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Diรกrio de Bordo



DiáriopordeTeresaBordo Pimentel 1ª edição 2015


Projeto gráfico: Renata Carvalho Capa: Renata Carvalho Imagens: Teresa Pimentel Revisão: Josinaldo Barbosa Elizete Coelho Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Pimentel, Teresa Diário de Bordo / Teresa Pimentel 1ª ediçao - Pernambuco: Compainha das Letras 2015 1. Familia 2. Alzheimer 3. Biografia ISBN: 85-7164-250-8

Índice para catálogo sistemático: 1. Alzheimer: Família : Biografia : 355.43092


Apresentação

Ela tem Alzheimer, Ele...caduquice, só que já estão junto a tanto tempo que o tal de Alzheimer já desistiu de fazer um esquecer do outro, pobre do Alzheimer nunca teve a menor chance. Mas...e o resto? O resto podemos ter o prazer de ler em Diário de Bordo, leve, lúdico e bem humorado, nos traz a convivência de quem não pode esquecer nada, com eles que não estão nem pouco preocupados em lembrar. Trazendo um ambiente onde as emoções estão ali, misturado a coisas que estão a um passo de perder o prazo de validade. Diário de Bordo mostra a trajetória de nossos “heróis da resistência”, enfrentando com carinhosa displicência o entardecer de suas vidas sem esquecer sua cumplicidade, seu amor e vigília. Com a única pretensão de que os ausentes tivessem a chance de participar da vida de seus heróis, Diário de Bordo, que como já era de se esperar, não tem nenhuma pretensão

literária, nasce na rede social, nas mãos de Teresa Pimentel, para tentar preencher o vazio desses ausentes e ansiosos corações. Uma rara felicidade para eles (filho e parentes), que mesmo no improvável, continuam bebendo dessa fonte inesgotável, Ela e Ele. Assim, preparem-se para rir e se emocionar junto com Ela, Ele e Eles. Num ambiente tão cotidiano quanto o meu ou o seu, em momentos tão imprescindíveis quanto os nossos, onde o surpreendente está no tão somente simplesmente. Ah! o Alzheimer...acabei me esquecendo dele. Celio Canuto



Diário de Bordo

12 de maio de 2014

Diário de bordo é um instrumento utilizado na navegação, qualquer que seja ela, para registro dos acontecimentos mais importantes - Alzheimer... Então vamos nessa, sono pouco e inquietação demais. Uma grande viagem, um grande vôo, caminho comprido, incompreensões e principalmente autoconhecimento! Linda borboleta e ela cada vez mais linda! Vamos juntas, quero voar com você!

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Diário de Bordo

03 de junho de 2014

Diário de bordo: hoje, sempre aqui com meus botões, me veio o verbo cuidar, e imediatamente o adjetivo: cuidador, cuida+dor, aquele que trata, que é zeloso, aquele que é cuidoso, que nos deixa confortável, aqueles que nos dão colo! nossos velhinhos estão ótimos e graças a uma equipe linda de cuidadores: nosso grande amigo e Dr. Alexandre Mattos, com sua tranquilidade, conhecimento e carinho; nossa bela Dalva, um anjo de sapiência, ternura e calma; Sandra, dedicação, disponibilidade e muita vontade e Gracita, com toda a sua efusividade (que as vezes até me enlouquece! ), alegria e leveza!, num sabem eles que estão cuidando de minha dor também!

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Diário de Bordo

19 de junho de 2014

Diário de bordo: são joão da fisio, não queriam ir, cansados, desanimados, “não dormi direito minha filha! sua mãe "acordou” de madrugada e se dizia perdida!” A vida é assim... altos e baixos, às vezes é ele que está tão rabugento e às vezes é ela que está tão longe de mim, distante! Dá sim um desânimo, uma sensação de nadar, nadar e nada dar... E ela: “minha filha, eu estou com alzeheimer?” e eu nessa mania de falar na lata, (oco, vazio, pausa), ainda não minha velha! E seguimos com mais uma tarde deliciosa! Ai D. Daisy e S. Geraldo, vocês nem imaginam o quanto me educam!!!

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Diário de Bordo

28 de junho de 2014

Diário de bordo: hoje, ela fez 89 anos! Ela (estava especialmente ligada e atenta): Minha filha, eu nunca imaginei que faria 89 anos, mas aí a velhice vai chegando devagarinho que a gente nem percebe...E aí a gente envelhece numa nice! Huum...a cerveja tá uma delícia! Toma Geraldo, ela parece que não tem álcool, mas tem, huum... toma meu velho!" E meu velhinho, naquele seu ar de deboche característico, eu queria mesmo era experimentar um cigarrinho de maconha, mas o danado é que ninguém deixou! Ah esses meus velhinhos! Nossos parabéns minha velha!

