmente, por uma questão operativa, entendeu-se conveniente limitar aos começos da Época Moderna, com as excepções referidas, o objecto do recenseamento. De outro modo, a quantidade de elementos da arquitectura civil e religiosa, por exemplo, tornariam o levantamento incomportável para o tempo de execução disponível, e necessariamente muito desigual à escala do concelho.

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dada no relatório publicado (SILVA 2007)10, passaremos em revista, com pequenas notas pontuais de enquadramento, a natureza e quantidade das informações arqueológicas disponíveis para cada época, não considerando os achados avulsos sem localização precisa. As mais antigas ocupações humanas encontram-se documentadas por uma série de achados de utensílios líticos feitos essencialmente na franja atlântica, em depósitos de cascalheiras designados convencionalmente como praias elevadas, a cotas inferiores aos 40 metros, como desde há muito noticiaram diversos autores (CORREIA 1935; CORTEZ 1946; COSTA & TEIXEIRA 1957; BRANDÃO 1962; MONTEIRO-RODRIGUES 2000), com importantes descobertas recentes na linha de costa entre a estação litoral da Aguda e a piscina da Granja, Arcozelo (ARAÚJO et al. 2005; MONTEIRO-RODRIGUES & GONZÁLEZ 2010). As escavações efectuadas em 1989 e 1992 na estação paleolítica do Cerro, Madalena, onde se documentaram traços de uma ocupação humana datável do Acheulense (MONTEIRORODRIGUES & CUNHA-RIBEIRO 1991), constituem até hoje as únicas realizadas em Gaia em jazidas desta cronologia. As sepulturas megalíticas neolíticas e os tumuli funerários da pré-história recente contam em Vila Nova de Gaia com 14 exemplares localizados, a maior parte dos quais identificados durante os trabalhos da carta arqueológica. Foram objecto de escavações arqueológicas apenas as Mamoas da Gestosa, Sandim (JORGE 1984) e do Cerro, Madalena (SILVA 1999, 2005), tendo-se entretanto descoberto as Mamoas da Raposa, em Pedroso e a Mamoa da Cama, em Santa Marinha (GUIMARÃES 1990; FRANÇA 1996). No levantamento localizou-se pela primeira vez com precisão a Mamoa de Matosinhos, São Félix da Marinha (ARAÚJO 1920; LIMA 1982; GUIMARÃES 1990; COSTA 2000a) e descobriram-se a Mamoa do Alto da Serra, Canelas; a Mamoa do Alto da Cimalha, Crestuma; as Mamoas 1, 2 e 3 de Santa Lomédia, Lever e os tumuli do Monte da Mamoa, da Gougeva e nº 2 da Gestosa, em Sandim (SILVA 2007). Deve ainda registar-se, no mesmo âmbito cronológico, a existência de um menir, se bem que deslocado da sua implantação original, o designado Menir de São Bartolomeu, em Pedroso (GUIMARÃES 1990; SILVA & SILVA 1994). Vestígios de locais com ocupação datável entre a pré-história recente e a proto-história foram identificados no Coteiro, limites entre Grijó e Nogueira da Regedoura (Santa Maria da Feira), na praia da Aguda, Arcozelo e no Balteiro 2, Vilar de Andorinho (MURALHA & MAURÍCIO 1995, 2004: 46), merecendo também registo a necrópole da

Os locais de valor arqueológico foram classificados por diferentes categorias, correspondentes ao seu estatuto de protecção legal e nível de confiança da informação disponível. Designámos como Zonas Arqueológicas Classificadas (ZAC) aquelas que se encontravam legalmente classificadas (Monumentos Nacionais, Imóveis de Interesse Público ou de Interesse Municipal), com as respectivas áreas de protecção legalmente consagradas; como Zonas Arqueológicas Inventariadas (ZAI) os sítios ou áreas de valor arqueológico confirmado e seguro face aos vestígios conservados e informação bibliográfica recolhida; e por fim como Zonas Arqueológicas Potenciais (ZAP) as de valor arqueológico presumido com base em elementos geográficos ou históricos mais gerais, ou seja, locais com orografia e toponímia sugestiva de interesse arqueológico, com referências documentais ou bibliográficas que não puderam ser confirmadas no terreno ou simplesmente com condições de acesso e visibilidade que não permitiram atestar aquelas indicações. Por fim, no que respeita à cartografia dos sítios, elemento fundamental para realidades cuja expressão espacial numa carta de salvaguarda pode ser decisiva para na sua preservação ou eventual afectação negativa em resultado de múltiplas intervenções sobre o território, foi proposto que os locais arqueológicos, numerados sequencialmente por mera ordem de catalogação, tivessem uma representação cartográfica que não fosse meramente feita por signos pontuais. Assim, ocorrências arqueológicas como mamoas, marcos e outros elementos cuja superfície não ultrapasse, em geral, os 10 metros foram representados no centro de um círculo com um diâmetro de 50 metros; áreas de significativa extensão, correspondentes por exemplo a povoados proto-históricos, quintas, complexos industriais ou simplesmente mais difusas por descontinuidade dos vestígios foram representadas por perímetros de geometria variável ou círculos e ovais correspondentes à área provável de dispersão dos vestígios; os edifícios religiosos (igrejas e capelas, uma vez que nos mosteiros se tentou sempre que possível considerar a respectiva cerca) foram cartografados com perímetro especial ou convencional (cerca de 25 metros medidos a partir de cada esquina); por fim os elementos arqueológicos de tipo linear, como caminhos e calçadas, foram assinalados com um buffer ou corredor com 40 metros de largura9. 3.

PATRIMÓNIO ARQUEOLÓGICO DE VILA NOVA DE GAIA: BREVÍSSIMO REPERTÓRIO

Numa apresentação necessariamente sumária dos monumentos e sítios arqueológicos identificados no território do concelho, que pode ser aprofun9

Naturalmente, estes critérios gerais foram ajustados, com a colaboração da equipa de SIG e cartografia da GAIURB, EEM, entidade responsável pela execução do Plano, em função da inserção geográfica concreta de cada local. 10 Para além da necessária contenção de referências já referida na nota 2, a actualização bibliográfica do levantamento de 2006-2007 foi restringida a casos muito pontuais. 11 Dispensamo-nos de citar para além desta bibliografia geral, para não alongar o texto, a relacionada com todos os trabalhos arqueológicos nos últimos anos feitos em diversos locais do Castelo de Gaia.