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Diário de Bordo

13 de julho de 2014

Diário de bordo: Sobre o jogo do Brasil... Eu: Ei meu velho tá assistindo o jogo?! Ele: Tô minha filha, tô aperriado, eu nunca vi o Brasil assim!" E nesse exato momento eu me arrependi profundamente de não ter torcido pelo Brasil! Ficando aquela angústia, um sentimento de não contido, de impertinência, de não poder mesmo presentear meu velhinho com esse evento, fiquei triste por ele, que além de ter vivenciado as vitórias do Brasil nos campeonatos mundiais de futebol, ele apostou e se empenhou num país muuito melhor, mas justo, mas digno. Onde, entre outras coisas, o futebol era uma alegria compartilhada, uma brincadeira autoral, uma arte. Perdoe-me, não fomos capazes, pioramos e muito o país, pioramos e muito a nossa realidade! Perdoe-me meu velhinho! 9


Diário de Bordo

17 de julho de 2014

Diário de bordo: hoje a pressão dele chegou a 22 por 11, a caminho da emergência cardiológica... Gracita: Ei papai você tá preocupado com alguma coisa, tem algo lhe aperreando, teve alguma contrariedade, fez algum esforço? Ele: Trepei com sua mãe ontem! Sabe como é né minha filha, um esforço danado! Gracita: Papai você não pode! por isso sua pressão subiu! Ele: Claro, alguma coisa tem que subir!! Gracita: E se você tiver um troço? Ele: Aí eu morro feliz, em cima da galega!

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Diário de Bordo

23 de julho de 2014

Diário de bordo: hoje foi difícil levá-los pra fisio! mesmo porque ele é a pessoa que mais se lembra da noite que passou!.Ele, “ai não quero ir pra fisio... não dormi direito, sua mãe tava muito inquieta!” Ela, de olhinhos mais fechados do que nunca, não esboça nem palavras nem reação! E eu “vamos nessa meu velho vai ser bom pra gente!". Claro que é super difícil ser e não ter muito a consciência do que se é, mas tem que ser. Aos trancos e barrancos, ele é a lucidez dela, a proteção dela; ele é cambaliantemente o norte dela; ele é inseguramente o porto seguro dele e dela; ele é o possível instante de lembrança dele e dela, e o mais louco, agora mais do que nunca, eles são nosso farol já distante, nossa âncora quase perdida nos mares, nossa "ùltima gravidez", ele é S. Geraldo e ela D. Daisy! é muuito bom tê-los! 11



Diário de Bordo

25 de julho de 2014

Diário de bordo: eles estavam tão direitinhos... minimamente e suficientemente conectados, ... apesar dos olhinhos fechados e da P.A. dele continuar oscilante... mas a vida é oscilante, né mesmo?! Hoje, foi aniversário da filha mais velha ou pelo menos da primogênita, Gracita, e ela (nossa velhinha), lembrou e comentou com a cuidadora: "hoje é aniversário de Gracita!", muito embora, ao longo do dia, ela irremediavelmente esqueceu! Aliás, esquecer tem sido imperativo na nossa realidade, tem sido visceral, e absolutamente íntimo, se constituiu em um estado de espírito mesmo. Por outro lado, as relações se tornam mais intensas, mas transparentes, muito menos superficiais porque você não tem mais o depois, é agora ou nunca mais. E aí me veio a idéia de uma conquista e uma constatação imensa, a amizade e o amor entre duas irmãs, eu e

Gracita, onde a gente é naquela gloriosa e intensa área de intersecção nós mesmas, com todas as nossas rabugices, com todos os nossos quadrados perfeitos, com todos os nossos limites, somos simplesmente filhas de Geraldo e Daisy, somos irmãs! Onde nossas vidas individuais pouco conta naquele universo tão íntimo, tão particular, tão aconchegante, naquele bendito trânsito que nos dá a chance de sermos apenas nós quatro, como se estivéssemos isolados numa imensa bolha de sabão, bem colorida, viajando, rindo, questionando, nos divertindo com nós mesmos e o mundo lá fora...que se foda!, porque a gente tá muito bem obrigada! Salve D. Daisy e S. Geraldo, o que será do mundo sem vocês ou pelo menos do nosso mundo sem vocês?! Parabéns minha irmã e que os deuses nos permita a troca de muuitas fraldas juntas! Salve, salve!!! 13


Diário de Bordo

27 de Julho de 2014

Diário de bordo: passeio bom danado ontem! exposição de Rian Fontenele, "A restauração de uma ausência", figuras fluídas, aquareladas, variações do preto nanquim, borrões, sujeiras, belos humanos se desfazendo como as lembranças... simbólico e auto referente. Minha velhinha se você esquecer de mim, eu nem sei o que faço...acho que lhe mordo!!!

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Diário de Bordo

31 de julho de 2014

Diário de bordo: hoje foi dia de faxina pra ele, barbearia com Bruno mãos de tesourinha, cabelo, pelos do nariz e da sobrancelhas! Ela... a cada degrau que ela sobe na ausência, no silêncio, na apatia, na distância é desequilibrante! Por mais que a gente saiba e tenha consciência do alzheimer, é sempre surpreendente, é melancólico, é um esforço tremendo para ficarmos bem e para tentarmos de todo jeito frear, retardar, postergar o diagnóstico: Eu: Boa noite Dr. Mattos, mamãe tá mais calada, mais quieta, o Sr. não acha que pode ser a dosagem do remédio tal que aumentamos? E Dr. Mattos (com aquela voz tranquila e atenciosa que me lembra o pediatra dos meus filhos): Vamos tentar mudar tal dosagem daquele outro medicamento. Mas nós sabemos que o melhor remédio é ficarmos fortes, botar ela no colo e dar muitos xeros e boas risadas! Ah, sim, porque a tarde foi muito gostosa! 15


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Diário de Bordo

05 de agosto de 2014

Diário de bordo: uma tarde bem bonita e reconfortante! tê-la um pouquinho mais presente, é muuito bom! tê-la já é bom demais!, com seus olhos suavemente mais abertos do que fechados, com seu sorriso mais intenso ou menos volátil, é muuito bom! Hoje dava pra enxergar, um pouquinho do que ela já foi, altiva, grandona, vaidosa, graúda, batom no bico, um colar que nela vira uma jóia e uma careta magnífica quando Gracita cortava suas unhas. E ele, claro que ele fica muito mais feliz, uma tarde bem bonita, leve e confortável!

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Diário de Bordo

07 de agosto de 2014

Diário de bordo: hoje foi muuito especial, primeiro porque eles estão bem, muito bem, felizes, tranquilos, firmes. Ele, na fisio, foi o condutor da cadeira de rodas do nosso mais recente amigo de infância, Sr. Adriano. E ela: “A melhor coisa de ficar velho, é ser cuidada pelos filhos, você fica assim... ao léu! ", E eu: bora minha velha, vamos acabar com essa preguiça, te liga doida, estamos atrasados pra fisio! Hoje, eles estavam mais pais do que filhos, e segundo, tivemos a companhia de uma flor que tem um olhar por si só, afetivo e que consegue concretizar a nossa ambiência, o nosso tempo, o nosso calor, a nossa querência, o nosso pequeno universo! Salve D. Daisy, salve S. Geraldo, salve Flora e salve meus outros amadíssimos rebentos Yuri e Sofia , pois foi sendo mãe que eu aprendi, aprendo e apreendo a ser filha! 18


Diário de Bordo

12 de agosto 2014

Diário de bordo: esse final de semana, ficamos transbordados. Visita maravilhosa de um primo, que eu mal conhecia, pois fazia pelo menos uns 20 anos que eu não o via. Se despencou do Rio pra visitar nossos velhinhos, beber deles, ouvir deles, contar pra eles, vivenciar um pouco deles! E eu dia antes do encontro, repassei a chegada de Paulo Cunha Bambu ao Recife, querendo semear a lembrança e afastar uma possível "brancas nuvens” dessa visita. Minha velha, sabe quem vem do Rio vê-los? E ela (com um certo desdém da minha pergunta): "Claro minha filha, não é o filho de Petrônio, Paulo Cesar? Isso minha velhinha!, e com meus botões: se nossa memória, dita saudável, precisa de estímulos e provocações que dirá a de quem tem 89 e 92 anos-luz? Muitíssimo obrigada Paulo, pela dedicação, pelo carinho, pela preocupação, pela admiração e por nos dá essa

oportunidade de refazer laços e desfazer nós, porque você não é "mãos-de-ouro", mas sem dúvida, é uma essência de ouro! Xero gigante de todos nós! e a vida corre sem deixar rastro e o futuro a todos nós ou a ninguém pertence!

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Diário de Bordo

27 de agosto 2014

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Diário de bordo: às vezes, e quase sempre, eu tenho a nítida sensação de que meus velhos, provavelmente assim diria minha avó, nos "come de côco"! Esse negócio de alzeheimer, nos deixa condescendente demais, negociantes demais... vamos tomar aquele banhão, vamos sair, vamos pra físio! "Acabei de tomar banho! vou nada!” Gracita, corre e toma a frente, como sempre, pois ela tem esse link de intimidade que eu ainda não tenho. E aí... Gracita com todo o amor e dedicação de uma querida avó: "mamãe, vamos lavar o cabelo! E minha velhinha no auge de sua performance (chora): "Geraldo tão me maltratando!” Ele: "basta ela chorar que ela, Gracita, amo(r)lece... minha galega tem que fazer o que quer!” Definitivamente e irremediavelmente, sofremos da rebordosa da cumplicidade, do efeito colateral do amor!


Diário de Bordo

09 de setembro de 2014

Diário de bordo: ela tá gripadinha, sem querer comer, bem rouca e, com tanta chuva, não deu pra irmos na fisio! Mas a tarde foi bem divertida, com muitas sabatinas e muitos amassos, muitas perguntas sem respostas e, de vez em quando, um golaço! Muitas ausências e grandes gargalhadas! definitivamente, quem ri junto, ri melhor!!