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Mais de um século de arqueologia em Vila Nova de Gaia: investigação e gestão de um património em risco

Idade do Bronze do Alto da Vela I, Gulpilhares, no mesmo local da fase romana de sepultamento no local (FORTES 1908, 1909; GUIMARÃES 1993a) e as referências a uma possível necrópole na Serra de Negrelos, Canelas (COSTA 1980, 1994), sem que todavia possa identificar-se o seu local com precisão. Na altura em que o PDM se encontrava em discussão pública foi registado ainda no inventário o sítio com fossas do Penouço, na Madalena, com cronologia geral talvez dentro do 2º milénio a.C. (GOMES 2007; BAPTISTA & OLIVEIRA 2008). No âmbito dos sítios documentados como da Idade do Ferro, por vezes com utilização prolongada até pelo menos à época romana, contam-se estações bem conhecidas como o Castro da Baiza, Vilar de Andorinho (SILVA et al. 1987; SÁ & PAIVA 1994; SILVA 1994: 60-1; LOPES 1996), o Castro da Madalena (CORREIA 1924a: 277; VELOSO 1963; GUIMARÃES 1993a; SILVA 1994: 63-4; QUEIROZ 1997, 2005; PEREIRA 2000), o Castro de Sandim (SOUSA 1957; SILVA 1994: 62-3), o Monte Murado, Pedroso/Perosinho (FORTES 1909; ARAÚJO 1920; SOUSA 1957; SILVA 1983, 1984, 1986; LIMA 1989; BELEZA 1991-1992; SILVA 1994: 61-2; TEIXEIRA et al. 2006) e o Castelo de Gaia (SILVA 1984, 1986; SILVA 1994: 63; GUIMARÃES 1995a; CARVALHO & FORTUNA 2000; CARVALHO 2003). A este elenco haverá que acrescentar também o Castelo de Crestuma, onde tem ocorrido cerâmicas da Idade do Ferro (SILVA & GUIMARÃES 2013a) e registou-se no levantamento ainda, por razões cautelares, o Outeiro do Castro, em Mafamude (MACHADO s.d.; ALMEIDA 1984, 1985; GUIMARÃES 1993a; SILVA 1994: 61), não obstante a inexistência de vestígios claros de ocupação antiga que justifiquem o topónimo e as referências literárias. A época romana não se encontra particularmente bem documentada. Para além dos diversos dos povoados fundados durante a Idade do Ferro cuja ocupação se prolonga durante os tempos do Império, como o Monte Murado, Baiza, Madalena, Castelo de Gaia, etc., apenas há a acrescentar a expressiva ocupação tardo-romana do Castelo de Crestuma (SILVA & GUIMARÃES 2011, 2013a, 2013b; SILVA 2014); os vestígios igualmente tardoantigos da Igreja do Bom Jesus de Gaia, Santa Marinha (GUIMARÃES 1989, 1995a, 1995b); a já mencionada Necrópole do Sameiro, em Valadares e o forno romano do Paranho, em Canelas (SILVA et al. 1984). Por outro lado, registam-se diversos troços de vias e calçadas consideradas de ascendência romana, atentas as habituais dificuldades de datação precisa destes elementos. São elas as calçadas da Senhora do Monte, Pedroso (MATOS 1937; COSTA 1980: 35-7; MANTAS 1996: 830-1), da Belavista, em Perosinho (SILVA 1993; LOPES 1996) e a de Brito (São Félix da Marinha) (FORTES 1909; MATOS 1937; LIMA 1982). No Monte de Santa Bárbara (Santa Marinha) alguns achados avulsos sugerem também a ocupação do cabeço em tempos

romanos (DUARTE 1987, 1994; GUIMARÃES 1995a, 2000a). Outros eixos viários antigos, notáveis pela sua tradição e importância local, foram igualmente registados no levantamento arqueológico, propondo -se que possam remontar às épocas medieval ou moderna, como sucede com as calçadas de Crasto, em Perosinho (ARAÚJO 1920; COSTA 2000d), Curvadelo, Serzedo (COUTO 2006), Novias, Vilar do Paraíso (GUIMARÃES 1986), Seada, Pedroso (MATTOSO 1993; COSTA 2003), a ponte e calçada das Menesas, Vilar de Andorinho (GOMES 1993a) e a Ponte e calçada dos Carros, em Sandim, freguesia na qual se inventariou igualmente, com o mesmo critério cronológico, a Ponte da Retorta (COSTA 1983; BAPTISTA 2000). A ocupação medieval da região gaiense parece ter tido pelo menos três pontos fortificados: no crasto da Seada, Pedroso e no já citado Castelo de Crestuma, a que naturalmente devemos acrescentar o Castelo de Gaia, por ora mais por tradição literária e historiográfica que por vestígios arqueológicos evidentes. Entretanto, outros elementos da arquitectura civil e religiosa merecem destaque, como o Paço de Campo Belo, que remontará pelo menos ao século XIV (CARDOSO 1983; CAMPO BELLO 1985; GUIMARÃES 1995a), a capela românica e Quinta de Quebrantões, aparentemente da mesma cronologia (ALMEIDA 1985; PESSOA 1986; GUIMARÃES 1992; COSTA 2004a) e um conjunto de igrejas e mosteiros de fundação seguramente anterior, como os bem conhecidos Mosteiros de Grijó, do séc. X (SOUSA 1984; PIZARRO 1987; COSTA 1993; AMARAL 1994; PAIVA & BOTELHO 2000), o de Vila Cova, Sandim, que parece remontar ao séc. XI (SILVA 1978; FONTES 1986; SANTOS 1989; BAPTISTA 2000; PEIXOTO 2003) e o Mosteiro de Pedroso, provavelmente da mesma centúria (RAMOS 1956; SILVA & MEIRELES 1982; SANTOS 1985; LIMA 1986; MONTEIRO 1993; BARROCA 2000, II: 282-3; MATTOSO 2002: 127; COSTA 2003). A maioria das igrejas paroquiais das freguesias de Gaia tem origens medievais, independentemente do seu aspecto actual, que decorre de numerosas obras e reconstruções de que foram objecto ao longo dos séculos. Deste modo, com excepção das sedes paroquiais que foram reedificadas fora do seu local original, esses templos apresentam elevado potencial arqueológico para a eventual detecção de pré-existências arcaicas ou de antigos espaços de sepultamento. Assim foram arroladas as matrizes Santa Marinha, que pode talvez remontar ao séc. IX (CAMPO BELLO 1984; MOREIRA 1987; GUIMARÃES 1995a, 2000c); Serzedo, com origens no séc. X (SILVA, J. 1978; MOREIRA 1987; COSTA 2000c); Sermonde, talvez assente sobre um antigo mosteiro do séc. XI (FERREIRA 1966; COSTA 2001a; MATTOSO 2002: 48); Oliveira do Douro (ALMEIDA 1985; MOREIRA 1987; COSTA, F. 2004a), Mafamude (MOREIRA 1987; COSTA & MOREIRA 2001) e 7