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Diário de Bordo

16 de setembro de 2014

Diário de bordo: graças aos deuses, a gente tem o poder de se adaptar, de se adequar às novidades, mesmo que elas cheguem sem pedir licença! hoje, nem sei porque, retirei o zoom do meu enxergar e foi impactante, me causou um certo torpor, uma certa ausência de chão! Hoje era ele quem estava gripado, e claro que não fomos à físio e a atenção se volta totalmente para o estímulo, para a contação de histórias, de ex e de estórias! E ela não lembrava que Toinho (nosso peterpan) havia morrido, nem que Renan (nossa ovelha destoante) também havia morrido, há pelo menos 8 anos. e ela chorou novamente a perda dos dois! E são nesses momentos, que o zoom se retrai, que você se distancia um pouco e vem uma "lucidez” que não cabe ali, que não deve lhe pertencer pelo menos naquele agora e que a gente não deve racionalizar algo que só a afetividade consola, que só a parceria e a cumplicidade nos fazem 22

fortes o suficiente pra darmos boas gargalhadas em um enterro, um enterro que já rolou faz tempo e pelo "caminhar da carruagem", vai rolar várias vezes. Minha velhinha, vamos costurar!!!


Diário de Bordo

18 de setembro de 2014

Diário de bordo: hoje foi difícil estar com eles... estavam looonge... quietos... dispersos, sonolentos... e o mais louco é que onde um está o outro tá junto, se um está em marte, o outro vai estar também, é sempre duplamente! não conseguimos estar juntos, não conseguimos chegar, não conseguimos... não conseguimos alcança-los, não conseguimos... é como aquela pipa voando... alto... bem alto e apenas um fiozinho nos ancorando... e a melhor ou única opção que nos restava, era admirar os leves, suaves e descontextualizados movimentos, de longe... segurando o fio, apenas segurando o fio...

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Diário de Bordo

23 de setembro de 2014

Diário de bordo: foi uma tarde gloriosa e surpreendente como sempre! mas hoje foi mais especial! eles estavam particularmente inspirados, estavam sem escudos, travessos mesmos, praticamente "cagando nas nossas cabeças"! Ela: na hora do banho, encheu a boca de água e jorrou na cara de Gracita e claro, caiu na risada! Ele, ah ele, mudou completamente a história (agora, mais do que nunca, até segunda ordem, são estórias), que desde muito pequena, eu ouvia e acreditava como sendo a história da nossa árvore genealógica, a vida inteira havia um tal de Quivilier, que possivelmente era francês, pois falava mal e porcamente o português com muitos ‘Rs’ e biquinhos, tinha conhecimento de plantas medicinais e que comeu (no sentido de fuder, ter relações sexuais) com as três irmãs, das quais uma delas era nossa bisavó ( índia safadinha, viu! ). Diagnóstico: 24

um pirata fugido da Guiana Francesa, essa era a lenda! E ele: Quem inventou essa estória de Armand Quivilier?, esse povo não era da nossa família não, ele era só um amigo do meu pai, que eu nem o conheci, isso é uma lorota, quem inventou essa? E eu, “contudentemente": foi Gracita, meu velho! E agora? de onde eu vim?, reinava uma áurea... somos apenas pessoas falíveis e fullgáses, que já fomos piratas e amanhã... quem sabe o que meu velhinho vai dizer... salve D. Daisy a encarnação de bob cuspe, salve S. Geraldo um pirata pirado e salve nós que temos a possibilidade de sermos quem eles quiserem!!!


Diário de Bordo

24 de setembro de 2014

Diário de bordo: tava muito bom hoje! foi integral! Gracita fez uma macarrona muito djilícia para que nós (Flora , Sofia e nossos velhinhos) nos saboreámos e gargalhámos juntos! Eu, só fazendo a logística, indo ao banco, comprando remédios (rotina básica e cara pra cacete!). E no final da tarde, visita de rotina (gloriosa rotina! salve, salve! ) a Dr. Mattos, como é bom conversar, se queixar e principalmente confiar na palavra, no diagnóstico e no entendimento contextualizado de nós, é mais de meio caminho andado, é muito além de estar presente, é estar contido, é fazer parte, é mais do que acompanhar, é curtir e ser preenchida por aquele universo de estar por um fio, de que hoje está ótimo e amanhã nem tão bem assim, porque independentemente da "alegria de viver", o corpo, a matéria e as artérias vão ficando enrijecidos, vão se impondo como única verdade, um viva fuderoso ao Dr. Mattos, porque ele nos ensina que a vida é qualidade, que a vida tem que ser inteira. Definitivamente, ir a Dr. Mattos, é como estar confortavelmente na parte mais segura de nossa casa! obrigada viu! 25


Diário de Bordo

03 de Outubro de 2014

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Diário de bordo: hoje o dia foi especial na presença fullgás e pontual dela, nossa galega, linda e cheirosa. Fisio com a presença ilustre e amada de nosso cochocho, Yuri. Papai tava impossível de tanta rabugice e falta de escudos: perdoai deuses, ele não sabe o que fala e muito menos o que pensa, e como não tava dirigindo, cogitei até em descer do carro e ir andando pra não compactuar com as tantas insanidades! Meu velho, você tá com fungo na unha e no juízo. E Gracita, pacientemente, coisa rara no DNA dos Pimentéis, ainda tentava dialogar, vocês não calculam!!! E ela (nossa velhinha): Cala a booca Geraldo!!, minha filha, vocês acham que a essa altura, vão mudar a cabeça dele?. Ele tá literalmente chutando o pau da barraca, eu preferiria ‘chupando’ o pau da barraca, mas enfim, quem disse que ia ser fácil... confusão mental, mudanças de identidade...até convicções frouxas, pura "tacanhês” e muitas vezes, a poesia não sobrevive, foge, escapole sem nenhuma cerimônia! e hoje foi uma tarde assim sem cerimônias!


Diário de Bordo

09 de Outubro de 2014

Diário de bordo: hoje foi foda! estávamos ressacados de tudo, ressabiados mesmo! ao chegarmos na casa dos nossos velhinhos, encontramos, ela sujinha e dormindo... nada e nem ninguém interferia naquele momento de ausência e até de plenitude com os seus próprios botões! Ele, como um cão de guarda, sem permitir que Elíude, pessoa que trabalha há anos lá, ajudasse! Eu, como sempre, batendo de frente com ele e com meus malditos botões, viciados em um sociologismo visceral, pensei numa relação tradicional de “casa grande e senzala” versão classe média, onde a intimidade não poderia ser compartilhada com uma simples doméstica, fiquei muito brava, puta mesmo! E como um pitbull: papai, você não pode deixar mamãe ficar assim... Elíude é do time, você tem que chamar por ela em qualquer situação, ele ficou meio chateado, desconfiado, foi até o o banheiro onde Gracita já dava um

banhão gostoso na nossa velhinha, voltou, foi até o quarto, onde eu pegava uma roupa pra ela, me olhou e me abraçou: "minha filha, me desculpe, é que eu fico incomodado, com as pessoas cuidando de minha galega. Onde mora o princípio da culpa e qual o caminho da inocência?!, sei que além de ressacada, ressabiada, fiquei profundamente magoada comigo, definitivamente, preciso amanhecer!

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Diário de Bordo

30 de outubro de 2014

Diário de bordo: tarde boa! oftalmo, numa sempre tentativa de reverter alguma coisa, qualquer que seja ela e por mínima ou menor que seja ela! e se constata, mais uma vez, que ele e ela estão ótimos na visão, com todas as sequelas do grande e efusivo discurso dele “a velhice é uma doença, minha filha! não consigo mais ler! e logo eu que gostava tanto! E a médica, em off, “ele tá vendo direitinho, só que esquece!” E eu, nessa altura do campeonato, com meus benditos ou malditos botões e que as vezes se chamam de Gracita: Como burlar essa inquietação? Como amenizar o ler e o não lido? Como aquietar essa pessoa ou essa outra pessoa que é extremamente fullgás e que as referências são ele guerrilheiramente e resistentemente, há muitos anos atrás? Como lidar com essa história do sair de mim e não se reconhecer? Sem dúvida alguma, ele tem sido a minha gravidez mais 28

difícil, a minha presença mais intensa, mais cabeçuda, mais probatória. E eu, sempre eu, também não sei o que vou ser daqui por diante, estou experimentando ser mais tranquila, mais condescendente, mais observadora com o que fica, porque o que foi, foi! não tem retorno e o que vem, só os deuses sabem, será?!


Diário de Bordo

15 de Dezembro de 2014

Diário de bordo: dia bom, daqueles que ficam tatuados no coração! eles mais esplendorosos e radiantes do que nunca! pelo belo encontro, mas, principalmente, por estarem no comando, por se sentirem no comando, no comando das atenções, no comando do foco, no comando do riso, no comando de uma ilusão de comando! Um instante congelado na memória. até que ela se vá. um instante... um frescor, um grande sopro de vida, Eu: Ei minha velhinha, você sabe a onde estamos? E ela, majestosamente: "sei” Eu: diga onde? Ela: "depois eu lhe digo! "

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Diário de Bordo

18 de dezembro de 2014

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Diário de bordo: hoje foi mais difícil do que nunca! , eles não perceberam, e pra que sentir falta, pra que se questionar sobre a finitude de uma amizade bem fullgás. Tivemos uma curta temporada à amizade, ao carinho e a fragilidade de D. Anunciada e sua fiel escudeira e cuidadora Vera. Houve uma perda e um ganho no céu e assim caminha a vida com essa forma inexorável de ser e de não ser, mas caminha, aos trancos e barrancos para nós que a observamos. Sim, observamos, porque as vezes não conseguimos ser nada além do que um reles observador, dor... e continuamos a caminhar, reunindo essa família linda da físio que se encontra nas pequeníssimas e grandes alegrias de conseguir, simplesmente de conseguir dar um passo um pouco mais seguro, equilibrar a bola naquele nem tão exato momento, fazer 10 minutos de bicicleta. Viva as pequenas revoluções, viva à D. Anunciada, linda e sempre de bom humor, viva a essa família, e eu levei um grande xero de D. Anunciada!


Diário de Bordo

06 de janeiro de 2015

Diário de bordo: feliz! Retornando aos trabalhos, retomando as rédeas, a rotina e ao nosso glorioso cotidiano! Com aquele olhar de futuro, de futuro imediato, de futuro fullgás, de futuro “rápido e rasteiro", de futuro presente que é um presente! Eu: E aí meu velhinho, vai pedalar até onde hoje? Ele: Com a galega junto... Vou até o céu!