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Canelas (COSTA 1980), todas talvez da mesma cronologia. Com informação histórica que remonta ao século XII contabilizámos as paroquiais de Canidelo (MOREIRA 1963; CUNHA & FREITAS 1966; SARAIVA 1995, 1999), Madalena (RODRIGUES 1980; FREITAS & QUEIROZ 2005), Seixezelo (COSTA 2005), Gulpilhares (P. N. 1963; FERREIRAALVES 1983; COSTA 2004b) e Perosinho (ARAÚJO 1920; BARROCA 2000, II:177-8; COSTA 2000d). A par das sedes de paróquia também diversas capelas podem ter ascendência medieva, como sucede pelo menos com as de Vera Cruz do Candal, Santa Marinha (CORREIA 1978), São Bartolomeu, Pedroso (PEDROSA 1992; BELEZA 1991-1992; COSTA 2003), São Martinho, Vilar do Paraíso (GUIMARÃES 1986; PARREIRA et al. 2003), São Tomé, São Félix da Marinha (LIMA 1927; 1982; BRANDÃO 1991), Santiago do Monte, Oliveira do Douro (ALMEIDA 1985; CUNHA 2001; COSTA 2004a), Sirgueiros, e Crasto (ARAÚJO 1920; COSTA 2000b), em Perosinho e ainda porventura a designada Capela do Santo, em Lever (COSTA & BARROS 2003). Naturalmente, as cronologias apontadas são recolhidas na bibliografia disponível e referem-se apenas a dados documentais, sendo ainda assim discutíveis tanto para muitos destes templos, como para algumas das matrizes e capelas cuja fundação se atribui à Idade Moderna. Aspecto curioso é o que respeita à tradição, colhida em diversas freguesias, do local onde teriam estado erguidas as igrejas primitivas, antes da construção dos novos templos. Registámos várias dessas situações, por vezes com significativa verosimilhança arqueológica, como a respeitante ao sítio dos Pardieiros, aparentemente o local de implantação da mais antiga igreja de Arcozelo, provavelmente medieval (COSTA 1983; 1986; AMENDOEIRA 1994); à Carvalhosa, local onde terá estado a primitiva matriz de Sandim (SILVA, M. et al. 1984; BAPTISTA 2000); o Passal, onde a tradição igualmente aponta ter existido templo arcaico em Vilar de Andorinho (GOMES 1993a); a Igreja Velha, ou “Igreja desfeita” em São Félix (LIMA 1982); o Souto do Monte Grande, assento talvez da matriz original do Olival, e ainda porventura o sítio da Igreja Velha de Lever, com referências desde o séc. XII (MOREIRA 1987; COSTA & BARROS 2003). Da época moderna ficaram registados no inventário do Plano Director uma significativa quantidade de sítios, todos eles coincidentes com imóveis ou conjuntos edificados cujo potencial arqueológico vai normalmente a par do seu excepcional interesse arquitectónico e artístico. Entre os edifícios religiosos contam-se as matrizes comprovadamente construídas a partir do século XV em local diverso de eventual fundação anterior, como parece suceder com as de Vilar do Paraíso, pelo menos do séc. XVI (SANTOS 1985; GUIMARÃES 1986; PARREIRA et al. 2003); Vilar de Andorinho, templo seguramente erguido em local diverso da

matriz antiga e que poderá remontar aos séculos XVII ou XVIII (MOREIRA 1987; GOMES, J. 1993a; MATTOSO 2002: 54); Sandim, aparentemente do século XVII (SILVA et al. 1984; BAPTISTA 2000); Avintes, também do século XVIII (GONDIM 18901891; COSTA 1983; GOMES 1992) se bem que aqui com escassa ou quase nula acerca de fundações anteriores; Olival, cujo edifício actual remonta ao séc. XIX (BARBOSA et al. 1984; MOREIRA 1987; COSTA 2001b), admitindo que fosse diferente a localização do templo primitivo; e ainda a igreja paroquial de São Félix da Marinha, templo igualmente oitocentista e que poderá ir já na terceira localização diferente desde a primitiva igreja medieval (ALLEN 1973; LIMA 1982; MOREIRA 1987; BARROCA 2000, II: 1514-6; COSTA 2000a). Entre as numerosas capelas e outros templos que não encabeçam paróquias destacam-se pela sua maior antiguidade (independentemente do aspecto actual das construções, como observámos) a Capela de Nossa Senhora das Fontes, Serzedo, talvez do séc. XV (COSTA 1993; COSTA 2000c) e diversos templos cuja edificação pode remontar pelo menos ao séc. XVI, como é o caso da ermida de São Paio, Canidelo (MOREIRA 1987; LEÃO 1991; 2001; SARAIVA 1995; SILVA et al. 2005), da Capela de Santa Isabel, Canelas, porventura coeva do cruzeiro fronteiro, que ostenta a data de 1579, sendo certamente o mais antigo cruzeiro datado de Vila Nova de Gaia (COSTA 1980); da Capela do Senhor de Além, Santa Marinha, que também já existia pelo menos no séc. XVI (AZEVEDO 1881; CUNHA & FREITAS 1987; GUIMARÃES 1995a; SOEIRO et al. 1995) e ainda da Capela de São Bartolomeu, na mesma freguesia, que igualmente pode remontar ao séc. XVI (AZEVEDO 1881; LEÃO 1992; ARAÚJO 1992; GUIMARÃES 1995a; SILVA & RIBEIRO 2002). Para concluir o elenco das casas religiosas antigas em Vila Nova de Gaia, após termos citado as mais antigas, há que referir o Convento de Corpus Christi, Santa Marinha, de origens trecentistas (FERREIRA-ALVES 1984; GUIMARÃES 1995a); na mesma freguesia o Convento de Santo António do Vale da Piedade (AZEVEDO 1881; CORREIA 1994; 1995; SILVA & RIBEIRO 2002) e o Mosteiro da Serra do Pilar (VALE 1966; VILA et al. 1984; FIGUEIREDO & TAVARES 1995; GUIMARÃES 1999), ambos do séc. XVI, e o mais recente (séc. XVII) Convento de Nossa Senhora da Conceição/Quinta dos Frades, em Oliveira do Douro (AZEVEDO 1881; SANTOS 1985; ALMEIDA 1985; LEÃO 2000; COSTA 2004a). No campo da arquitectura civil, há também em Gaia diversos imóveis e conjuntos edificados onde além da valia patrimonial que lhes é conferida pela vetustez da sua história, reside igualmente um insuspeitado potencial arqueológico, não obstante as obras e transformações que essas construções certamente sofreram para chegar aos dias de hoje. Estão nesta situação por exemplo a Casa do Paço, Valadares, talvez do séc. XIII (VELOSO 1963; MEIRELES & 8


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VALE 1997); a também Casa do Paço em Canidelo, documentada desde o séc. XIV (MOREIRA 1963; MACHADO 1966; SANTOS 1966; GUIMARÃES 1984b; SARAIVA 1995, 1999) e a Quinta de São Salvador (Oliveira do Douro, com referências que remontam ao séc. XV, (ALMEIDA 1985; CUNHA E FREITAS 1984; LEÃO 1998; GUIMARÃES 2000c), podendo bem serem também anteriores ao séc. XVI a Casa do Maravedi, em Mafamude (SOVERAL 1994; NOGUEIRA 1998; GUIMARÃES 2000c, 2000d) e a Quinta do Paço, Avintes (GONDIM 1890-1891; SANTOS 1985; ALMEIDA 1988; PEREIRA 1989; GUIMARÃES 1993b; AMARAL 1993; GOMES 1998). Pelo menos do século XVI datarão o Solar dos Condes de Resende, Canelas (COSTA 1980; GOMES, J. 1993b; GUIMARÃES 2006); a Quinta do Outeiro, em Vilar de Andorinho (GOMES 1993a), a Quinta do Paço, em Olival (COSTA 2001b; AFONSO 2005) ou a Quinta da Formiga, entre Vilar do Paraíso e Valadares (GUIMARÃES 1986; PARREIRA et al. 2003). Uma curiosa construção de vigilância da costa, o Facho do Fojo, em Canidelo, terá também as suas origens pelo menos entre os séculos XVI e XVII, se não mesmo antes (VILA 1981; GUIMARÃES 1995a; QUEIROZ 2002). O levantamento arqueológico do PDM incluiu ainda um conjunto de 33 marcos de delimitação territorial, localizados em várias freguesias e datáveis globalmente entre os séculos XVI e XVII, relacionados principalmente com a demarcação de antigos coutos eclesiásticos e, mais modernamente, alguns deles servindo também de marco de divisão administrativa entre freguesias. Estes monumentos, muitas vezes desprezados enquanto ocorrências arqueológicas, têm um valor histórico e simbólico de grande alcance enquanto materialização de territórios e poderes distintos, e ainda em tempos recentes alguns desses marcos foram peças fundamentais em disputas de limites entre freguesias. O património industrial mereceu também registo entre os bens imóveis de interesse arqueológico, estando representados 16 complexos industriais, metade dos quais do sector da cerâmica mas englobando também a produção de papel, vidro, têxteis, destilaria e outros artigos. Como exemplar de maior antiguidade conta-se a designada Casa Ramos Pinto, em Santa Marinha, correspondente a uma oficina de produção de faiança activa entre os séculos XVII e XVIII, cujo estudo foi determinante para a identificação das produções daquele tipo de cerâmica em Vila Nova de Gaia durante a época moderna (ALMEIDA et al. 2001; SEBASTIAN 2010); mas também ainda do século XVIII foram naturalmente inventariadas, na mesma freguesia, as importantes fábricas cerâmicas de Santo António do Vale da Piedade (SOEIRO et al. 1995; SOUSA 2012, 2013) e do Cavaquinho (LEÃO 1992, 1999; SOEIRO et al. 1995; NASCIMENTO & PEREIRA 2010), instalações fundamentais para a compreensão do desenvolvimento da cerâmica portuense no trânsito do século

XVIII para o XIX (SOUSA 2013). Entre as unidades fabris já oitocentistas permita-se-nos destacar apenas, pela relevância do seu peso económico, social e artístico, os casos da Companhia de Fiação de Crestuma, em Lever (RIBEIRO 1997; ALVES 1999; TEIXEIRA 2014, 2015) e o Conjunto da Fábrica de Cerâmica das Devesas, Santa Marinha (SOEIRO et al. 1995; QUEIROZ & PORTELA 2001; PORTELA 2003), sobre o qual corre presentemente nas devidas instâncias um processo de classificação patrimonial. Um conjunto de 33 áreas foi recenseado na categoria de Zonas Arqueológicas Potenciais, segundo os critérios atrás expostos. Entre elas contam-se praticamente todos os locais acima referenciados como possível assento de igrejas paroquiais primitivas, o local correspondente ao antigo facho da Madalena, talvez dos séculos XVI ou XVII (PEIXOTO 1984; FREITAS & QUEIROZ 1997), uma eventual necrópole romana na serra de Negrelos, Canelas (COSTA 1980;,1994), a área onde terão sido erguidos os redutos militares oitocentistas do Cabedelo (MOREIRA s.d.; PINHO LEAL 1874; COELHO 1994; BARROCA 2001; SILVA et al. 2005), a Quinta de Vale de Amores, Santa Marinha, onde pelo menos desde o século XVI terá estado localizado o “degredo” dos empestados que vinham nas embarcações e que aí ficavam em quarentena (FERREIRA 1977; CORREIA 1994; GUIMARÃES 1995a; SILVA & RIBEIRO 2002), o Monte da Virgem (Oliveira do Douro/Vilar de Andorinho), o antigo Monte Grande dos documentos medievos, pontuado por vários achados nas imediações (ALMEIDA 1985; GUIMARÃES 1993a; LEÃO 2004; COSTA 2004a) e muitos outros sítios para os quais não foi possível obter informação mais precisa ou espacialmente localizada. Um caso particular relacionou-se com a forma de sinalizar (e mais importante que isso, sujeitar a formas mínimas de salvaguarda) a ocorrência de artefactos líticos pré-históricos na franja atlântica de Vila Nova de Gaia, documentada por diversos Autores (CORREIA 1935; CORTEZ 1946; COSTA & TEIXEIRA 1957; BRANDÃO 1962; MONTEIRORODRIGUES 2000; SILVA et al. 2005). Verificandose que tais utensílios aparecem usualmente em depósitos de cascalheiras a cotas inferiores aos 40 metros, em contextos geomorfológicos designados habitualmente como praias elevadas, utilizou-se este critério orográfico para propor a demarcação de uma ZAP, designada como Área de potencial arqueológico da frente atlântica, em todo o litoral gaiense. 4.

O PATRIMÓNIO ARQUEOLÓGICO NO PLANO DIRECTOR MUNICIPAL

Para além dos trabalhos de campo e correspondente investigação documental, que deram origem ao recenseamento dos 196 sítios arqueológicos já referidos, o Relatório Final deste estudo particular incluiu, entre outros anexos, proposta de 9