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Diário de Bordo

04 de Fevereiro de 2015

Diário de bordo: saindo um pouco do casulo, que às vezes, é necessário e fundamental pra arrumar os botões, repregar as linhas que estavam soltas e soltar algumas que estavam muito presas, seguindo... e nada como entender os próprios limites assim como o do outro, nada como incorporar e respeitar a doença, trazendo-a para o lado e não bater de frente, nada como uma rotina e suas mudanças, nada como a poeira sentada suavemente, nada como saber que a poeira é leve, muito leve, e se alvoroça ao menor movimento, nada como uma lucidez breve na expectativa de um possível alvoroço da poeira, nada como estarmos vivos, juntos e se apoiando uns nos outros. Nado como a poeira, às vezes no alvoroço, às vezes na calmaria.

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Diário de Bordo

05 de fevereiro 2015

Diário de bordo: hoje estava bom demais! colo e consulta com nossos seguros parceiros geriatras! eles estão ótimos! esquecidos sim, lúcidos nem tanto, mas carinhosos e bem humorados sempre, e querendo estar bem, ou seja, com muito sopro de vida...e nós?! felizes da vida!!! E aí, Michele, a nossa querida e preferida atendente diz: “Quando é que vocês vão cortar o cordão umbilical hein?!”. Eles até que tentam, mas a gente amarra tudo de novo!!

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Diário de Bordo

12 de Fevereiro de 2015

Diário de bordo: e num dia é assim... e às vezes assado! Hoje foi clube da luluzinha, ele não quis ir de jeito nenhum! Traquino, fez faxina nas suas ferramentas, sorrateiramente, e as colocou onde a vista alcança como forma de usá-las com o olhar. E o martelo o denunciou, caiu no pé dele, nada que justificasse duas faltas a físio, mas pra quem é perrengue como ele, qualquer motivo tá valendo pra tentar impor a sua vontade e sua rabugice! E fomos com nossa galega, linda, na habitual sabatina: Eu: Onde estamos minha velha? Vamos passar por uma ponte, que ponte é essa? Ela (olhou em volta como um periscópio perdido no caos): “Ponte Petrobrás!”. Outra coisa não, mas ela fila que é uma beleza!!

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Diário de Bordo

23 de fevereiro de 2015

Diário de bordo: carnaval passou e já faz um tempo, mas não passou e espero que não passe nunca a nossa intimidade, a nossa querência, a nossa disponibilidade e prazer de estar juntos, é quase um vício, com controvérsias, sim!; Com medos, claro!; Com inseguranças, evidentemente!; Com discordâncias, aff e como!; Com até certa rejeição! Foda e muito foda se reconhecer num momento de tanta fragilidade, em que o eu depende do outro, essencialmente! E no auge do bailinho, aqui em casa, na terça de carnaval, Ela: "Se não fosse à música, como a gente ia se lembrar?! Lindinhos, né não?!

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Com foto das maĂľs


Diário de Bordo

26 de fevereiro de 2015

Diário de bordo: hoje tava bom! apesar dos ajustes no entorno, hoje foi uma tarde daquelas...deliciosa! E como é difícil se desprender do nosso umbigo e perceber que nosso umbigo é imenso no sentido de que vários outros umbigos estão contido no seu e vice-versa. Contido, palavra boa viu?! Então, eu com os meus umbigos, tivemos uma tarde daquelas... deliciosa! faltamos, deliberadamente, a físio, porque rebeldia é sempre muuuito bom, revigora, rejuvenesce, reforça a pseudo autonomia dele e ela sempre linda, sempre uma rainha que nunca perde a majestade! bel-prazer! uma tarde de puro bel-prazer! fora o perfume fedorento que Gracita estava usando!!!

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Diário de Bordo

03 de março de 2015

Diário de bordo: pegamos um flagra maravilhoso deles hoje! ela de olhos abertos e ele de olhos fechados, claro, com aquela preguiça de sempre de ir pra físio! Eu: booora meu velho! te liga doido que os exercícios e os amigos nos esperam!!!! E ele: “curtir a preguiça é a única vantagem da velhice!”

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Diário de Bordo

24 de março de 2015

Diário de bordo: céu de brigadeiro, mar de almirante e astral de Pimentel. Assim foi a nossa tarde com eles! E cada instante com eles, é sinal de algum lembrete, de algum ‘se ligue!’, é incrível a sensação do quanto a gente ‘perde tempo’ se preocupando com o que virá e o foco sai do presente para o que poderá ser ou não ser! E fato, e no meu caso é foda, me tira o sono, mas nessas tardes me dou ao luxo de ser filha, nessas tardes as preocupações se diluem em afetos, nessas tardes somos inteiras, filhas, mães e irmãs. Salve meus velhinhos, amoos pracaraleo!

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Diário de Bordo

02 de Abril de 2015

Diário de bordo: depois de quase uma semana de muuita rabugice dele e meu habitual mal e incorrigível jeito de "bater de frente” nele, ficamos todos bem. Ele hoje, estava receptivo, tranquilo, sorridente, conversador. ela com os olhos abertos e com uma certa faísca de curiosidade em relação a rua... Eu: minha velha, que ponte é essa que vamos passar? Ela (impiedosamente com muito sarcasmo): É a ponte do caralho!!! Imaginem no que se transformou o carro! numa balbúrdia! É bom que só perder os escudos, e a gente gosta pouco de perder a compostura!!!!