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medidas concretas a incluir no Regulamento do Plano Director (SILVA 2007, Anexo 4). Como repetidamente temos sublinhado (SILVA 2005, 2006, 2010a, 2010b; PINTO & SILVA 2010), no que respeita à salvaguarda dos valores patrimoniais arqueológicos, a peça mais decisiva do PDM não é o inventário patrimonial ou a respectiva cartografia, por maior que sejam o seu rigor e carácter exaustivo; mas sim as normas regulamentares que acompanham o Plano, onde se definem os particularismos das operações urbanísticas e outros intervenções sobre o território no que à salvaguarda dos bens arqueológicos concerne. Naturalmente, a política de gestão territorial a que o regulamento do PDM dá suporte legal não deverá assentar numa postura de matriz proibicionista ou de radical conservacionismo dos sítios e vestígios arqueológicos, prática não só inexequível como potencialmente geradora de conflitualidade a todos os níveis. Pelo contrário, o que uma moderna gestão patrimonial exige é uma atitude informada, aberta e esclarecida que habilite uma política preventiva que atenda às realidades e condicionalismos de cada situação, evitando destruições inadvertidas e assegurando sistematicamente a salvaguarda da informação. Desta forma, produz-se um fluxo de comunicação técnica que permite num distinto processo de análise, com a participação de outros interesses envolvidos, a tomada das decisões mais convenientes, que na larguíssima maioria dos casos admitem a destruição dos bens arqueológicos quando tal é requerido pelos projectos. Nesta linha, as propostas regulamentares efectuadas visavam essencialmente dotar o Município de mecanismos de avaliação prévia e controle da eventual afectação negativa sobre áreas arqueológicas das operações urbanísticas que promove ou licencia. Assim, foi definida a tripla tipologia de zonamento entre zonas arqueológicas classificadas (ZAC), inventariadas (ZAI) e potenciais (ZAP), como vimos, mas fazendo-se equivaler a estas últimas, para efeitos práticos, (a) “as áreas afectas a empreendimentos de grande magnitude, que impliquem escavações e revolvimentos de terra ou alterações da topografia original, como túneis, parques subterrâneos, abertura de novas vias e grandes arranjos urbanísticos”; e ainda (b) “os projectos de loteamento, urbanização ou edificação afectos a operações urbanísticas de significativa expressão, designadamente aqueles que mobilizem uma superfície térrea superior a um hectare” (SILVA 2007). Para colocar em prática a gestão preventiva subjacente à filosofia do levantamento da carta arqueológica, propusemos que o regulamento do Plano estabelecesse que em todas as áreas condicionadas (ZAC, ZAI, ZAP e situações equiparadas a ZAP)

“as intervenções que envolvam obras de edificação, demolição, operações de loteamento, urbanização, remodelação ou instalação de infra-estruturas e trabalhos de florestação ou remodelação de terrenos que careçam de licenciamento ou parecer municipal deverão ser sujeitas a parecer prévio dos serviços competentes da entidade licenciadora, que informarão da necessidade e condições de execução de eventuais intervenções arqueológicas de avaliação prévia, acompanhamento de obras ou outros trabalhos arqueológicos indispensáveis à aprovação e execução das intervenções pretendidas”

sem prejuízo naturalmente da intervenção dos órgãos de tutela da Administração Central no que se refere aos imóveis e conjuntos classificados. No caso de obras particulares sujeitas a comunicação prévia que não careçam de licenciamento, propôs-se uma avaliação caso a caso, sobre a necessidade e oportunidade de eventuais acções de salvaguarda ou minimização de quaisquer impactes negativos sobre vestígios arqueológicos que possam ocorrer (SILVA 2007). Esta metodologia, similar à definida pelo regulamento do Plano Director Municipal do Porto e que naquela cidade, com constrangimentos de dinâmica urbanística por certo não inferiores aos de Vila Nova de Gaia, vem sendo posta em prática, sem grandes sobressaltos, desde há cerca de uma década (SILVA 2006; 2010a), implicava como custo mais significativo a afectação de pelo menos um arqueólogo a estas tarefas, uma vez que os encargos das intervenções arqueológicas em obras particulares recaem, nos termos legais, sobre os seus promotores. E mesmo nestas últimas, verifica-se que na larga maioria dos casos, os custos de salvaguarda arqueológica são relativamente pouco expressivos no custo final da execução dos projectos, o que não obsta que as entidades municipais possam ter medidas de apoio e minimização de custos, como aliás sucede na cidade do Porto, considerando a natureza do património arqueológico como um bem essencialmente de interesse público. Todavia, estas propostas de tipificação de áreas arqueológicas e subsequente metodologia de salvaguarda, depois de discutidas e validadas quer por parte da GAIURB, EEM, quer por parte das entidades de tutela do património arqueológico no âmbito da Comissão Mista de Coordenação que acompanhou a elaboração do Plano, viriam a ser profundamente alteradas em sede do executivo municipal, por razões que não tendo sido resultantes de qualquer discussão ou pedido de esclarecimento, só podemos entender como não-técnicas.

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Aprovado por deliberação da Assembleia Municipal de 2 de Junho de 2005 e ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 19/2006 (Diário da República, 1ª série-B, nº 25, de 3 de Fevereiro de 2006). 13 Código Regulamentar do Município do Porto, Artº G/14º, nº 6. Disponível em https://cmpexternos.cm-porto.pt/. 14 Na altura ainda o Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR) e o Instituto Português de Arqueologia (IPA).

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mente inventariadas em Programas Polis superiormente aprovados e pelo menos uma constava já como sítio arqueológico na Base de Dados oficial da administração arqueológica (Código Nacional de Sítio nº 14637), mas naturalmente sem sucesso.

Tais alterações incidiram no inventário de sítios arqueológicos e respectiva cartografia, tendo sido liminarmente eliminadas as 33 Zonas Arqueológicas Potenciais definidas no quadro do levantamento; mas também ao nível do regulamento do Plano, de onde desapareceu quase todo o articulado que havia sido proposto e nomeadamente a previsão de mecanismos de avaliação prévia do risco de impacte negativo das operações urbanísticas, substituído por um conjunto de normativas vagas e equívocas, no geral idênticas às que são sistematicamente glosadas na maioria dos PDM de segunda geração publicados nos últimos anos na Região Norte (SILVA 2010b) e na prática ineficazes e rapidamente esquecidas, como a realidade o vem demonstrando desde então. Infelizmente, as mesmas entidades de tutela do património cultural que durante a fase de elaboração do Plano se haviam revelado atentas e criteriosas, validando a metodologia e propostas apresentadas, acabaram por validar igualmente, aparentemente sem objecções, as significativas alterações finais impostas pelos decisores políticos. Pela nossa parte, tentamos ainda na subsequente fase de discussão pública recuperar as zonas arqueológicas cegamente expurgadas, tanto mais que 13 delas se encontravam já anterior-

5.

A ACTIVIDADE ARQUEOLÓGICA EM VILA NOVA DE GAIA: OUTROS INDICADORES

Regressando à observação do que tem sido, desde 1908, a actividade arqueológica no concelho, será certamente de interesse analisar alguns indicadores gerais15. No gráfico da Figura 1 verifica-se o grande incremento de trabalhos arqueológicos a partir essencialmente da viragem do século XX para a actual centúria, explicado pela emergência de intervenções preventivas ou de minimização de impactes negativos em áreas classificadas. Deste modo, considerando que a larga maioria das duas dezenas de imóveis e conjuntos classificados se situam em área urbana ou do próprio “centro histórico” da cidade, compreendese bem que perto de metade das cerca de 160 intervenções arqueológicas registadas até 2014 tenham tido lugar na freguesia de Santa Marinha, estando as restantes dispersas, com valores ínfimos, pelas restantes freguesias do município (Fig. 5).

Fig. 5. Trabalhos arqueológicos no concelho de Vila Nova de Gaia. Distribuição por freguesias (1908-2014). Fig .5. Archaeological projects (excavations and others) in Vila Vila Nova de Gaia, by parishes (1908-2014).

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Os dados apresentados têm como data geral de referência o final de 2014. O levantamento de trabalhos arqueológicos efectuado, para o qual cumpre-nos agradecer a boa colaboração de Leonor Sousa Pereira, da Direcção Regional de Cultura do Norte, não pôde ainda ser tão exacto quanto desejaríamos, quer pelo facto de assentar, para as intervenções mais recentes, apenas em autorizações concedidas (sendo incerta a realização de algumas), quer por alguma imprecisão de localização no que se refere a alguns trabalhos de acompanhamento arqueológico de ferrovias, eixos rodoviários, instalação de infraestruturas de larga extensão, etc. Não obstante, cremos que tais imprecisões não têm significado estatístico particular. 16

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António Manuel S. P. Silva

Analisando o perfil dos arqueólogos responsáveis por esses trabalhos (Fig. 6), vemos, pela mesma razão, que 80% são profissionais enquadrados por empresas de prestação de serviços de arqueologia ou praticantes liberais; a pequena proporção de professores universitários ou de intervenções dirigidas por arqueólogos da Autarquia, ou do Gabinete de História e Arqueologia de V. N. Gaia17 referemse a trabalhos que com poucas excepções18 tiveram lugar há mais de uma década, até aos começos da fase “comercial” da arqueologia gaiense. Fig. 8. Tipologia de trabalhos arqueológicos em Vila Nova de Gaia (2000-2014). Fig. 8. Kind of Archaeological projects in Vila Vila Nova de Gaia (2000-2014).

ram de 4% para 32% e as acções preventivas no centro histórico e outras áreas classificadas passaram de 42% para 66%. Gostaríamos de pensar que a diminuição de achados ocasionais, trabalhos de emergência ou “salvamentos arqueológicos” (que passou de 19% para 1%) possa dever-se a uma atitude mais preventiva das práticas patrimoniais dos últimos anos, mas provavelmente a redução daquele valor resultará mais do crescimento exponencial das intervenções arqueológicas suscitadas pelas operações urbanísticas em áreas classificadas. Os dois últimos indicadores que tentámos apurar apresentam talvez um maior grau de incerteza, mas certamente sem afectar a panorâmica geral que aqui nos interessa. Referem-se à localização dos “espólios” (i.e. os objectos ou restos de artefactos recolhidos nas intervenções arqueológicas) e à publicação ou divulgação por outras formas dos resultados dos trabalhos arqueológicos. No que se refere aos espólios (Figuras 9 e 10), calculámos que das acções arqueológicas levadas a cabo entre 1908 e 1999, possam estar à guarda do Município menos de um terço desses bens móveis19, encontrando-se uma parte similar com os arqueólogos que realizaram esses trabalhos e algum espólio aparentemente em local incerto; já para o período 20002014 só uns 4% desses bens terão sido entregues para depósito na Autarquia, achando-se a maior parte na posse das empresas ou arqueólogos que realizaram as intervenções e uma parte significativa porventura noutros locais20. A questão da publicação ou divulgação por outras formas dos resultados das intervenções, não obstante constituir um imperativo ético e obrigação legal dos arqueólogos, tem sido um verdadeiro calcanhar de Aquiles da arqueologia portuguesa, nomeadamente a partir da década de 1990 com o crescimento

Fig. 6. Responsáveis pelos trabalhos arqueológicos no concelho de Vila Nova de Gaia (1908-2014). Fig. 6. Archaeological projects’ directors in Vila Vila Nova de Gaia (1908-2014).

Na mesma linha, é interessante analisar a tipologia dos trabalhos arqueológicos em dois períodos: o compreendido entre 1908 e 1999 e o que medeia entre os anos de 2000 e 2014 (Figuras 7 e 8). Não obstante a diferença entre ambos os intervalos cronológicos e a assimetria do volume de trabalhos desenvolvidos num e outro, vemos que as acções enquadráveis em pesquisa científica programada caíram de 35% para 1% nos últimos quinze anos; enquanto os estudos de impacte ambiental e levantamentos prévios aumenta-

Fig. 7. Tipologia de trabalhos arqueológicos em Vila Nova de Gaia (1908-1999). Fig. 7. Kind of Archaeological projects in Vila Vila Nova de Gaia (1908-1999). 17

Instituição entretanto substituída pelo Gabinete de História, Arqueologia e Património dos Amigos do Solar Condes de Resende – Confraria Queirosiana. Como por exemplo a intervenção que vem sendo realizada pelo GHAP no Castelo de Crestuma, desde 2010. Convém esclarecer que nos termos legais (Lei nº 107/2001 e Regulamento de Trabalhos Arqueológicos, Dec.-Lei nº 164/2014) o espólio arqueológico exumado em trabalhos arqueológicos constitui património nacional e compete à Administração Central definir o local (museu ou outra instituição) da sua incorporação definitiva. Na prática, todavia, pelo atraso no seu estudo ou realização de relatórios por parte dos arqueólogos e também pela falta de instituições depositárias acreditadas, o espólio de muitas intervenções acaba por ficar muitos anos à guarda dos arqueólogos ou empresas de arqueologia. Em Vila Nova de Gaia, o Solar dos Condes de Resende funciona como depósito temporário (uma vez que nunca foi formalizada a incorporação definitiva) do espólio das intervenções efectuadas no município. 20 O cômputo destes dados, que certamente requereria um inquérito sistemático aos responsáveis pelos trabalhos, resulta principalmente do nosso conhecimento pessoal e de algumas informações particulares, mas mais uma vez acreditamos que os valores globais corresponderão à data de referência do levantamento. 18 19

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exponencial dos trabalhos arqueológicos (BUGALHÃO 2011; PINTO & SILVA 2010; SILVA 2010a). O tema é complexo e exigiria uma discussão prévia quer sobre as formas actuais de publicação e divulgação; quer sobre a crónica falta de meios para a edição convencional de estudos monográficos ou dos relatórios técnicos, por vezes longos e complexos, que são produzidos em consequência de certos trabalhos de arqueologia.

dos monográfica ou parcialmente talvez não mais que 4% dos trabalhos (Fig. 12).

Fig. 11. Publicação dos resultados dos trabalhos arqueológicos em Vila Nova de Gaia (1908-1999). Fig. 11. Publication of the results of the Archaeological projects in Vila Vila Nova de Gaia (1908-1999).