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Diário de Bordo

07 de Abril de 2015

Diário de bordo: hoje foi mais uma tarde daquelas... trânsito, buzinas e nenhum estresse! se existe algum lado positivo no alzheimer é a redoma em que a gente se coloca ou a redoma que o "doente” constrói. E se a gente tiver um pouquinho de lucidez e muito afeto, a gente se inclui e reforça essa redoma! Nunca mais eu vi minha velhinha chorar, nem de saudade, nem de profundidade, há uma certa letargia, torpor que os fazem, inclusive, acrescer à memória e às histórias, mais "memória” e mais "histórias” com uma certa melancolia e muita poesia! Queiram os deuses proteger, em mim, a memória dessas tardes! Amém!

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Diário de Bordo

09 de Abril de 2015

Diário de bordo: eles estavam especialmente felizes! uma ressaca boa do show do filho longeperto e pertolonge! Ele lembrou de todo o mutirão noturno, do quanto se emocionou e do quanto se envolveu e chorou! foi como uma audição onde o grande público fosse apenas os dois! Ela, ai ai ela, no momento do show acompanhou atentamente cada movimento e cantou junto liricamente! hoje, Gracita: "minha velha, como foi a farra?" Ela: hãm? farra? a gente foi pra onde Geraldo?” E ele (seu hd externo de prontidão): "Ô lora, num fomos pro show do teu filho!! E assim, ela saiu com a camisa do filho como um cordão amarrado no dedo. Precisamos urgentemente mandar fazer uma camisa com nossos nomes: limbo: TERESA e céu: GRACITA!!! 43


Diário de Bordo

21 de abril de 2015

Diário de bordo: bom tê-los bem pertinho, o dia inteiro de bobeira, o dia inteiro beliscando uma comidinha, uma cervejinha 0% álcool e mesmo assim se embriagar... chegue aqui, meu velho! venha ouvir algumas coisas do disco novo do seu filho! E ele, no seu passinho que já foi lépido, mas que continua ispilicute: "A velhice é uma merda minha filha! A neta, numa tentativa de intervir no indefectível: "Não, voinho, você é um senhor jovem!" Ele, sorrindo com desdém: "nada, minha querida, eu tô escapando, eu sou um resto de gente!" Foda! doeu!

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Diário de Bordo

28 de Abril de 2015

Diário de bordo: hoje não fomos à fisio! ela muito molinha, resfriada, sem comer e sem nenhuma reação! passou a tarde deitada e ele sentado ao lado dela segurando a sua mão, toda a tarde e a tarde toda!!

29 de abril de 2015

Diário de bordo: passamos o dia na emergência com nossa velhinha, pionga, molinha, sem força alguma pra segurar o corpo! Confesso que me deparei com um grande desânimo e auto fragilidade! mas respirei fundo, usei o batfone e pronto: batman e robin, ou pink e o cérebro, ou a vaca e o frango, estavam juntas pra mais uma aventura! E assim tem dado certo, juntamos nossos medos, nossas inseguranças e claro, nossa imensa vontade de que tudo fique bem e que possamos retirar a leveza daquilo que pesa e ainda rir! Acho que esse é o grande barato, ela está muuito bem, depois de um dia de exames, um dia de vexames (derrubei todo o xixi coletado!) e um dia de encontros “inesperados" - seu Adriano e dona Helena companheiros de fisio estavam lá também sendo atendido! - tudo se resumiu a uma farra, como disse nossa velhinha depois que chegou em casa, sem mais se lembrar de onde esteve durante toda a tard. Llinda e leve! 45


Diário de Bordo

05 de maio de 2015

Diário de bordo: hoje foi mais um dia especial, principalmente porque ela está muuito bem, tranquila, serena e relativamente participativa, observadora e ativa, enxergando o outro e a si mesmo! Conversamos bastante e sobre várias coisas, som, sexo, rock and roll e inclusive sobre o #ocupeestelita! E ela se colocou, de forma passageira, momentânea e fugaz, mas ouviu, se indgnou. Salve d. daisy, salve todos nós que acreditamos e que queremos uma cidade sem alzheimer!

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Diário de Bordo

11 de maio de 2015

Diário de bordo: celebração foi a palavra de ordem! Celebrar o encontro, os desencontros, as idéias, as más idéias, o demonstrar carinho, o ter carinho, o carinho que não foi dado, a carência que fica, a imagem que guardamos, a imagem que esquecemos, o apego e o desapego, a pele, o riso, o choro, a alegria de estarmos juntos, a vida que foge, a perda que ronda, à alma...salve D. Daisy, minha mãe, linda e que confesso que não sei o que vai ser... Salve S. Geraldo no auge dos seus 93 anosluz e que eu também não sei como vai ser... Porque eles continuam sendo minha âncora, meu destino meu maior aprendizado! Salve, salve!