Fig. 9. Depósito do espólio proveniente dos trabalhos arqueológicos em Vila Nova de Gaia (1908-1999). Fig. 9. Deposit location of the finds from Archaeological projects in Vila Nova de Gaia (1908-1999).

Fig. 12. Publicação dos resultados dos trabalhos arqueológicos em Vila Nova de Gaia (2000-2014). Fig. 12. Publication of the results of the Archaeological projects in Vila Vila Nova de Gaia (2000-2014).

Fig. 10. Depósito do espólio proveniente dos trabalhos arqueológicos em Vila Nova de Gaia (2000-2014). Fig. 10. Deposit location of the finds from Archaeological projects in Vila Vila Nova de Gaia (2000-2014).

6.

Não interessando para aqui tal discussão, ainda assim ensaiámos o cálculo do que poderíamos talvez traduzir como uma espécie de índice de publicação das observações e conclusões das intervenções arqueológicas, mais uma vez baseados mais no nosso conhecimento pessoal da bibliografia e do meio arqueológico que em qualquer inquérito formal. Por esta forma, estimámos que dos trabalhos executados até 1999 se achem publicados monograficamente cerca de 38%, tendo talvez uns 19% sido objecto de publicação parcial (notícias preliminares, comunicações a congressos, artigos de imprensa com algum detalhe, etc.); de uns 12% conhece-se apenas o relatório técnico21 e nas restantes intervenções encontram -se inéditas as respectivas observações e achados (Fig. 11). Imagem bem diferente resulta da apreciação global feita para o intervalo 2000-2014, verificando-se que o boom da arqueologia em Gaia não foi minimamente acompanhado por igual investimento na difusão dos resultados. Na verdade, de perto de 80% das intervenções só temos indicação da existência de relatórios técnicos, achando-se publica-

ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E PATRIMÓNIO ARQUEOLÓGICO: REGRESSO AO PLANO DIRECTOR MUNICIPAL

Após o processo final de consulta pública e validação das alterações finais, o Plano Director Municipal de Vila Nova de Gaia foi publicado em Diário da República em 12 Agosto de 2009 (Aviso n.º 14327/2009) e entrou em vigor no dia seguinte. A listagem das zonas arqueológicas classificadas e inventariadas (totalizando 163 ocorrências) consta do Anexo II do respectivo Regulamento, que reserva o artº 130º à tipificação das Zonas de Valor Arqueológico, referindo-se o artigo anterior à ocorrência ocasional de vestígios arqueológicos. Os sítios de interesse arqueológico constam de duas séries cartográficas do PDM: a Carta de Salvaguardas da Planta de Ordenamento (a par de outros elementos que requerem protecção ou de algum modo condicionam determinadas intervenções no território), e a Carta do Património Arqueológico (Fig. 4), que lhes é exclusivamente dedicada. Entre os elementos que acompanham o Plano contam-se também o relatório final do levantamento arqueológico e geomorfológico (SILVA 2007) e as respectivas fichas de inventário22.

21

Por princípio não consideramos os relatórios técnicos formalmente como “publicação”, atendendo a que esta, por definição, deve estar disponível a um público alargado e adoptar um estilo e estratégia comunicacional algo diversa de um memorando técnico-científico; não obstante, a moderna disponibilização em linha e com acesso livre de relatórios de arqueologia poder matizar um pouco, admitimos, a nossa visão mais convencional. 22 Todos estes documentos estão disponíveis em linha: http://www.gaiurb.pt/pdm.htm.

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Após uma vigência de perto de cinco anos, para que serviu o PDM no que respeita à salvaguarda do património arqueológico? Estamos em crer que para muito pouco. As alterações de última hora introduzidas nas propostas já validadas internamente e externamente por parte das entidades oficiais com competência na matéria não só deixaram sem qualquer regime de protecção regulamentar as 33 zonas arqueológicas potenciais (algumas das quais foram entretanto destruídas por obras diversas, sem que nunca venha a poder confirmar -se os vestígios ou referências arqueológicas que as recomendavam); como nem sequer garantiram procedimentos cautelares às zonas arqueológicas inventariadas, que tem sido objecto de numerosas intervenções urbanísticas com mais que provável afectação negativa de elementos arqueológicos e em alguns casos sofrido mesmo destruição completa ou muito extensiva. Exemplificamos apenas com duas situações, certos que muitas mais encontraríamos se sistematicamente visitássemos hoje os 163 locais arqueológicos que sobreviveram até 2007. Um dos casos, que consideramos como um dos maiores atentados patrimoniais cometidos nos últimos anos diz respeito ao promontório aplanado onde foi construída a Seca do Bacalhau, junto à foz do rio Douro, em Canidelo (Fig. 13). A longa sequência de ocupação humana desta elevação, parece iniciar-se em tempos longínquos da préhistória, tendo em conta os achados de objectos em pedra lascada feitos nas proximidades. A altitude e posição estratégica do promontório levou a que na arriba se edificasse, provavelmente nos séculos XVII ou XVIII, um facho, espécie de farol para orientação dos navios e defesa da costa, que pode ver-se ainda representado na cartografia setecentis-

ta. No período das guerras liberais (1833-1834) mais uma vez a estratégia militar elegeu o monte das Pedras Altas e o Cabedelo como pontos estratégicos de controle da entrada do Douro e de ataque às posições liberais instaladas na cidade do Porto. Aí se instalou, designadamente, o reduto miguelista do Cabedelo, um reduto fechado, poligonal e com fosso que estava armado com quatro canhoneiras e uma plataforma de morteiro (COELHO 1994; SILVA 2010; 2011; GUIMARÃES & SILVA 2011). Certamente na sequência deste reduto, foi posteriormente edificado o Forte das Pedras Altas, que surge representado em cartografia diversa entre o século XIX e os inícios do séc. XX e terá resistido, ao que parece, até à década de 1940. Por fim, a história recente do local foi marcada pelas diversas construções destinadas à secagem do bacalhau. O complexo industrial conhecido genericamente como “Seca do Bacalhau” corresponde a três conjuntos de edifícios, de funcionalidade similar no que se refere ao tratamento do pescado mas articulados com outras tantas fases da utilização do sítio para a seca do bacalhau, desde provavelmente os inícios do século XX até aos começos da década de 1990, quando cessou a actividade industrial (Fig. 13). Na sua fase de maior expansão e expressão arquitectónica, correspondendo à “seca nova” (edificada na sua maior parte entre 1948 e 1959, com outras obras que se estendem até meados da década de 1970), o complexo envolvia mais de uma dezena de edifícios, destacando-se os armazéns de grandes dimensões, o tanque exterior, a portaria, administração, refeitórios, creche, capela exterior, etc. (SILVA et al. 2005; SILVA 2011; GUIMARÃES & SILVA 2011).

Fig. 13. O monte da Seca do Bacalhau (Canidelo), uma oportunidade perdida da arqueologia gaiense? [Foto: G. Guimarães, 1993]. Fig. 13. Codefish factory hill, at Canidelo: a lost opportunity for Gaia’s archaeology? [Photo: Gonçalves Guimarães, 1993].

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Actualmente, o monte da Seca do Bacalhau encontra-se totalmente descaracterizado por uma vasta urbanização, em obra que iniciada bem depois da entrada em vigor do PDM, ainda que porventura o licenciamento possa ter sido anterior. Perderam-se num só local pelo menos três ou quatro elementos patrimoniais de elevado interesse: a memória de um complexo fabril de grande importância local, regional e nacional ao longo do século XIX, testemunho de uma actividade industrial quase extinta; a possibilidade de recuperar informação e porventura resgatar para conhecimento e fruição dos presentes uma fortificação oitocentista e talvez a principal (e única) evidência arquitectónica do Cerco do Porto; a possibilidade de localizar um dos poucos fachos marítimos de Época Moderna; e porventura vestígios materiais das mais antigas ocupações pré-históricas da região. Demasiados prejuízos e sobretudo totalmente evitáveis. Não questionamos sequer o projecto ali desenvolvido; bastava ter cumprido o regulamento do PDM que estabelece que nas zonas de valor arqueológico consagradas no PDM, como era o caso, “são interditas as operações urbanísticas e quaisquer acções que possam destruir ou prejudicar os valores arqueológicos identificados, excepto se forem impostas medidas de minimização de impactes negativos ou de conservação dos mesmos que se mostrem adequadas” (Regulamento, Artº 130º, nº 4). Seguramente que a realização de quaisquer

trabalhos arqueológicos (prospecção, sondagens, acompanhamento de obra, etc.) teria sido totalmente compatível com a execução do projecto e, ainda para mais, os seus custos provavelmente irrelevantes em relação ao investimento efectuado, mas na realidade perdeu-se ali, por ignorância, insensibilidade, inércia ou receio de melindrar quaisquer poderes, a oportunidade única de verificar um dos sítios gaienses com maior potencial arqueológico. A segunda situação, tanto ou mais gravosa, diz respeito ao “centro histórico” de Gaia, cuja espessura arqueológica como berço do aglomerado urbano desde tempos proto-históricos, confirmada pelos resultados de numerosas intervenções, torna dispensável justificação particular (Fig. 14). Na realidade, o perímetro do centro histórico da cidade, se bem que aprovado pelo Município já em 1984 (GUIMARÃES 1984a, 1994), nunca foi objecto de qualquer classificação formal que desse substância à excepcionalidade da área delimitada. Mais recentemente, na sequência da classificação pela UNESCO do centro histórico do Porto como Património Mundial (1996), foi estabelecida em 201023 a Zona Especial de Protecção daquele conjunto classificado, que abrangia a generalidade do centro histórico de Gaia; todavia a delimitação dessa ZEP foi nesse mesmo ano contestada em Tribunal Administrativo pelo município gaiense, levando à suspensão, por decisão judicial, da eficácia dessa mesma zona de protecção.

Fig. 14. Vista geral do centro histórico de Gaia [Foto: Autor, 2007]. Fig. 14. General view of Vila Nova de Gaia’s historic center [Photo: Author, 2007]. 23

Aviso nº 15173/2010 (DR, 2.ª série, n.º 147, de 30 de Julho de 2010).

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Entretanto, o Centro Histórico de Gaia, com esta mesma designação, ficou registado como Zona Arqueológica Inventariada no Plano Director Municipal, com os respectivos limites devidamente assinalados na Carta de Salvaguardas da Planta de Ordenamento e na Carta do Património Arqueológico, o que significa naturalmente, à luz do artº 130º do Regulamento do PDM, atrás reproduzido, que quaisquer operações urbanísticas “que possam destruir ou prejudicar os valores arqueológicos identificados” obrigam à previsão de medidas de “minimização de impactes negativos ou de conservação dos mesmos”. Esta é a doutrina e a lei, mas não a prática, infelizmente. No centro histórico de Gaia o licenciamento urbanístico tem sistematicamente ignorado esta disposição regulamentar e apenas os projectos localizados no perímetro das zonas especiais de protecção dos imóveis classificados (como a Igreja de Santa Marinha, o convento do Corpus Christi, o Castelo de Gaia e outras) têm sido objecto de medidas cautelares, e apenas porque o respectivo licenciamento requer parecer vinculativo do orgão de tutela da Administração Central24.

arqueológico; não possibilita que os serviços municipais apoiem devidamente, por falta de informação adequada, os requerentes de projectos situados em áreas de condicionamento arqueológico, o mesmo se passando com os arqueólogos que promovem esses trabalhos; não assegura, na grande maioria dos casos, o retorno ao Município da informação e dos espólios produzidos pela actividade arqueológica realizada no concelho; e impede quase por completo (desde logo por falta de informação) acções de valorização do património arqueológico (móvel ou imóvel) resultante dos trabalhos efectuados. Pode perguntar-se para rematar: o que ganham, nestas condições, o município e a comunidade com tanta actividade arqueológica (referindonos principalmente às intervenções comerciais) desenvolvida no seu território? Esta será porventura a questão central de um debate urgente que nos é imposto tanto pelo respeito pelo passado como pela dignificação do nosso futuro comum.

7.

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BIBLIOGRAFIA CONCLUSÃO

O fracasso do PDM, no que à salvaguarda do património arqueológico diz respeito, traduz-se em primeira instância pelo objectivo incumprimento, por inércia ou insensibilidade, das normas regulamentares que o próprio plano consagra. Esta circunstância é profundamente gravosa face aos riscos a que os sítios arqueológicos estão sujeitos; e se a vontade política impediu a previsão de medidas cautelares para os depósitos estratificados da frente atlântica onde correntemente se detectam artefactos indiciadores de ocupação pré-histórica, a destruição do monte da Seca do Bacalhau ou as numerosas intervenções que sem qualquer dúvida tem destruído ou afectado negativamente as préexistências multiseculares do centro histórico responsabilizam não só os operadores técnicos, que talvez se vejam sem meios para intervir de forma adequada, mas sobretudo os autarcas a quem cabe a gestão territorial do município. Sendo esta a principal tragédia patrimonial – porque estão a perder-se elementos certamente irrecuperáveis – não é a única consequência de muitos anos de políticas desenvolvimentistas que vêm os bens arqueológicos ora como uma espécie de hobby de eruditos ou bibelot para enfeitar museus, ora como constrangimento dispensável à construção e ao crescimento urbano. Na verdade, ao demitir o município de responsabilidades próprias e contornar o que teria sido a normal e moderna implementação de estruturas de gestão patrimonial, o Plano Director não permite, salvo casos muito excepcionais, qualquer intervenção do Município na salvaguarda do património 24

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