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Diário de Bordo

14 de maio de 2015

Diário de bordo: Hoje o papo foi assim... Eu: Ei meu velhinho, domingo tem a macha da maconha, vamos?! Ele: Vamos sim minha filha, é de tarde né? Eu: É sim!” Ele: Então vamos!" Eu: E você minha velha, vamos? Ela: “Deus me livre!" Eu: Não minha velha, é um protesto para que o uso não seja crime! Ela: Ahhhhh, vamos sim!!!" Pense nuns velhinhos bacana e com muuito entendimento do outro, e desde de sempre! Então vamos né?!

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Diário de Bordo

19 de maio de 2015

Diário de bordo: hoje a tarde foi cheia, cheinha! teve físio preguiçosa, mas teve, teve barbeiro e teve paço do frevo! A mudança de medicamento sempre repercute de uma forma ou de outra e hoje, ela estava numa ausência delicada, sem nenhuma preocupação de esforço, sem qualquer iniciativa, apenas pra sorrir quando provocada, quando chamada, quando abraçada! Ele estava bem esperto, malhou direitinho, feliz por ter cortado o cabelo, curioso com as informações do paço e teve medo de percorrer o piso de vidro! Claro que tentei caminhar loucamente pelos vidros. É o frevo meu velhinho! Mas ele travou e fomos pelo caminho proposto, só vendo os blocos passarem, divertido, intenso, foi uma tarde cheinha!

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Diário de Bordo

30 de maio de 2015

Diário de bordo: ”hoje o dia foi foda", Ele: produzindo a mil, agora a história são casinhas, humildes, singelas, interioranas, casebres, possíveis palafitas, com resto de materiais, com caixas de remédios, lindas, a fila tá grande de querência e ele muito orgulhoso! Ela: sempre linda! E eu: com meus insistentes botões, tenho amado muito mais ela agora do que antes. porque? nem sei dizer, talvez pela plenitude da delicadeza dos nossos momentos, talvez por nós estarmos mais sensíveis, mais pacientes uma com a outra, talvez isso seja o lado bom da nossa velhice! envelhecer com pai e mãe é pleno! Hoje foi difícil, foi uma legítima peleja incentivar o bordar, o que seria, algum tempo atrás, respirar, estar viva! Minha velhinha, Flora quer casar (sic!), mas só se tiver um paninho bordado por você! se avexe minha velha, se não ela vai ser mãe e não casa! vamos nessa! e ela começou a bordar!

Que vida surgiu nos seus olhinhos! como se ela voltasse e levasse a gente junto! E eu, com meus resistentes botões... Porque não aprendi com ela a bordar, a cozinhar, a ser prendada, a ser ela?! Porque não apreendi com ele a fazer casinhas com caixas de remédios, porque não incorporei saber usar um martelo, porque perdi tanto tempo, porque não fiz a lição de casa? E a gente passa... e a memória se perde... e a gente perde... Vamos correr atrás do prejuízo? Será que ainda há tempo???

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Diário de Bordo

03 de junho de 2015

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Diário de bordo: hoje tentamos ir à médica de nossa velhinha, Dra. Fontenele, parceira e cúmplice de Dr. Mattos. mudamos só por uma estratégia nossa, de tentar dar uma individualidade, um espaço do tipo ”ado, cada um no seu quadrado" e até para pensarmos um pouco em separação... aproveitamos a vontade dele de ficar em casa, de não acompanhá-la (coisa rara!) para reforçar um programa só nosso, as três patetas, os três mosqueteiros, as três cabeças de vento! E não deu nem um pouquinho certo! Ela (todo o tempo): ”cadê Geraldo?" Gracita: ficou, minha velhinha! vai ser um programa de mulheres! Ela fechava os olhos e quando abria: ”cadê meu velho?" ficou em casa, minha velha, descansando! e assim foi todo o percusso, fechava, abria os olhos e perguntava: ”onde tá Geraldo?" e pra completar, troquei as datas, a consulta é amanhã!! Mas valeu, foi um belo exercício! 52


Diário de Bordo

05 de junho de 2015

Diário de bordo: hoje, enfim, tivemos nossa consulta, é sempre muito paliativa porque as coisas caminham, andam, acontecem, se firmam e se instalam cada vez mais notoriamente! E muitas vezes você não está tão forte e nem tão otimista como costuma ser; ela está fisicamente bem, taxas boas, P.A. boa, peso bom apesar de fastiosa... Mas, por onde anda minha velha? Em que vazio ela se encontra? Em que nada ela se ancora? E os meus botões, diz baixinho: " Ei doida, eles mais do que nunca, pertencem, estão contido em você, de forma cada vez mais etérea! te liga e vai no vácuo!" tô tentando botões filhos da puta!!!

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Dimensões: 15 cm x 22cm Volume: 54 páginas Impressão em 4 cores Tipografia: Gabriola 14 textos, 30 títulos Papel: Couché 170 com laminação fosca e chipboard 300g/m2[capa], offset 120g/m² [miolo]. Folha de Guarda: papel Off Set 150g/m2 Tiragem: 02 cópias Impresso na Gráfica e Copiadora Nacional Rua Boa vista, s/n - bairro: Boa Vista - Recife/PE.




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